SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 52
Baixar para ler offline
Coleção	PASSO-A-PASSO
CIÊNCIAS	SOCIAIS	PASSO-A-PASSO
Direção:	Celso	Castro
FILOSOFIA	PASSO-A-PASSO
Direção:	Denis	L.	Rosenfield
PSICANÁLISE	PASSO-A-PASSO
Direção:	Marco	Antonio	Coutinho	Jorge
Ver	lista	de	títulos	no	final	do	volume
Leonardo	Sartori	Porto
Filosofia	da	educação
Sumário
Introdução
A	concepção	idealista
A	concepção	empirista
A	concepção	transcendental
Filosofia	contemporânea
Reformistas
Aperfeiçoadores
Considerações	finais
Seleção	de	textos
Referências	e	fontes
Leituras	recomendadas
Sobre	o	autor
Introdução
A	 educação	 é	 um	 tema	 filosófico	 desde	 a	 Grécia	 Clássica.	 O	 diálogo	 mais	
famoso	de	Platão,	A	República,	é	também	a	primeira	grande	obra	de	filosofia	da	
educação.	O	tema	central	do	diálogo	é	a	política,	mas,	para	criar	uma	sociedade	
perfeita	—	objetivo	da	filosofia	política	platônica	—,	é	preciso	educar	os	seus	
membros.	 Assim,	 surge	 uma	 relação	 entre	 filosofia	 política	 e	 educação,	 que	
perdura	até	os	nossos	dias.
Os	aspectos	epistemológicos	envolvidos	na	educação	também	são	objeto	de	
estudo	 filosófico	 desde	 Platão,	 que	 apresenta,	 no	 diálogo	 Mênon,	 uma	
abordagem	sistemática	desse	assunto.
Em	 um	 primeiro	 momento	 deste	 livro,	 abordarei	 as	 concepções	
epistemológicas	envolvidas	no	ensino,	concepções	estas	que	têm	sua	razão	de	ser	
na	medida	em	que,	para	identificarmos	a	melhor	forma	de	conduzir	o	processo	
educacional,	é	preciso	saber	como	ocorre	o	conhecimento	humano.
A	investigação	filosófica	é	um	diálogo	entre	pensadores,	que	ocorre	há	mais	
de	 dois	 milênios	 no	 Ocidente.	 Reconstruirei	 brevemente	 esse	 diálogo	
apresentando	 três	 concepções	 epistemológicas	 do	 ensino	 que	 classificaremos	
como:	idealista,	empirista	e	transcendental.
A	concepção	idealista	será	tratada	através	de	dois	filósofos:	Platão	e	santo	
Agostinho.	Abarcaremos,	recorrendo	a	eles,	o	período	da	Antigüidade	e	o	início	
da	 Idade	 Média.	 É	 preciso	 ter	 claro	 que,	 apesar	 de	 santo	 Agostinho	 ter	 se	
inspirado	 na	 doutrina	 platônica,	 ele	 desenvolveu	 uma	 filosofia	 própria,	 que	
influenciou	 o	 pensamento	 ocidental	 durante	 toda	 a	 Idade	 Média	 e	 que,	
indiretamente,	também	influenciou	a	filosofia	que	surge	na	Idade	Moderna.
Locke	foi	o	filósofo	escolhido	para	apresentar	a	concepção	empirista.	Com	
esse	 filósofo	 chegamos	 à	 filosofia	 moderna.	 Também	 por	 meio	 de	 Locke
apresentaremos	o	debate	filosófico	que	se	dá	entre	o	empirismo	defendido	por	
ele	e	o	idealismo.
A	 concepção	 transcendental	 requer	 um	 esclarecimento:	 o	 termo	
“transcendental”	foi	extraído	da	filosofia	de	Kant,	mas	não	se	aplica	a	são	Tomás	
de	 Aquino,	 filósofos	 que	 serão	 apresentados	 sob	 esta	 rubrica.	 Reuni-los	 se
justifica,	 contudo,	 pelo	 fato	 de	 ambos	 oferecerem	 uma	 alternativa	 tanto	 ao	
idealismo	platônico	quanto	ao	empirismo,	segundo	a	qual	o	fundamento	para	o	
conhecimento	 não	 está	 em	 idéias	 inatas,	 tampouco	 na	 mera	 informação	 dos	
sentidos,	 mas	 em	 princípios	 que	 coordenam	 a	 aquisição	 do	 conhecimento	 —	
princípios	estes	que	Kant	denomina	de	“transcendentais”.
E	tratarei	ainda	das	teorias	filosóficas	contemporâneas,	que	se	ocupam	da	
relação	entre	epistemologia	e	educação.
Em	 um	 segundo	 momento,	 tratarei	 da	 relação	 entre	 filosofia	 política	 e
educação.	O	tópico	principal	dessa	relação	é	o	papel	da	educação	na	formação	e	
organização	da	sociedade	e	do	Estado,	porque	para	vários	filósofos	educar	os	
cidadãos	é	a	única	forma	de	aperfeiçoar	ou	modificar	o	Estado.	Dividiremos	as	
teorias	 filosóficas	 sobre	 a	 relação	 entre	 educação	 e	 política	 em	 dois	 grandes	
grupos:	 os	 reformistas	 da	 sociedade	 e	 os	 aperfeiçoadores	 desta.	 Sabemos	 que	
essa	 classificação	 não	 é	 de	 todo	 satisfatória,	 visto	 que	 as	 teorias	 filosóficas	
apresentadas	 pretendem	 que	 a	 educação	 seja	 uma	 forma	 de	 aperfeiçoar	 a	
sociedade	humana,	mas	algumas	defendem	uma	mudança	radical	na	sociedade	
ou	na	forma	como	o	indivíduo	se	relaciona	com	esta,	enquanto	outras	advogam	
em	favor	do	aperfeiçoamento	das	instituições	sociais	já	existentes.
O	dilema	entre	mudar	a	sociedade	e	aperfeiçoar	as	instituições	já	existentes	
ocorre	logo	no	início	da	filosofia	ocidental,	nas	concepções	de	Platão,	defensor	
da	primeira	alternativa,	e	Aristóteles,	que	defende	a	segunda.
Na	 filosofia	 moderna	 (que	 corresponde	 ao	 período	 compreendido	 entre	 os	
séculos	XVII	e	XIX)	encontra-se	o	trabalho	de	Rousseau,	que	incluiremos	no	
grupo	dos	reformistas,	uma	vez	que,	apesar	de	a	sua	filosofia	da	educação	estar	
mais	voltada	para	o	indivíduo,	o	fim	último	da	reforma	do	indivíduo	é	a	reforma	
de	todos	os	indivíduos,	ou	seja,	da	sociedade.
Quanto	à	filosofia	contemporânea,	apresentarei,	no	grupo	dos	reformistas,	as	
concepções	de	um	dos	autores	da	Escola	de	Frankfurt:	Adorno,	aqui	enquadrado	
por	sua	sofisticada	reformulação	do	marxismo.	Pelo	grupo	dos	aperfeiçoadores	
do	 sistema	 social	 vigente	 exporei	 as	 teses	 do	 filósofo	 norte-americano	 John	
Dewey,	que	defendeu	um	aprimoramento	da	democracia	através	da	educação.
No	 total,	 este	 livro	 tratará	 das	 obras	 sobre	 educação	 de	 nove	 filósofos,	
englobando	a	filosofia	da	Grécia	Clássica	(Platão	e	Aristóteles),	a	Idade	Média	
(santo	 Agostinho	 e	 são	 Tomás	 de	 Aquino),	 a	 filosofia	 moderna	 nas	 tradições	
filosóficas	 inglesas,	 alemãs	 e	 francesas	 (Locke,	 Kant	 e	 Rousseau,	
respectivamente),	 e	 a	 filosofia	 contemporânea	 (Adorno	 e	 Dewey),	 além	 de	
outros	 filósofos	 tratados	 em	 menos	 detalhe.	 Pretendo,	 com	 isto,	 oferecer	 um
panorama	histórico	da	filosofia	da	educação	que	inclua	diferentes	perspectivas.
A	concepção	idealista
Por	“idealismo”	entendemos	a	concepção	segundo	a	qual	o	nosso	conhecimento
não	está	assentado	na	experiência	sensível,	que,	por	ser	transitória,	não	fornece
certeza	 alguma,	 e	 sim	 no	 acesso	 a	 uma	 realidade	 não	 sensível,	 composta	 por
idéias.	 O	 melhor	 exemplo	 que	 podemos	 dar	 de	 uma	 “realidade	 não	 sensível”
seria:	aquela	na	qual	habitariam	as	figuras	geométricas	de	duas	dimensões	—	os
círculos	e	os	quadrados	perfeitos,	que	jamais	poderiam	existir	em	nosso	mundo,
e,	portanto,	não	podem	ser	percebidos	por	nossos	sentidos	(um	círculo	que	vejo
desenhado	 num	 papel	 é	 um	 objeto	 tridimensional:	 o	 traço	 do	 lápis	 tem
profundidade	e	largura).
O	fundador	do	idealismo	filosófico	é	Platão,	e	com	ele	iniciarei	a	exposição
dessa	concepção.	A	influência	da	filosofia	platônica	se	faz	sentir	num	filósofo	e
teólogo	 medieval:	 santo	 Agostinho,	 que	 será	 o	 segundo	 representante	 do
idealismo.
Platão.	 O	 idealismo	 platônico	 não	 é	 uma	 teoria	 estabelecida	 de	 maneira
dogmática:	 suas	 teses	 são	 usualmente	 sustentadas	 por	 sólidos	 argumentos.	 No
que	diz	respeito	à	filosofia	da	educação,	Platão	inicia	a	defesa	da	tese	de	que
educar	é	rememorar	valendo-se	de	argumentação	por	via	negativa:	o	paradoxo
da	investigação.
No	diálogo	Mênon,	ele	apresenta	o	paradoxo:	como	alguém	pode	investigar
algo	que	já	sabe	ou	algo	que	não	sabe?	O	que	já	sabe	não	precisa	investigar	e	o
que	não	sabe	não	pode	investigar,	uma	vez	que	não	sabe	o	que	procurar	e,	se
encontrar	algo,	não	saberá	se	era	aquilo	que	procurava.
Com	 relação	 ao	 conhecimento	 de	 qualquer	 objeto,	 existem	 apenas	 quatro
possibilidades:	1)	eu	sei	que	o	conheço;	2)	eu	sei	que	não	o	conheço;	3)	eu	não
sei	que	o	conheço;	4)	eu	não	sei	que	não	o	conheço.	No	primeiro	caso,	não	é
necessária	 a	 investigação	 e,	 por	 conseguinte,	 a	 aprendizagem:	 eu	 não	 posso
aprender	 algo	 que	 eu	 já	 sei.	 O	 último	 caso	 é	 o	 do	 total	 desconhecimento,
tampouco	aqui	é	possível	a	aprendizagem,	pois	eu	sequer	sei	que	não	sei	algo;
assim,	não	há	motivo	para	querer	aprender	esse	algo.	É	claro	que	alguém	pode
me	informar	o	que	eu	não	sei,	mas	então	caímos	no	segundo	caso:	eu	sei	que	não
sei	isso.
Mas	como	eu	posso	saber	que	não	sei	algo?	Para	eu	saber	que	não	sei	algo,
eu	preciso	saber	o	que	é	isso,	mas	então	eu	sei	o	que	é	isso.	Chegamos	ao	núcleo
do	paradoxo	da	investigação,	que	também	é	o	paradoxo	da	aprendizagem,	pois
como	posso	querer	aprender	algo	que	eu	não	sei	o	que	é,	nem	onde	investigá-lo?
Existe,	 contudo,	 uma	 objeção	 óbvia	 à	 interpretação	 do	 paradoxo	 da
investigação	como	sendo	também	um	paradoxo	da	aprendizagem:	alguém	—	o
professor	 —	 pode	 me	 dizer	 o	 que	 eu	 não	 sei,	 pode,	 portanto,	 informar-me
daquilo	 que	 preciso	 aprender.	 Mas	 é	 necessário	 entender	 que	 Platão	 toma	 a
aprendizagem	 como	 uma	 tarefa	 ativa,	 ou	 seja,	 há	 uma	 vontade	 no	 aluno	 de
aprender	algo.	A	aprendizagem,	portanto,	é	uma	investigação.
Só	resta	uma	alternativa:	eu	não	sei	que	sei	isso.	O	paradoxo	da	investigação
nos	leva	à	conclusão	de	que	toda	aprendizagem	consiste	na	rememoração	de	algo
que	esquecemos.	Essa	solução	do	paradoxo,	no	entanto,	cria	um	novo	problema:
quando	aprendemos	algo	pela	primeira	vez?	Não	pode	ser	em	nossa	vida,	pois
aprender	sempre	é	rememorar,	então	só	pode	ser	antes	de	nascermos!	A	solução
não	parece	tão	absurda	quando	pensamos	nas	doutrinas	religiosas	que	falam	da
imortalidade	da	alma.	E	aqui	começa	a	metafísica	platônica.
Segundo	Platão,	a	alma	humana	é	imortal	e	“já	 nasceu	 várias	vezes	e	viu
tudo	o	que	existe	aqui	e	no	outro	mundo	(Hades),	não	existindo	nada	que	não
tenha	aprendido”.	Entretanto,	o	que	a	alma	apreende	em	suas	várias	vidas	não	é
o	conhecimento	daquilo	que	é	transitório	no	mundo,	mas	as	verdades	eternas	e
imutáveis,	aquilo	que	Platão	denomina	idéias.
O	típico	conhecimento	eterno	e	imutável	é	o	da	matemática,	e	não	é	à	toa	que
o	 personagem	 principal	 do	 Mênon,	 Sócrates,	 mostra	 que	 um	 escravo	 pode
demonstrar	 um	 teorema	 sem	 nunca	 ter	 aprendido	 matemática.	 O	 tema	 do
diálogo,	porém,	é	a	virtude;	assim,	podemos	listar	também	os	conceitos	éticos,
bem	como	os	estéticos,	entre	as	idéias.
Se	aprender	é	apenas	rememorar,	então	a	função	do	professor	é	conduzir	o
aluno	no	processo	de	trazer	à	consciência	as	idéias	que	jazem	escondidas	em	sua
alma.	 Sócrates,	 o	 professor	 por	 excelência,	 compara	 o	 seu	 trabalho	 com	 o	 da
parteira:	através	de	perguntas,	faz	com	que	os	indivíduos	cheguem	às	verdades
que	 estavam	 adormecidas	 no	 interior	 de	 suas	 mentes,	 ou	 seja,	 induz	 o
nascimento	dessas	verdades.
Agostinho.	Nos	primórdios	da	Igreja	Católica,	surge	a	patrística	(séculos	II	a	V
da	nossa	era),	cujo	objetivo	era	dotar	a	nova	fé	de	argumentos	filosóficos	para
combater	seus	detratores.	É	nessa	tradição	que	se	insere	o	pensamento	de	santo
Agostinho,	 teólogo	 e	 filósofo	 que	 encontrou	 na	 filosofia	 platônica	 inspiração
para	os	seus	escritos.
O	 principal	 livro	 que	 escreveu	 sobre	 educação,	 De	 Magistro	 (Sobre	 o
mestre),	não	inicia	com	uma	exposição	sobre	os	objetivos	da	educação;	em	vez
disso,	 aborda	 inicialmente	 a	 linguagem.	 Palavras,	 proferidas	 ou	 escritas,	 são
consideradas	 sinais	 por	 Agostinho,	 que	 pergunta:	 como	 podemos	 apreender	 o
significado	desses	sinais?
Não	 pode	 ser	 através	 de	 outros	 sinais,	 pois	 os	 sinais,	 em	 si	 mesmos,	 não
possuem	significado,	apenas	indicam	algo.	A	resposta	parece	óbvia:	aprendemos
o	significado	das	palavras	quando	nos	é	indicado	o	que	uma	palavra	significa.
Um	dos	modos	de	fazer	isso	é	apontar	para	um	objeto	e	dizer	o	seu	nome.
O	filósofo	nos	lembra,	todavia,	que	o	gesto	de	apontar	nada	mais	é	do	que
um	sinal;	assim,	só	se	pode	indicar	o	significado	de	um	sinal	usando-se	outros
sinais.	 Então,	 conclui	 que	 “com	 as	 palavras	 não	 aprendemos	 senão	 palavras;
antes,	o	som	e	o	ruído	das	palavras,	porque,	se	o	que	não	é	sinal	não	pode	ser
palavra,	não	sei	também	como	possam	ser	palavras	aquilo	que	ouvi	pronunciado
como	palavras	enquanto	não	lhe	conhecer	o	significado”.
A	última	parte	dessa	conclusão	requer	um	esclarecimento.	Palavras,	quando
não	se	conhece	seu	significado,	sequer	são	palavras,	mas	apenas	ruídos	ou	traços
no	papel	—	é	o	que	experienciamos	ao	lermos	ou	ouvirmos	uma	língua	que	não
conhecemos.	 Portanto,	 ao	 apontarmos	 para	 um	 objeto	 dizendo	 o	 seu	 nome,
precisamos	 saber	 que	 o	 nome	 é	 uma	 palavra,	 não	 um	 ruído	 ou	 rabisco,	 e	 só
podemos	 ter	 esse	 conhecimento	 sabendo	 o	 significado	 da	 palavra,	 segundo
Agostinho.
A	 solução	 para	 esse	 dilema	 encontra-se	 num	 conhecimento	 anterior	 ao
empírico,	 ou	 seja,	 anterior	 àquele	 que	 os	 sentidos	 nos	 fornecem:	 é	 o
conhecimento	da	verdade	interior.	Assim,	a	nossa	mente	já	contém	o	significado
das	 palavras,	 a	 saber:	 as	 coisas	 às	 quais	 elas	 se	 referem.	 E	 quem	 fornece	 a
verdade	à	nossa	mente	é	o	“…	Cristo	que	habita	…	no	homem	interior,	isto	é:	a
virtude	incomutável	de	Deus	e	a	sempiterna	Sabedoria,	que	toda	alma	racional
consulta	…”
O	dilema	é	similar	àquele	enfrentado	por	Platão;	a	solução,	contudo,	difere,
porquanto	em	Agostinho	não	será	a	rememoração,	mas	a	inspiração	divina	o	que
dará	a	base	para	o	nosso	conhecimento.
Ambos	os	filósofos	concordam,	no	entanto,	que	a	função	do	professor	não	é
transmitir	conhecimento,	mas	conduzir	o	aluno	na	descoberta	do	conhecimento
que	está	latente	em	seu	interior.
A	concepção	empirista
O	 empirismo	 se	 opõe	 ao	 idealismo	 ao	 propor	 uma	 regra	 para	 distinguir	 uma
concepção	imaginária	do	mundo	de	uma	concepção	real:	o	teste	da	experiência
sensível.	A	tese	empirista	não	é	a	de	que	todo	conhecimento	vem	da	experiência
—	pois	posso	conhecer	sereias,	uma	vez	que	conheço	suas	características:	ser
metade	mulher,	metade	peixe	(se	não	conhecesse	as	sereias	não	seria	capaz	de
distingui-las	dos	duendes)	—,	mas	de	que	todo	o	conhecimento	sobre	objetos
reais	procede	da	experiência.	É	claro	que	essa	tese	gera	dificuldade	para	explicar
como	 conhecemos	 aqueles	 objetos	 que	 são	 tão	 caros	 ao	 idealismo:	 os	 objetos
matemáticos.	Para	esses	objetos,	o	empirismo	cria	a	noção	de	objetos	abstratos,
criados	pela	mente	ao	abstrair	certas	características	dos	objetos	reais.	Assim,	os
filósofos	 empiristas	 podem	 explicar	 as	 várias	 facetas	 que	 constituem	 o
conhecimento	humano.
Apesar	 de	 as	 teses	 empiristas	 terem	 sido	 sustentadas	 por	 vários	 filósofos
desde	 a	 Grécia	 Clássica,	 o	 empirismo	 geralmente	 é	 restrito	 a	 um	 grupo	 de
filósofos	modernos	ingleses:	Francis	Bacon,	Hobbes,	Locke,	Berkeley	e	Hume.
Dentre	esses,	apenas	Locke	escreveu	um	livro	sobre	a	educação,	sobre	o	qual
falarei	a	seguir.
Locke.	 Em	 oposição	 ao	 idealismo,	 John	 Locke	 sustenta	 a	 tese	 de	 que	 não	 há
idéias	 nem	 princípios	 inatos,	 porque	 não	 existe	 um	 consenso	 universal	 com
relação	a	eles	e	porque	eles	não	estão	presentes	nas	crianças	e	nos	deficientes
mentais.	 Locke	 também	 apresenta	 um	 argumento	 contra	 a	 teoria	 da
reminiscência:	se	todo	conhecimento	já	estivesse	em	nossa	memória,	então	um
cego	de	nascença	conheceria	as	cores.	E	chega	a	citar	o	caso	de	um	homem	que
perdeu	a	visão	e	acabou	perdendo	a	noção	das	cores,	o	que	não	ocorreria	se	essas
existissem	em	sua	memória.	Além	do	mais,	ele	não	acredita	que	a	alma	exista
antes	do	começo	da	vida	no	corpo.
A	filosofia	de	Locke	pode	ser	resumida	em	duas	teses	interligadas:	a)	não
existem	idéias	nem	princípios	inatos;	b)	todas	as	nossas	idéias	e	os	princípios	do
entendimento	são	derivados	da	experiência	sensível.	Porém	nem	todas	as	nossas
idéias	e	nenhum	princípio	do	entendimento	têm	sua	origem	na	experiência,	pois
muitas	daquelas	e	todos	estes	surgem	da	reflexão	que	a	mente	realiza	sobre	os
dados	da	experiência.
A	 concepção	 segundo	 a	 qual	 a	 nossa	 mente	 é	 um	 fluxo	 constante	 e
descoordenado	de	impressões	sensíveis	não	corresponde	de	modo	algum	às	teses
empiristas.	 Se	 incluirmos,	 entre	 os	 defensores	 dessas	 teses,	 filósofos	 como
Locke,	Hume	e	Hobbes,	veremos	que	para	nenhum	deles	a	mente	é	passiva.	Pelo
contrário,	eles	defendem	que	grande	parte	do	nosso	conhecimento	é	produzido
pela	mente	quando	esta	opera	sobre	dados	fornecidos	pelos	sentidos.
Uma	 das	 tarefas	 da	 educação,	 portanto,	 será	 preparar	 o	 aluno	 para	 usar
corretamente	 o	 seu	 entendimento.	 Entretanto,	 diferentemente	 de	 Platão	 e
Agostinho,	que	consideram	tarefa	do	professor	conduzir	o	aluno	no	caminho	da
rememoração	ou	da	inspiração	divina,	Locke	julga	que	“a	tarefa	da	educação	…
não	é	torná-los	[os	indivíduos]	perfeitos	em	cada	uma	das	ciências,	mas	abrir	as
suas	 mentes	 para	 melhor	 torná-los	 capazes	 de	 qualquer	 uma,	 quando	 se
dedicarem	a	ela”.
Visto	que	o	nosso	conhecimento	surge	da	reflexão	sobre	as	impressões	dos
sentidos,	não	basta	informar	o	aluno,	apresentar-lhe	um	conhecimento	acabado,
porque	ele	só	compreenderá	aquilo	que	ele	próprio	elaborar,	ou	seja,	aquilo	que
for	resultado	de	suas	investigações	intelectuais.	Ora,	“nada	facilitará	mais	suas
investigações	e	as	 levará	mais	longe	do	 que	um	bom	método”.	O	objetivo	da
educação,	portanto,	deve	ser	ensinar	ao	aluno	os	vários	métodos	por	meio	dos
quais	o	conhecimento	pode	ser	obtido.	O	modo	mais	apropriado	para	atingir	esse
objetivo	é	fazer	com	que	o	aluno	raciocine	a	partir	daquilo	que	já	conhece,	pois
Locke	sustenta	que	as	crianças,	assim	que	começam	a	falar,	já	são	capazes	de
raciocinar.
Na	concepção	empirista,	a	educação	não	se	dá	a	partir	da	transmissão	de	um
conteúdo,	mas	no	exercício	dos	métodos	que	levam	à	produção	dos	diferentes
tipos	de	conhecimento.
A	concepção	transcendental
Como	 dissemos	 na	 introdução,	 “transcendental”	 é	 um	 termo	 que	 pertence	 à
filosofia	kantiana,	que	também	será	usado	com	relação	à	filosofia	de	são	Tomás
de	 Aquino,	 profundamente	 influenciado	 pelo	 pensamento	 de	 Aristóteles.	 A
concepção	 transcendental	 tenta	 superar	 a	 dicotomia	 idealismo/empirismo,
aceitando	 do	 empirismo	 a	 evidência	 dos	 sentidos,	 mas	 estabelecendo	 as
condições	a	priori	requeridas	pela	experiência.
São	Tomás	de	Aquino.	O	movimento	de	renovação	do	pensamento	católico	que
se	seguiu	à	patrística	é	usualmente	denominado	de	escolástica	(séculos	IX	ao
XV	 de	 nossa	 era),	 e	 tem	 como	 principal	 característica	 o	 uso	 da	 obra	 de
Aristóteles	 nas	 discussões	 filosóficas	 e	 teológicas.	 O	 filósofo	 e	 teólogo	 mais
importante	 da	 escolástica	 é	 são	 Tomás	 de	 Aquino,	 que,	 diferentemente	 de
Agostinho,	não	escreveu	um	tratado	sobre	educação,	mas	deixou	um	texto	sobre
o	 assunto,	 também	 intitulado	 De	 Magistro,	 que	 pertence	 à	 obra	 Quaestiones
disputatae	de	veritate	(Questões	disputadas	sobre	a	verdade).
Aquino	não	se	opõe	às	concepções	de	Agostinho,	ele	inclusive	concorda	com
a	 tese	 de	 que	 Deus	 ensina	 ao	 homem	 a	 partir	 do	 interior;	 seu	 alvo	 será	 o
inspirador	de	Agostinho:	Platão.
A	teoria	platônica	da	reminiscência	é	explicitamente	rejeitada	por	Aquino,
porque	elimina	a	ação	humana,	uma	vez	que,	se	todo	conhecimento	é	lembrança
—	 trata-se,	 obviamente,	 de	 conhecimento	 verdadeiro,	 portanto,	 conhecimento
daquilo	que	de	fato	ocorre	—,	então	tudo	o	que	nos	ocorre	já	está	determinado
antes	de	nascermos.
A	rejeição	ao	platonismo	não	implica	a	aceitação	do	empirismo,	pois	há	uma
“via	intermediária	entre	essas	duas	opiniões”.	Caminho	indicado	por	Aristóteles:
nós	possuímos	em	potência	a	capacidade	de	conhecer	o	mundo	que	nos	cerca,
mas	é	preciso	efetivar	essa	potência	no	próprio	ato	de	conhecer.
A	 idéia	 de	 possuirmos	 em	 potência	 a	 capacidade	 de	 conhecer	 torna-se
bastante	clara	quando	pensamos	no	sentido	da	visão:	é	por	meio	dele	que	posso
ver	o	mundo,	mas	se	não	abrir	meus	olhos,	não	os	dirigir	ao	que	me	cerca,	não
verei	nada.
O	 exemplo	 também	 apresenta	 outra	 característica	 fundamental	 do
conhecimento:	o	que	eu	vejo	não	é	predeterminado	pelos	meus	olhos,	mas	há
uma	qualidade	que	não	pode	faltar	—	a	visibilidade;	assim,	embora	o	que	vamos
conhecer	não	esteja	já	inscrito	em	nossa	mente,	existem	certas	qualidades	que	os
objetos	necessariamente	têm	de	possuir	a	fim	de	que	possamos	conhecê-los.
Do	mesmo	modo,	certos	princípios	necessários	ao	conhecimento	encontram-
se	em	nós.	Esses	princípios	são	de	dois	tipos:	a)	verdades	auto-evidentes,	como
“duas	quantidades	iguais	a	uma	terceira	são	iguais	entre	si”;	b)	noções	simples,
tais	como	“ser”	e	o	“o	número	um”.
Como	já	vimos,	Aquino	não	quer	se	opor	a	Agostinho,	e	aceita	a	teoria	da
inspiração	 divina,	 que	 se	 manifesta	 nesses	 princípios	 universais.	 Em
contrapartida,	 existe	 o	 conhecimento	 que	 é	 produzido	 a	 partir	 deles,	 sendo	 o
resultado	da	atividade	humana.
Os	seres	humanos	adquiririam,	assim,	conhecimento	de	duas	maneiras:	“por
descoberta	pessoal,	e	por	um	princípio	exterior,	como	se	constata	naquele	que
aprende	por	um	outro”.	É	importante	assinalar,	porém,	que,	em	ambos	os	casos,
é	 necessária	 a	 existência	 dos	 princípios	 universais,	 e	 Aquino	 cita	 Aristóteles:
“Todo	 conhecimento	 e	 toda	 aquisição	 de	 conhecimento	 partem	 de	 um
conhecimento	preexistente.”
Assim,	 a	 função	 do	 professor	 não	 é	 informar	 o	 aluno,	 transmitir-lhe
conhecimento,	 mas	 “…	 conduzir	 o	 discípulo,	 a	 partir	 do	 que	 já	 conhece,	 ao
conhecimento	daquilo	que	ignora	…”.	E	o	filósofo	indica,	inclusive,	o	método
para	 se	 realizar	 essa	 tarefa,	 que	 consistiria	 basicamente	 em	 oferecer	 ao	 aluno
problemas	que	possa	resolver	utilizando	os	princípios	universais,	que	são	aquilo
que	 ele	 já	 sabe	 (devido	 à	 intervenção	 divina).	 Desse	 modo,	 o	 aluno	 pode
exercitar	 a	 sua	 capacidade	 de	 aplicar	 aos	 casos	 particulares	 (aos	 objetos	 no
mundo,	aos	fatos)	os	princípios	universais.
Kant.	 Kant	 pertence	 a	 uma	 tradição	 filosófica	 bastante	 distinta	 daquela	 de
Aristóteles	 e	 Aquino,	 mas	 o	 incluímos	 neste	 grupo	 porque	 também	 esposa	 a
idéia	 do	 ensino	 através	 do	 exercício	 de	 princípios	 que	 são	 necessários	 para	 a
produção	 do	 conhecimento.	 Porém	 não	 parece	 que,	 para	 Kant,	 tais	 princípios
sejam	inatos:	“Para	designar	a	classe	que	o	homem	ocupa	no	sistema	da	natureza
…	é	suficiente	afirmar	que	ele	possui	um	caráter	que	se	cria	a	si	mesmo	…	.	É
por	isso	que,	a	partir	de	um	animal	capaz	de	razão	(animal	rationabile),	ele	pode
fazer	de	si	mesmo	um	animal	racional	(animal	rationale)	…	.”
A	citação	denota	uma	perspectiva	fundamental	para	se	entender	a	concepção
kantiana	 do	 entendimento:	 a	 autonomia.	 Neste	 caso,	 a	 etimologia	 é
esclarecedora,	 visto	 que	 “autos”	 em	 grego	 significa	 “si	 mesmo”	 e	 “nomos”,
“lei”,	“autonomia”	significa	“regrar	a	si	mesmo”.	E	Kant	não	pensa	a	autonomia
como	 algo	 pertencente	 apenas	 ao	 domínio	 da	 moral,	 pois	 a	 estende	 às	 nossas
capacidades	cognitivas.
Num	 exercício	 realizado	 numa	 escola	 alemã	 atual,	 crianças	 com	 os	 olhos
vendados	são	conduzidas	por	outras	crianças	através	de	um	bosque	e	apalpam
algumas	 árvores	 determinadas;	 logo	 em	 seguida,	 são	 levadas	 para	 a	 beira	 do
bosque,	seus	olhos	são	descobertos,	e	elas	têm	de	identificar	visualmente	quais
árvores	 tocaram.	 Esse	 exercício	 ilustra	 uma	 capacidade	 humana	 da	 qual
raramente	nos	damos	conta:	conseguimos	unificar	informações	de	tipos	distintos
—	dados	visuais,	táteis,	sonoros,	olfativos	—	para	conformar	um	único	objeto.
Reunimos	uma	imagem,	um	cheiro,	um	sabor,	uma	textura,	para	criar	o	objeto
“esta	árvore”,	“esta	maçã”	etc.
Essa	e	outras	capacidades	são	as	regras	ou	os	princípios	do	entendimento.
Pensar,	 incluindo-se	 a	 percepção	 dos	 objetos,	 não	 é	 algo	 passivo,	 é	 uma
atividade	guiada	por	regras.	A	tarefa	do	professor,	portanto,	não	deve	ser	apenas
informar	o	estudante;	afinal,	“quantas	pessoas	lêem	e	escutam	certas	coisas,	as
quais	 admitem	 sem	 entender”?	 Cabe	 ao	 educador	 treinar	 o	 estudante	 no	 uso
correto	das	regras	do	entendimento.	Mas	Kant	pergunta:	“convém	começar	com
