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Adriana Pinto L.F. Sousa, nº50660
Teoria da Tradução
2015
Resumo: Abordar-se-ão, em primeiro lugar, problemáticas patentes no
processo de globalização. Em segundo lugar, levantar-se-ão questões que se
prendem com a importância da comunicação intercultural bem como a
postura de um tradutor perante o trabalho de uma tradução. Por fim explorar-
se-ão seis estádios pelos quais o mesmo deve passar de modo a se tornar um
mediador cultural, equilibrando, assim, atitudes etnocêntricas com atitudes
multiculturais. ……………………
O tradutor
como mediador cultural
1
Índice
Introdução …………………………………………………..………………………….. 2
1. A exploração de termos ………………………………………………..…..….. 3
1.1 Identidade cultural ……………………………………………..…………... 3
1.2 Aculturação ………………………………………………………………… 4
1.3 Preconceito e Descriminação ………..………………………..…….……… 5
1.4 Etnocentrismo ………………………………………...……….…………… 6
2. A tradução como um ato de comunicação intercultural ……………………….. 7
2.1 Comunicação Intercultural …………………………...…………….……… 7
2.2 O tradutor como mediador cultural ………………………………………... 8
3. David Katan e o Desenvolvimento do Modelo de Sensibilidade Cultural ….... 10
3.1 Introdução ao Modelo de Sensibilidade cultural ………………………..…10
3.2 Composição dos seis estádios …………..………………………………… 11
3.3 Considerações finais ………………………………………....…………… 14
Conclusão …………………………………………………………………………..… 16
Bibliografia ……………………………………………………………………..…….. 17
Sitografia ………………………………………………….………...………………... 18
2
Introdução
Este trabalho é desenvolvido no âmbito da disciplina de Teoria da Tradução, pelo
que o tema incide sobre “O tradutor como mediador cultural”. Constata-se que, apesar de
vivermos em plena época multicultural, ainda se verificam sentimentos bastante
arraigados do tipo etnocêntrico e de preconceito em relação a membros de outras culturas,
daí a escolha e aprofundação deste mesmo tópico. Consequentemente, neste plano, surge
então o tradutor que, através da sua ação, se torna o “veículo” através do qual os valores
culturais são transmitidos. Afirma-se também que os tradutores, aliada à sua profissão,
desenvolvem inerentemente uma comunicação entre pessoas de culturas diferentes e que
a identidade, especialmente a de um tradutor, não é uma entidade fixa já que é
permanentemente reconfigurada e reconstruída ao longo da vida. Por outras palavras, é
através do seu trabalho que os tradutores, ao comunicarem com textos provenientes de
várias outras culturas, modificam a sua identidade cultural, aguçando a sua atitude de
tolerância, sendo esta dada a conhecer através de futuras traduções. Assim, será feita uma
exposição de termos pertinentes para a discussão deste tema, como é o caso de “identidade
cultural”, “aculturação”, “preconceito e descriminação” e “etnocentrismo”; salienta-se
para o facto de a exploração das quatro primeiras definições se apoiar no livro Educação
Intercultural por Manuela Malheiro Ferreira, sendo a quinta auxiliada pela obra A noção
de Cultura nas Ciências Sociais, por Denys Cuche. Segundamente, aprofundar-se-ão
noções da tradução como um ato de comunicação intercultural, destacando a importância
da comunicação intercultural e do tradutor como mediador cultural. Seguidamente,
introduzir-se-á o Desenvolvimento do Modelo de Sensibilidade Cultural de David Katan
juntamente com a composição dos seis estádios do modelo e considerações finais.
Será apresentada, por fim, uma conclusão pertinente de todo o trabalho de investigação e
de reflexão.
Este trabalho será realizado com o objetivo de demonstrar que, ainda que existam nos
dias que correm conflitos entre povos, a tradução aparece como uma fonte apaziguadora com
capacidades construtivas e evolutivas. Cabe ao tradutor equilibrar o seu trabalho entre
atitudes multiculturalistas e etnocêntricas, compreendendo fronteiras linguísticas e culturais
estrangeiras, não se limitando apenas a importar valores, mas sim a fazê-los chegar a outros
horizontes ou correntes de pensamento, tornando-se, por assim dizer, num mediador cultural.
3
1. A exploração de termos
1.1 Identidade cultural
Em primeiro lugar há que ter em conta a dificuldade em definir, com exatidão,
termos como identidade e cultura; não obstante, é possível afirmar que nem um conceito
nem o outro permanecem estáticos no tempo. A identidade passa pela integração do
indivíduo em algum grupo específico, como por exemplo a pertença a uma determinada
classe etária ou social, a pertença a um país em particular, um partido político, entre
outros. A identidade é um conceito multifacetado particularmente caracterizado pela
multidimensionalidade e pelo dinamismo. Por sua vez e etimologicamente falando, a
palavra “cultura” vem do latim colere, sendo inicialmente referida em áreas como o
cultivo da terra para a produção, a agricultura e o lavrar dos campos. Com o passar do
tempo este termo começou a ser usado no domínio da mente humana e veio até hoje
despoletar não um consentimento geral em termos de opinião, mas uma imensa variedade
de definições. Destacam-se, assim, duas conceções pertinentes do termo:
Conceção primeira: “A cultura é um padrão acumulado de valores, crenças e
comportamentos partilhados por um grupo identificável de pessoas com uma história em
comum e sistemas simbólicos verbais e não-verbais comuns.” (Neuliep, 2012)
………………………….
Conceção segunda:
Culture consists of everything one needs to know, master and feel, in order to assess
where members of a society are behaving acceptably or deviantly in their various
roles, and in order to behave in a way that is acceptable or deviant for that society,
as far one wishes to do and is not prepared to take the consequences arising from
deviant conduct. (Vermeer, 1977:10)1
Tendo em consideração os pontos anteriormente referidos, afirma-se que a
identidade cultural consiste na pertença de um indivíduo a uma cultura em particular.
Assim, acaba por ser maioritariamente graças às migrações internacionais, às traduções,
ao uso da Internet, e a toda uma vasta ação dos media que as pessoas entram efetivamente
em contacto com outras culturas e que é, consequentemente, despoletada uma reação
por parte dos recetores, provocando, ou não, uma alteração em termos de identidade
cultural.
1
Presente em SNALL-HORNBY, M. (2006)
4
1.2 Aculturação
Aculturação é o termo que se dá ao fenómeno caracterizado pela existência
efetiva de contacto entre culturas diferentes dentro do mesmo território e que graças a
este se verificam alterações nos padrões culturais originais de um ou mais grupos. Este
não é, de facto, um processo consensual, pelo que há tendência a encará-lo com uma
perspetiva relativamente positiva embora isto nem sempre aconteça. De agora em diante,
o termo “aculturação” refere-se não a uma aculturação forçada (como foi o caso, por
exemplo, do colonialismo) mas sim a uma aculturação livre, que parte da própria pessoa.
Por um lado, a aculturação é um fenómeno através do qual nos enriquecemos
como indivíduos, escolhendo o que decidimos aceitar da outra cultura, pondo-o em
prática, ou não, na nossa. Por outro lado, este pode também ser um momento em que nos
mantemos de mente fechada, não interiorizando quaisquer ideais provenientes de outras
culturas. Independentemente da perspetiva positiva ou negativa relativamente aos
processos de globalização e de aculturação, a verdade é que estes acontecem quer sejamos
contra ou a favor dos mesmos. Pode-se verificar e comprovar, assim, a influência que
estes processos têm em termos de origem de novas culturas, em termos políticos, de
correntes de pensamento e costumes, de moda, hábitos culinários e literatura.
Exemplo primeiro: Quando a cultura azteca nativa se fundiu com a cultura espanhola
invasora, originando a atual cultura mexicana;
Exemplo segundo: A adoção de vocabulário estrangeiro na própria língua
(em Portugal usam-se termos como: abajur – do francês abat-jour; sutiã – do francês
soutien; a palavra inglesa selfie, entre outros).
Fig.1 Gráfico do processo de aculturação
Cultura A Cultura B Cultura A + B
+
5
1.3 Preconceito e Discriminação
A relação entre culturas deve basear-se sobretudo na reciprocidade de respeito, no
entanto esta relação de igualdade raramente se verifica considerando o facto de que, por
mais que queiramos, não existem visões neutras acerca das culturas. Assim, é impossível
falar na relação entre culturas sem antes se considerar dois termos como o preconceito e
a discriminação.
