VICENTE, Dafiana do Socorro S. Imagem, livro didático e escolarização de jovens e adultos: interfaces de um problema pedagógico. João Pessoa, 2011. TCC.
Relatório do Primeiro Bimestre - Março/Abril 2012.
Semelhante a VICENTE, Dafiana do Socorro S. Imagem, livro didático e escolarização de jovens e adultos: interfaces de um problema pedagógico. João Pessoa, 2011. TCC.
Semelhante a VICENTE, Dafiana do Socorro S. Imagem, livro didático e escolarização de jovens e adultos: interfaces de um problema pedagógico. João Pessoa, 2011. TCC. (20)
VICENTE, Dafiana do Socorro S. Imagem, livro didático e escolarização de jovens e adultos: interfaces de um problema pedagógico. João Pessoa, 2011. TCC.
1. 1
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE EDUCAÇÃO
CURSO DE PEDAGOGIA
LABORATÓRIO DE ESTÁGIO SUPERVISIONADO
IMAGEM, LIVRO DIDÁTICO E ESCOLARIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS:
INTERFACES DE UM PROBLEMA PEDAGÓGICO
Dafiana do Socorro Soares Vicente
JOÃO PESSOA – PB
Novembro de 2011
2. 2
Dafiana do Socorro Soares Vicente
IMAGEM, LIVRO DIDÁTICO E ESCOLARIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS:
INTERFACES DE UM PROBLEMA PEDAGÓGICO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
à Disciplina de Estágio Supervisionado, como
requisito parcial para obtenção de título de
Licenciatura em Pedagogia pela UFPB.
Orientador: Prof. Dr. Erenildo João Carlos
JOÃO PESSOA – PB
Novembro de 2011
3. 3
Dafiana do Socorro Soares Vicente
IMAGEM, LIVRO DIDÁTICO E ESCOLARIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS:
INTERFACES DE UM PROBLEMA PEDAGÓGICO
Comissão examinadora:
_______________________________________
Orientador - Prof. Dr. Erenildo João Carlos
_______________________________________
1º Examinador - Profª. Laura Maria de Farias Brito
________________________________________
2º Examinador – Prof. Dr. José Ramos Barbosa da Silva
João Pessoa/ PB, 09 de dezembro de 2011
4. 4
V632i Vicente, Dafiana do Socorro Soares.
Imagem, livro didático e escolarização de jovens e adultos:
interfaces de um problema pedagógico / Dafiana do Socorro Soares
Vicente. – João Pessoa: UFPB, 2011.
82f. ; il.
Orientador: Erenildo João Carlos
Monografia (graduação em Pedagogia) – UFPB/CE
1. Imagem. 2. Livro didático. 3. Educação de jovens e adultos.
I. Título.
UFPB/CE/BS CDU: 374.7(043.2)
5. 5
DEDICATÓRIA
Aos estudantes do Curso de Pedagogia, que despertaram sua curiosidade pelo mundo
da imagem na educação;
Aos sujeitos da EJA, que aspiram à efetividade do seu direito à escolarização;
Aos educadores de jovens e adultos, que militam cotidianamente pela construção de
uma escola de qualidade;
Aos gestores das escolas públicas, comprometidos com a criação de condições
necessárias ao desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem responsável;
Enfim, aos alfabetizadores de EJA, que estão aprendendo a empregar a imagem a
partir de uma pedagogia crítica da visualidade.
6. 6
AGRADECIMENTOS
À Pessoa de Deus
Por Seu amor e cuidado. Por todos os momentos difíceis em que me fortaleceu, para
que hoje pudesse compreender que Ele me tratou e me trata, não conforme as minhas
iniqüidades, mas conforme a sua graça e misericórdia. Obrigada Senhor.
Aos Professores Dr. Edson Carvalho Guedes, Dra. Fabíola Barrocas Tavares,
Meus sinceros agradecimentos, pelas contribuições que conferiram a minha formação
acadêmica, pessoal e profissional.
De modo especial, meus agradecimentos ao Prof. Dr. Erenildo João Carlos que,
com apoio, presteza e dedicação, contribuiu relevantemente para a feitura deste Trabalho de
Conclusão de Curso e de minha formação.
Ao Funcionário Marcelo do Centro de Educação/UFPB,
pela disponibilidade e dedicação prestada na resolução de problemas, contribuindo na
efetividade das aulas.
À Colega de classe Camila Laís Gomes de Lima,
pela espontaneidade, amizade, alegria e pela troca de informações cotidianas.
Aos Familiares,
Aos meus pais, Sebastião Vicente e Odete Lenir Soares Vicente que, mediante o amor
e carinho, me concederam maturidade para lutar pelos meus ideais.
As minhas irmãs, Dáfia, Dilma e Doralice, pela certeza de que, sempre que precisasse,
estariam dispostas a me ajudar.
Aos Amigos,
aqueles que me apoiaram nesse percurso, aconselhando em cada fase, fazendo-se presente em
todos os momentos.
Agradecimento especial ao meu amado e companheiro, Erenildo João Carlos que,
com seu amor, me proporcionou momentos inesquecíveis, felicidade e aprendizagem,
encorajando-me e incentivando-me sempre que possível.
7. 7
EPÍGRAFE
Para introduzir o aluno na leitura de imagens dos livros
didáticos, é importante, inicialmente, separar a ilustração
do texto, isolando-a, para iniciar uma observação
impressionista, sem interferência inicial da interpretação
dos professores ou das legendas escritas. Trata-se de um
momento em que o observador fará uma leitura geral da
ilustração, deixando fluir as relações que estabelece entre
o que está vendo e as outras imagens.
Circe Bittencourt (2008, p. 86-87)
8. 8
RESUMO
Antes do surgimento da escrita, a imagem era um meio de comunicação, que contribuía para
expressar as relações sociais, a cultura e a ideologia da época. Com o “desenvolvimento” da
civilização, a imagem perdeu seu caráter natural, o que levou à configuração de um novo
sistema de símbolos, desde o ideograma até o surgimento do alfabeto, que acarretou o
rompimento com as comunicações de natureza imagética. Todavia, o advento da pós-
modernidade e o avanço da cultura midiática estabeleceram um novo conceito de sociedade,
marcado pelo simbólico e pela proliferação da imagem. Devido à abrangência do tema
imagem, nos vários campos do conhecimento, delimitamos a nossa análise em torno das
imagens contidas nos livros didáticos da EJA, com o objetivo de compreender como as
imagens articulam, sistematizam e organizam o conhecimento, destinado à EJA. No campo
epistemológico, o livro didático aparece com algumas restrições, pois considera o texto-
escrito e desconsidera o texto-imagem como mediação do conhecimento. Observa-se,
todavia, que há um investimento considerável das editoras na ilustração dos livros didáticos
da Educação Infantil, do Ensino Fundamental, do Ensino Médio, assim como nos da
Educação de Jovens e Adultos. Tendo em vista o exposto, organizamos o texto em três eixos:
no primeiro, refletimos sobre o livro; no segundo, discutimos sobre o Livro didático no
Brasil: especificidades, importância e estado da Arte; no terceiro, trataremos sobre a imagem
no livro didático; no quarto, serão abordados o surgimento e o desenvolvimento do livro
didático na Educação de Jovens e Adultos, tendo em vista dialogar sobre o uso das imagens e
suas implicações na construção do conhecimento escolar.
Palavras-chaves: Imagem. Livro didático. Educação de jovens e adultos.
