1. Agravo Regimental em Medida Cautelar Incidental em Inquérito n.
2013.088693-6/0009.01, de Videira
Relator: Des. Trindade dos Santos
AGRAVO REGIMENTAL. PREVISÃO LEGAL NOS ARTS. 39
DA LEI N.º 8.038/1990 E 195 DO REGIMENTO INTERNO DO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA. MEDIDA
CAUTELAR. SUSPENSÃO DO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO
PÚBLICA DE PRESIDENTE DA CORTE LEGISLATIVA
CATARINENSE. MOTIVAÇÃO SEDIMENTADA NA
NECESSIDADE DE NEUTRALIZAÇÃO DO AGENTE PÚBLICO,
COMO FORMA DE INIBI-LO DA PRÁTICA DE INFLUÊNCIA NO
AMBIENTE DE TRABALHO OU A REITERAÇÃO DELITIVA.
FASE INSTRUTÓRIA QUE NÃO SE ENCERRA COM O
INQUÉRITO. NÃO ADMISSÃO, PELA CORTE, POR MAIORIA,
DO CÔMPUTO DO VOTO DO RELATOR. SOLUÇÃO ILEGAL.
REGIMENTO INTERNO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ART. 196.
ATO REGIMENTAL N.º 70/05-TJ, DE 1 DE JUNHO DE 2005.
NÃO OBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ART. 282 DO MESMO
REGIMENTO C/C O ART. 317, § 2.º, DO REGIMENTO INTERNO
DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, APLICÁVEL
SUBSIDIARIAMENTE AO CASO. SUSPENSÃO DAS
ATIVIDADES FUNCIONAIS QUE NÃO IMPLICA NO CORTE
DOS VENCIMENTOS. RECLAMO RECURSAL DESPROVIDO.
1 Não alcança provimento o agravo regimental que ataca a
decisão cautelar que suspendeu de suas funções públicas
indiciado em investigatório criminal, quando os elementos
constantes dos autos, mormente aqueles decorrentes de escutas
telefônicas autorizadas pelo Judiciário, indicam a necessidade de
se tolher qualquer influência que possa exercer o agente público
na colheita da prova testemunhal, inibindo-se-o, de outro lado, de
novas práticas delituosas do mesmo jaez.
2 É totalmente ilegal a decisão do Órgão Especial que, com
supedâneo em proposição formulada de ofício pela Presidência
da Corte, sustentada em redação de dispositivo do Regimento
Interno do Tribunal, de há muito revogada, impede o relator de
agravo regimental de exercer o seu direito de voto.
3 O afastamento do indiciado das funções de seu cargo
público não acarreta a perda dos correspondentes vencimentos,
vez ser a suspensão de suas atividades decorrente, de
determinação judicial, sendo, pois, involuntária.
2. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo Regimental em
Medida Cautelar Incidental em Inquérito n. 2013.088693-6/0009.01, da comarca de
Videira (Vara Criminal), em que é agravante Romildo Luiz Titon, sendo
agravado o Ministério Público do Estado de Santa Catarina:
O Órgão Especial decidiu, por maioria de votos, negar provimento ao
recurso, consubstanciando-se os votos vencidos no sentido substituir, de ofício, a
cautelar de suspensão das funções de Presidente da Mesa da Assembléia Legislativa
do Estado de Santa Catarina, reintegrando o agravante no cargo, mediante as
seguintes condições: a) não poderá dirimir, decidir ou despachar qualquer ato que
diga respeito aos codenunciados do presente inquérito ou às testemunhas arroladas,
incluindo-se os atos de nomeação ou de exoneração da Casa Legislativa; b) que
sejam delegadas ao 1.º Vice-Presidente da Mesa, na forma do parágrafo 3.º do art. 65
do Regimento Interno da ALESC, todas as atribuições inerentes ao Presidente da
Mesa que digam respeito a este Inquérito, tal como o ato de receber ou de prestar
informações, entregar documentos requisitados por este Tribunal ou pelo Ministério
Público. Custas legais.
O julgamento, realizado em 16 de abril de 2014, foi presidido pelo
Exmo. Sr. Des. Nelson Schaefer Martins, dele participando, com votos vencedores, os
Exmos. Srs. Des. Cláudio Barreto Dutra, Luiz Cézar Medeiros, Eládio Torret Rocha,
Monteiro Rocha, Fernando Carioni, Torres Marques, Salim Schead dos Santos, Jânio
Machado, Sônia Maria Schmitz, Paulo Roberto Camargo Costa e Gaspar Rubick,
vencidos os Exmos. Srs. Des. Moacyr de Moraes Lima Filho, João Henrique Blasi,
Jorge Luiz de Borba, Newton Trisotto, Sérgio Luiz Baasch Luz, Rui Fortes, Marcus
Túlio Sartorato, Cesar Abreu, Alexandre D'Ivanenko e Lédio Rosa de Andrade.
Florianópolis, 5 de maio de 2014.
Trindade dos Santos
RELATOR SEM VOTO
Gabinete Des. Trindade dos Santos
3. RELATÓRIO
Subsidiado nos arts. 39, da Lei n.º 8.038 e 195, do Regimento Interno do
Tribunal de Justiça de Santa Catarina, ingressou Romildo Luiz Titon com agravo
regimental, objetivando ver cassada a decisão que, proferida nos autos do Inquérito
n.º 2013.088693-6/0009.00, da comarca de Videira, promovido pelo Mistério Público
do Estado de Santa Catarina, em que figura o seu nome no rol dos indiciados,
determinou a suspensão do exercício de sua função pública de Presidente da
Assembléia Legislativa de Santa Catarina.
Expôs o agravante estar a decisão combatida impregnada de ilegalidade
por ter tomado como verdadeiros os fatos que compõem o conteúdo do inquérito e ter
adentrado no campo da presunção, configurando-se, em sendo assim, a
arbitrariedade do relator, sustentando que, para a aplicação da medida cautelar
deferida devem ser observados os requisitos do art. 282, incs. I e II, do Código de
Processo Penal, pressupostos esses não integrados na hipótese vertente.
Argumentou que, ao contrário do alegado pelo órgão ministerial, ao
Presidente da Assembléia Legislativa não compete a "gestão de pessoas", conforme
se denota do Regimento Interno daquela casa legislativa.
No tocante à nomeação de Lissandra Duwe Passeto como Chefe de
Gabinete, disse o agravante não ter essa nomeação qualquer relação com os fatos
narrados da denúncia ou com a exoneração do marido da mesma, o coindiciado
Evandro Carlos dos Santos do cargo que ocupava na ALESC, posto que trata-se de
pessoa de sua confiança e que consigo trabalha desde 4 de dezembro de 1995,
consoante faz prova a Resolução n.º 1.403/95 e a certidão juntada ao caderno
processual.
E o mesmo ocorre referentemente às testemunhas arroladas na
denúncia e que, inclusive, já foram ouvidas na fase inquisitorial e trabalham há anos
com o recorrente.
Em continuidade, refutou os fundamentos da decisão impugnada,
afirmando ter havido afronta ao dever de explicitar o magistrado o seu convencimento
quanto à necessidade da segregação cautelar, indicando os motivos concretos pelos
quais se torna absolutamente necessária a prisão ante tempus, pois a decisão teria se
utilizado de expressões vagas e elementos abstratos, assumindo aparência de
execução antecipada de pena.
Aduziu mais, ter a decisão incorrido em ofensa ao princípio
constitucional da presunção de inocência, inexistindo nos autos, de outro lado,
qualquer indicativo de justo receio da utilização da função pública para o cometimento
de crimes.
Finalizando, enfatizou que "o afastamento da função pública revela-se
prudente e recomendável se os indícios indicarem interferência do agente na
instrução processual, notadamente, o que não restou comprovado no presente caso",
pugnando, então, pelo provimento do agravo regimental, com a revogação da decisão
questionada.
Gabinete Des. Trindade dos Santos
5. VOTO
Enfeixam os autos presentes agravo regimental, recurso esse com
previsão no art. 39, da Lei n. 8.038/1990 e no art. 195, do Regimento Interno do
Tribunal de Justiça de Santa Catarina, atacando o recorrente a decisão singular que,
exarada na medida cautelar incidental em inquérito n.º 2013.088693-6/0009.00, da
Comarca de Videira, determinou o afastamento do agravante Romildo Luiz Titon da
função pública de Presidente da Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina.
De início, é de se observar que talvez o termo "voto" seja impróprio para
a presente manifestação, posto ter sido cassado deste relator o direito ao voto,
conforme determinação da eg. Presidência deste Tribunal. Talvez melhor seria
dizer-se "manifestação" ou "defesa da medida agravada", pois está-se diante de um
típico caso de relator sem voto.
Entretanto, por questões apenas ligadas ao sistema computadorizado
deste Pretório, é que o termo "voto" é mantido, ainda que de voto não se trate.
Retornando-se ao caso sob exame propriamente dito, tem-se que, do
conteúdo do caderno investigatório, despontam vários fatos que apontam o agravante
como autor de diversos delitos graves, dentre eles, participação em duas
organizações criminosas, além de que teria praticado, por conta do cargo público em
que foi investido, crimes contra administração pública: recebimento de vantagens
indevidas, caracterizadoras de corrupção passiva, por quatro vezes, além de
advocacia administrativa.
Enfatizou a decisão combatida, em um de seus tópicos, que "ante a
assunção pelo denunciado à Presidência do Poder Legislativo estadual, razão assiste
ao Ministério Público, no que tange à presença de risco imediato e concreto à
instrução processual; à ordem pública, aqui compreendida na dimensão da própria
credibilidade do Judiciário em face de situação de grande repercussão na sociedade
catarinense; e, ainda, à reiteração delituosa, em face de anúncio prévio de tal
intenção, extraído da prova já constante do feito".
Em razão de tais fundados receios, a medida extrema de suspensão
temporária do exercício da função de Chefe do Poder Legislativo Estadual teve que
ser decretada e impõe-se, data vênia, confirmada por este Colegiado no julgamento
presente, pelas razões que a seguir se elenca.
É de se destacar, ab initio, a importância da estrita obediência ao
princípio constitucional de presunção inocência ressaltada em brilhante decisão da
nossa Corte Suprema de Justiça, sob a seguinte ementa:
"HABEAS CORPUS" - PRISÃO CAUTELAR DECRETADA COM APOIO NA
GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA, NA NÃO FRUSTRAÇÃO DA APLICAÇÃO DA
LEI PENAL E NA SEGURANÇA DA PROVA PROCESSUAL - ILEGITIMIDADE
JURÍDICA DA PRISÃO CAUTELAR QUANDO DECRETADA, UNICAMENTE, COM
SUPORTE EM JUÍZOS MERAMENTE CONJECTURAIS - INDISPENSABILIDADE
DA VERIFICAÇÃO CONCRETA DE RAZÕES DE NECESSIDADE SUBJACENTES
À UTILIZAÇÃO, PELO ESTADO, DESSA MEDIDA EXTRAORDINÁRIA - SITUAÇÃO
EXCEPCIONAL NÃO VERIFICADA NA ESPÉCIE - INJUSTO CONSTRANGIMENTO
Gabinete Des. Trindade dos Santos
6. CONFIGURADO - "HABEAS CORPUS" DEFERIDO. PRISÃO CAUTELAR -
CARÁTER EXCEPCIONAL.
- A privação cautelar da liberdade individual - cuja decretação resulta possível
em virtude de expressa cláusula inscrita no próprio texto da Constituição da
República (CF, art. 5º, LXI), não conflitando, por isso mesmo, com a presunção
constitucional de inocência (CF, art. 5º, LVII) - reveste-se de caráter excepcional,
somente devendo ser ordenada, por tal razão, em situações de absoluta e real
necessidade. A prisão processual, para legitimar-se em face de nosso sistema
jurídico, impõe - além da satisfação dos pressupostos a que se refere o art. 312 do
CPP (prova da existência material do crime e indício suficiente de autoria) - que se
evidenciem, com fundamento em base empírica idônea, razões justificadoras da
imprescindibilidade dessa extraordinária medida cautelar de privação da liberdade do
indiciado ou do réu. Doutrina. Precedentes.
A PRISÃO PREVENTIVA - ENQUANTO MEDIDA DE NATUREZA CAUTELAR
- NÃO PODE SER UTILIZADA COMO INSTRUMENTO DE PUNIÇÃO ANTECIPADA
DO INDICIADO OU DO RÉU.