Preconceito pode ser definido como uma atitude favorável ou desfavorável em
relação a membros de algum grupo baseada sobretudo no facto da pertença
a esse grupo e não necessariamente em características particulares de membros
individuais. (Neto, 1998)
O preconceito é uma atitude que é, na grande maioria das vezes, infundada e que,
no entanto, é sentida nos mais variados grupos. Esta atitude pode ocorrer não só entre
membros de culturas diferentes, mas também entre membros pertencentes a uma mesma
cultura. Destacam-se, como exemplos, casos de homossexualidade, de algum tipo de
incapacidade física ou mental, de grupos étnicos minoritários, entre outros.
Aliado ao preconceito, surge, então, o comportamento mais negativo de todos −a
discriminação. “A discriminação é a manifestação comportamental do preconceito.
Quando ocorre a discriminação, membros de grupos particulares são tratados de modo
positivo ou negativo por causa da sua pertença a determinado grupo.” (Neto, 1998)
Posto isto, quando estamos em contacto com “outros” criamos sentimentos de
pertença ou de estranheza em relação a determinados indivíduos. Assim, o preconceito e
a discriminação surgem como uma forma de controlo social, que serve essencialmente
para acentuar o distanciamento e as diferenças sociais entre sujeitos. Ambas as atitudes
descartam os comportamentos reais das pessoas a quem se dirige o preconceito e a
discriminação como modo de afirmação da própria identidade, distinguindo,
consequentemente, aquilo que é bom daquilo que é mau e aquilo que tem valor daquilo
que não tem. Este tipo de postura ainda se vê nos dias de hoje, podendo originar
consequências extremamente negativas, como é o caso da marginalização e do aumento
de violência.
6
1.4 Etnocentrismo
Antes de mais, pode constatar-se que a realidade é, de facto, vivida através de um
determinado ponto de vista já que cada pessoa detém uma perceção própria, não podendo
nunca deixá-la de lado. Existem, assim, várias visões de uma mesma situação e é através
da nossa perspetiva individual que partimos, na grande maioria das vezes, para um
julgamento de valores. Embora não estejamos completamente conscientes dela, existe
também uma perceção cultural capaz de influenciar o modo como agimos e o modo como
nos comportamos. Ainda que inconscientes, todos podemos avaliar as ações e
comportamentos dos outros, comparando-os aos nossos, tornando o nosso juízo de valor
pouco objetivo e parcial. Consequentemente, a nossa perceção pode levar a mal-
entendidos em relação a outras culturas ou a uma atitude etnocêntrica.
Fig. 2 O processo percetivo
O termo “etnocentrismo” foi, por sua vez, cunhado pelo sociólogo americano
William G. Summer e aparece pela primeira vez em 1906 na sua obra Folkways.
William afirma e defende que a atitude etnocêntrica passa por uma pessoa considerar a
sua cultura superior a todas as outras, acabando, consequentemente, por menosprezá-las
visto serem diferentes da sua. Este conceito de etnocentrismo pode ser levado a extremos
(como por exemplo o decorrer da época em que Hitler tomou o poder na Alemanha, na
qual este depreciou e tentou eliminar todos aqueles que considerava inferiores à raça
ariana). Sendo assim, afirma-se, então, que quando uma pessoa é de facto etnocêntrica
esta não está minimamente interessada em conhecer, entender ou apreender traços de
outras culturas que não a sua.
7
2.DA tradução como um ato de comunicação intercultural
2.1 Comunicação intercultural
Antes de avançar na discussão, e sem intenção de aprofundar com exaustão esta
temática, é conveniente que se proceda à definição do conceito de comunicação
intercultural. Assim, este é tido como “a disciplina científica que estuda os processos de
comunicação entre representantes de culturas diferentes.” (Infopédia, 2015)
Em segundo lugar, há que relevar o facto de este ser um fenómeno que tem vindo
a marcar notoriamente a contemporaneidade. É igualmente importante referir que durante
este processo de cariz intercultural estão presentes vários participantes, sendo que cada
um deles acarreta consigo enormes desigualdades. Além do mais, constata-se que as
pessoas codificam e descodificam mensagens de um modo bastante próprio e isto faz com
que haja uma maior probabilidade de ocorrerem mal-entendidos durante uma
comunicação interpessoal.
Dale Carnegie, o escritor norte-americano, afirma existirem apenas quatro
maneiras de termos contacto com o mundo: “There are four ways, and four ways only, in
which we have contact with the world. We are evaluated and classified by these four
contacts: what we do, how we look, what we say, and how we say it.” ……………………
Este salienta o facto de sermos avaliados e classificados segundo esses quatro
contactos, tornando, assim, a questão da delicadeza na comunicação um fator crucial para
conseguirmos ser bem-sucedidos em termos de transmissão de mensagem; por outras
palavras, para que seja possível transmitir exatamente aquilo que se quer, sem correr
possíveis riscos de mal-entendidos ou equívocos, há que ter em conta o que se faz, como
se olha, o que se diz, e como se diz.
É necessário aludir para o facto de que os conflitos são inerentes à condição
humana e que estes podem derivar por diferenças em termos de pontos de vista, por
diferenças de opiniões ou de desejos. Logo os conflitos propriamente ditos tanto podem
surgir entre pessoas que partilham um grau de proximidade, como entre pessoas que
pertencem a culturas distintas.
8
2.2 O tradutor como mediador cultural
Uma última instância deve ser feita antes de conjugar todos os pontos
anteriormente referidos e avançar, assim, para o papel fundamental do tradutor.
Há ainda que constatar, como já foi referido, que existem diferenças culturais
capazes de arruinar as hipóteses de uma comunicação intercultural bem-sucedida. Os
nossos atos, o modo como nos dirigimos a alguém e tudo aquilo que dizemos é
inevitavelmente filtrado pela outra pessoa que está presente na comunicação; daí ser
crucial, em termos práticos, sem que isso nos impeça de comunicar, a consciência da
diferença. Tenhamos agora em conta a delicadeza dos três exemplos seguintes:
Exemplo primeiro: Olhar fixamente nos olhos de um membro de cultura chinesa e falar
em termos pessoais e não de grupo pode ser mal-entendido visto que esta atitude poder
ser tida como uma afronta e como um gesto de altivez para com o outro falante;
Exemplo segundo: Em Itália palitar os dentes após as refeições é tido como um ato que
demonstra que a refeição foi deveras apreciada;
Exemplo terceiro: Na China assoar o nariz na rua ou cuspir são comportamentos tidos
como sinais de higiene pois representam o expulsar de algo sujo de dentro do corpo.
Consequentemente, quer estejamos num contexto de produção de uma tradução,
ou quer estejamos simplesmente a contactar com algum membro de uma outra cultura ou
não, devemos ter sempre presente o facto de que cada língua/cultura tem a sua própria
maneira de pensar e de agir.
Devemos considerar, também, que um membro portador de uma determinada
língua/cultura pode julgar indiretamente o outro com base na sua própria vivência do
mundo. Para haver uma comunicação intercultural há que encontrar palavras comuns que
ambos os falantes conheçam de modo a que se consigam entender uns aos outros sem
despoletar problemas. Por outras palavras, tanto na tradução, como na nossa vida, existe
sempre uma comunicação codificada por experiências próprias, pelas relações que temos
com os outros comunicantes e o modo com que o fazemos. Consequentemente, cabe-nos
a nós, indivíduos, considerar as nuances culturais (os falsos amigos por exemplo), de
modo a que não ocorram os desconfortáveis equívocos.
9
Posto isto, resta-nos agora saltar para o plano do tradutor como mediador cultural.
Sabe-se, então, que o tradutor é um profissional da língua sujeito às mais variadas críticas.
Este é também um indivíduo que deve ser capaz de encontrar as nuances e as diferenças
linguísticas e culturais entre as línguas (nas quais está apto a trabalhar) de modo a que a
mensagem a ser transmitida seja igualmente captada tanto como pelo público inicial,
como pelo público de chegada ao qual se dirige a tradução. Assim, o mediador cultural
é a pessoa que toma decisões em função das regras da cultura a que se dirige, mas também
é alguém que facilita a comunicação e compreensão, adequando e avaliando, de modo a
procurar não ofender nem prejudicar, o que convém dizer, o que não convém dizer e como
o dizer.
A cultural mediator is a person who facilitates communication, understanding and
action between persons or groups who differ with respect to language and culture.
The role of the mediator is performed by interpreting the expressions, intentions,
perceptions and expectations of each cultural group to the other, that is, by
establishing and balancing the communication between them. In order to participate
to some extent in both cultures. Thus a mediator must be to a certain extent bicultural.
(Taft 1981:53)
Consequentemente, o tradutor, para além de representar o elo que liga duas ou
mais culturas implicadas em todo um processo comunicativo, é a pessoa que importa os
valores patentes em cada cultura e que os faz viajar pelo globo, fazendo-os aterrar,
algures, noutro lugar do mundo completamente diferente de onde estes se encontravam
inicialmente.