o	estudo	das	regras	abstratamente,	ou	devemos	aprendê-las	após	o	uso	delas?”.	A
solução	 encontra-se	 numa	 terceira	 alternativa:	 aprender	 as	 regras	 ao	 mesmo
tempo	 em	 que	 são	 usadas.	 O	 ensino	 deve	 ser,	 ao	 mesmo	 tempo,	 prático	 e
reflexivo,	ou	seja,	o	estudante	deve	ser	levado	a	refletir	sobre	a	atividade	que
esteja	realizando.
Apesar	 de	 Kant	 julgar	 o	 autodidatismo	 a	 forma	 mais	 perfeita	 de
aprendizagem,	ele	reconhece	que	poucos	indivíduos	são	capazes	de	tal	proeza.
Então,	recomenda	o	método	socrático	de	ensino,	ou	seja,	o	mestre	deve	guiar	o
aluno	em	exercícios	onde	este	aplique	as	regras	do	entendimento,	a	fim	de	que
possa	refletir	sobre	elas,	sempre	com	a	condução	do	professor.
Filosofia	contemporânea
Todas	essas	concepções	de	educação	influenciaram	a	filosofia	e	o	pensamento
contemporâneos.	 Embora	 a	 concepção	 idealista	 não	 esteja	 mais	 em	 voga,	 a
filosofia	ocidental	está	assentada	sobre	as	idéias	de	Platão,	e	o	fato	de	tanto	a
concepção	empirista	quanto	a	transcendental	serem	desenvolvidas	para	refutar	a
filosofia	platônica	ilustra	a	permanência	desta	no	pensamento	ocidental.
Uma	 influência	 da	 concepção	 empirista	 podemos	 encontrar	 no	 livro	 de
Alfred	North	Whitehead,	Os	fins	da	educação,	no	qual	o	matemático	e	filósofo
inglês	propõe	um	ensino	baseado	na	alegria	da	descoberta	para	combater	o	que
chama	de	o	ensino	das	idéias	inertes,	que	nada	mais	é	do	que	o	conhecimento
livresco	que	muitas	vezes	ainda	é	ensinado	em	nossas	escolas.	No	tipo	de	ensino
proposto	por	Whitehead	o	aluno	deve	aprender	a	provar	as	idéias,	o	que	pode	ser
feito	utilizando-se	a	experiência	ou	a	lógica.
Whitehead,	 portanto,	 concorda	 com	 a	 tese	 dos	 filósofos	 que	 examinamos
acima	de	que	a	educação	deve	ser	o	desenvolvimento	de	habilidades	mais	do	que
a	aquisição	de	informações.	Com	o	intuito	de	realizar	esse	objetivo,	apresenta	o
que	chama	de	ritmo	da	educação.	A	palavra	“ritmo”	indica	que	se	trata	de	algo
que	se	repete,	ou	seja,	algo	cíclico,	que	são	três	etapas	lógicas	que	o	aluno	deve
realizar	toda	vez	que	adquire	um	conhecimento	novo.
A	 primeira	 etapa,	 Whitehead	 denomina	 período	 de	 romance,	 que	 é	 o
momento	 em	 que	 o	 conhecimento	 retém	 o	 brilho	 da	 novidade,	 das	 conexões
inexploradas.	Essa	é	a	etapa	na	qual	a	curiosidade	do	aluno	deve	ser	aguçada.
A	segunda	etapa	é	o	período	da	precisão,	correspondendo	à	etapa	analítica
do	 ensino,	 na	 qual	 o	 aluno	 deve	 aprender	 a	 “gramática	 da	 linguagem	 e	 a
gramática	da	ciência”.	Obviamente,	é	o	momento	no	qual	o	aluno	aprimora	as
suas	habilidades	de	produzir	conhecimento	correto.
A	 última	 etapa,	 período	 da	 generalização,	 é	 caracterizada	 pelo	 retorno	 à
primeira	 etapa,	 com	 as	 habilidades	 adquiridas	 na	 segunda	 —	 nas	 palavras	 do
filósofo:	“é	o	êxito	final”.
Através	 desses	 ciclos,	 a	 educação	 deixa	 de	 ser	 um	 processo	 cujo	 final	 é
longínquo,	para	se	tornar	um	processo	em	que	tanto	a	sensação	de	dominar	um
conteúdo	 ou	 habilidade	 quanto	 a	 de	 estar	 deparando	 com	 algo	 novo	 ocorrem
freqüentemente.
Outro	 filósofo	 inglês	 que	 também	 rejeitou	 a	 educação	 livresca	 foi	 Gilbert
Ryle.	 Lembrando	 Platão	 e	 Agostinho,	 Ryle	 inicia	 o	 ensaio	 “Ensino	 e
treinamento”	com	um	dilema:	“Todos	concordamos,	creio,	que	algo	falhou	no
ensino	se	o	aluno	não	é	capaz,	cedo	ou	tarde,	de	dar	as	suas	próprias	soluções
aos	problemas,	mas	o	problema	é	este:	como	podemos	ensinar	um	indivíduo	a
fazer	coisas	que	não	aprendeu	previamente?”	O	paradoxo	não	é	novo.
A	solução	para	o	dilema	é	distinguir	entre	ensinar	que	e	ensinar	como	(que
espelha	a	sua	distinção	entre	saber	que	e	 saber	como,	apresentada	no	livro	A
Concept	of	Mind).	Quando	dizemos	que	alguém	só	pode	aprender	algo	que	lhe
tenha	sido	ensinado,	é	preciso	sabermos	em	que	sentido	estamos	usando	o	verbo
“ensinar”.	A	proposição	“eu	ensinei	a	João	que	a	água	congela	a	0ºC”	significa
que	estou	informando	João	de	algo;	já	a	proposição	“eu	ensinei	a	João	como
medir	a	temperatura	em	que	a	água	congela”	diz	que	estou	desenvolvendo	em
João	uma	habilidade.	No	primeiro	caso,	o	indivíduo	não	pode	ir	além	do	que	lhe
foi	ensinado,	o	que	não	ocorre	no	segundo,	pois	a	habilidade	que	desenvolveu
lhe	permite	fazer	descobertas	por	si	mesmo.
O	 dilema	 ocorre	 porque	 geralmente	 pensamos	 em	 termos	 de	 ensinar	 que,
quando,	 na	 verdade,	 para	 podermos	 viver,	 é	 preciso	 aprender	 como	 fazer	 as
coisas	—	como	falar,	por	exemplo.	Mas	surgem	novas	questões:	como	é	possível
desenvolver	em	alguém	uma	habilidade?	Isto	não	é	algo	que	surge	no	interior	do
indivíduo?	É	possível	criá-la	a	partir	do	exterior?
A	 solução	 para	 essas	 questões,	 segundo	 o	 filósofo	 norte-americano	 Israel
Scheffler,	 encontra-se	 na	 terceira	 concepção	 de	 ensino	 por	 nós	 apresentada:
ensinar	 como	 é	 ensinar	 regras.	 É	 uma	 solução	 temporária,	 pois	 leva
inevitavelmente	à	pergunta:	como	as	regras	são	ensinadas?
No	conto	de	Julio	Cortázar	chamado	“Instruções	para	subir	uma	escada”,	as
dificuldades	já	começam	na	descrição	dos	degraus,	mas	o	próprio	autor	nos	avisa
para	 não	 confundirmos	 pé	 (direito)	 com	 pé	 (esquerdo),	 evitando	 “levantar	 ao
mesmo	tempo	pé	e	pé”.	Esse	conto	ilustra	muito	bem	o	que	Max	Black,	outro
filósofo	 norte-americano,	 quer	 dizer	 ao	 afirmar	 que	 não	 se	 podem	 explicar
verbalmente	todas	as	regras	e	que	só	nos	resta	ensiná-las	através	de	exemplos.
Podemos	recorrer	também	ao	filósofo	austríaco	Ludwig	Wittgenstein,	que	nos
indica	 o	 caráter	 social	 de	 seguir	 uma	 regra:	 aprendemos	 a	 seguir	 regras	 na
interação	 com	outros	seres	humanos,	seja	pela	imitação,	seja	pelas	indicações
que	os	outros	indivíduos	nos	dão	de	nossos	erros	e	acertos	ao	tentarmos	executar
uma	atividade.	Na	verdade,	os	dois	métodos	andam	juntos:	aprendemos	a	falar
imitando	os	nossos	pais	e	sendo	corrigidos	por	eles.
Apresento	brevemente,	a	partir	de	Ryle,	alguns	temas	que	permeiam	a	filosofia
analítica	da	educação,	em	que	dois	livros	se	destacam:	A	lógica	da	educação,
dos	ingleses	Paul	Hirst	e	Richard	Peters,	e	Linguagem	da	educação,	de	Israel
Scheffler.	 Esses	 livros,	 escritos	 na	 década	 de	 1960,	 têm	 como	 característica
comum	 a	 análise	 dos	 conceitos	 empregados	 na	 educação	 (tais	 como	 ensino,
desenvolvimento,	currículo)	e	dos	argumentos	que	são	utilizados	para	sustentar
os	princípios	educacionais.	O	método	dos	autores	parece	indicar	que	fazem	uma
investigação	neutra,	sem	emitirem	juízos	críticos	sobre	o	assunto.	A	aparência	é
falsa.	Ambos	os	livros	tratam	das	metas	da	educação	e	dos	métodos	para	atingi-
las,	o	que	implica	uma	análise	crítica.
Na	 década	 seguinte,	 entretanto,	 o	 termo	 “crítica”	 assume	 uma	 conotação
social,	e	surge	a	pedagogia	crítica,	que	é	uma	junção	do	marxismo	humanista,
da	Escola	de	Frankfurt,	com	a	pedagogia	do	oprimido,	de	Paulo	Freire.
Com	 o	 declínio	 da	 teoria	 marxista,	 a	 filosofia	 da	 educação,	 na	 década	 de
1990,	buscará	inspiração	na	filosofia	pós-marxista	francesa	de	Foucault,	Deleuze
e	 Derrida,	 os	 filósofos	 chamados	 de	 pós-estruturalistas,	 e	 de	 Lyotard	 e
Baudrillard,	os	teóricos	do	pós-modernismo.
De	 influência	 pós-estruturalista,	 temos	 a	 inserção	 de	 temas	 como	 o
feminismo,	multiculturalismo,	homossexualidade,	questões	étnicas	e	raciais.	O
pós-modernismo,	 por	 seu	 turno,	 legou	 os	 vários	 tipos	 de	 relativismo:
epistemológico,	cultural,	psicológico	etc.	É	preciso	frisar,	no	entanto,	que	não	há
uma	 definição	 clara	 nem	 uma	 distinção	 rigorosa	 entre	 essas	 duas	 correntes
intelectuais,	quando	se	trata	das	teorias	educacionais,	de	tal	modo	que	ambas	são
usualmente	colocadas	na	rubrica	pós-modernismo.
A	tese	básica	da	teoria	educacional	pós-moderna	é	a	de	que	o	conhecimento
—	em	especial,	o	conhecimento	científico	—	não	é	resultado	da	observação	de
como	 as	 coisas	 são	 na	 natureza,	 mas	 das	 relações	 de	 poder	 na	 sociedade
(entendendo-se	 por	 “poder”,	 além	 do	 poder	 político	 ou	 econômico,	 o	 poder
masculino,	 o	 poder	 do	 homem	 branco,	 o	 poder	 do	 europeu	 etc.),	 o	 que,
obviamente,	 retira	 do	 conhecimento	 (inclusive	 o	 científico)	 qualquer
objetividade.
As	 conseqüências	 que	 são	 extraídas	 dessa	 tese	 são	 tão	 variadas	 quanto	 é
diverso	aquilo	que	está	sob	a	rubrica	“pós-moderno”,	mas,	em	geral,	os	autores
não	 oferecem	 alternativas	 à	 epistemologia	 tradicional,	 apenas	 limitando-se	 a
criticá-la.	Quando	são	propositivos,	muitas	vezes	suas	propostas	não	trazem	nada
de	 realmente	 novo.	 Nesse	 cenário,	 Usher	 e	 Edwards,	 defensores	 do	 pós-
modernismo,	afirmam	que	“…	o	papel	do	professor	não	é	transmitir	conteúdo,
mas	 guiar	 os	 estudantes	 através	 de	 pacotes	 de	 aprendizagem	 e	 dotá-los	 de
habilidades	para	aprenderem	através	deste	método”.	Ora,	afirmar	que	o	papel	do
professor	 não	 é	 transmitir	 conhecimento,	 e	 sim	 desenvolver	 habilidades	 nos
alunos	 é,	 como	 vimos,	 uma	 idéia	 compartilhada	 por	 inúmeros	 filósofos	 do
passado	e	do	presente.
Quanto	à	concepção	de	que	não	existe	conhecimento	objetivo,	ela	vem	sendo
criticada	por	vários	filósofos,	inclusive	por	aqueles	que	se	dedicam	à	educação.
Entre	esses	últimos,	podemos	citar	Harvey	Siegel,	que	aponta	inconsistência	nos
defensores	 do	 pós-modernismo,	 visto	 que,	 quando	 afirmam	 que	 não	 existe
conhecimento	 objetivo,	 estão	 supondo	 que	 essa	 tese	 é	 objetiva,	 o	 que	 a
contradiz.	Caso	considerem,	contudo,	que	a	tese	não	é	objetiva	(não	indica	uma
verdade	 sobre	 o	 mundo),	 então	 é	 possível	 que	 exista	 conhecimento	 objetivo;
portanto,	a	tese	não	prova	nada.
Reformistas
A	primeira	teoria	filosófica	envolvendo	a	reforma	social	e	a	educação	ocorre	no
diálogo	A	República,	de	Platão,	que	será	exposto	a	seguir.	Na	filosofia	moderna,
a	idéia	da	reforma	social	sofre	uma	modificação	drástica	com	a	obra	Emílio,	de
Rousseau,	 na	 qual	 é	 o	 indivíduo	 o	 foco	 das	 mudanças	 que	 a	 educação	 pode
proporcionar.	Já	na	filosofia	contemporânea,	um	filósofo	marxista	reflete	sobre	a
tragédia	do	seu	tempo	—	o	nazismo	na	Europa	—	e	sugere	o	que	a	educação
pode	fazer	para	evitar	que	tal	tragédia	se	repita.
São	três	concepções	muito	distantes	no	tempo,	e	tal	distância	se	reflete	em
suas	teses.	O	que	existe	de	comum	entre	elas	é	a	crítica	à	forma	como	os	estados
estavam	organizados	em	suas	respectivas	épocas	e	a	convicção	de	que,	através
da	educação,	é	possível	mudar	a	forma	como	a	sociedade	está	estruturada.
Platão.	Foi	o	primeiro	filósofo	a	pensar	em	erigir	uma	nova	sociedade	com	base
na	 educação,	 que	 é	 um	 dos	 temas	 principais	 da	 sua	 obra	 mais	 conhecida,	 A
República.	Como	qualquer	reformador	social,	Platão	inicia	apontando	as	causas
da	 degeneração	 do	 Estado.	 No	 início,	 a	 sociedade	 surge	 para	 satisfazer	 às
necessidades	básicas	dos	indivíduos,	o	que	implica	a	divisão	de	trabalho	entre
agricultores,	 tecelões,	 pedreiros	 etc.	 Com	 o	 tempo,	 a	 sociedade	 cresce,	 seus
membros	 não	 se	 contentam	 mais	 com	 a	 satisfação	 das	 necessidades	 básicas	 e
criam	 novas	 necessidades,	 fazendo	 surgir	 a	 sociedade	 do	 luxo.	 É	 interessante
notar	que,	também	para	Rousseau,	é	no	surgimento	de	necessidades	artificiais
que	ocorre	a	corrupção	da	sociedade.	O	filósofo	grego,	contudo,	não	propõe	o
retorno	a	uma	sociedade	pequena	e	sã,	mas	teoriza	sobre	o	melhor	modo	de	se
manter	uma	grande	sociedade.
A	 solução,	 ele	 a	 encontra	 fundamentalmente	 na	 educação	 dos	 líderes	 da
sociedade.	 Antes,	 porém,	 é	 preciso	 estabelecer	 uma	 hierarquia	 para	 o	 Estado
ideal.	 Na	 hierarquia	 que	 Platão	 propõe,	 encontramos	 três	 classes:	 a	 dos
agricultores	e	artesãos,	a	dos	guardiões	(os	soldados)	e	a	dos	reis-filósofos.	Os
indivíduos	que	comporão	cada	uma	dessas	classes	serão	escolhidos	pelas	suas
qualidades.	No	caso	dos	guardiões,	as	qualidades	são	a	força	física	e	a	coragem,
uma	vez	que	serão	eles	que	protegerão	o	Estado.	A	escolha	é	mais	interessante
no	que	se	refere	aos	filósofos,	pois	eles	serão	escolhidos	entre	os	que	“quando
contarem	 cinqüenta	 anos	 …	 se	 tiverem	 se	 destacado	 em	 tudo	 e	 de	 toda	 a
maneira,	no	trabalho	e	na	ciência,	deverão	ser	levados	até	o	limite,	e	forçados	a
inclinar	a	luz	radiosa	da	alma	para	a	contemplação	do	Ser	que	dá	luz	a	todas	as
coisas;	 depois	 de	 terem	 visto	 o	 bem	 em	 si,	 usá-lo-ão	 como	 paradigma	 para
ordenar	a	cidade	…”.
Os	 filósofos,	 que	 serão	 os	 governantes	 do	 Estado	 “por	 amor	 à	 cidade,
fazendo	assim	não	porque	é	bonito,	mas	porque	é	necessário”,	são	escolhidos
mediante	avaliação	de	suas	aptidões	intelectuais	e	morais,	que,	por	sua	vez,	são
desenvolvidas	 na	 educação	 dos	 guardiões.	 É	 na	 educação	 desses	 que	 Platão
expõe	a	sua	teoria	geral	sobre	a	educação.
A	formação	do	homem	grego	inclui	tanto	a	educação	da	mente	quanto	a	do
corpo.	Com	relação	a	esta	última,	caberá	à	ginástica	desenvolver	as	capacidades
do	corpo,	mas	Platão	não	dedica	muito	espaço	para	a	discussão	dessa	disciplina,
pois	seu	interesse	está	voltado	para	a	educação	da	mente.
É	 com	 relação	 à	 mente	 que	 Platão	 apresenta	 a	 sua	 tese	 mais	 polêmica:	 a
rejeição	da	poesia,	inclusive	a	de	Homero,	como	forma	de	educação.	É	preciso
ter	 claro,	 antes	 de	 qualquer	 coisa,	 que	 a	 educação	 dos	 jovens	 gregos	 dava-se
através	dos	poemas	épicos	e	do	teatro;	assim,	esse	tipo	de	literatura	assumia	uma
importância	 muito	 maior	 na	 formação	 dos	 indivíduos	 do	 que	 a	 que	 tem
atualmente.	 E	 Platão	 critica	 o	 fato	 de	 as	 crianças	 serem	 ensinadas	 a	 partir	 da
mentira,	ou	seja,	da	ficção.	Platão	vê	a	poesia	como	uma	imitação	da	realidade	e
entende	 que	 existe	 o	 perigo	 de	 aqueles	 que	 sejam	 educados	 por	 meio	 dela
imitarem	os	personagens	que	demonstram	um	comportamento	imoral.	Visto	que
a	educação	deve	visar	à	perfeição	dos	educandos,	é	a	música	que	melhor	cumpre
a	função	de	educar,	“…	porque	o	ritmo	e	a	harmonia	penetram	mais	fundo	na
alma	e	afetam-na	mais	fortemente,	trazendo	consigo	a	perfeição	…”.
Contudo,	como	vimos	no	início	deste	livro,	o	conhecimento	mais	elevado	é
concebido	como	aquele	que	trata	das	verdades	eternas	e	imutáveis,	como,	por
exemplo,	as	da	matemática.	O	modo	de	se	obter	esse	conhecimento	é	o	exercício
da	dialética,	que	Platão	define	como	o	raciocínio	que	parte	de	hipóteses	para	“
…	ir	até	aquilo	que	não	admite	hipóteses,	que	é	o	princípio	de	tudo	…	fixando-
se	em	todas	as	conseqüências	que	daí	decorrem,	até	chegar	à	conclusão,	sem	se
servir	 em	 nada	 de	 qualquer	 dado	 sensível,	 mas	 passando	 das	 idéias	 umas	 às
outras,	e	terminando	em	idéias	…”.
É	o	conhecimento	das	verdades	imutáveis	e	eternas,	as	idéias,	em	especial	o
conhecimento	 da	 idéia	 de	 bem,	 que	 permite	 aos	 filósofos	 serem	 os	 melhores
governantes.	 Desse	 modo,	 a	 educação	 prepara	 os	 indivíduos	 para	 cumprirem
suas	 funções	 nas	 três	 classes	 que	 constituem	 a	 sociedade,	 criando	 um	 Estado
onde	existe	harmonia	entre	os	seus	cidadãos,	que	é	o	Estado	ideal.
Rousseau.	 O	 filósofo	 inicia	 o	 seu	 livro	 sobre	 a	 educação,	 Emílio	 ou	 Da
Educação,	afirmando	que	o	melhor	livro	sobre	a	educação	pública	é	A	República
de	 Platão.	 O	 que	 não	 significa	 que	 seguirá	 os	 passos	 do	 filósofo	 grego,	 pois
Rousseau	 julga	 que	 os	 colégios	 de	 sua	 época	 não	 merecem	 o	 título	 de
instituições	públicas	e	que	a	educação	deve	estar	a	cargo	da	família.
Emílio	é	uma	obra	que	visa	a	nortear	a	educação	privada	—	aquela	oferecida
pelos	 pais	 —	 tendo	 por	 objetivo	 preparar	 o	 indivíduo	 para	 a	 vida	 no	 Estado.
Contudo,	 assim	 como	 Platão,	 Rousseau	 critica	 o	 Estado	 de	 sua	 época,
concentrando	as	suas	censuras	nas	relações	sociais	entre	os	indivíduos,	relações
essas	 marcadas	 pela	 dissimulação	 e	 pelo	 empenho	 em	 satisfazer	 falsas
necessidades.
O	indivíduo	em	sociedade	perdeu	a	capacidade	de	avaliar	a	si	mesmo,	pois
precisa	reconhecer	o	seu	valor	por	meio	da	comparação	com	os	outros	membros
da	 sociedade:	 “O	 homem	 da	 sociedade	 está	 por	 inteiro	 na	 sua	 máscara.”	 Ao
transformar	os	outros	em	espelho,	o	indivíduo	forja	novas	necessidades	para	si
mesmo,	 necessidades	 artificiais,	 cuja	 única	 função	 é	 satisfazer	 o	 jogo	 de
aparências	de	uma	vida	social	deturpada.
Nesse	jogo,	o	indivíduo	se	esforça	para	obter	bens	que	não	são	necessários
para	 atender	 suas	 necessidades	 reais,	 mas	 para	 servir	 como	 trunfo	 na	 sua
comparação	com	os	outros.	Isso	gera	pessoas	gananciosas	e	invejosas,	que,	por
mais	 que	 obtenham	 bens,	 continuam	 insatisfeitas,	 uma	 vez	 que	 os	 bens	 são
usados	para	satisfazer	necessidades	puramente	fantasiosas.
A	solução	para	o	conflito	social,	gerado	pela	ganância,	também	é	uma	forma
de	se	evitar	a	infelicidade	dos	sujeitos:	levar	uma	vida	autêntica.	Desse	modo,
Rousseau	pode	unir	a	reforma	social	a	uma	mudança	na	atitude	dos	homens.	Não
é	 uma	 reforma	 que	 parte	 da	 sociedade	 para	 o	 indivíduo,	 pelo	 contrário,	 é
educando	 os	 indivíduos	 para	 uma	 vida	 autêntica	 que	 se	 podem	 modificar	 as
relações	entre	os	indivíduos	na	sociedade.
O	problema	central	da	filosofia	da	educação	rousseauniana,	portanto,	é	o	de
como	 desenvolver	 nas	 pessoas	 o	 desejo	 e	 as	 condições	 de	 levar	 uma	 vida
autêntica.	 Na	 solução	 desse	 problema,	 está	 envolvido	 o	 famoso	 conceito	 do
“bom	selvagem”.
Em	 primeiro	 lugar,	 é	 preciso	 esclarecer	 que	 Rousseau	 não	 pretende
transformar	 os	 homens	 civilizados	 em	 selvagens:	 “…	 querendo	 formar	 um
homem	de	natureza,	nem	por	isso	se	trata	de	fazer	dele	um	selvagem,	de	jogá-lo
no	 fundo	 da	 floresta	 …	 .	 O	 progresso	 natural	 do	 espírito	 é	 acelerado,	 nunca
invertido.	 O	 mesmo	 homem	 que	 deve	 permanecer	 estúpido	 na	 floresta	 deve
tornar-se	racional	nas	cidades	…	.”	Não	se	trata,	portanto,	de	fazer	regredir	a
civilização.	Pelo	contrário,	o	filósofo	pretende	acelerar	o	seu	progresso	com	o
cultivo	do	espírito	daqueles	que	a	compõem.
A	solução	para	o	problema	reside	em	educar	a	criança	e	o	jovem	para	não	se
deixarem	 levar	 pelas	 necessidades	 artificiais,	 o	 que	 implica	 educá-los	 para	 a
busca	 da	 satisfação	 das	 necessidades	 naturais,	 ou	 seja,	 o	 encontro	 da	 vida
autêntica	na	vida	natural.
A	educação	deve	começar	seguindo	os	princípios	naturais,	uma	vez	que	os
“primeiros	 movimentos	 da	 natureza	 são	 sempre	 retos”,	 e	 entre	 estes	 o	 mais
básico	 é	 a	 autopreservação,	 que	 gera	 uma	 paixão	 que	 estará	 conosco	 durante
toda	a	vida:	o	amor	a	si	mesmo.	Mas,	na	medida	em	que	o	indivíduo	entra	para	a
sociedade,	 fica	 dependente	 da	 aprovação	 social	 dos	 outros,	 e	 o	 amor	 de	 si	 é
substituído	pelo	amor-próprio,	que	é	a	fonte	de	toda	ganância	e	inveja;	além	do
mais,	 como	 o	 amor-próprio	 demanda	 que	 os	 outros	 nos	 amem	 mais	 que	 a	 si
mesmos,	o	que	é	impossível,	“o	amor-próprio	…	nunca	está	satisfeito”.
O	 cultivo	 do	 amor	 de	 si	 permite	 ao	 homem	 atingir	 a	 felicidade,	 pois	 as
necessidades	a	que	se	dedica,	por	serem	naturais,	são	passíveis	de	satisfação,	e	a
satisfação	das	necessidades	naturais	torna-o	bondoso	com	os	outros,	visto	que,
segundo	o	filósofo,	é	o	excesso	de	necessidades	que	torna	o	homem	mau.
Na	vida	em	sociedade,	as	pessoas,	para	cultivarem	o	amor	de	si,	precisam
desenvolver	 seu	 senso	 crítico,	 que	 lhes	 permite	 distinguir	 as	 necessidades
naturais	 daquelas	 oriundas	 da	 ostentação	 social,	 a	 fim	 de	 que	 não	 se	 tornem
gananciosas	e	formem	uma	sociedade	onde	cada	um	deseje	apenas	aquilo	de	que
precisa	—	uma	sociedade	de	homens	livres.
Adorno.	A	filosofia	sempre	viveu	a	tensão	entre	pensar	o	universal	e	atemporal	e
refletir	sobre	o	que	é	particular	e	situado	no	tempo.	No	caso	da	análise	política
da	 educação,	 o	 que	 predominou	 foi	 o	 segundo	 tipo	 de	 reflexão.	 Theodor	 W.
Adorno,	contudo,	foi	o	único	filósofo	a	pensar	a	filosofia	da	educação	a	partir	de
um	único	evento:	os	campos	de	concentração	nazistas.
Adorno	participou	de	um	movimento	de	renovação	do	marxismo,	iniciado	na
primeira	metade	do	século	XX:	a	Escola	de	Frankfurt.	Além	dele,	fizeram	parte
desse	 movimento	 os	 filósofos	 Walter	 Benjamin,	 Max	 Horkheimer,	 Herbert
Marcuse	 e,	 mais	 tarde,	 Jürgen	 Habermas.	 Esses	 filósofos	 mantiveram	 do
marxismo	 o	 conceito	 de	 classes	sociais	 e	 o	 de	 ideologia,	 mas	 acrescentaram
conceitos	oriundos	da	psicanálise,	retomaram	conceitos	da	filosofia	de	Hegel	e
reavivaram	de	Kant	a	idéia	de	uma	filosofia	crítica.
O	 principal	 texto	 que	 Adorno	 escreveu	 sobre	 a	 educação	 é	 o	 artigo
“Educação	 após	 Auschwitz”.	 Nele	 estabelece	 um	 princípio	 geral	 para	 a
educação,	baseado	num	fato	histórico:	“A	exigência	de	que	Auschwitz	não	se
repita	é	a	primeira	de	todas	para	a	educação.”	Transformar	um	fato	histórico,
algo	puramente	contingente,	num	princípio	universal	para	a	educação	justifica-se
porquanto	 esse	 fato	 instancia	 um	 processo	 universal	 da	 história	 humana:	 a
possibilidade	de	a	civilização	tornar-se	o	seu	oposto,	a	barbárie.
Esse	processo	é	analisado	no	livro	Dialética	do	Esclarecimento,	escrito	em
parceria	 com	 Horkheimer.	 A	 civilização	 deriva	 da	 necessidade	 do	 homem	 de
dominar	 a	 natureza,	 não	 apenas	 a	 natureza	 externa,	 mas	 também	 a	 natureza
interna:	 seus	 impulsos	 animais.	 Esses	 impulsos,	 contudo,	 podem	 ser
domesticados,	jamais	anulados;	e	quanto	maior	é	a	força	utilizada	para	reprimi-
los,	 mais	 pressão	 eles	 exercem	 para	 vir	 à	 tona.	 Fatalmente,	 as	 forças
civilizatórias	 sucumbem	 ao	 poder	 atávico	 de	 nossos	 impulsos	 naturais,	 e	 o
caminho	 está	 preparado	 para	 a	 irrupção	 da	 barbárie,	 pois	 o	 selvagem	 que	 se
encontra	adormecido	no	homem	civilizado,	ao	despertar,	tem	a	seu	dispor	todo	o
poder	destrutivo	da	tecnologia	—	aquilo	que	a	civilização	criou	para	dominar	a
natureza	volta-se	contra	ela	própria.	Essa	é	a	dialética	que	explica	tanto	o	rigor
científico	dos	campos	de	concentração	nazista,	quanto	o	das	armas	nucleares.
O	conceito	fundamental	para	se	entender	o	processo	é	o	“esclarecimento”:	o
esforço	 intelectual	 que	 a	 humanidade	 realizou	 para	 se	 elevar	 da	 pura
animalidade.	Apesar	de	o	livro	ser	uma	crítica	ao	esclarecimento,	os	autores	não
o	estão	negando.	 Pelo	 contrário,	 eles	 utilizam	 a	 noção	 kantiana	 de	 crítica,	 ou
seja,	 a	 análise	 de	 uma	 capacidade	 humana	 para	 estabelecer	 seus	 verdadeiros
limites:	“Não	alimentamos	dúvida	nenhuma	…	de	que	a	liberdade	na	sociedade	é
inseparável	do	pensamento	esclarecedor”,	mas	esse	conceito	“contém	o	germe
da	regressão	[à	barbárie]”,	que	é	o	seu	limite,	e,	se	“o	esclarecimento	não	acolhe
dentro	de	si	a	reflexão	sobre	esse	elemento	regressivo	…”,	poderá	causar	a	sua
própria	destruição.
Não	é	difícil	concluir	que	a	tarefa	da	educação	é	esclarecer	o	esclarecimento:
“A	 educação	 tem	 sentido	 unicamente	 como	 educação	 dirigida	 a	 uma	 reflexão
crítica.”	 É	 importante	 usar	 aqui	 o	 termo	 “esclarecimento”	 em	 vez	 de
“racionalidade”,	porque,	como	Adorno	enfatiza	em	entrevistas	que	concedeu	à
Rádio	de	Hessen,	razão	muitas	vezes	é	tomado	como	se	referindo	à	“capacidade
formal	 de	 pensar”,	 quando	 o	 que	 “caracteriza	 a	 consciência	 é	 o	 pensar	 em
relação	à	realidade,	ao	conteúdo”.	O	esclarecimento	é	a	racionalidade	em	ação.
Sua	 primeira	 meta	 é	 a	 sobrevivência,	 e,	 para	 realizá-la,	 precisa	 dominar	 a
natureza,	 mas	 se	 não	 refletir	 sobre	 si	 mesmo,	 este	 impulso	 para	 a	 dominação
poderá	dominá-lo,	fazendo	eclodir	dessa	dominação	a	irracionalidade,	a	barbárie.
Apesar	de	o	filósofo	não	pretender	apresentar	uma	metodologia	de	ensino,
ele	 indica	 alguns	 objetivos	 para	 a	 educação	 crítica;	 dentre	 eles,	 o	 mais
importante	é	o	fortalecimento	da	personalidade,	o	que	não	implica	legitimar	o