- A prisão cautelar não pode - nem deve - ser utilizada, pelo Poder Público,
como instrumento de punição antecipada daquele a quem se imputou a prática do
delito, pois, no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas, prevalece
o princípio da liberdade, incompatível com punições sem processo e inconciliável
com condenações sem defesa prévia. A prisão cautelar - que não deve ser
confundida com a prisão penal - não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua
decretação, mas destina-se, considerada a função cautelar que lhe é inerente, a
atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal.
Precedentes.
A PRISÃO CAUTELAR NÃO PODE APOIAR-SE EM JUÍZOS MERAMENTE
CONJECTURAIS.
- A mera suposição, fundada em simples conjecturas, não pode autorizar a
decretação da prisão cautelar de qualquer pessoa. - A decisão que ordena a
privação cautelar da liberdade não se legitima quando desacompanhada de fatos
concretos que lhe justifiquem a necessidade, não podendo apoiar-se, por isso
mesmo, na avaliação puramente subjetiva do magistrado de que a pessoa
investigada ou processada, se em liberdade, poderá delinqüir, ou interferir na
instrução probatória, ou evadir-se do distrito da culpa, ou, então, prevalecer-se de
sua particular condição social, funcional ou econômico-financeira para obstruir,
indevidamente, a regular tramitação do processo penal de conhecimento. -
Presunções arbitrárias, construídas a partir de juízos meramente conjecturais,
porque formuladas à margem do sistema jurídico, não podem prevalecer sobre o
princípio da liberdade, cuja precedência constitucional lhe confere posição eminente
no domínio do processo penal.
PRISÃO CAUTELAR E POSSIBILIDADE DE EVASÃO DO DISTRITO DA
CULPA.
- A mera possibilidade de evasão do distrito da culpa - seja para evitar a
configuração do estado de flagrância, seja, ainda, para questionar a legalidade e/ou
a validade da própria decisão de custódia cautelar - não basta, só por si, para
justificar a decretação ou a manutenção da medida excepcional de privação cautelar
da liberdade individual do indiciado ou do réu. Precedentes.
AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO, NO CASO, DA NECESSIDADE
Gabinete Des. Trindade dos Santos
7. CONCRETA DE DECRETAR-SE A PRISÃO PREVENTIVA DO PACIENTE.
- Sem que se caracterize situação de real necessidade, não se legitima a
privação cautelar da liberdade individual do indiciado ou do réu. Ausentes razões de
necessidade, revela-se incabível, ante a sua excepcionalidade, a decretação ou a
subsistência da prisão cautelar.
A PRESUNÇÃO CONSTITUCIONAL DE INOCÊNCIA IMPEDE QUE O
ESTADO TRATE COMO SE CULPADO FOSSE AQUELE QUE AINDA NÃO
SOFREU CONDENAÇÃO PENAL IRRECORRÍVEL.
- A prerrogativa jurídica da liberdade - que possui extração constitucional (CF,
art. 5º, LXI e LXV) - não pode ser ofendida por interpretações doutrinárias ou
jurisprudenciais, que, fundadas em preocupante discurso de conteúdo autoritário,
culminam por consagrar, paradoxalmente, em detrimento de direitos e garantias
fundamentais proclamados pela Constituição da República, a ideologia da lei e da
ordem. Mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática de crime
hediondo, e até que sobrevenha sentença penal condenatória irrecorrível, não se
revela possível - por efeito de insuperável vedação constitucional (CF, art. 5º, LVII) -
presumir-lhe a culpabilidade. Ninguém, absolutamente ninguém, pode ser tratado
como culpado, qualquer que seja o ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída,
sem que exista, a esse respeito, decisão judicial condenatória transitada em julgado.
O princípio constitucional do estado de inocência, tal como delineado em nosso
sistema jurídico, consagra uma regra de tratamento que impede o Poder Público de
agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao
réu, como se estes já houvessem sido condenados, definitivamente, por sentença do
Poder Judiciário. Precedentes (HC n. 102.124, rel. Min. Celso de Mello, Segunda
Turma, j. 29-6-2010, Acórdão eletrônico, DJe n. 224, divulg. 13-11-2012, public.
14-11-2012).
Não obstante, tal regramento não impede a decretação de prisão
preventiva ou mesmo a aplicação de medidas cautelares diversas da segregação
preventiva, quando integrados os pressupostos legais, como ocorre no caso sob
análise.
Em tal viés, iterativa é a jurisprudência da Suprema Corte de Justiça,
como exemplifica o acórdão assim sumariado:
É inquestionável que a antecipação cautelar da prisão - qualquer que seja a
modalidade autorizada pelo ordenamento jurídico positivo (prisão temporária,
preventiva ou prisão decorrente de sentença de pronúncia) - não se revela
incompatível com o princípio constitucional da presunção de não-culpabilidade. (...).
Impõe-se advertir, no entanto, que a prisão cautelar - que não se confunde com a
prisão penal (carcer ad poenam) - não objetiva inflingir punição à pessoa que sofre a
sua decretação. Não traduz, a prisão cautelar, em face da estrita finalidade a que se
destina, qualquer idéia de sanção. Constitui, ao contrário, instrumento destinado a
atuar em benefício da atividade desenvolvida no processo penal (HC n. 80.719, rel.
Min. Celso de Mello, Informativo do STF n. 221).
De outra banda, a Lei n.º 12.403/2011 ao trazer nova redação a vários
dispositivos do Código de Processo Penal privilegiou a aplicação de "outras medidas
cautelares" no curso do processo, relegando a segregação provisória a situações
Gabinete Des. Trindade dos Santos
8. específicas e excepcionais.
Neste cenário legislativo preceitua o art. 319, do Código de Processo
Penal:
São medidas cautelares diversas da prisão:
[...]
VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza
econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática
de infrações penais;
Tecendo seus comentários sobre esta disposição legal, anota Gustavo
Henrique Badarô:
A medida de suspensão do exercício da função pública ou de atividade de
natureza econômica ou financeira tem sua finalidade estabelecida, ainda que
indiretamente, na lei. O inc. VI do caput do art. 319 prevê que a medida é cabível
"quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais".
Logo, sendo o receio da prática de infrações penais requisito da medida, não é
difícil concluir que sua finalidade é evitar a prática de infrações penais, impedindo
que algum funcionário público investigado por crime cometido no exercício de sua
função ou em razão dela possa continuar a se valer ilegalmente da mesma função
para reiteração delitiva. [...]
Por outro lado, nada impede que se determine a suspensão de apenas parte
da atividade normalmente desenvolvida pelo funcionário público, segundo a lógica do
"sacrifício mínimo do direito afetado", segundo o qual deve se buscar invadir a esfera
de liberdade do indivíduo o mínimo necessário. (Medidas cautelares no processo
penal: prisões e suas alternativas: comentários à Lei 12.0403, de 04.05.2011. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. pp. 247, 248 e 251).
De outro lado, é de se obtemperar que o dispositivo acima transcrito foi
introduzido no Código de Processo Penal em 2011, pela Lei n.º 12.403, visando
reprimir, conforme expresso no próprio dispositivo, que o exercício da função pública
possa ser utilizada para a prática de atividade ilícita relacionada com o cargo
exercido.
A forma unipessoal de sua apreciação deriva do espírito da medida, qual
seja, de que não se trata de uma "ação cautelar" mas sim de um pedido incidental
formulado por meio de simples requerimento, com a decisão respondendo a um pleito
deduzido pelo Órgão Acusatório.
A propósito, observa Silvio Maciel:
No processo penal, a exemplo do processo civil, também existe uma tutela
cautelar (medidas cautelares). Não há, entretanto uma ação cautelar, ou seja, um
processo penal cautelar. As medidas cautelares são aplicadas incidentalmente, por
meio de simples requerimento ou até mesmo de ofício.
[...]
Também Vicente Greco Filho assevera que no processo penal "inexiste ação
ou processo cautelar. Há decisões ou medidas cautelares, como a prisão preventiva,
o sequestro, e outras, mas sem que se promova uma ação ou se instaure um
processo cautelar diferente da ação ou processo de conhecimento. As providências
cautelares são determinadas como incidentes no processo de conhecimento (Prisão
Gabinete Des. Trindade dos Santos
9. e medidas cautelares. Coord.: Luiz Flávio Gomes e Ivan Luís Marques. 2. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 170).
Nos dizeres do postulante recursal a decisão agravada ostenta a eiva de
ilegalidade, em razão de haver ela considerado como verdadeiros os fatos que
compõem o conteúdo do inquérito, adentrando, demais disso, no terreno da
presunção, o que configura arbitrariedade; incidiu a decisão, ainda, em afronta ao
dever do julgador de explicitar o seu convencimento quanto à necessidade da
segregação cautelar, com a indicação dos motivos concretos a tornarem
absolutamente necessária a prisão ante tempus, utilizando-se de expressões vagas e
elementos abstratos, emprestando ao ato decisório, em sendo assim, a aparência de
uma antecipada execução de pena.
Razão, no entanto, não assiste ao recorrente!
Da decisão recorrida, pinço, a respeito, o seguinte trecho (fl. 38):
[...] tem-se que o denunciado, como um de seus primeiros atos como
Presidente da ALESC, nomeou Lissandra Duwe Pasetto como Chefe de Gabinete
daquela Presidência (conforme nota jornalística juntada) e, portanto e a princípio,
pública e notória, trazida na petição formulada pelo Ministério Público.
Assente-se que a aludida servidora é esposa do co-denunciado Evandro
Carlos dos Santos, pessoa que, segundo a denúncia, além de integrar as
organizações criminosas das quais participava o deputado Romildo Luiz Titon, teria
sido responsável pelo recebimento, em nome deste, de parte das vantagens ilícitas
que lhes teriam sido destinadas. Tal circunstância, aliada à exoneração do próprio
Evandro Carlos dos Santos do cargo que ocupava na ALESC, na mesma data, indica
claramente a ocorrência de ajuste ou composição entre este e o ora requerido.
No reclamo recursal deduzido, sustenta o agravante que, no entretanto,
a nomeação de tal servidora para o cargo de Chefe de Gabinete da Presidência não
guarda qualquer vínculo com o fato de ser ela casada com o coindiciado Evandro
Carlos dos Santos, sendo a mesma pessoa de sua confiança e que com ele trabalha
desde 4 de dezembro de 1995, consoante a Resolução n.º 1.403/95 e a certidão que
entranhou nos autos.
Ora, a indicação pode ser fruto do mérito profissional da nomeada;
contudo, por certo que o cargo de Chefia lhe renderia proventos mais elevados e,
nesta etapa preliminar, a coincidência do ato com a exoneração dos cargos em
comissão que o corréu Evandro - suposto responsável pelo recebimento de
vantagens indevidas em nome do recorrente - exercia na Assembléia Legislativa,
deve ser vista com cautela, pois o incremento na renda da Sra. Lissandra Duwe
Pasetto beneficia de forma indireta todo o núcleo familiar.
No mesmo vértice, não merece guarida a justificativa de que as
testemunhas de acusação Humberto Geraldo Reolon, Eliana Capellari e Éder
Mesquita, já foram ouvidas na fase inquisitorial e trabalham há anos com o Deputado
Romildo Luiz Titon e, assim, nenhum risco à instrução criminal e à credibilidade da
Justiça na condução do processo poderia nessas circunstâncias advir.
Ocorre que, como o próprio agravante reconheceu, referidas
Gabinete Des. Trindade dos Santos
10. testemunhas somente foram ouvidas na etapa policial, fase essa que não se confunde
com a instrução judicial, sendo esta última a que é submetida ao crivo do contraditório
e, portanto, o fato de serem elas funcionárias do Legislativo Estadual, ocupantes de
cargos comissionados, e o agravante ocupante do cargo máximo de Chefia do
Parlamento poderá acarretar grave risco ao relato isento das servidoras referidas,
diante do evidente receio de represálias acaso relatem elas algum fato incriminador.
Ademais, além desses depoimentos testemunhais mencionados, a peça
exordial desta medida cautelar menciona outras oitivas que poderiam sobre prejuízo
(fls. 7 e 8), quando taxativamente expressa:
[...] a absoluta maioria das pessoas que nela figuram como denunciados, cujos
interrogatórios se constituirão em importante elemento de prova a ser colhido por
esse Juízo, ocupa ou ocupava cargos de natureza política nos âmbitos municipal ou
estadual, sendo evidentes seus vínculos com as agremiações políticas estaduais e
presumível a sua intimidação em face do exercício pelo também denunciado
ROMILDO LUIZ TITON, do cargo máximo de chefia de um dos Poderes do estado.
No concernente a ausência de competência do Presidente da
Assembléia Legislativa para a "gestão de pessoas", uma vez que o Regimento Interno
daquele órgão não lhe acomete tal atribuição, sendo a sua função "eminentemente
política", melhor sorte não lhe ocorre.
