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Universidade Católica Portuguesa – Faculdade de Teologia
Braga, 2020
Unidade: Modelos e Práticas Catequéticas – Ano Pastoral | 1º Doutoramento
Aluno: João Miguel Pereira
Síntese de Luís Figueiredo Rodrigues, O digital no serviço da fé: formar
para uma oportunidade (Lisboa: Universidade Católica Portuguesa,
2016), 27-87.
O ser humano insere-se num contexto de comunicação com os humanos que vivem na
atualidade e também com os que viveram em épocas anteriores, acolhendo, transmitindo, destruindo e
criando novas tradições por meio da linguagem, da escrita e de outros documentos e objetivações do
espírito humano1
.
A linguagem é, em simultâneo, meio de transmissão cultural e elemento constitutivo da
tradição, que lhe permite superar o tempo, dando assim «resposta cultural a duas limitações do ser
humano: a finitude e a necessidade de não se começar sempre do início, mas de assumir e acolher as
descobertas precedentes para, sobre elas, construir e elaborar novas conquistas»2
.
O indivíduo consegue, com os processos de transmissão, algo que o transcende no espaço e no
tempo, acolhendo o que lhe é entregue, fazendo-o seu, para, por seu turno, na medida em que o acolhe,
o transmitir3
. No ato de o fazer seu, existe uma atitude crítica do sujeito, «pois a assimilação pessoal é
sempre interpretação. Esta resulta da interação daquilo que é transmitido, ou ensinado, com as
experiências pessoais»4
, havendo assim, ao mesmo tempo, continuidade e inovação.
No caso da tradição como fenómeno teológico, ela «tem a sua origem no próprio querigma e é
a forma própria da mediação querigmática em virtude da qual a Igreja se fundamenta e percebe a sua
missão essencial»5
. «Como em qualquer tradição há que distinguir o conteúdo que é transmitido, o
processo de transmitir e receber, e os sujeitos da tradição»6
.
«Em relação à Escritura, “a reinterpretação constante é expressão da verdade de que o Senhor
está vivo e está diretamente presente em cada época e nela quer ser novamente testemunhado. Destarte,
a Bíblia transmite não somente os conteúdos da tradição, mas também os modelos da sua
interpretação”. É por isso que ela se configura como norma suprema da fé»7
. A revelação não se
confina em nenhuma forma de testemunho. É a Escritura quem estabelece e inspira a tradição
1
Cf. 27.
2
28.
3
Cf. 28.
4
28-29.
5
29.
6
29.
7
30.
subsequente e portanto pode ser designada como regra da fé em relação às instâncias testemunhais
subordinadas. É-lhe subordinada «a tradição de fé da Igreja: a tradição interpretativa e explicativa, em
virtude da promessa da presença constante de Cristo na sua Igreja (cf. Mt 28, 20) e da permanente
assistência do Espírito Santo que promete à Igreja a indefetibilidade»8
.
Existem critérios que permitem avaliar a pertença ou não à tradição de fé da Igreja e o
verdadeiro sentido da formulação doutrinal:
1- Pertença: «avalia-se a vinculação à fé da Igreja quer na história quer na atualidade»9
;
2- Hermenêuticos: «para avaliar o sentido verdadeiro, o peso do conteúdo e a importância de cada
tradição, importa ter presente: a pesquisa histórica, a importância salvífica (cf. DV 8, 11), a
hierarquia das verdades (cf. UR 11) e, por último, o seu discernimento à luz dos sinais dos
tempos (cf. GS 4, 11)»10
.
O conteúdo da tradição é a revelação que Deus faz de si mesmo, já a forma é o testemunho de
fé dos apóstolos e das comunidades. Eles devem tendencialmente corresponder-se mutuamente, isto é,
«a forma vai-se aperfeiçoando, na medida em que o conteúdo dá respostas sempre novas às
interpelações dos “sinais dos tempos” (cf GS 4)»11
. «A palavra de Deus continua a sua incarnação em
diversos documentos ou “corpos” da fé – Sagrada Escritura, doutrina, liturgia, vida da igreja e sentir
dos crentes –, mas não se esgota em nenhum deles, nem na soma de todos: ela é de carácter
escatológico. Este facto dá lugar, por um lado, à multiplicidade de testemunhos, mas também a formas
de testemunho, a expressões sempre novas. Deste modo, “a fé testemunhal não alcança a sua identidade
e o seu conteúdo com a sua mera repetição, mas reproduzindo-se como mediação do acesso à
confidência com o Senhor que, mediante o seguimento deste e através do Espírito, instrui e edifica o
discípulo”»12
.
O sujeito que crê responde à iniciativa divina mas não o faz de modo isolado. Fá-lo em contexto
eclesial, no qual a «fé da Igreja precede, gera, suporta e nutre a nossa fé» (CCE 181). A Igreja é
mediação de Cristo e, por isso, caminho para chegar a Deus. A instituição eclesial emerge da própria
dinâmica de transmissão da fé como condição de possibilidade da mesma. A Igreja pertence ao destino
histórico da encarnação e missão de Cristo, ela faz parte da Revelação. Por isso, «a cada pessoa é
possível crer, ter fé, na medida em que participa, seja de que modo for, na fé da Igreja; quando há uma
8
30.
9
31.
10
31.
11
31.
12
32.
certa identificação entre o sujeito crente e a Igreja»13
. A Igreja «não transmite apenas verdades
isoladas, mas sobretudo a comunicação da possibilidade, oferecida por Deus, de cada ser humano
entrar em diálogo amoroso com Deus Trindade, através do acolhimento da Revelação»14
.
Todavia, a Igreja, «porque subsiste na história e é formada por seres humanos, está sujeita às
contradições próprias da história, o que origina falhas na vivência e testemunho da fé. A fé e a sua
verdade só se podem verificar pela permanente referência ao dado revelado, à história da salvação que
tem o seu ápice em Jesus Cristo»15
. A verdade da fé é aprimorada pelo sentido da fé dos fiéis, pelo
ensinamento e condução do magistério e pelo trabalho dos teólogos que pela articulação da fé, Igreja
e ciência, acolhem as questões que se levantam no seio eclesial e lhe devolvem o resultado do trabalho
teológico16
. Por fim, o tempo é o fator indispensável na interpretação que se faz de cada expressão da
fé, só o que é conforme à verdade da Revelação poderá prevalecer17
.
Para o crente acreditar em Deus, concorrem o testemunho que Deus dá de si mesmo e a
referência da fé que não se vê nem se toca pelos sentidos, mas que chega através do outro, pelo
testemunho, «onde a credibilidade deste – pessoal – e os motivos de credibilidade daquilo que
testemunha – conteúdo – são postos à prova pelo recetor»18
. Entende-se o ato de acreditar como adesão
a alguém e também a consideração de que ago é verdade. No caso da fé cristã isto expressa-se em dois
termos: «a fé em que se crê [,isto é, que] designa o conteúdo da fé, compendiado nos símbolos da fé e
proposições dogmáticas […] a fé com que se crê [que] é o conjunto de ações do sujeito através das
quais se decide a crer e a manter-se nesse estado de fé»19
. A fé cristã é a resposta pessoal à revelação
pessoal que Deus faz de si mesmo. Não pode excluir o recetor, reduzindo-se apenas ao lado divino.