Fig. 3 O poder nas mãos do tradutor capaz de ultrapassar barreiras
linguísticas/culturais e transportar ideias
Sendo assim, o tradutor deve procurar, independentemente das suas crenças, não
ser contra a globalização nem contra a aculturação já que são processos inevitáveis e
irreversíveis. Não obstante, a assimilação não deve ser um objetivo da tradução
considerando o facto de que a redução da diferença pode ser feita, não só pela assimilação,
mas pela integração.
10
Por outras palavras, não é imperativo que o tradutor, aquando procede a uma
tradução, deixe de lado todos os seus princípios para assimilar os de outros. Sabe-se que
existe diferença e que este é um valor, sim, mas não é um valor absoluto. Posteriormente,
o modo de conciliar a diferença com a liberdade e igualdade passa pela consideração não
só da universalidade, mas também do direito a se ser particular. “Deve haver alguma coisa
entre, por um lado, a exigência não genuína e homogeneizante de reconhecimento do
valor igual e, por outro lado, o auto-enclausuramento nos critérios etnocêntricos.”
(Charles Taylor, 1998)
Assim, a comunicação intercultural exige que se trate o texto como uma unidade
viva já que nele está patente toda uma cultura à sua volta. Como diz Eugene Nida (1997)2
“Many translators believe that if they care of the words and grammar, the discourse will
take of itself, but this concept results from an insufficient understanding of the role of
discourse structures in intercultural communication.”…………………….……………
Dito isto, o tradutor não se deve encarar como uma entidade superior aos outros.
Este deve sim, procurar estabelecer uma igualdade baseada no pressuposto da
reciprocidade, cultivando, assim, cada vez mais uma visão objetiva em relação a outras
culturas, transformando-se, consequentemente, num mediador cultural.
3.DDavid Katan em O Desenvolvimento do Modelo de Sensibilidade
Cultural
3.1 Introdução ao Modelo de Sensibilidade Cultural
Um tradutor, tal como qualquer outro trabalhador que inicie funções, tem,
efetivamente, um longo caminho a percorrer até atingir a atitude e comportamento ideais
de modo a produzir um trabalho feliz, objetivo e o mais imparcial possível. Sendo assim,
é possível que durante o processo de versão o tradutor passe por um processo de
amadurecimento mental, evoluindo, consequentemente, de estudante a profissional da
língua, e de tradutor a mediador cultural. O Modelo de Sensibilidade Cultural constata
que existem seis estádios pelos quais um tradutor pode atravessar durante o
desenvolvimento interior acima referido, pretendendo, assim, observá-los com detalhe.
2
Presente em KATAN, D. (2009)
11
Adicionalmente, este modelo prova que a certeza de um tradutor em relação à
tarefa de tradução de um texto para uma nova cultura pode mudar com o passar do tempo.
Mais importante do que isso, este prevê uma mudança de identidade já que o tradutor se
move de uma reação local pessoal para uma reação de sensibilidade cultural. …………
3.2 Composição dos seis estádios
Fig. 4 Caracterização dos seis estádios
Estádio primeiro: Negação (Denial)
Este estádio é constituído por duas posturas, sendo que a primeira é marcada
efetivamente pela sensação de lua-de-mel e a segunda pela cegueira. Assim, numa
primeira postura, a reação inicial de um tradutor às diferentes culturas passa por as ver
sem quaisquer tipo de defeitos e, consequentemente, considerar tudo maravilhoso.
“We concentrate on what we expect (distortion), and much of what is actually different
is filtered out (deletion) […].” (David Katan, 1999) Não obstante, a sensação de lua-de-
mel nem sempre representa a sensação despoletada quando se dá o primeiro contacto.
Numa segunda postura, não há qualquer tipo de resposta ao “outro”, pelo que as
diferenças são ignoradas devido a uma ingenuidade cognitiva baseada na generalização.
Este estado de cegueira pode levar a que as pessoas mantenham uma abrangência de
categorias em termos de diferenças culturais. “The Welsh, the Scottish and the Irish are
not “English”, nor are Canadians American, though they are all loosely included as such
by many foreigners […]” (David Katan, 1999) Dito isto, é neste primeiro nível, de
negação, que se lida com estudantes de tradução e com profissionais pouco capazes.
Os estádios etnocêntricos:
1. Negação
2. Defesa
3. Minimização
Os estádios etnorelativos:
4. Aceitação
5. Adaptação
6. Integração
12
Estádio segundo: Defesa (Defence)
Considerando o facto de querermos evoluir como profissionais, alcança-se, pois,
um segundo estádio. Este é, por sua vez, vivido através da sensação de que tudo aquilo
que é diferente é perigoso, da sensação de superioridade e, por fim, da adoção de uma
estratégia contrária. É numa primeira sensação de que tudo o que é diferente é perigoso
que se dá o chamado choque cultural, isto é “the emotional reactions to the disorientation
that occur when one is immersed in an unfamiliar culture and is deprived of familiar cues”
(Paige, 1993:2)3 Aqui, a existência da diferença já não pode ser ignorada nem negada,
pelo que há a mais natural tendência para nos fecharmos no nosso mundo, julgando
sempre o “outro” através do nosso filtro de perceção já que sentimos uma ameaça em
termos de valores do que é normal e do que é certo −o que é uma clara marca de uma
resposta etnocêntrica. Por um lado, é na sensação de superioridade que se assume que a
evolução seguindo exclusivamente o caminho de uma cultura é o melhor caminho para
todas as culturas. Por outro lado, quando o tradutor adota uma estratégia contrária este
parte do pressuposto que todas as outras culturas é que são boas, acabando, no final, por
denegrir a sua.
Estádio terceiro: Minimização das diferenças (Minimization)
Terceiramente, é atingido o universalismo físico (considerar que todos somos um
corpo igual) e o universalismo transcendente (atentar que todos somos filhos de Deus).
“I have yet to hear anyone at this stage say, “There is a single truth in the universe and it
is not what I believe.” (Bennett, 1993:44)4
Estádio quarto: Aceitação (Acceptance)
É neste quarto estádio que o tradutor sente respeito pelas diferenças de
comportamento, respeito pelas diferenças de valor (ou depressão) e no qual se dá lugar
à aceitação de relatividade de culturas. “This is where the translator begins to perceive
that his/her ethnocentric model of the world is not the only one, and that text-basing
copying […] will not communicate the same message across cultures.” (Katan, 1999)
Consequentemente, neste primeiro sentimento o tradutor não está só consciente da
importância que o contexto cultural tem em termos de tradução: este sabe também que
não existe uma correspondência exata entre línguas/culturas e que, por isso, há
3
Presente em KATAN, D. (1999)
4
Presente em KATAN, D. (1999)
13
necessidade de se adaptar a mensagem de modo a que esta seja também eficaz na cultura
de chegada. Num segundo sentimento, o tradutor tenta alargar o seu “mapa do mundo”
de modo a incluir sistemas de valores de outras culturas. “[…] translators will be in the
position of make their own moral, professional and translation decisions, which means
that they need to be capable of taking multiple positions.” (Katan, 1999)
Estádio quinto: Adaptação (Adaptation)
Neste penúltimo estádio o tradutor é capaz de produzir sentimentos de empatia
para com “outros”, não esquecendo as crenças de outras culturas nem abdicando das suas.
Aqui, estamos perante um indivíduo que já possui uma identidade diferente da que tinha
inicialmente, o que o torna, naturalmente, numa pessoa mais flexível. Este nível
pressupõe também um pluralismo, pelo que é importante destacar, nesta fase, o facto de
que não basta só conhecer a outra língua, mas há também que dominar todos os valores
que nela se encontram subjacentes.
Estádio sexto: Integração (Integration)
Por último, o estádio da integração pressupõe que o tradutor, como já estudou e
adquiriu competências para tal, tem uma identidade completamente aberta, sendo, por
isso, capaz de se adaptar facilmente a quaisquer contextos diferentes do seu. “The
translator is now a cultural interpreter or mediator and has a supra-cultural mission: to
improve crosscultural cooperation, and build trust and understanding between
communities.” (Katan, 1999) Assim, é neste estádio final que não se têm certezas, que
não se tem uma identidade cultural específica e no qual não se fazem assunções
inquestionáveis.