Isto porque embora precipuamente políticas, as atribuições do Chefe de
um Poder não se restringem exclusivamente a elas.
Não poder-se-ia imaginar, como pretende a defesa, que a tarefa de
"gestão de pessoas" seria exercida pelo Diretor Geral, posto que é inerente ao cargo
de Presidente a atribuição de escolha do ocupante deste cargo e de outros
importantes na estrutura administrativa e que comporão sua equipe de trabalho.
Outro elemento a indicar o acerto da decisão singular diz respeito a um
possível ajuste da utilização do cargo maior do Legislativo Catarinense para fins
diversos daqueles regimentalmente previstos, nos termos do assim destacado por
este relator às fls. 38 e 39:
De outro norte, é também verdade que no diálogo registrado por meio do
Telefone 4999803493, em 01/11/2013, às 08:44:38, e que consta dos autos em
apenso e do relatório de investigação que instruiu a denúncia, o codenunciado
Luciano Dal Pizzol, ao conversar com um advogado de nome Cláudio, refere que
assim que o ora requerido Romildo Luiz Titon viesse a assumir à Presidência da
Assembleia Legislativa de Santa Catarina, passaria a exercer mais diretamente
influência junto aos órgãos estaduais, quando então poderiam os interesses da
empresa de perfuração de poços de sua propriedade ser melhor preservados.
Tem-se, assim, o indicativo expresso e regularmente coletado nos autos, da
prévia pretensão de uso do cargo de Chefia do Legislativo catarinense, diga-se,
inclusive com possibilidade de assunção interina do comando do Executivo Estadual,
para a ilícita defesa de interesses privados, hipótese esta configuradora do crime já
descrito na inicial e que a permanência do ora requerido em tal posição de comando
traz razoável receio de que venha a ocorrer novamente.
É bem verdade que o agravante não participou diretamente da conversa
Gabinete Des. Trindade dos Santos
11. telefônica interceptada e, via de consequência, não detinha qualquer gerência com os
diálogos, que poderiam, inclusive, ser fruto de cogitação fantasiosa do empresário de
que a assunção do recorrente no cargo de Presidente da Casa Legislativa
Catarinense importaria em melhor possibilidade de preservação de ser interesses.
Todavia, reafirmo, trata-se de medida cautelar!
Por isso mesmo, não há exigência de prova cabal da ocorrência das
suspeitas narradas na peça pórtica, sendo suficiente que haja indicativos de sua
ocorrência com a permanência do ocupante do cargo público.
Neste desenho, a prova colhida é bastante para a configuração do
requisito do fumus boni iuris.
Também, e por derradeiro, consignei na decisão espancada, que (fl. 39):
Por fim, indubitavelmente assiste também razão ao Ministério Público quando
afirma que em situação de tamanha complexidade, na qual envolvidos 46
denunciados, a maioria ocupante de cargos públicos e em atividades delituosas que
em tudo envolvem a sistemática de destinação de verbas públicas para obras
municipais e estaduais mediante convênios, com a intermediação ou indicação do
Deputado Estadual Romildo Luiz Titon, exsurge como extremamente provável a
necessidade de produção ou complementação das provas, a partir de informações a
serem prestadas pelo Legislativo Estadual ou mesmo de documentos a serem por
este fornecidos, situação na qual a permanência do ora requerido na atual posição
de seu Presidente implicará em situação de grande constrangimento ao serem tais
provas requisitadas ao próprio acusado, que se configuraria em seu guardião,
hipótese que em tudo compromete a credibilidade de seu resultado e, portanto, a
credibilidade da própria Justiça, ferindo dessa forma a ordem pública, na qual tal
credibilidade nas instituições se insere.
Inconteste que o constituinte originário, no Capítulo sobre os direitos e
deveres individuais, trouxe como garantias fundamentais de todo cidadão o princípio
da presunção de inocência e o direito do preso de permanecer calado sem que isso
pese contra si (art 5.º, incisos LVII e LXII, da Constituição Federal, respectivamente).
Acrescente-se que desses princípios constitucionais deriva outra
importante garantia fundamental de todo cidadão brasileiro, o "nemo tenetur se
detegere", ou seja, o direito de "não produzir provas contra si", que encontra respaldo
também na Convenção de Direitos Humanos de 1969, conhecida como Pacto de San
José da Costa Rica. Em seu artigo 8º, das Garantias Judiciais, a Convenção declara
que toda pessoa tem "direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem
confessar-se culpada".
Este juízo, obviamente, deverá respeitar essas garantias ao agravante, o
que poderia gerar conflito com a necessidade de produção ou complementação das
provas, a partir de informações a serem prestadas pelo Legislativo Estadual, como
fundamentado na decisão monocrática.
Diante de todo o até aqui exposto verifica-se que não houve qualquer
desrespeito às regras do art. 282, do Código de Processo Penal, de acordo com as
quais:
As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas
Gabinete Des. Trindade dos Santos
12. observando-se a:-
I - necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução
criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações
penais;-
II - adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e
condições pessoais do indiciado ou acusado.
Reafirmo, na decisão singular sob crivo recursal há menção expressa
dos fundamentos pelos quais entendi que havia a "presença de risco imediato e
concreto à instrução processual; à ordem pública, aqui compreendida na dimensão da
própria credibilidade do Judiciário em face de situação de grande repercussão na
sociedade catarinense; e, ainda, à reiteração delituosa", nos termos aqui repisados
em parte.
E, mormente, havia o temor de destruição de provas imprescindíveis à
instrução do feito!
Dizer-se que, nada nos autos está a indicar essa possibilidade é
afirmação que não se coaduna com os elementos de prova já colhidos.
No dia da deflagração da Operação Fundo do Poço, em 28-11-2013,
dois telefonemas foram interceptados, contendo os seguintes diálogos que
evidenciam a intenção da ocultação de provas pelo aqui agravante, conversas essas
que têm, em resumo, os seguintes conteúdos:
No primeiro deles, com início às 09:31:30 e término às 09:35:12,
Diana Aparecida Gomes de Oliveira - secretária do escritório de Campos
Novos, liga para o Deputado Romildo Luiz Titon e pergunta o que é que deu, ele
responde não sei estou por fora. Diana diz, está com dificuldade aí . Titon diz:
Aqueles lá dos grampos antigos aí. Diana pergunta se o Deputado está aqui ou está
lá, ele responde estou por aí. Diana diz estar bem angustiada. Titon pergunta se eles
foram ai no escritório. Diana diz que foi avisada pelo Evandro que estiveram no
escritório de Videira, e aqui ainda não. Titon diz de ainda vão aí e pergunta se
devolveu o envelope aí para você. Diana diz que não, e que foi ontem lá fazer a
reabertura daquela conta daí hoje para mim fazer que eu não queria que a Bá visse
eu levar, daí eu iria hoje fazer. [..] Diana diz que ele me falou, ele foi lá em casa às
sete horas e eu fiquei assustada. Titon pergunta se ela tem aí aqueles dois cartões
que estão ali, (Tire dali) Diana diz tá. Titon diz: Tire agora porque eles iram aí, e pode
abrir o cofre se eles quiserem ver pode deixar e pede que Diana não se apavore que
eles vão entrar e revistar tudo porque é praxe deles, pegue aqueles cartões e leve.
Diana pergunta qual, Titon responde aqueles dos cartões. Diana diz que vai fazer
isso. Titon orienta Diana que eles vão levar todos os computadores e devem estar
quase chegando (grifo nosso).
Outro contato telefônico travado entre o Deputado Romildo Luiz Titon e
a secretária Diana Aparecida Gomes de Oliveira foi interceptada no mesmo ligação
dia, com início às 13:29:42 e término às 13:43:09 horas, conforme se transcreve a
seguir:
Secretária de Titon liga para ele e relata como foi o andamento das buscas no
escritório e com relação aos cartões - dinheiro - e computadores que Titon havia lhe
Gabinete Des. Trindade dos Santos
13. instruído para retirar do local o que aconteceu. Ela, a secretária, mandou a Bárbara
retirar o dinheiro e o computador, então Bárbara colocou no porta-malas do carro,
mas foi seguida por um investigador, que após dar várias voltas pela cidade, retornou
para o escritório, pois estava apavorada. Daí um dos investigadores pediu para eu
(secretária) quem era aquela moça que saiu e onde ela foi- Daí eu (secretária) disse
que ela é minha filha e ela leva o computador dela onde ela vai e o outro ela vai levar
no conserto. Titon pergunta se pegaram os computadores e o dinheiro. Secretária diz
que sim. Titon, demonstrando indignação, diz que foi pior do que se estivesse lá no
escritório. Secretária concorda e, com detalhes, relata o que ocorreu no escritório
durante as buscas. Secretária diz que estava tentando mandar mensagens para o
Deputado, mas foi surpreendida pelo Promotor, então desligou o telefone. Secretária
diz que deu um jeito e mandou Bárbara sumir com o telefone, com medo que Titon
retornasse a ligação. Secretária disse que já havia instruído a Leila "você não sabe
de nada, não viu nada". Secretária diz me perguntaram se eu tinha ouvido falar de
poço artesiano. Eu disse que não, nunca tinha ouvido falar o nome dessas
empresas. Mas bem que eu já tinha ouvido aqui no escritório, ainda mais por causa
daquela pastinha. Titon diz que aquele dinheiro que eles levaram é o dinheiro dos
adubos, esse que ela iria depositar lá, é o dinheiro que entrou dos adubos. Secretária
diz não é os 15 mil dos cartões, o Evandro só havia pego o envelope daquele do
carro. Secretária diz que o computador da Leila ainda deu tempo de retirar do local
antes de eles entrarem aqui. Titon questiona se eles perguntaram sobre os
funcionários, se eram da granja ou da Assembléia. Secretária responde que
perguntaram e ela respondeu que Leila era funcionária da granja, mas já estava para
sair. Titon diz: mas você disse que era da Assembléia. Secretária volta a frisar: mas
o dinheiro eles levaram daí. Era 15 mil e pouco. É que eu não abri ali, e como o
Evandro esteve ali de manhã e disse que tinha tirado o dinheiro do cofre, não sabia
que tinha dinheiro ali, eu não sabia que tinha aquele outro, senão eu tinha ido antes
lá em casa. Titon interrompe a conversa. Tá, tá. Titon pede para a Secretária
localizar Evandro e marca encontro com ela (Secretária), Evandro e Titon, na entrada
do sítio da cunhada. Secretária pergunta se ele não quer ir lá na Diná mesmo, e se
entra pelo portão de trás. Titon diz que não quer ver ninguém a estas alturas. Titon
diz nós entramos lá embaixo e conversamos. Secretária diz áh lá no salto ou no
asfalto. Titon diz é só dar um alô quando chegar lá, que daí eu vou lá, entramos lá
em baixo, eu já pego o Evandro e falo contigo. Secretária concorda e os dois se
despedem (grifo nosso).
Presentes nas conversas transcritas, de forma clara, a intenção do
agravante de ver ocultadas ou suprimidas provas da sua participação como um dos
integrantes da verdadeira quadrilha desbaratada pela Operação Fundo do Poço.
Nesse contexto, afirmar-se que o recorrente, no exercício da função de
Presidente do Legislativo Catarinense não iria destruir ou suprimir outras provas,
valendo-se da sua posição privilegiada, não convence a ninguém com um mínimo de
inteligência.
Parece-nos que a defesa, com todo respeito possível, ainda acredita em
Papai Noel, Coelhinho da Páscoa, Duendes e Fadas. Este relator, não!
Arnaldo Quirino de Almeida, no artigo "A suspensão cautelar do
exercício de função pública ou atividade privada como alternativa à prisão preventiva",
Gabinete Des. Trindade dos Santos
14. observa:
A continuidade da atividade profissional ou o exercício da função pública seria
elemento facilitador para a obstrução de provas ou para a reiteração criminosa, já
que o suposto autor do crime se manteria no local de trabalho, podendo se utilizar
novamente dos mesmos instrumentos que o levaram a prática do crime, além de
permanecer com livre acesso a arquivos, documentos e registros que de algum
modo poderia interessar à investigação do crime
(http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php-n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10307
Na mesma vertente, registra Edilson Mougenot Bonfim:
A medida em questão será uma das que, quando aplicadas, melhor trará
resultados práticos. Isto porque a imposição da referida cautelar se justifica quando o
acusado se vale da função para a prática delitiva, notadamente nos crimes contra a
Administração Pública. Desta forma, afasta-se o acusado do cargo para, assim
melhor apurar a infração penal, evitando-se a supressão de provas e facilitando sua
colheita (Código de processo penal anotado. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p.