9. 9
LISTA DE IMAGENS
Imagem 1. Primeiro suporte (pedra) e primeira escrita (petróglifos).................................. 16
Imagem 2. Suporte: pedra; escrita: hieróglifos egípcios......................................................... 18
Imagem 3. Suporte: tabuinhas de argila. Escrita cuneiforme da Suméria.......................... 19
Imagem 4. Suporte: Papiro com trechos de Platão. Escrita: grego...................................... 19
Imagem 5. Suporte: papel. A produção do papel chinês...................................................... 21
Imagem 6. Material didático utilizado na CEA (1956) ....................................................... 30
Imagem 7. Material didático utilizado na CEA (1960)........................................................ 30
Imagem 8. Material Radiocartilha Sirena (1960)................................................................. 32
Imagem 9. Livros didáticos produzidos pelo MEB (1962).................................................. 33
Imagem 10. Livros didáticos produzidos pelo MEB (1963)................................................ 33
Imagem 11. Materiais didáticos produzidos pelo CPC (1962)............................................ 34
Imagem 12. Materiais didáticos produzidos pelo CPC (1962)............................................ 34
Imagem 13. Caderno da EJA Cultura e Trabalho ......................................................... 54
Imagem 14. Caderno da EJA Cultura e Trabalho ......................................................... 54
Imagem 15. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 54
Imagem 16. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 55
Imagem 17. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 52
Imagem 18. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 55
Imagem 19. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 55
Imagem 20. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 56
Imagem 21. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 57
Imagem 22. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 57
Imagem 23. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 58
Imagem 24. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 58
Imagem 25. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 58
Imagem 26. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 55
Imagem 27. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 59
Imagem 28. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 59
Imagem 29. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 60
Imagem 30. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 60
Imagem 31. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 60
10. 10
Imagem 32. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 61
Imagem 33. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 61
Imagem 34. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 62
Imagem 35. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 62
Imagem 36. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 62
Imagem 37. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 62
Imagem 38. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 63
Imagem 39. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 63
Imagem 40. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 64
Imagem 41. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 64
Imagem 42. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 65
Imagem 43. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 65
Imagem 44. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 65
Imagem 45. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 66
Imagem 46. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 66
Imagem 47. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 67
Imagem 48. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 67
Imagem 49. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 68
Imagem 50. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 68
Imagem 51. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 68
Imagem 52. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 68
Imagem 53. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 68
Imagem 54. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 68
Imagem 55. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 69
Imagem 56. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 69
Imagem 57. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 69
Imagem 58. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 70
Imagem 59. Caderno da EJA Cultura e Trabalho.......................................................... 70
11. 11
LISTA DE TABELAS E GRÁFICOS
Tabela 1. Estrutura da Coleção Cadernos da EJA................................................................ 51
Tabela 2. Gêneros imagéticos impressos na Coleção Cadernos da EJA.............................. 53
Tabela 3. Caderno cultura e trabalho – imagem, conteúdo e atividade............................ 54
Gráfico 1. Quantidade de imagens e seu uso................................................................... 71
Gráfico 2. Número de alunos matriculados........................................................................ 73
Tabela 4. Fala dos alunos em torno das imagens do Caderno Cultura e Trabalho.............. 73
12. 12
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CEA – Campanha de Educação de Adultos
CEAA - Campanha de Educação de Adultos Analfabetos
CEPLAR – Campanha de Educação Popular da Paraíba
CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
CNLD - Comissão Nacional do Livro Didático
COEJA - Coordenação de Educação de Jovens e Adultos
COLTED - Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático
CPC - Centro Popular de Cultura da União dos Estudantes
DOPS – Departamento de Ordem Política e Social
EJA – Educação de Jovens e Adultos
FAE - Fundação de Assistência ao Estudante
FENAME - Fundação Nacional do Material Escolar
FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
FNEP - Fundo Nacional do Ensino Primário
INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa
INL - Instituto Nacional do Livro
LDBEN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MCP - Movimento de Cultura Popular de Recife
MEB – Movimento de Cultura Popular
MEC – Ministério da Educação e Cultura
MNCA - Mobilização Nacional Contra o Analfabetismo
ONG – Organizações não governamentais
PLINDEF - Programa do Livro Didático para o Ensino Fundamental
PNLD – Programa Nacional do Livro Didático
SEA - Serviço Educação de Adultos
SIRENA - Sistema Rádio Educativo Nacional
UFPE – Universidade Federal de Pernambuco
USAID - Agência Norte-americana para o Desenvolvimento Internacional
13. 13
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...................................................................................................... 13
CAPÍTULO I: DA ESCRITA AO LIVRO DIDÁTICO.................................... 15
1. A trajetória do livro................................................................................... 16
2. A produção do livro no Brasil e sua especificidade ................................... 22
3. O livro didático na educação de jovens e adultos ...................................... 28
CAPÍTULO II: A PROLIFERAÇÃO DA IMAGEM NA SOCIEDADE DA
ESCRITA ............................................................................................................... 37
1. Um pouco de história sobre o uso social da imagem ................................. 38
2. O impacto da imagem na formação da consciência .................................. 41
3. O papel do educador na formação da criticidade ..................................... 46
CAPITULO III: A IMAGEM NO LIVRO DIDÁTICO DA EDUCAÇÃO
DE JOVENS E ADULTOS ............................................................................... 49
1. Sobre a Coleção Cadernos de EJA .......................................................... 50
2. O uso das imagens do Caderno de EJA “Cultura e Trabalho” na Escola
Municipal David Trindade .......................................................................... 72
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 76
REFERÊNCIAS ................................................................................................... 78
ANEXOS A ............................................................................................................ 81
ANEXOS B ........................................................................................................... 82
ANEXOS C ............................................................................................................ 82
14. 14
INTRODUÇÃO
O presente trabalho de conclusão do Curso de Licenciatura em Pedagogia da UFPB
articula-se com o projeto PROLICEN 2008.1, intitulado “O uso de filmes como mediação da
prática docente: um exercício do fazer interdisciplinar entre os professores do Curso de
Pedagogia da UFPB”, coordenado pelo Prof. Dr. Erenildo João Carlos. O referido projeto
possibilitou que bolsistas/os e voluntários/as se apropriassem, de forma sistemática, de
conhecimentos relativos à IMAGEM1, em suas multifaces, e resultou na produção de artigos
pertinentes ao objeto, considerando as suas especificidades: imagem televisiva, fílmica,
fotográfica, videográfica, desenhos animados e charge.
Antes do surgimento do texto-escrito, a imagem era o meio de comunicação que se
destacava por expressar as relações estabelecidas na vida social, a cultura e a ideologia da
época. Com o “desenvolvimento” da civilização, a imagem perdeu seu caráter naturalista, o
que levou à configuração de um novo sistema de símbolos, desde o ideograma até o
surgimento do alfabeto, e ao rompimento com as comunicações de natureza imagética.
Todavia, com o advento da pós-modernidade e o avanço da cultura midiática,
estabeleceu-se um novo conceito de sociedade, marcado pelo simbólico, pela proliferação da
imagem. Esse fenômeno reflete as mudanças tecnológicas que a sociedade sofreu e das quais
tem desfrutado, supervalorizando o mundo imagético. Basta olharmos a nossa volta e
seremos tomados por uma diversidade de imagens, desde fotografia, outdoor, escultura,
televisão, computadores, charges, filmes, vídeos, desenhos, entre outras. Essa diversidade
tem encantado, seduzido e delineado um novo tipo de sujeito, formando identidades e
estabelecendo novas relações sociais, caracterizadas pela influência que a mensagem
imagética exerce no inconsciente das pessoas. A realidade, assim construída, acarreta uma
espécie de “hipnose” de nossa consciência crítica e nos torna manipuláveis e vítimas de uma
hegemonia social, que tem o fator econômico como princípio norteador das relações. Isso
denota o poder de comunicabilidade e persuasão que a imagem tem em sua essência, pelo
fato de ter, em sua configuração, uma intencionalidade e, como todo processo educativo é
intencional, a imagem passa por potencializar a apropriação do conhecimento.
Devido à abrangência do tema imagem, nos vários campos do conhecimento, tivemos
que delimitar a nossa análise e determinamos, como nosso objeto de investigação, as imagens
contidas nos livros didáticos da EJA, visando compreender como se articulam, sistematizam e
1
As imagens que constam no presente trabalho foram intituladas na lista de imagens pela autora do TCC, pelo
fato de não apresentarem titulação.
15. 15
organizam o conhecimento destinado à referida modalidade de ensino. No campo
epistemológico, o livro didático emerge com algumas restrições, por se limitar ao texto-
escrito, sem considerar o texto-imagem como mediação do conhecimento. Todavia, vale
salientar que as editoras, na contemporaneidade, têm investido consideravelmente na
ilustração dos livros didáticos, que estão encharcados de signos imagéticos, desde a Educação
Infantil, o Ensino Fundamental e o Ensino Médio, até os materiais didáticos destinados à
Educação de Jovens e Adultos. Diante dessa realidade e dos enfoques que ela suscita,
elaboramos o trabalho em tela dividido em três momentos: o primeiro capítulo trata da escrita
até o aparecimento do livro didático, considerando sua trajetória, sua produção,
especificidade e como manual didático para a educação de jovens e adultos. O segundo
capítulo2 discute sobre a proliferação da imagem na sociedade da escrita. Nesse momento, o
texto trata do uso social da imagem, o impacto que ela promove na formação da consciência
coletiva e o papel do educador como mediador no processo de ensino-aprendizagem e na
formação da consciência crítica, mediante o uso da imagem televisiva. Por fim, no terceiro
capítulo, trataremos do livro didático na educação de jovens e adultos. Para tanto,
apresentamos uma síntese da Coleção Cadernos de EJA, considerando sua historicidade e
intencionalidade. Posteriormente, descrevemos o relato de uma experiência realizada numa
escola Municipal do Município de João Pessoa com o uso da imagem do material analisado,
tendo em vista compreender se as imagens possibilitam a apropriação do conhecimento
escolar por parte dos alunos de EJA.
2
Todas as imagens que constam na capa e no início de cada capítulo foram produzidas pela autora deste
trabalho.
16. 16
CAPÍTULO I
DA ESCRITA AO LIVRO DIDÁTICO
1.1 A trajetória do livro
17. 17
Historicamente, a humanidade é marcada por processos de desenvolvimento
sociocultural. O homem, como um ser portador de racionalidade, ao longo de sua trajetória,
foi produzindo mecanismos de sobrevivência. Nos primórdios, o homo sapiens não se
conteve apenas com a descoberta do fogo, mas foi evoluindo até chegar à sociedade em que
estamos inseridos - sociedade pós-moderna. Nesse processo de desenvolvimento, devido à
necessidade de expressar e comunicar o pensamento, a escrita passou, ao longo da história,
por transformações.
Inicialmente, as pinturas e os desenhos foram as alternativas encontradas pelo homem
primitivo para registrar os acontecimentos de sua vida, sua cultura, seu modo de produção,
suas divindades, ou seja, as primeiras ideias sobre sua realidade concreta, registradas como
objetos simbólicos em pedras. Esse tipo de escrita foi denominado pelos arqueólogos de
3
petróglifos. As pinturas rupestres expressavam a cosmovisão que o homem primitivo
buscava trasmitir, apesar da carência de instrumentos mais sofisticados e de uma noção mais
complexa sobre a realidade. Surge, então, o primeiro meio de expressão permanente em
suportes4 (as pedras). Oliveira (1984, p. 17) destaca que é nesse momento em que “o homem
vê a necessidade de se criarem meios permanentes de expressão, com os quais possa falar
para o futuro”.
Imagem 1. Primeiro suporte (pedra) e primeira escrita (petróglifos)
Fonte: http://www.rupestreweb.info/toromuerto.html
Nas cavernas, Martis (1996) diz que o homem, ao utilizar as mãos, nas primeiras
tentativas de gravar a pedra, exercia um esforço de abstração e não trabalhava apenas com as
mãos, mas mentalmente. Os mais simples traços desenhados nas pedras expressavam o
3
Gravuras rupestres: pinturas e desenhos preservados nas cavernas e as imagens gravadas nas pedras. Oliveira
(1984) diz que os petróglifos seriam mensagens propiciatórias dirigidas às forças misteriosas reverenciadas pelo
grupo ou uma preleção endereçada às gerações futuras, demonstrando o desejo de materializar o pensamento
através de sinais acessíveis à compreensão da coletividade.
4
Instrumento capaz de imobilizar, fixar o pensamento, a linguagem articulada.
18. 18
pensamento humano. Esse episódio nos faz refletir sobre o conceito de escrita. O que é
escrita? O que é imagem? Se a escrita tem a função de registrar a linguagem e as ideias de um
determinado povo, podemos considerar a imagem como uma forma de escrita?