Fig. 5 Gráfico dos processos do Modelo de Desenvolvimento Cultural
14
3.3 Considerações finais
Inicialmente, e de acordo com David Katan, quando o tradutor começa a traduzir
este ainda se encontra num nível bastante amador, pelo que não dá a devida atenção a
fatores de contexto (seja em termos culturais − língua/cultura de partida e língua/cultura
de chegada; em termos sociais, políticos, espaciais e temporais). Este procura tornar a sua
tradução o mais natural possível já que pretende uma aceitação total por parte do público
de chegada – o que, em termos de tradução, não acontece. É igualmente importante referir
que este tradutor ainda é alguém que afirma ingenuamente que o discurso da sua tradução
seria o modo exato com que o autor se apresentaria caso aquela fosse a sua língua/cultura
natal. Dito isto, nesta fase ainda não existe um mediador cultural pelo facto de este não
querer sacrificar a sua beleza e naturalidade de estilo, o que faz com que este seja, por
isso, um tradutor pouco humilde e relativamente etnocêntrico.
À medida que avançamos, o tradutor já não pode mais negar que existem
diferenças e essa consciência da desigualdade pode levar ao despoletar de reações mais
avassaladoras, compreendendo, ainda, que tudo faz parte de um processo de construção
interior e pessoal. Pode dizer-se, também, que os tradutores são dos indivíduos que mais
beneficiam do contacto entre culturas já que acabam por dinamizar os seus pensamentos
e por aprender a aceitar gradualmente aquilo que não podem evitar. Consequentemente,
torna-se essencial uma ação consciente por parte do tradutor de modo a que se minimizem
as diferenças.
Além disso, quanto mais o tradutor toma consciência das diferenças, mais aberto
este se torna à aceitação e à alargação do seu “mapa do mundo”. Aqui, este percebe que
cada língua/cultura opera de uma determinada forma, valorizando, mais tarde, os
enquadramentos contextuais patentes nas trocas de comunicação intercultural.
Consequentemente, cabe ao tradutor, não só concluir que o pensamento é determinado
pela língua/cultura (o que dificulta todo o processo de tradução), mas também decidir
com imparcialidade aquilo que deve dizer daquilo que deve ocultar e como o fazer.
15
Haverá que admitir que há uma exigência imprescindível deste método de tradução,
a de uma postura da língua que, não sendo a quotidiana, antes deixa adivinhar que
não cresceu em total liberdade e que, pelo contrário, foi obrigada a curvar-se para ir
ao encontro de algo semelhante, mas estranho; […] Estas são as renúncias que o
tradutor tem que aceitar […] no esforço para manter estranha a sonoridade da língua.
[…] Daí que este modo de traduzir exija um procedimento em grande escala, uma
transplantação de literaturas inteiras para a outra língua, e que portanto só possua
sentido e valor para um povo que tenha uma decidida inclinação para a apropriação
daquilo que lhe é estranho. …………………………………………………………
(Schleiermarcher, 1813:91)5
Pode dizer-se também que é na tradução que se ganha a noção de que as línguas
são diferentes, o que faz com que esta seja tida como uma forma de arte concretizada não
só com talento, mas também com esforço e muita dedicação. Assim, podem existir
traduções muito boas mas a verdade é que não há traduções perfeitas, pelo que agradar a
todo um público é um ato de concretização impossível.
Após se dar uma aceitação positiva em termos das diferenças comportamentais e
de valores presentes em cada cultura, resta-lhe, ao tradutor, evoluir para uma fase ligada
à adaptação e, mais tarde, à integração final. Consequentemente, não basta o tradutor
aguçar e desenvolver as suas competências linguísticas/culturais e sociais, mas
compreender também que a globalização, a cultura e a tradução se influenciam todas
mutuamente, tentando, posteriormente, sempre que traduz, não apagar o espírito do autor
inicial. Contudo, o papel do tradutor não passa exclusivamente pela disseminação de
valores culturais: sim, é através das traduções que se importam outros ideais, mas é
também graças a estas que se unem culturas e que se criam e originam valores novos.
Além disso, pode constatar-se que o tradutor é também um ser paradoxal porque
sabe, por um lado, que existem fronteiras, mas que quer, por outro, esbater e acabar com
elas através das suas traduções.
Dito isto, por todos os fatores referidos, verifica-se que o tradutor tem de ser, no
seu ideal, um mediador cultural; não obstante, o facto de o estádio final de integração se
basear num processo de isenção, quer em termos de crenças, quer em termos de identidade
cultural, eleva-o a um patamar relativamente utópico já que a perceção, como foi
mencionado antes, não é algo que possamos simplesmente rasurar e apagar.
5
Presente em JUSTO, J. (2003)
16
Conclusão
Em primeiro lugar, há que constatar que toda a contemporaneidade está a ser
notoriamente marcada pelo processo de globalização, o que faz com que se levantem
questões em termos de identidade cultural, aculturação, preconceito e discriminação e
etnocentrismo. Em adição, afirma-se que este é um decurso que esbate e reduz as
diferenças culturais, pelo que é irrelevante sermos contra ou a favor de algo irreversível.
Em segundo, há que salientar o facto de que é num contexto multicultural que
surgem as diferenças, já que cada pessoa possui a sua perceção, tem as suas próprias
experiências do mundo, tem necessidades e crenças particulares, pelo que codifica e
descodifica mensagens à sua maneira. Consequentemente, o nosso discurso é sempre
filtrado pelos princípios dos outros, quer durante uma comunicação intercultural, quer
durante uma tradução, pois pensamos e agimos de formas diferentes. Assim, surge o
mediador cultural, que adequa a sua comunicação a quem se quer dirigir, ligando duas ou
mais culturas, transportando princípios e originando valores novos.
Em terceiro, há que notar que o tradutor tem, também, nas suas mãos o poder de
intervir sempre que queira no texto que verte, manipulando-o conforme a sua vontade.
Este pode também, segundo David Katan, passar por vários estádios, mais precisamente
seis, sendo a sua meta final alcançar uma total imparcialidade que não deixa de ser
ligeiramente utópica. Ainda assim, cada tradutor faz a sua própria interpretação da
mensagem e do que considera que é o seu significado, produzindo, consequentemente,
traduções distintas.
Para concluir, reconhece-se que embora presenciemos uma redução de diferenças
entre culturas e às suas uniões, ainda se verificam conflitos interculturais, atentados,
críticas à perda de identidade, julgamento do outro, preconceito e discriminação dirigidos
a certos grupos e a defesa do etnocentrismo. Apesar disto, são as traduções, através de
atos de mediação cultural, que nos levam a compreender outros ideais, fazendo com que
as sociedades e os pensamentos evoluam e que caminhemos, juntos, em direção a uma
cultura internacional de paz.
Ninguém nasce a odiar outra pessoa devido à cor da sua pele, ao seu passado ou
religião. As pessoas aprendem a odiar, e, se o podem fazer, também podem ser
ensinadas a amar, porque o amor é mais natural no coração humano do que o seu
oposto. (Nelson Mandela, 1995)
17
Bibliografia
CUCHE, D. (2004). A noção de Cultura nas Ciências Sociais, Lisboa, Fim de Século
DELISLE, J e Woodsworth, J. (2012). Translators through History: Revised Edition,
Amsterdam/Philadelphia, John Benjamins Publishing Company
FERREIRA, M. (2003). Educação Intercultural, Universidade Aberta
JUSTO, J. (2003). Sobre os Diferentes Métodos de Traduzir: Edição Bilingue, Porto,
Porto Editora
KATAN, D. (1999). Chapter 13 On Becoming a Mediator in Translating Cultures,
An Introduction for Translators, Interpreters and Mediators, Manchester, St. Jerome
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KATAN, D. (2009). The Routledge Companion to Translation Studies Revised Edition,
London and New York, Routledge Taylor & Francis Group
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NEULIEP, J. (2012). Intercultural Communication: A Contextual Approach, Sage
Publications
SNALL-HORNBY, M. (2006). The Turns of Translation Studies: New paradigms and
shifting viewpoints, Amsterdam, John Benjamins B.V.
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Mediating Person: Bridges between Cultures, Cambridge, Schenkman
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18
Sitografia
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http://www.brainyquote.com/quotes/quotes/d/dalecarneg156626.html. [consultado em
26-10-15]
Carnegie, Dale. Book of Famous Quotes. [Em linha]. Disponível em:
http://www.famous-quotes.com/author.php?page=2&total=52&aid=1328 [consultado
em 05-12-15]
Infopédia in Língua Portuguesa com Acordo Ortográfico [Em linha]. Porto: Porto
Editora, 2003-2015. Disponível em:
http://www.infopedia.pt/$comunicacao-intercultural. [consultado em 26-10-15].
Mandela, Nelson. (1995). Good Reads: Long Walk to Freedom Quotes. [Em linha].