650).
Do site do Supremo Tribunal Federal, mais precisamente em Notícias do
STF, de 1-4-2014, colhe-se a seguinte matéria que, dada a sua similitude com a
hipótese aqui sob apreciação, vale à pena ser transcrita.
É o seguinte o teor da notícia:
Terça-feira, 01 de abril de 2014
Por maioria de votos, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF)
não conheceu (julgou incabível), nesta terça-feira (1), o Habeas Corpus (HC)
121035, impetrado pelo prefeito do município de Manaíra (PB), José Simão de
Sousa. No Supremo, a defesa pretendia reverter decisão de ministro do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) que indeferiu pedido de liminar em HC lá impetrado, no
qual o perfeito pedia trancamento da ação penal e seu retorno ao cargo.
Denunciado com quatro corréus por suspeita de fraude em licitação, crime
previsto no artigo 90 da Lei 8.666/1993, e formação de quadrilha, artigo 288 do
Código Penal, o prefeito pretendia obter o trancamento da ação penal, alegando que
a denúncia seria inepta, e também a cassação de decisão do Tribunal de Justiça da
Paraíba que determinou seu afastamento preventivo do cargo. Ao não conhecer do
pedido, o relator do caso, ministro Dias Toffoli, considerou haver afronta à Súmula
691 do STF, que não admite habeas contra decisão de relator de tribunal superior
que indefere pedido de liminar em HC.
De acordo com os autos, o prefeito de Manaíra e os membros da comissão
permanente de licitação, de forma permanente e mediante prévia combinação e
ajuste, o caráter competitivo de procedimentos licitatórios. Segundo o Ministério
Público, "os acusados, em comum acordo, escolhiam as empresas para compor o
número mínimo exigido para a modalidade convite e utilizavam indevidamente
documentos de empresas, falsificando as assinaturas de seus representantes legais
em todos os atos do procedimento licitatório. Os elementos de convicção para o
oferecimento da denúncia foram produzidos pelo Ministério Público da Paraíba, a
partir da atuação do Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado
(GAECO) e da Comissão de Combate aos Crimes de Responsabilidade e à
Improbidade Administrativa (CCRIMP).
Gabinete Des. Trindade dos Santos
15. O ministro Dias Tofoli destacou que afastar do mandado eletivo um agente
político, com base no artigo 319 do Código de Processo Penal, em vez da
decretação da prisão pode ser mais eficaz. Lembrou que, antes da alteração da lei,
houve diversos casos em que prefeitos tiveram a prisão decretada, mas continuaram
despachando da cadeia.
O ministro afirmou ter refletido sobre a possibilidade de um juiz que não é da
seara eleitoral afastar alguém do mandato, mas que no caso em julgamento,
especialmente pelo fato de o acusado ser alvo de denúncia de diversos crimes
semelhantes, na gestão da prefeitura, a medida se justifica.
"É necessário que não fechemos a porta a toda e qualquer possibilidade de
uso deste dispositivo do Código de Processo Penal, na medida em que, se o crime
pode voltar a ser praticado, estando a pessoa da função pública, ela deve ser
afastada", observou o relator.
Com o julgamento desta terça-feira, fica prejudicada a medida cautelar
concedida em janeiro pela Presidência do STF, que, em análise preliminar, mantinha
José Simão de Souza no cargo de Prefeito de Manaíra, até que houvesse decisão
definitiva na ação penal (grifo nosso).
Outrossim, não há como deixar-se de rebater as manifestações contidas
no memorial que, precedentemente à sessão de julgamento, foi entregue a alguns
membros desta Corte pela defesa do insurgente
Num desses argumentos, encampado veemente por um dos julgadores
presentes a esta sessão, entende o recorrente que, tendo este julgador revogado o
decreto de prisão preventiva dos indiciados Luciano Dal Pizzol, Atílio Miguel Roani e
Juarez Ataniel da Silva, os motivos que geraram aquela revogação deveriam ser a ele
estendidos, com a sua reintegração na Presidência do Poder Legislativo Estadual.
É premissa, concessa vênia, totalmente equivocada e destituída de
qualquer respaldo jurídico!
Ora, os indiciados Luciano Dal Pizzol, Atílio Miguel Roani e Juarez
Ataniel da Silva não exercem qualquer cargo ou função pública, mas apenas
atividades no campo privado, sendo empresários, com a colheita da prova
documental contra eles se esgotado mediante a apreensão de documentos e
computadores; não há, assim, como se pretender possam esses indiciados
interferirem na coleta da prova testemunhal, em prejuízo da instrução processual.
De outro lado, o decreto de prisão preventiva dos indiciados em questão
retringia-lhes a liberdade, de modo que a liberação dos mesmos levou em
consideração, acima de tudo, que eventual demora na instrução do processo
acarretaria um sensível prejuízo àquele direito.
Enquanto isso, a medida cautelar imposta ao aqui agravante foi
decretada como alternativa à possibilidade de sua prisão preventiva, não se tratando,
pois, da mesma medida que foi revogada em relação aos indiciados Luciano Dal
Pizzol, Atílio Miguel Roani e Juarez Atanael da Silva.
A par disso, não há como concluir que eventual demora na instrução do
processo venha a causar prejuízos a direito do agravante, justamente porque já foi ele
beneficiado com medida menos gravosa: afastamento de função pública ao invés de
segregação preventiva.
Gabinete Des. Trindade dos Santos
16. E mais: além de se tratarem de institutos processuais distintos - medida
cautelar alternativa e prisão -, a decisão de revogação da segregação preventiva
impôs aos indiciados Luciano Dal Pizzol, Atílio Miguel Roani e Juarez Atanael da Silva
o cumprimento de diversas medidas cautelares, igualando, portanto, a situação
jurídica dos mesmos com a do Deputado Romildo Luiz Titon.
Mas não é só: a decisão de revogação da prisão preventiva reconheceu
a necessidade de medidas cautelares substitutivas como forma de evitar a obstrução
do andamento do processo, fundamento esse igualmente utilizado para afastar o
agravante das funções de Presidente da Mesa da Assembléia Legislativa de Santa
Catarina.
Porém, ainda que as situações do agravante e dos indiciados colocados
em liberdade fossem idênticas sob o prisma jurídico, é pacífica a jurisprudência no
sentido de inexistir efeito extensivo obrigatório, e nem de ofensa ao princípio da
isonomia, no tratamento diferenciado de indiciados que apresentem condições
subjetivas distintas.
A propósito, destaque-se, a título exemplificativo:
PRISÃO ANTECIPADA. SUBSTITUIÇÃO POR MEDIDAS CAUTELARES
PELA CORTE ESTADUAL EM RELAÇÃO A TRÊS CORRÉUS. INDEFERIMENTO
DO PEDIDO DE EXTENSÃO LÁ FORMULADO EM FAVOR DA PACIENTE.
BENEFICIADOS EM SITUAÇÃO DISTINTA. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE
FÁTICO-PROCESSUAL. ART. 580 DO CPP. INAPLICABILIDADE.
CONSTRANGIMENTO INOCORRENTE.
1. O artigo 580 do CPP permite que, na hipótese de concurso de agentes, a
decisão judicial favorável proferida em favor de um acusado se estenda aos demais,
desde que as situações fático-processuais sejam idênticas e não esteja a decisão
beneficiadora fundada em motivos que sejam de caráter eminentemente pessoal.
2. Constada a ausência de identidade fático-processual entre a situação dos
corréus beneficiados pela decisão proferida pela Corte Estadual, que substituiu a
prisão preventiva por medidas alternativas, e a da ora paciente, não há espaço para
a aplicação do art. 580 do CPP.
[...] (STJ, HC n. 279.377/SE, rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, j. 3-12-2013,
grifo nosso).
[...]
PRISÃO ANTECIPADA. SUBSTITUIÇÃO POR MEDIDAS CAUTELARES
PELA CORTE ESTADUAL EM RELAÇÃO A TRÊS CORRÉUS. INDEFERIMENTO
DO PEDIDO DE EXTENSÃO LÁ FORMULADO EM FAVOR DA PACIENTE.
BENEFICIADOS EM SITUAÇÃO DISTINTA. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE
FÁTICO-PROCESSUAL. ART. 580 DO CPP. INAPLICABILIDADE.
CONSTRANGIMENTO INOCORRENTE.
1. O artigo 580 do CPP permite que, na hipótese de concurso de agentes, a
decisão judicial favorável proferida em favor de um acusado se estenda aos demais,
desde que as situações fático-processuais sejam idênticas e não esteja a decisão
beneficiadora fundada em motivos que sejam de caráter eminentemente pessoal.
2. Constatada a ausência de identidade fático-processual entre a situação dos
corréus beneficiados pela decisão proferida pela Corte Estadual, que substituiu a
prisão preventiva por medidas alternativas, e a da ora paciente, não há espaço para
Gabinete Des. Trindade dos Santos
17. a aplicação do art. 580 do CPP.
[...] (STJ, HC n. 279.377/SE, rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, j. 3-12-2013,
grifo nosso).
HABEAS CORPUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO
PREVISTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. 1. NÃO CABIMENTO. MODIFICAÇÃO
DE ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. RESTRIÇÃO DO REMÉDIO
CONSTITUCIONAL. EXAME EXCEPCIONAL QUE VISA PRIVILEGIAR A AMPLA
DEFESA E O DEVIDO PROCESSO LEGAL. 2. HOMICÍDIO QUALIFICADO.
PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO PARA A FORMAÇÃO DA CULPA.
NÃO OCORRÊNCIA. RAZOABILIDADE. ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO. 3.
PEDIDO DE EXTENSÃO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE SIMILARIDADE DE
CONDIÇÕES SUBJETIVAS. 4. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
[...].
3. Nos termos do art. 580 do Código de Processo Penal, a decisão proferida
em relação a um acusado, havendo concurso de agentes, deve ser estendida aos
corréus, se baseada em motivos que não sejam de caráter exclusivamente pessoal.
No caso em apreço, o Tribunal impetrado consignou expressamente não haver
similiaridade de condições subjetivas legalmente exigidas para a concessão do
benefício pleiteado.
4. Habeas corpus não conhecido (STJ, HC n. 282.858/CE, rel. Min. Marco
Aurélio Belizze, Quinta Turma, j. 25-2-2014, DJe 10-3-2014, grifo nosso).
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ASSOCIAÇÃO PARA O
TRÁFICO DE DROGAS E LAVAGEM DE DINHEIRO. PEDIDO DE EXTENSÃO DE
ALVARÁ DE SOLTURA CONCEDIDO A CORRÉUS. INVIABILIDADE. AUSÊNCIA
DE IDENTIDADE DE SITUAÇÕES. [...].
[...].
2. Não se encontrando os acusados na mesma situação fático-processual, não
cabe, a teor do Princípio da Isonomia e do art. 580 do Código de Processo Penal,
deferir pedido de extensão de julgado benéfico obtido por alguns deles.
[...] (STJ, RHC n. 37.739/RS, rela. Mina. Laurita Vaz, Quinta Turma, j.
25-2-2014, DJe 12-3-2014, grifo nosso).
Nesse contexto, ainda permanecem válidos os motivos que ensejaram o
afastamento contra o qual inflete o recorrente, consistentes na conveniência da
investigação e da instrução criminal.
Colacionou o agravante, outrossim, no mesmo memorial, precedente da
lavra do Min. Ricardo Lewandowski, destacado pelo defensor do indiciado Romildo
Luiz Titon, o seguinte excerto:
[...] a medida deixa de ser adequada, pois impede que os recorrentes exerçam
os cargos para os quais foram eleitos por seus pares, sem que exista qualquer
previsão para o término do processo de conhecimento, que, aliás, não teve nem a
instrução iniciada. Evidente, portanto, a presença do periculum in mora, ante a
concreta possibilidade de que os recorrentes sejam mantidos afastados dos cargos
que exerciam na Assembléia Legislativa local até o encerramento da legislatura
atual, sem que a ação penal chegue ao seu final, o que representa uma clara
Gabinete Des. Trindade dos Santos
18. antecipação dos efeitos de um eventual juízo condenatório (STF, MC no RO em HC
n. 118.096/AP, j. 5-12-2013).
No entanto, talvez com o intuito de confundir os julgadores, omitiu-se o
recorrente de declinar que a situação que deu margem ao entendimento acima
transcrito e a dos presentes autos são bastante diferentes, vez que no precedente
citado havia o perigo iminente do término da legislatura do Estado do Amapá, não
tendo sido fixado prazo para o afastamento do impetrante.