individualismo,	visto	que	este	surge	de	uma	motivação	exterior	ao	indivíduo	—
somos	 condicionados	 a	agir	segundo	 a	 máxima	 do	 “cada	 um	 por	 si”	 —,	 mas
desenvolver	no	indivíduo	a	capacidade	de	liberar	seu	pensamento	da	ideologia
dominante.
Outro	 aspecto	 do	 projeto	 adorniano	 que	 queremos	 ressaltar	 é	 a	 sua
preocupação	com	a	diferença	cultural	entre	o	campo	e	a	cidade.	Ele	cita	o	livro
de	 Eugen	 Kogon,	 O	 Estado	 da	 SS,	 segundo	 o	 qual	 os	 algozes	 do	 campo	 de
concentração	 onde	 Kogon	 esteve	 preso	 eram,	 na	 sua	 maioria,	 filhos	 de
camponeses.	Adorno	atribui	a	essa	triste	constatação	o	fato	de	que,	no	campo,	“o
insucesso	da	desbarbarização	foi	ainda	maior”	do	que	na	cidade.	E	sugere,	como
estratégia	 para	 mudar	 essa	 situação,	 que	 “colunas	 educacionais	 móveis	 de
voluntários”	 se	 dirijam	 ao	 campo	 e	 “…	 procurem	 preencher	 as	 lacunas	 [de
formação]	mais	graves	por	meio	de	discussões,	de	cursos	e	de	ensino	…”.
É	 interessante	 notar	 que,	 na	 mesma	 época	 —	 década	 de	 1960	 —	 em	 que
Adorno	 fazia	 esses	 comentários,	 Paulo	 Freire,	 no	 Recife,	 organizava	 um
movimento	 de	 alfabetização	 e	 “conscientização”	 de	 adultos	 no	 meio	 rural.	 A
conscientização	 consiste	 em	 desenvolver	 no	 indivíduo	 a	 habilidade	 de	 refletir
sobre	a	“sua	condição	de	pessoa,	por	isso,	de	sujeito”.
Assim,	 apesar	 de	 Freire	 não	 mencionar	 a	 barbárie,	 percebemos	 que	 a
finalidade	 do	 seu	 processo	 de	 educação	 é	 a	 mesma	 proposta	 por	 Adorno:
desenvolver	 o	 senso	 crítico	 nos	 indivíduos,	 o	 que	 implica,	 antes	 de	 qualquer
coisa,	o	fortalecimento	da	personalidade.	O	que	também	envolve,	como	diz	o
educador	brasileiro,	a	“democratização	da	cultura”	—	e	cabe	ter	em	mente	que
as	pessoas	do	campo	têm	mais	dificuldade	para	ter	acesso	à	cultura	universal	do
que	as	da	cidade;	por	isso,	é	fundamental	levar	até	elas	aquilo	que	a	humanidade
produziu.
A	filosofia	de	Adorno	e	dos	outros	filósofos	da	Escola	de	Frankfurt,	junto
com	 a	 teoria	 educacional	 de	 Paulo	 Freire,	 inspirou	 os	 criadores	 da	 Pedagogia
Crítica,	 principalmente	 na	 crítica	 que	 esses	 teóricos	 fazem	 à	 razão	 científica,
afirmando	que	é	pouco	reflexiva	e	sobrepondo	a	ela	a	razão	dialética,	que,	além
de	crítica,	inclui	a	subjetividade	e	a	cultura	nas	análises	educacionais.
Aperfeiçoadores
A	 diferença	entre	reformistas	 e	aperfeiçoadores	 é	 mais	 clara	 no	 que	 tange	 às
teorias	de	Platão	e	Aristóteles,	pois	o	primeiro	propõe	uma	reforma	radical	na
sociedade,	enquanto	a	proposta	do	segundo	é	a	de	que	cada	sociedade	tenha	uma
educação	 condizente	 com	 a	 sua	 forma	 de	 governo.	 Podemos	 ver	 ecos	 da
concepção	de	Aristóteles	em	filósofos	modernos	como	Hobbes	e	Hegel,	que	não
escreveram	livros	sobre	o	assunto,	mas	dedicaram	algumas	passagens	de	suas
obras	ao	tema.	Na	filosofia	contemporânea,	a	distinção	que	fazemos	já	não	é	tão
clara.	Adorno,	que	colocamos	sob	a	rubrica	dos	reformadores,	e	o	filósofo	norte-
americano	 John	 Dewey,	 classificado	 como	 aperfeiçoador,	 apesar	 de	 todas	 as
diferenças	 filosóficas	 e	 mesmo	 políticas	 —	 Adorno	 é	 marxista,	 Dewey	 é	 um
liberal	—,	concordam	numa	questão	fundamental:	a	educação	deve	preparar	os
cidadãos	 para	 viverem	 de	 forma	 responsável	 numa	 democracia.	 Assim,	 a
classificação	que	propomos	deve	ser	vista	tão-somente	como	um	expediente	para
agrupar	concepções	filosóficas	que	têm	apenas	algumas	semelhanças.
Aristóteles.	Diferentemente	de	Platão,	Aristóteles	afirma	que	“…	o	cidadão	deve
ser	 moldado	 para	 se	 adequar	 à	 forma	 de	 governo	 sob	 a	 qual	 vive,	 pois	 cada
governo	tem	um	caráter	peculiar	o	qual	originalmente	o	formou	e	que	continua	a
preservá-lo”.	 Ao	 invés	 de	 propor	 a	 criação	 de	 um	 Estado	 ideal,	 Aristóteles
estabelece	 as	 condições	 para	 a	 melhor	 realização	 e	 manutenção	 dos	 Estados
existentes,	mas	não	justifica	a	existência	de	qualquer	tipo	de	Estado,	nem	afirma
que	a	estabilidade	do	Estado	seja	mais	importante	que	o	bem-estar	dos	cidadãos
—	 numa	 passagem	 da	 Política,	 livro	 em	 que	 desenvolve	 sua	 teoria	 sobre	 a
relação	entre	política	e	educação,	ele	censura	os	gregos	de	sua	época	por	não
terem	“…	estruturado	seus	governos	visando	ao	melhor	fim,	ou	de	não	terem
dado	leis	e	educação	visando	a	atingir	todas	as	excelências	…”.
A	última	palavra	citada	—	“excelências”	—	ilustra	muito	bem	a	função	que	o
filósofo	 confere	 à	 política:	 desenvolver	 todas	 as	 potencialidades	 intelectuais	 e
morais	dos	cidadãos.	Portanto,	a	educação	dos	cidadãos	não	visa	apenas	a	torná-
los	obedientes	às	leis	do	Estado	—	Aristóteles,	aliás,	afirma	que	a	educação	dos
governantes	e	a	educação	dos	governados	devem	ser	idênticas,	pelo	menos	no
sentido	de	que	“…	aquele	que	deve	aprender	a	governar	deve	antes,	como	se	diz,
aprender	a	obedecer”	—,	uma	vez	que	a	função	do	Estado	não	é	apenas	manter-
se	ou	garantir	o	bem-estar	de	uma	minoria,	mas	proporcionar	o	melhor	modo	de
vida	a	todos	os	cidadãos.
A	finalidade	do	Estado	coincide	com	a	finalidade	da	vida	do	indivíduo	—	e
qual	será	esta?	Aristóteles	percebe	que	é	aquilo	a	que	os	homens	chamam	de
felicidade.	Mas,	quando	se	trata	de	caracterizar	o	que	é	a	felicidade,	as	coisas	se
complicam,	 pois	 pode	 ser	 o	 prazer,	 a	 riqueza,	 a	 saúde,	 a	 honra;	 contudo,	 “…
alguns	pensam	que,	ao	lado	desses	bens,	existe	outro	que	é	o	bem	em	si	mesmo
…”,	sendo	um	dos	temas	principais	do	livro	Ética	a	Nicômaco	o	bem	supremo.
Além	dessa	definição	de	felicidade,	o	filósofo	apresenta	a	felicidade	como	uma
atividade	e	distingue	dois	tipos:	corpórea	e	racional.
Assim	como	Platão,	Aristóteles	privilegia	o	segundo	tipo	de	atividade:	“…
felicidade	 é	 uma	 atividade	 da	 alma	 que	 visa	 à	 completa	 excelência	 …	 .”	 As
excelências	 de	 um	 ser	 racional	 são	 de	 dois	 tipos:	 morais	 e	 intelectuais.	 A
primeira	é	adquirida	por	meio	do	hábito,	enquanto	a	segunda,	apesar	de	existir
em	 nós	 desde	 o	 nascimento,	 em	 potência,	 precisa	 ser	 desenvolvida	 pela
educação.	 Desse	 modo,	 para	 o	 filósofo,	 a	 felicidade	 é	 atingida	 por	 meio	 da
educação.	E,	uma	vez	que	a	felicidade	do	cidadão	é	a	meta	do	Estado,	cabe	a
este	educar	todos	os	cidadãos,	ou	seja,	a	educação	deve	ser	pública.
Mas	 o	 que	 se	 deve	 aprender	 para	 atingir	 a	 excelência	 intelectual?	 Em
primeiro	lugar,	é	preciso	o	ócio	—	e,	na	sociedade	da	época	de	Aristóteles,	o
ócio	de	uns	era	obtido	graças	ao	trabalho	escravo	de	outros.	Com	tempo	livre
disponível,	o	indivíduo	pode	se	dedicar	à	mais	elevada	atividade	intelectual:	a
contemplação	da	verdade,	que	compreende	o	uso	puramente	teórico	da	razão.	No
livro	 Metafísica,	 Aristóteles	 afirma	 que	 a	 esse	 uso	 correspondem	 “…	 três
filosofias	teóricas:	matemática,	ciência	natural	e	teologia	…”,	mas	é	claro	que	a
educação	 compreende	 também	 outras,	 que	 serão	 as	 etapas	 necessárias	 para
chegar	a	tal	uso	da	razão.
Seguindo	 a	 tradição	 grega,	 o	 sistema	 educacional	 proposto	 por	 Aristóteles
principia	com	o	desenvolvimento	do	corpo,	aqui	incluído	desde	os	cuidados	com
a	 nutrição	 do	 recém-nascido	 até	 a	 ginástica	 para	 os	 jovens.	 Após,	 vêm	 a
alfabetização	 e	 o	 ensino	 das	 artes.	 Com	 relação	 às	 artes,	 Aristóteles	 também
concorda	com	Platão	ao	escolher	a	música	como	a	mais	elevada	e	investiga	se
esta	 poderia	 desenvolver	 o	 caráter	 moral	 dos	 indivíduos,	 com	 o	 que	 parece
concordar.
Contudo,	ele	oferece	um	outro	motivo	para	a	educação	musical:	Aristóteles
julga	 que	 a	 melhor	 forma	 de	 aproveitar	 o	 ócio	 é	 a	 propiciada	 pela	 música:
“Todos	os	homens	concordam	que	a	música	é	uma	das	coisas	mais	prazerosas
que	 existem	 …	 .”	 Deste	 modo,	 dedicar-se	 ao	 prazer	 da	 música	 conduz	 à
felicidade.
Na	teoria	aristotélica,	a	função	da	educação	é	adequar	o	indivíduo	à	forma	de
governo	na	qual	vive,	o	que	não	implica,	contudo,	uma	simples	acomodação	dos
interesses	 do	 indivíduo	 aos	 interesses	 dos	 governantes,	 pois	 o	 interesse
primordial	do	Estado	é	o	bem-estar	dos	indivíduos.	Por	conseguinte,	o	Estado
deve	 providenciar	 a	 educação	 mais	 adequada	 para	 que	 o	 indivíduo	 possa
desenvolver	a	atividade	que	é	o	bem	viver,	ou	seja,	a	felicidade.
Dewey.	 No	 início	 do	 século	 XX,	 a	 democracia	 moderna	 ainda	 estava	 se
anunciando	 na	 Europa,	 enquanto	 se	 desenvolvia	 nos	 Estados	 Unidos.	 Tal
desenvolvimento	 foi	 uma	 preocupação	 constante	 na	 vida	 do	 filósofo	 norte-
americano	John	Dewey,	que,	ao	lado	de	William	James	e	Charles	Pierce,	é	um
dos	expoentes	do	pragmatismo	—	a	escola	filosófica	cujo	principal	objetivo	é
estudar	 o	 pensamento	 humano	 a	 partir	 das	 conseqüências	 empíricas	 do
significado	de	nossas	idéias	e	do	uso	da	linguagem.
O	pragmatismo	de	Dewey	tem	como	característica	principal	a	interpretação
do	 pensamento	 como	 um	 dos	 processos	 vitais	 que	 constituem	 o	 ser	 humano.
Todo	processo	vital	nada	mais	é	do	que	o	esforço	que	o	organismo	realiza	para
manter	a	sua	organização,	ou	seja,	a	sua	vida.	Assim,	há	uma	continuidade	entre
os	 processos	 biológicos	 e	 os	 processos	 intelectuais,	 sendo	 o	 pensamento	 o
resultado	 do	 processo	 evolutivo	 do	 ser	 humano.	 A	 evolução	 pressupõe	 a
transmissão	 de	 características	 de	 uma	 geração	 a	 outra,	 o	 que	 pode	 ocorrer	 de
maneira	 puramente	 biológica,	 mas	 o	 pensamento	 não	 é	 apenas	 biológico	 —
“pensar	e	sentir	…	são	modos	sociais	de	comportamento	…”	—,	o	que	implica	a
transmissão	social	do	comportamento	pela	educação.
Dewey	 contrapõe	 ao	 naturalismo	 rousseauniano	 o	 idealismo	 hegeliano:	 as
capacidades	 intelectuais	 do	 indivíduo	 não	 se	 desenvolvem	 espontaneamente	 a
partir	 de	 sua	 natureza,	 sendo	 a	 sociedade	 um	 impedimento	 ao	 correto
desenvolvimento	de	tais	capacidades,	como	pensa	Rousseau;	pelo	contrário,	é
preciso	aprender	com	Hegel	que	as	nossas	capacidades	intelectuais	são	formadas
a	partir	da	interação	social,	que	gera	a	linguagem,	a	cultura,	o	governo,	a	arte	e	a
religião.	 A	 origem	 das	 capacidades	 cognitivas	 pode	 ser	 natural,	 mas	 o	 seu
desenvolvimento	 se	 dá	 na	 interação	 do	 indivíduo	 com	 as	 instituições	 sociais.
Uma	 vez	 que	 a	 sociedade	 nada	 mais	 é	 do	 que	 a	 reunião	 dos	 indivíduos,
desenvolvê-los	 culturalmente	 é	 o	 modo	 de	 manter	 a	 cultura	 da	 sociedade	 e,
mesmo,	 aperfeiçoá-la.	 A	 educação,	 portanto,	 tem	 a	 finalidade	 de	 manter	 e
desenvolver	a	sociedade.
A	 rejeição	 ao	 naturalismo	 implica	 recusar	 a	 concepção	 da	 política
educacional	 de	 Rousseau:	 “…	 a	 doutrina	 de	 seguir	 a	 natureza	 é	 um	 dogma
político,	ela	significa	a	rebelião	contra	todas	as	instituições,	costumes	e	ideais
sociais	existentes.”	Isso	não	significa	que	o	objetivo	da	educação	seja	domesticar
os	homens	a	fim	de	facilitar	a	sua	subordinação	a	outros	homens.	Pelo	contrário,
“…	 a	 eficiência	 social	 não	 é	 obtida	 através	 do	 cerceamento	 das	 capacidades
naturais	 do	 indivíduo,	 mas	 do	 seu	 uso	 em	 ocupações	 que	 tenham	 significado
social”.
É	 claro	 que	 o	 filósofo	 norte-americano	 não	 acredita	 que	 qualquer
organização	social	possa	desenvolver	as	capacidades	naturais	do	indivíduo.	Por
isso,	defende	o	aperfeiçoamento	da	democracia.	É	preciso,	contudo,	dirimir	um
possível	mal-entendido	com	relação	às	convicções	políticas	de	Dewey:	ele	ser
um	defensor	do	liberalismo	não	significa	que	defenda	a	versão	contemporânea
do	 liberalismo	 econômico	 que	 desobriga	 o	 grande	 capital	 de	 seus	 encargos
sociais;	 pelo	 contrário,	 o	 filósofo	 defendia	 o	 que	 mais	 tarde	 foi	 chamado	 de
liberalismo-social,	ou	seja,	um	sistema	democrático	onde	haja	um	controle	social
que	 impeça	 o	 surgimento	 de	 grandes	 desigualdades	 entre	 os	 indivíduos.	 Esse
controle	social	não	se	dará	por	uma	intervenção	direta	do	governo,	mas	através
da	educação,	uma	vez	que	uma	educação	democrática	possibilita	“…	uma	ordem
social	mais	equânime	e	esclarecida	…”.
O	 próprio	 conceito	 de	 liberdade,	 que	 o	 filósofo	 defende,	 é	 baseado	 na
interação	social:	“…	a	 essência	da	demanda	por	liberdade	é	a	necessidade	de
condições	que	permitam	a	um	indivíduo	fazer	a	sua	contribuição	aos	interesses
do	grupo	e	participar	das	suas	atividades	de	tal	modo	que	a	orientação	social	seja
originada	em	seus	próprios	atos	mentais	…”.
No	 conceito	 de	 liberdade	 está	 implicado	 o	 conceito	 de	 autonomia	 de
pensamento.	Dewey	sabe	que	“pensar	por	si	mesmo”	é	um	pleonasmo;	por	isso,
quando	fala	de	pensamento	próprio,	refere-se	a	pensar	com	originalidade,	algo
que	só	pode	ser	desenvolvido	graças	à	educação.
Assim,	 a	 educação	 é	 um	 conceito-chave	 em	 toda	 a	 filosofia	 política	 de
Dewey:	a	democracia	 é	um	sistema	político	que	permite	conciliar	a	liberdade
com	a	harmonia	social,	mas	isso	só	pode	ser	alcançado	através	de	uma	educação
que	faça	jus	a	esse	sistema,	ou	seja,	uma	educação	para	a	democracia.
O	principal	livro	que	Dewey	escreve	sobre	esse	tópico	chama-se	Democracia
e	 educação.	 Apesar	 de	 não	 o	 dizer	 explicitamente,	 nesse	 livro	 ele	 trata	 da
educação	pública,	universal	e	gratuita	—	a	única	forma	de	educação	compatível
com	seu	ideal	de	uma	democratização	da	sociedade.
Vimos,	logo	acima,	que	a	liberdade	do	indivíduo,	que	é	fundamental	numa
sociedade	democrática,	significa	autonomia	de	pensamento;	por	isso,	Dewey,	no
livro	 mencionado,	 estabelece	 o	 método	 educacional	 que	 melhor	 convém	 a	 tal
autonomia.
Além	de	 criticar	a	 concepção	naturalista	 rousseauniana	da	educação	 como
desdobramento	de	poderes	latentes,	também	refuta	a	concepção	mais	tradicional
de	educação	como	uma	formação	vinda	do	exterior,	oferecendo	como	alternativa
a	educação	como	uma	permanente	reconstrução	da	experiência:	“…	[educação]
é	a	reconstrução	ou	reorganização	da	experiência	que	acrescenta	significado	a
esta	e	aumenta	a	habilidade	para	dirigir	a	experiência	subseqüente.”
A	 proposta	 de	 metodologia	 educacional	 do	 filósofo	 norte-americano
apresenta	uma	certa	similaridade	com	a	de	Locke	(e	mesmo	com	a	de	Kant),	na
medida	em	que	entende	como	tarefa	do	professor	desenvolver	no	aluno	a	sua
capacidade	de	interpretar	a	experiência,	o	que	implica	a	construção	de	hipóteses,
que,	por	sua	vez,	precisam	ser	testadas	por	meio	de	novos	experimentos	—	as
“experiências	 subseqüentes”.	 Assim,	 a	 educação	 consiste	 mais	 no
desenvolvimento	 de	 habilidades	 cognitivas	 do	 que	 na	 transmissão	 de
conhecimento.	 É	 claro	 que	 o	 desenvolvimento	 dessas	 habilidades	 também
aumenta	 a	 capacidade	 de	 raciocínio	 crítico	 do	 aluno,	 o	 que	 contribui	 para	 o
desenvolvimento	 de	 sua	 autonomia	 —	 uma	 meta	 prioritária	 no	 projeto
educacional	deweyano,	como	vimos.
A	tarefa	da	escola	é	proporcionar	um	ambiente	onde	a	aprendizagem	se	dê
por	 meio	 de	 experimentos,	 cabendo	 ao	 professor	 planejar	 as	 atividades	 de
pesquisa,	de	tal	forma	que	correspondam	aos	interesses	dos	alunos,	ao	mesmo
tempo	em	que	sejam	desafiadoras.	Todo	o	ambiente	de	ensino	deve	favorecer	a
cooperação	entre	os	alunos,	a	fim	de	prepará-los	para	viverem	numa	sociedade
democrática.	Mas	o	filósofo	faz	uma	ressalva:	“…	é	dever	do	ambiente	escolar
equilibrar	os	vários	elementos	do	ambiente	social,	e	providenciar	que	cada	um
tenha	a	oportunidade	de	escapar	das	limitações	do	grupo	social	no	qual	nasceu
…	.”	Segundo	o	liberalismo-social	de	Dewey,	numa	sociedade	democrática	os
indivíduos	devem	ter	a	liberdade	de	escolher	sua	profissão	e	de	transitar	entre	os
diversos	grupos	sociais	que	a	compõem,	sendo	tarefa	da	 educação	 prover	 aos
indivíduos	tal	liberdade.
Esse	é	um	dos	aspectos	da	educação	numa	sociedade	democrática	enfatizado
por	 Anísio	 Teixeira	 no	 artigo	 “O	 processo	 democrático	 de	 educação”.	 O
educador	baiano,	idealizador	da	Universidade	de	Brasília	(UnB)	e	signatário	do
Manifesto	da	Escola	Nova	de	1932,	foi	aluno	de	Dewey	e	trouxe	as	idéias	de	seu
professor	 para	 o	 Brasil.	 No	 referido	 artigo,	 afirma	 “que	 todos	 os	 homens	 são
suficientemente	 educáveis	 para	 conduzir	 a	 vida	 em	 sociedade	 de	 forma	 a	 que
cada	um	e	todos	dela	partilhem	como	iguais”.
À	 luz	 da	 filosofia	 de	 Dewey,	 o	 programa	 de	 educação	 democrática	 de
Teixeira	 compreende	 a	 substituição	 das	 diferenças	 de	 classe	 pelas	 diferenças
individuais,	a	fim	de	“…	reconstruí-las	e	integrá-las	em	uma	experiência	mais
larga	…	visando	o	estabelecimento	de	uma	verdadeira	fraternidade	humana”.
Considerações	finais
O	 processo	 educacional	 é	 um	 processo	 de	 aquisição	 de	 conhecimento,	 mas	 é
mais	do	que	isso:	a	educação	deve	desenvolver	os	instrumentos	por	meio	dos
quais	 adquirimos	 o	 conhecimento.	 Esta	 é	 a	 tese	 básica	 tanto	 dos	 empiristas
quanto	 daqueles	 que	 classificamos	 como	 defensores	 da	 concepção
transcendental.	Estes	e	aqueles,	na	filosofia	contemporânea,	concebem	o	ensino
como	 um	 processo	 cuja	 finalidade	 não	 é	 apenas	 informar	 o	 aluno,	 mas
desenvolver	 nele	 a	 capacidade	 de	 procurar	 e	 processar	 informações.	 É
importante	notar,	ainda,	que	também	a	concepção	idealista	não	vê	na	educação
um	 processo	 de	 memorização	 de	 conhecimento.	 Todas	 as	 três	 concepções
enfatizam,	 portanto,	 a	 educação	 como	 um	 meio	 para	 o	 desenvolvimento	 das
capacidades	intelectuais	dos	seres	humanos.	A	atividade	educacional	também	é
vista	 como	 um	 meio	 para	 harmonizar	 as	 relações	 entre	 os	 seres	 humanos,
evitando	que	apenas	em	virtude	da	coação	estatal	os	cidadãos	respeitem	as	leis
que	garantem	a	ordem	na	sociedade.
Para	 alguns	 filósofos,	 contudo,	 é	 por	 meio	 da	 educação	 que	 se	 pode	 criar
uma	nova	organização	social	—	esse	é	o	caso,	como	vimos,	das	propostas	de
Platão	 e	 Rousseau.	 Mas	 também	 aqui	 há	 um	 aspecto	 comum	 entre	 todas	 as
teorias	filosóficas	abordadas:	uma	vez	que	a	política	é	uma	maneira	de	garantir
uma	 boa	 vida	 para	 os	 cidadãos,	 a	 educação,	 mesmo	 quando	 deve	 preparar	 as
pessoas	para	viverem	sob	o	tipo	de	Estado	no	qual	nasceram,	sempre	visará	às
melhores	condições	de	vida	possíveis.
Seleção	de	textos
Educação	e	Estado
Não	há	dúvidas	de	que	o	legislador	deve	se	preocupar,	acima	de	tudo,	com	a
educação	das	crianças,	porque	negligenciá-la	prejudica	o	Estado.	O	cidadão	deve
ser	 moldado	 para	 se	 adequar	 à	 forma	 de	 governo	 sob	 a	 qual	 vive,	 pois	 cada
governo	tem	um	caráter	peculiar	que	originalmente	o	formou	e	que	continua	a
preservá-lo.	O	caráter	democrático	perpetua	a	democracia	e	o	caráter	oligárquico
mantém	a	oligarquia,	e	quanto	melhor	o	caráter,	melhor	o	governo.
Para	o	exercício	de	qualquer	faculdade	ou	arte	requer-se	um	treinamento	ou
hábito	prévio,	o	mesmo	ocorrendo	para	o	exercício	da	virtude.	E,	visto	que	a
cidade-Estado,	como	um	todo,	tem	uma	única	e	mesma	finalidade,	a	educação
deve	 ser	 una	 e	 idêntica	 para	 todos;	 por	 conseguinte,	 deve	 ser	 pública,	 e	 não
privada.	 Embora	 atualmente	 cada	 um	 cuide	 da	 educação	 de	 seus	 filhos	 da
maneira	que	julga	melhor,	a	aprendizagem	das	coisas	comuns	deve	ser	a	mesma
para	todos.	Tampouco	deve-se	supor	que	os	cidadãos	pertençam	a	si	mesmos,
visto	 que	 todos	 pertencem	 ao	 Estado,	 e	 cada	 um	 é	 parte	 do	 Estado,	 sendo	 o
cuidado	de	cada	parte	inseparável	do	cuidado	com	o	todo.	Neste	aspecto,	como
em	outros,	os	lacedemônios	devem	ser	louvados,	uma	vez	que	eles	se	dedicam
bastante	às	suas	crianças	e	fazem	da	educação	uma	tarefa	do	Estado.
Ninguém	nega	que	a	educação	deve	ser	regulada	pela	lei	e	ser	um	assunto	do
Estado,	 mas	 qual	 deve	 ser	 o	 caráter	 da	 educação	 pública	 e	 como	 os	 jovens
devem	ser	educados	são	questões	que	precisam	ser	investigadas.	Como	as	coisas
estão,	 existe	 desacordo	 com	 respeito	 a	 este	 assunto.	 Não	 se	 sabe	 se	 devemos
ensiná-los	a	ser	virtuosos	ou	a	ter	uma	vida	melhor,	tampouco	está	claro	se	a
educação	 diz	 respeito	 à	 formação	 intelectual	 ou	 à	 moral.	 As	 práticas
educacionais	atuais	dificultam	a	questão:	devemos	ensinar	aquilo	que	é	útil	para
a	vida,	o	que	é	virtuoso,	ou	o	conhecimento	mais	elevado?	As	três	alternativas
possuem	 defensores.	 Também	 não	 há	 consenso	 com	 relação	 aos	 métodos
educacionais.	 Uma	 vez	 que	 pessoas	 diferentes	 têm	 concepções	 diferentes	 a
respeito	do	que	seja	a	virtude,	elas	irão	discordar	quanto	à	prática	desta.
Não	há	dúvida	de	que	às	crianças	devam	ser	ensinadas	coisas	úteis,	mas	não
todas	as	coisas	úteis,	pois	as	ocupações	são	divididas	entre	liberais	e	servis,	e
deve-se	 ensinar	 aos	 jovens	 apenas	 aquele	 conhecimento	 útil	 que	 não	 os
transforme	em	artesãos.	E	chamamos	de	ocupação	de	artesão	toda	a	ocupação,
arte	ou	ciência	que	não	torna	o	corpo	e	a	mente	ou	alma	de	um	homem	livre
adequados	 à	 prática	 ou	 ao	 exercício	 da	 virtude.	 Damos	 o	 mesmo	 nome	 às
ocupações	que	deformam	o	corpo	e,	igualmente,	a	todo	trabalho	pago,	porque
degradam	a	mente.
Existem	também	artes	liberais	que	são	adequadas	a	um	homem	livre	apenas
em	 certo	 grau,	 uma	 vez	 que,	 se	 ele	 as	 praticar	 com	 afinco	 visando	 atingir	 a
perfeição,	seguir-se-ão	os	mesmos	efeitos	negativos.	A	grande	diferença	consiste
na	intenção	que	motiva	o	trabalho	ou	o	estudo:	se	ele	faz	ou	aprende	algo	por
interesse	 próprio,	 ou	 de	 seus	 amigos,	 ou	 visando	 a	 virtude,	 então	 a	 ação	 não
parecerá	 servil;	 mas	 a	 mesma	 ação,	 se	 feita	 para	 outros,	 será	 tida	 como
mercenária	e	servil.	As	concepções	atuais	da	educação,	como	já	disse,	têm,	em
parte,	um	caráter	liberal,	em	parte,	um	caráter	servil.
Aristóteles,	Política,	livro	8,	1337a10-1337b22
Educação	e	conhecimento
Um	homem	pode	ensinar	outro	homem?
1ª	objeção.	Parece	que	um	homem	não	pode	ensinar	outro,	porque	o	Senhor	diz
(Mt.,	 23:8):	 “Não	 queirais	 ser	 chamado	 Rabi	 (meu	 mestre).”	 A	 glosa	 de
Jerônimo	diz	o	seguinte	a	este	respeito:	“Não	dê	ao	homem	a	honra	devida	a
Deus.”	Portanto,	ser	mestre	é	uma	honra	que	pertence	a	Deus.	Como	pertence	ao
mestre	ensinar,	o	homem	não	pode	ensinar,	sendo	essa	tarefa	apropriada	a	Deus.
2ª	objeção.	Além	do	mais,	se	um	homem	ensina	outro,	ele	o	faz	através	de	seu
próprio	 conhecimento,	 a	 fim	 de	 causar	 conhecimento	 no	 outro.	 Mas	 uma
qualidade	 que	 envolve	 ação	 para	 produzir	 outra	 que	 lhe	 assemelhe	 é	 uma
qualidade	ativa.	Segue-se	que	o	conhecimento	é	uma	qualidade	ativa,	como	o
calor.
3ª	objeção.	Além	disto,	para	se	obter	conhecimento	requer-se	a	luz	intelectual,	e
a	espécie	da	coisa	compreendida.	Mas	um	homem	não	pode	causar	nada	disto
em	outro.	Logo,	um	homem,	através	do	ensino,	não	pode	causar	conhecimento
em	outro.
4ª	objeção.	O	professor	não	faz	nada	em	relação	ao	aluno	além	de	lhe	propor
alguns	signos,	de	modo	a	significar	algo	através	de	palavras	ou	gestos.	Mas	não
é	possível	ensinar	conhecimento	a	alguém	através	dos	signos,	pois	serão	signos
de	coisas	que	ele	sabe	ou	não	sabe.	Se	são	de	coisas	que	ele	sabe,	então	ele	já
tem	o	conhecimento	da	coisa	e	não	precisa	de	um	mestre.	Se	são	de	coisas	que
não	sabe,	não	poderá	aprender	nada	através	destes;	por	exemplo:	se	um	homem
falar	 em	 grego	 para	 alguém	 que	 só	 sabe	 latim,	 este	 não	 aprenderá	 nada.
Conseqüentemente,	 um	 homem	 não	 pode	 causar	 conhecimento	 em	 outro
ensinando-o.
Mas,	em	contrário,	são	Paulo	diz	(1º	Tm,	2:7):	“Por	Cristo	fui	constituído
pregador	e	apóstolo	…	mestre	dos	gentis	na	fé	e	na	verdade.”
Respondo	a	essa	questão	afirmando	que	sobre	ela	existem	várias	opiniões.
Segundo	o	comentário	de	Averroes	ao	[livro	de	Aristóteles]	De	Anima	iii,	todos
os	homens	possuem	um	intelecto	passivo.	Disto	se	segue	que	todos	os	homens
possuem	as	mesmas	espécies	inteligíveis,	o	que	o	leva	a	concluir	que	um	homem
não	pode	incutir	em	outro	um	conhecimento	distinto	daquele	que	possui,	mas
que	 comunica	 o	 mesmo	 conhecimento	 que	 possui	 movendo	 de	 maneira