Disponível em: http://www.goodreads.com/work/quotes/2501119-long-walk-to-
freedom-the-autobiography-of-nelson-mandela. [consultado em 21-09-15]
Uberti, Cassiano. (2013). Transcender. [Em linha]. Disponível em:
http://transcender-ensinoreligioso.blogspot.pt/2013/03/cultura-de-paz-o-que-e-isso.html.
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O tradutor como mediador entre culturas

  • 1. Adriana Pinto L.F. Sousa, nº50660 Teoria da Tradução 2015 Resumo: Abordar-se-ão, em primeiro lugar, problemáticas patentes no processo de globalização. Em segundo lugar, levantar-se-ão questões que se prendem com a importância da comunicação intercultural bem como a postura de um tradutor perante o trabalho de uma tradução. Por fim explorar- se-ão seis estádios pelos quais o mesmo deve passar de modo a se tornar um mediador cultural, equilibrando, assim, atitudes etnocêntricas com atitudes multiculturais. …………………… O tradutor como mediador cultural
  • 2. 1 Índice Introdução …………………………………………………..………………………….. 2 1. A exploração de termos ………………………………………………..…..….. 3 1.1 Identidade cultural ……………………………………………..…………... 3 1.2 Aculturação ………………………………………………………………… 4 1.3 Preconceito e Descriminação ………..………………………..…….……… 5 1.4 Etnocentrismo ………………………………………...……….…………… 6 2. A tradução como um ato de comunicação intercultural ……………………….. 7 2.1 Comunicação Intercultural …………………………...…………….……… 7 2.2 O tradutor como mediador cultural ………………………………………... 8 3. David Katan e o Desenvolvimento do Modelo de Sensibilidade Cultural ….... 10 3.1 Introdução ao Modelo de Sensibilidade cultural ………………………..…10 3.2 Composição dos seis estádios …………..………………………………… 11 3.3 Considerações finais ………………………………………....…………… 14 Conclusão …………………………………………………………………………..… 16 Bibliografia ……………………………………………………………………..…….. 17 Sitografia ………………………………………………….………...………………... 18
  • 3. 2 Introdução Este trabalho é desenvolvido no âmbito da disciplina de Teoria da Tradução, pelo que o tema incide sobre “O tradutor como mediador cultural”. Constata-se que, apesar de vivermos em plena época multicultural, ainda se verificam sentimentos bastante arraigados do tipo etnocêntrico e de preconceito em relação a membros de outras culturas, daí a escolha e aprofundação deste mesmo tópico. Consequentemente, neste plano, surge então o tradutor que, através da sua ação, se torna o “veículo” através do qual os valores culturais são transmitidos. Afirma-se também que os tradutores, aliada à sua profissão, desenvolvem inerentemente uma comunicação entre pessoas de culturas diferentes e que a identidade, especialmente a de um tradutor, não é uma entidade fixa já que é permanentemente reconfigurada e reconstruída ao longo da vida. Por outras palavras, é através do seu trabalho que os tradutores, ao comunicarem com textos provenientes de várias outras culturas, modificam a sua identidade cultural, aguçando a sua atitude de tolerância, sendo esta dada a conhecer através de futuras traduções. Assim, será feita uma exposição de termos pertinentes para a discussão deste tema, como é o caso de “identidade cultural”, “aculturação”, “preconceito e descriminação” e “etnocentrismo”; salienta-se para o facto de a exploração das quatro primeiras definições se apoiar no livro Educação Intercultural por Manuela Malheiro Ferreira, sendo a quinta auxiliada pela obra A noção de Cultura nas Ciências Sociais, por Denys Cuche. Segundamente, aprofundar-se-ão noções da tradução como um ato de comunicação intercultural, destacando a importância da comunicação intercultural e do tradutor como mediador cultural. Seguidamente, introduzir-se-á o Desenvolvimento do Modelo de Sensibilidade Cultural de David Katan juntamente com a composição dos seis estádios do modelo e considerações finais. Será apresentada, por fim, uma conclusão pertinente de todo o trabalho de investigação e de reflexão. Este trabalho será realizado com o objetivo de demonstrar que, ainda que existam nos dias que correm conflitos entre povos, a tradução aparece como uma fonte apaziguadora com capacidades construtivas e evolutivas. Cabe ao tradutor equilibrar o seu trabalho entre atitudes multiculturalistas e etnocêntricas, compreendendo fronteiras linguísticas e culturais estrangeiras, não se limitando apenas a importar valores, mas sim a fazê-los chegar a outros horizontes ou correntes de pensamento, tornando-se, por assim dizer, num mediador cultural.
  • 4. 3 1. A exploração de termos 1.1 Identidade cultural Em primeiro lugar há que ter em conta a dificuldade em definir, com exatidão, termos como identidade e cultura; não obstante, é possível afirmar que nem um conceito nem o outro permanecem estáticos no tempo. A identidade passa pela integração do indivíduo em algum grupo específico, como por exemplo a pertença a uma determinada classe etária ou social, a pertença a um país em particular, um partido político, entre outros. A identidade é um conceito multifacetado particularmente caracterizado pela multidimensionalidade e pelo dinamismo. Por sua vez e etimologicamente falando, a palavra “cultura” vem do latim colere, sendo inicialmente referida em áreas como o cultivo da terra para a produção, a agricultura e o lavrar dos campos. Com o passar do tempo este termo começou a ser usado no domínio da mente humana e veio até hoje despoletar não um consentimento geral em termos de opinião, mas uma imensa variedade de definições. Destacam-se, assim, duas conceções pertinentes do termo: Conceção primeira: “A cultura é um padrão acumulado de valores, crenças e comportamentos partilhados por um grupo identificável de pessoas com uma história em comum e sistemas simbólicos verbais e não-verbais comuns.” (Neuliep, 2012) …………………………. Conceção segunda: Culture consists of everything one needs to know, master and feel, in order to assess where members of a society are behaving acceptably or deviantly in their various roles, and in order to behave in a way that is acceptable or deviant for that society, as far one wishes to do and is not prepared to take the consequences arising from deviant conduct. (Vermeer, 1977:10)1 Tendo em consideração os pontos anteriormente referidos, afirma-se que a identidade cultural consiste na pertença de um indivíduo a uma cultura em particular. Assim, acaba por ser maioritariamente graças às migrações internacionais, às traduções, ao uso da Internet, e a toda uma vasta ação dos media que as pessoas entram efetivamente em contacto com outras culturas e que é, consequentemente, despoletada uma reação por parte dos recetores, provocando, ou não, uma alteração em termos de identidade cultural. 1 Presente em SNALL-HORNBY, M. (2006)
  • 5. 4 1.2 Aculturação Aculturação é o termo que se dá ao fenómeno caracterizado pela existência efetiva de contacto entre culturas diferentes dentro do mesmo território e que graças a este se verificam alterações nos padrões culturais originais de um ou mais grupos. Este não é, de facto, um processo consensual, pelo que há tendência a encará-lo com uma perspetiva relativamente positiva embora isto nem sempre aconteça. De agora em diante, o termo “aculturação” refere-se não a uma aculturação forçada (como foi o caso, por exemplo, do colonialismo) mas sim a uma aculturação livre, que parte da própria pessoa. Por um lado, a aculturação é um fenómeno através do qual nos enriquecemos como indivíduos, escolhendo o que decidimos aceitar da outra cultura, pondo-o em prática, ou não, na nossa. Por outro lado, este pode também ser um momento em que nos mantemos de mente fechada, não interiorizando quaisquer ideais provenientes de outras culturas. Independentemente da perspetiva positiva ou negativa relativamente aos processos de globalização e de aculturação, a verdade é que estes acontecem quer sejamos contra ou a favor dos mesmos. Pode-se verificar e comprovar, assim, a influência que estes processos têm em termos de origem de novas culturas, em termos políticos, de correntes de pensamento e costumes, de moda, hábitos culinários e literatura. Exemplo primeiro: Quando a cultura azteca nativa se fundiu com a cultura espanhola invasora, originando a atual cultura mexicana; Exemplo segundo: A adoção de vocabulário estrangeiro na própria língua (em Portugal usam-se termos como: abajur – do francês abat-jour; sutiã – do francês soutien; a palavra inglesa selfie, entre outros). Fig.1 Gráfico do processo de aculturação Cultura A Cultura B Cultura A + B +
  • 6. 5 1.3 Preconceito e Discriminação A relação entre culturas deve basear-se sobretudo na reciprocidade de respeito, no entanto esta relação de igualdade raramente se verifica considerando o facto de que, por mais que queiramos, não existem visões neutras acerca das culturas. Assim, é impossível falar na relação entre culturas sem antes se considerar dois termos como o preconceito e a discriminação. Preconceito pode ser definido como uma atitude favorável ou desfavorável em relação a membros de algum grupo baseada sobretudo no facto da pertença a esse grupo e não necessariamente em características particulares de membros individuais. (Neto, 1998) O preconceito é uma atitude que é, na grande maioria das vezes, infundada e que, no entanto, é sentida nos mais variados grupos. Esta atitude pode ocorrer não só entre membros de culturas diferentes, mas também entre membros pertencentes a uma mesma cultura. Destacam-se, como exemplos, casos de homossexualidade, de algum tipo de incapacidade física ou mental, de grupos étnicos minoritários, entre outros. Aliado ao preconceito, surge, então, o comportamento mais negativo de todos −a discriminação. “A discriminação é a manifestação comportamental do preconceito. Quando ocorre a discriminação, membros de grupos particulares são tratados de modo positivo ou negativo por causa da sua pertença a determinado grupo.” (Neto, 1998) Posto isto, quando estamos em contacto com “outros” criamos sentimentos de pertença ou de estranheza em relação a determinados indivíduos. Assim, o preconceito e a discriminação surgem como uma forma de controlo social, que serve essencialmente para acentuar o distanciamento e as diferenças sociais entre sujeitos. Ambas as atitudes descartam os comportamentos reais das pessoas a quem se dirige o preconceito e a discriminação como modo de afirmação da própria identidade, distinguindo, consequentemente, aquilo que é bom daquilo que é mau e aquilo que tem valor daquilo que não tem. Este tipo de postura ainda se vê nos dias de hoje, podendo originar consequências extremamente negativas, como é o caso da marginalização e do aumento de violência.