Enquanto isso, em situação diametralmente oposta, ao deferirmos a
cautelar de afastamento deixamos acentuado com todas as letras que o afastamento
perduraria pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias ou até o recebimento da denúncia,
prevalecendo entre esses lapsos temporais o que primeiro ocorresse.
Ainda em seu memorial, insurge-se o agravante contra o fato de não
haver sido este regimental levado a julgamento pelo Órgão Especial na primeira
sessão seguinte à sua propositura, afirmando ter este relator sido recalcitrante com o
que dispõe o art. 196 do Regimento Interno deste Tribunal, assinalando, ainda, que,
segundo as justificativas por nós dadas, tratava-se de matéria complexa,
complexidade essa que não foi considerada quando do deferimento da liminar
postulada pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina.
Ora, a matéria tornou-se de uma complexidade total, justamente com o
ajuizamento do presente agravo regimental, vez que, a partir de então, passou ela a
ser controvertida, o que não ocorria quando deferimos a liminar contra a qual é
colocada a insurgência, pois, para tanto, a análise incidiu apenas sobre os termos da
denúncia e gravações de escutas telefônicas que a instruíam.
E, com o ingresso do instrumento recursal sob exame, é que, em
verdade, a matéria tornou-se deveras complexa, em face dos inúmeros contrapontos
trazidos à baila e que, como é óbvio, impunham-se analisados.
Demais disso, é de se ressaltar que, na atualidade, é quase impossível
que os agravos regimentais sejam apresentados na sessão seguinte à da respectiva
propositura, em face do número expressivo e sempre crescente dos recursos que
aportam diariamente nesta Corte; aliás, não só neste Tribunal, como em todos os
Tribunais pátrios, a determinação de apresentação dos agravos regimentais na
sessão imediata à da data do ajuizamento não vem sendo atendida há muito tempo,
tornando-se letra morta a disposição a respeito existente em alguns Regimentos
Internos.
É determinação, de outro lado, ausente da maioria dos Regimentos
Internos das Cortes de Justiça do País, inclusive nos do Supremo Tribunal Federal e
do Superior Tribunal de Justiça!
Causa espécie, outrossim, questionar o procurador do agravante o fato
de não terem os agravos regimentais interpostos por Walter Kleber Kucher Júnior,
Luciano Antônio Salmória e André Jamir Turra sido submetidos ao Órgão Especial na
sessão imediatamente realizada após a dedução dos mesmos recursos.
Ocorre que ao defensor do agravante falece legitimidade para defender
os interesses dos nominados recorrentes, já que não detém ele poderes para tanto,
Gabinete Des. Trindade dos Santos
19. por não ter sido constituído como procurador dos mesmos; defensores desses
coindicados são os Drs. Marlon Charles Bertol, André Mello Filho e Alexandra Paglia,
que não se opuseram ao não cumprimento da disposição regimental em questão,
como também não de intrometeram na defesa de outros indiciados, limitando-se a
agir na defesa dos interesses de seus constituintes.
E, no referente ao aqui agravante, resta ver, a decisão impugnada foi a
mantida e justificada às fls. 158 e seguintes, oportunidade em que designou-se a
sessão do dia 2 de abril último para a submissão do agravo regimental ao eg. Órgão
Especial desta Corte. Dessa decisão, saliente-se, foi o defensor do recorrente
intimado através do Diário de Justiça Eletrônico de 13-3-2014, sem manifestar
qualquer insurgência a respeito. Assim, o seu direito de revolver a matéria precluiu,
pois o direito não socorre àqueles que dormem.
E, numa vã e primária tentativa de confundir os julgadores, assinala o
agravante que ao Judiciário não é facultado impor a cassação de mandatos eletivos,
como feito na hipótese vertente, em relação a agentes políticos que exerciam os
cargos de Prefeito e de Vice-Prefeito.
Primeiramente, é de se esclarecer que, no caso, não houve em relação
a qualquer dos indiciados a cassação de seus mandatos eletivos, mas tão-somente, e
apenas, a suspensão dos exercícios nesses cargos, como medida que entendemos
salutar à preservação da instrução criminal e à inibição de novas práticas deletivas.
Acresça-se a isso que, como já expusemos, não é dado ao aqui
recorrente questionar, ainda que através memoriais, os afastamentos dos cargos de
Chefe do Executivo e de Vice-Prefeito dos indiciados Walter Kleber Kucher Júnior,
Luciano Antônio Salmória e André Jamir Turra, até por questão de ética, posto não
ser o seu defensor o defensor também desses indiciados, não lhe cabendo, por
razões óbvias, interferir nas defesas de quem não confiou a ele poderes de
representação.
Na continuidade, diz o postulante recursal que o diálogo registrado por
meio do telefone (49) 9980-3493, em 1-11-2013, às 8:44:38 horas, do qual se extrai
uma conversa dando conta que o agravante, assim que viesse a assumir a
Presidência da Assembléia Legislativa de Santa Catarina, "passaria a exercer mais
diretamente influência junto aos órgãos estaduais, quando então poderiam os
interesses da empresa de perfuração de poços ser melhor preservados", jamais
poderia servir para embasar o seu afastamento do cargo de Presidente.
Primeiro, por uma questão elementar: a defesa demonstrou
pericialmente que arquivos das interceptações foram excluídos, requerendo que as
demais escutas fossem fornecidas de maneira a possibilitar a checagem, o que foi
indeferido por este relator sem justificativa plausível, principalmente quando apontada
uma primeira violação.
E mais: a defesa tem direito de receber os arquivos em formatação que
possibilite sua checagem e o consequente direito à contraprova.
Não procedem, também no aspecto em questão, os argumentos trazidos
à baila pelo agravante, não havendo que se cogitar, a prima facie, de exclusão de
arquivos.
Gabinete Des. Trindade dos Santos
20. Os arquivos, na sua integralidade, encontram-se em depósito neste
Tribunal, e sobre eles foi determinada a realização de perícia técnica, para provar,
justamente, que não houve essa exclusão e nem, como afirmado pelo agravante, sem
qualquer base fática, ter havido violação das gravações.
Apenas e somente, como é óbvio, só vieram aos autos os arquivos da
gravação que dizem respeito aos fatos em si, não havendo porque instruir-se os autos
com a parte das gravações que se referem a outras conversas particulares dos
envolvidos.
Isso, no entanto, não corresponde à pretensa violação ou montagem de
gravações, que contamina a prova como um todo, sob o ponto de vista penal.
O Supremo Tribunal Federal, na condição de mais alta Corte de Justiça
do País, assim tem enfocado o tema:
[...]
9. PROVA. Criminal. Interceptação telefônica. Transcrição da totalidade das
gravações. Desnecessidade. Gravações diárias e ininterruptas de diversos terminais
telefônicos durante período de 7 (sete) meses. Conteúdo sonoro armazenado em 2
(dois) DVDs e 1 (hum) HD, com mais de quinhentos mil arquivos. Impossibilidade
material e inutilidade prática de reprodução gráfica. Suficiência da transcrição literal e
integral das gravações em que se apoiou a denúncia. Acesso garantido às defesas
também mediante meio magnético, com reabertura de prazo. Cerceamento de
defesa não ocorrente. Preliminar repelida. Interpretação do art. 6º, § 1º, da Lei nº
9.296/96. Precedentes. Votos vencidos.
O disposto no art. 6º, § 1º, da Lei federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996, só
comporta a interpretação sensata de que, salvo para fim ulterior, só é exigível, na
formalização da prova de interceptação telefônica, a transcrição integral de tudo
aquilo que seja relevante para esclarecimento sobre os fatos da causa sub judice.
[...] (Inqu. n. 2.424, rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, j. 26-11-2008).
[...]
Não é necessária a trascrição integral dos diálogos captados por meio de
interceptação telefônica. Basta que sejam transcritos os trechos necessários ao
embasamento da denúncia oferecida e que seja entregue à defesa todo o conteúdo
das gravações em mídia eletrônica.
No entanto, não haverá, em princípio, qualquer irregularidade, caso o juiz da
causa entenda pertinente a gravação de todas as conversas e determine a sua
juntada aos autos (Ap. 508AGR/AP, rel. Min. Marco Aurélio, Plenário, j. 7-2-2013).
No mesmo viés, contundente é a jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça, como exemplificam os acórdãos encimados pelas seguintes ementas:
HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO PARA
O TRÁFICO. LIMINAR. INDEFERIMENTO. NÃO CABIMENTO. SÚMULA 691 DO
STF. JULGAMENTO DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL ORIGINÁRIO. ACÓRDÃO
PROLATADO. FUNDAMENTAÇÃO PERTINENTE AO EXPOSTO NA INICIAL.
SUPERAÇÃO DO ÓBICE. CONHECIMENTO DO WRIT EM RESPEITO AO
PRINCÍPIO DA CELERIDADE PROCESSUAL. [...]. INTERCEPTAÇÕES
TELEFÔNICAS. PRORROGAÇÕES SUCESSIVAS. DILIGÊNCIAS QUE
ULTRAPASSAM O LIMITE DE 30 (TRINTA) DIAS PREVISTO NO ARTIGO 5º, DA
Gabinete Des. Trindade dos Santos
21. LEI 9.296/1996. POSSIBILIDADE DE VÁRIAS RENOVAÇÕES. EXISTÊNCIA DE
DECISÕES FUNDAMENTADAS. ILICITUDE NÃO CARACTERIZADA.
1. Apesar de no artigo 5º da Lei 9.296/1996 se prever o prazo máximo de 15
(quinze) dias para a interceptação telefônica, renovável por mais 15 (quinze) dias,
não há qualquer restrição ao número de prorrogações, exigindo-se apenas que haja
decisão fundamentando a dilatação do período. Doutrina. Precedentes.
DEGRAVAÇÃO DAS CONVERSAS INTERCEPTADAS. ALEGADA EMISSÃO
DE JUÍZO DE VALOR PELA AUTORIDADE POLICIAL. OBSERVÂNCIA AO ART. 6º,
§ 1º, DA LEI 9.296/1996. EIVA NÃO EVIDENCIADA.
1. Como a interceptação, para valer como prova, deve estar gravada, tem-se
entendido, tanto em sede doutrinária, quanto nos Tribunais Superiores, que não é
necessária a degravação integral das conversas captadas, pois tal trabalho, além de
muitas vezes ser de impossível realização, por outras pode se mostrar totalmente
infrutífero.
2. Pelo relatório de interceptação, único documento referente à quebra de sigilo
das comunicações telefônicas do paciente constante dos autos, depreende-se que
não houve a degravação integral dos diálogos que foram interceptados, tendo-se
selecionado alguns trechos para a transcrição, sendo que, no que se refere a
determinados telefonemas, há somente um resumo do objeto da conversa travada.
3. No entanto, tal procedimento não configura, por si só, qualquer ilegalidade,
uma vez que a supressão de alguns trechos de conversas, transcrevendo-se outros,
que interessam às investigações, não significa a emissão de juízo de valor por parte
da autoridade policial, a ponto de contaminar a prova colhida.
4. Da mesma forma, as notas explicativas elaboradas pelos agentes policiais
não caracterizam parcialidade, pois representam somente comentários que teriam
por objetivo facilitar a compreensão do teor dos diálogos, não alterando o conteúdo
das conversas interceptadas.
PRISÃO PREVENTIVA. CONCESSÃO DA ORDEM A CORRÉU.
[...].
2. Ordem denegada. Pedido de extensão indeferido (HC n. 118.803/SC, rel.
Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, j. 26-10-2010, DJe 13-12-2010, grifo nosso).
HABEAS CORPUS. ART. 35, DA LEI N.º 11.343/06. ALEGAÇÃO DE
AUSÊNCIA DE PERÍCIA TÉCNICA PARA IDENTIFICAÇÃO DAS VOZES
GRAVADAS EM INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS E DE TRANSCRIÇÃO DE
TODAS AS CONVERSAS INTERCEPTADAS. DESNECESSIDADE. TESE DE QUE
AS DECISÕES JUDICIAIS QUE AUTORIZARAM AS INTERCEPTAÇÕES
TELEFÔNICAS, E SUAS RESPECTIVAS PRORROGAÇÕES, SÃO DESTITUÍDAS
DE FUNDAMENTAÇÃO, E SE PROLONGARAM DEMASIADAMENTE NO TEMPO.
DEMONSTRAÇÃO DA IMPRESCINDIBILIDADE DAS MEDIDAS. ORDEM DE
HABEAS CORPUS DENEGADA.
1. [...].