No ato de crer intervém a inteligência (o conhecimento sobre Deus e o julgamento de que tal é
verdadeiro) e também a vontade (a vontade de livremente decidir crer, diante do bem que lhe é
apresentado)20
.
No ato de crer intervém fortemente o testemunho do outro. O testemunho é tanto mais forte
quanto maior o compromisso vital existente entre aquele que testemunha e aquilo que testemunha, isto
é, Aquele sobre quem dá testemunho: «a pessoa que testemunha compromete-se por inteiro com o seu
depoimento; a sua palavra é autoempenhativa, o ser e o dizer coincidem»21
. O testemunho passa da
13
33.
14
34.
15
35.
16
Cf. 36-37
17
Cf. 38.
18
39.
19
40.
20
Cf. 42-43.
21
44-45.
palavra à ação e pode chegar ao sacrifício da vida22
. Mas, «para além do testemunho humano, está a
ação de Deus que suscita interiormente o crer, pelo que o motivo último é sempre Deus»23
. Só Deus
pode dar à sua Palavra a garantia absoluta da sua credibilidade. O testemunho por excelência é Cristo,
«Aquele em quem o dizer e o agir coincidem na transparência do Seu ser»24
.
«Os nossos contemporâneos solicitam aos cristãos “não só que lhes ´falem` de Cristo, mas
também que de certa forma lh`O façam ´ver`”»25
pela acomodação da própria vida a Jesus Cristo.
Na Igreja estão presentes os acontecimentos fundantes da fé, a Morte e Ressurreição do Senhor,
e todo o crente, pela ação do Espírito Santo, é de certo modo participante neles, ao participar na cadeia
ininterrupta de testemunhas que forma a Igreja e os seus sacramentos26
. A educação cristã é uma
«iniciação ordenada à revelação que Deus, em Jesus Cristo, fez à humanidade e que permanece na
memória da Igreja e nas Sagradas Escrituras»27
. «Não podemos falar de revelação com toda a
propriedade, se a automanifestação de Deus em e pela história não for captada pelo homem»28
. A
educação cristã deve fomentar «a entrega confiada do homem a Deus e a homenagem do entendimento
e da vontade, conversão e conhecimento, experiência vital e verdade revelada»29
. Todavia, só se pode
falar verdadeiramente de revelação quando, fruto disso, o humano acolhe livremente o dom que Deus
lhe oferece. A fé é por isso personalista mas não individualista. A realidade eclesial e comunitária não
são excluídas mas são as mediações através das quais a relação com Deus se pode estabelecer30
. A
instituição é local de interpelação ao sujeito e à sua resposta, ele, diante dela, vê a possibilidade de
exercício da sua própria liberdade31
. «O indivíduo torna-se crente porque na sua individualidade
emergiu uma experiência do divino que o surpreende, a instituição favorece, promove e ajuda a
perceber esta Novidade»32
.
A transmissão da fé ou catequese, que o autor exprime como «educação da fé», é «o exercício
humano e divino de entrega do dom da revelação divina, conservada na Igreja e transmitida mediante
uma tradição viva e ativa, a cada ser humano»33
e «tem por finalidade conseguir que, sob a ação do
22
Cf. 45.
23
44.
24
46.
25
47.
26
48.
27
49.
28
49.
29
49.
30
Cf. 51-52.
31
Cf. 52.
32
54.
33
55
Espírito Santo, a revelação seja significativa para cada pessoa. A sua função consiste em fazer ressoar
a palavra de Deus, viva e significante, de modo que toque a experiência do crente e a ilumine»34
.
Para fazer catequese, a Igreja deve servir-se da «pedagogia divina», a mesma utilizada por Deus
para se revelar, que está patente de modo mais eminente nos evangelhos. É preciso que as técnicas da
educação em geral, quando aplicadas na catequese, estejam ao serviço da consciência de que «não se
trata simplesmente de transmitir um saber humano, por mais elevado que se considere; trata-se de
comunicar na sua integridade a Revelação de Deus» (Catechesi Tradendae, 58). A formação cristã há-
de ter como modelo a educação dada pelos pais aos filhos, neste caso pelo Pai Deus e pela Mãe Igreja
(cf. João Paulo II). Ela há-de ser gradual (CCE, 53), condescendente (CCE, 684), operada a partir de
símbolos35
. Ela há-de seguir o modelo operado por Jesus Cristo que se apresentou aos discípulos como
«único Mestre e, ao mesmo tempo, amigo paciente e fiel, estimulando-os com oportunas perguntas,
explicou-lhes de maneira aprofundada aquilo que anunciava à multidão, introduziu-os na oração […]
enviou o Espírito de seu Pai, para que os guiasse à verdade na sua totalidade, e os amparou nos
inevitáveis momentos difíceis» (Diretório Geral da Catequese 1997, 137).
Na história da Revelação, Deus não quer só dar-Se a conhecer, mas também convidar o ser
humano à comunhão com Ele36
. «A pedagogia divina trata, sobretudo, de “comunicar a Revelação de
Deus na sua integridade e trata de inserir o novo crente na história salvífica que Deus teceu na história
do seu povo de Israel e agora tece através da vida da Igreja”»37
. Ela só alcança o objetivo quando
favorece o diálogo salvífico entre Deus e o ser humano.
Na pedagogia divina está patente a condescendência de Deus que se adequa à realidade
humana, para estar ao alcance do humano e dialogar com ele. A Sagrada Escritura testemunha a
condescendência divina que, para conhecermos a inefável benignidade de Deus, com quanta
acomodação Ele nos falou, tornando a sua linguagem tão semelhante à linguagem humana que, no
Verbo eterno, se assemelhou aos homens, tomando a carne da fraqueza humana (cf. Dei Verbum, 13).
A educação cristã, como a pedagogia da palavra de Deus, deve «não apenas transmitir
conteúdos a serem conhecidos, mas proporcionar um diálogo, um encontro entre pessoas»38
, a
comunhão, em intimidade, entre alguém e Jesus. Deve procurar, como o fez Jesus, estabelecer, entre
o humano e a Trindade, uma comunhão interpessoal, fazer a pessoa participação da vida de Deus (cf.
34
55
35
Cf. 58.
36
Cf. 59.
37
60.
38
61.
Dei Verbum, 2). Trata-se de torná-la discípula de Jesus, o que exige um empenho permanente: de
pensar como Ele, de julgar como Ele e de viver como Ele viveu (cf. Diretório Geral da Catequese, 53).