  • 7. 6 1.4 Etnocentrismo Antes de mais, pode constatar-se que a realidade é, de facto, vivida através de um determinado ponto de vista já que cada pessoa detém uma perceção própria, não podendo nunca deixá-la de lado. Existem, assim, várias visões de uma mesma situação e é através da nossa perspetiva individual que partimos, na grande maioria das vezes, para um julgamento de valores. Embora não estejamos completamente conscientes dela, existe também uma perceção cultural capaz de influenciar o modo como agimos e o modo como nos comportamos. Ainda que inconscientes, todos podemos avaliar as ações e comportamentos dos outros, comparando-os aos nossos, tornando o nosso juízo de valor pouco objetivo e parcial. Consequentemente, a nossa perceção pode levar a mal- entendidos em relação a outras culturas ou a uma atitude etnocêntrica. Fig. 2 O processo percetivo O termo “etnocentrismo” foi, por sua vez, cunhado pelo sociólogo americano William G. Summer e aparece pela primeira vez em 1906 na sua obra Folkways. William afirma e defende que a atitude etnocêntrica passa por uma pessoa considerar a sua cultura superior a todas as outras, acabando, consequentemente, por menosprezá-las visto serem diferentes da sua. Este conceito de etnocentrismo pode ser levado a extremos (como por exemplo o decorrer da época em que Hitler tomou o poder na Alemanha, na qual este depreciou e tentou eliminar todos aqueles que considerava inferiores à raça ariana). Sendo assim, afirma-se, então, que quando uma pessoa é de facto etnocêntrica esta não está minimamente interessada em conhecer, entender ou apreender traços de outras culturas que não a sua.
  • 8. 7 2.DA tradução como um ato de comunicação intercultural 2.1 Comunicação intercultural Antes de avançar na discussão, e sem intenção de aprofundar com exaustão esta temática, é conveniente que se proceda à definição do conceito de comunicação intercultural. Assim, este é tido como “a disciplina científica que estuda os processos de comunicação entre representantes de culturas diferentes.” (Infopédia, 2015) Em segundo lugar, há que relevar o facto de este ser um fenómeno que tem vindo a marcar notoriamente a contemporaneidade. É igualmente importante referir que durante este processo de cariz intercultural estão presentes vários participantes, sendo que cada um deles acarreta consigo enormes desigualdades. Além do mais, constata-se que as pessoas codificam e descodificam mensagens de um modo bastante próprio e isto faz com que haja uma maior probabilidade de ocorrerem mal-entendidos durante uma comunicação interpessoal. Dale Carnegie, o escritor norte-americano, afirma existirem apenas quatro maneiras de termos contacto com o mundo: “There are four ways, and four ways only, in which we have contact with the world. We are evaluated and classified by these four contacts: what we do, how we look, what we say, and how we say it.” …………………… Este salienta o facto de sermos avaliados e classificados segundo esses quatro contactos, tornando, assim, a questão da delicadeza na comunicação um fator crucial para conseguirmos ser bem-sucedidos em termos de transmissão de mensagem; por outras palavras, para que seja possível transmitir exatamente aquilo que se quer, sem correr possíveis riscos de mal-entendidos ou equívocos, há que ter em conta o que se faz, como se olha, o que se diz, e como se diz. É necessário aludir para o facto de que os conflitos são inerentes à condição humana e que estes podem derivar por diferenças em termos de pontos de vista, por diferenças de opiniões ou de desejos. Logo os conflitos propriamente ditos tanto podem surgir entre pessoas que partilham um grau de proximidade, como entre pessoas que pertencem a culturas distintas.
  • 9. 8 2.2 O tradutor como mediador cultural Uma última instância deve ser feita antes de conjugar todos os pontos anteriormente referidos e avançar, assim, para o papel fundamental do tradutor. Há ainda que constatar, como já foi referido, que existem diferenças culturais capazes de arruinar as hipóteses de uma comunicação intercultural bem-sucedida. Os nossos atos, o modo como nos dirigimos a alguém e tudo aquilo que dizemos é inevitavelmente filtrado pela outra pessoa que está presente na comunicação; daí ser crucial, em termos práticos, sem que isso nos impeça de comunicar, a consciência da diferença. Tenhamos agora em conta a delicadeza dos três exemplos seguintes: Exemplo primeiro: Olhar fixamente nos olhos de um membro de cultura chinesa e falar em termos pessoais e não de grupo pode ser mal-entendido visto que esta atitude poder ser tida como uma afronta e como um gesto de altivez para com o outro falante; Exemplo segundo: Em Itália palitar os dentes após as refeições é tido como um ato que demonstra que a refeição foi deveras apreciada; Exemplo terceiro: Na China assoar o nariz na rua ou cuspir são comportamentos tidos como sinais de higiene pois representam o expulsar de algo sujo de dentro do corpo. Consequentemente, quer estejamos num contexto de produção de uma tradução, ou quer estejamos simplesmente a contactar com algum membro de uma outra cultura ou não, devemos ter sempre presente o facto de que cada língua/cultura tem a sua própria maneira de pensar e de agir. Devemos considerar, também, que um membro portador de uma determinada língua/cultura pode julgar indiretamente o outro com base na sua própria vivência do mundo. Para haver uma comunicação intercultural há que encontrar palavras comuns que ambos os falantes conheçam de modo a que se consigam entender uns aos outros sem despoletar problemas. Por outras palavras, tanto na tradução, como na nossa vida, existe sempre uma comunicação codificada por experiências próprias, pelas relações que temos com os outros comunicantes e o modo com que o fazemos. Consequentemente, cabe-nos a nós, indivíduos, considerar as nuances culturais (os falsos amigos por exemplo), de modo a que não ocorram os desconfortáveis equívocos.
  • 10. 9 Posto isto, resta-nos agora saltar para o plano do tradutor como mediador cultural. Sabe-se, então, que o tradutor é um profissional da língua sujeito às mais variadas críticas. Este é também um indivíduo que deve ser capaz de encontrar as nuances e as diferenças linguísticas e culturais entre as línguas (nas quais está apto a trabalhar) de modo a que a mensagem a ser transmitida seja igualmente captada tanto como pelo público inicial, como pelo público de chegada ao qual se dirige a tradução. Assim, o mediador cultural é a pessoa que toma decisões em função das regras da cultura a que se dirige, mas também é alguém que facilita a comunicação e compreensão, adequando e avaliando, de modo a procurar não ofender nem prejudicar, o que convém dizer, o que não convém dizer e como o dizer. A cultural mediator is a person who facilitates communication, understanding and action between persons or groups who differ with respect to language and culture. The role of the mediator is performed by interpreting the expressions, intentions, perceptions and expectations of each cultural group to the other, that is, by establishing and balancing the communication between them. In order to participate to some extent in both cultures. Thus a mediator must be to a certain extent bicultural. (Taft 1981:53) Consequentemente, o tradutor, para além de representar o elo que liga duas ou mais culturas implicadas em todo um processo comunicativo, é a pessoa que importa os valores patentes em cada cultura e que os faz viajar pelo globo, fazendo-os aterrar, algures, noutro lugar do mundo completamente diferente de onde estes se encontravam inicialmente. Fig. 3 O poder nas mãos do tradutor capaz de ultrapassar barreiras linguísticas/culturais e transportar ideias Sendo assim, o tradutor deve procurar, independentemente das suas crenças, não ser contra a globalização nem contra a aculturação já que são processos inevitáveis e irreversíveis. Não obstante, a assimilação não deve ser um objetivo da tradução considerando o facto de que a redução da diferença pode ser feita, não só pela assimilação, mas pela integração.