De acordo com a etimologia da palavra imagem, seu sentido é o mesmo, tanto no
grego, como no latim e no hebraico. No grego, a palavra “imagem” é encontrada de duas
maneiras: imagem, semelhança, forma, aparência) e forma, aparência externa,
vista e visão). O termo é também a raiz etimológica da palavra “ideia”, cujo conceito
foi desenvolvido por Platão, que originou o idealismo platônico, ou seja, a ideia da coisa, a
sua imagem como sendo a projeção da mente. No latim, vem no termo Imago (representação
visual de um objeto) e, no hebraico, Tslem (refere-se a algo similar, mas não idêntico, que
representa outra coisa). Então, se o significado da palavra “imagem” é a ideia de alguma
coisa, os registros nas cavernas são uma forma de escrita, são textos que podem ser
interpretados. Apesar da onipresença da escrita no cotidiano da sociedade atual, a imagem
esteve presente antes do surgimento da linguagem verbal.
Apesar do esforço humano para registrar os acontecimentos do cotidiano, os
petróglifos foram sofrendo modifiicações à medida que surgiam outras demandas na
sociedade. A partir de 5.000 aC., surgiram povoações que encontraram na agricultura o meio
de desenvolvimento urbano e agrícola. O povo sumério foi quem investiu nesse modelo
econômico. Além disso, a Suméria foi construida aos redores dos templos sagrados,
recebendo as marcas da religiosidade e propiciando o sustento dos cléricos. Essas
transformações societárias permitiram os registros da movimentação e do armazenamento dos
bens, a definição dos dias de trabalho dos trabalhadores e o registro do rol do rebanho nos
templos. Nessa nova realidade cultural, iniciaram-se os primeiros ensaios em direção à
escrita5.
O livro surge juntamente com a escrita. Como já foi destacado, antes da escrita, a
imagem foi o símbolo através do qual os seres humanos se comunicavam. Essas imagens-
símbolos evoluíram e se tornaram diversos sistemas de escrita6. Posteriormente, a escrita
aproximou-se da linguagem, chegou aos sinais fonéticos, depois passou pelo sistema silábico
e, por fim, chegou a escritas consonânticas, que se desenvolveram, inicialmente, no Oriente
Médio, para só então chegar ao alfabeto, na Fenícia, desde o Século XVI ou XV aC.
5
Oliveira (1984, p. 45) destaca que foi na Suméria onde a escrita nasceu. E mais, ali se desenvolveu,
transformando-se em admirável instrumento de trabalho.
6
Cuneiformes sumérios, depois, mesopotâmios, hieróglifos egípcios, creto-minoicos, hititas, caracteres chineses
e ideogramas. É no estágio dos ideogramas, em que as representações já não sugerem apenas objetos, mas
também ideias abstratas.
19. 19
Só no Século IX a.C., os gregos adotam o alfabeto da Fenícia, acrescentando-lhes as
vogais, e dispõem a escrita da esquerda para a direita. Foi a partir desse alfabeto que se
originaram o alfabeto latino e o moderno. Labarre (1981, p. 07-08) destaca em sua obra, “A
história do livro”, que “... o aparecimento do livro está ligado aos suportes da escrita e que o
mais antigo livro parece ser de pedra, desde as pictografias rupestres até as estelas e
inscrições do antigo Oriente e da Antiguidade Clássica”. Todavia, o autor, apesar de
reconhecer que essa técnica de registrar em pedras os acontecimentos das sociedades tem um
valor documental, não se configurava, ainda, como um livro, mas que a madeira foi o
primeiro suporte dos verdadeiros livros.
Imagem 2. Suporte: pedra; Escrita: hieróglifos egípcios
Fonte: http://movimentoculturalgaia.wordpress.com/page/2/
As palavras que deram origem e que designaram o termo livro vêm do grego, biblos, e
do latim, líber. Ambos, em seu sentido primário, denota a ideia de casca de árvores. Esse
mesmo entendimento e sentido são encontrados para designar livro em chinês, em que ele era
construído sob a forma de tabuinhas de madeira ou bambu. Isso sinaliza que, nos primórdios,
os povos que forjaram essas palavras demonstram que esses materiais (madeira, bambu)
foram os primeiros suportes para a confecção do livro. Além desses elementos, a ideia de
livro está vinculada a sua edição, ao desejo de difundi-lo e de conservá-lo, diferenciando-o
dos documentos de arquivo.
Mesmo com o avanço na confecção e produção do livro em diversos suportes7 ou
formas, Escolar (1977, p.09) diz que “o papiro, denominado de volume8, foi à forma do livro
7
Argila, usada na Mesopotâmia; os tecidos (principalmente a seda), os osso, as carapaças e o bronze entre os
chineses; em conchas, fragmentos de cerâmica, os óstraca, entre os povos semitas e gregos; folhas de palmeiras,
nas índias; alem desses, o tijolo, o marfim, a ardósia e metais diversos. (1981.p, 08)
20. 20
mais usada na Antiguidade Clássica por todos os povos, principalmente entre os gregos e os
romanos”, independentemente de outros formatos, como as tabuinhas cobertas de cera e o
código de pergaminho. Esse tipo de produção, tanto nos rolos de papiro quanto nas tabuinhas
de argila, configurou-se como o tipo de livro por mais de dois mil anos. Os conteúdos
veiculados nessas produções eram conjuros, poemas religiosos; normas jurídicas, tratados e
narrações históricas, atos administrativos e comerciais, rudimentares conhecimentos médicos,
agrícolas e astronômicos. Porém, esse epítome não adivinha exclusivamente dos povos
gregos, mas dos sumérios, acádios, hititas, assírios, romanos, entre outros.
Imagem 3. Suporte: tabuinhas de argila. Escrita cuneiforme da Suméria
Fonte: http://universodahistoria.blogspot.com/2010/07/escrita-cuneiforme.html
Imagem 4. Suporte: Papiro. Escrita: grego
Papiro com trechos de Platão
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Papirologia
No Século III aC., o pergaminho começou a ser usado na confecção dos livros9. Era
feito com pele curtida de animais. Labarre (1981, p. 10) descreve esse tipo de material como
8
Em seu livro „História do Livro em cinco mil palavras", Escolar (1977) afirma que o volumen era uma longa
tira enrolável, ou seja, um rolo de lâminas de papiro, presas umas as outras pelos lados, e onde largas colunas,
escritas em um único lado, equivaliam às atuais páginas.
9
Para Escolar (1977, p. 13), esse tipo de produção iniciou-se na cidade de Pérgamo, durante o imenso império
de Alexandre Magno. Nesse mesmo período, havia a famosa Biblioteca de Alexandria, onde eram depositadas e
ocorria a difusão comercial, desempenhando, assim, um papel capital na transmissão dos textos. Labarre (1981,
p.10) complementa, afirmando que “Pérgamo foi, sem dúvida, um importante centro de fabricação desse novo
21. 21
sendo, “simultaneamente, mais sólido e mais flexível que o papiro e permitia que se raspasse
e apagasse”. Todavia, apesar desse avanço, só no Século IV o papiro foi suplantado e deu
lugar ao pergaminho.
Quanto ao surgimento do papel, os chineses foram seus inventores, que passaram a
substituir o pergaminho, que se tornou o instrumento fundamental do desenvolvimento
humano. Apesar de ser descoberto na China, foi conquistado, primeiramente, pelos árabes,
que o introduziram no mundo islâmico. Seu acesso à Europa cristã só se deu nos últimos anos
da Idade Média. A resistência da Europa Cristã por esse novo material era devido a sua
fragilidade. Todavia, a sua criação gerou o desenvolvimento cultural, com a criação de
enormes bibliotecas, nos países mulçumanos.
Apesar da fragilidade apontada pelos gregos, o papel potencializou a proliferação de
textos, o que promoveu o avanço do ensino e da pesquisa, bem como um considerável
crescimento no campo da Medicina, da Teologia, da Astronomia, da Filosofia, da História, da
Geografia e de textos de caráter narrativo e poético. Além disso, fomentou a secularização da
cultura e o desenvolvimento das Universidades na Europa cristã. Essas mudanças
aconteceram porque o papel era um material de mais acesso e mais barato que o
pergaminho10. Como destaca Escolar (1977, p.20), a “generalização do papel provocou o
incremento do livro, passando a ser copiado agora pelos próprios estudantes universitários ou
por profissionais, o que deu lugar a um comércio de livro muito ativo”. O autor enfatiza que
o comércio de livros se expandiu com a criação da imprensa no Século XV, na cidade de
Mogúncia, graças à iniciativa de Gutemberg, que facilitou a reprodução e a divulgação do
livro e o libertou da cópia manuscrita. Em consonância com Escolar (1977), Walty at. al
(2006, p.19) enfatiza que o primeiro livro impresso data de 1436, fruto da invenção da
tipografia por Gutemberg, na Mongúcia. Intermediário entre os livros in-fólio e a forma que
conhecemos hoje, o incunábulo. Os incunábulos caracterizam-se, entre outras coisas, pela
letra irregular e imperfeita, pela ausência de paginação, assinatura e título. Não contém
margem, nem capítulos, nem sinais de pontuação. Nesta ocasião o livro impresso imita o
manuscrito, o qual, por longo tempo continuou sendo o mais valorizado no período.
material, que, em latim, chamava-se de pergamineum. Utilizavam-se peles de carneiro, bezerro, cabras, bode,
até mesmo de jumento ou antílopes, e submetiam-nas a uma preparação cujas modalidades pouco variavam até à
Idade Média”.
10
Mais detalhes sobre o aparecimento do papel ler: LABARRE, Albert. História do Livro. Trad. Maria
Armanda Torres e Abreu. São Paulo: Editora Cultrix. INL. 1981, p. 32.
22. 22
Imagem 5. Suporte: papel
A produção do papel chinês
Fonte: http://www.comofazerpapel.com.br/papelchina.html
No Brasil, o livro começa a ser produzido em 1808, quando D. João VI, príncipe
regente, chegou ao Rio de Janeiro, fugido da invasão napoleônica, e criou a primeira
imprensa brasileira. Todos os equipamentos foram oriundos de Portugal, da imprensa
Régia11, assim como o núcleo do acervo que, posteriormente, constituiu-se na Biblioteca
Nacional. Inicialmente, teve a impressão de documentos oficiais e publicação de alguns
ensaios e livros de moral. Contudo, segundo Lindoso (2004, p.56), a “impressão de livros só
veio a acontecer comercialmente bem mais tarde, e até o final do Século a maior parte dos
livros editados no Brasil era feita em Portugal ou em Paris”. Em todo o império, as Editoras
se concentravam no Rio de Janeiro, salvo algumas exceções, em São Paulo. Esses fatores
eram devidos às poucas condições econômicas e tecnológicas para a produção de livros.