apropriada	os	fantasmas	em	sua	alma	a	fim	de	estarem	corretamente	dispostos
para	a	apreensão	inteligível.	Esta	opinião	é	verdadeira	somente	na	medida	em
que	 o	 conhecimento	 é	 o	 mesmo	 no	 discípulo	 e	 no	 mestre,	 se	 consideramos	 a
identidade	da	coisa	conhecida,	pois	a	mesma	verdade	objetiva	é	conhecida	por
ambos.	Entretanto,	quando	mantém	que	todos	os	homens	têm	o	mesmo	intelecto
passivo	 e	 as	 mesmas	 espécies	 inteligíveis,	 diferindo	 apenas	 quanto	 aos	 vários
fantasmas,	a	opinião	de	Averroes	é	falsa.
Existe,	além	do	mais,	a	opinião	dos	platônicos,	que	sustentam	que	a	alma
possui	 conhecimento	 desde	 o	 seu	 início,	 através	 da	 participação	 das	 formas
separadas,	mas	que	é	impedida,	em	virtude	da	sua	união	com	o	corpo,	da	livre
consideração	 das	 coisas	 que	 já	 conhece.	 De	 acordo	 com	 esta	 concepção,	 o
discípulo	não	adquire	novo	conhecimento	de	seu	mestre,	apenas	é	levado	por
este	a	considerar	o	que	já	conhece,	de	tal	forma	que	aprender	nada	mais	é	do	que
rememorar.	Da	mesma	maneira,	eles	sustentam	que	os	agentes	naturais	apenas
nos	predispõem	a	receber	formas	que	a	matéria	adquire	através	da	participação
de	substâncias	distintas.	Contra	esta	concepção,	no	entanto,	já	provamos	que	o
intelecto	passivo	da	alma	humana	está	em	pura	potencialidade	com	relação	ao
inteligível	(species),	como	Aristóteles	afirmou	(De	anima,	iii,	4).
Devemos,	 por	 conseguinte,	 resolver	 o	 problema	 de	 modo	 diferente,
afirmando	que	o	professor	causa	conhecimento	no	aprendiz	fazendo-o	passar	da
potencialidade	ao	ato,	como	Aristóteles	disse	(Física,	viii,	4).	A	fim	de	tornar
isto	 claro,	 precisamos	 notar	 que,	 dos	 efeitos	 que	 resultam	 de	 um	 princípio
exterior,	alguns	procedem	apenas	deste,	como	a	forma	da	casa,	que	é	causada	na
matéria	 apenas	 pela	 arte	 do	 arquiteto;	 enquanto	 outros	 efeitos	 originam-se,	 às
vezes,	de	um	princípio	exterior,	outras	vezes	de	um	princípio	interior:	assim,	a
cura	é,	algumas	vezes,	alcançada	num	homem	doente	através	de	um	princípio
exterior,	 a	 arte	 médica,	 e,	 noutras,	 por	 meio	 de	 um	 princípio	 interior,	 como
quando	um	homem	é	curado	pela	força	da	natureza.
Com	 relação	 a	 esses	 efeitos,	 duas	 coisas	 devem	 ser	 notadas.	 Em	 primeiro
lugar,	 a	 arte	 imita	 a	 maneira	 como	 a	 natureza	 cura	 um	 homem:	 alterando,
digerindo	ou	expulsando	a	matéria	que	causou	a	doença.	Em	segundo	lugar,	é
preciso	ter	claro	que	o	princípio	exterior,	a	arte,	age	não	como	o	agente	principal,
mas	ajudando	o	agente	principal,	o	princípio	interior,	fortalecendo-o	e	dando-lhe
instrumentos	 e	 assistência	 que	 serão	 utilizados	 por	 ele	 para	 produzir	 o	 efeito.
Desse	modo,	o	médico	fortalece	a	natureza	e	emprega	comida	e	remédios	que
serão	utilizados	pela	natureza	para	produzir	o	fim	almejado.
Ora,	o	conhecimento	é	adquirido	pelo	homem,	tanto	de	um	princípio	interior,
que	 fica	 claro	 no	 caso	 do	 homem	 que	 produz	 conhecimento	 através	 da
descoberta	pessoal,	quanto	de	um	princípio	exterior,	como	no	caso	daquele	que
recebe	 um	 ensinamento,	 pois	 em	 todo	 homem	 há	 um	 certo	 princípio	 de
conhecimento,	a	saber,	a	luz	do	intelecto	ativo,	através	do	qual	certos	princípios
universais	 de	 todas	 as	 ciências	 são	 naturalmente	 conhecidos	 assim	 que	 são
apresentados	 ao	 intelecto.	 Quando	 alguém	 aplica	 estes	 princípios	 universais	 a
uma	coisa	particular,	cuja	memória	ou	experiência	adquire	através	dos	sentidos,
então,	 por	 sua	 própria	 investigação,	 indo	 do	 conhecido	 ao	 desconhecido,	 ele
obtém	conhecimento	daquilo	que	não	conhecia.	Logo,	qualquer	um	que	ensina
leva	o	discípulo	das	coisas	que	ele	conhecia	às	coisas	que	não	conhece,	o	que
está	em	acordo	com	o	que	Aristóteles	diz	(Analíticos	posteriores,	i,	1):	“Todo
conhecimento	 e	 toda	 aquisição	 de	 conhecimento	 partem	 de	 um	 conhecimento
preexistente.”
são	Tomás	de	Aquino,	Suma	teológica,
1ª	parte,	questão	117,	1º	artigo
O	ensino	através	do	raciocínio
§81.	Talvez	possa	causar	estranheza	que	eu	mencione	raciocinar	com	crianças:
não	posso,	no	entanto,	deixar	de	pensar	que	esta	é	a	única	maneira	de	lidar	com
elas.	As	crianças	compreendem	isto	assim	que	começam	a	utilizar	a	linguagem,
e,	a	menos	que	me	engane,	adoram	ser	tratadas	como	criaturas	racionais	mais
cedo	do	que	se	imagina.	Este	orgulho	deve	ser	acalentado	e	usado,	tanto	quanto
possível,	como	um	grande	instrumento	para	transformá-las.
Porém,	quando	falo	de	raciocínio,	não	me	refiro	a	nada	além	daquilo	que	é
apropriado	à	capacidade	e	à	compreensão	da	criança.	Ninguém	pode	imaginar
um	 menino	 de	 três	 ou	 sete	 anos	 respondendo	 a	 perguntas	 como	 um	 adulto.
Longos	discursos	e	raciocínios	filosóficos	no	máximo	assombram	e	confundem,
mas	 não	 instruem	 as	 crianças.	 Quando	 digo,	 portanto,	 que	 elas	 devem	 ser
tratadas	 como	 criaturas	 racionais,	 quero	 dizer	 que	 você	 deve	 sensibilizá-las
com	 brandura	 na	 sua	 criação	 e	 manter	 a	 serenidade	 mesmo	 no	 castigo,	 para
mostrar	a	elas	que	o	que	você	faz	é	racional,	necessário	e	útil	para	o	bem	delas,
não	sendo	as	suas	ordens	o	resultado	de	mero	caprichio	(capricho),	paixão	ou
fantasia.	Elas	são	capazes	de	compreender	isto	e	não	creio	que	não	possamos
convencê-las	a	seguir	a	virtude	e	afastar-se	do	vício,	desde	que	isso	seja	feito
com	raciocínios	adequados	a	sua	idade	e	compreensão,	usando	palavras	simples
e	 em	 pouca	 quantidade.	 As	 fundações	 sobre	 as	 quais	 vários	 deveres	 são
edificados	e	as	fontes	do	certo	e	do	errado	dos	quais	nascem	estes	deveres	não
são	 fáceis	 de	 serem	 inculcadas	 na	 mente	 de	 homens	 adultos	 que	 não	 estejam
habituados	a	abstrair	seus	pensamentos	de	opiniões	recebidas	do	senso	comum.
Muito	 menos	 são	 as	 crianças	 capazes	 de	 raciocinar	 a	 partir	 de	 princípios
distantes.	 Elas	 não	 entendem	 a	 força	 de	 longas	 deduções:	 as	 razões	 que	 as
movem	 devem	 ser	 óbvias	 e	 niveladas	 aos	 seus	 pensamentos	 quase	 como	 se
pudessem	 ser	 sentidas	 e	 tocadas.	 Mas,	 se	 a	 sua	 idade,	 têmpera	 e	 inclinações
forem	levadas	em	conta,	nunca	faltarão	motivos	suficientes	para	convencê-las.
Se	 não	 existir	 outro	 motivo	 mais	 particular,	 ainda	 assim	 estes	 serão	 sempre
inteligíveis	e	terão	força	para	detê-las	de	qualquer	falta	que	possam	cometer,	do
tipo	que	poderá	envergonhá-las,	desonrá-las	e	desagradar	aos	pais.
§82.	De	todos	os	modos	pelos	quais	uma	criança	pode	ser	instruída	e	formar	seu
comportamento,	o	mais	simples,	fácil	e	eficiente	é	colocar	diante	dos	seus	olhos
exemplos	daquelas	coisas	que	você	quer	que	ela	faça	ou	evite	fazer,	as	quais,
quando	 são	 apresentadas	 através	 da	 prática	 de	 pessoas	 que	 conhecem,	 com
alguma	reflexão	sobre	sua	beleza	ou	inconveniência,	têm	mais	força	para	impelir
ou	 impedir	 que	 as	 imitem	 do	 que	 qualquer	 discurso.	 Virtudes	 e	 vícios	 não
podem,	 pelas	 palavras,	 ser	 tão	 facilmente	 inculcados	 em	 seu	 entendimento
quanto	 a	 contemplação	 das	 ações	 de	 outros	 homens,	 quando	 você	 orienta	 sua
observação	a	fim	de	que	percebam	esta	ou	aquela	boa	ou	má	qualidade	em	sua
prática.	E	a	beleza	ou	inconveniência	de	muitas	coisas	com	respeito	à	boa	ou	má
educação	 será	 mais	 bem	 aprendida	 e	 causará	 uma	 impressão	 mais	 profunda
através	dos	exemplos	dos	outros	do	que	de	qualquer	regra	ou	instruções	que	lhes
forem	oferecidas.
Este	é	um	método	a	ser	usado	não	apenas	com	aqueles	que	são	jovens,	mas
com	aqueles	que	continuam	sob	o	ensino	ou	direção	de	alguém.	Eu	creio	que
esta	é	a	melhor	maneira	a	ser	usada	por	um	pai	enquanto	ele	julgar	adequado
corrigir	 o	 seu	 filho:	 nada	 penetra	 mais	 profunda	 e	 gentilmente	 na	 mente	 dos
homens	 do	 que	 um	 exemplo.	 E	 o	 que	 eles	 inadequadamente	 indultam	 em	 si
mesmos	causa	desgosto	e	vergonha	quando	é	mostrado	através	de	outro.
…
§118.	 A	 curiosidade	 nas	 crianças	 não	 é	 nada	 além	 de	 um	 desejo	 por
conhecimento	 e	 deve,	 pois,	 ser	 encorajada,	 não	 só	 como	 um	 bom	 sinal,	 mas
como	 o	 grande	 instrumento	 que	 a	 natureza	 providenciou	 para	 remover	 a
ignorância	com	a	qual	nasceram,	a	qual,	sem	a	curiosidade,	faria	delas	criaturas
estúpidas	 e	 inúteis.	 Os	 modos	 de	 encorajá-las	 a	 manterem	 esta	 atividade,	 eu
suponho,	são	os	seguintes:
1.	Não	rejeitar	nem	desdenhar	de	qualquer	indagação	feita	pelo	infante,	ou	rir	de
suas	dúvidas,	mas	responder	todas	as	suas	questões	e	explicar	os	assuntos	que
ele	deseja	conhecer,	de	modo	a	torná-los	inteligíveis	e	apropriados	a	sua	idade	e
conhecimento.	 Porém,	 não	 confunda	 seu	 entendimento	 com	 explicações	 que
estão	 para	 além	 dele	 ou	 com	 uma	 variedade	 ou	 número	 de	 coisas
despropositadas.	Note	qual	o	objetivo	da	sua	mente	na	questão,	e	não	o	que	suas
palavras	expressam;	e,	quando	você	o	tiver	informado	e	satisfeito,	com	relação
ao	assunto,	verá	como	os	seus	pensamentos	aumentarão	a	si	mesmos,	e	como,
através	 das	 respostas	 apropriadas,	 ele	 pode	 ser	 levado	 além	 daquilo	 que	 você
imagina,	 visto	 que	 o	 conhecimento	 agrada	 ao	 entendimento,	 como	 a	 luz	 aos
olhos.	 As	 crianças	 o	 adoram,	 especialmente	 se	 elas	 percebem	 que	 as	 suas
investigações	são	levadas	a	sério	e	se	o	seu	desejo	de	conhecimento	é	encorajado
e	 elogiado.	 E	 não	 tenho	 dúvida	 de	 que	 a	 grande	 razão	 de	 as	 crianças	 se
dedicarem	inteiramente	a	divertimentos	bobos	e	gastarem	seu	tempo	de	modo
insípido	 é	 porque	 tiveram	 sua	 curiosidade	 obstada	 e	 suas	 inquirições
negligenciadas.	Mas	se	tivessem	sido	tratadas	com	mais	ternura	e	respeito,	se
suas	questões	fossem	respondidas,	não	tenho	dúvidas	de	que	teriam	mais	prazer
em	 aprender	 e	 aperfeiçoar	 seu	 conhecimento	 nos	 assuntos	 que	 oferecessem
variedade	e	novidade	do	que	em	retornar	aos	mesmos	divertimentos.
…
§120.	 Assim	 como	 as	 inquirições	 das	 crianças	 não	 devem	 ser	 desprezadas,
também	 deve-se	 cuidar	 para	 que	 nunca	 recebam	 respostas	 enganadoras	 e
evasivas.	 Elas	 facilmente	 percebem	 quando	 estão	 sendo	 desconsideradas	 ou
enganadas	 e	 rapidamente	 aprendem	 a	 ser	 negligentes,	 dissimuladas	 e	 falsas
quando	observam	outros	fazerem	o	mesmo.	Não	devemos	fugir	da	verdade	em
qualquer	conversa,	muito	menos	com	as	crianças,	uma	vez	que,	ao	sermos	falsos
com	 elas,	 não	 estamos	 apenas	 frustrando	 suas	 expectativas	 e	 impedindo	 seu
conhecimento,	 mas	 estamos	 corrompendo	 sua	 inocência	 e	 lhes	 ensinando	 os
piores	vícios.	Elas	são	viajantes	recém-chegados	a	uma	terra	estranha,	da	qual
não	sabem	nada;	devemos,	portanto,	ter	em	mente	não	as	enganar.	E	mesmo	que
suas	 questões	 pareçam	 algumas	 vezes	 não	 serem	 pertinentes,	 devem	 ser
respondidas	 com	 diligência,	 pois,	 ainda	 que	 nos	 pareçam	 (a	 quem	 já	 são
conhecidas	 por	 muito	 tempo)	 inquirições	 sem	 mérito,	 elas	 não	 são	 menos
importantes	para	quem	é	totalmente	ignorante.	Crianças	ignoram	aquilo	que	nos
é	mais	familiar	e	tudo	com	o	que	se	deparam	é	desconhecido	para	elas,	como	já
foi	um	dia	para	nós,	e	felizes	são	aqueles	que	encontram	pessoas	cordiais	que
percebem	sua	ignorância	e	as	ajudam	a	sair	dela.
…
John	Locke,	Some	Thoughts	Concerning	Education,
p.58-9	e	93-4
O	ensino	através	da	experiência
A	experiência	consiste	primariamente	em	relações	ativas	entre	um	ser	humano	e
seu	 ambiente	 natural	 e	 social.	 Em	 alguns	 casos,	 a	 iniciativa	 parte	 do	 lado	 do
ambiente;	os	esforços	dos	seres	humanos	sofrem	certas	frustrações	e	desvios.	Em
outros	casos,	o	procedimento	das	coisas	e	pessoas	do	ambiente	leva	a	desfecho
favorável	as	tendências	ativas	do	indivíduo,	de	modo	que,	afinal	aquilo	que	o
indivíduo	sofre	ou	sente	são	as	conseqüências	que	tentou	produzir.	Exatamente
na	proporção	em	que	se	estabelecem	conexões	entre	aquilo	que	sucede	a	uma
pessoa	e	o	que	ela	faz	em	resposta,	e	entre	aquilo	que	a	pessoa	faz	a	seu	meio	e	o
modo	 por	 que	 esse	 meio	 lhe	 corresponde,	 adquirem	 significação	 os	 atos	 e	 as
coisas	 que	 se	 referem	 a	 essa	 pessoa.	 Ela	 aprende	 a	 conhecer-se	 e	 também	 a
conhecer	 o	 mundo	 dos	 homens	 e	 das	 coisas.	 A	 educação	 praticada
intencionalmente	 (ou	 escolar)	 deveria	 apresentar	 um	 ambiente	 em	 que	 essa
interação	 proporcionasse	 a	 aquisição	 daquelas	 significações	 que	 são	 tão
importantes	que	se	tornam	por	sua	vez	instrumentos	para	a	ulterior	aquisição	de
conhecimentos.
Segundo	 o	 que	 já	 foi	 repetidamente	 salientado,	 a	 atividade	 extra-escolar
manifesta-se	 em	 condições	 que	 não	 foram	 propositadamente	 adaptadas	 para
incentivar	a	função	da	compreensão	e	a	formação	de	eficazes	atitudes	mentais.
Na	 proporção	 em	 que	 se	 produzem,	 os	 resultados	 são	 genuínos	 e	 vitais,	 mas
apresentam-se	 limitados	 por	 todas	 as	 espécies	 de	 circunstâncias.	 Algumas
tendências	 permanecem	 totalmente	 sem	 direção	 e	 sem	 desenvolvimento;	 para
outras,	 deparam-se	 apenas	 estímulos	 ocasionais;	 outras	 adquirem	 hábitos	 de
rotina	 em	 detrimento	 dos	 objetivos	 da	 iniciativa	 e	 inventividade	 ricas	 de
recursos.	A	função	da	escola	não	é	transportar	os	adolescentes	de	um	ambiente
ativo	para	outro	de	um	estudo	inerte	dos	registros	daquilo	que	outros	homens
aprenderam,	e	sim	levá-los	de	um	ambiente	de	atividades	relativamente	casuais
(casuais	em	relação	à	compreensão	e	à	inteligência	que	possam	proporcionar)
para	 outro	 de	 atividades	 selecionadas,	 tendo	 em	 vista	 servir	 de	 guias	 para	 o
aprendizado.	Um	ligeiro	exame	dos	métodos	aperfeiçoados	que	já	se	mostraram
eficazes	 para	 a	 educação	 revelará	 que	 eles	 se	 apegam,	 mais	 ou	 menos
conscientemente,	ao	fato	de	que	os	estados	“intelectuais”,	em	vez	de	se	oporem
aos	trabalhos	ativos,	representam	a	intelectualização	desses	trabalhos	práticos.
Resta-nos	aprender	mais	solidamente	esse	princípio.
As	 mudanças	 que	 se	 operam	 no	 conteúdo	 da	 vida	 social	 facilitam
consideravelmente	 a	 seleção	 da	 espécie	 de	 atividade	 que	 intelectuarizará	 os
brinquedos	e	os	trabalhos	escolares.	Se	pensarmos	no	ambiente	social	dos	gregos
e	 dos	 povos	 medievais,	 em	 que	 as	 atividades	 práticas	 que	 pudessem	 ser
exercitadas	com	bom	êxito	eram	em	sua	maioria	de	espécie	rotineira	e	inferior,	e
até	 de	 natureza	 servil,	 não	 nos	 surpreenderemos	 que	 os	 educadores	 desses
tempos	as	tenham	desdenhado	como	impróprias	para	cultivarem	a	inteligência.
Mas	o	caso	é	diferente	hoje,	tempo	em	que	até	os	serviços	domésticos,	os	da
agricultura	e	da	indústria,	assim	como	os	de	transporte	e	comunicações,	estão
impregnados	 do	 espírito	 da	 ciência	 aplicada.	 É	 verdade	 que	 muitos	 dos	 que
atualmente	se	dedicam	a	eles	não	têm	consciência	do	conteúdo	intelectual	de	que
seus	atos	pessoais	dependem.	Mas	esta	circunstância	apenas	produz	o	efeito	de
acrescentar	 mais	 um	 motivo	 para	 que	 o	 ensino	 escolar	 se	 utilize	 dessas
atividades,	de	modo	a	habilitar	a	próxima	geração	a	adquirir	uma	compreensão
que	 falta,	 geralmente,	 em	 nossos	 dias,	 podendo,	 assim,	 conduzirem-se	 seus
trabalhos,	não	mais	cegamente,	mas	com	inteligência.
John	Dewey,	Democracia	e	educação,	p.301-2
Referências	e	fontes
[1]	A	citação	é	do	diálogo	de	Platão	Mênon	(81	c,	numeração	marginal),	e	foi
retirada	 de	 Plato’s	 Meno	 in	 Focus,	 organizada	 por	 J.M.	 Day	 (Londres,
Routledge,	1994).
[2]	Extratos	da	obra	Sobre	o	mestre,	de	santo	Agostinho	(in	Santo	Agostinho,
col.	Os	Pensadores,	São	Paulo,	Nova	Cultural,	1987,	p.318	e	319).
[3]	As	passagens	são	de	obras	de	Locke,	Of	the	Conduct	of	the	Understanding
(Indianápolis,	 Hackett,	 1996,	 p.192,	 §19)	 e	 Some	 Thoughts	 Concerning
Education	(Indianápolis,	Hackett,	1996,	p.150,	§195),	respectivamente.
[4]	A	citação	é	extraída	da	obra	de	são	Tomás	de	Aquino,	Suma	teológica	(Porto
Alegre,	 Est,	 Sulina	 e	 UCS,	 1980,	 1ª	 parte,	 questão	 117,	 1o	 artigo),	 de	 onde
também	vêm	a	primeira	e	a	terceira	passagens	da	página	20.
[5]	A	segunda	citação	foi	retirada	da	obra	de	Aristóteles	Analíticos	posteriores
(I,	1,	71a1).
[6]	Kant,	Antropologie	du	point	de	vue	pragmatique	(Paris,	Vrin,	1991).
[7]	 Extratos	 do	 livro	 de	 Kant	 Sobre	 a	 pedagogia	 (Piracicaba,	 Unimep,	 1996,
p.74	e	71,	respectivamente).
[8]	Os	excertos	foram	retirados	da	obra	de	Whitehead,	Os	fins	da	educação	(São
Paulo,	Editora	Nacional	/	Editora	da	USP,	1969,	p.14,	31	e	32,	respectivamente).
[9]	A	citação	foi	extraída	do	texto	de	Ryle,	“Ensenãnza	y	entrenamiento”,	in	El
concepto	de	educación	(Buenos	Aires,	Paidos,	1969,	p.168).	Desse	mesmo	livro
vem	a	referência	da	página	25	a	Max	Black,	retirada	do	artigo	“Reglas	y	rutinas”
(p.148-67).
[10]	 A	 passagem	 foi	 extraída	 do	 livro	 de	 Robin	 Usher	 e	 Richard	 Edwards,
Postmodernism	and	Education	(Londres,	Routledge,	1994,	p.179).
[11]	A	referência	a	Harvey	Siegel	é	baseada	no	que	ele	afirma	na	página	30	do
livro	 Education,	 Knowledge	 and	 Truth:	 Beyond	 the	 Postmodern	 Impasse,
organizado	por	David	Carr	(Londres,	Routledge,	1998).
[12]	 Excertos	 do	 diálogo	 platônico	 A	República	 (540a,	 540b,	 401e	 e	 511b-c,
respectivamente,	numeração	marginal).
[13]	 e	 [14]	 Citações	 de	 Rousseau,	 Emílio	 ou	 Da	 educação	 (Rio	 de	 Janeiro,
Bertrand	Brasil,	1995,	p.258,	291,	78	e	236,	respectivamente).
[15]	 Passagem	 de	 Adorno	 publicada	 no	 livro	 Educação	 e	 emancipação	 (São
Paulo,	Paz	e	Terra,	2000,	p.119).
[16]	A	primeira	citação	é	de	Adorno	e	Horkheimer,	Dialética	do	Esclarecimento
(Rio	 de	 Janeiro,	 Jorge	 Zahar,	 1986,	 p.13);	 as	 outras	 são	 de	 Educação	 e
emancipação	(op.cit.,	p.121,	151	e	126,	respectivamente).
[17]	As	citações	de	Paulo	Freire	vêm	de	Educação	como	prática	da	liberdade
(Rio	de	Janeiro,	Paz	e	Terra,	1967,	p.120).
[18]	As	citações	de	Aristóteles	vêm	de	Política	(1337a	12,	1333b	6,	1333a	2	e
1139b	 20,	 numeração	 marginal),	 Ética	 a	 Nicômaco	 (1095a27	 e	 1102a5)	 e
Metafísica	(1026a19).
[19]	 Trechos	 da	 obra	 de	 Dewey,	 Democracy	 and	 Education	 (Nova	 York,
Macmillan,	1966,	p.12,	20,	30,	76,	117,	118-9,	319).
[20]	 Passagens	 extraídas	 do	 artigo	 de	 Anísio	 Teixeira	 “Os	 processos
democráticos	 da	 educação”,	 Revista	 Brasileira	 de	 Estudos	 Pedagógicos,	 v.25,
n.62,	abr/jun	1956,	p.3-16).
Outros	livros	consultados	foram	são	Tomás	de	Aquino,	Questions	disputées	sur
la	 verité	 (Question	 XI,	 De	 Magistro)	 (Paris,	 Vrin,	 1992)	 e	 R.S.	 Peters,	 El
concepto	 de	 educación	 (Buenos	 Aires,	 Paidos,	 1969).	 Para	 as	 obras	 de
Aristóteles	 baseei-me	 na	 edição	 The	 Complete	 Works	 of	 Aristotle	 (Princeton,
Princeton	University	Press,	1995)	e	para	A	República,	de	Platão,	na	edição	da
Fundação	Calouste	Gulbenkian	(Lisboa,	1987).
Na	“Seleção	de	textos”,	as	traduções	são	todas	de	minha	autoria,	baseadas
nas	edições	indicadas	aqui,	à	exceção	do	último	excerto,	extraído	da	edição	da
Companhia	Editora	Nacional	(São	Paulo,	1959,	tradução	de	Godofredo	Rangel	e
Anísio	Teixeira).
Leituras	recomendadas
•	A	 República,	 de	 Platão	 (Calouste	 Gulbenkian,	 1987).	 O	 importante	 diálogo
platônico	 é	 também	 a	 primeira	 obra	 de	 filosofia	 da	 educação.	 Nele	 o	 foco
principal,	no	que	diz	respeito	à	filosofia	da	educação,	é	o	papel	da	educação	na
formação	do	cidadão.	O	livro	é	fundamental	para	quem	quer	conhecer	o	início
do	debate	filosófico	sobre	a	relação	entre	educação	e	política.
•	Emílio	ou	Da	Educação,	de	Rousseau	(Martins	Fontes,	2004).	Esse	longo	livro
é	um	tratado	sobre	a	educação	privada,	ou	seja,	aquela	que	é	fornecida	pelos	pais
por	 meio	 de	 preceptores.	 Nele,	 Rousseau	 transforma	 suas	 visões	 sobre	 a
sociedade	num	guia	sobre	como	transformar	a	sociedade	através	da	educação.	O
livro	aborda	vários	assuntos,	como	é	comum	nas	obras	sobre	educação	da	época,
que	vão	desde	a	correta	nutrição	até	a	educação	moral	e	política.
•	De	Magistro,	de	santo	Agostinho	(in	Santo	Agostinho,	coleção	Os	Pensadores,
Nova	Cultural,	1987).	Essa	é	uma	das	primeiras	obras	de	filosofia	da	educação
na	 Idade	 Média.	 Nela,	 o	 teólogo	 e	 filósofo	 cristão	 aborda	 a	 relação	 entre	 a
aprendizagem	 e	 a	 inspiração	 divina.	 Obra	 de	 filosofia	 da	 educação	 cristã
claramente	inspirada	no	idealismo	platônico.
•	 Pequena	 introdução	 à	 filosofia	 da	 educação,	 de	 Anísio	 Teixeira	 (DP&A,
2000).	Exposição	das	opiniões	do	autor	sobre	a	filosofia	da	educação.	Devido	à
importância	 de	 Anísio	 Teixeira	 para	 o	 pensamento	 educacional	 brasileiro,	 é
interessante	conhecer	o	texto,	publicado	pela	primeira	vez	em	1934,	em	que	ele
critica	a	escola	nova	e	defende	a	escola	progressista	de	Dewey	e	Kirkpatrick.
•	 Sobre	 o	 mestre	 (De	 Magistro),	 de	 são	 Tomás	 de	 Aquino	 (Martins	 Fontes,
2001).	Esse	livro	trava	um	diálogo	com	a	obra	homônima	de	santo	Agostinho.
Apesar	de	Tomás	não	condenar	diretamente	o	seu	colega	cristão,	ele	critica	o
filósofo	 que	 o	 inspirou,	 Platão,	 preferindo	 a	 teoria	 de	 outro	 filósofo	 grego,
Aristóteles.	O	livro	de	são	Tomás	também	é,	portanto,	uma	introdução	à	filosofia
da	educação	aristotélica.
•	Sobre	 a	 pedagogia,	 de	 Immanuel	 Kant	 (Unimep,	 1996).	 Único	 livro	 que	 o
grande	filósofo	alemão	escreveu	sobre	o	tema,	discorrendo	sobre	a	educação	do
corpo	até	a	educação	moral,	enfatizando	a	necessidade	de	se	educar	ambos.	Essa
pequena	obra	é	de	fácil	leitura	e	aborda	alguns	temas	presentes	em	dois	grandes
livros	do	filósofo:	Crítica	da	razão	pura	e	Crítica	da	razão	prática,	sempre	no
sentido	de	a	partir	da	educação	desenvolver	as	faculdades	(intelectuais	e	morais)
abordadas	nesses	livros.
Sobre	o	autor
Leonardo	 Sartori	 Porto,	 doutor	 em	 filosofia	 moral	 e	 política,	 é	 professor	 da
Faculdade	de	Educação	da	Universidade	Federal	do	Rio	Grande	do	Sul,	onde
leciona	a	disciplina	de	Prática	de	Ensino	de	Filosofia.
Coleção	PASSO-A-PASSO
Volumes	recentes:
CIÊNCIAS	SOCIAIS	PASSO-A-PASSO
Capital	social	[25],	Maria	Celina	D’Araujo
Hierarquia	e	individualismo	[26],	Piero	de	Camargo	Leirner
Sociologia	do	trabalho	[39],	José	Ricardo	Ramalho	e	Marco	Aurélio	Santana
O	negócio	do	social	[40],	Joana	Garcia
Origens	da	linguagem	[41],	Bruna	Franchetto	e	Yonne	Leite
Literatura	e	sociedade	[48],	Adriana	Facina
Sociedade	de	consumo	[49],	Lívia	Barbosa
Antropologia	da	criança	[57],	Clarice	Cohn
FILOSOFIA	PASSO-A-PASSO
Amor	[44],	Maria	de	Lourdes	Borges
Filosofia	analítica	[45],	Danilo	Marcondes
Maquiavel	&	O	Príncipe	[46],	Alessandro	Pinzani
A	Teoria	Crítica	[47],	Marcos	Nobre
Filosofia	da	mente	[52],	Claudio	Costa
Espinosa	&	a	afetividade	humana	[53],	Marcos	André	Gleizer
Kant	&	a	Crítica	da	Razão	Pura	[54],	Vinicius	de	Figueiredo
Bioética	[55],	Darlei	Dall’Agnol
Anarquismo	e	conhecimento	[58],	Alberto	Oliva
A	pragmática	na	filosofia	contemporânea	[59],	Danilo	Marcondes
Wittgenstein	&	o	Tractatus	[60],	Edgar	Marques
Leibniz	&	a	linguagem	[61],	Vivianne	de	Castilho	Moreira
Filosofia	da	educação	[62],	Leonardo	Sartori	Porto
Estética	[63],	Kathrin	Rosenfield
PSICANÁLISE	PASSO-A-PASSO
Freud	&	a	religião	[20],	Sérgio	Nazar	David
Para	que	serve	a	psicanálise?	[21],	Denise	Maurano
Depressão	e	melancolia	[22],	Urania	Tourinho	Peres
A	neurose	obsessiva	[23],	Maria	Anita	Carneiro	Ribeiro
Mito	e	psicanálise	[36],	Ana	Vicentini	de	Azevedo
O	adolescente	e	o	Outro	[37],	Sonia	Alberti
A	teoria	do	amor	[38],	Nadiá	P.	Ferreira
O	conceito	de	sujeito	[50],	Luciano	Elia
A	sublimação	[51],	Orlando	Cruxên
Lacan,	 o	 grande	 freudiano	 [56],	 Marco	 Antonio	 Coutinho	 Jorge	 e	 Nadiá	 P.
Ferreira
Copyright	©	2006,	Leonardo	Sartori	Porto
Copyright	desta	edição	©	2006:
Jorge	Zahar	Editor	Ltda.
rua	Marquês	de	São	Vicente	99,	1º	andar
22451-041	Rio	de	Janeiro,	RJ
tel	(21)	2529-4750	/	fax	(21)	2529-4787
editora@zahar.com.br
www.zahar.com.br
Todos	os	direitos	reservados.
A	reprodução	não-autorizada	desta	publicação,	no	todo
ou	em	parte,	constitui	violação	de	direitos	autorais.	(Lei	9.610/98)
Capa:	Sérgio	Campante
ISBN:	978-85-378-0621-0
Arquivo	ePub	produzido	pela	Simplíssimo	Livros