A Igreja procura fazer discípulos de Jesus «através do anúncio, do testemunho, do ensino, dos
sacramentos e da caridade»39
. Esta é a denominada «pedagogia dos sinais», na qual se entrecruzam
ações e palavras, ensino e experiência (cf. Diretório Geral da Catequese, 143). As verdades de fé são
primeiro mostradas e depois explicadas, revelando-se assim o significado vital do mistério que Deus
quis revelar; algo comum à pedagogia de Jesus: contou as parábolas e depois explicou o seu sentido
mais profundo. Todavia, a explicação do significado das verdades reveladas não fica indiferente à vida
do destinatário: «a educação da fé não se limita a narrar as ações e palavras divinas, antes ajuda a que
seja descoberta na vida e história de cada pessoa a ação salvífica de Deus»40
. Assim o diz o Diretório
Geral da Catequese (n.108): «o ministério da palavra, além de recordar a revelação das admiráveis
obras realizadas por Deus no passado… interpreta também, à luz desta revelação, a vida humana dos
nossos dias, os sinais dos tempos e as realidades deste mundo, uma vez que é nele que se atua o projeto
de Deus para a salvação da humanidade».
A Igreja é o sujeito promotor da catequese que, em fidelidade ao mandato do Senhor, foi
enviada a ser mestra da fé. Ela transmite a fé que ela mesma vive (cf. Dei Verbum, 8). A comunhão
com Deus acontece, assim, através da comunidade: «sem a comunidade de fé que acolhe cada crente,
seja em que nível for da sua caminhada, a educação da fé corre o risco de se esterilizar (cf. Diretório
Geral da Catequese, 69)»41
. Por seu turno, «a educação da fé, em virtude da sua própria natureza
eclesial, alimenta o vínculo da unidade, promove o sentido de pertença e favorece a comunhão
recíproca e a partilha de fé eclesial»42
.
Para a possibilidade do conhecimento da fé, do qual procede a identidade do cristão, o ser
humano tem de começar por aceitar e reconhecer as sua própria finitude: o facto de não ser o todo nem
a origem e medida de todas as coisas, de não ser o dono do ser (da existência). Só então o humano
pode partir para uma postura de abertura (a Outro superior) e confiança radical: a fé. Esta confiança
tem como primeira consequência a aceitação de ser (da razão da sua existência) a partir de outro, do
Outro. «O ser humano “percebe-se, assim, a braços com algo que o transcende, não só pela
inevitabilidade, mas também pela grandeza”. O centro não é o indivíduo, mas sim Deus»43
. Dá-se
assim uma experiência de transcendência, de abertura a um horizonte infinito, ao mistério absoluto.
39
63.
40
63.
41
64.
42
64.
43
66.
«Esta tomada de consciência e aceitação afeta o ser mais íntimo da pessoa, pois confiar não é mais
uma atitude, a acrescentar a outras, é a atitude por excelência que permite ser em plenitude, pelo que
afeta o ser, a identidade da pessoa. Esta transformação envolve a pessoa toda: vontade, razão e
afetividade»44
.
No cristianismo, esta experiência de transcendência realiza-se de modo excelente na
experiência pascal dos discípulos de Jesus de Nazaré (cf. Jo 21, 1-14). As consequências tornaram-se
visíveis: «de homens temerosos, passaram a valentes anunciadores desta experiência: “o Senhor
ressuscitou” (Lc 24, 34); “vimos o Senhor” (Jo 20, 25); “Ele está vivo para sempre” (Heb 7, 25)»45
.
Fruto da «meditação da Escritura, guiados pelos ensinamentos de Jesus durante o seu ministério e
iluminados por algum tipo de cristofania, reconheceram o Senhor»46
. «Sentiram-se amados e
corresponderam, sentiram-se chamados e responderam, ou seja, converteram-se e acreditaram com
todo o coração»47
. Desta experiência radical surgem as primeiras formulações doutrinais da mensagem
cristã e o anúncio missionário que, no decorrer dos tempos, permite a cada pessoa ter acesso a Jesus
Cristo e fazer a experiência da fé. Acreditar em Jesus Cristo, ter fé, implica conseguir abrir-se
livremente ao dom do Espírito Santo, entrar nesta corrente temporal e, de modo atual, fazer a mesma
experiência do Ressuscitado que fizeram os primeiros discípulos. «Implica fazer a experiência efetiva
do encontro com Ele, que marca e transforma a vida»48
. Essa transformação «manifesta-se sobretudo
na adoção de um estio de vida plasmada pelo estilo de vida de Jesus Cristo. […] Uma vez que o
essencial da vida de Jesus é ser para os outros, a doação e a entrega, a experiência cristã tem a sua
manifestação mais autêntica no serviço e no amor aos irmãos»49
.
A experiência de Deus integra, por tanto, duas dimensões : a mística, o encontro pessoal com
Deus, em Jesus Cristo, graças ao Espírito Santo; e a prática, a incarnação dos sentimentos, atitudes e
comportamentos de Jesus na sua própria vida como discípulo50
. Por isso, podemos dizer que «o ser
humano “não realiza ou tem experiência de Deus, mas é experiência de Deus”»51
.
Derivado disto, só podemos falar de educação da fé (ou catequese) como «uma ajuda, por via
dos processos educativos, a que o sujeito adquira condições para se deixar surpreender pelo mistério,
encontrar-se por Deus»52
. A educação da fé deve ser um estímulo, proporcionadora das condições para
44
67.
45
68.
46
68.
47
68.
48
69.
49
69.
50
Cf. 69.
51
70.
52
71.
que surja a oportunidade para o encontro individual e íntimo do sujeito com Deus: «o encontro com o
divino acontece no mais profundo do ser humano e chegar aí supõe “um cultivo adequado da razão
humana, um exercício efetivo da liberdade, o indispensável desenvolvimento de relações pessoais
autênticas”»53
. É a isso que podemos chamar ascese cristã (do grego ἄσκησις, áskesis, "exercício
espiritual", derivado de ἀσκέω, "exercitar"): a atitude do sujeito em «exercitar-se para aumentar a
disponibilidade para acolher a vontade de Deus quando esta se manifestar»54
. Considerar a catequese
como «um processo através do qual o educador transmite conteúdos, as atitudes e os valores educativos
ao educando»55
, tal como o faz o ensino escolar, é uma visão redutora.
Falamos no início desta exposição no conceito de cultura. O ser humano nasce sem instintos
suficientes e capazes de o fazer caminhar no mundo de modo autónomo. Isto fez com que
desenvolvesse mais do que a sua mera biologia: imaginou e experimentou sempre caminhos novos
para ultrapassar as dificuldades com que a realidade o confronta. Isto originou um conjunto de
conhecimentos e regras que são transmitidos de geração em geração. Tal permite ao humano posterior
não ter de fazer de novo todo o percurso já realizado pelos antepassados para obter os êxitos já
alcançados. Em vez disso ele pode usar esses êxitos como base para, a seu turno, os desenvolver e,
assim, evoluir. Este processo gera a cultura56
.