Tanto o atraso tecnológico na produção de papel, no Brasil, quanto as tarifas alfandegárias
desestimulavam a fabricação local.
No Brasil, a produção de livros com autores locais ocorreu através do francês,
Garnier, que se tornou o mais importante editor brasileiro do Século XIX. O tino comercial
desse visionário o ajudava na escolha dos autores para a publicação de livros em sua editora.
José de Alencar e Machado de Assis foram os mais importantes autores que compuseram a
sua equipe. Das publicações editadas por Garnier, havia romances, poesias, mas também,
teve como destaque as edições de livros12 escolares. Foi o primeiro a investir em livros
11
Razzini (2005, p.100), ao tratar da Imprensa Régia, declara que, posteriormente, ela foi denominada de
Imprensa Nacional.
12
Garnier publicou para as escolas livros de gramática, aritmética e geometria, história natural, instrução moral
e cívica e dicionários.
23. 23
voltados para a educação. Todavia, foi Francisco Alves o primeiro editor brasileiro a fazer
dos livros escolares a base fundamental do seu negócio e tinha como política produzi-los com
preços baixos. A livraria de Francisco Alves foi fundada em 1854, na cidade do Rio de
Janeiro, e se expandiu por São Paulo, em 1894, e Belo Horizonte, em 191013. Em relação à
nacionalização do livro e seu desenvolvimento, no que tange às produções de manuais
didáticos no Brasil, tanto Hallewell (1982, p. 206-211) como Lindoso (2004, p.63)
estabelecem uma vinculação entre o desenvolvimento editorial no país com o avanço no
campo educacional:
Francisco manteve a linha de trabalho do tio, ampliando-a com a inclusão de
material didático para a escola primária e desenvolvendo a parte editorial.
Os livros didáticos proporcionam uma linha de vendas segura e permanente;
dão também ao editor nacional uma vantagem sobre os competidores
estrangeiros, cujos produtos jamais podem adaptar-se tão bem as condições
e aos currículos locais. Baptiste Garnier já tinha, por essa razão, começado,
a desenvolver a publicação de livros didáticos, mas Francisco Alves foi o
primeiro editor brasileiro a fazer disso o principal esteio de seu negócio.
(1982, p. 207)
As tendências que marcarão a edição brasileira nas décadas seguintes são: a
primeira e mais importante é a estreita relação entre o desenvolvimento da
indústria editorial e o crescimento da rede de escolas e do numero de
estudantes. (2004, p 63-64)
Com a pretensão de esboçar os aspectos relevantes da trajetória do livro no Brasil,
Razzini (2005, p. 100) assinala que, no Século XX, com a expansão da escola pública e os
novos modos de ler na escola, foram definidas demandas para a produção de livros didáticos.
Essas definições vão desde o texto-escrito até o texto-imagem.
1.2 A produção do livro no Brasil e sua especificidade
No Brasil, a educação tem sido alvo de inúmeras discussões e debates, que geraram
todo um ordenamento jurídico, visando a uma melhoria no processo de ensino-aprendizagem.
É nesse contexto em que o livro didático se apresenta como um fator crucial na área
educacional, uma vez que é utilizado pelas escolas brasileiras - públicas e privadas - tanto na
zona urbana quanto na zona rural, alcançando um considerável número de professores e
alunos.
13
Quanto a esse dado, consulte: HALLEWELL (1982); LINDOSO (2004); RAZZINI (2005); BITTENCOURT
(2008).
24. 24
Isso sinaliza que o livro didático está presente cotidianamente na sala de aula e se
constitui um dos elementos básicos no planejamento do trabalho docente. Sobre isso,
Bittencourt (2008, p. 28-29a) refere que o livro didático emerge, no cenário brasileiro, no
final do Século XVIII, para oferecer suporte na formação dos professores e assegurar-lhes o
domínio de um conteúdo básico a ser transmitido aos alunos. Já no Século XIX, predominou
no exercício da docência como principal instrumento de trabalho dos professores e alunos,
sendo depositário dos saberes provenientes das diferentes disciplinas escolares. É por seu
intermédio que são passados os conhecimentos e as técnicas consideradas fundamentais em
uma dada sociedade, os quais são vinculados com os valores, as ideologias, a cultura, a
economia e a política de uma determinada época. Quanto a isso, Bittencourt (2008, p72b)
concebe que o livro didático é um importante “portador de um sistema de valores, de uma
ideologia, de uma cultura”.
Quanto ao aspecto ideológico, alguns estudos, a partir de 1980, ganharam visibilidade
no âmbito nacional, através de Freitag e colaboradores (1993); Lourdes e Nosella (1981),
Bonazzi e Eco (1980) e Molina (1988), que analisaram as ideologias subjacentes nos livros
didáticos, evidenciando a presença nesses materiais de valores oriundos das classes
dominantes, contrapondo-se à realidade concreta da grande massa da sociedade brasileira - as
classes populares.
Além de mediador da proposta curricular oficial e dos aspectos ideológicos, o livro
didático tem um caráter pedagógico. Nesse sentido, ele é pensado e estruturado em torno da
apresentação não apenas dos conteúdos curriculares, mas também de um conjunto de
atividades objetivas, para fixação desses conteúdos, incluindo questionários, exercícios e
estratégias de trabalho e metodologias de ensino, visando poupar o professor do “exaustivo”
trabalho de planejar suas aulas.
Ao nos debruçarmos sobre um determinado livro didático, seja da Educação Infantil
ou do Ensino Fundamental, deparamo-nos com a sistematização dos conteúdos e das
atividades cronometradas. Para cada hora, há um conteúdo a ser passado e uma atividade a
ser realizada. Caso o professor não obedeça a esse direcionamento ofertado ou proposto pelo
livro didático, corre o risco de atrasar todo o conteúdo “necessário” e “fundamental” para os
alunos, comprometendo, desse modo, seu aprendizado. Portanto, os materiais didáticos não
trazem em seu arcabouço apenas os conteúdos das disciplinas, mas o modo como devem ser
ensinados. Com base nessa assertiva, Gatti (2005, p.386) reforça:
[...] pode-se afirmar que é possível examinar o núcleo constitutivo de uma
disciplina escolar nos livros didáticos que, no caso brasileiro, assumiram um
duplo papel: o de portador dos conteúdos disciplinares e o de organizadores
25. 25
das aulas. É perceptível o fato de que nos livros didáticos apresentam-se os
conteúdos disciplinares de formas explicitas. Assim, esses conteúdos, que
constantemente mudam, são sempre uma seleção daquilo que deve ser
trabalhado nas escolas. Esse caráter seletivo é extremamente importante na
compreensão dos livros didáticos.
Encerrando as tentativas de definir o que seja o livro didático, não poderíamos deixar
de enfocar o seu caráter mercadológico. O livro didático constitui-se como uma mercadoria,
um produto a ser ofertado pelas editoras e a ser comprado, seja pelo Estado, seja pelos pais
dos alunos. Antes de chegar às mãos dos professores e dos alunos, os materiais didáticos
passam por processos de industrialização e comercialização, obedecendo à lógica do
mercado14. Todo esse investimento é fruto do entendimento de que o livro didático é o
material referencial de professores, pais e alunos, que, apesar do preço apresentado pelas
editoras, consideram-no indispensável para os estudos. Em outras palavras, pensar no livro
didático, em principio, é considerar sua função no âmbito escolar, mas também as
interferências de diferentes agentes na sua elaboração, construção, circulação e consumo.
Devido à multiplicidade de sua forma e ao lugar que ocupa no ambiente escolar, o
livro didático vem sendo alvo de muitos olhares nos últimos anos15, desde um olhar
pedagógico, que avalia a qualidade e a correção gráfica; passando por um olhar político, que
formula e direciona os processos decisórios de seleção, distribuição e controle; e um
econômico, que determina normas e parâmetros para sua produção, comercialização e
circulação. Esses diversos olhares sobre o livro didático são resultados das primeiras
iniciativas desenvolvidas pelo Estado Novo como forma de controlar a elaboração e a
circulação dos materiais didáticos.
Quanto a isso, Freitag (1989, p.12) afirma, com propriedade, que “remontam a 1937
as primeiras iniciativas desenvolvidas pelo Estado Novo para assegurar a divulgação de obras
de interesse educacional e cultural, criando o Instituto Nacional do Livro (INL) em 1929,
órgão subordinado ao MEC”, visando dar maior legitimação aos livros didáticos nacionais e,
consequentemente, contribuindo para o aumento de sua produção. Competia, ainda, a essa
coordenação gerenciar todos os trabalhos relacionados ao livro didático, como planejar
atividades, estabelecer convênios com órgãos e instituições, a fim de assegurar a produção e a
14
Bittencourt (2008, p.63) afirma que as editoras, ao conquistarem o direito de fabricar e divulgar os livros
didáticos, cuidaram de transformá-los em uma mercadoria inserida na lógica capitalista e que, para efetivar a
transformação de um material didático em produto de maior consumo e simbólico da cultura escolar, editores
aproximaram-se do Estado, engendrando atuações conjuntas em sua forma de circulação. Estabeleceram-se
entre ambos tramas, por intermédio das quais o livro didático disseminou-se no cotidiano escolar,
transformando-se no principal instrumento do professor na transmissão do saber.
15
Sobre esses olhares, ver: GATTI, Décio Jr. In. Entre políticas de Estado e práticas escolares: uma historia
do livro didático no Brasil. STEPHANOU, Maria; bastos, Maria Helena Camara (Orgs). Histórias e
Memórias da Educação no Brasil Vol. III – Século XX. Petrópolis, RJ. Vozes, 2005.
26. 26
distribuição do livro didático. Esse momento foi um marco na história do livro didático no
Brasil, porque, como assinala Gatti (2005, p.382),
[...] até a década de 1920 os livros destinados ao Brasil eram de origem
estrangeira, advindos da Europa (França e Portugal). Eram editados no
exterior o que consequentemente nem todos os brasileiros tinham acesso
devido ao valor exorbitante, ficando nas mãos dos filhos da elite.