2. A Lei n.º 9.296/96, que disciplina a interceptação de comunicações
telefônicas, nada dispõe sobre a necessidade de realização de perícia para a
identificação de vozes gravadas.
3. "O disposto no art. 6º, § 1º, da Lei Federal nº 9.296, de 24 de julho de 1996,
só comporta a interpretação sensata de que, salvo para fim ulterior, só é exigível, na
formalização da prova de interceptação telefônica, a transcrição integral de tudo
Gabinete Des. Trindade dos Santos
22. aquilo que seja relevante para esclarecer sobre os fatos da causa sub iudice." (STF,
Inq. 2.424/RJ, Tribunal Pleno, Rel. Min. CEZAR PELUSO, DJe de 25/03/2010). É
completamente despicienda a degravação de todas as conversas interceptadas,
especialmente as que nada se referem aos fatos.
4. É válido, como fundamento para decretação de interceptação telefônica que
a apuração dos fatos mostra-se inviável sem a realização da diligência, e de que a
medida é imprescindível para a investigação criminal.
5. "Persistindo os pressupostos que conduziram à decretação da interceptação
telefônica, não há obstáculo para sucessivas prorrogações, desde que devidamente
fundamentadas, nem ficam maculadas como ilícitas as provas derivadas da
interceptação" (STF, RHC 85.575/SP, 2.ª Turma, Rel. Ministro JOAQUIM BARBOSA,
DJ de 16/03/2007).
6. Ordem de habeas corpus denegada (HC n. 203.377/SP, rela. Mina. Laurita
Vaz, Quinta Turma, j. 26-6-2012, DJe 24-9-2012, grifo nosso).
Conclui-se, então, que o fato de não ser realizada a transcrição integral
das interceptações telefônicas, a par de não implicar em violação do material
degravado, não ofende o princípio do devido processo legal, garantido peo art. 5.º,
LV, da Constituição Federal de 1988.
O que tem de ser garantido é o acesso das defesas, também através
meio magnético, o que foi feito in casu, não obrigando a lei, contudo, sejam as mídias
entregues dentro de padrões adequados aos equipamentos de escuta que têm os
defensores ou os indiciados.
Entretanto, desde que haja consenso de todos os envolvidos, podemos
gestionar junto à Presidência deste Órgão Especial a designação de sessão ou de
sessões tendentes à ouvida de todo o conteúdo das interceptações gravadas, desde
que sejam públicas essas sessões e desde que haja a isenção da responsabilidade
deste relator pela divulgação de qualquer fato desabonador à conduta de qualquer um
dos indiciados.
Assim viria a público - o que não seria conveniente para alguns dos
indiciados, a marcação de programas de cunho sexual, conversas amorosas travadas
entre alguns dos envolvidos nos fatos, além de outros fatos que por dizerem respeito
à vida pessoal dos mesmos que, entendemos, devam ser preservados.
De modo idêntico, não se pretenda que o fato de não se conhecer ainda
a data em que o Superior Tribunal de Justiça levará a julgamento o Habeas Corpus
n.º 290.120/SC, intentado pelo indiciado Luciano Dal Pizzol, no qual se discute a
competência para o recebimento e processamento da denúncia ofertada pelo
Ministério Público de Santa Catarina, cuja liminar suspendeu a sessão designada por
este Tribunal para o recebimento ou não da peça de acusação, seria relevante para
impor a reversão da medida agravada, não é nada convincente.
O aludido Habeas Corpus, cuja relatoria foi transferida à Exma. Sra.
Ministra Regina Helena Costa, segundo apuramos, está em vias de julgamento,
podendo ser apresentado em mesa numa das próximas sessões do Superior Tribunal
de Justiça.
Inclusive, em tais autos, o Ministério Público Federal, através do
Gabinete Des. Trindade dos Santos
23. Subprocurador-Geral da República, Dr. Eitel Santiago de Brito Pereira, emitiu, em
9-4-2014, parecer que, com rara felicidade, colocou com total propriedade a real
situação do caso, fazendo-o nos seguintes termos:
[...]
3. O writ não merece prosperar.
4. Nota-se que se trata de feito complexo, envolvendo 46 (quarenta e seis)
denunciados e 80 (oitenta) crimes. No que tange aos crimes atinentes ao paciente,
podemos resumir o esquema da seguinte forma:
5. Luciano Dal Pizzol, empresário, faz parte de organização criminosa, que
ainda está sendo desmantelada, voltada para a prática de crimes contra licitações
em vários municípios dos Estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná. A
quadrilha é composta por deputados, prefeitos, servidores públicos estaduais e
municipais, entidades associativas, bem como por donos e funcionários de poços
artesianos, que, em conjunto, desviaram dinheiro do erário.
6. Para tanto, o deputado Romildo Luiz Titon se incumbia de destinar, perante
a Assembléia Legislativa, recursos a prefeituras e associações de diversos
municípios de Santa Catarina para a realização de obras em poços artesianos, as
quais seriam realizadas por empresários específicos, dentre eles, o paciente.
7. Para frustrar a competição dos certames licitatórios, os donos dos citados
poços faziam combinações prévias, entre si e com agentes dos órgãos públicos
envolvidos, para delimitar como seriam realizados os pagamentos de todos os
participantes do esquema, inclusive, a dos empresários que perderiam a
concorrência pública. Aliás, ao que tudo indica, Luciano é o lider e articulador de um
dos núcleos do empresariado (fl. 391/397).
8. Tais delitos causaram, segundo a Corte Estadual, "danos de vulto ao erário
e, consequente e criminosamente, a uma população inteira" (fl. 397).
9. Aliás, essa Subprocuradoria-Geral de Justiça, já, inclusive, se pronunciou
sobre a legalidade da prisão preventiva do paciente no HC 285185/SC, conforme
ementa abaixo transcrita:
Habeas corpus. Formação de Quadrilha. Fraude à licitação. Corrupção passiva.
Revogação da prisão preventiva. Impossibilidade. Decisão fundamentada na garantia
da ordem pública e na conveniência da instrução criminal. Organização criminosa,
que ainda está sendo desmantelada, voltada para a prática de crimes contra a
licitação pública para a construção de poços artesianos nos municípios dos estados
de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná. Delitos praticados de forma
constante e reiterada. Indícios da existência de alguns procedimentos licitatórios
fraudados, ainda em curso. Possibilidade de que, solto, o paciente, líder e articulador
do núcleo dos empresários no esquema criminoso, venha a ameaçar testemunhas e
destruir provas. Parecer pela denegação da ordem.
10. Neste habeas corpus, o impetrante tenta, com uma falaciosa
argumentação, atrasar o recebimento da denúncia, bem como anular todos os atos
decisórios do Inquérito Policial nº 2013.088693-6/SC, ao argumentar que a
competência para analisar os citados crimes seria da Justiça Federal.
11. Para tanto, a Defesa selecionou trechos esparsos da denúncia e os editou,
maliciosamente, para fazer o Relator crer que o Parquet Estadual teria o acusado de
fraudar as licitações referentes aos contratos nº 69/2010 e 70/2010, os quais foram
pagos com verbas federais.
12. No entanto, não foi isso que ocorreu. Ao contrário, podemos verificar dos
Gabinete Des. Trindade dos Santos
24. autos que o MP-SC, ao tratar dos delitos relacionados ao Município de Ouro/SC (fls.
143/152), fez um breve apanhado, no item 11 da peça exordial, para demonstrar que
os empresários Luciano Dal Pizzol (ora paciente) e Miguel Atílio Roani se
aproximaram no Prefeito de Ouro/SC, Neri Luíz Miqueloto, e de outros servidores,
com o fim de fraudar licitações relativas a serviços de perfuração e manutenção de
poços artesianos na referida cidade. Relatou que, entre 2009 e 2013, os dois
comerciantes foram agraciados com três contratos administrativos (69/2010, 70/2010
e 84/2012), os quais totalizaram R$ 432.957,19 (quatrocentos e trinta e dois mil,
novecentos e cinquenta e sete reais e dezenove centavos).
13. Posteriormente, passou a descrever, no item 11.1 da denúncia, as
condutas de Neri Micheloto e Miguel Roani relativas aos contratos 69/2010 e
70/2010. Relatou que em 2011, Miguel, proprietário da empresa Hiddroani Poços
Artesianos LTDA, prometeu vantagem indevida de R$ 5000,00 (cinco mil reais) ao
então Prefeito de Ouro/SC, Neri, para que este praticasse atos de ofício, com o fim
de "priorizar e agilizar" (fl. 15) os pagamentos devidos à contratante. Demonstrou,
inclusive, que a entrega do dinheiro foi realizada, consoante anotação feita em
documento apreendido pelo GAECO na sede da citada empresa, durante a
"Operação Fundo do Poço".
14. Nota-se que, em nenhum momento, o Ministério Público disse que as
licitações referentes a esses contratos teriam sido fraudadas. Apenas descreveu a
prática de corrupção passiva imprópria, ao se mencionar que foi prometido um certo
montante para antecipar pagamento do valor devido.
15. Dessa forma, irrelevante o fato de os citados contratos terem sido pagos
com verba relativa à convênio celebrado com a FUNASA, porque não se está
questionando, aqui, o desvio de recursos públicos, mas sim o ato de solicitar e
receber vantagem para o agente público agilizar a liberação de pagamento regular e
devido.
16. Já no item 11.2 da exordial, o Parquet, de fato, imputa aos acusados a
prática de fraude à licitação e corrupção ativa e passiva. No entanto, nesse caso, não
houve qualquer convênio entre órgão da União e o município de Ouro/SC para o
pagamento do objeto do certame. Não se justifica, portanto, a competência da
Justiça Federal. Vejamos:
17. Relata-se que o Prefeito, Neri Luíz Miqueloto, e o Secretário da Agricultura,
Rodrigo José Neis, foram pressionados por pessoas ligadas a partidos políticos a
desviar 10% (dez por cento) das licitações realizadas no Município. Neri, então,
articulou com o Deputado Romildo Titon, para conseguir obter verba, por meio de
uma emenda parlamentar, para perfuração de poços no citado Município.
Conseguido o recurso, determinou a abertura da Licitação 045/2012 (Carta Convite
12/2012). No entanto, o vencedor (Água Azul Poços Artesianos LTDA - empresa do
ora paciente) já estava previamente escolhido, tendo havido combinações e
manipulação de preços pelas empresas convidadas. Descreveu-se, ainda, no item
11.3 da exordial, que, para conseguir o contrato, Luciano Dal Pizzol ofereceu R$
20.000,00 (vinte mil reais) aos, então, Deputado Estadual Romildo Titon, e Prefeito,
Neri Miqueloto.
18. Mais uma vez, não há que se falar em verba federal. O contrato seria pago
com recursos estaduais, oriundos da citada emenda parlamentar anteriormente
aprovada.
19. Logo, não se vislumbra nos autos, qualquer constrangimento ilegal ao
Gabinete Des. Trindade dos Santos
25. direito de locomoção do paciente.
20. Importante ressaltar, por oportuno, que o caso envolve diversos servidores
públicos, inclusive, o já afastado Presidente da Assembléia Legislativa Catarinense.
Caso se mantenha a suspensão do inquérito policial e o não recebimento da
denúncia, os diversos acusados, que hoje estão afastados dos seus cargos ou
presos, para garantia da ordem pública e conveniência da instrução criminal serão
soltos, podendo, com isso, destruir provas. Tal fato já aconteceu no passado,
conforme ficou comprovado nas interceptações telefônicas realizadas.
Ante o exposto, o parecer, salvo melhor juízo, é pela denegação da ordem,
devendo ser revogada a decisão do Relator que suspendeu o trâmite do Inquérito
Policial nº 2013.088693-6/SC e sobrestou o recebimento da denúncia, até o
julgamento final deste writ.
Assim, que a defesa do aqui agravante, encabeçada pelo Dr. Cláudio
Gastão da Rosa Filho, a mesma do também indiciado Luciano Dal Pizzol, está
atuando ao arrepio dos elementos constantes dos autos, usando argumentos
falaciosos, editando trechos esparsos da peça acusatória, promovendo, pois, um total
engodo, não é ilação nossa: é conclusão do Ministério Público Federal!
Todavia, não finalizamos por aqui!
Não, por questões de foro íntimo, de apego à Justiça, entendemos por
bem fazermos algumas considerações sobre o desenrolar da sessão do Órgão
Especial deste Tribunal em que foi submetido a julgamento o presente agravo
regimental.
Perdoe-nos o tom ácido das críticas, mas a decepção deste relator foi
por demais forte, pois, em alguns dos votos, restou nítida uma conclusão: como não
se pode ou deve fazer justiça, com a distorção da fatos em benefício do parlamentar
envolvido.