A primeira fase da catequese corresponde ao período em que se estrutura a conversão a Jesus
Cristo, oferecendo as bases para essa primeira adesão. Posteriormente, os catecúmenos «são iniciados
no mistério da salvação e num estilo de vida evangélico. Trata-se, de facto, de os iniciar na plenitude
da vida cristã» (Diretório Geral da Catequese, 63). Para isso, importa que a catequese, se numa primeira
fase passa por uma instrução, centrada na transmissão de saberes, consiga passar a ser uma verdadeira
iniciação à fé cristã, «que ponha os alicerces da vida em Cristo, colocando o catequizando em
comunhão e intimidade com Jesus Cristo (cf. Catechesi Tradendae, 5)»57
. Esta missão é confiada pela
Igreja aos catequistas. Eles devem seguir o exemplo de Jesus Cristo: dar a conhecer as diversas
dimensões do Reino, ensinar a rezar, incentivar para as atitudes evangélicas e enviar em missão (Cf.
Diretório Geral da Catequese, 84). Importa, pois, que a catequese seja vista como mais do que um
ensino: ela é «aprendizagem para toda a vida cristã, “uma iniciação cristã integral”» (Diretório Geral
53
71.
54
71.
55
70.
56
Cf. 72.
57
73.
da Catequese, 67). O objetivo que a Igreja tem para a catequese «é o de acompanhar o catecúmeno até
se tornar um adulto na fé»58
.
A iniciação cristã é uma preparação progressiva para celebrar e viver o Mistério de Deus, uma
espécie de caminho no qual os catecúmenos descobrem as realidades da fé e são introduzidos no Reino
que há-de vir. Assim, «O catecumenado é um tempo prolongado, durante o qual os candidatos recebem
formação cristã e se submetem a uma adequada disciplina» (Ritual da Iniciação Cristã de Adultos, 19)
em vista de atingirem uma fé adulta:
1 – Palavra de Deus: Levar «os candidatos a uma conveniente instrução sobre os dogmas e
preceitos, e a um conhecimento íntimo dos mistérios da salvação que desejam aplicar à sua vida»
(RICA, 19).
2 – Exercício diário da vida cristã: Habituarem-se «a orar a Deus com mais facilidade, a dar
testemunho da fé, a procurar Cristo em tudo, a seguir em seus atos a inspiração do alto, a entregarem-
se ao amor do próximo até à renúncia de si mesmos», «comungando já pela fé no mistério da morte e
ressurreição, passam do homem velho ao homem novo que em Cristo atinge a sua perfeição» (RICA,
19). Esta passagem implica progressiva mudança de mentalidade e de costumes e deve manifestar-se
com suas consequências sociais (cf. RICA, 19).
3 – Ritos Litúrgicos: «vão sendo desde já progressivamente purificados e ao mesmo tempo
sustentados pela graça divina» (RICA, 19). Pelo batismo «serão agregados ao povo sacerdotal e
deputados para tomarem parte no novo culto de Cristo» (RICA, 19).
4 – Vida apostólica: «devem também os catecúmenos aprender a cooperar ativamente na
evangelização e na edificação da Igreja pelo testemunho da vida e pela fé» (RICA, 19).
Segundo o Sínodo de 1997, a catequese é Palavra, Memória e Testemunho:
- Palavra, porque faz ressoar no mais íntimo do catecúmeno a Mensagem cristã, que é a pessoa
de Jesus Cristo.
- Memória, porque a ação e palavra eclesiais manifestam a ação de Deus e unem a Deus.
- Testemunho, porque, vendo a ação da comunidade que vive o hoje da sua fé e realiza a história
da salvação, cada pessoa aprende a ser cristão. Também integra na comunidade dos discípulos.
58
74.
A catequese «há-de levar a que a pessoa se entregue livre e totalmente a Deus (cf. DV 5; DGC
144), que se converta não só a sua inteligência, mas também a vontade e os sentimentos»59
.
Sintetizado60
:
Faculdades do
ser humano
Dimensão
preponderante
Tríplice
dimensão de
Cristo
Dei Verbum, 8
Ritual da
Iniciação Crista
de Adultos, 37
Sínodo 1977
Inteligência Ensino Profeta Doutrina
Meditação da
Palavra de Deus:
Evangelho
Palavra
Sentimentos
e emoções
Iniciação Sacerdote Culto
Liturgia:
Eucaristia
Memória
Vontade Educação Rei Vida
Vida cristã e
apostólica:
Caridade
Testemunho
A comunidade inicia e integra, com os sacramentos e sacramentais, o catecúmeno no Mistério
pascal, através de sucessivas etapas.
A comunidade educa o catecúmeno para que aprenda um saber-viver e saber-fazer
especificamente cristãos.
A comunidade ensina por via da transmissão de conhecimentos bíblicos, litúrgicos e doutrinais,
que permitam ao catecúmeno «compreender e assimilar a maneira de pensar e agir e acordo com a
Tradição cristã»61
, mais com o intuito de desenvolver a inteligência de fé do que a acumulação de
conhecimentos.
A inserção progressiva do catequizando no Mistério de Cristo e na comunidade eclesial
visibiliza-se nos sacramentos de iniciação cristã em que, por meio da fé, ele é introduzido numa nova
condição de vida, incorporado em Cristo, participa da vida trinitária e é inserido na Igreja62
. Neste
caminho o catequizando «responde progressivamente a Deus que se revela, por meio da “obediência
da fé” (cf. Rm 16, 26), pela qual se entrega livremente a Deus, dando uma livre resposta positiva à
verdade revelada»63
. «Pela catequese que precede, acompanha e sucede à celebração dos sacramentos,
59
78-79.
60
Cf. 79.
61
80.
62
Cf. 82.
63
83.
o catequizando descobre o dom de Deus, progride no conhecimento dos mistérios da salvação, dá o
assentimento da fé a Deus e inicia a aprendizagem da vida cristã, ajudado pela comunidade»64
.
As características da catequese de iniciação cristã são65
:
1 – Formação orgânica: aberta a todas as componentes da vida cristã: conhecer, celebrar, viver,
orar;
2 – É iniciação integral: não só ensina conhecimentos, não só educa num estilo de vida (saber-
ser/saber-fazer); O catecúmeno sente-se chamado ao seguimento de Cristo numa adesão global:
entrega-se confiadamente de todo o coração a Ele e esforça-se por melhor O conhecer.
3 - Centrada no essencial da fé, no núcleo da experiência cristã: coloca os alicerces do ser
cristão (as certezas profundas da fé e os valores evangélicos) que se hão-de desenvolver posteriormente
no seio da comunidade.
A catequese deve favorecer o conhecimento do Mistério de Cristo e a adesão a Ele. «O
aprofundamento no conhecimento da fé ilumina cristãmente a existência humana, alimenta a vida de
fé, e também capacita para testemunhar ao mundo as razões da fé» (Diretório Geral da Catequese, 85).
Também «favorece o conhecimento dos significados litúrgicos e sacramentais, os sinais e a dimensão
comunitária da celebração»66
; introduz os catecúmenos num caminho de conversão interior,
transmitindo aos catecúmenos as atitudes próprias do Mestre (cf. Diretório Geral da Catequese, 85);
«leva os cristãos a assumirem a dimensão orante de Jesus, rezando com os mesmos sentimentos que
Ele rezava ao Pai: confiança, adoração, louvor, súplica, agradecimento e contemplação da Sua
glória»67
; e educa para a vida comunitária e para o espírito missionário.
