O documento discute as abordagens ocidentais e orientais à cidadania e como regimes democráticos responderam à pandemia de COVID-19. Analisa a resposta dos EUA, incluindo ações do presidente Trump que levantaram questões sobre o compromisso dos EUA com princípios democráticos como o direito à vida. A pandemia também revelou desigualdades raciais no acesso aos cuidados de saúde.

1. Marina Fernandes A85840
As diferentes abordagens do modelo de cidadania ocidental e oriental fase ao novo
coronavírus
“Citizens are the owners of society. The government is made by the people. People are
you and me simply.”
Zimbabwean1
O que significa Cidadania para os Ocidentais?
O conceito de cidadania sofreu várias alterações ao longo do tempo e associada a
qualquer mudança vem o espírito de sacrifício e luta. No século XVIII, numa ótica
ocidental surge a cidadania civil que refere-se aos direitos associados à liberdade
individual, entre eles, liberdade de expressão e reunião, direito de propriedade e a
igualdade de direitos perante a lei. A cidadania política, por sua vez, emergiu das lutas do
século XIX. Aos direitos anteriores, associa-se agora o direito de participação no mundo
político, seja como eleitor, candidato ou funcionário público. É visível que as mulheres e
as minorias travaram uma luta mais extensa para obter o sufrágio universal, que
anteriormente era apenas concedido aos proprietários masculinos. Neste contexto, surge
a cidadania social que advém das crescentes desigualdades do século XX. O foco são os
direitos e padrões mínimos de bem-estar económico , cultural e social.
No entanto, não se pode falar de cidadania sem se referir a democracia, uma vez que são
dois conceitos interligados e complementares entre si. “Citizenship is very tied to the idea
of democracy. Democracy is the first name and citizenship is the last name.”2
Deste modo, democracia carateriza-se por ser uma forma de governo em que o poder
supremo é mantido pelo povo e exercido diretamente ou através de representantes
eleitos. A palavra tem origem grega "People’s rule" sendo que a democracia pode ser
exercida de diversas formas. Na Era moderna, o conceito geralmente implica a regra da
maioria ,bem como, a garantia de direitos por parte das minorias e individuais. Associado
ao conceito advém, a igualdade de oportunidades, igualdade sob a lei e liberdades civis.
Seguindo essa linha de pensamento, surgem duas teorias cruciais: A democracia liberal e
Republicanismo.
Teorias democráticas
2
Lisa Veneklasen. Valerie Miller. A new wave of power, people and politics: the action guide for advocacy and citizen
participation. (Oklahoma: World Neighbors,2002). p.29
1
Democratic Governance in Zimbabwe: Citizen Power, Africa Community Publishing and Development Trust and the
Commonwealth Foundation, Harare, 1999.

2. O que significa, portanto , democracia liberal? Etimologicamente, a palavra liberalismo
vem do latim liber e significa livre. O liberalismo político define-se como “uma norma
jurídica que reconhece certos direitos ou liberdades individuais que escapam ao controle
do governo” 3
. Deste modo, o papel do liberalismo associa-se imediatamente à limitação
da esfera de atuação do Estado.
O Estado só intervém para garantir a esfera de proteção dos indivíduos. Daí a figura do
Estado mínimo, restrito às tarefas de ordem interna e externa e a distinção entre as
esferas pública e privada.
É importante realçar que ao Liberalismo associa-se inerentemente o conceito de liberdade
negativa. A liberdade negativa pressupõe um espaço de não interferência externa, da
ausência de impedimentos ou obstáculos, para o livre exercício de ações que
deliberadamente o ser humano deseja realizar. Os indivíduos serão livres, se eles mesmo
forem os atores das suas escolhas e decisões, definidas num campo não arbitrário de
interferência. Por essa razão, a liberdade passa a ser chamada de negativa, isto é, ela
existe na ausência de ações que podem criar impedimentos arbitrários e indevidos à livre
atividade dos sujeitos.
A influência mais notória é de John Locke, que defendia um Estado e uma lei natural de
acordo com os quais se reconhece que ninguém deve prejudicar o outro, quer em termos
da sua saúde, vida, liberdade ou posses. Outro traço significativo desta doutrina política
surgiu por parte dos colonos norte americanos que afirmaram que os homens são
portadores de certos direitos inalienáveis: a vida, a liberdade e a busca da felicidade.
O republicanismo , por sua vez, surge como um desafio à teoria liberal pondo em causa a
conceção de liberdade negativa. Neste âmbito, é proposta uma nova perspetiva de
liberdade que segue a linha da teoria maquiaveliana da liberdade, sem recorrer à
estratégia dos direitos naturais, que carateriza e penetra a teoria política do liberalismo
clássico.
Desse modo, o republicanismo assume dois significados. O primeiro, numa ótica política,
consiste em ver no republicanismo a teoria de um regime político que se opõe à
monarquia. Desde as revoluções francesa e americana do século XVIII que esta teoria se
veio desenvolver e a república é vista como um sistema na qual os governos são eleitos
pelos cidadãos. Claramente que o próprio acesso à cidadania vai se alterando consoante
a república e época em questão. O poder neste caso, não é mais hereditário, mas
conquista-se através do mérito, o que contrasta o que acontecia na monarquia ou até
mesmo numa aristocracia nobiliárquica. Por conseguinte, o papel dos cidadãos será,
portanto, a vigia permanente sob as ações e decisões tomadas de forma a evitar
despesas desnecessárias que aumente a dívida pública.
3
Fukuyama, 1992 in Cesar Ramos, The liberal and republican model of freedom: a disjunctive choice? Trans/
Form/Ação, (Marília); v.34, n.1, 2011, p. 10