Posteriormente, segundo Freitag (1989, p12), o Ministério da Educação, em 1938,
instituiu a Comissão Nacional do Livro Didático (CNLD), por meio do Decreto-lei nº
1.006/38, de 30/12/1938, que traz, em seu Art. 2º, § 1º e § 2º, a primeira definição de livro
didático:
Art. 2º, § 1º - Compêndios são livros que exponham total ou parcialmente a
matéria das disciplinas constantes dos programas escolares; § 2º - Livros de
leitura de classe são os livros para leitura dos alunos em aula; tais livros
também são chamados de livros texto, livro-texto, compêndio escolar, livro
escolar, livro de classe, manual, livro didático.
Em virtude desse Decreto, a CNLD é composta por sete membros, indicados pela
presidência. A função da comissão16 era a de examinar e julgar o valor dos livros didáticos.
Na verdade, mais exerciam um controle político-ideológico do que avaliavam os livros
didáticos. Freitag (1989, p. 24), ao tratar da política do livro didático no Brasil, conclui que
“a criação da Comissão insere-se em um rol de medidas visando à reestruturação e o controle
ideológico de todo o sistema educacional brasileiro”. Afirma, ainda, que, naqueles anos,
foram criadas outras medidas que contribuíam para o reforço do aparato ideológico da
Comissão, como o ensino de moral e cívica, em todos os níveis, a expansão do ensino
profissionalizante para a classe operária, entre outras. O autor (idem, p.13) destaca que, no
artigo 20 do decreto em questão, são enumerados onze impedimentos à autorização do livro e
somente cinco dizem respeito a questões genuinamente didáticas.
Com o Decreto-lei nº 8.460, de 26/12/45, o Estado ratifica a legislação brasileira em
torno da produção e utilização do livro didático e coloca, nas mãos dos professores, a
16
Quanto à função da Comissão Nacional do Livro Didático o Decreto-Lei 1.006 de 30/12/1938, em seu Art. 10
institui: “compete a Comissão Nacional do Livro Didático: a) examinar os livros didáticos que forem
apresentados, e conferir julgamento favorável ou contrario a autorização de seu uso; b) estimular a produção e
orientar a importação dos livros didáticos; c) indicar os livros didáticos estrangeiros de notável valor, que
mereçam ser traduzidos e editados pelos poderes públicos, bem como sugerir-lhes a abertura de concurso para a
produção de determinadas espécies de livros didáticos de sensível necessidade e ainda não existente no país;
d)promover, periodicamente, a organização de exposições nacionais do livros didáticos, cujo o uso tenha sido
autorizado na forma dessa lei”.
27. 27
incumbência de escolher os livros a serem usados pelos alunos, conforme estabelecido no
Art. 5º.
[...] Os poderes públicos não poderão determinar a obrigatoriedade de
adoção de um só livro ou de certos e determinados livros para cada grau ou
ramo de ensino nem estabelecer preferência entre os livros didáticos de uso
autorizado, sendo livre aos professores de ensino primário, secundário,
normal e profissional a escolha de livros para uso dos alunos, uma vez que
constem da relação oficial das obras de uso autorizado.
Segundo Molina (1988, p.22), esse dispositivo ganha força a partir de 1985, quando
aumentou a ilusão de que os professores seriam realmente os detentores do poder no mercado
do livro didático, já que, segundo a autora, o governo, na Nova República, colocou como uma
de suas metas educacionais a autonomia do educador na escolha dos materiais didáticos que
seus alunos, da rede pública, receberiam gratuitamente do Estado.
Após esse marco inicial na história do livro didático, em 1966, o governo militar
concordou em assinar um acordo entre o MEC e a USAID (Agência Norte-americana para o
Desenvolvimento Internacional), que consentiu com a criação da COLTED17 (Comissão do
Livro Técnico e do Livro Didático), que passou a substituir a CNLD. Essa nova comissão
tinha a responsabilidade de coordenar as ações referentes à produção, à edição e à
universalização/democratização do livro didático, ou seja, sua distribuição a todos os alunos
da rede pública. Além disso, objetivava a criação de bibliotecas e a formação de educadores e
instrutores em todo o território nacional (1993, p. 14).
A Portaria nº 35, de 11/3/1970, do Ministério da Educação, implementou o sistema de
coedição de livros com as editoras nacionais, com recursos do Instituto Nacional do Livro
(INL) que, em 1971, passou a desenvolver o Programa do Livro Didático para o Ensino
Fundamental (PLINDEF) e assumiu as atribuições administrativas e de gerenciamento dos
recursos financeiros, até então sob a responsabilidade da COLTED. A contrapartida das
Unidades da Federação passou a ser necessária com o término do convênio entre o MEC e a
USAID, efetivando-se com a implementação do sistema de contribuição das unidades
federadas para o Fundo do Livro Didático18.
17
Lindoso (2004, p. 92-93), ao tratar sobre o livro didático Brasil, diz que “...a COLTED produzia cadernos e
outros materiais didáticos escolares e estava iniciando um programa de edições de dicionários, atlas e alguns
outros títulos com preços altamente subsidiários”, e que as suas ações “ ...envolviam uma consulta aos
professores dos livros disponíveis, seguindo de uma seleção por especialistas e da aquisição das quantidades
definidas de exemplares diretamente das editoras para distribuição nas escolas.” Segundo o autor, com a
implantação do programa, em 1969 foram distribuídos aproximadamente seis milhões de exemplares”.
18
Sobre isso, ver: BRASIL, Programas – Livro didático:histórico.http://www.fnde.gov.br/index.php/pnld-
histórico
28. 28
Com o Decreto nº 77.107, de 4/2/76, o Estado compra grande quantidade de livros
para distribuí-los com parte das escolas e das unidades federadas. Com a extinção do INL, a
Fundação Nacional do Material Escolar (FENAME) torna-se responsável pela execução do
programa do livro didático. Os recursos são advindos do Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação (FNDE) e das contrapartidas mínimas estabelecidas para
participação das Unidades da Federação19.
Além do conjunto de normas, durante a década de 1970, os livros impressos sofreram
alterações20 e ganharam uma roupagem mais didática, até então presente na atualidade. Essas
modificações e adaptações foram adequando-se ao processo de mudança sofrida na realidade
escolar brasileira, fruto do processo de democratização do ensino, o que permitiu o acesso de
outros sujeitos, oriundos das classes populares (da zona urbana ou rural), no ambiente
escolar. Essa realidade concreta deu uma nova configuração à escola e à sociedade brasileira,
expressando-se, desse modo, na lógica de produção dos livros escolares que, de manuais de
pouco acesso, passaram a livros didáticos, com centralidade tanto no âmbito escolar quanto
nos planos de governo.
Em 1983, é criada a Fundação de Assistência ao Estudante (FAE), com a finalidade
de examinar os problemas dos livros didáticos, com critérios de avaliação puramente
técnicos, analisando-se a durabilidade, a qualidade do papel, da encadernação, quantidade de
cores utilizadas, entre outros. Esses critérios parte dos pressupostos encontrados na
Resolução nº 113 de 31 de março de 1976, em que sete itens foram elencados para a análise
das obras didáticas na época, a saber: em primeiro lugar, a forma, incluindo os aspectos
editoriais, como título, índice, prefácio, glossário, bibliografia, identificação, e o
aperfeiçoamento físico, que envolve impressão, encadernação, marginação, ilustração, o tipo
de papel, espaçamento e linguagem. Em segundo lugar, os demais itens de análise referem-se
ao conteúdo informativo, à metodologia e ao planejamento pedagógico21.
19
Quanto aos aspectos históricos dos programas do livro didático ver: http://www.fnde.gov.br/index.php/pnld-
historico
20
Gatti (2005,p. 383) afirma que a partir de 1970 os livros didáticos produzidos no Brasil tiveram um avanço
considerável e urgente na elaboração e atualização dos mesmos, sendo os autores responsáveis pela divulgação
de suas obras; passaram a ter propostas didático-pedagógicas diferenciadas com forte teor cognitivista na
configuração das metodologias de ensino; passaram por um processo de modernização na estrutura física
(forma) do livro e também ocorreram mudanças no perfil dos autores, que de autores exclusivamente da
docência de faculdades e universidade passaram também a ter a presença de docentes de escolas destinadas às
classes médias e, preferencialmente, com experiência no magistério.
21
Esses itens estão elencados no texto de MOLINA, Olga. Quem engana quem? Professor X Livro didático.
Papiro. Campinas, SP. 1988, p. 28.
29. 29
A partir de 1997, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação22 (FNDE)
passou a ser responsável pela política de execução do PNLD, que é resultado de um processo
de formulações e reformulações, propostas por diferentes governos, diferentes políticas e
diferentes interesses. Tem como objetivo adquirir e distribuir, gratuitamente, livros didáticos
de qualidade das diversas áreas de alfabetização, Matemática, Língua Português, Ciências,
História, Geografia, Dicionários da língua portuguesa a todos os alunos matriculados na rede
pública.
1.3 O livro didático na educação de jovens e adultos
O tema Educação de Jovens e Adultos nos remete à ideia de regresso, volta ou
retorno. Por diversas razões, por se constituir uma modalidade de ensino composta por alunos
que estão retornando ao processo de escolarização, pelo fato de, em algum momento, no
percurso de sua trajetória, ter abandonado a Educação Básica sem tê-la concluído e agora
buscam retornar à sala de aula. Se, por um lado, há uma característica comum entre os alunos
da EJA (o retorno), por outro, eles são fortemente marcados por trajetórias individuais, que os
constituíram como sujeitos históricos e portadores de saberes acumulados. É nesse sentido
que o público da EJA se configura como sujeitos diversificados que devem ser pensadas, não
exclusivamente pelos professores, mas, sobretudo, nas formulações de políticas públicas,
dentre elas, as políticas para o livro didático destinado a essa modalidade de ensino.
Na década de 1940, aconteceram inúmeras iniciativas, tanto no campo das políticas,
como no campo pedagógico na Educação de Jovens e Adultos, a saber: a regulamentação no
Fundo Nacional do Ensino Primário (FNEP), em 1942, durante o Estado Novo; a criação do
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa (INEP), com o surgimento das primeiras obras
especificamente destinadas ao Ensino Supletivo; a Primeira Campanha de Educação de
Adultos Analfabetos (CEAA), através da qual tiveram início reflexões sobre a elaboração de
materiais didáticos voltados para adultos e a realização de eventos que oportunizaram
diálogos entre os agente da educação sobre temática: o 1º Congresso Nacional de Educação
de Jovens e Adultos (1947) e o Seminário Interamericano de Educação de Adultos (1949)23.