64
84.
65
Cf. 86-87.
66
87.
67
87.

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Práticas catequéticas

  • 1. Universidade Católica Portuguesa – Faculdade de Teologia Braga, 2020 Unidade: Modelos e Práticas Catequéticas – Ano Pastoral | 1º Doutoramento Aluno: João Miguel Pereira Síntese de Luís Figueiredo Rodrigues, O digital no serviço da fé: formar para uma oportunidade (Lisboa: Universidade Católica Portuguesa, 2016), 27-87. O ser humano insere-se num contexto de comunicação com os humanos que vivem na atualidade e também com os que viveram em épocas anteriores, acolhendo, transmitindo, destruindo e criando novas tradições por meio da linguagem, da escrita e de outros documentos e objetivações do espírito humano1 . A linguagem é, em simultâneo, meio de transmissão cultural e elemento constitutivo da tradição, que lhe permite superar o tempo, dando assim «resposta cultural a duas limitações do ser humano: a finitude e a necessidade de não se começar sempre do início, mas de assumir e acolher as descobertas precedentes para, sobre elas, construir e elaborar novas conquistas»2 . O indivíduo consegue, com os processos de transmissão, algo que o transcende no espaço e no tempo, acolhendo o que lhe é entregue, fazendo-o seu, para, por seu turno, na medida em que o acolhe, o transmitir3 . No ato de o fazer seu, existe uma atitude crítica do sujeito, «pois a assimilação pessoal é sempre interpretação. Esta resulta da interação daquilo que é transmitido, ou ensinado, com as experiências pessoais»4 , havendo assim, ao mesmo tempo, continuidade e inovação. No caso da tradição como fenómeno teológico, ela «tem a sua origem no próprio querigma e é a forma própria da mediação querigmática em virtude da qual a Igreja se fundamenta e percebe a sua missão essencial»5 . «Como em qualquer tradição há que distinguir o conteúdo que é transmitido, o processo de transmitir e receber, e os sujeitos da tradição»6 . «Em relação à Escritura, “a reinterpretação constante é expressão da verdade de que o Senhor está vivo e está diretamente presente em cada época e nela quer ser novamente testemunhado. Destarte, a Bíblia transmite não somente os conteúdos da tradição, mas também os modelos da sua interpretação”. É por isso que ela se configura como norma suprema da fé»7 . A revelação não se confina em nenhuma forma de testemunho. É a Escritura quem estabelece e inspira a tradição 1 Cf. 27. 2 28. 3 Cf. 28. 4 28-29. 5 29. 6 29. 7 30.
  • 2. subsequente e portanto pode ser designada como regra da fé em relação às instâncias testemunhais subordinadas. É-lhe subordinada «a tradição de fé da Igreja: a tradição interpretativa e explicativa, em virtude da promessa da presença constante de Cristo na sua Igreja (cf. Mt 28, 20) e da permanente assistência do Espírito Santo que promete à Igreja a indefetibilidade»8 . Existem critérios que permitem avaliar a pertença ou não à tradição de fé da Igreja e o verdadeiro sentido da formulação doutrinal: 1- Pertença: «avalia-se a vinculação à fé da Igreja quer na história quer na atualidade»9 ; 2- Hermenêuticos: «para avaliar o sentido verdadeiro, o peso do conteúdo e a importância de cada tradição, importa ter presente: a pesquisa histórica, a importância salvífica (cf. DV 8, 11), a hierarquia das verdades (cf. UR 11) e, por último, o seu discernimento à luz dos sinais dos tempos (cf. GS 4, 11)»10 . O conteúdo da tradição é a revelação que Deus faz de si mesmo, já a forma é o testemunho de fé dos apóstolos e das comunidades. Eles devem tendencialmente corresponder-se mutuamente, isto é, «a forma vai-se aperfeiçoando, na medida em que o conteúdo dá respostas sempre novas às interpelações dos “sinais dos tempos” (cf GS 4)»11 . «A palavra de Deus continua a sua incarnação em diversos documentos ou “corpos” da fé – Sagrada Escritura, doutrina, liturgia, vida da igreja e sentir dos crentes –, mas não se esgota em nenhum deles, nem na soma de todos: ela é de carácter escatológico. Este facto dá lugar, por um lado, à multiplicidade de testemunhos, mas também a formas de testemunho, a expressões sempre novas. Deste modo, “a fé testemunhal não alcança a sua identidade e o seu conteúdo com a sua mera repetição, mas reproduzindo-se como mediação do acesso à confidência com o Senhor que, mediante o seguimento deste e através do Espírito, instrui e edifica o discípulo”»12 . O sujeito que crê responde à iniciativa divina mas não o faz de modo isolado. Fá-lo em contexto eclesial, no qual a «fé da Igreja precede, gera, suporta e nutre a nossa fé» (CCE 181). A Igreja é mediação de Cristo e, por isso, caminho para chegar a Deus. A instituição eclesial emerge da própria dinâmica de transmissão da fé como condição de possibilidade da mesma. A Igreja pertence ao destino histórico da encarnação e missão de Cristo, ela faz parte da Revelação. Por isso, «a cada pessoa é possível crer, ter fé, na medida em que participa, seja de que modo for, na fé da Igreja; quando há uma 8 30. 9 31. 10 31. 11 31. 12 32.
  • 3. certa identificação entre o sujeito crente e a Igreja»13 . A Igreja «não transmite apenas verdades isoladas, mas sobretudo a comunicação da possibilidade, oferecida por Deus, de cada ser humano entrar em diálogo amoroso com Deus Trindade, através do acolhimento da Revelação»14 . Todavia, a Igreja, «porque subsiste na história e é formada por seres humanos, está sujeita às contradições próprias da história, o que origina falhas na vivência e testemunho da fé. A fé e a sua verdade só se podem verificar pela permanente referência ao dado revelado, à história da salvação que tem o seu ápice em Jesus Cristo»15 . A verdade da fé é aprimorada pelo sentido da fé dos fiéis, pelo ensinamento e condução do magistério e pelo trabalho dos teólogos que pela articulação da fé, Igreja e ciência, acolhem as questões que se levantam no seio eclesial e lhe devolvem o resultado do trabalho teológico16 . Por fim, o tempo é o fator indispensável na interpretação que se faz de cada expressão da fé, só o que é conforme à verdade da Revelação poderá prevalecer17 . Para o crente acreditar em Deus, concorrem o testemunho que Deus dá de si mesmo e a referência da fé que não se vê nem se toca pelos sentidos, mas que chega através do outro, pelo testemunho, «onde a credibilidade deste – pessoal – e os motivos de credibilidade daquilo que testemunha – conteúdo – são postos à prova pelo recetor»18 . Entende-se o ato de acreditar como adesão a alguém e também a consideração de que ago é verdade. No caso da fé cristã isto expressa-se em dois termos: «a fé em que se crê [,isto é, que] designa o conteúdo da fé, compendiado nos símbolos da fé e proposições dogmáticas […] a fé com que se crê [que] é o conjunto de ações do sujeito através das quais se decide a crer e a manter-se nesse estado de fé»19 . A fé cristã é a resposta pessoal à revelação pessoal que Deus faz de si mesmo. Não pode excluir o recetor, reduzindo-se apenas ao lado divino. No ato de crer intervém a inteligência (o conhecimento sobre Deus e o julgamento de que tal é verdadeiro) e também a vontade (a vontade de livremente decidir crer, diante do bem que lhe é apresentado)20 . No ato de crer intervém fortemente o testemunho do outro. O testemunho é tanto mais forte quanto maior o compromisso vital existente entre aquele que testemunha e aquilo que testemunha, isto é, Aquele sobre quem dá testemunho: «a pessoa que testemunha compromete-se por inteiro com o seu depoimento; a sua palavra é autoempenhativa, o ser e o dizer coincidem»21 . O testemunho passa da 13 33. 14 34. 15 35. 16 Cf. 36-37 17 Cf. 38. 18 39. 19 40. 20 Cf. 42-43. 21 44-45.
