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                                   LIDERANÇA: A ADMINISTRAÇAO
                                   DO SENTIDO



       ARTIGO                                                                                 * Cecília Whitaker   Bergamini




Uma revisão da evolução histórica dos estudos e pesquisas sobre liderança
enfatiza a importância de líderes organizacionais eficazes.

A review of ihe historical eoolution of the studies and surveys on leadership strengh the
imporiance of effective organizacional leadere.

PALAVRAS-CHAVE:
Liderança, interação, poder, ÚJ-
ttuêncie, autoridade, carisma,
cultura organizacional, motiva-
ção, atitude.

KEY WOROS:
Leaders/Jip, interaction, power,
inttuence. authority, cnerism,
organizationa/ cu/ture, motiva-
tion, altitude.




, Professora do Departamento
de Administração   Geral e Re-
cursos Humanos     da EAESPI
FGV.



102                Revista de Administração de Empresas   São Paulo, v. 34, n. 3, p.102-114                 Mai./Jun. 1994
LIDERANÇA: A ADMINISTRAÇÃO DO SENTIDO



     o tema da liderança tem um forte ape-          liderança, é indispensável que se conheça
lo tanto para aqueles que dirigem como              o que veio sendo pesquisado anterior-
para aqueles que são dirigidos. Muitas              mente. É importante que se tenha em
vezes esse conceito assume uma conota-              mente os trabalhos especiais publicados
ção de "dom" mágico, responsável por                pela literatura sobre o assunto a partir do
uma espécie de atração inexplicável que             início do presente século. Conhecendo
certas pessoas exercem sobre as outras. A           como se deram as tentativas anteriores
imaginação daqueles que se envolveram               voltadas à explicação do fenômeno e do
com o assunto fez com que ele fosse in-             processo de liderança é que se poderá ca-
vestigado a partir dos mais diferentes en-          racterizar mais precisamente o mérito das
foques, trazendo à luz do conhecimento               obras divulgadas na atualidade, atribuin-
 da ciência comportamental as mais varia-            do a elas o verdadeiro grau de confiança
 das inferências.                                    que merecem receber.
     Não é de estranhar, portanto, que a pa-
 lavra "liderança" reflita conceitos aparen-         o COMEÇO DA HISTÓRIA
 temente diferentes para diferentes pessoas.
 Os pesquisadores passam, assim, a definir              Embora o termo liderança venha sendo
 liderança partindo de uma perspectiva in-           usado há aproximadamente           duzentos
 dividual, ressaltando aquele aspecto do fe-         anos na língua inglesa, Stogdill (1974)
 nômeno que lhes pareça mais significativo.          acredita que ele tenha aparecido por volta
 Devido ao grande interesse despertado               do ano 1300 da era cristã. Fiedler afirma
 pelo tema da liderança, nota-se, no mo-             que: "A preocupação com a liderança é tão
 mento atual, o aparecimento de incontá-             antiga quanto a história escrita: A república
 veis conceitos emitidos pelos pesquisado-           de Platão constitui um bom exemplo dessas
 res em comportamento organizacional, o              preocupações iniciais ao falar da adequada
 que permite afirmar: "Assim como o amor, a          educação e treinamento dos líderes políticos,
  liderança continuou a ser algo que todos sa-       assim como da grande parte dos filósofos polí-
  biam que existia, mas ninguém podia definir". 1    ticos que desde essa época procuraram lidar
      Dois aspectos parecem ser comuns à             com esse problema". 3 Isso permite dizer que
  grande maioria das definições de lideran-          a liderança tem sido investigada desde há
  ça existentes na atualidade. Em primeiro           muito e, como tal, é justo que apresente as
  lugar, elas conservam o denominador co-            mais variadas interpretações. Somente o
  mum de que a liderança esteja ligada a             conjunto de todos esses pontos de vista
  um fenômeno grupal, isto é, envolve duas           oferece a possibilidade de uma visão mais
  ou mais pessoas. Em segundo lugar, fica            abrangente a respeito do tema.
  evidente tratar-se de um processo de in-               Dentro de toda multiplicidade de as-
  fluenciação exercido de forma intencional          pectos sob os quais se estudou liderança,
  por parte dos líderes sobre seus seguido-           percebe-se que alguns teóricos preocupa-
   res. Hollander consegue abranger a gran-           ram-se em especial com aquilo que o líder
   de maioria desses aspectos propondo: "O            é, procurando retratar traços ou caracte-
   processo da liderança normalmente envolve          rísticas de personalidade que sejam os
   um relacionamento de influência em duplo           responsáveis por sua eficácia. Outros im-
   sentido, orientado principalmente para o aten-     primiram maior dinâmica quanto à con-
   dimento de objetivos mútuos, tais como aque-       cepção do líder, buscando investigar
   les de um grupo, organização ou sociedade.         aquilo que o líder faz, isto é, procuraram
   Portanto, a liderança não é apenas o cargo do      delinear diferentes estilos de liderança.       1. BENNIS, W., NANUS, B. Lí-
                                                      Um terceiro grupo de pesquisadores em           deres: estratégias para assumir
   líder mas também requer esforços de coopera-                                                       a verdadeira liderança. São Pau-
   ção por parte de outras pessoas". 2 Dentro         liderança procura analisá-la em função          lo: Harbra, 1988, p. 5.
   desse processo considera-se que, embora            daquelas circunstâncias que determinam
                                                      a eficácia do líder, buscando conhecer que      2. HOLLANDER, E. P. Leadership
   o líder seja quem geralmente inicia as                                                             dynamics - a praticai guide to
   ações, os seus seguidores precisam ser             variáveis do meio ambiente podem influir        efectíve relatíonshíps.     New
   sensíveis a ele, isto é, levá-lo em conta na-      no desenvolvimento do vínculo líder-se-         York: lhe Free Press, 1978.
   quilo que diga respeito às suas idéias e           guidor. Existe também um grupo repre-
                                                                                                      3. FIEDLER, F. A theory of lea-
   programas.                                         sentativo de teóricos que se dedicou ao         dershíp effectiveness.    New
       Embora ainda se continuem publican-            estudo das motivações subjacentes às ati-       York: McGraw-Hill Book Com-
    do trabalhos inéditos dentro do campo da          vidades de dirigir pessoas.                     pany, 1967, p. 3.