Mais conteúdo relacionado

Semelhante a Filosofia da Educação: Concepções Idealista, Empirista e Transcendental

Texto sobre escola de frankfurt
Texto sobre escola de frankfurtTexto sobre escola de frankfurt
Texto sobre escola de frankfurtFrancilis Enes
 
Trabalho de filosofia
Trabalho de filosofiaTrabalho de filosofia
Trabalho de filosofiawellblue
 
A pluralidade singular da antropologia
A pluralidade singular da antropologiaA pluralidade singular da antropologia
A pluralidade singular da antropologiaClaudiane Sousa
 
Fundamentos da-educacao-normal-historia-filosofia-2s-2b
Fundamentos da-educacao-normal-historia-filosofia-2s-2bFundamentos da-educacao-normal-historia-filosofia-2s-2b
Fundamentos da-educacao-normal-historia-filosofia-2s-2bSEDUC-RJ
 
Breve histórico dos motivos que levaram a educação do ocidente de uma perspec...
Breve histórico dos motivos que levaram a educação do ocidente de uma perspec...Breve histórico dos motivos que levaram a educação do ocidente de uma perspec...
Breve histórico dos motivos que levaram a educação do ocidente de uma perspec...francisco de assis henrique
 
Trabalho de filosofia ensino médio
Trabalho de filosofia ensino médioTrabalho de filosofia ensino médio
Trabalho de filosofia ensino médioWANDERSON JONER
 
Guia de studos para sociologia e ciêc soc
Guia de studos para sociologia e ciêc socGuia de studos para sociologia e ciêc soc
Guia de studos para sociologia e ciêc socGeraldo Aguiar
 
Apresentações Sociais
Apresentações SociaisApresentações Sociais
Apresentações Sociaisitassa
 
Antropologia correcao3.
Antropologia correcao3.Antropologia correcao3.
Antropologia correcao3.itassa
 
Livro de pedagogia universal - uma persctiva
Livro de pedagogia universal - uma persctivaLivro de pedagogia universal - uma persctiva
Livro de pedagogia universal - uma persctivaJaineSoares6
 
Empirismo iluminismo 24 tp luana pimmel
Empirismo iluminismo 24 tp luana pimmelEmpirismo iluminismo 24 tp luana pimmel
Empirismo iluminismo 24 tp luana pimmelalemisturini
 
O estudo cientifico da aprendizagem
O estudo cientifico da aprendizagemO estudo cientifico da aprendizagem
O estudo cientifico da aprendizagemQuitriaSilva2
 
fundamentos Filosóficos da Educação.pptx
fundamentos Filosóficos da Educação.pptxfundamentos Filosóficos da Educação.pptx
fundamentos Filosóficos da Educação.pptxHEDIPOBELTHESEM
 
Fundamentos sociologicos da educação
Fundamentos sociologicos da educaçãoFundamentos sociologicos da educação
Fundamentos sociologicos da educaçãoceliferreira
 

Semelhante a Filosofia da Educação: Concepções Idealista, Empirista e Transcendental (20)

Texto sobre escola de frankfurt
Texto sobre escola de frankfurtTexto sobre escola de frankfurt
Texto sobre escola de frankfurt
 
Introdução a filosofia
Introdução a filosofiaIntrodução a filosofia
Introdução a filosofia
 
Trabalho de filosofia
Trabalho de filosofiaTrabalho de filosofia
Trabalho de filosofia
 
A pluralidade singular da antropologia
A pluralidade singular da antropologiaA pluralidade singular da antropologia
A pluralidade singular da antropologia
 
Concepções filosoficas-s
Concepções filosoficas-sConcepções filosoficas-s
Concepções filosoficas-s
 
Fundamentos da-educacao-normal-historia-filosofia-2s-2b
Fundamentos da-educacao-normal-historia-filosofia-2s-2bFundamentos da-educacao-normal-historia-filosofia-2s-2b
Fundamentos da-educacao-normal-historia-filosofia-2s-2b
 
Breve histórico dos motivos que levaram a educação do ocidente de uma perspec...
Breve histórico dos motivos que levaram a educação do ocidente de uma perspec...Breve histórico dos motivos que levaram a educação do ocidente de uma perspec...
Breve histórico dos motivos que levaram a educação do ocidente de uma perspec...
 
Trabalho de filosofia ensino médio
Trabalho de filosofia ensino médioTrabalho de filosofia ensino médio
Trabalho de filosofia ensino médio
 
Guia de studos para sociologia e ciêc soc
Guia de studos para sociologia e ciêc socGuia de studos para sociologia e ciêc soc
Guia de studos para sociologia e ciêc soc
 
Filosofia moderna 3 25
Filosofia moderna 3 25Filosofia moderna 3 25
Filosofia moderna 3 25
 
Apresentações Sociais
Apresentações SociaisApresentações Sociais
Apresentações Sociais
 
Antropologia correcao3.
Antropologia correcao3.Antropologia correcao3.
Antropologia correcao3.
 
Livro de pedagogia universal - uma persctiva
Livro de pedagogia universal - uma persctivaLivro de pedagogia universal - uma persctiva
Livro de pedagogia universal - uma persctiva
 
Empirismo iluminismo 24 tp luana pimmel
Empirismo iluminismo 24 tp luana pimmelEmpirismo iluminismo 24 tp luana pimmel
Empirismo iluminismo 24 tp luana pimmel
 
Pedagogia espirita
Pedagogia espiritaPedagogia espirita
Pedagogia espirita
 
Antropologia Filosófica
Antropologia FilosóficaAntropologia Filosófica
Antropologia Filosófica
 
O estudo cientifico da aprendizagem
O estudo cientifico da aprendizagemO estudo cientifico da aprendizagem
O estudo cientifico da aprendizagem
 
fundamentos Filosóficos da Educação.pptx
fundamentos Filosóficos da Educação.pptxfundamentos Filosóficos da Educação.pptx
fundamentos Filosóficos da Educação.pptx
 
Fundamentos sociologicos da educação
Fundamentos sociologicos da educaçãoFundamentos sociologicos da educação
Fundamentos sociologicos da educação
 
Slide positivismo
Slide positivismoSlide positivismo
Slide positivismo
 

Mais de Antonio Burnat

Aula de filosofia 02.pptx
Aula de filosofia 02.pptxAula de filosofia 02.pptx
Aula de filosofia 02.pptxAntonio Burnat
 
aorigemdabbliaeasuahistria-130619145412-phpapp01 (1).pptx
aorigemdabbliaeasuahistria-130619145412-phpapp01 (1).pptxaorigemdabbliaeasuahistria-130619145412-phpapp01 (1).pptx
aorigemdabbliaeasuahistria-130619145412-phpapp01 (1).pptxAntonio Burnat
 
textos filosoficos.pptx
textos filosoficos.pptxtextos filosoficos.pptx
textos filosoficos.pptxAntonio Burnat
 
filosofia-180226024509 (3).pptx
filosofia-180226024509 (3).pptxfilosofia-180226024509 (3).pptx
filosofia-180226024509 (3).pptxAntonio Burnat
 
periodos da filosofia.pptx
periodos da filosofia.pptxperiodos da filosofia.pptx
periodos da filosofia.pptxAntonio Burnat
 
Aula 03. Aula de filosofia para 2 EM 3.pptx
Aula 03. Aula de filosofia para 2 EM 3.pptxAula 03. Aula de filosofia para 2 EM 3.pptx
Aula 03. Aula de filosofia para 2 EM 3.pptxAntonio Burnat
 
Aula 03. Aula de filosofia para 2 EM 1.pptx
Aula 03. Aula de filosofia para 2 EM 1.pptxAula 03. Aula de filosofia para 2 EM 1.pptx
Aula 03. Aula de filosofia para 2 EM 1.pptxAntonio Burnat
 
O que a filosofia estuda.pptx
O que a filosofia estuda.pptxO que a filosofia estuda.pptx
O que a filosofia estuda.pptxAntonio Burnat
 
ritos de passagem.pptx
ritos de passagem.pptxritos de passagem.pptx
ritos de passagem.pptxAntonio Burnat
 
MATERNAL I B – 2010.ppt
MATERNAL I B – 2010.pptMATERNAL I B – 2010.ppt
MATERNAL I B – 2010.pptAntonio Burnat
 
O Fenômeno Religioso Universal EM avaliação.pptx
O Fenômeno Religioso Universal EM avaliação.pptxO Fenômeno Religioso Universal EM avaliação.pptx
O Fenômeno Religioso Universal EM avaliação.pptxAntonio Burnat
 
A ciência na história.pptx
A ciência na história.pptxA ciência na história.pptx
A ciência na história.pptxAntonio Burnat
 
A ciência e a arte.pptx
A ciência e a arte.pptxA ciência e a arte.pptx
A ciência e a arte.pptxAntonio Burnat
 
A atividade racional.pptx
A atividade racional.pptxA atividade racional.pptx
A atividade racional.pptxAntonio Burnat
 
A atitude científica.pptx
A atitude científica.pptxA atitude científica.pptx
A atitude científica.pptxAntonio Burnat
 
Aula sobre Descartes 2 EM.pptx
Aula sobre Descartes 2 EM.pptxAula sobre Descartes 2 EM.pptx
Aula sobre Descartes 2 EM.pptxAntonio Burnat
 
1_5019389482672062834.pdf
1_5019389482672062834.pdf1_5019389482672062834.pdf
1_5019389482672062834.pdfAntonio Burnat
 
Filosofia_passo_a_passo_54_Vinicius.pdf
Filosofia_passo_a_passo_54_Vinicius.pdfFilosofia_passo_a_passo_54_Vinicius.pdf
Filosofia_passo_a_passo_54_Vinicius.pdfAntonio Burnat
 

Mais de Antonio Burnat (20)

Aula de filosofia 02.pptx
Aula de filosofia 02.pptxAula de filosofia 02.pptx
Aula de filosofia 02.pptx
 
aorigemdabbliaeasuahistria-130619145412-phpapp01 (1).pptx
aorigemdabbliaeasuahistria-130619145412-phpapp01 (1).pptxaorigemdabbliaeasuahistria-130619145412-phpapp01 (1).pptx
aorigemdabbliaeasuahistria-130619145412-phpapp01 (1).pptx
 
rel.pptx
rel.pptxrel.pptx
rel.pptx
 
textos filosoficos.pptx
textos filosoficos.pptxtextos filosoficos.pptx
textos filosoficos.pptx
 
filosofia-180226024509 (3).pptx
filosofia-180226024509 (3).pptxfilosofia-180226024509 (3).pptx
filosofia-180226024509 (3).pptx
 
periodos da filosofia.pptx
periodos da filosofia.pptxperiodos da filosofia.pptx
periodos da filosofia.pptx
 
Aula 03. Aula de filosofia para 2 EM 3.pptx
Aula 03. Aula de filosofia para 2 EM 3.pptxAula 03. Aula de filosofia para 2 EM 3.pptx
Aula 03. Aula de filosofia para 2 EM 3.pptx
 
Aula 03. Aula de filosofia para 2 EM 1.pptx
Aula 03. Aula de filosofia para 2 EM 1.pptxAula 03. Aula de filosofia para 2 EM 1.pptx
Aula 03. Aula de filosofia para 2 EM 1.pptx
 
O que a filosofia estuda.pptx
O que a filosofia estuda.pptxO que a filosofia estuda.pptx
O que a filosofia estuda.pptx
 
ritos de passagem.pptx
ritos de passagem.pptxritos de passagem.pptx
ritos de passagem.pptx
 
MATERNAL I B – 2010.ppt
MATERNAL I B – 2010.pptMATERNAL I B – 2010.ppt
MATERNAL I B – 2010.ppt
 
O Fenômeno Religioso Universal EM avaliação.pptx
O Fenômeno Religioso Universal EM avaliação.pptxO Fenômeno Religioso Universal EM avaliação.pptx
O Fenômeno Religioso Universal EM avaliação.pptx
 
26723.pptx
26723.pptx26723.pptx
26723.pptx
 
A ciência na história.pptx
A ciência na história.pptxA ciência na história.pptx
A ciência na história.pptx
 
A ciência e a arte.pptx
A ciência e a arte.pptxA ciência e a arte.pptx
A ciência e a arte.pptx
 
A atividade racional.pptx
A atividade racional.pptxA atividade racional.pptx
A atividade racional.pptx
 
A atitude científica.pptx
A atitude científica.pptxA atitude científica.pptx
A atitude científica.pptx
 
Aula sobre Descartes 2 EM.pptx
Aula sobre Descartes 2 EM.pptxAula sobre Descartes 2 EM.pptx
Aula sobre Descartes 2 EM.pptx
 
1_5019389482672062834.pdf
1_5019389482672062834.pdf1_5019389482672062834.pdf
1_5019389482672062834.pdf
 
Filosofia_passo_a_passo_54_Vinicius.pdf
Filosofia_passo_a_passo_54_Vinicius.pdfFilosofia_passo_a_passo_54_Vinicius.pdf
Filosofia_passo_a_passo_54_Vinicius.pdf
 

Último

Cenários de Aprendizagem - Estratégia para implementação de práticas pedagógicas
Cenários de Aprendizagem - Estratégia para implementação de práticas pedagógicasCenários de Aprendizagem - Estratégia para implementação de práticas pedagógicas
Cenários de Aprendizagem - Estratégia para implementação de práticas pedagógicasRosalina Simão Nunes
 
GÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - Cartum
GÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - CartumGÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - Cartum
GÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - CartumAugusto Costa
 
Mapa mental - Classificação dos seres vivos .docx
Mapa mental - Classificação dos seres vivos .docxMapa mental - Classificação dos seres vivos .docx
Mapa mental - Classificação dos seres vivos .docxBeatrizLittig1
 
COMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEM
COMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEMCOMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEM
COMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEMVanessaCavalcante37
 
CRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASB
CRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASBCRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASB
CRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASBAline Santana
 
Manual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envio
Manual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envioManual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envio
Manual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envioManuais Formação
 
Bullying - Texto e cruzadinha
Bullying        -     Texto e cruzadinhaBullying        -     Texto e cruzadinha
Bullying - Texto e cruzadinhaMary Alvarenga
 
11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...
11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...
11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...licinioBorges
 
Slides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptx
Slides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptxSlides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptx
Slides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptxLuizHenriquedeAlmeid6
 
E agora?! Já não avalio as atitudes e valores?
E agora?! Já não avalio as atitudes e valores?E agora?! Já não avalio as atitudes e valores?
E agora?! Já não avalio as atitudes e valores?Rosalina Simão Nunes
 
Slide língua portuguesa português 8 ano.pptx
Slide língua portuguesa português 8 ano.pptxSlide língua portuguesa português 8 ano.pptx
Slide língua portuguesa português 8 ano.pptxssuserf54fa01
 
Bullying - Atividade com caça- palavras
Bullying   - Atividade com  caça- palavrasBullying   - Atividade com  caça- palavras
Bullying - Atividade com caça- palavrasMary Alvarenga
 
“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptx
“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptx“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptx
“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptxthaisamaral9365923
 
LEMBRANDO A MORTE E CELEBRANDO A RESSUREIÇÃO
LEMBRANDO A MORTE E CELEBRANDO A RESSUREIÇÃOLEMBRANDO A MORTE E CELEBRANDO A RESSUREIÇÃO
LEMBRANDO A MORTE E CELEBRANDO A RESSUREIÇÃOColégio Santa Teresinha
 
RedacoesComentadasModeloAnalisarFazer.pdf
RedacoesComentadasModeloAnalisarFazer.pdfRedacoesComentadasModeloAnalisarFazer.pdf
RedacoesComentadasModeloAnalisarFazer.pdfAlissonMiranda22
 
Modelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e Tani
Modelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e TaniModelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e Tani
Modelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e TaniCassio Meira Jr.
 