  • 4. palavra à ação e pode chegar ao sacrifício da vida22 . Mas, «para além do testemunho humano, está a ação de Deus que suscita interiormente o crer, pelo que o motivo último é sempre Deus»23 . Só Deus pode dar à sua Palavra a garantia absoluta da sua credibilidade. O testemunho por excelência é Cristo, «Aquele em quem o dizer e o agir coincidem na transparência do Seu ser»24 . «Os nossos contemporâneos solicitam aos cristãos “não só que lhes ´falem` de Cristo, mas também que de certa forma lh`O façam ´ver`”»25 pela acomodação da própria vida a Jesus Cristo. Na Igreja estão presentes os acontecimentos fundantes da fé, a Morte e Ressurreição do Senhor, e todo o crente, pela ação do Espírito Santo, é de certo modo participante neles, ao participar na cadeia ininterrupta de testemunhas que forma a Igreja e os seus sacramentos26 . A educação cristã é uma «iniciação ordenada à revelação que Deus, em Jesus Cristo, fez à humanidade e que permanece na memória da Igreja e nas Sagradas Escrituras»27 . «Não podemos falar de revelação com toda a propriedade, se a automanifestação de Deus em e pela história não for captada pelo homem»28 . A educação cristã deve fomentar «a entrega confiada do homem a Deus e a homenagem do entendimento e da vontade, conversão e conhecimento, experiência vital e verdade revelada»29 . Todavia, só se pode falar verdadeiramente de revelação quando, fruto disso, o humano acolhe livremente o dom que Deus lhe oferece. A fé é por isso personalista mas não individualista. A realidade eclesial e comunitária não são excluídas mas são as mediações através das quais a relação com Deus se pode estabelecer30 . A instituição é local de interpelação ao sujeito e à sua resposta, ele, diante dela, vê a possibilidade de exercício da sua própria liberdade31 . «O indivíduo torna-se crente porque na sua individualidade emergiu uma experiência do divino que o surpreende, a instituição favorece, promove e ajuda a perceber esta Novidade»32 . A transmissão da fé ou catequese, que o autor exprime como «educação da fé», é «o exercício humano e divino de entrega do dom da revelação divina, conservada na Igreja e transmitida mediante uma tradição viva e ativa, a cada ser humano»33 e «tem por finalidade conseguir que, sob a ação do 22 Cf. 45. 23 44. 24 46. 25 47. 26 48. 27 49. 28 49. 29 49. 30 Cf. 51-52. 31 Cf. 52. 32 54. 33 55
  • 5. Espírito Santo, a revelação seja significativa para cada pessoa. A sua função consiste em fazer ressoar a palavra de Deus, viva e significante, de modo que toque a experiência do crente e a ilumine»34 . Para fazer catequese, a Igreja deve servir-se da «pedagogia divina», a mesma utilizada por Deus para se revelar, que está patente de modo mais eminente nos evangelhos. É preciso que as técnicas da educação em geral, quando aplicadas na catequese, estejam ao serviço da consciência de que «não se trata simplesmente de transmitir um saber humano, por mais elevado que se considere; trata-se de comunicar na sua integridade a Revelação de Deus» (Catechesi Tradendae, 58). A formação cristã há- de ter como modelo a educação dada pelos pais aos filhos, neste caso pelo Pai Deus e pela Mãe Igreja (cf. João Paulo II). Ela há-de ser gradual (CCE, 53), condescendente (CCE, 684), operada a partir de símbolos35 . Ela há-de seguir o modelo operado por Jesus Cristo que se apresentou aos discípulos como «único Mestre e, ao mesmo tempo, amigo paciente e fiel, estimulando-os com oportunas perguntas, explicou-lhes de maneira aprofundada aquilo que anunciava à multidão, introduziu-os na oração […] enviou o Espírito de seu Pai, para que os guiasse à verdade na sua totalidade, e os amparou nos inevitáveis momentos difíceis» (Diretório Geral da Catequese 1997, 137). Na história da Revelação, Deus não quer só dar-Se a conhecer, mas também convidar o ser humano à comunhão com Ele36 . «A pedagogia divina trata, sobretudo, de “comunicar a Revelação de Deus na sua integridade e trata de inserir o novo crente na história salvífica que Deus teceu na história do seu povo de Israel e agora tece através da vida da Igreja”»37 . Ela só alcança o objetivo quando favorece o diálogo salvífico entre Deus e o ser humano. Na pedagogia divina está patente a condescendência de Deus que se adequa à realidade humana, para estar ao alcance do humano e dialogar com ele. A Sagrada Escritura testemunha a condescendência divina que, para conhecermos a inefável benignidade de Deus, com quanta acomodação Ele nos falou, tornando a sua linguagem tão semelhante à linguagem humana que, no Verbo eterno, se assemelhou aos homens, tomando a carne da fraqueza humana (cf. Dei Verbum, 13). A educação cristã, como a pedagogia da palavra de Deus, deve «não apenas transmitir conteúdos a serem conhecidos, mas proporcionar um diálogo, um encontro entre pessoas»38 , a comunhão, em intimidade, entre alguém e Jesus. Deve procurar, como o fez Jesus, estabelecer, entre o humano e a Trindade, uma comunhão interpessoal, fazer a pessoa participação da vida de Deus (cf. 34 55 35 Cf. 58. 36 Cf. 59. 37 60. 38 61.