A Primeira Campanha de Educação de Adultos – CEA, em 1947, ocasionou na
atuação do setor público na produção e elaboração de materiais didáticos para essa
modalidade de ensino, tendo em vista o desenvolvimento das habilidades da escrita; das
22
A compra e distribuição das obras estão sob a responsabilidade do Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE).
23
Ver Beisiegel (2008))
30. 30
operações de matemática; noções de cidadania, saúde e higiene; Geografia e História. Foi
nesse cenário que a União formentou a articulação entre os governos estaduais e municipais e
arregimentou o apoio da sociedade civil organizada, envolvendo diferentes sujeitos nas
produções de recursos didáticos. De acordo com Beisiegel (2008, p. 16-33), o objetivo
primordial da CEA era estender a escolarização para a classe iletrada constituída por
adolescentes e adultos analfabetos, e tinha como pilares: o ajustamento social, as
possibilidades de melhores destinos para as massas marginalizadas, a elevação dos níveis
educacionais e culturais da coletividade, a integração dos desfavorecidos nas condições de
vida do mundo moderno e o progresso social econômico da nação.
Vale destacar que a produção de materiais didáticos, durante a Campanha de
Educação de Adultos, foi destinada ao setor de Orientação Pedagógica do Serviço de
Educação de Adultos – SEA. Segundo Beisiegel (2004, p.100), o SEA foi instalado como
serviço especial do Departamento Nacional de Educação, ainda no ano de 1947, que, nessa
ocasião, “... concluía a elaboração de cartilhas e textos de leituras e iniciava sua distribuição,
em larga escala, para todas as unidades do ensino já instaladas”.
Se a Primeira Campanha de Educação de Adultos – CAE - foi um marco histórico no
âmbito nacional da educação de jovens e adultos, também se configurou a primeira iniciativa
na elaboração e produção de materiais didáticos em larga escala, visando à distribuição em
todo o território nacional. A quantidade de publicações de materiais didáticos distribuídos
durante a CEA demonstra a dimensão do impacto da Campanha na produção didática.
Fávero (1986) e Beisiegel (2004, p. 104-105) assinalam que, até o final da década de
1950, os materiais produzidos pelo Serviço de Educação de Adultos – SEA - foram: Ler -
Primeiro Guia de Leitura24; Saber – 2ª livro de leitura25; Caderno de Aritmética26; Tirar Leite
com Ciência, Como Guardar Ovos; Lindaura vai fazer manteiga, O Grão de Ouro, Lindaura
vai fazer Requeijão, Guerra à Saúva, Terra Cansada, Uma das Melhores Frutas do Mundo27;
28
Cartilha de Saúde (Alfabeto da Saúde) ; Maranduba29; Tuberculose, Malária e Maria
Pernilongo30. Beisiegel (Idem) assinala que todas essas publicações “desenvolviam,
coerentemente, na prática, a orientação imprimida ao ensino supletivo pela direção central da
Campanha de Educação de Adultos”.
24
Essa foi à cartilha de alfabetização de maior destaque, durante a Campanha de Alfabetização de Adultos, que
chegando a atingir 10 edições, em 1958, num total de 4.450.000 exemplares.
25
500 mil exemplares.
26
300 mil exemplares em 1950.
27
100 mil exemplares cada um.
28
50 mil exemplares.
29
20 mil exemplares.
30
30 mil exemplares.
31. 31
Imagem 6. Material didático utilizado na CEA
Fonte: http://forumeja.org.br/df/files/saber.pdf
Imagem 7. Material didático utilizado na CEA
Fonte: http://forumeja.org.br/df/files/Lercompleta.pdf
Nota-se que as publicações empreendidas pela CEA visavam à alfabetização, ao
ensino da linguagem e de aritmética e a temas relativos à higiene, saúde e técnicas de
produção voltadas para o ensino nas zonas rurais. Segundo Beisiegel (2004), o conteúdo das
publicações – materiais didáticos básicos para a alfabetização - identificava-se como os do
ensino primário infantil.
Na década de 196031, novas perspectivas para a Educação Básica e para a Educação
de Adultos foram formuladas, no bojo do debate gestado durante o II Congresso de Educação
de Adultos, realizado em 1958, e das discussões sobre a elaboração da primeira LDBEN.
Após a promulgação da LDBEN, foi elaborado o PNE. Durante o Governo de Jânio Quadros,
emerge, no cenário nacional, o MEB, num convênio entre a CNBB e o MEC. Nessa mesma
31
No início de década de 60, os movimentos de caráter popular que emergiram no cenário nacional eram
compostos por intelectuais, políticos e estudantes, oriundos da esquerda marxista, vinculados a grupos liberais,
ou provenientes de movimentos católicos, que tinham como objetivo promover a participação política das
massas e com o processo de tomada de consciência em torno das problemáticas vigentes na sociedade
brasileira.
32. 32
ocasião, foi organizada a MNCA, que não chegou a ser implantada; ocorreram o Encontro
Nacional de Alfabetização e Cultura Popular (1963) e a criação da Comissão Nacional de
Alfabetização, com o Plano Nacional de Alfabetização (1964).
Nesse contexto, Baisiegel (2004) assinala que todas essas ações ocorreram devido à
conjuntura política do momento. Segundo o autor, o governo federal, gradativamente, foi
perdendo o controle e a liderança, no campo da educação de adultos, e a nova liderança que
emergia e se fortalecia era ocupada por novos agentes, em particular, dos movimentos de
cultura e educação popular, a saber: o Movimento de Cultura Popular de Recife - MCP; a
Campanha de Pé no Chão Também se Aprende a Ler de Natal, que chegou a produzir um
livro de leitura para a alfabetização; o Centro Popular de Cultura da União dos Estudantes –
CPC da UNE; o Movimento de Educação de Base da Igreja Católica – MEB; Campanha de
Educação Popular da Paraíba. Vale ressaltar que esses movimentos populares foram
marcados pela proposta32 teórico-metodológica de Freire, constituindo-se referencial para a
alfabetização de adultos.
A partir das propostas freireana, foram introduzidos, no campo da educação de
adultos, materiais didáticos que possibilitassem o letramento. Moura (2007, p. 24) assinala
que esse “... período foi extremamente fértil no campo de produções de livros didáticos
destinados à educação popular, à educação de adultos e à Alfabetização, graças à grande
efervescência no âmbito das instituições públicas e dos Movimentos de Cultura Popular”.
Nessa ocasião, Osmar Fávero foi um dos elaboradores na produção de materiais didáticos
para a EJA, utilizados no início da década de 60, nas escolas radiofônicas do Movimento de
Educação de Base – MEB, patrocinado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil –
CNBB, apoiado pelo MEC. Segundo Fávero (1982), o Sistema Rádio Educativo Nacional -
SIRENA - foi organizado com a presença de diversos profissionais das várias áreas do
conhecimento, como educação, saúde, agronomia e veterinária. O SIRENA produziu a
Radiocartilha33, que era utilizada nas escolas radiofônicas, principalmente no sistema - mãe
de Leopoldina, no âmbito da Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo, e em
alguns sistemas radiofônicos do MEB, aproximadamente até o final de 1962.
32
Segundo Moura (2005), as ideias e propostas de Freire fazem eco entre todos os que optaram por se dedicar às
tarefas de educação e alfabetização das classes populares, na perspectiva da leitura do mundo e da leitura da
palavra de forma em que seus sujeitos pudessem intervir conscientemente na estrutura social. Beisiegel (2008),
ao fazer referência ao modelo de educação proposto por Paulo Freire, destaca que seria uma educação fundada
na prática do diálogo, que estimulasse a participação do adulto analfabeto, visando à resolução de problemas,
desenvolvendo a capacidade de reflexão-crítica desses problemas, formando a consciência crítica e a
personalidade democrática, tendo em vista a emancipação dos sujeitos, tornando-os protagonistas de suas
histórias.
33
A Radiocartilha foi elaborada pelo Sistema Rádio Educativo Nacional – SIRENA, no final da década de 1950,
e se estendeu até o início dos anos 60.
33. 33
Figura 8. Radiocartilha utilizada pelo Sistema Rádio Educativo Nacional - SIRENA
Fonte:http://forumeja.org.br/df/files/radiocartilha_sirena.pdf.pdf
Moura (Idem) destaca alguns materiais didáticos produzidos nesse período, quais
sejam: em 1963, foram elaborados o primeiro e o segundo volumes dos livros de leitura para
adultos: “Saber para viver”; “Viver é lutar34”, “Saber para construir” e a Coleção
Mutirão35, produzidos pelo MEB, que objetivavam alfabetizar, para formar a consciência
crítica dos alunos. Nesse mesmo ano, a Campanha de Educação Popular da Paraíba -
CEPLAR - criou um livro de leitura para recém-alfabetizados, chamado de “Força e
trabalho”, que não chegou a ser impresso, e a Campanha “De pé no chão também se aprende
a ler”. Chegou a elaborar um livro de leitura, com o título da campanha.
Figura 9. Materiais didáticos produzidos pelo MEB
Fonte:http://forumeja.org.br/didaticos.meb
34
Em seu texto “Materiais didáticos na educação de jovens e adultos”, Fávero confirma a sua participação
enquanto responsável pela produção e edição do Conjunto didático “Viver é Lutar”. O livro-texto que denomina
esse conjunto, preparado para os recém-alfabetizados, foi publicado no final de 1963 e teve pequena parte de sua
edição apreendida pela polícia de Carlos Lacerda, então governador do estado da Guanabara, em fevereiro de
1964, às vésperas do golpe militar.
35 35
Essa coleção era composta por: Mutirão I (para alfabetização); Mutirão II (para os recém-alfabetizados), e
um encarte para o segundo livro: Mutirão para a saúde, financiado pelo Ministerio da Saúde. (Moura. 2005, p.