Ressalvamos, desse contexto, os votos de alguns dos julgadores
presentes que, embora não tenha acatado a tese deste relator, foram dados por
motivos jurídicos ou processuais. Exemplo desses votos que, de nossa parte têm o
maior respeito, são aqueles proferidos pelos Des. Alexandre D'Ivanenko e Cesar
Abreu, dentre outros.
Mas, proferido o nosso voto, começou a ostensiva distorção do conjunto
probante por razões que a história realizará, por certo, um julgamento infalível.
O posicionamento de reintegrar o agravante na Presidência do Poder
Legislativo Catarinense, mas de uma forma mutilada, ou seja, com a devolução de um
arremedo de Presidência, de um modo totalmente ofensivo à Casa Legiferante,
implicando numa total violação do princípio da separação dos Poderes, em razão de
redundar tal voto na drástica modificação de regras internas de um outro Poder, não
nos parece aceitável sob o ponto de vista jurídico.
Por tal entendimento, a Presidência da Assembléia Legislativa do
Estado seria restituída ao recorrente, mediante as seguintes condições: a) não
poderia ele dirimir, decidir ou despachar qualquer ato que diga respeito aos
codenunciados do presente inquérito ou a testemunhas aqui arroladas, incluindo-se o
atos de nomeação ou de exoneração da Casa Legislativa; b) a delegação ao 1.º
Gabinete Des. Trindade dos Santos
26. Vice-Presidente da Mesa, na forma do § 3.º, do art. 65, do Regimento Interno da
ALESC, todas as atribuições inerentes ao Presidente da Mesa que digam respeito a
este Inquérito, tal como o ato de receber ou de prestar informações, entregar
documentos requisitados por este Tribunal ou pelo Ministério Público.
Destarte, totalmente incoerentes os termos da sugestão contida em tal
manifestação, insista-se, acompanhado por grande parte dos componentes deste
Órgão Especial, mais exatamente por dez dos julgadores presentes à sessão de
julgamento, vez que, a grande maioria deles defendeu, em suas colocações, que não
mais haveria possibilidade ou intenção do agravante de suprimir provas, de
obstaculizar-lhe a colheita ou de destruir elementos de convicção.
Contudo, se assim se entendia efetivamente, não haveria porque, data
vênia, vedar ao recorrente que, uma vez determinado o seu retorno à Presidência do
Poder Legislativo Catarinense, externar decisões ou proferir despachos em qualquer
ato que diga respeito aos coindiciados no investigatório aqui tratado ou a qualquer
das testemunhas arroladas, incluindo-se o atos de nomeação ou de exoneração da
Casa Legislativa; e, muito menos, impor-se a delegação, à 1.ª Vice-Presidência da
Mesa, de totalidade das atribuições da Presidência que digam respeito a este
Inquérito, tal como o ato de receber ou de prestar informações, entregar documentos
requisitados por este Tribunal ou pelo Ministério Público.
São proposições, convenhamos, totalmente antagônicas e que não
observam o mínimo bom senso!
As condições contidas no voto em questão, e não propriamente o
afastamento do agravante do cargo de Presidente da Assembléia Legislativa do
Estado é que, sob o prisma político, poderia conduzir a uma crise constitucional entre
os Poderes Legislativo e Judiciário, pois essas condições, insistimos, implicam em
ostensiva modificação das normas que integram o Regimento Interno daquela Casa,
implicando em desrespeito, não só ao agravante, mas a todos os membros do Poder
Legislativo de Santa Catarina.
Como assinalou o respeitado Sérgio da Costa Ramos, em sua coluna no
Diário Catarinense de 4 de março de 2014, com a acuidade que lhe é inerente:
Processo e crise
Há um claro exagero em falar-se de "crise institucional" no caso do presidente
afastado da Assembléia Legislativa, Romildo Titon. O que há é uma denúncia do
Ministério Público e o afastamento preventivo do deputado, que poderá vir a ser réu
no caso da Operação Fundo do Poço. Órgão especial do Tribunal de Justiça decidirá
hoje se acolhe recurso de competência jurisidicional, que não entra no mérito da
denúncia. O que é incompatível é um investigado responder em nome do Poder
Legislativo questões relativas à denúncia do MP. Como a Assembléia prestaria
informações ao processo, sendo o presidente o próprio processado-
O parlamentar deveria, isto sim, afastar-se voluntariamente da presidência para
melhor se defender. Tem todo o direito à defesa e presunção de inocência, mas o
bom Direito e a boa ética, mandam fazê-lo sem implicar no processo a instituição
legislativa.
Só o corporativismo partidário não enxerga isso (grifo nosso).
Gabinete Des. Trindade dos Santos
27. Mais contundente, ainda, o registro feito pelo Jornalista Upiara Boschi,
na coluna "Moacir Pereira", veiculada no Diário Catarinense, edição de 19 de abril de
2014, p. 10, nos seguintes termos:
O respeito às instituições
Normalmente em pólos contrários no espectro ideológico, os desembargadores
Lédio Rosa de Andrade e Cesar Abreu chegaram a um raro consenso durante a
votação do recurso que pedia o retorno de Romildo Titon (PMDB) à presidência da
Assembléia Legislativa. Ambos levantaram o argumento de que era necessário
preservar a independência dos poderes para defender a volta do peemedebista ao
cargo. Também criticaram a desmoralização da classe política, com o argumento de
que não há democracia sem políticos.
Na sequencia, o desembargador Paulo Costa deu um contundente voto em
que dizia não caber à Justiça socorrer os políticos que se desvalorizam. O mesmo
magistrado lembrou que a tão citada independência dos poderes é desrespeitada
diariamente em legislativos que se curvam aos interesses dos governos - e não é
preciso determinar se municipais, estaduais ou federal, porque a situação é a
mesma.
Esse registro tardio do debate de quarta-feira entre os desembargadores que
por 11 votos a 10, decidiram manter o afastamento de Titon, é para uma constatação
maior.
Assim como no Judiciário, na classe política o afastamento do peemedebista
também tem unido a atuação de pólos contrários do espectro ideológico. De olho no
que representa o PMDB no contexto eleitoral, nenhum deputado, oposição ou
governo, ninguém ergue a voz para dizer que não aceita ter como presidente do
poder Legislativo um homem denunciado pelo Ministério Público Estadual, afastado
pelo Tribunal de Justiça, com os bens bloqueados por um juiz de primeira instância.
O respeito às instituições começa pelo respeito que as instituições tem por si
mesmas.
Porém, uma derradeira tentativa de revogar-se a decisão impugnada
verificou-se.
Como o resultado da votação ocorreu por uma margem bastante exígua
- e sabia-se isso de antemão -, manifestou-se a Presidência deste Tribunal no sentido
de que o fato de ter sido este relator o prolator da decisão atacada, o seu voto, acaso
considerado, implicaria na duplicidade de votos, em prejuízo evidente, pois, para a
defesa.
Esqueceu-se Sua Excelência, ser da essência do agravo regimental, ou
agravo interno, a validade do voto do relator, vez que há, no caso duas condições
distintas: a decisão agravada é proferida de forma unilateral pelo relator, ao passo
que o seu voto no agravo regimental é proferido em outra etapa processual: a
recursal.
Nem mesmo o fato de que, na hipótese de haver empate no julgamento,
prevalecerá o teor da decisão combatida poderá ser traduzida por duplicidade de
votos. É, apenas, uma regra ditada pelo legislador, e que, como tal, não pode ser
modificada pelo Órgão Especial ou pela Presidência desta Casa!
Mormente quando se tem que, em todos os julgamentos referentes a
Gabinete Des. Trindade dos Santos
28. agravos regimentais, feitos anteriormente - e em cada sessão do órgão especial -
inúmeros agravos regimentais são julgados, a quase unanimidade deles em Mesa, a
regra agora imposta jamais foi sequer ventilada, como também não foi observada no
referente aos agravos regimentais que, na continuidade da sessão, foram julgados em
Mesa.
Ainda assim, no entanto, a regra do jogo foi alterada para o caso
concreto, ainda que aos 45 (quarenta e cinco) minutos do 2.º tempo e isso sem
qualquer ciência deste relator, como é recomendável neste Tribunal e como exige o
respeito por qualquer dos membros deste Sodalício.
Simplesmente, de ofício, a Presidência da Casa resolveu submeter ao
Órgão Especial a matéria, em que pesem as ponderações de alguns dos seus
integrantes de que tal regra jamais tinha sido observada nos julgamentos dos agravos
regimentais e que a mesma deveria ser aplicada, então, a partir das próximas
sessões.
A intransigência, contudo, venceu, ao pueril argumento de que se o
Órgão Especial não cumpriu as disposições regimentais até aquele dia, estava
obrigada agora a cumpri-la.
Para tanto, levou-se em consideração a redação original do art. 196 do
Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina que, efetivamente, não
dava direito de voto ao relator do agravo regimental.
Esqueceu-se Sua Excelência, bem como todos aqueles que
acompanharam a posição externada, que a disposição primitiva do aludido art. 196 foi
ceifada do nosso Regimento Interno, desde o ano de 2000, quando editado o Ato
Regimental n.º 41/00, datado de 9 de agosto de 2000, publicado no Diário da Justiça
n.º 10.519, de 11-8-2000, p. 1 e 2.
Em sua exposição de motivos, referido Ato Regimental, consignava
expressamente "que, paralelamente, está sendo alterado o Regimento Interno do
Tribunal, com vistas, a exemplo do STJ, a computar o voto do relator nos julgamentos
de agravos regimentais" (grifo nosso).
Expressamente, expôs o art. 4.º do Ato Regimental em referência, que:
O art. 196 do Regimento Interno passa a vigorar com a seguinte redação:
"Mantida a decisão agravada, seu prolator apresentará os autos em mesa na sessão
seguinte, computando-se também o seu voto" (grifo nosso).
Tal texto prevaleceu até a edição, em 1 de junho de 2005, do Ato
Regimental n.º 70/05-TJ, publicado no Diário da Justiça n.º 11.684, de 7-6-2005, p. 2,
que impôs ao art. 196 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de
Santa Catarina, a seguinte redação:
Art. 196 Recebido o agravo, o relator terá prazo de 5 (cinco) dias para
reexaminar a decisão. Ratificando-a, apresentará o agravo em mesa na primeira
sessão do órgão competente.
Parágrafo único. Havendo empate na votação, prevalecerá a decisão ou ato
impugnado.
É, data vênia, a redação em vigor do art. 196 do Regimento Interno do
Gabinete Des. Trindade dos Santos
29. Tribunal de Justiça de Santa Catarina!
Certo que o art. 196 do Regimento Interno deste Tribunal é omisso
quanto a ter ou não o direito de voto.
Mas, em tal hipótese, presente essa omissão, não cabe à Presidência
da Corte apresentar à discussão e decisão do colegiado a interpretação que melhor
atenda os interesses de quem quer que seja. Não, cabe-lhe, dentro de suas
atribuições, atender estritamente o que dispõe o Regimento Interno.
E este é de clareza solar, ao dispor, em seu art. 282, que "Nos casos
omissos, será subsidiário deste Regimento o do Supremo Tribunal Federal".
E, nos exatos termos do art. 317, § 2.º, do Regimento Interno da nossa
mais alta Corte de Justiça:
O agravo regimental será protocolado e, sem qualquer outra formalidade,
submetido ao prolator do despacho, que poderá reconsiderar o seu ato ou submeter
o agravo ao julgamento do Plenário ou da Turma, a quem caiba a competência,
computando-se também o seu voto (grifo nosso).
Aliás, no mesmo sentido dispõe o art. 259 do Regimento Interno do
Superior Tribunal de Justiça, ao enunciar que:
O agravo regimental será submetido ao prolator da decisão, que poderá
reconsiderá-la ou submeter o agravo ao julgamento da Corte Especial, da Seção ou
da Turma, conforme o caso, computando-se também o seu voto (grifo nosso).
À toda evidência, pois, não era dado ao Presidente da Corte agir
discricionariamente, na tentativa de impor uma interpretação pessoal aos dispositivos
regimentais, incidindo a decisão do Órgão Especial, ao não permitir que este relator
exercesse o seu direito de voto, em ostensiva ilegalidade.
Não é assim!
Ao dispor sobre o processamento dos agravos regimentais o nosso
Regimento Interno, a exemplo do que ocorre quanto aos Regimentos Internos do
Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, trata a modalidade
recursal em causa de uma forma genérica, sem distinguir o processamento dos
agravos regimentais em matéria cível, comercial, de direito público ou criminal.