  • 6. Dei Verbum, 2). Trata-se de torná-la discípula de Jesus, o que exige um empenho permanente: de pensar como Ele, de julgar como Ele e de viver como Ele viveu (cf. Diretório Geral da Catequese, 53). A Igreja procura fazer discípulos de Jesus «através do anúncio, do testemunho, do ensino, dos sacramentos e da caridade»39 . Esta é a denominada «pedagogia dos sinais», na qual se entrecruzam ações e palavras, ensino e experiência (cf. Diretório Geral da Catequese, 143). As verdades de fé são primeiro mostradas e depois explicadas, revelando-se assim o significado vital do mistério que Deus quis revelar; algo comum à pedagogia de Jesus: contou as parábolas e depois explicou o seu sentido mais profundo. Todavia, a explicação do significado das verdades reveladas não fica indiferente à vida do destinatário: «a educação da fé não se limita a narrar as ações e palavras divinas, antes ajuda a que seja descoberta na vida e história de cada pessoa a ação salvífica de Deus»40 . Assim o diz o Diretório Geral da Catequese (n.108): «o ministério da palavra, além de recordar a revelação das admiráveis obras realizadas por Deus no passado… interpreta também, à luz desta revelação, a vida humana dos nossos dias, os sinais dos tempos e as realidades deste mundo, uma vez que é nele que se atua o projeto de Deus para a salvação da humanidade». A Igreja é o sujeito promotor da catequese que, em fidelidade ao mandato do Senhor, foi enviada a ser mestra da fé. Ela transmite a fé que ela mesma vive (cf. Dei Verbum, 8). A comunhão com Deus acontece, assim, através da comunidade: «sem a comunidade de fé que acolhe cada crente, seja em que nível for da sua caminhada, a educação da fé corre o risco de se esterilizar (cf. Diretório Geral da Catequese, 69)»41 . Por seu turno, «a educação da fé, em virtude da sua própria natureza eclesial, alimenta o vínculo da unidade, promove o sentido de pertença e favorece a comunhão recíproca e a partilha de fé eclesial»42 . Para a possibilidade do conhecimento da fé, do qual procede a identidade do cristão, o ser humano tem de começar por aceitar e reconhecer as sua própria finitude: o facto de não ser o todo nem a origem e medida de todas as coisas, de não ser o dono do ser (da existência). Só então o humano pode partir para uma postura de abertura (a Outro superior) e confiança radical: a fé. Esta confiança tem como primeira consequência a aceitação de ser (da razão da sua existência) a partir de outro, do Outro. «O ser humano “percebe-se, assim, a braços com algo que o transcende, não só pela inevitabilidade, mas também pela grandeza”. O centro não é o indivíduo, mas sim Deus»43 . Dá-se assim uma experiência de transcendência, de abertura a um horizonte infinito, ao mistério absoluto. 39 63. 40 63. 41 64. 42 64. 43 66.
  • 7. «Esta tomada de consciência e aceitação afeta o ser mais íntimo da pessoa, pois confiar não é mais uma atitude, a acrescentar a outras, é a atitude por excelência que permite ser em plenitude, pelo que afeta o ser, a identidade da pessoa. Esta transformação envolve a pessoa toda: vontade, razão e afetividade»44 . No cristianismo, esta experiência de transcendência realiza-se de modo excelente na experiência pascal dos discípulos de Jesus de Nazaré (cf. Jo 21, 1-14). As consequências tornaram-se visíveis: «de homens temerosos, passaram a valentes anunciadores desta experiência: “o Senhor ressuscitou” (Lc 24, 34); “vimos o Senhor” (Jo 20, 25); “Ele está vivo para sempre” (Heb 7, 25)»45 . Fruto da «meditação da Escritura, guiados pelos ensinamentos de Jesus durante o seu ministério e iluminados por algum tipo de cristofania, reconheceram o Senhor»46 . «Sentiram-se amados e corresponderam, sentiram-se chamados e responderam, ou seja, converteram-se e acreditaram com todo o coração»47 . Desta experiência radical surgem as primeiras formulações doutrinais da mensagem cristã e o anúncio missionário que, no decorrer dos tempos, permite a cada pessoa ter acesso a Jesus Cristo e fazer a experiência da fé. Acreditar em Jesus Cristo, ter fé, implica conseguir abrir-se livremente ao dom do Espírito Santo, entrar nesta corrente temporal e, de modo atual, fazer a mesma experiência do Ressuscitado que fizeram os primeiros discípulos. «Implica fazer a experiência efetiva do encontro com Ele, que marca e transforma a vida»48 . Essa transformação «manifesta-se sobretudo na adoção de um estio de vida plasmada pelo estilo de vida de Jesus Cristo. […] Uma vez que o essencial da vida de Jesus é ser para os outros, a doação e a entrega, a experiência cristã tem a sua manifestação mais autêntica no serviço e no amor aos irmãos»49 . A experiência de Deus integra, por tanto, duas dimensões : a mística, o encontro pessoal com Deus, em Jesus Cristo, graças ao Espírito Santo; e a prática, a incarnação dos sentimentos, atitudes e comportamentos de Jesus na sua própria vida como discípulo50 . Por isso, podemos dizer que «o ser humano “não realiza ou tem experiência de Deus, mas é experiência de Deus”»51 . Derivado disto, só podemos falar de educação da fé (ou catequese) como «uma ajuda, por via dos processos educativos, a que o sujeito adquira condições para se deixar surpreender pelo mistério, encontrar-se por Deus»52 . A educação da fé deve ser um estímulo, proporcionadora das condições para 44 67. 45 68. 46 68. 47 68. 48 69. 49 69. 50 Cf. 69. 51 70. 52 71.
  • 8. que surja a oportunidade para o encontro individual e íntimo do sujeito com Deus: «o encontro com o divino acontece no mais profundo do ser humano e chegar aí supõe “um cultivo adequado da razão humana, um exercício efetivo da liberdade, o indispensável desenvolvimento de relações pessoais autênticas”»53 . É a isso que podemos chamar ascese cristã (do grego ἄσκησις, áskesis, "exercício espiritual", derivado de ἀσκέω, "exercitar"): a atitude do sujeito em «exercitar-se para aumentar a disponibilidade para acolher a vontade de Deus quando esta se manifestar»54 . Considerar a catequese como «um processo através do qual o educador transmite conteúdos, as atitudes e os valores educativos ao educando»55 , tal como o faz o ensino escolar, é uma visão redutora. Falamos no início desta exposição no conceito de cultura. O ser humano nasce sem instintos suficientes e capazes de o fazer caminhar no mundo de modo autónomo. Isto fez com que desenvolvesse mais do que a sua mera biologia: imaginou e experimentou sempre caminhos novos para ultrapassar as dificuldades com que a realidade o confronta. Isto originou um conjunto de conhecimentos e regras que são transmitidos de geração em geração. Tal permite ao humano posterior não ter de fazer de novo todo o percurso já realizado pelos antepassados para obter os êxitos já alcançados. Em vez disso ele pode usar esses êxitos como base para, a seu turno, os desenvolver e, assim, evoluir. Este processo gera a cultura56 . A primeira fase da catequese corresponde ao período em que se estrutura a conversão a Jesus Cristo, oferecendo as bases para essa primeira adesão. Posteriormente, os catecúmenos «são iniciados no mistério da salvação e num estilo de vida evangélico. Trata-se, de facto, de os iniciar na plenitude da vida cristã» (Diretório Geral da Catequese, 63). Para isso, importa que a catequese, se numa primeira fase passa por uma instrução, centrada na transmissão de saberes, consiga passar a ser uma verdadeira iniciação à fé cristã, «que ponha os alicerces da vida em Cristo, colocando o catequizando em comunhão e intimidade com Jesus Cristo (cf. Catechesi Tradendae, 5)»57 . Esta missão é confiada pela Igreja aos catequistas. Eles devem seguir o exemplo de Jesus Cristo: dar a conhecer as diversas dimensões do Reino, ensinar a rezar, incentivar para as atitudes evangélicas e enviar em missão (Cf. Diretório Geral da Catequese, 84). Importa, pois, que a catequese seja vista como mais do que um ensino: ela é «aprendizagem para toda a vida cristã, “uma iniciação cristã integral”» (Diretório Geral 53 71. 54 71. 55 70. 56 Cf. 72. 57 73.