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdfWilliam J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdfAdrianaCunha84
 
activIDADES CUENTO lobo esta CUENTO CUARTO GRADO
activIDADES CUENTO  lobo esta  CUENTO CUARTO GRADOactivIDADES CUENTO  lobo esta  CUENTO CUARTO GRADO
activIDADES CUENTO lobo esta CUENTO CUARTO GRADOcarolinacespedes23
 
trabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditaduratrabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditaduraAdryan Luiz
 

Último (20)

Cenários de Aprendizagem - Estratégia para implementação de práticas pedagógicas
Cenários de Aprendizagem - Estratégia para implementação de práticas pedagógicasCenários de Aprendizagem - Estratégia para implementação de práticas pedagógicas
Cenários de Aprendizagem - Estratégia para implementação de práticas pedagógicas
 
GÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - Cartum
GÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - CartumGÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - Cartum
GÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - Cartum
 
Mapa mental - Classificação dos seres vivos .docx
Mapa mental - Classificação dos seres vivos .docxMapa mental - Classificação dos seres vivos .docx
Mapa mental - Classificação dos seres vivos .docx
 
COMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEM
COMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEMCOMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEM
COMPETÊNCIA 1 DA REDAÇÃO DO ENEM - REDAÇÃO ENEM
 
CRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASB
CRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASBCRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASB
CRÔNICAS DE UMA TURMA - TURMA DE 9ºANO - EASB
 
Manual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envio
Manual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envioManual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envio
Manual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envio
 
Bullying - Texto e cruzadinha
Bullying        -     Texto e cruzadinhaBullying        -     Texto e cruzadinha
Bullying - Texto e cruzadinha
 
XI OLIMPÍADAS DA LÍNGUA PORTUGUESA -
XI OLIMPÍADAS DA LÍNGUA PORTUGUESA      -XI OLIMPÍADAS DA LÍNGUA PORTUGUESA      -
XI OLIMPÍADAS DA LÍNGUA PORTUGUESA -
 
11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...
11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...
11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...
 
Slides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptx
Slides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptxSlides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptx
Slides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptx
 
E agora?! Já não avalio as atitudes e valores?
E agora?! Já não avalio as atitudes e valores?E agora?! Já não avalio as atitudes e valores?
E agora?! Já não avalio as atitudes e valores?
 
Slide língua portuguesa português 8 ano.pptx
Slide língua portuguesa português 8 ano.pptxSlide língua portuguesa português 8 ano.pptx
Slide língua portuguesa português 8 ano.pptx
 
Bullying - Atividade com caça- palavras
Bullying   - Atividade com  caça- palavrasBullying   - Atividade com  caça- palavras
Bullying - Atividade com caça- palavras
 
“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptx
“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptx“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptx
“Sobrou pra mim” - Conto de Ruth Rocha.pptx
 
LEMBRANDO A MORTE E CELEBRANDO A RESSUREIÇÃO
LEMBRANDO A MORTE E CELEBRANDO A RESSUREIÇÃOLEMBRANDO A MORTE E CELEBRANDO A RESSUREIÇÃO
LEMBRANDO A MORTE E CELEBRANDO A RESSUREIÇÃO
 
RedacoesComentadasModeloAnalisarFazer.pdf
RedacoesComentadasModeloAnalisarFazer.pdfRedacoesComentadasModeloAnalisarFazer.pdf
RedacoesComentadasModeloAnalisarFazer.pdf
 
Modelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e Tani
Modelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e TaniModelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e Tani
Modelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e Tani
 
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdfWilliam J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
 
activIDADES CUENTO lobo esta CUENTO CUARTO GRADO
activIDADES CUENTO  lobo esta  CUENTO CUARTO GRADOactivIDADES CUENTO  lobo esta  CUENTO CUARTO GRADO
activIDADES CUENTO lobo esta CUENTO CUARTO GRADO
 
trabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditaduratrabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditadura
 