E até o eminente Presidente desta Corte tinha pleno conhecimento
disso!
Tanto é assim que, em 16 de dezembro de 2011, Sua Excelência, nos
autos do Agravo Regimental em Ação Rescisória n.º 2011.057510-9/0001.00, da
comarca de Presidente Getúlio, em que foram agravantes Erich Etzold e Manelora
Etzold, sendo agravados Guido Pfiffer e outros, não só exerceu o seu direito de voto,
mas, de forma monocrática, ou seja, sem apresentar o recurso ao órgão competente,
manteve a decisão agravada, negando provimento ao agravo regimental.
E, como assinalou o brilhante escritor norte-americano, em sua festejada
obra "O inverno de nossa desesperança":
"Quando uma luz se apaga é muito mais escuro do que se jamais
tivesse brilhado".
Arremate-se registrando que, no último dia 11 de abril, por decisão da
Gabinete Des. Trindade dos Santos
30. lavra do Dr. Luiz Antônio Zanini Fornerolli, DD. Juiz de Direito da 1.ª Vara da Fazenda
Pública da comarca da Capital, nos autos da ação civil pública por ato de improbidade
administrativa n.º 0011297-04.2014.8.24.0023, proposta pelo Ministério Público do
Estado de Santa Catarina contra Romildo Luiz Titon, Evandro Carlos dos Santos,
Luciano Dal Pizzol, Miguel Atílio Roani, Cláudio Frederico May, Juarez Atanael da
Silva, Neri Luiz Michelotto, Rodrigo José Neis, Água Azul Poços Artesianos Ltda.,
Hidroani Poços Artesianos Ltda. e Cristal Poços Artesianos Ltda., determinou a
indisponibilidade de bens do agravante, entre outros acionados, do valor de R$
2.762.649,99 (dois milhões, setecentos e sessenta e dois mil, seiscentos e quarenta e
nove reais e noventa e nove centavos).
No encerramento, de bom alvitre é que se deixe ressaltado que, embora
a medida decretada tenha determinado a suspensão das suas atividades funcionais
como Presidente da Casa Legislativa Estadual, possui o agravante em seu favor a
presunção de inocência até que seja o processo julgado; e, por conta disso, sua
remuneração não deve ser cortada, já que sua ausência no trabalho não é voluntária,
mas impingida por força de decisão judicial.
Nesse norte, acentua ainda Gustavo Henrique Badaró:
Não se trata de falta, afastamento ou licença voluntária. Ao contrário, o
funcionário foi coativamente afastado de suas funções, em processo no qual o
mesmo é presumido inocente e sem que haja declaração judicial transitada em
julgado de sua culpa. Correto, portanto, que não se efetue qualquer desconto (obr.
cit., p. 251).
À vista do exposto, conheço do agravo regimental, mas mantenho a
decisão agravada, opinando, em decorrência, pela negativa de provimento à
insurgência.
Esta é a minha manifestação.
Declaração de voto vencido do Exmo. Sr. Des. Moacyr de Moraes Lima
Filho
Trata-se de agravo regimental em inquérito policial em que foi decretada
a suspensão temporária da função de Presidente da Assembleia Legislativa então
atribuída ao Deputado Romildo Titon, em razão da garantia da ordem pública, da
conveniência da instrução criminal e da aplicação da lei penal.
No mesmo contexto e com semelhante argumentação havia sido
decretada a prisão preventiva de Luciano Dal Pizzol, Miguel Atílio Roani e Juarez
Atanael da Silva, que, todavia, foi revogada monocraticamente pelo Des. Relator,
tendo em vista a ocorrência de fato novo - suspensão do trâmite do inquérito policial e
dos autos em que ocorreram as interceptações telefônicas, decidida pelo STJ e o
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31. desaparecimento dos requisitos do art. 312 do CPP.
Por maioria de votos, negou-se provimento ao recurso, vencido este
Desembargador.
Dissenti da maioria, pois entendo desnecessário o afastamento cautelar
do cargo, determinando-se a reintegração, desde que cumpridas certas condições.
Pois bem.
Naquele caso concreto, Sua Excelência pronunciou-se pelo não
cabimento de medida tão severa, compilando argumentações objetivas que, a meu
ver, estendem-se diretamente ao ora agravante, diante da similar situação em que se
encontra.
Veja-se:
1. Um dos motivos pelos quais a citada prisão preventiva foi revogada
fundou-se na existência da -possibilidade de mudança de competência o que
acarretaria, via de consequência, a nulidade deste ato em razão de ter sido proferido
por Tribunal incompetente-.
Com efeito, eventual mudança na ordem de competência para o
julgamento do feito tornará qualquer ato decisório nulo, inclusive a suspensão cautelar
do cargo de Presidente da Mesa da Assembleia Legislativa deste Estado, de impacto
similar na ordem constitucional quanto à prisão preventiva (já revogada), se decretado
por órgão incompetente.
2. O segundo argumento, de que -o prazo para a manutenção das
prisões já se expirou, ultrapassando os 81 dias recomendáveis pela legislação
processual penal-, também alcança objetivamente o ora agravante.
A medida cautelar de afastamento do cargo (Presidente da ALESC)
iniciou em 26 de fevereiro de 2014 e, na presente data (16/4/2014), já totaliza 47 dias.
Se porventura for mantida a medida cautelar de afastamento do cargo,
estar-se-á cassando, indiretamente, cerca de 1/4 (um quarto) do seu mandato na
Presidência da Augusta Casa Legislativa.
Conquanto a decisão monocrática tenha condicionado a duração da
medida ao ato de deliberação do recebimento da denúncia, limitado a 180 dias, é fato
que tal prazo será inevitavelmente alcançado. Nada obstante isso, como se viu, a
apreciação da denúncia foi suspensa pelo Superior Tribunal de Justiça, não se
podendo, por ora, prever quando ou qual Tribunal se manifestará acerca do mérito,
formando-se uma situação processual inédita.
Ademais, se porventura, futuramente, esta Corte for declarada
competente para o julgamento do feito, deve-se considerar que: a) a denúncia conta
com aproximadamente 80 fatos, 46 acusados, com procuradores e defesas distintos;
b) que cada um terá direito à sustentação oral (no mínimo por 15 minutos); c) que já
existem questões de ordem para discutir matérias relativas à conexão, inépcia da
denúncia, dentre outras; d) que as sessões deste Colegiado são realizadas
quinzenalmente e em meio período. Assim, o prazo de 180 dias, neste caso,
inevitavelmente será ultrapassado.
Logo, levando-se em conta que o cargo do qual o denunciado Romildo
Titon foi afastado tem duração de 2 anos, a decisão de sua suspensão, por via
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32. reflexa, cassará cerca de 1/4 do mandato a ele conferido.
A título de exemplificação, em caso semelhante, a Terceira Câmara
Criminal desta Corte, ao analisar pedido de revogação de medida cautelar de
afastamento de vereadores de seus cargos políticos, sob pena de configurar
cassação antecipada do mandato, assim se pronunciou:
HABEAS CORPUS. MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO
CONSISTENTES EM AFASTAR AGENTES POLÍTICOS DO EXERCÍCIO DA
VEREANÇA. HIPÓTESE CONCRETA QUE, EM RAZÃO DO DECURSO DO
PRAZO, PODERÁ CONFIGURAR PERDA ANTECIPADA DO MANDATO.
DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL
EXCEPCIONALMENTE VERIFICADO. COMPROMISSO DOS PACIENTES EM
NÃO EXERCER NENHUM ATO QUE DEMANDE DESPESA NA CASA
LEGISLATIVA. CONCESSÃO DO PEDIDO DE ORDEM. (Habeas Corpus n.
2013.042939-6, de Correia Pinto, desta Relatoria, j. em 23/7/2013, grifou-se)
Portanto, na hipótese - tal qual se demonstrou na decisão que revogou a
prisão preventiva -, visualiza-se coação ao direito do denunciado no exercício de seu
cargo político, ao qual foi investido pelos seus pares, na Casa Legislativa deste
Estado, especialmente porque já não persistem os motivos ensejadores da medida
excepcional.
3. Nada obstante isso, os argumentos de que -d) a ordem econômica
nunca foi motivo para a decretação da prisão cautelar; e) a necessidade de se
garantir a aplicação da lei penal, pode ser atendida com a aplicação de outras
medidas cautelares diversas da prisão; f) a nova decisão acarretará maior demora na
prestação jurisdicional, sendo que os acusados em nada contribuíram para isso-
também são objetivos e, portanto, alcançam o ora agravante.
Esse ponto não comporta maiores digressões.
4. Aliado a isso, tem-se que não mais subsiste o argumento de que o
agravante poderia intervir na coleta da prova - em razão da -pendência de
depoimentos de testemunhas funcionárias do Legislativo, ocupantes de cargos
comissionados, e a situação apresentada evidentemente evidencia grave risco à
instrução criminal e à credibilidade da Justiça na condução do processo, cujo início
pende hoje do recebimento da exordial acusatória-.
Disse o Relator por ocasião da soltura de Luciano, Miguel e Juarez que
-não há risco de que venham a intervir na coleta da prova ou mesmo reiterar a
conduta criminosa haja vista que a denúncia já foi apresentada e, a princípio, as
testemunhas ouvidas-.
A garantia da instrução criminal pela hipotética intervenção na colheita
de prova - além de já estar superada, como bem exaltou Sua Exa. -, pode ser
resguardada por outras medidas, que não tão severa quanto o afastamento do cargo.
Do mesmo modo, a suposta possibilidade de -reiteração criminosa em
face de anúncio prévio de tal intenção-, também pode ser obstada por meios menos
gravosos.
Assim, considerando que a manutenção da medida está a configurar
constrangimento ilegal, o voto é para que seja substituída a cautelar de suspensão do
exercício do cargo, para que o Deputado Romildo Titon retorne às atividades de
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33. Presidente da Mesa da ALESC, porém, obedecendo às seguintes condições:
a) não poderá dirimir, decidir ou despachar qualquer ato que diga
respeito aos codenunciados do presente inquérito ou a testemunhas aqui arroladas,
incluindo-se os atos de nomeação ou de exoneração da Casa Legislativa;
b) que sejam delegadas ao 1º Vice-Presidente da Mesa, na forma do §
3º do art. 65 do Regimento Interno da ALESC, todas as atribuições inerentes ao
Presidente da Mesa que digam respeito a este Inquérito, tal como o ato de receber ou
de prestar informações, entregar documentos requisitados por este Tribunal ou pelo
Ministério Público - a fim de -evitar constrangimento ou comprometer a credibilidade-,
como afirmou o Relator - mantendo-se o agravante equidistante de tudo o que tiver
relação com o presente processo.
Considerando tais medidas suficientes, forte no poder geral de cautela
do Juiz, considerando o disposto no art. 3º do Código de Processo Penal, é de se
aplicar, por analogia, os arts. 798 do Código de Processo Civil e 79 do Código Penal,
entendendo-se desnecessário o afastamento cautelar do cargo, determinando-se a
reintegração, desde que cumpridas todas condições acima estabelecidas.
À vista do exposto, o voto é no sentido de dar provimento parcial ao
recurso.
Florianópolis, 15 de maio de 2014.
Moacyr de Moraes Lima Filho
DESEMBARGADOR
Declaração de voto vencido do Des. João Henrique Blasi
Para ser fidedigno ao voto que deduzi oralmente na sessão de
julgamento, reproduzi-lo-ei adiante, porém com a necessária revisão para adaptá-lo à
linguagem escrita.
Principio pelo exame dos fundamentos lançados pelo eminente relator,
Desembargador Trindade dos Santos, ao deferir a medida cautelar que importou no
afastamento do acusado, ora agravante, da presidência da Assembleia Legislativa.
Fundamentalmente, Sua Excelência aludiu à necessidade de
preservar-se a instrução processual e a ordem pública como requisitos autorizativos
para o afastamento que concedeu.
Contudo, tal fundamento não faz mais sentido uma vez que não há
instrução processual a ser feita, ao menos por ora, à vista da decisão do Superior
Tribunal de Justiça de suspender o trâmite da ação penal até definir qual é a instância
competente para examiná-la, - e fico muito à vontade para falar a esse respeito
porque fui o primeiro que, na oportunidade, embora acompanhando o relator, cogitei
da possibilidade de que a competência não fosse nossa, mas da Justiça Federal, à
vista do aporte de recursos da União na construção dos questionados poços
artesianos. Naquele azo, todavia, os nossos olhos estavam voltados para o Município
Gabinete Des. Trindade dos Santos