26)
34. 34
Figura 10. Materiais didáticos produzidos pelo MEB
Fonte:http://forumeja.org.br/didaticos.meb
Além desses, outros materiais didáticos foram produzidos pelo Centro Popular de
Cultura – CPC. Grande parte desse material foi destruída por um incêndio criminal da sede na
UNE em 1964. Os materiais eram conhecidos por trazerem em seu arcabouço conteúdos
vinculados à cultura popular, com a música, a poesia, peças de teatro, filmes e folhetos de
cordel. Os materiais são: cordel Bumba-meu-boi, de Capinam, representado pelo CPC/Bahia;
o Livro de leitura para adultos, do CPC/Goiás, e a cartilha Uma família operária, do
CPC/Belo Horizonte, além das poesias divulgadas no Violão de Rua.
Figura 11. Materiais didáticos produzidos pelo Centro Popular de Cultura
Fonte: http://forumeja.org.br/didaticos.cpc
35. 35
Figura 12. Materiais didáticos produzidos pelo Centro Popular de Cultura
Fonte: http://forumeja.org.br/didaticos.cpc
Já em 1990, o livro didático para a EJA surge com a coleção Viver, aprender36,
direcionada para o primeiro segmento do Ensino Fundamental. Essa coleção foi elaborada
pela Ação Educativa, sob a coordenação do MEC, que distribuiu, aproximadamente, seis
milhões de livros. Em 2004, a mesma coleção foi ampliada, com livros temáticos para o
segundo segmento do Ensino Fundamental. Ainda em 2004, o Instituto Paulo Freire chegou
a produzir livros para o primeiro segmento do Ensino Fundamental, destinado ao novo
Telecurso da Fundação Roberto Marinho.
Diversas organizações e instituições contribuíram para a produção de materiais
didáticos para a EJA. A ONG “Serviços de apoio à pesquisa em Educação” produziu os
paradidáticos Aluá (almanaque). Todavia, entre os paradidáticos destinados à EJA,
destacaram-se os livros do Projeto Integrar da Central Única dos Trabalhadores e a coleção
do Núcleo de Educação Popular do Centro de Educação da UFPE.
Entre 2001 e 2007, foi sendo elaborada a Coleção Cadernos de EJA37, adotada pelas
escolas municipais da cidade de João Pessoa/PB no período de 2009 a 2010. Essa coleção é
resultado da parceria entre a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade
e o Ministério da Educação (SECAD/MEC) e a Fundação Unitrabalho. Mediante um
convênio estabelecido com o FNDE, essas duas entidades têm produzido materiais didáticos
para o 1º e o 2° segmentos do ensino fundamental de jovens, adultos e idosos. A coleção tem
36
Vóvio (2001, p.125-135), ao tratar sobre esses materiais didáticos, diz que os livros se organizaram em torno
de módulos temáticos que articulam conteúdos com as áreas de Língua Portuguesa, Matemática e Estudos da
Sociedade e da Natureza. A coleção é composta por quatro livros, e cada um desses livros do aluno corresponde
a um guia dos educadores, que contém explicações quanto às opções temáticas adotadas no módulo, assim
como, orientações didáticas específicas para a modalidade EJA.
37
Esse material didático está disponível no Portal dos professores de EJA do MEC: http://www.eja.org.br
36. 36
como tema gerador “o trabalho” e é composta por 27 livros. Sobre essa coleção,
posteriormente, trataremos mais detalhadamente.
No que tange às primeiras pesquisas sobre a presença das imagens nos livros
didáticos, Freitag (1993, p.66) retrata a pessoa de Osman Lins como pioneiro (1976), ao
investigar sobre o uso da imagem no livro didático de português de 1º e 2º graus, que,
enfaticamente, retrata esse período como a era da “Disneylândia pedagógica”, diante da
redução da palavra em favor da imagem nos livros didáticos que, segundo ele, expressava um
“delírio iconográfico”.
Atualmente, no Brasil, estudiosos têm refletido sobre os aspectos iconográficos nos
livros didáticos. Bittencourt (2008, p. 74) traz uma discussão da Imagem nos livros de
História e afirma que, “no Brasil, embora não se possa encontrar pesquisa especialmente
dedicada à produção iconográfica na área de História, existem trabalhos que buscam analisar
como determinados segmentos sociais têm sido representados, especialmente os indígenas e a
população negra, nos diversos livros escolares”. Quanto à presença da imagem na
contemporaneidade, Carlos (1991, 1996a, 1996b 2006, 2008) parte do pressuposto de que a
imagem é um texto que precisa ser lido. Quanto a isso, assinala: ”Estabelecer uma relação
competente e crítica com o texto-imagem, aprender suas regras de funcionamento é, no
contexto, sociocultural midiático, imagético e sígnico dominante, tão significativo como a
aprendizagem da gramática, da sintaxe e da ortografia” (1996b, p.49). Suas reflexões têm se
voltado para o emprego da imagem nos livros de Língua Portuguesa, no uso da imagem na
Educação de Jovens e Adultos, o signo da imagem como instrumento potencializador de
novas aprendizagens e competências. Quanto ao uso pedagógico da imagem na EJA, Carlos
(1996b, p. 20) afirma que, em se “tratando da EJA, é preciso superar uma concepção
grafocêntrica: centrada no signo da escrita e no paradigma da língua.”
Esse entendimento demonstra que, na educação atual, a imagem tem grande valor na
prática educativa. Na era da globalização, ela vem sendo cada vez mais utilizada de forma
significativa e diversa. As imagens são importantes recursos para a comunicação de ideias e
de formação, devido a sua intencionalidade educacional carregada de significações. Ao se
referir à necessidade de ler imagens, mediante o desafio da educação na contemporaneidade,
os educadores devem trabalhar o saber na perspectiva de um mundo que está cada vez mais
visual. É nesse contexto em que o livro didático está inserido. Se, entre nossos antepassados,
o meio de escrita e comunicação era a imagem e, mesmo depois do predomínio da grafia nas
sociedades posteriores, nota-se que, na contemporaneidade, a imagem retorna com
intensidade e passa a ocupar todos os segmentos da sociedade, entre eles, as editoras.
37. 37
Apesar dessa ruptura embrionária, a imagem, no livro, passou a ter um caráter
ilustrativo, em que o leitor se limitava unicamente a ler o texto-escrito, sem ter a consciência
de que o texto-imagem deve ser lido, discutido e refletido. Essa perspectiva condiz com a
ideia de que a imagem em livros limita-se à estética e tem a função de apoiar o texto, sem que
seja usada como um recurso para a produção e articulação do conhecimento. Tal delimitação
na leitura do livro didático perde de vista o conceito de signo como produto cultural. É nessa
cultura, cada vez mais imagética, que os livros didáticos são pensados, elaborados,
sistematizados e organizados. Isso denota que, com o desenvolvimento econômico, cultural e
político, o livro didático foi ganhando novas nuances, com uma intensa valorização da
imagem em sua constituição.
Para finalizar, tomamos o pensamento de Freire (1997), quanto afirma: “a leitura do
mundo, precede a leitura da Palavra”. Ler o mundo, através da imagem, significa adentrar o
mundo da cultura e extrair a leitura e a interpretação dessas imagens, percebendo que elas
representam signos e cultura de consumo, numa sociedade cercada por suas representações.
38. 38
CAPITULO II
A PROLIFERAÇÃO DA IMAGEM NA SOCIEDADE DA ESCRITA
39. 39
A presença massiva dos meios de comunicação como mediadores sociais, na
contemporaneidade, tem alertado diversos estudiosos a refletirem sobre seus efeitos na
construção da consciência individual e coletiva das pessoas. Tais efeitos partem do
pressuposto de que o homem, por ser relacional, vive em processos de reciprocidade de
comunicação. Nessas relações, numa sociedade midiática, os sujeitos interlocutores
relacionam-se por meio de sistemas de signos e códigos. É nesse cenário que a escola tem o
desafio de contextualizar sua prática educativa, aceitando novas linguagens até então pouco
exploradas.
O presente capítulo38 não tem a pretensão de abordar todos os fatos que compõem a
influência da imagem na construção social, mas, modestamente, propõe-se a assinalar três
fatores pertinentes para se compreender a imagem e sua contribuição para a educação: a
historicidade da imagem, destacando seu uso social e cultural; o impacto da imagem na
formação da consciência, em que estabeleceremos a relação existente entre a imagem e o
cérebro, e o papel do educador na formação da consciência crítica do discente.
2.1 Um pouco de história sobre o uso social da imagem
Desde que nascemos, somos bombardeados por imagens que nos desafiam a aprender
a analisá-las sem que sejamos seduzidos por seu encanto. Antes de adentrar o universo verbal
e letrado, estamos presos ao sensorial. As imagens estão presentes no nosso campo visual
constantemente e basta uma rápida reflexão para observarmos: fotos, outdoors, jornais,
revistas, cinema e televisão. São imagens de textos, imagens sem textos, que pretendem
distrair, ilustrar, refletir e informar uma mensagem.
Estamos inseridos no mundo globalizado e, cada vez mais, é atribuído à imagem um
caráter de onipotência e onipresença, quer na constituição do sujeito, quer na constituição da
sociedade. No começo das civilizações, cada cultura apresentava imagem própria. Sobre isso,
Joly (1996, p. 17) leciona que, “[...] por toda parte do mundo, o homem deixou vestígios de
suas faculdades imaginativas desde os tempos mais remotos, do paleolítico à atualidade”.
Para Santaella (1983, p. 11), essas imagens se destinavam a comunicar mensagens, desde
pinturas nas paredes das cavernas até modelagem de barro que descrevesse a vida daquele
povo:
38
Este capítulo foi re-elaborado e publicado com o titulo “A imagem televisiva e o papel do educador na
formação da consciência critica do discente”, no livro CARLOS, Erenildo João Carlos (Org.). Por uma
pedagogia crítica da visualidade. João Pessoa: Editora Universitária da UFPB, 2010, p. 103-123.
40. 40
No entanto, em todos os tempos, grupos humanos constituídos sempre
recorreram a modos de expressões, de manifestações de sentido e de
comunicação sociais outros e diversos da linguagem verbal, desde os
desenhos nas grutas de Lascaux, os ritos de tribos primitivas, danças,
músicas, cerimônias e jogos, até as produções de arquitetura e de objetos,
além das formas de criação de linguagem que viemos a chamar de arte:
desenhos, pinturas, esculturas, poética, cenografia etc. [...] Em síntese,
existe uma linguagem verbal (escrita), mas existem, simultaneamente,
enormes variedades de outras linguagens que também se constituem em
sistemas sociais e históricos de comunicação do mundo.