Filosofia da Educação: Concepções Idealista, Empirista e Transcendental

  • 1.
  • 5. Introdução A educação é um tema filosófico desde a Grécia Clássica. O diálogo mais famoso de Platão, A República, é também a primeira grande obra de filosofia da educação. O tema central do diálogo é a política, mas, para criar uma sociedade perfeita — objetivo da filosofia política platônica —, é preciso educar os seus membros. Assim, surge uma relação entre filosofia política e educação, que perdura até os nossos dias. Os aspectos epistemológicos envolvidos na educação também são objeto de estudo filosófico desde Platão, que apresenta, no diálogo Mênon, uma abordagem sistemática desse assunto. Em um primeiro momento deste livro, abordarei as concepções epistemológicas envolvidas no ensino, concepções estas que têm sua razão de ser na medida em que, para identificarmos a melhor forma de conduzir o processo educacional, é preciso saber como ocorre o conhecimento humano. A investigação filosófica é um diálogo entre pensadores, que ocorre há mais de dois milênios no Ocidente. Reconstruirei brevemente esse diálogo apresentando três concepções epistemológicas do ensino que classificaremos como: idealista, empirista e transcendental. A concepção idealista será tratada através de dois filósofos: Platão e santo Agostinho. Abarcaremos, recorrendo a eles, o período da Antigüidade e o início da Idade Média. É preciso ter claro que, apesar de santo Agostinho ter se inspirado na doutrina platônica, ele desenvolveu uma filosofia própria, que influenciou o pensamento ocidental durante toda a Idade Média e que, indiretamente, também influenciou a filosofia que surge na Idade Moderna. Locke foi o filósofo escolhido para apresentar a concepção empirista. Com esse filósofo chegamos à filosofia moderna. Também por meio de Locke apresentaremos o debate filosófico que se dá entre o empirismo defendido por ele e o idealismo. A concepção transcendental requer um esclarecimento: o termo “transcendental” foi extraído da filosofia de Kant, mas não se aplica a são Tomás de Aquino, filósofos que serão apresentados sob esta rubrica. Reuni-los se
  • 6. justifica, contudo, pelo fato de ambos oferecerem uma alternativa tanto ao idealismo platônico quanto ao empirismo, segundo a qual o fundamento para o conhecimento não está em idéias inatas, tampouco na mera informação dos sentidos, mas em princípios que coordenam a aquisição do conhecimento — princípios estes que Kant denomina de “transcendentais”. E tratarei ainda das teorias filosóficas contemporâneas, que se ocupam da relação entre epistemologia e educação. Em um segundo momento, tratarei da relação entre filosofia política e educação. O tópico principal dessa relação é o papel da educação na formação e organização da sociedade e do Estado, porque para vários filósofos educar os cidadãos é a única forma de aperfeiçoar ou modificar o Estado. Dividiremos as teorias filosóficas sobre a relação entre educação e política em dois grandes grupos: os reformistas da sociedade e os aperfeiçoadores desta. Sabemos que essa classificação não é de todo satisfatória, visto que as teorias filosóficas apresentadas pretendem que a educação seja uma forma de aperfeiçoar a sociedade humana, mas algumas defendem uma mudança radical na sociedade ou na forma como o indivíduo se relaciona com esta, enquanto outras advogam em favor do aperfeiçoamento das instituições sociais já existentes. O dilema entre mudar a sociedade e aperfeiçoar as instituições já existentes ocorre logo no início da filosofia ocidental, nas concepções de Platão, defensor da primeira alternativa, e Aristóteles, que defende a segunda. Na filosofia moderna (que corresponde ao período compreendido entre os séculos XVII e XIX) encontra-se o trabalho de Rousseau, que incluiremos no grupo dos reformistas, uma vez que, apesar de a sua filosofia da educação estar mais voltada para o indivíduo, o fim último da reforma do indivíduo é a reforma de todos os indivíduos, ou seja, da sociedade. Quanto à filosofia contemporânea, apresentarei, no grupo dos reformistas, as concepções de um dos autores da Escola de Frankfurt: Adorno, aqui enquadrado por sua sofisticada reformulação do marxismo. Pelo grupo dos aperfeiçoadores do sistema social vigente exporei as teses do filósofo norte-americano John Dewey, que defendeu um aprimoramento da democracia através da educação. No total, este livro tratará das obras sobre educação de nove filósofos, englobando a filosofia da Grécia Clássica (Platão e Aristóteles), a Idade Média (santo Agostinho e são Tomás de Aquino), a filosofia moderna nas tradições filosóficas inglesas, alemãs e francesas (Locke, Kant e Rousseau, respectivamente), e a filosofia contemporânea (Adorno e Dewey), além de outros filósofos tratados em menos detalhe. Pretendo, com isto, oferecer um
  • 8. A concepção idealista Por “idealismo” entendemos a concepção segundo a qual o nosso conhecimento não está assentado na experiência sensível, que, por ser transitória, não fornece certeza alguma, e sim no acesso a uma realidade não sensível, composta por idéias. O melhor exemplo que podemos dar de uma “realidade não sensível” seria: aquela na qual habitariam as figuras geométricas de duas dimensões — os círculos e os quadrados perfeitos, que jamais poderiam existir em nosso mundo, e, portanto, não podem ser percebidos por nossos sentidos (um círculo que vejo desenhado num papel é um objeto tridimensional: o traço do lápis tem profundidade e largura). O fundador do idealismo filosófico é Platão, e com ele iniciarei a exposição dessa concepção. A influência da filosofia platônica se faz sentir num filósofo e teólogo medieval: santo Agostinho, que será o segundo representante do idealismo. Platão. O idealismo platônico não é uma teoria estabelecida de maneira dogmática: suas teses são usualmente sustentadas por sólidos argumentos. No que diz respeito à filosofia da educação, Platão inicia a defesa da tese de que educar é rememorar valendo-se de argumentação por via negativa: o paradoxo da investigação. No diálogo Mênon, ele apresenta o paradoxo: como alguém pode investigar algo que já sabe ou algo que não sabe? O que já sabe não precisa investigar e o que não sabe não pode investigar, uma vez que não sabe o que procurar e, se encontrar algo, não saberá se era aquilo que procurava. Com relação ao conhecimento de qualquer objeto, existem apenas quatro possibilidades: 1) eu sei que o conheço; 2) eu sei que não o conheço; 3) eu não sei que o conheço; 4) eu não sei que não o conheço. No primeiro caso, não é necessária a investigação e, por conseguinte, a aprendizagem: eu não posso aprender algo que eu já sei. O último caso é o do total desconhecimento, tampouco aqui é possível a aprendizagem, pois eu sequer sei que não sei algo; assim, não há motivo para querer aprender esse algo. É claro que alguém pode me informar o que eu não sei, mas então caímos no segundo caso: eu sei que não sei isso. Mas como eu posso saber que não sei algo? Para eu saber que não sei algo,
  • 9. eu preciso saber o que é isso, mas então eu sei o que é isso. Chegamos ao núcleo do paradoxo da investigação, que também é o paradoxo da aprendizagem, pois como posso querer aprender algo que eu não sei o que é, nem onde investigá-lo? Existe, contudo, uma objeção óbvia à interpretação do paradoxo da investigação como sendo também um paradoxo da aprendizagem: alguém — o professor — pode me dizer o que eu não sei, pode, portanto, informar-me daquilo que preciso aprender. Mas é necessário entender que Platão toma a aprendizagem como uma tarefa ativa, ou seja, há uma vontade no aluno de aprender algo. A aprendizagem, portanto, é uma investigação. Só resta uma alternativa: eu não sei que sei isso. O paradoxo da investigação nos leva à conclusão de que toda aprendizagem consiste na rememoração de algo que esquecemos. Essa solução do paradoxo, no entanto, cria um novo problema: quando aprendemos algo pela primeira vez? Não pode ser em nossa vida, pois aprender sempre é rememorar, então só pode ser antes de nascermos! A solução não parece tão absurda quando pensamos nas doutrinas religiosas que falam da imortalidade da alma. E aqui começa a metafísica platônica. Segundo Platão, a alma humana é imortal e “já nasceu várias vezes e viu tudo o que existe aqui e no outro mundo (Hades), não existindo nada que não tenha aprendido”. Entretanto, o que a alma apreende em suas várias vidas não é o conhecimento daquilo que é transitório no mundo, mas as verdades eternas e imutáveis, aquilo que Platão denomina idéias. O típico conhecimento eterno e imutável é o da matemática, e não é à toa que o personagem principal do Mênon, Sócrates, mostra que um escravo pode demonstrar um teorema sem nunca ter aprendido matemática. O tema do diálogo, porém, é a virtude; assim, podemos listar também os conceitos éticos, bem como os estéticos, entre as idéias. Se aprender é apenas rememorar, então a função do professor é conduzir o aluno no processo de trazer à consciência as idéias que jazem escondidas em sua alma. Sócrates, o professor por excelência, compara o seu trabalho com o da parteira: através de perguntas, faz com que os indivíduos cheguem às verdades que estavam adormecidas no interior de suas mentes, ou seja, induz o nascimento dessas verdades. Agostinho. Nos primórdios da Igreja Católica, surge a patrística (séculos II a V da nossa era), cujo objetivo era dotar a nova fé de argumentos filosóficos para combater seus detratores. É nessa tradição que se insere o pensamento de santo Agostinho, teólogo e filósofo que encontrou na filosofia platônica inspiração
  • 10. para os seus escritos. O principal livro que escreveu sobre educação, De Magistro (Sobre o mestre), não inicia com uma exposição sobre os objetivos da educação; em vez disso, aborda inicialmente a linguagem. Palavras, proferidas ou escritas, são consideradas sinais por Agostinho, que pergunta: como podemos apreender o significado desses sinais? Não pode ser através de outros sinais, pois os sinais, em si mesmos, não possuem significado, apenas indicam algo. A resposta parece óbvia: aprendemos o significado das palavras quando nos é indicado o que uma palavra significa. Um dos modos de fazer isso é apontar para um objeto e dizer o seu nome. O filósofo nos lembra, todavia, que o gesto de apontar nada mais é do que um sinal; assim, só se pode indicar o significado de um sinal usando-se outros sinais. Então, conclui que “com as palavras não aprendemos senão palavras; antes, o som e o ruído das palavras, porque, se o que não é sinal não pode ser palavra, não sei também como possam ser palavras aquilo que ouvi pronunciado como palavras enquanto não lhe conhecer o significado”. A última parte dessa conclusão requer um esclarecimento. Palavras, quando não se conhece seu significado, sequer são palavras, mas apenas ruídos ou traços no papel — é o que experienciamos ao lermos ou ouvirmos uma língua que não conhecemos. Portanto, ao apontarmos para um objeto dizendo o seu nome, precisamos saber que o nome é uma palavra, não um ruído ou rabisco, e só podemos ter esse conhecimento sabendo o significado da palavra, segundo Agostinho. A solução para esse dilema encontra-se num conhecimento anterior ao empírico, ou seja, anterior àquele que os sentidos nos fornecem: é o conhecimento da verdade interior. Assim, a nossa mente já contém o significado das palavras, a saber: as coisas às quais elas se referem. E quem fornece a verdade à nossa mente é o “… Cristo que habita … no homem interior, isto é: a virtude incomutável de Deus e a sempiterna Sabedoria, que toda alma racional consulta …” O dilema é similar àquele enfrentado por Platão; a solução, contudo, difere, porquanto em Agostinho não será a rememoração, mas a inspiração divina o que dará a base para o nosso conhecimento. Ambos os filósofos concordam, no entanto, que a função do professor não é transmitir conhecimento, mas conduzir o aluno na descoberta do conhecimento que está latente em seu interior.
  • 11. A concepção empirista O empirismo se opõe ao idealismo ao propor uma regra para distinguir uma concepção imaginária do mundo de uma concepção real: o teste da experiência sensível. A tese empirista não é a de que todo conhecimento vem da experiência — pois posso conhecer sereias, uma vez que conheço suas características: ser metade mulher, metade peixe (se não conhecesse as sereias não seria capaz de distingui-las dos duendes) —, mas de que todo o conhecimento sobre objetos reais procede da experiência. É claro que essa tese gera dificuldade para explicar como conhecemos aqueles objetos que são tão caros ao idealismo: os objetos matemáticos. Para esses objetos, o empirismo cria a noção de objetos abstratos, criados pela mente ao abstrair certas características dos objetos reais. Assim, os filósofos empiristas podem explicar as várias facetas que constituem o conhecimento humano. Apesar de as teses empiristas terem sido sustentadas por vários filósofos desde a Grécia Clássica, o empirismo geralmente é restrito a um grupo de filósofos modernos ingleses: Francis Bacon, Hobbes, Locke, Berkeley e Hume. Dentre esses, apenas Locke escreveu um livro sobre a educação, sobre o qual falarei a seguir. Locke. Em oposição ao idealismo, John Locke sustenta a tese de que não há idéias nem princípios inatos, porque não existe um consenso universal com relação a eles e porque eles não estão presentes nas crianças e nos deficientes mentais. Locke também apresenta um argumento contra a teoria da reminiscência: se todo conhecimento já estivesse em nossa memória, então um cego de nascença conheceria as cores. E chega a citar o caso de um homem que perdeu a visão e acabou perdendo a noção das cores, o que não ocorreria se essas existissem em sua memória. Além do mais, ele não acredita que a alma exista antes do começo da vida no corpo. A filosofia de Locke pode ser resumida em duas teses interligadas: a) não existem idéias nem princípios inatos; b) todas as nossas idéias e os princípios do entendimento são derivados da experiência sensível. Porém nem todas as nossas idéias e nenhum princípio do entendimento têm sua origem na experiência, pois muitas daquelas e todos estes surgem da reflexão que a mente realiza sobre os dados da experiência.
  • 12. A concepção segundo a qual a nossa mente é um fluxo constante e descoordenado de impressões sensíveis não corresponde de modo algum às teses empiristas. Se incluirmos, entre os defensores dessas teses, filósofos como Locke, Hume e Hobbes, veremos que para nenhum deles a mente é passiva. Pelo contrário, eles defendem que grande parte do nosso conhecimento é produzido pela mente quando esta opera sobre dados fornecidos pelos sentidos. Uma das tarefas da educação, portanto, será preparar o aluno para usar corretamente o seu entendimento. Entretanto, diferentemente de Platão e Agostinho, que consideram tarefa do professor conduzir o aluno no caminho da rememoração ou da inspiração divina, Locke julga que “a tarefa da educação … não é torná-los [os indivíduos] perfeitos em cada uma das ciências, mas abrir as suas mentes para melhor torná-los capazes de qualquer uma, quando se dedicarem a ela”. Visto que o nosso conhecimento surge da reflexão sobre as impressões dos sentidos, não basta informar o aluno, apresentar-lhe um conhecimento acabado, porque ele só compreenderá aquilo que ele próprio elaborar, ou seja, aquilo que for resultado de suas investigações intelectuais. Ora, “nada facilitará mais suas investigações e as levará mais longe do que um bom método”. O objetivo da educação, portanto, deve ser ensinar ao aluno os vários métodos por meio dos quais o conhecimento pode ser obtido. O modo mais apropriado para atingir esse objetivo é fazer com que o aluno raciocine a partir daquilo que já conhece, pois Locke sustenta que as crianças, assim que começam a falar, já são capazes de raciocinar. Na concepção empirista, a educação não se dá a partir da transmissão de um conteúdo, mas no exercício dos métodos que levam à produção dos diferentes tipos de conhecimento.
  • 13. A concepção transcendental Como dissemos na introdução, “transcendental” é um termo que pertence à filosofia kantiana, que também será usado com relação à filosofia de são Tomás de Aquino, profundamente influenciado pelo pensamento de Aristóteles. A concepção transcendental tenta superar a dicotomia idealismo/empirismo, aceitando do empirismo a evidência dos sentidos, mas estabelecendo as condições a priori requeridas pela experiência. São Tomás de Aquino. O movimento de renovação do pensamento católico que se seguiu à patrística é usualmente denominado de escolástica (séculos IX ao XV de nossa era), e tem como principal característica o uso da obra de Aristóteles nas discussões filosóficas e teológicas. O filósofo e teólogo mais importante da escolástica é são Tomás de Aquino, que, diferentemente de Agostinho, não escreveu um tratado sobre educação, mas deixou um texto sobre o assunto, também intitulado De Magistro, que pertence à obra Quaestiones disputatae de veritate (Questões disputadas sobre a verdade). Aquino não se opõe às concepções de Agostinho, ele inclusive concorda com a tese de que Deus ensina ao homem a partir do interior; seu alvo será o inspirador de Agostinho: Platão. A teoria platônica da reminiscência é explicitamente rejeitada por Aquino, porque elimina a ação humana, uma vez que, se todo conhecimento é lembrança — trata-se, obviamente, de conhecimento verdadeiro, portanto, conhecimento daquilo que de fato ocorre —, então tudo o que nos ocorre já está determinado antes de nascermos. A rejeição ao platonismo não implica a aceitação do empirismo, pois há uma “via intermediária entre essas duas opiniões”. Caminho indicado por Aristóteles: nós possuímos em potência a capacidade de conhecer o mundo que nos cerca, mas é preciso efetivar essa potência no próprio ato de conhecer. A idéia de possuirmos em potência a capacidade de conhecer torna-se bastante clara quando pensamos no sentido da visão: é por meio dele que posso ver o mundo, mas se não abrir meus olhos, não os dirigir ao que me cerca, não verei nada. O exemplo também apresenta outra característica fundamental do conhecimento: o que eu vejo não é predeterminado pelos meus olhos, mas há
  • 14. uma qualidade que não pode faltar — a visibilidade; assim, embora o que vamos conhecer não esteja já inscrito em nossa mente, existem certas qualidades que os objetos necessariamente têm de possuir a fim de que possamos conhecê-los. Do mesmo modo, certos princípios necessários ao conhecimento encontram- se em nós. Esses princípios são de dois tipos: a) verdades auto-evidentes, como “duas quantidades iguais a uma terceira são iguais entre si”; b) noções simples, tais como “ser” e o “o número um”. Como já vimos, Aquino não quer se opor a Agostinho, e aceita a teoria da inspiração divina, que se manifesta nesses princípios universais. Em contrapartida, existe o conhecimento que é produzido a partir deles, sendo o resultado da atividade humana. Os seres humanos adquiririam, assim, conhecimento de duas maneiras: “por descoberta pessoal, e por um princípio exterior, como se constata naquele que aprende por um outro”. É importante assinalar, porém, que, em ambos os casos, é necessária a existência dos princípios universais, e Aquino cita Aristóteles: “Todo conhecimento e toda aquisição de conhecimento partem de um conhecimento preexistente.” Assim, a função do professor não é informar o aluno, transmitir-lhe conhecimento, mas “… conduzir o discípulo, a partir do que já conhece, ao conhecimento daquilo que ignora …”. E o filósofo indica, inclusive, o método para se realizar essa tarefa, que consistiria basicamente em oferecer ao aluno problemas que possa resolver utilizando os princípios universais, que são aquilo que ele já sabe (devido à intervenção divina). Desse modo, o aluno pode exercitar a sua capacidade de aplicar aos casos particulares (aos objetos no mundo, aos fatos) os princípios universais. Kant. Kant pertence a uma tradição filosófica bastante distinta daquela de Aristóteles e Aquino, mas o incluímos neste grupo porque também esposa a idéia do ensino através do exercício de princípios que são necessários para a produção do conhecimento. Porém não parece que, para Kant, tais princípios sejam inatos: “Para designar a classe que o homem ocupa no sistema da natureza … é suficiente afirmar que ele possui um caráter que se cria a si mesmo … . É por isso que, a partir de um animal capaz de razão (animal rationabile), ele pode fazer de si mesmo um animal racional (animal rationale) … .” A citação denota uma perspectiva fundamental para se entender a concepção kantiana do entendimento: a autonomia. Neste caso, a etimologia é esclarecedora, visto que “autos” em grego significa “si mesmo” e “nomos”,
  • 15. “lei”, “autonomia” significa “regrar a si mesmo”. E Kant não pensa a autonomia como algo pertencente apenas ao domínio da moral, pois a estende às nossas capacidades cognitivas. Num exercício realizado numa escola alemã atual, crianças com os olhos vendados são conduzidas por outras crianças através de um bosque e apalpam algumas árvores determinadas; logo em seguida, são levadas para a beira do bosque, seus olhos são descobertos, e elas têm de identificar visualmente quais árvores tocaram. Esse exercício ilustra uma capacidade humana da qual raramente nos damos conta: conseguimos unificar informações de tipos distintos — dados visuais, táteis, sonoros, olfativos — para conformar um único objeto. Reunimos uma imagem, um cheiro, um sabor, uma textura, para criar o objeto “esta árvore”, “esta maçã” etc. Essa e outras capacidades são as regras ou os princípios do entendimento. Pensar, incluindo-se a percepção dos objetos, não é algo passivo, é uma atividade guiada por regras. A tarefa do professor, portanto, não deve ser apenas informar o estudante; afinal, “quantas pessoas lêem e escutam certas coisas, as quais admitem sem entender”? Cabe ao educador treinar o estudante no uso correto das regras do entendimento. Mas Kant pergunta: “convém começar com o estudo das regras abstratamente, ou devemos aprendê-las após o uso delas?”. A solução encontra-se numa terceira alternativa: aprender as regras ao mesmo tempo em que são usadas. O ensino deve ser, ao mesmo tempo, prático e reflexivo, ou seja, o estudante deve ser levado a refletir sobre a atividade que esteja realizando. Apesar de Kant julgar o autodidatismo a forma mais perfeita de aprendizagem, ele reconhece que poucos indivíduos são capazes de tal proeza. Então, recomenda o método socrático de ensino, ou seja, o mestre deve guiar o aluno em exercícios onde este aplique as regras do entendimento, a fim de que possa refletir sobre elas, sempre com a condução do professor.
  • 16. Filosofia contemporânea Todas essas concepções de educação influenciaram a filosofia e o pensamento contemporâneos. Embora a concepção idealista não esteja mais em voga, a filosofia ocidental está assentada sobre as idéias de Platão, e o fato de tanto a concepção empirista quanto a transcendental serem desenvolvidas para refutar a filosofia platônica ilustra a permanência desta no pensamento ocidental. Uma influência da concepção empirista podemos encontrar no livro de Alfred North Whitehead, Os fins da educação, no qual o matemático e filósofo inglês propõe um ensino baseado na alegria da descoberta para combater o que chama de o ensino das idéias inertes, que nada mais é do que o conhecimento livresco que muitas vezes ainda é ensinado em nossas escolas. No tipo de ensino proposto por Whitehead o aluno deve aprender a provar as idéias, o que pode ser feito utilizando-se a experiência ou a lógica. Whitehead, portanto, concorda com a tese dos filósofos que examinamos acima de que a educação deve ser o desenvolvimento de habilidades mais do que a aquisição de informações. Com o intuito de realizar esse objetivo, apresenta o que chama de ritmo da educação. A palavra “ritmo” indica que se trata de algo que se repete, ou seja, algo cíclico, que são três etapas lógicas que o aluno deve realizar toda vez que adquire um conhecimento novo. A primeira etapa, Whitehead denomina período de romance, que é o momento em que o conhecimento retém o brilho da novidade, das conexões inexploradas. Essa é a etapa na qual a curiosidade do aluno deve ser aguçada. A segunda etapa é o período da precisão, correspondendo à etapa analítica do ensino, na qual o aluno deve aprender a “gramática da linguagem e a gramática da ciência”. Obviamente, é o momento no qual o aluno aprimora as suas habilidades de produzir conhecimento correto. A última etapa, período da generalização, é caracterizada pelo retorno à primeira etapa, com as habilidades adquiridas na segunda — nas palavras do filósofo: “é o êxito final”. Através desses ciclos, a educação deixa de ser um processo cujo final é longínquo, para se tornar um processo em que tanto a sensação de dominar um conteúdo ou habilidade quanto a de estar deparando com algo novo ocorrem freqüentemente. Outro filósofo inglês que também rejeitou a educação livresca foi Gilbert
  • 17. Ryle. Lembrando Platão e Agostinho, Ryle inicia o ensaio “Ensino e treinamento” com um dilema: “Todos concordamos, creio, que algo falhou no ensino se o aluno não é capaz, cedo ou tarde, de dar as suas próprias soluções aos problemas, mas o problema é este: como podemos ensinar um indivíduo a fazer coisas que não aprendeu previamente?” O paradoxo não é novo. A solução para o dilema é distinguir entre ensinar que e ensinar como (que espelha a sua distinção entre saber que e saber como, apresentada no livro A Concept of Mind). Quando dizemos que alguém só pode aprender algo que lhe tenha sido ensinado, é preciso sabermos em que sentido estamos usando o verbo “ensinar”. A proposição “eu ensinei a João que a água congela a 0ºC” significa que estou informando João de algo; já a proposição “eu ensinei a João como medir a temperatura em que a água congela” diz que estou desenvolvendo em João uma habilidade. No primeiro caso, o indivíduo não pode ir além do que lhe foi ensinado, o que não ocorre no segundo, pois a habilidade que desenvolveu lhe permite fazer descobertas por si mesmo. O dilema ocorre porque geralmente pensamos em termos de ensinar que, quando, na verdade, para podermos viver, é preciso aprender como fazer as coisas — como falar, por exemplo. Mas surgem novas questões: como é possível desenvolver em alguém uma habilidade? Isto não é algo que surge no interior do indivíduo? É possível criá-la a partir do exterior? A solução para essas questões, segundo o filósofo norte-americano Israel Scheffler, encontra-se na terceira concepção de ensino por nós apresentada: ensinar como é ensinar regras. É uma solução temporária, pois leva inevitavelmente à pergunta: como as regras são ensinadas? No conto de Julio Cortázar chamado “Instruções para subir uma escada”, as dificuldades já começam na descrição dos degraus, mas o próprio autor nos avisa para não confundirmos pé (direito) com pé (esquerdo), evitando “levantar ao mesmo tempo pé e pé”. Esse conto ilustra muito bem o que Max Black, outro filósofo norte-americano, quer dizer ao afirmar que não se podem explicar verbalmente todas as regras e que só nos resta ensiná-las através de exemplos. Podemos recorrer também ao filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein, que nos indica o caráter social de seguir uma regra: aprendemos a seguir regras na interação com outros seres humanos, seja pela imitação, seja pelas indicações que os outros indivíduos nos dão de nossos erros e acertos ao tentarmos executar uma atividade. Na verdade, os dois métodos andam juntos: aprendemos a falar imitando os nossos pais e sendo corrigidos por eles.
  • 18. Apresento brevemente, a partir de Ryle, alguns temas que permeiam a filosofia analítica da educação, em que dois livros se destacam: A lógica da educação, dos ingleses Paul Hirst e Richard Peters, e Linguagem da educação, de Israel Scheffler. Esses livros, escritos na década de 1960, têm como característica comum a análise dos conceitos empregados na educação (tais como ensino, desenvolvimento, currículo) e dos argumentos que são utilizados para sustentar os princípios educacionais. O método dos autores parece indicar que fazem uma investigação neutra, sem emitirem juízos críticos sobre o assunto. A aparência é falsa. Ambos os livros tratam das metas da educação e dos métodos para atingi- las, o que implica uma análise crítica. Na década seguinte, entretanto, o termo “crítica” assume uma conotação social, e surge a pedagogia crítica, que é uma junção do marxismo humanista, da Escola de Frankfurt, com a pedagogia do oprimido, de Paulo Freire. Com o declínio da teoria marxista, a filosofia da educação, na década de 1990, buscará inspiração na filosofia pós-marxista francesa de Foucault, Deleuze e Derrida, os filósofos chamados de pós-estruturalistas, e de Lyotard e Baudrillard, os teóricos do pós-modernismo. De influência pós-estruturalista, temos a inserção de temas como o feminismo, multiculturalismo, homossexualidade, questões étnicas e raciais. O pós-modernismo, por seu turno, legou os vários tipos de relativismo: epistemológico, cultural, psicológico etc. É preciso frisar, no entanto, que não há uma definição clara nem uma distinção rigorosa entre essas duas correntes intelectuais, quando se trata das teorias educacionais, de tal modo que ambas são usualmente colocadas na rubrica pós-modernismo. A tese básica da teoria educacional pós-moderna é a de que o conhecimento — em especial, o conhecimento científico — não é resultado da observação de como as coisas são na natureza, mas das relações de poder na sociedade (entendendo-se por “poder”, além do poder político ou econômico, o poder masculino, o poder do homem branco, o poder do europeu etc.), o que, obviamente, retira do conhecimento (inclusive o científico) qualquer objetividade. As conseqüências que são extraídas dessa tese são tão variadas quanto é diverso aquilo que está sob a rubrica “pós-moderno”, mas, em geral, os autores não oferecem alternativas à epistemologia tradicional, apenas limitando-se a criticá-la. Quando são propositivos, muitas vezes suas propostas não trazem nada de realmente novo. Nesse cenário, Usher e Edwards, defensores do pós- modernismo, afirmam que “… o papel do professor não é transmitir conteúdo,
  • 19. mas guiar os estudantes através de pacotes de aprendizagem e dotá-los de habilidades para aprenderem através deste método”. Ora, afirmar que o papel do professor não é transmitir conhecimento, e sim desenvolver habilidades nos alunos é, como vimos, uma idéia compartilhada por inúmeros filósofos do passado e do presente. Quanto à concepção de que não existe conhecimento objetivo, ela vem sendo criticada por vários filósofos, inclusive por aqueles que se dedicam à educação. Entre esses últimos, podemos citar Harvey Siegel, que aponta inconsistência nos defensores do pós-modernismo, visto que, quando afirmam que não existe conhecimento objetivo, estão supondo que essa tese é objetiva, o que a contradiz. Caso considerem, contudo, que a tese não é objetiva (não indica uma verdade sobre o mundo), então é possível que exista conhecimento objetivo; portanto, a tese não prova nada.
  • 20. Reformistas A primeira teoria filosófica envolvendo a reforma social e a educação ocorre no diálogo A República, de Platão, que será exposto a seguir. Na filosofia moderna, a idéia da reforma social sofre uma modificação drástica com a obra Emílio, de Rousseau, na qual é o indivíduo o foco das mudanças que a educação pode proporcionar. Já na filosofia contemporânea, um filósofo marxista reflete sobre a tragédia do seu tempo — o nazismo na Europa — e sugere o que a educação pode fazer para evitar que tal tragédia se repita. São três concepções muito distantes no tempo, e tal distância se reflete em suas teses. O que existe de comum entre elas é a crítica à forma como os estados estavam organizados em suas respectivas épocas e a convicção de que, através da educação, é possível mudar a forma como a sociedade está estruturada. Platão. Foi o primeiro filósofo a pensar em erigir uma nova sociedade com base na educação, que é um dos temas principais da sua obra mais conhecida, A República. Como qualquer reformador social, Platão inicia apontando as causas da degeneração do Estado. No início, a sociedade surge para satisfazer às necessidades básicas dos indivíduos, o que implica a divisão de trabalho entre agricultores, tecelões, pedreiros etc. Com o tempo, a sociedade cresce, seus membros não se contentam mais com a satisfação das necessidades básicas e criam novas necessidades, fazendo surgir a sociedade do luxo. É interessante notar que, também para Rousseau, é no surgimento de necessidades artificiais que ocorre a corrupção da sociedade. O filósofo grego, contudo, não propõe o retorno a uma sociedade pequena e sã, mas teoriza sobre o melhor modo de se manter uma grande sociedade. A solução, ele a encontra fundamentalmente na educação dos líderes da sociedade. Antes, porém, é preciso estabelecer uma hierarquia para o Estado ideal. Na hierarquia que Platão propõe, encontramos três classes: a dos agricultores e artesãos, a dos guardiões (os soldados) e a dos reis-filósofos. Os indivíduos que comporão cada uma dessas classes serão escolhidos pelas suas qualidades. No caso dos guardiões, as qualidades são a força física e a coragem, uma vez que serão eles que protegerão o Estado. A escolha é mais interessante no que se refere aos filósofos, pois eles serão escolhidos entre os que “quando contarem cinqüenta anos … se tiverem se destacado em tudo e de toda a
  • 21. maneira, no trabalho e na ciência, deverão ser levados até o limite, e forçados a inclinar a luz radiosa da alma para a contemplação do Ser que dá luz a todas as coisas; depois de terem visto o bem em si, usá-lo-ão como paradigma para ordenar a cidade …”. Os filósofos, que serão os governantes do Estado “por amor à cidade, fazendo assim não porque é bonito, mas porque é necessário”, são escolhidos mediante avaliação de suas aptidões intelectuais e morais, que, por sua vez, são desenvolvidas na educação dos guardiões. É na educação desses que Platão expõe a sua teoria geral sobre a educação. A formação do homem grego inclui tanto a educação da mente quanto a do corpo. Com relação a esta última, caberá à ginástica desenvolver as capacidades do corpo, mas Platão não dedica muito espaço para a discussão dessa disciplina, pois seu interesse está voltado para a educação da mente. É com relação à mente que Platão apresenta a sua tese mais polêmica: a rejeição da poesia, inclusive a de Homero, como forma de educação. É preciso ter claro, antes de qualquer coisa, que a educação dos jovens gregos dava-se através dos poemas épicos e do teatro; assim, esse tipo de literatura assumia uma importância muito maior na formação dos indivíduos do que a que tem atualmente. E Platão critica o fato de as crianças serem ensinadas a partir da mentira, ou seja, da ficção. Platão vê a poesia como uma imitação da realidade e entende que existe o perigo de aqueles que sejam educados por meio dela imitarem os personagens que demonstram um comportamento imoral. Visto que a educação deve visar à perfeição dos educandos, é a música que melhor cumpre a função de educar, “… porque o ritmo e a harmonia penetram mais fundo na alma e afetam-na mais fortemente, trazendo consigo a perfeição …”. Contudo, como vimos no início deste livro, o conhecimento mais elevado é concebido como aquele que trata das verdades eternas e imutáveis, como, por exemplo, as da matemática. O modo de se obter esse conhecimento é o exercício da dialética, que Platão define como o raciocínio que parte de hipóteses para “ … ir até aquilo que não admite hipóteses, que é o princípio de tudo … fixando- se em todas as conseqüências que daí decorrem, até chegar à conclusão, sem se servir em nada de qualquer dado sensível, mas passando das idéias umas às outras, e terminando em idéias …”. É o conhecimento das verdades imutáveis e eternas, as idéias, em especial o conhecimento da idéia de bem, que permite aos filósofos serem os melhores governantes. Desse modo, a educação prepara os indivíduos para cumprirem suas funções nas três classes que constituem a sociedade, criando um Estado
  • 22. onde existe harmonia entre os seus cidadãos, que é o Estado ideal. Rousseau. O filósofo inicia o seu livro sobre a educação, Emílio ou Da Educação, afirmando que o melhor livro sobre a educação pública é A República de Platão. O que não significa que seguirá os passos do filósofo grego, pois Rousseau julga que os colégios de sua época não merecem o título de instituições públicas e que a educação deve estar a cargo da família. Emílio é uma obra que visa a nortear a educação privada — aquela oferecida pelos pais — tendo por objetivo preparar o indivíduo para a vida no Estado. Contudo, assim como Platão, Rousseau critica o Estado de sua época, concentrando as suas censuras nas relações sociais entre os indivíduos, relações essas marcadas pela dissimulação e pelo empenho em satisfazer falsas necessidades. O indivíduo em sociedade perdeu a capacidade de avaliar a si mesmo, pois precisa reconhecer o seu valor por meio da comparação com os outros membros da sociedade: “O homem da sociedade está por inteiro na sua máscara.” Ao transformar os outros em espelho, o indivíduo forja novas necessidades para si mesmo, necessidades artificiais, cuja única função é satisfazer o jogo de aparências de uma vida social deturpada. Nesse jogo, o indivíduo se esforça para obter bens que não são necessários para atender suas necessidades reais, mas para servir como trunfo na sua comparação com os outros. Isso gera pessoas gananciosas e invejosas, que, por mais que obtenham bens, continuam insatisfeitas, uma vez que os bens são usados para satisfazer necessidades puramente fantasiosas. A solução para o conflito social, gerado pela ganância, também é uma forma de se evitar a infelicidade dos sujeitos: levar uma vida autêntica. Desse modo, Rousseau pode unir a reforma social a uma mudança na atitude dos homens. Não é uma reforma que parte da sociedade para o indivíduo, pelo contrário, é educando os indivíduos para uma vida autêntica que se podem modificar as relações entre os indivíduos na sociedade. O problema central da filosofia da educação rousseauniana, portanto, é o de como desenvolver nas pessoas o desejo e as condições de levar uma vida autêntica. Na solução desse problema, está envolvido o famoso conceito do “bom selvagem”. Em primeiro lugar, é preciso esclarecer que Rousseau não pretende transformar os homens civilizados em selvagens: “… querendo formar um homem de natureza, nem por isso se trata de fazer dele um selvagem, de jogá-lo
  • 23. no fundo da floresta … . O progresso natural do espírito é acelerado, nunca invertido. O mesmo homem que deve permanecer estúpido na floresta deve tornar-se racional nas cidades … .” Não se trata, portanto, de fazer regredir a civilização. Pelo contrário, o filósofo pretende acelerar o seu progresso com o cultivo do espírito daqueles que a compõem. A solução para o problema reside em educar a criança e o jovem para não se deixarem levar pelas necessidades artificiais, o que implica educá-los para a busca da satisfação das necessidades naturais, ou seja, o encontro da vida autêntica na vida natural. A educação deve começar seguindo os princípios naturais, uma vez que os “primeiros movimentos da natureza são sempre retos”, e entre estes o mais básico é a autopreservação, que gera uma paixão que estará conosco durante toda a vida: o amor a si mesmo. Mas, na medida em que o indivíduo entra para a sociedade, fica dependente da aprovação social dos outros, e o amor de si é substituído pelo amor-próprio, que é a fonte de toda ganância e inveja; além do mais, como o amor-próprio demanda que os outros nos amem mais que a si mesmos, o que é impossível, “o amor-próprio … nunca está satisfeito”. O cultivo do amor de si permite ao homem atingir a felicidade, pois as necessidades a que se dedica, por serem naturais, são passíveis de satisfação, e a satisfação das necessidades naturais torna-o bondoso com os outros, visto que, segundo o filósofo, é o excesso de necessidades que torna o homem mau. Na vida em sociedade, as pessoas, para cultivarem o amor de si, precisam desenvolver seu senso crítico, que lhes permite distinguir as necessidades naturais daquelas oriundas da ostentação social, a fim de que não se tornem gananciosas e formem uma sociedade onde cada um deseje apenas aquilo de que precisa — uma sociedade de homens livres. Adorno. A filosofia sempre viveu a tensão entre pensar o universal e atemporal e refletir sobre o que é particular e situado no tempo. No caso da análise política da educação, o que predominou foi o segundo tipo de reflexão. Theodor W. Adorno, contudo, foi o único filósofo a pensar a filosofia da educação a partir de um único evento: os campos de concentração nazistas. Adorno participou de um movimento de renovação do marxismo, iniciado na primeira metade do século XX: a Escola de Frankfurt. Além dele, fizeram parte desse movimento os filósofos Walter Benjamin, Max Horkheimer, Herbert Marcuse e, mais tarde, Jürgen Habermas. Esses filósofos mantiveram do marxismo o conceito de classes sociais e o de ideologia, mas acrescentaram
  • 24. conceitos oriundos da psicanálise, retomaram conceitos da filosofia de Hegel e reavivaram de Kant a idéia de uma filosofia crítica. O principal texto que Adorno escreveu sobre a educação é o artigo “Educação após Auschwitz”. Nele estabelece um princípio geral para a educação, baseado num fato histórico: “A exigência de que Auschwitz não se repita é a primeira de todas para a educação.” Transformar um fato histórico, algo puramente contingente, num princípio universal para a educação justifica-se porquanto esse fato instancia um processo universal da história humana: a possibilidade de a civilização tornar-se o seu oposto, a barbárie. Esse processo é analisado no livro Dialética do Esclarecimento, escrito em parceria com Horkheimer. A civilização deriva da necessidade do homem de dominar a natureza, não apenas a natureza externa, mas também a natureza interna: seus impulsos animais. Esses impulsos, contudo, podem ser domesticados, jamais anulados; e quanto maior é a força utilizada para reprimi- los, mais pressão eles exercem para vir à tona. Fatalmente, as forças civilizatórias sucumbem ao poder atávico de nossos impulsos naturais, e o caminho está preparado para a irrupção da barbárie, pois o selvagem que se encontra adormecido no homem civilizado, ao despertar, tem a seu dispor todo o poder destrutivo da tecnologia — aquilo que a civilização criou para dominar a natureza volta-se contra ela própria. Essa é a dialética que explica tanto o rigor científico dos campos de concentração nazista, quanto o das armas nucleares. O conceito fundamental para se entender o processo é o “esclarecimento”: o esforço intelectual que a humanidade realizou para se elevar da pura animalidade. Apesar de o livro ser uma crítica ao esclarecimento, os autores não o estão negando. Pelo contrário, eles utilizam a noção kantiana de crítica, ou seja, a análise de uma capacidade humana para estabelecer seus verdadeiros limites: “Não alimentamos dúvida nenhuma … de que a liberdade na sociedade é inseparável do pensamento esclarecedor”, mas esse conceito “contém o germe da regressão [à barbárie]”, que é o seu limite, e, se “o esclarecimento não acolhe dentro de si a reflexão sobre esse elemento regressivo …”, poderá causar a sua própria destruição. Não é difícil concluir que a tarefa da educação é esclarecer o esclarecimento: “A educação tem sentido unicamente como educação dirigida a uma reflexão crítica.” É importante usar aqui o termo “esclarecimento” em vez de “racionalidade”, porque, como Adorno enfatiza em entrevistas que concedeu à Rádio de Hessen, razão muitas vezes é tomado como se referindo à “capacidade formal de pensar”, quando o que “caracteriza a consciência é o pensar em