3. No entanto, o termo “republicanismo” não se direciona exclusivamente a um sistema
político; existe outra vertente que se foca na descrição das relações que os indivíduos
poderiam adotar em relação uns aos outros numa sociedade. Sob esta ótica, o
republicanismo coloca ênfase no campo igualitário entre indivíduos e sobre a necessária
participação destes nos assuntos públicos. O objetivo será a garantia da liberdade
usufruída por todos os cidadãos, sem estarem suscetíveis à dominação de um outro, quer
seja do governo quer seja do âmbito que for.
Qual é a posição e reação de regimes democráticos fase ao vírus Covid-19?
Recentemente foi detetado na cidade chinesa de Wuhan, o vírus Covid-19 que se
propaga não apenas no seu país de origem, China, mas também nos restantes países. O
recente alarmismo global tem como a origem as inúmeras mortes ocorridas devido à
facilidade de transmissão inter-humana, isto é, o contágio de pessoa para pessoa. Fonte
da pandemia atual, várias consequências e mudanças tiveram que ser adotadas. Deste
modo, a análise que se segue, foca-se na resposta dos Estados Unidos da América à
nova crise mundial. É curioso e questionável qual é a linha de resposta que a atual
potência mundial poderá seguir.
É conhecido que os Estados Unidos é o atual epicentro da pandemia do novo coronavírus
e que regista o maior número de mortes por dia - “Estamos a assistir a uma disseminação
muito rápida de casos nos EUA”.4
Este trágico acontecimento, impulsionou que os governadores dos Estados mais
afetados, como Nova Iorque, Califórnia e Washington pedissem ajuda direta à Casa
Branca para combater a escassez de máscaras e ventiladores. No entanto, a resposta do
Presidente Donald Trump não satisfaz os pedidos uma vez que, não existem intenções
por parte de Trump de ordenar empresas privadas a fabricar equipamentos de combate à
pandemia. Deste modo, o Presidente apenas autoriza o Recurso à Guarda Nacional sem
custos para esses mesmos Estados.
Todavia, os Estados mais afetados tiveram que tomar alguma medida para combater a
escassez de equipamento. O que se sucede é que os Estados em questão juntamente
com outros Estados ligados ao Partido Democrata exigem ao Donald Trump que accione
a cláusula “Lei de Defesa da Produção”. A respetiva cláusula é uma lei que foi aprovada
durante a Guerra da Coreia, há 70 anos, e foi igualmente reforçada após os ataques
terroristas de 11 de Setembro de 2001 nos Estados Unidos.
4
OMS in Lusa, “Coronavírus: OMS diz que os Estados Unidos podem torna-se o epicentro da pandemia.” Público,
Março 24, 2020,
https://www.publico.pt/2020/03/24/sociedade/noticia/coronavirus-oms-eua-podem-tornarse-epicentro-pandemia-190
9300.