Como se vê, desde a pré-história, a imagem faz parte de nossa convivência social. Por
outro lado, a aquisição da fala, do discurso e, posteriormente, da escrita se deu em épocas
bem mais recentes. Somos povoados por imagens que representam nossas fantasias, desejos,
vontades, alegrias, tristezas, recordações e aspirações. Essas expressões são reflexos e
produtos de toda a nossa historicidade, que está vinculada à imagem como representação
visual.
Em diversas civilizações - Egito, Grécia e Roma, por exemplo - as imagens eram
utilizadas para representar suas ideologias. No Egito, elas indicavam o poder soberano do
faraó e sua divindade inquestionável, como também apresentava uma sociedade dividida em
classes: a classe superior, constituída pelos nobres, escribas e sacerdotes, e as classes
inferiores, compostas pelos escravos e artesãos. Já na sociedade grega, as imagens
demonstravam um caráter antropocêntrico, preocupado com o realismo, em que se procurava
exaltar a beleza humana, destacando a perfeição de suas formas. Na Grécia, em suas diversas
manifestações, que vão desde as esculturas até a arquitetura, as imagens mostram uma cultura
de caráter antropocêntrico, individualista e racional. Quanto às imagens de Roma, que
estavam nas mãos dos poderosos da época, ressaltam a ideia de ostentação e poderio romano
e retratam não apenas uma sociedade dividida em castas, mas também o valor das guerras
como fator importante para a economia da sociedade.
No decorrer da história, as imagens foram mantidas nas mãos dos que detinham o
poder. Na Idade Média, época em que a Igreja detinha autoridade absoluta, as imagens
assumiam uma postura artística, porém associada a temas religiosos. Em suas pinturas, os
artistas da época dedicavam-se à representação humanizada de santos e de outras divindades
cristãs. Nesse mesmo período, as pinturas de murais e a produção de vitrais adquiriram
grande importância, o que atesta que também estavam ligadas à arquitetura. Sem dúvida, a
produção artística da imagem da Idade Média revela a preocupação religiosa do homem
medieval.
41. 41
Percorrendo a Idade Moderna, a mentalidade era a de construir um novo homem e
romper com a visão medieval da Idade Média. O renascimento marcou a arte numa nova
perspectiva. Inspirando-se na Antiguidade, os artistas desenvolveram imagens em que
procuravam alcançar equilíbrio e elegância, em substituição, respectivamente, à paixão da fé
medieval e ao espírito rude do Feudalismo.
Procurando captar a realidade do mundo físico, os pintores aperfeiçoaram as técnicas
da perspectiva. Ao lado dos temas religiosos, a imagem passou a explorar outros, como
mitologia e cenas do cotidiano. O corpo humano era demasiadamente exaltado em todas as
manifestações artísticas, devido à filosofia humanística vigente. Nssa época, de muita
importância artística, vários artistas se destacaram, entre eles: Leonardo da Vinci (A última
ceia, Monalisa e A virgem dos rochedos), Michelangelo (a Capela Sistina - no Vaticano,
Moisés, Pietà e David) e Ticiano (A fonte do amor e Vênus deitada).
Já na modernidade, a imagem, nas artes visuais, representava a ruptura com o
passado, a busca do novo homem, baseada na racionalidade, no período pós-moderno, nas
manifestações visuais que fazem parte da mídia. Na contemporaneidade, nos mais diversos
tipos de comunicação, a cultura midiática organiza-se com base no modelo de produção de
massa, organizando imagens com uma nova roupagem, não artística, mas tecnológica. De
fato, a imagem sempre esteve comprometida em reproduzir e criar novas culturas.
Para os povos, as imagens são criadas para atender a interesses específicos, em
tempos e lugares diferentes, na história da humanidade. Apesar de os signos imagéticos terem
surgido na antiguidade, Santaella (2007, p. 05) enfatiza que, na contemporaneidade, há
diversidade de signos, que têm crescido consideravelmente.
[...] Venho desenvolvendo a hipótese de que os signos estão crescendo no
mundo. Basta um retrospecto para darmos conta de que, desde o advento da
fotografia, então do cinema, desde a exploração da imprensa e das imagens,
seguindo pelo advento da revolução eletrônica, que trouxe consigo o rádio e
a televisão, então com todas as formas de gravação sonora, também com o
surgimento da holografia e hoje com a revolução digital que trouxe consigo
o hipertexto e a hipermídia, o mundo vem sendo crescentemente povoado
por novos signos.
Como educadores, precisamos, urgentemente, sentir “as dores do parto”, no sentido de
dar a luz à criticidade e à reflexão latente em cada indivíduo, que, quase que geralmente, está
adormecida e sufocada, devido ao dilúvio de mensagens de caráter persuasivo e
antipedagógico. Entretanto, como bons “parteiros”, os educadores devem ter consciência da
ameaça “visual” que seus alunos sofrem e, sobretudo, percorrer caminhos, ainda que sejam
42. 42
árduos, em busca de uma prática pedagógica que promova a formação crítica de seus
educandos, para evitar que se tornem marionetes nas mãos da mídia.
Assim, no que diz respeito à imagem midiática, especificamente a televisiva, urge que
se promova um alfabetismo visual, que tem a função de eliminar a ignorância sobre a leitura
das imagens midiáticas e capacitar o receptor a fazer uma análise reflexiva das comunicações
visuais na era da globalização. Embora a ênfase ainda esteja na linguagem verbal, na cultura
midiática, “ver” é fundamental, mas não significa apenas olhar uma determinada imagem sem
compreendê-la. Sobre isso, ressalta Carlos (2008, p. 22):
A imagem é uma espécie de signo que serve, dentre outras coisas, para
representar o mundo e mediar o contato entre o olho e o mundo. A
representação do mundo por meio da imagem significa, em certo sentido,
uma invenção que possibilita a substituição cognitiva do mundo pela
imagem.
Assim, enquanto no texto impresso os fatores visuais são considerados apenas apoio,
Dondis (2007, p. 17) lembra que ocorre o contrário no texto-imagem: “O visual predomina, o
verbal tem a função de acréscimo”. O autor ainda enfatiza que “[...] o alfabetismo visual
permite domínio sobre o modismo e controle de seus efeitos. Alfabetismo significa
participação e transforma todos os que alcançaram em observadores menos passivos. [...]
Alfabetismo visual significa uma inteligência visual”.
Nesse ponto, existem implicações importantes contra o analfabetismo visual.
Contudo, em concordância com o afirmado por Belloni (2001, p. 26), este artigo não tem a
intenção de tornar a leitura visual superior à leitura textual, mas considerar que a
alfabetização visual tem um caráter relevante diante do crescimento imagético na sociedade,
e como isso tem repercutido na formação da consciência do indivíduo. Esse autor afirma que
“não se trata de substituir a palavra pela imagem, ou a ciência pelo sentimento. Trata-se de
integrar essas duas linguagens até agora tão divergentes. Integrar essas duas instituições até
agora paralela: a escola e as mídias”.
2.2. O impacto da imagem na formação da consciência
Mesmo com o advento da imagem nos primórdios e as mutações sofridas no decorrer
da história, a imagem nunca obteve o destaque que está tendo na contemporaneidade. A
presença massiva dos meios de comunicação em nossas vidas tem exigido dos pedagogos
uma postura reflexiva e analítica sobre os conhecimentos, os valores e os conceitos que vêm
se proliferando na consciência dos alunos que, diariamente, são invadidos por mensagens que
43. 43
chegam sob diferentes apelos sensoriais - visuais, auditivos e emocionais - com ininterruptos
estímulos midiáticos que se apresentam na nossa percepção sensorial em fração de segundos,
sem pedir licença, e invadem nossa consciência, imprimindo-lhe sentimentos, valores,
emoções, sensações e reação, e nos persuadindo com ideologias, em cujas tramas de sua
manipulação vemo-nos passivos e que colocam em xeque nosso livre-arbítrio, que está cada
vez mais fragilizado e monopolizado.
Vale dizer que a percepção é um tema antigo de estudo, utilizada para explicar as
observações do homem. Pode ser entendida como um processo ativo de planejamento, assim
como de interpretação de dados sensórios através dos olhos. Perceber não se restringe a
detectar ou sentir, mas decifrar a sensação, as mensagens sensoriais: é escutar uma sirene
como sinal de alarme, ouvir fogos de artifício e reconhecer que algo está sendo comemorado
ou homenageado. A filosofia entende que a percepção nos fornece o conhecimento do mundo
que nos cerca. Estamos conscientes desse mundo por estarmos conscientes das suas
qualidades sensíveis: as cores, os sons, os cheiros, os sabores, as formas e a posição dos
objetos que nos rodeiam. Blackburn (1997, p. 293) entende que essa consciência é mediada
por canais de informações, tais como as células cromossensíveis dos olhos. O autor assinala,
ainda, que a percepção é o ato, efeito ou faculdade de perceber conscientemente, adquirindo
conhecimento pelos sentidos, que são mediadores perceptivos ou mecanismos
esquadrinhadores que sondam de dentro para fora e tiram as amostras do mundo exterior,
captando os estímulos que são processados pelo cérebro:
[...] a percepção nos fornece o conhecimento do mundo que nos rodeia.
Estamos conscientes desse mundo por estarmos conscientes das suas
qualidades sensíveis: as cores, os sons, os sabores, os cheiros, o calor que
sentimos e as formas e posição dos objetos que nos rodeiam. Essa
consciência efetua-se através de canais de informações altamente
complexos, tais como os três tipos de células cromossensíveis dos olhos
...dessas informações as funções cerebrais superiores permite-nos interpretar
a informação recebida.
Na Fenomenologia da Percepção (2007), Ponty refere que a sensação é o que nos dá
as qualidades exteriores e interiores, isto é, as qualidades dos objetos e os efeitos internos
dessas qualidades sobre nós. Por meio da sensação, vemos, ouvimos ou sentimos qualidades
puras e diretas; cores, sabores, textura, odores. Sentimos o doce e o amargo, o quente e o frio
etc. Sentir é algo ambíguo, pois o sensível é, ao mesmo tempo, a qualidade que está no objeto
e o sentimento interno do nosso corpo das qualidades sentidas. O autor destaca que a
sensação não está desvinculada da intencionalidade do sujeito, pois há, no sensível, a