  • 25. relação à realidade, ao conteúdo”. O esclarecimento é a racionalidade em ação. Sua primeira meta é a sobrevivência, e, para realizá-la, precisa dominar a natureza, mas se não refletir sobre si mesmo, este impulso para a dominação poderá dominá-lo, fazendo eclodir dessa dominação a irracionalidade, a barbárie. Apesar de o filósofo não pretender apresentar uma metodologia de ensino, ele indica alguns objetivos para a educação crítica; dentre eles, o mais importante é o fortalecimento da personalidade, o que não implica legitimar o individualismo, visto que este surge de uma motivação exterior ao indivíduo — somos condicionados a agir segundo a máxima do “cada um por si” —, mas desenvolver no indivíduo a capacidade de liberar seu pensamento da ideologia dominante. Outro aspecto do projeto adorniano que queremos ressaltar é a sua preocupação com a diferença cultural entre o campo e a cidade. Ele cita o livro de Eugen Kogon, O Estado da SS, segundo o qual os algozes do campo de concentração onde Kogon esteve preso eram, na sua maioria, filhos de camponeses. Adorno atribui a essa triste constatação o fato de que, no campo, “o insucesso da desbarbarização foi ainda maior” do que na cidade. E sugere, como estratégia para mudar essa situação, que “colunas educacionais móveis de voluntários” se dirijam ao campo e “… procurem preencher as lacunas [de formação] mais graves por meio de discussões, de cursos e de ensino …”. É interessante notar que, na mesma época — década de 1960 — em que Adorno fazia esses comentários, Paulo Freire, no Recife, organizava um movimento de alfabetização e “conscientização” de adultos no meio rural. A conscientização consiste em desenvolver no indivíduo a habilidade de refletir sobre a “sua condição de pessoa, por isso, de sujeito”. Assim, apesar de Freire não mencionar a barbárie, percebemos que a finalidade do seu processo de educação é a mesma proposta por Adorno: desenvolver o senso crítico nos indivíduos, o que implica, antes de qualquer coisa, o fortalecimento da personalidade. O que também envolve, como diz o educador brasileiro, a “democratização da cultura” — e cabe ter em mente que as pessoas do campo têm mais dificuldade para ter acesso à cultura universal do que as da cidade; por isso, é fundamental levar até elas aquilo que a humanidade produziu. A filosofia de Adorno e dos outros filósofos da Escola de Frankfurt, junto com a teoria educacional de Paulo Freire, inspirou os criadores da Pedagogia Crítica, principalmente na crítica que esses teóricos fazem à razão científica, afirmando que é pouco reflexiva e sobrepondo a ela a razão dialética, que, além
  • 27. Aperfeiçoadores A diferença entre reformistas e aperfeiçoadores é mais clara no que tange às teorias de Platão e Aristóteles, pois o primeiro propõe uma reforma radical na sociedade, enquanto a proposta do segundo é a de que cada sociedade tenha uma educação condizente com a sua forma de governo. Podemos ver ecos da concepção de Aristóteles em filósofos modernos como Hobbes e Hegel, que não escreveram livros sobre o assunto, mas dedicaram algumas passagens de suas obras ao tema. Na filosofia contemporânea, a distinção que fazemos já não é tão clara. Adorno, que colocamos sob a rubrica dos reformadores, e o filósofo norte- americano John Dewey, classificado como aperfeiçoador, apesar de todas as diferenças filosóficas e mesmo políticas — Adorno é marxista, Dewey é um liberal —, concordam numa questão fundamental: a educação deve preparar os cidadãos para viverem de forma responsável numa democracia. Assim, a classificação que propomos deve ser vista tão-somente como um expediente para agrupar concepções filosóficas que têm apenas algumas semelhanças. Aristóteles. Diferentemente de Platão, Aristóteles afirma que “… o cidadão deve ser moldado para se adequar à forma de governo sob a qual vive, pois cada governo tem um caráter peculiar o qual originalmente o formou e que continua a preservá-lo”. Ao invés de propor a criação de um Estado ideal, Aristóteles estabelece as condições para a melhor realização e manutenção dos Estados existentes, mas não justifica a existência de qualquer tipo de Estado, nem afirma que a estabilidade do Estado seja mais importante que o bem-estar dos cidadãos — numa passagem da Política, livro em que desenvolve sua teoria sobre a relação entre política e educação, ele censura os gregos de sua época por não terem “… estruturado seus governos visando ao melhor fim, ou de não terem dado leis e educação visando a atingir todas as excelências …”. A última palavra citada — “excelências” — ilustra muito bem a função que o filósofo confere à política: desenvolver todas as potencialidades intelectuais e morais dos cidadãos. Portanto, a educação dos cidadãos não visa apenas a torná- los obedientes às leis do Estado — Aristóteles, aliás, afirma que a educação dos governantes e a educação dos governados devem ser idênticas, pelo menos no sentido de que “… aquele que deve aprender a governar deve antes, como se diz, aprender a obedecer” —, uma vez que a função do Estado não é apenas manter-
  • 28. se ou garantir o bem-estar de uma minoria, mas proporcionar o melhor modo de vida a todos os cidadãos. A finalidade do Estado coincide com a finalidade da vida do indivíduo — e qual será esta? Aristóteles percebe que é aquilo a que os homens chamam de felicidade. Mas, quando se trata de caracterizar o que é a felicidade, as coisas se complicam, pois pode ser o prazer, a riqueza, a saúde, a honra; contudo, “… alguns pensam que, ao lado desses bens, existe outro que é o bem em si mesmo …”, sendo um dos temas principais do livro Ética a Nicômaco o bem supremo. Além dessa definição de felicidade, o filósofo apresenta a felicidade como uma atividade e distingue dois tipos: corpórea e racional. Assim como Platão, Aristóteles privilegia o segundo tipo de atividade: “… felicidade é uma atividade da alma que visa à completa excelência … .” As excelências de um ser racional são de dois tipos: morais e intelectuais. A primeira é adquirida por meio do hábito, enquanto a segunda, apesar de existir em nós desde o nascimento, em potência, precisa ser desenvolvida pela educação. Desse modo, para o filósofo, a felicidade é atingida por meio da educação. E, uma vez que a felicidade do cidadão é a meta do Estado, cabe a este educar todos os cidadãos, ou seja, a educação deve ser pública. Mas o que se deve aprender para atingir a excelência intelectual? Em primeiro lugar, é preciso o ócio — e, na sociedade da época de Aristóteles, o ócio de uns era obtido graças ao trabalho escravo de outros. Com tempo livre disponível, o indivíduo pode se dedicar à mais elevada atividade intelectual: a contemplação da verdade, que compreende o uso puramente teórico da razão. No livro Metafísica, Aristóteles afirma que a esse uso correspondem “… três filosofias teóricas: matemática, ciência natural e teologia …”, mas é claro que a educação compreende também outras, que serão as etapas necessárias para chegar a tal uso da razão. Seguindo a tradição grega, o sistema educacional proposto por Aristóteles principia com o desenvolvimento do corpo, aqui incluído desde os cuidados com a nutrição do recém-nascido até a ginástica para os jovens. Após, vêm a alfabetização e o ensino das artes. Com relação às artes, Aristóteles também concorda com Platão ao escolher a música como a mais elevada e investiga se esta poderia desenvolver o caráter moral dos indivíduos, com o que parece concordar. Contudo, ele oferece um outro motivo para a educação musical: Aristóteles julga que a melhor forma de aproveitar o ócio é a propiciada pela música: “Todos os homens concordam que a música é uma das coisas mais prazerosas
  • 29. que existem … .” Deste modo, dedicar-se ao prazer da música conduz à felicidade. Na teoria aristotélica, a função da educação é adequar o indivíduo à forma de governo na qual vive, o que não implica, contudo, uma simples acomodação dos interesses do indivíduo aos interesses dos governantes, pois o interesse primordial do Estado é o bem-estar dos indivíduos. Por conseguinte, o Estado deve providenciar a educação mais adequada para que o indivíduo possa desenvolver a atividade que é o bem viver, ou seja, a felicidade. Dewey. No início do século XX, a democracia moderna ainda estava se anunciando na Europa, enquanto se desenvolvia nos Estados Unidos. Tal desenvolvimento foi uma preocupação constante na vida do filósofo norte- americano John Dewey, que, ao lado de William James e Charles Pierce, é um dos expoentes do pragmatismo — a escola filosófica cujo principal objetivo é estudar o pensamento humano a partir das conseqüências empíricas do significado de nossas idéias e do uso da linguagem. O pragmatismo de Dewey tem como característica principal a interpretação do pensamento como um dos processos vitais que constituem o ser humano. Todo processo vital nada mais é do que o esforço que o organismo realiza para manter a sua organização, ou seja, a sua vida. Assim, há uma continuidade entre os processos biológicos e os processos intelectuais, sendo o pensamento o resultado do processo evolutivo do ser humano. A evolução pressupõe a transmissão de características de uma geração a outra, o que pode ocorrer de maneira puramente biológica, mas o pensamento não é apenas biológico — “pensar e sentir … são modos sociais de comportamento …” —, o que implica a transmissão social do comportamento pela educação. Dewey contrapõe ao naturalismo rousseauniano o idealismo hegeliano: as capacidades intelectuais do indivíduo não se desenvolvem espontaneamente a partir de sua natureza, sendo a sociedade um impedimento ao correto desenvolvimento de tais capacidades, como pensa Rousseau; pelo contrário, é preciso aprender com Hegel que as nossas capacidades intelectuais são formadas a partir da interação social, que gera a linguagem, a cultura, o governo, a arte e a religião. A origem das capacidades cognitivas pode ser natural, mas o seu desenvolvimento se dá na interação do indivíduo com as instituições sociais. Uma vez que a sociedade nada mais é do que a reunião dos indivíduos, desenvolvê-los culturalmente é o modo de manter a cultura da sociedade e, mesmo, aperfeiçoá-la. A educação, portanto, tem a finalidade de manter e
  • 30. desenvolver a sociedade. A rejeição ao naturalismo implica recusar a concepção da política educacional de Rousseau: “… a doutrina de seguir a natureza é um dogma político, ela significa a rebelião contra todas as instituições, costumes e ideais sociais existentes.” Isso não significa que o objetivo da educação seja domesticar os homens a fim de facilitar a sua subordinação a outros homens. Pelo contrário, “… a eficiência social não é obtida através do cerceamento das capacidades naturais do indivíduo, mas do seu uso em ocupações que tenham significado social”. É claro que o filósofo norte-americano não acredita que qualquer organização social possa desenvolver as capacidades naturais do indivíduo. Por isso, defende o aperfeiçoamento da democracia. É preciso, contudo, dirimir um possível mal-entendido com relação às convicções políticas de Dewey: ele ser um defensor do liberalismo não significa que defenda a versão contemporânea do liberalismo econômico que desobriga o grande capital de seus encargos sociais; pelo contrário, o filósofo defendia o que mais tarde foi chamado de liberalismo-social, ou seja, um sistema democrático onde haja um controle social que impeça o surgimento de grandes desigualdades entre os indivíduos. Esse controle social não se dará por uma intervenção direta do governo, mas através da educação, uma vez que uma educação democrática possibilita “… uma ordem social mais equânime e esclarecida …”. O próprio conceito de liberdade, que o filósofo defende, é baseado na interação social: “… a essência da demanda por liberdade é a necessidade de condições que permitam a um indivíduo fazer a sua contribuição aos interesses do grupo e participar das suas atividades de tal modo que a orientação social seja originada em seus próprios atos mentais …”. No conceito de liberdade está implicado o conceito de autonomia de pensamento. Dewey sabe que “pensar por si mesmo” é um pleonasmo; por isso, quando fala de pensamento próprio, refere-se a pensar com originalidade, algo que só pode ser desenvolvido graças à educação. Assim, a educação é um conceito-chave em toda a filosofia política de Dewey: a democracia é um sistema político que permite conciliar a liberdade com a harmonia social, mas isso só pode ser alcançado através de uma educação que faça jus a esse sistema, ou seja, uma educação para a democracia. O principal livro que Dewey escreve sobre esse tópico chama-se Democracia e educação. Apesar de não o dizer explicitamente, nesse livro ele trata da educação pública, universal e gratuita — a única forma de educação compatível
  • 31. com seu ideal de uma democratização da sociedade. Vimos, logo acima, que a liberdade do indivíduo, que é fundamental numa sociedade democrática, significa autonomia de pensamento; por isso, Dewey, no livro mencionado, estabelece o método educacional que melhor convém a tal autonomia. Além de criticar a concepção naturalista rousseauniana da educação como desdobramento de poderes latentes, também refuta a concepção mais tradicional de educação como uma formação vinda do exterior, oferecendo como alternativa a educação como uma permanente reconstrução da experiência: “… [educação] é a reconstrução ou reorganização da experiência que acrescenta significado a esta e aumenta a habilidade para dirigir a experiência subseqüente.” A proposta de metodologia educacional do filósofo norte-americano apresenta uma certa similaridade com a de Locke (e mesmo com a de Kant), na medida em que entende como tarefa do professor desenvolver no aluno a sua capacidade de interpretar a experiência, o que implica a construção de hipóteses, que, por sua vez, precisam ser testadas por meio de novos experimentos — as “experiências subseqüentes”. Assim, a educação consiste mais no desenvolvimento de habilidades cognitivas do que na transmissão de conhecimento. É claro que o desenvolvimento dessas habilidades também aumenta a capacidade de raciocínio crítico do aluno, o que contribui para o desenvolvimento de sua autonomia — uma meta prioritária no projeto educacional deweyano, como vimos. A tarefa da escola é proporcionar um ambiente onde a aprendizagem se dê por meio de experimentos, cabendo ao professor planejar as atividades de pesquisa, de tal forma que correspondam aos interesses dos alunos, ao mesmo tempo em que sejam desafiadoras. Todo o ambiente de ensino deve favorecer a cooperação entre os alunos, a fim de prepará-los para viverem numa sociedade democrática. Mas o filósofo faz uma ressalva: “… é dever do ambiente escolar equilibrar os vários elementos do ambiente social, e providenciar que cada um tenha a oportunidade de escapar das limitações do grupo social no qual nasceu … .” Segundo o liberalismo-social de Dewey, numa sociedade democrática os indivíduos devem ter a liberdade de escolher sua profissão e de transitar entre os diversos grupos sociais que a compõem, sendo tarefa da educação prover aos indivíduos tal liberdade. Esse é um dos aspectos da educação numa sociedade democrática enfatizado por Anísio Teixeira no artigo “O processo democrático de educação”. O educador baiano, idealizador da Universidade de Brasília (UnB) e signatário do
  • 32. Manifesto da Escola Nova de 1932, foi aluno de Dewey e trouxe as idéias de seu professor para o Brasil. No referido artigo, afirma “que todos os homens são suficientemente educáveis para conduzir a vida em sociedade de forma a que cada um e todos dela partilhem como iguais”. À luz da filosofia de Dewey, o programa de educação democrática de Teixeira compreende a substituição das diferenças de classe pelas diferenças individuais, a fim de “… reconstruí-las e integrá-las em uma experiência mais larga … visando o estabelecimento de uma verdadeira fraternidade humana”.
  • 33. Considerações finais O processo educacional é um processo de aquisição de conhecimento, mas é mais do que isso: a educação deve desenvolver os instrumentos por meio dos quais adquirimos o conhecimento. Esta é a tese básica tanto dos empiristas quanto daqueles que classificamos como defensores da concepção transcendental. Estes e aqueles, na filosofia contemporânea, concebem o ensino como um processo cuja finalidade não é apenas informar o aluno, mas desenvolver nele a capacidade de procurar e processar informações. É importante notar, ainda, que também a concepção idealista não vê na educação um processo de memorização de conhecimento. Todas as três concepções enfatizam, portanto, a educação como um meio para o desenvolvimento das capacidades intelectuais dos seres humanos. A atividade educacional também é vista como um meio para harmonizar as relações entre os seres humanos, evitando que apenas em virtude da coação estatal os cidadãos respeitem as leis que garantem a ordem na sociedade. Para alguns filósofos, contudo, é por meio da educação que se pode criar uma nova organização social — esse é o caso, como vimos, das propostas de Platão e Rousseau. Mas também aqui há um aspecto comum entre todas as teorias filosóficas abordadas: uma vez que a política é uma maneira de garantir uma boa vida para os cidadãos, a educação, mesmo quando deve preparar as pessoas para viverem sob o tipo de Estado no qual nasceram, sempre visará às melhores condições de vida possíveis.
  • 34. Seleção de textos Educação e Estado Não há dúvidas de que o legislador deve se preocupar, acima de tudo, com a educação das crianças, porque negligenciá-la prejudica o Estado. O cidadão deve ser moldado para se adequar à forma de governo sob a qual vive, pois cada governo tem um caráter peculiar que originalmente o formou e que continua a preservá-lo. O caráter democrático perpetua a democracia e o caráter oligárquico mantém a oligarquia, e quanto melhor o caráter, melhor o governo. Para o exercício de qualquer faculdade ou arte requer-se um treinamento ou hábito prévio, o mesmo ocorrendo para o exercício da virtude. E, visto que a cidade-Estado, como um todo, tem uma única e mesma finalidade, a educação deve ser una e idêntica para todos; por conseguinte, deve ser pública, e não privada. Embora atualmente cada um cuide da educação de seus filhos da maneira que julga melhor, a aprendizagem das coisas comuns deve ser a mesma para todos. Tampouco deve-se supor que os cidadãos pertençam a si mesmos, visto que todos pertencem ao Estado, e cada um é parte do Estado, sendo o cuidado de cada parte inseparável do cuidado com o todo. Neste aspecto, como em outros, os lacedemônios devem ser louvados, uma vez que eles se dedicam bastante às suas crianças e fazem da educação uma tarefa do Estado. Ninguém nega que a educação deve ser regulada pela lei e ser um assunto do Estado, mas qual deve ser o caráter da educação pública e como os jovens devem ser educados são questões que precisam ser investigadas. Como as coisas estão, existe desacordo com respeito a este assunto. Não se sabe se devemos ensiná-los a ser virtuosos ou a ter uma vida melhor, tampouco está claro se a educação diz respeito à formação intelectual ou à moral. As práticas educacionais atuais dificultam a questão: devemos ensinar aquilo que é útil para a vida, o que é virtuoso, ou o conhecimento mais elevado? As três alternativas possuem defensores. Também não há consenso com relação aos métodos educacionais. Uma vez que pessoas diferentes têm concepções diferentes a respeito do que seja a virtude, elas irão discordar quanto à prática desta. Não há dúvida de que às crianças devam ser ensinadas coisas úteis, mas não
  • 35. todas as coisas úteis, pois as ocupações são divididas entre liberais e servis, e deve-se ensinar aos jovens apenas aquele conhecimento útil que não os transforme em artesãos. E chamamos de ocupação de artesão toda a ocupação, arte ou ciência que não torna o corpo e a mente ou alma de um homem livre adequados à prática ou ao exercício da virtude. Damos o mesmo nome às ocupações que deformam o corpo e, igualmente, a todo trabalho pago, porque degradam a mente. Existem também artes liberais que são adequadas a um homem livre apenas em certo grau, uma vez que, se ele as praticar com afinco visando atingir a perfeição, seguir-se-ão os mesmos efeitos negativos. A grande diferença consiste na intenção que motiva o trabalho ou o estudo: se ele faz ou aprende algo por interesse próprio, ou de seus amigos, ou visando a virtude, então a ação não parecerá servil; mas a mesma ação, se feita para outros, será tida como mercenária e servil. As concepções atuais da educação, como já disse, têm, em parte, um caráter liberal, em parte, um caráter servil. Aristóteles, Política, livro 8, 1337a10-1337b22
  • 36. Educação e conhecimento Um homem pode ensinar outro homem? 1ª objeção. Parece que um homem não pode ensinar outro, porque o Senhor diz (Mt., 23:8): “Não queirais ser chamado Rabi (meu mestre).” A glosa de Jerônimo diz o seguinte a este respeito: “Não dê ao homem a honra devida a Deus.” Portanto, ser mestre é uma honra que pertence a Deus. Como pertence ao mestre ensinar, o homem não pode ensinar, sendo essa tarefa apropriada a Deus. 2ª objeção. Além do mais, se um homem ensina outro, ele o faz através de seu próprio conhecimento, a fim de causar conhecimento no outro. Mas uma qualidade que envolve ação para produzir outra que lhe assemelhe é uma qualidade ativa. Segue-se que o conhecimento é uma qualidade ativa, como o calor. 3ª objeção. Além disto, para se obter conhecimento requer-se a luz intelectual, e a espécie da coisa compreendida. Mas um homem não pode causar nada disto em outro. Logo, um homem, através do ensino, não pode causar conhecimento em outro. 4ª objeção. O professor não faz nada em relação ao aluno além de lhe propor alguns signos, de modo a significar algo através de palavras ou gestos. Mas não é possível ensinar conhecimento a alguém através dos signos, pois serão signos de coisas que ele sabe ou não sabe. Se são de coisas que ele sabe, então ele já tem o conhecimento da coisa e não precisa de um mestre. Se são de coisas que não sabe, não poderá aprender nada através destes; por exemplo: se um homem falar em grego para alguém que só sabe latim, este não aprenderá nada. Conseqüentemente, um homem não pode causar conhecimento em outro ensinando-o. Mas, em contrário, são Paulo diz (1º Tm, 2:7): “Por Cristo fui constituído pregador e apóstolo … mestre dos gentis na fé e na verdade.” Respondo a essa questão afirmando que sobre ela existem várias opiniões. Segundo o comentário de Averroes ao [livro de Aristóteles] De Anima iii, todos os homens possuem um intelecto passivo. Disto se segue que todos os homens
  • 37. possuem as mesmas espécies inteligíveis, o que o leva a concluir que um homem não pode incutir em outro um conhecimento distinto daquele que possui, mas que comunica o mesmo conhecimento que possui movendo de maneira apropriada os fantasmas em sua alma a fim de estarem corretamente dispostos para a apreensão inteligível. Esta opinião é verdadeira somente na medida em que o conhecimento é o mesmo no discípulo e no mestre, se consideramos a identidade da coisa conhecida, pois a mesma verdade objetiva é conhecida por ambos. Entretanto, quando mantém que todos os homens têm o mesmo intelecto passivo e as mesmas espécies inteligíveis, diferindo apenas quanto aos vários fantasmas, a opinião de Averroes é falsa. Existe, além do mais, a opinião dos platônicos, que sustentam que a alma possui conhecimento desde o seu início, através da participação das formas separadas, mas que é impedida, em virtude da sua união com o corpo, da livre consideração das coisas que já conhece. De acordo com esta concepção, o discípulo não adquire novo conhecimento de seu mestre, apenas é levado por este a considerar o que já conhece, de tal forma que aprender nada mais é do que rememorar. Da mesma maneira, eles sustentam que os agentes naturais apenas nos predispõem a receber formas que a matéria adquire através da participação de substâncias distintas. Contra esta concepção, no entanto, já provamos que o intelecto passivo da alma humana está em pura potencialidade com relação ao inteligível (species), como Aristóteles afirmou (De anima, iii, 4). Devemos, por conseguinte, resolver o problema de modo diferente, afirmando que o professor causa conhecimento no aprendiz fazendo-o passar da potencialidade ao ato, como Aristóteles disse (Física, viii, 4). A fim de tornar isto claro, precisamos notar que, dos efeitos que resultam de um princípio exterior, alguns procedem apenas deste, como a forma da casa, que é causada na matéria apenas pela arte do arquiteto; enquanto outros efeitos originam-se, às vezes, de um princípio exterior, outras vezes de um princípio interior: assim, a cura é, algumas vezes, alcançada num homem doente através de um princípio exterior, a arte médica, e, noutras, por meio de um princípio interior, como quando um homem é curado pela força da natureza. Com relação a esses efeitos, duas coisas devem ser notadas. Em primeiro lugar, a arte imita a maneira como a natureza cura um homem: alterando, digerindo ou expulsando a matéria que causou a doença. Em segundo lugar, é preciso ter claro que o princípio exterior, a arte, age não como o agente principal, mas ajudando o agente principal, o princípio interior, fortalecendo-o e dando-lhe instrumentos e assistência que serão utilizados por ele para produzir o efeito.
  • 38. Desse modo, o médico fortalece a natureza e emprega comida e remédios que serão utilizados pela natureza para produzir o fim almejado. Ora, o conhecimento é adquirido pelo homem, tanto de um princípio interior, que fica claro no caso do homem que produz conhecimento através da descoberta pessoal, quanto de um princípio exterior, como no caso daquele que recebe um ensinamento, pois em todo homem há um certo princípio de conhecimento, a saber, a luz do intelecto ativo, através do qual certos princípios universais de todas as ciências são naturalmente conhecidos assim que são apresentados ao intelecto. Quando alguém aplica estes princípios universais a uma coisa particular, cuja memória ou experiência adquire através dos sentidos, então, por sua própria investigação, indo do conhecido ao desconhecido, ele obtém conhecimento daquilo que não conhecia. Logo, qualquer um que ensina leva o discípulo das coisas que ele conhecia às coisas que não conhece, o que está em acordo com o que Aristóteles diz (Analíticos posteriores, i, 1): “Todo conhecimento e toda aquisição de conhecimento partem de um conhecimento preexistente.” são Tomás de Aquino, Suma teológica, 1ª parte, questão 117, 1º artigo
  • 39. O ensino através do raciocínio §81. Talvez possa causar estranheza que eu mencione raciocinar com crianças: não posso, no entanto, deixar de pensar que esta é a única maneira de lidar com elas. As crianças compreendem isto assim que começam a utilizar a linguagem, e, a menos que me engane, adoram ser tratadas como criaturas racionais mais cedo do que se imagina. Este orgulho deve ser acalentado e usado, tanto quanto possível, como um grande instrumento para transformá-las. Porém, quando falo de raciocínio, não me refiro a nada além daquilo que é apropriado à capacidade e à compreensão da criança. Ninguém pode imaginar um menino de três ou sete anos respondendo a perguntas como um adulto. Longos discursos e raciocínios filosóficos no máximo assombram e confundem, mas não instruem as crianças. Quando digo, portanto, que elas devem ser tratadas como criaturas racionais, quero dizer que você deve sensibilizá-las com brandura na sua criação e manter a serenidade mesmo no castigo, para mostrar a elas que o que você faz é racional, necessário e útil para o bem delas, não sendo as suas ordens o resultado de mero caprichio (capricho), paixão ou fantasia. Elas são capazes de compreender isto e não creio que não possamos convencê-las a seguir a virtude e afastar-se do vício, desde que isso seja feito com raciocínios adequados a sua idade e compreensão, usando palavras simples e em pouca quantidade. As fundações sobre as quais vários deveres são edificados e as fontes do certo e do errado dos quais nascem estes deveres não são fáceis de serem inculcadas na mente de homens adultos que não estejam habituados a abstrair seus pensamentos de opiniões recebidas do senso comum. Muito menos são as crianças capazes de raciocinar a partir de princípios distantes. Elas não entendem a força de longas deduções: as razões que as movem devem ser óbvias e niveladas aos seus pensamentos quase como se pudessem ser sentidas e tocadas. Mas, se a sua idade, têmpera e inclinações forem levadas em conta, nunca faltarão motivos suficientes para convencê-las. Se não existir outro motivo mais particular, ainda assim estes serão sempre inteligíveis e terão força para detê-las de qualquer falta que possam cometer, do tipo que poderá envergonhá-las, desonrá-las e desagradar aos pais. §82. De todos os modos pelos quais uma criança pode ser instruída e formar seu comportamento, o mais simples, fácil e eficiente é colocar diante dos seus olhos
  • 40. exemplos daquelas coisas que você quer que ela faça ou evite fazer, as quais, quando são apresentadas através da prática de pessoas que conhecem, com alguma reflexão sobre sua beleza ou inconveniência, têm mais força para impelir ou impedir que as imitem do que qualquer discurso. Virtudes e vícios não podem, pelas palavras, ser tão facilmente inculcados em seu entendimento quanto a contemplação das ações de outros homens, quando você orienta sua observação a fim de que percebam esta ou aquela boa ou má qualidade em sua prática. E a beleza ou inconveniência de muitas coisas com respeito à boa ou má educação será mais bem aprendida e causará uma impressão mais profunda através dos exemplos dos outros do que de qualquer regra ou instruções que lhes forem oferecidas. Este é um método a ser usado não apenas com aqueles que são jovens, mas com aqueles que continuam sob o ensino ou direção de alguém. Eu creio que esta é a melhor maneira a ser usada por um pai enquanto ele julgar adequado corrigir o seu filho: nada penetra mais profunda e gentilmente na mente dos homens do que um exemplo. E o que eles inadequadamente indultam em si mesmos causa desgosto e vergonha quando é mostrado através de outro. … §118. A curiosidade nas crianças não é nada além de um desejo por conhecimento e deve, pois, ser encorajada, não só como um bom sinal, mas como o grande instrumento que a natureza providenciou para remover a ignorância com a qual nasceram, a qual, sem a curiosidade, faria delas criaturas estúpidas e inúteis. Os modos de encorajá-las a manterem esta atividade, eu suponho, são os seguintes: 1. Não rejeitar nem desdenhar de qualquer indagação feita pelo infante, ou rir de suas dúvidas, mas responder todas as suas questões e explicar os assuntos que ele deseja conhecer, de modo a torná-los inteligíveis e apropriados a sua idade e conhecimento. Porém, não confunda seu entendimento com explicações que estão para além dele ou com uma variedade ou número de coisas despropositadas. Note qual o objetivo da sua mente na questão, e não o que suas palavras expressam; e, quando você o tiver informado e satisfeito, com relação ao assunto, verá como os seus pensamentos aumentarão a si mesmos, e como, através das respostas apropriadas, ele pode ser levado além daquilo que você imagina, visto que o conhecimento agrada ao entendimento, como a luz aos olhos. As crianças o adoram, especialmente se elas percebem que as suas
  • 41. investigações são levadas a sério e se o seu desejo de conhecimento é encorajado e elogiado. E não tenho dúvida de que a grande razão de as crianças se dedicarem inteiramente a divertimentos bobos e gastarem seu tempo de modo insípido é porque tiveram sua curiosidade obstada e suas inquirições negligenciadas. Mas se tivessem sido tratadas com mais ternura e respeito, se suas questões fossem respondidas, não tenho dúvidas de que teriam mais prazer em aprender e aperfeiçoar seu conhecimento nos assuntos que oferecessem variedade e novidade do que em retornar aos mesmos divertimentos. … §120. Assim como as inquirições das crianças não devem ser desprezadas, também deve-se cuidar para que nunca recebam respostas enganadoras e evasivas. Elas facilmente percebem quando estão sendo desconsideradas ou enganadas e rapidamente aprendem a ser negligentes, dissimuladas e falsas quando observam outros fazerem o mesmo. Não devemos fugir da verdade em qualquer conversa, muito menos com as crianças, uma vez que, ao sermos falsos com elas, não estamos apenas frustrando suas expectativas e impedindo seu conhecimento, mas estamos corrompendo sua inocência e lhes ensinando os piores vícios. Elas são viajantes recém-chegados a uma terra estranha, da qual não sabem nada; devemos, portanto, ter em mente não as enganar. E mesmo que suas questões pareçam algumas vezes não serem pertinentes, devem ser respondidas com diligência, pois, ainda que nos pareçam (a quem já são conhecidas por muito tempo) inquirições sem mérito, elas não são menos importantes para quem é totalmente ignorante. Crianças ignoram aquilo que nos é mais familiar e tudo com o que se deparam é desconhecido para elas, como já foi um dia para nós, e felizes são aqueles que encontram pessoas cordiais que percebem sua ignorância e as ajudam a sair dela. … John Locke, Some Thoughts Concerning Education, p.58-9 e 93-4
  • 42. O ensino através da experiência A experiência consiste primariamente em relações ativas entre um ser humano e seu ambiente natural e social. Em alguns casos, a iniciativa parte do lado do ambiente; os esforços dos seres humanos sofrem certas frustrações e desvios. Em outros casos, o procedimento das coisas e pessoas do ambiente leva a desfecho favorável as tendências ativas do indivíduo, de modo que, afinal aquilo que o indivíduo sofre ou sente são as conseqüências que tentou produzir. Exatamente na proporção em que se estabelecem conexões entre aquilo que sucede a uma pessoa e o que ela faz em resposta, e entre aquilo que a pessoa faz a seu meio e o modo por que esse meio lhe corresponde, adquirem significação os atos e as coisas que se referem a essa pessoa. Ela aprende a conhecer-se e também a conhecer o mundo dos homens e das coisas. A educação praticada intencionalmente (ou escolar) deveria apresentar um ambiente em que essa interação proporcionasse a aquisição daquelas significações que são tão importantes que se tornam por sua vez instrumentos para a ulterior aquisição de conhecimentos. Segundo o que já foi repetidamente salientado, a atividade extra-escolar manifesta-se em condições que não foram propositadamente adaptadas para incentivar a função da compreensão e a formação de eficazes atitudes mentais. Na proporção em que se produzem, os resultados são genuínos e vitais, mas apresentam-se limitados por todas as espécies de circunstâncias. Algumas tendências permanecem totalmente sem direção e sem desenvolvimento; para outras, deparam-se apenas estímulos ocasionais; outras adquirem hábitos de rotina em detrimento dos objetivos da iniciativa e inventividade ricas de recursos. A função da escola não é transportar os adolescentes de um ambiente ativo para outro de um estudo inerte dos registros daquilo que outros homens aprenderam, e sim levá-los de um ambiente de atividades relativamente casuais (casuais em relação à compreensão e à inteligência que possam proporcionar) para outro de atividades selecionadas, tendo em vista servir de guias para o aprendizado. Um ligeiro exame dos métodos aperfeiçoados que já se mostraram eficazes para a educação revelará que eles se apegam, mais ou menos conscientemente, ao fato de que os estados “intelectuais”, em vez de se oporem aos trabalhos ativos, representam a intelectualização desses trabalhos práticos. Resta-nos aprender mais solidamente esse princípio.
  • 43. As mudanças que se operam no conteúdo da vida social facilitam consideravelmente a seleção da espécie de atividade que intelectuarizará os brinquedos e os trabalhos escolares. Se pensarmos no ambiente social dos gregos e dos povos medievais, em que as atividades práticas que pudessem ser exercitadas com bom êxito eram em sua maioria de espécie rotineira e inferior, e até de natureza servil, não nos surpreenderemos que os educadores desses tempos as tenham desdenhado como impróprias para cultivarem a inteligência. Mas o caso é diferente hoje, tempo em que até os serviços domésticos, os da agricultura e da indústria, assim como os de transporte e comunicações, estão impregnados do espírito da ciência aplicada. É verdade que muitos dos que atualmente se dedicam a eles não têm consciência do conteúdo intelectual de que seus atos pessoais dependem. Mas esta circunstância apenas produz o efeito de acrescentar mais um motivo para que o ensino escolar se utilize dessas atividades, de modo a habilitar a próxima geração a adquirir uma compreensão que falta, geralmente, em nossos dias, podendo, assim, conduzirem-se seus trabalhos, não mais cegamente, mas com inteligência. John Dewey, Democracia e educação, p.301-2
  • 44. Referências e fontes [1] A citação é do diálogo de Platão Mênon (81 c, numeração marginal), e foi retirada de Plato’s Meno in Focus, organizada por J.M. Day (Londres, Routledge, 1994). [2] Extratos da obra Sobre o mestre, de santo Agostinho (in Santo Agostinho, col. Os Pensadores, São Paulo, Nova Cultural, 1987, p.318 e 319). [3] As passagens são de obras de Locke, Of the Conduct of the Understanding (Indianápolis, Hackett, 1996, p.192, §19) e Some Thoughts Concerning Education (Indianápolis, Hackett, 1996, p.150, §195), respectivamente. [4] A citação é extraída da obra de são Tomás de Aquino, Suma teológica (Porto Alegre, Est, Sulina e UCS, 1980, 1ª parte, questão 117, 1o artigo), de onde também vêm a primeira e a terceira passagens da página 20. [5] A segunda citação foi retirada da obra de Aristóteles Analíticos posteriores (I, 1, 71a1). [6] Kant, Antropologie du point de vue pragmatique (Paris, Vrin, 1991). [7] Extratos do livro de Kant Sobre a pedagogia (Piracicaba, Unimep, 1996, p.74 e 71, respectivamente). [8] Os excertos foram retirados da obra de Whitehead, Os fins da educação (São Paulo, Editora Nacional / Editora da USP, 1969, p.14, 31 e 32, respectivamente). [9] A citação foi extraída do texto de Ryle, “Ensenãnza y entrenamiento”, in El concepto de educación (Buenos Aires, Paidos, 1969, p.168). Desse mesmo livro vem a referência da página 25 a Max Black, retirada do artigo “Reglas y rutinas” (p.148-67). [10] A passagem foi extraída do livro de Robin Usher e Richard Edwards, Postmodernism and Education (Londres, Routledge, 1994, p.179).
  • 45. [11] A referência a Harvey Siegel é baseada no que ele afirma na página 30 do livro Education, Knowledge and Truth: Beyond the Postmodern Impasse, organizado por David Carr (Londres, Routledge, 1998). [12] Excertos do diálogo platônico A República (540a, 540b, 401e e 511b-c, respectivamente, numeração marginal). [13] e [14] Citações de Rousseau, Emílio ou Da educação (Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 1995, p.258, 291, 78 e 236, respectivamente). [15] Passagem de Adorno publicada no livro Educação e emancipação (São Paulo, Paz e Terra, 2000, p.119). [16] A primeira citação é de Adorno e Horkheimer, Dialética do Esclarecimento (Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1986, p.13); as outras são de Educação e emancipação (op.cit., p.121, 151 e 126, respectivamente). [17] As citações de Paulo Freire vêm de Educação como prática da liberdade (Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1967, p.120). [18] As citações de Aristóteles vêm de Política (1337a 12, 1333b 6, 1333a 2 e 1139b 20, numeração marginal), Ética a Nicômaco (1095a27 e 1102a5) e Metafísica (1026a19). [19] Trechos da obra de Dewey, Democracy and Education (Nova York, Macmillan, 1966, p.12, 20, 30, 76, 117, 118-9, 319). [20] Passagens extraídas do artigo de Anísio Teixeira “Os processos democráticos da educação”, Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, v.25, n.62, abr/jun 1956, p.3-16). Outros livros consultados foram são Tomás de Aquino, Questions disputées sur la verité (Question XI, De Magistro) (Paris, Vrin, 1992) e R.S. Peters, El concepto de educación (Buenos Aires, Paidos, 1969). Para as obras de Aristóteles baseei-me na edição The Complete Works of Aristotle (Princeton, Princeton University Press, 1995) e para A República, de Platão, na edição da Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa, 1987). Na “Seleção de textos”, as traduções são todas de minha autoria, baseadas nas edições indicadas aqui, à exceção do último excerto, extraído da edição da Companhia Editora Nacional (São Paulo, 1959, tradução de Godofredo Rangel e
  • 47. Leituras recomendadas • A República, de Platão (Calouste Gulbenkian, 1987). O importante diálogo platônico é também a primeira obra de filosofia da educação. Nele o foco principal, no que diz respeito à filosofia da educação, é o papel da educação na formação do cidadão. O livro é fundamental para quem quer conhecer o início do debate filosófico sobre a relação entre educação e política. • Emílio ou Da Educação, de Rousseau (Martins Fontes, 2004). Esse longo livro é um tratado sobre a educação privada, ou seja, aquela que é fornecida pelos pais por meio de preceptores. Nele, Rousseau transforma suas visões sobre a sociedade num guia sobre como transformar a sociedade através da educação. O livro aborda vários assuntos, como é comum nas obras sobre educação da época, que vão desde a correta nutrição até a educação moral e política. • De Magistro, de santo Agostinho (in Santo Agostinho, coleção Os Pensadores, Nova Cultural, 1987). Essa é uma das primeiras obras de filosofia da educação na Idade Média. Nela, o teólogo e filósofo cristão aborda a relação entre a aprendizagem e a inspiração divina. Obra de filosofia da educação cristã claramente inspirada no idealismo platônico. • Pequena introdução à filosofia da educação, de Anísio Teixeira (DP&A, 2000). Exposição das opiniões do autor sobre a filosofia da educação. Devido à importância de Anísio Teixeira para o pensamento educacional brasileiro, é interessante conhecer o texto, publicado pela primeira vez em 1934, em que ele critica a escola nova e defende a escola progressista de Dewey e Kirkpatrick. • Sobre o mestre (De Magistro), de são Tomás de Aquino (Martins Fontes, 2001). Esse livro trava um diálogo com a obra homônima de santo Agostinho. Apesar de Tomás não condenar diretamente o seu colega cristão, ele critica o filósofo que o inspirou, Platão, preferindo a teoria de outro filósofo grego, Aristóteles. O livro de são Tomás também é, portanto, uma introdução à filosofia da educação aristotélica. • Sobre a pedagogia, de Immanuel Kant (Unimep, 1996). Único livro que o grande filósofo alemão escreveu sobre o tema, discorrendo sobre a educação do corpo até a educação moral, enfatizando a necessidade de se educar ambos. Essa
  • 49. Sobre o autor Leonardo Sartori Porto, doutor em filosofia moral e política, é professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, onde leciona a disciplina de Prática de Ensino de Filosofia.
  • 50. Coleção PASSO-A-PASSO Volumes recentes: CIÊNCIAS SOCIAIS PASSO-A-PASSO Capital social [25], Maria Celina D’Araujo Hierarquia e individualismo [26], Piero de Camargo Leirner Sociologia do trabalho [39], José Ricardo Ramalho e Marco Aurélio Santana O negócio do social [40], Joana Garcia Origens da linguagem [41], Bruna Franchetto e Yonne Leite Literatura e sociedade [48], Adriana Facina Sociedade de consumo [49], Lívia Barbosa Antropologia da criança [57], Clarice Cohn FILOSOFIA PASSO-A-PASSO Amor [44], Maria de Lourdes Borges Filosofia analítica [45], Danilo Marcondes Maquiavel & O Príncipe [46], Alessandro Pinzani A Teoria Crítica [47], Marcos Nobre Filosofia da mente [52], Claudio Costa Espinosa & a afetividade humana [53], Marcos André Gleizer Kant & a Crítica da Razão Pura [54], Vinicius de Figueiredo Bioética [55], Darlei Dall’Agnol Anarquismo e conhecimento [58], Alberto Oliva A pragmática na filosofia contemporânea [59], Danilo Marcondes Wittgenstein & o Tractatus [60], Edgar Marques