  • 11. 10 Por outras palavras, não é imperativo que o tradutor, aquando procede a uma tradução, deixe de lado todos os seus princípios para assimilar os de outros. Sabe-se que existe diferença e que este é um valor, sim, mas não é um valor absoluto. Posteriormente, o modo de conciliar a diferença com a liberdade e igualdade passa pela consideração não só da universalidade, mas também do direito a se ser particular. “Deve haver alguma coisa entre, por um lado, a exigência não genuína e homogeneizante de reconhecimento do valor igual e, por outro lado, o auto-enclausuramento nos critérios etnocêntricos.” (Charles Taylor, 1998) Assim, a comunicação intercultural exige que se trate o texto como uma unidade viva já que nele está patente toda uma cultura à sua volta. Como diz Eugene Nida (1997)2 “Many translators believe that if they care of the words and grammar, the discourse will take of itself, but this concept results from an insufficient understanding of the role of discourse structures in intercultural communication.”…………………….…………… Dito isto, o tradutor não se deve encarar como uma entidade superior aos outros. Este deve sim, procurar estabelecer uma igualdade baseada no pressuposto da reciprocidade, cultivando, assim, cada vez mais uma visão objetiva em relação a outras culturas, transformando-se, consequentemente, num mediador cultural. 3.DDavid Katan em O Desenvolvimento do Modelo de Sensibilidade Cultural 3.1 Introdução ao Modelo de Sensibilidade Cultural Um tradutor, tal como qualquer outro trabalhador que inicie funções, tem, efetivamente, um longo caminho a percorrer até atingir a atitude e comportamento ideais de modo a produzir um trabalho feliz, objetivo e o mais imparcial possível. Sendo assim, é possível que durante o processo de versão o tradutor passe por um processo de amadurecimento mental, evoluindo, consequentemente, de estudante a profissional da língua, e de tradutor a mediador cultural. O Modelo de Sensibilidade Cultural constata que existem seis estádios pelos quais um tradutor pode atravessar durante o desenvolvimento interior acima referido, pretendendo, assim, observá-los com detalhe. 2 Presente em KATAN, D. (2009)
  • 12. 11 Adicionalmente, este modelo prova que a certeza de um tradutor em relação à tarefa de tradução de um texto para uma nova cultura pode mudar com o passar do tempo. Mais importante do que isso, este prevê uma mudança de identidade já que o tradutor se move de uma reação local pessoal para uma reação de sensibilidade cultural. ………… 3.2 Composição dos seis estádios Fig. 4 Caracterização dos seis estádios Estádio primeiro: Negação (Denial) Este estádio é constituído por duas posturas, sendo que a primeira é marcada efetivamente pela sensação de lua-de-mel e a segunda pela cegueira. Assim, numa primeira postura, a reação inicial de um tradutor às diferentes culturas passa por as ver sem quaisquer tipo de defeitos e, consequentemente, considerar tudo maravilhoso. “We concentrate on what we expect (distortion), and much of what is actually different is filtered out (deletion) […].” (David Katan, 1999) Não obstante, a sensação de lua-de- mel nem sempre representa a sensação despoletada quando se dá o primeiro contacto. Numa segunda postura, não há qualquer tipo de resposta ao “outro”, pelo que as diferenças são ignoradas devido a uma ingenuidade cognitiva baseada na generalização. Este estado de cegueira pode levar a que as pessoas mantenham uma abrangência de categorias em termos de diferenças culturais. “The Welsh, the Scottish and the Irish are not “English”, nor are Canadians American, though they are all loosely included as such by many foreigners […]” (David Katan, 1999) Dito isto, é neste primeiro nível, de negação, que se lida com estudantes de tradução e com profissionais pouco capazes. Os estádios etnocêntricos: 1. Negação 2. Defesa 3. Minimização Os estádios etnorelativos: 4. Aceitação 5. Adaptação 6. Integração
  • 13. 12 Estádio segundo: Defesa (Defence) Considerando o facto de querermos evoluir como profissionais, alcança-se, pois, um segundo estádio. Este é, por sua vez, vivido através da sensação de que tudo aquilo que é diferente é perigoso, da sensação de superioridade e, por fim, da adoção de uma estratégia contrária. É numa primeira sensação de que tudo o que é diferente é perigoso que se dá o chamado choque cultural, isto é “the emotional reactions to the disorientation that occur when one is immersed in an unfamiliar culture and is deprived of familiar cues” (Paige, 1993:2)3 Aqui, a existência da diferença já não pode ser ignorada nem negada, pelo que há a mais natural tendência para nos fecharmos no nosso mundo, julgando sempre o “outro” através do nosso filtro de perceção já que sentimos uma ameaça em termos de valores do que é normal e do que é certo −o que é uma clara marca de uma resposta etnocêntrica. Por um lado, é na sensação de superioridade que se assume que a evolução seguindo exclusivamente o caminho de uma cultura é o melhor caminho para todas as culturas. Por outro lado, quando o tradutor adota uma estratégia contrária este parte do pressuposto que todas as outras culturas é que são boas, acabando, no final, por denegrir a sua. Estádio terceiro: Minimização das diferenças (Minimization) Terceiramente, é atingido o universalismo físico (considerar que todos somos um corpo igual) e o universalismo transcendente (atentar que todos somos filhos de Deus). “I have yet to hear anyone at this stage say, “There is a single truth in the universe and it is not what I believe.” (Bennett, 1993:44)4 Estádio quarto: Aceitação (Acceptance) É neste quarto estádio que o tradutor sente respeito pelas diferenças de comportamento, respeito pelas diferenças de valor (ou depressão) e no qual se dá lugar à aceitação de relatividade de culturas. “This is where the translator begins to perceive that his/her ethnocentric model of the world is not the only one, and that text-basing copying […] will not communicate the same message across cultures.” (Katan, 1999) Consequentemente, neste primeiro sentimento o tradutor não está só consciente da importância que o contexto cultural tem em termos de tradução: este sabe também que não existe uma correspondência exata entre línguas/culturas e que, por isso, há 3 Presente em KATAN, D. (1999) 4 Presente em KATAN, D. (1999)
  • 14. 13 necessidade de se adaptar a mensagem de modo a que esta seja também eficaz na cultura de chegada. Num segundo sentimento, o tradutor tenta alargar o seu “mapa do mundo” de modo a incluir sistemas de valores de outras culturas. “[…] translators will be in the position of make their own moral, professional and translation decisions, which means that they need to be capable of taking multiple positions.” (Katan, 1999) Estádio quinto: Adaptação (Adaptation) Neste penúltimo estádio o tradutor é capaz de produzir sentimentos de empatia para com “outros”, não esquecendo as crenças de outras culturas nem abdicando das suas. Aqui, estamos perante um indivíduo que já possui uma identidade diferente da que tinha inicialmente, o que o torna, naturalmente, numa pessoa mais flexível. Este nível pressupõe também um pluralismo, pelo que é importante destacar, nesta fase, o facto de que não basta só conhecer a outra língua, mas há também que dominar todos os valores que nela se encontram subjacentes. Estádio sexto: Integração (Integration) Por último, o estádio da integração pressupõe que o tradutor, como já estudou e adquiriu competências para tal, tem uma identidade completamente aberta, sendo, por isso, capaz de se adaptar facilmente a quaisquer contextos diferentes do seu. “The translator is now a cultural interpreter or mediator and has a supra-cultural mission: to improve crosscultural cooperation, and build trust and understanding between communities.” (Katan, 1999) Assim, é neste estádio final que não se têm certezas, que não se tem uma identidade cultural específica e no qual não se fazem assunções inquestionáveis. Fig. 5 Gráfico dos processos do Modelo de Desenvolvimento Cultural
  • 15. 14 3.3 Considerações finais Inicialmente, e de acordo com David Katan, quando o tradutor começa a traduzir este ainda se encontra num nível bastante amador, pelo que não dá a devida atenção a fatores de contexto (seja em termos culturais − língua/cultura de partida e língua/cultura de chegada; em termos sociais, políticos, espaciais e temporais). Este procura tornar a sua tradução o mais natural possível já que pretende uma aceitação total por parte do público de chegada – o que, em termos de tradução, não acontece. É igualmente importante referir que este tradutor ainda é alguém que afirma ingenuamente que o discurso da sua tradução seria o modo exato com que o autor se apresentaria caso aquela fosse a sua língua/cultura natal. Dito isto, nesta fase ainda não existe um mediador cultural pelo facto de este não querer sacrificar a sua beleza e naturalidade de estilo, o que faz com que este seja, por isso, um tradutor pouco humilde e relativamente etnocêntrico. À medida que avançamos, o tradutor já não pode mais negar que existem diferenças e essa consciência da desigualdade pode levar ao despoletar de reações mais avassaladoras, compreendendo, ainda, que tudo faz parte de um processo de construção interior e pessoal. Pode dizer-se, também, que os tradutores são dos indivíduos que mais beneficiam do contacto entre culturas já que acabam por dinamizar os seus pensamentos e por aprender a aceitar gradualmente aquilo que não podem evitar. Consequentemente, torna-se essencial uma ação consciente por parte do tradutor de modo a que se minimizem as diferenças. Além disso, quanto mais o tradutor toma consciência das diferenças, mais aberto este se torna à aceitação e à alargação do seu “mapa do mundo”. Aqui, este percebe que cada língua/cultura opera de uma determinada forma, valorizando, mais tarde, os enquadramentos contextuais patentes nas trocas de comunicação intercultural. Consequentemente, cabe ao tradutor, não só concluir que o pensamento é determinado pela língua/cultura (o que dificulta todo o processo de tradução), mas também decidir com imparcialidade aquilo que deve dizer daquilo que deve ocultar e como o fazer.