4. De acordo com essa lei, que atualmente está em vigor, pelo menos, até 2025, Donald
Trump tem o poder de ordenar as empresas privadas a alterarem os seus planos para
ajudar a combater a ameaça mundial. Em consequência, a Casa Branca está sob pressão
para invocar a lei e colocar as empresas privadas na produção de equipamentos
estritamente necessários ao combate do vírus como uso público e não com fins de venda
aos preços de mercado. Porém, qual é a resposta do presidente Donald Trump a um
pedido de acudo? “Falem com as pessoas na Venezuela. Perguntem-lhes como correu a
nacionalização dos seus negócios. Não correu muito bem. O conceito de nacionalização
das nossas empresas não é um bom conceito.”5
Outra vertente importante é a Organização Mundial de Saúde. Os recentes
acontecimentos chocam a população mundial num momento de desespero. A Casa
Branca suspende cerca de US$ 500 milhões em contribuições anuais à OMS devido a
vários motivos. Donald Trump aclama que a organização avaliou incorretamente o risco
de transmissão do coronavírus e juntamente beneficiou a China com os comentários
positivos relativamente aos seus esforços de contenção no início da pandemia. Portanto,
acusa a OMS de acobertar as falhas da China , a sua falta de transparência e a má
conduta da administração por parte da organização. Com isto, o Presidente requer uma
revisão que demora entre 60 a 90 dias.
Porém numa regime democrático ainda existe discriminação racial perante a comunidade
afro-americana dos Estados Unidos. Na área metropolitana de Milwaukee, no estado do
Wisconsin, é onde se verifica uma maior divisão entre a população de brancos e negros.
É notório que a população negra tem sido afastada dos serviços de saúde quer por
motivos de pobreza, quer por racismo- explícito ou implícito que tem vindo a excluir os
doentes negros dos tratamentos mais eficazes. Este problema estrutural é refletido na
taxa de mortalidade do Covid-19.
Conclusão
A constituição estabeleceu os Estados Unidos como uma república democrática. Porquê?
É democrática porque a população governa-se a si mesma e é justamente considerada
uma república porque o poder do governo é derivado do seu povo. Isto significa que o
governo quer seja federal, estado ou local é elegido pelos cidadãos através do voto. Para
um cidadão dos Estados Unidos existem dois deveres fulcrais: votar nas eleições federais
e to serve on jury. Ser um bom cidadão significa ser leal ao seu país, e estar disponível a
lutar por ele. Mas o que acontece quando quem os cidadãos elegem não está disposto a
lutar por eles?
5
Donald Trump in Alexandre,Martins ”Coronavírus: Trump acciona Guarda Nacional, mas rejeita
intervenção no sector privado.” Público, Março 23, 2020,
https://www.publico.pt/2020/03/23/mundo/noticia/coronavirus-trump-acciona-guarda-nacional-rejeita-intervencao-sec
tor-privado-1908991.

5. Os mesmos cidadãos que juram ser leais ao seu país são os mesmo que morrem por falta
de assistência, por discriminação e por falta de uma poção de humanidade. Como em
tempos de ameaça externa e crise global, ainda se olha para os próprios bolsos e não se
olha para o verdadeiro valor que é a vida humana?
A falta de investimento em equipamentos estritamente fulcrais para a assistência dos
cidadãos americanos e o corte do financiamento em relação à Organização Mundial de
Saúde são medidas tomadas por Donald Trump que levantam dúvidas nos restantes
indivíduos. Então afinal, os EUA que representam um regime democrático associado a
certos direitos inalienáveis, isto é, o direito à vida, à liberdade e a busca de felicidade (já
defendidos pelos seus antepassados colono americanos) leva a que se levante uma
grande questão: O que é afinal Democracia nos tempos contemporâneos?
Referências
Ramos C. A. The liberal and republican model of freedom: a disjunctive choice? Trans/
Form/Ação, (Marília); v.34, n.1, 2011, p. 43-66
Merrill Roberto, Vincent Bourdeau. «Republicanismo», in João Cardoso Rosas (org.), Manual de
Filosofia Política,Coimbra, Almedina, 2008 p. 109-127
UCIS. “Intermediate Level and Responsabilities.”
uscis.gov/citizenship
Veneklasen Lisa, Miller Valerie. A new wave of power, people and politics: the action guide for
advocacy and citizen participation. Oklahoma: World Neighbors,2002.
Martins, Alexandre, ”Coronavírus: Trump acciona Guarda Nacional, mas rejeita intervenção
no sector privado.” Público, Março 23, 2020.
https://www.publico.pt/2020/03/23/mundo/noticia/coronavirus-trump-acciona-guarda-nacional-rejeita-intervencao-sector-
privado-1908991
Lusa, “Coronavírus: OMS diz que os Estados Unidos podem torna-se o epicentro da
pandemia.” Público, Março 24, 2020.
https://www.publico.pt/2020/03/24/sociedade/noticia/coronavirus-oms-eua-podem-tornarse-epicentro-pandemia-1909300
Martins, Alexandre, “ Covid-19: nos EUA, é a população negra quem mais sofre com o novo
coronovírus.” Público, Abril 8, 2020.
https://www.publico.pt/2020/04/08/mundo/noticia/covid19-eua-populacao-negra-sofre-novo-coronavirus-1911560
JN, “ Donald Trump ataca OMS: ‘ Muitas mortes foram causadas pelos erros deles.’ “Jornal
Nacional, Abril 15, 2020.
https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2020/04/15/donald-trump-ataca-oms-muitas-mortes-foram-causadas-pelos-er
ros-deles.ghtml