 © 1994, Revista de Administração de Empresas / EAESP / FGV, São Paulo, Brasil.                                                103
iJ!J/J ARTIGO
                                     Cronologicamente, a seqüência históri-         como os responsáveis pelos primeiros
                                  ca do estudo da liderança mostra várias           passos rumo à sistematização do estudo
                                  etapas. A teoria dos traços originou-se de        em liderança. A contribuição desses pes-
                                 pesquisas disponíveis a respeito de lide-          quisadores ficou, por assim dizer, mais
                                 rança dentro dos períodos compreendi-              restrita ao estudo do líder em si, tendo
                                  dos entre 1904-1948.Uma revisão dessas            suas pesquisas se omitido na considera-
                                 pesquisas conseguiu isolar cerca de 34             ção de aspectos ligados às circunstâncias
                                 traços de personalidade considerados               ambientais que envolvem o vínculo líder-
                                 como típicos de bons líderes. O enfoque            seguidor. Avaliando o trabalho desenvol-
                                 dos estilos de liderança aparece logo no           vido dentro desses primeiros enfoques,
                                 início da década de 50. Nesse momento,             Smith e Peterson comentam: "Esses pes-
                                 um grande esforço de pesquisa foi mobili-          quisadores em liderança agiam como se eles
                                 zado buscando saber como o bom líder              fossem alquimistas medievais à procura da pe-
                                 deve agir.                                         dra filoeofal", 5 Está subentendido nessa
                                     Essa segunda etapa da história da lide-        crítica que esses pesquisadores preten-
                                 rança inicia-se no pós-guerra, especial-           diam como que" destilar a essência" da li-
                                 mente nos Estados Unidos. Nesse mo-                derança para encontrar aquilo que pudes-
                                 mento foram criados inúmeros instru-               se distinguir os líderes como pessoas es-
                                 mentos de análise do comportamento em              peciais, diferentes, portanto, do restante
                                 liderança, representados principalmente            dos mortais.
                                 pelos questionários. Como testemunha                  Numa etapa subseqüente surgem as
                                 Guiot: "Numerosas pesquisas foram levadas a        teorias situacionais que possuem como
                                 efeito tendo em vista colocar em evidência as      principal foco de interesse o estudo do
                                 relações entre os tipos de comportamento do        comportamento contingente em lideran-
                                 líder e a eficácia de sua liderança. A hipótese    ça. A ênfase já não é mais colocada unica-
                                 subjacente, orientadora da pesquisa, é aquela     mente sobre uma variável isolada cir-
                                 que propõe ser o estilo de liderança manifesto     cunscrita à ação do líder sobre um tipo de
                                 pelo líder, o determinante do nível de desem-      atitude passiva do subordinado. De ma-
                                 penho atingido pelo grupo (ou unidade orga-       neira um pouco mais complexa, a princi-
                                 nizacional por ele comandada)".» É sabido         pal preocupação desse novo grupo de es-
                                 que nesse momento todo o esforço de               tudos será dirigida também às caracterís-