  • 16. 15 Haverá que admitir que há uma exigência imprescindível deste método de tradução, a de uma postura da língua que, não sendo a quotidiana, antes deixa adivinhar que não cresceu em total liberdade e que, pelo contrário, foi obrigada a curvar-se para ir ao encontro de algo semelhante, mas estranho; […] Estas são as renúncias que o tradutor tem que aceitar […] no esforço para manter estranha a sonoridade da língua. […] Daí que este modo de traduzir exija um procedimento em grande escala, uma transplantação de literaturas inteiras para a outra língua, e que portanto só possua sentido e valor para um povo que tenha uma decidida inclinação para a apropriação daquilo que lhe é estranho. ………………………………………………………… (Schleiermarcher, 1813:91)5 Pode dizer-se também que é na tradução que se ganha a noção de que as línguas são diferentes, o que faz com que esta seja tida como uma forma de arte concretizada não só com talento, mas também com esforço e muita dedicação. Assim, podem existir traduções muito boas mas a verdade é que não há traduções perfeitas, pelo que agradar a todo um público é um ato de concretização impossível. Após se dar uma aceitação positiva em termos das diferenças comportamentais e de valores presentes em cada cultura, resta-lhe, ao tradutor, evoluir para uma fase ligada à adaptação e, mais tarde, à integração final. Consequentemente, não basta o tradutor aguçar e desenvolver as suas competências linguísticas/culturais e sociais, mas compreender também que a globalização, a cultura e a tradução se influenciam todas mutuamente, tentando, posteriormente, sempre que traduz, não apagar o espírito do autor inicial. Contudo, o papel do tradutor não passa exclusivamente pela disseminação de valores culturais: sim, é através das traduções que se importam outros ideais, mas é também graças a estas que se unem culturas e que se criam e originam valores novos. Além disso, pode constatar-se que o tradutor é também um ser paradoxal porque sabe, por um lado, que existem fronteiras, mas que quer, por outro, esbater e acabar com elas através das suas traduções. Dito isto, por todos os fatores referidos, verifica-se que o tradutor tem de ser, no seu ideal, um mediador cultural; não obstante, o facto de o estádio final de integração se basear num processo de isenção, quer em termos de crenças, quer em termos de identidade cultural, eleva-o a um patamar relativamente utópico já que a perceção, como foi mencionado antes, não é algo que possamos simplesmente rasurar e apagar. 5 Presente em JUSTO, J. (2003)
  • 17. 16 Conclusão Em primeiro lugar, há que constatar que toda a contemporaneidade está a ser notoriamente marcada pelo processo de globalização, o que faz com que se levantem questões em termos de identidade cultural, aculturação, preconceito e discriminação e etnocentrismo. Em adição, afirma-se que este é um decurso que esbate e reduz as diferenças culturais, pelo que é irrelevante sermos contra ou a favor de algo irreversível. Em segundo, há que salientar o facto de que é num contexto multicultural que surgem as diferenças, já que cada pessoa possui a sua perceção, tem as suas próprias experiências do mundo, tem necessidades e crenças particulares, pelo que codifica e descodifica mensagens à sua maneira. Consequentemente, o nosso discurso é sempre filtrado pelos princípios dos outros, quer durante uma comunicação intercultural, quer durante uma tradução, pois pensamos e agimos de formas diferentes. Assim, surge o mediador cultural, que adequa a sua comunicação a quem se quer dirigir, ligando duas ou mais culturas, transportando princípios e originando valores novos. Em terceiro, há que notar que o tradutor tem, também, nas suas mãos o poder de intervir sempre que queira no texto que verte, manipulando-o conforme a sua vontade. Este pode também, segundo David Katan, passar por vários estádios, mais precisamente seis, sendo a sua meta final alcançar uma total imparcialidade que não deixa de ser ligeiramente utópica. Ainda assim, cada tradutor faz a sua própria interpretação da mensagem e do que considera que é o seu significado, produzindo, consequentemente, traduções distintas. Para concluir, reconhece-se que embora presenciemos uma redução de diferenças entre culturas e às suas uniões, ainda se verificam conflitos interculturais, atentados, críticas à perda de identidade, julgamento do outro, preconceito e discriminação dirigidos a certos grupos e a defesa do etnocentrismo. Apesar disto, são as traduções, através de atos de mediação cultural, que nos levam a compreender outros ideais, fazendo com que as sociedades e os pensamentos evoluam e que caminhemos, juntos, em direção a uma cultura internacional de paz. Ninguém nasce a odiar outra pessoa devido à cor da sua pele, ao seu passado ou religião. As pessoas aprendem a odiar, e, se o podem fazer, também podem ser ensinadas a amar, porque o amor é mais natural no coração humano do que o seu oposto. (Nelson Mandela, 1995)
  • 18. 17 Bibliografia CUCHE, D. (2004). A noção de Cultura nas Ciências Sociais, Lisboa, Fim de Século DELISLE, J e Woodsworth, J. (2012). Translators through History: Revised Edition, Amsterdam/Philadelphia, John Benjamins Publishing Company FERREIRA, M. (2003). Educação Intercultural, Universidade Aberta JUSTO, J. (2003). Sobre os Diferentes Métodos de Traduzir: Edição Bilingue, Porto, Porto Editora KATAN, D. (1999). Chapter 13 On Becoming a Mediator in Translating Cultures, An Introduction for Translators, Interpreters and Mediators, Manchester, St. Jerome Publishing KATAN, D. (2009). The Routledge Companion to Translation Studies Revised Edition, London and New York, Routledge Taylor & Francis Group NETO, F. (1998). Psicologia Social, Lisboa Universidade Aberta, Vol. I NEULIEP, J. (2012). Intercultural Communication: A Contextual Approach, Sage Publications SNALL-HORNBY, M. (2006). The Turns of Translation Studies: New paradigms and shifting viewpoints, Amsterdam, John Benjamins B.V. TAFT, R. (1981) The Role and Personality of the Mediator in S. Bochner ed. The Mediating Person: Bridges between Cultures, Cambridge, Schenkman TAYLOR, C. (1998) Examinando a Política de Reconhecimento in Multiculturalismo, Instituto Piaget
  • 19. 18 Sitografia Carnegie, Dale. (2015). BrainyQuote [Em linha]. Disponível em: http://www.brainyquote.com/quotes/quotes/d/dalecarneg156626.html. [consultado em 26-10-15] Carnegie, Dale. Book of Famous Quotes. [Em linha]. Disponível em: http://www.famous-quotes.com/author.php?page=2&total=52&aid=1328 [consultado em 05-12-15] Infopédia in Língua Portuguesa com Acordo Ortográfico [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2015. Disponível em: http://www.infopedia.pt/$comunicacao-intercultural. [consultado em 26-10-15]. Mandela, Nelson. (1995). Good Reads: Long Walk to Freedom Quotes. [Em linha]. Disponível em: http://www.goodreads.com/work/quotes/2501119-long-walk-to- freedom-the-autobiography-of-nelson-mandela. [consultado em 21-09-15] Uberti, Cassiano. (2013). Transcender. [Em linha]. Disponível em: http://transcender-ensinoreligioso.blogspot.pt/2013/03/cultura-de-paz-o-que-e-isso.html. [consultado em 13-10-15]