  • 9. da Catequese, 67). O objetivo que a Igreja tem para a catequese «é o de acompanhar o catecúmeno até se tornar um adulto na fé»58 . A iniciação cristã é uma preparação progressiva para celebrar e viver o Mistério de Deus, uma espécie de caminho no qual os catecúmenos descobrem as realidades da fé e são introduzidos no Reino que há-de vir. Assim, «O catecumenado é um tempo prolongado, durante o qual os candidatos recebem formação cristã e se submetem a uma adequada disciplina» (Ritual da Iniciação Cristã de Adultos, 19) em vista de atingirem uma fé adulta: 1 – Palavra de Deus: Levar «os candidatos a uma conveniente instrução sobre os dogmas e preceitos, e a um conhecimento íntimo dos mistérios da salvação que desejam aplicar à sua vida» (RICA, 19). 2 – Exercício diário da vida cristã: Habituarem-se «a orar a Deus com mais facilidade, a dar testemunho da fé, a procurar Cristo em tudo, a seguir em seus atos a inspiração do alto, a entregarem- se ao amor do próximo até à renúncia de si mesmos», «comungando já pela fé no mistério da morte e ressurreição, passam do homem velho ao homem novo que em Cristo atinge a sua perfeição» (RICA, 19). Esta passagem implica progressiva mudança de mentalidade e de costumes e deve manifestar-se com suas consequências sociais (cf. RICA, 19). 3 – Ritos Litúrgicos: «vão sendo desde já progressivamente purificados e ao mesmo tempo sustentados pela graça divina» (RICA, 19). Pelo batismo «serão agregados ao povo sacerdotal e deputados para tomarem parte no novo culto de Cristo» (RICA, 19). 4 – Vida apostólica: «devem também os catecúmenos aprender a cooperar ativamente na evangelização e na edificação da Igreja pelo testemunho da vida e pela fé» (RICA, 19). Segundo o Sínodo de 1997, a catequese é Palavra, Memória e Testemunho: - Palavra, porque faz ressoar no mais íntimo do catecúmeno a Mensagem cristã, que é a pessoa de Jesus Cristo. - Memória, porque a ação e palavra eclesiais manifestam a ação de Deus e unem a Deus. - Testemunho, porque, vendo a ação da comunidade que vive o hoje da sua fé e realiza a história da salvação, cada pessoa aprende a ser cristão. Também integra na comunidade dos discípulos. 58 74.
  • 10. A catequese «há-de levar a que a pessoa se entregue livre e totalmente a Deus (cf. DV 5; DGC 144), que se converta não só a sua inteligência, mas também a vontade e os sentimentos»59 . Sintetizado60 : Faculdades do ser humano Dimensão preponderante Tríplice dimensão de Cristo Dei Verbum, 8 Ritual da Iniciação Crista de Adultos, 37 Sínodo 1977 Inteligência Ensino Profeta Doutrina Meditação da Palavra de Deus: Evangelho Palavra Sentimentos e emoções Iniciação Sacerdote Culto Liturgia: Eucaristia Memória Vontade Educação Rei Vida Vida cristã e apostólica: Caridade Testemunho A comunidade inicia e integra, com os sacramentos e sacramentais, o catecúmeno no Mistério pascal, através de sucessivas etapas. A comunidade educa o catecúmeno para que aprenda um saber-viver e saber-fazer especificamente cristãos. A comunidade ensina por via da transmissão de conhecimentos bíblicos, litúrgicos e doutrinais, que permitam ao catecúmeno «compreender e assimilar a maneira de pensar e agir e acordo com a Tradição cristã»61 , mais com o intuito de desenvolver a inteligência de fé do que a acumulação de conhecimentos. A inserção progressiva do catequizando no Mistério de Cristo e na comunidade eclesial visibiliza-se nos sacramentos de iniciação cristã em que, por meio da fé, ele é introduzido numa nova condição de vida, incorporado em Cristo, participa da vida trinitária e é inserido na Igreja62 . Neste caminho o catequizando «responde progressivamente a Deus que se revela, por meio da “obediência da fé” (cf. Rm 16, 26), pela qual se entrega livremente a Deus, dando uma livre resposta positiva à verdade revelada»63 . «Pela catequese que precede, acompanha e sucede à celebração dos sacramentos, 59 78-79. 60 Cf. 79. 61 80. 62 Cf. 82. 63 83.
  • 11. o catequizando descobre o dom de Deus, progride no conhecimento dos mistérios da salvação, dá o assentimento da fé a Deus e inicia a aprendizagem da vida cristã, ajudado pela comunidade»64 . As características da catequese de iniciação cristã são65 : 1 – Formação orgânica: aberta a todas as componentes da vida cristã: conhecer, celebrar, viver, orar; 2 – É iniciação integral: não só ensina conhecimentos, não só educa num estilo de vida (saber- ser/saber-fazer); O catecúmeno sente-se chamado ao seguimento de Cristo numa adesão global: entrega-se confiadamente de todo o coração a Ele e esforça-se por melhor O conhecer. 3 - Centrada no essencial da fé, no núcleo da experiência cristã: coloca os alicerces do ser cristão (as certezas profundas da fé e os valores evangélicos) que se hão-de desenvolver posteriormente no seio da comunidade. A catequese deve favorecer o conhecimento do Mistério de Cristo e a adesão a Ele. «O aprofundamento no conhecimento da fé ilumina cristãmente a existência humana, alimenta a vida de fé, e também capacita para testemunhar ao mundo as razões da fé» (Diretório Geral da Catequese, 85). Também «favorece o conhecimento dos significados litúrgicos e sacramentais, os sinais e a dimensão comunitária da celebração»66 ; introduz os catecúmenos num caminho de conversão interior, transmitindo aos catecúmenos as atitudes próprias do Mestre (cf. Diretório Geral da Catequese, 85); «leva os cristãos a assumirem a dimensão orante de Jesus, rezando com os mesmos sentimentos que Ele rezava ao Pai: confiança, adoração, louvor, súplica, agradecimento e contemplação da Sua glória»67 ; e educa para a vida comunitária e para o espírito missionário. 64 84. 65 Cf. 86-87. 66 87. 67 87.