                                 pesquisa contava com ambientes onde ha-           ticas comportamentais dos liderados. Os
                                 via maior controle das variáveis.                 defensores das proposições conhecidas
                                    A liderança tem sido também estudada           como contingenciais levantam novas va-
                                 como um processo de interação que envol-          riáveis que passam a ser objeto de investi-
                                 ve trocas sociais. Sob esse aspecto, o líder é    gação. Esse posicionamento determina o
                                 visto como alguém que traz um benefício,          caráter de maior abrangência dessas teo-
                                 não só ao grupo em geral, como a cada             rias com relação às anteriores. O ambiente
                                 membro em particular, fazendo nascer              organizacional, bem como as característi-
                                 desse intercâmbio o valor que seus segui-         cas comportamentais dos seguidores, pas-
                                 dores lhe atribuem. Em troca, os membros          sa agora a fazer parte integrante do qua-
                                 do grupo devolverão ao líder seu reconhe-         dro geral das investigações voltadas ao
                                 cimento e aceitação como forma de lhe             estudo sistemático da ciência da lideran-
                                 conferir a autoridade para dirigir pessoas.       ça. Os enfoques contingenciais propuse-
                                    Dentro desse apanhado de estudos               ram que as organizações poderiam contar
                                 mais sistemáticos, alguns nomes se desta-         com bons líderes desde que lhes dispen-
                                 cam. Nas pesquisas sobre traços de perso-         sassem treinamento adequado e promo-
                                 nalidade surgem Stogdil e Mann. Lewin,            vessem um ambiente favorável onde pu-
                                 Fleshman, Coons, Likert e outros conheci-         dessem agir com eficácia.
4. GUIOT, J. M. Organisations    dos, como os pesquisadores dos grupos                 Hampton, Summer e Weber assim re-
socia/es et comportements.
Montreal: Les Éditions Agenee    das Universidades de Ohio e Michigan,             sumem a contribuição oferecida nessa
d'Are INC, 1987, p. 142.         foram os principais responsáveis pelas in-        fase do estudo da liderança: "Os três enfo-
                                 vestigações feitas em tomo dos estilos de         ques situacionais acrescentam muito à nossa
5. SMITH, R., PETERSON, M. F.
Leadership, organization and-
                                 liderança. McClellan e Minner investiga-          atual compreensão de liderança. O modelo
cu/ture. London: Sage Publica-   ram a motivação para a liderança. Todos           contingencial de Fiedler mostra que existe si-
tion, 1989, p. 11.               eles são reconhecidamente considerados            tuações favoráveis e desfavoráveis para o líder

104                                                                                            RAE. v.34 • n.3 • Mai./Jun.1994
LIDERANÇA: A ADMINISTRAÇÃO DO SENTIDO


e que alguns tipos de líderes saem-se melhor     /I A função motivacional do líder reside nas
em situações favoráveis, enquanto que outros,     crescentes recompensas pessoais dos subordi-
em situações desfavoráveis. O enfoque do ca-      nados no sentido da chegada aos objetivos do
minho-objetivo deu vida à noção de que os su-     trabalho, fazendo com que o caminho para es-
bordinados tentam ser pessoas bem-intencio-       sas recompensas se torne mais fácil de ser per-
nadas e que o líder que puder ajudá-las nesse     corrido ao deixá-lo mais evidente, reduzindo
processo terá sucesso. Finalmente, os enfoques    os bloqueios do percurso e as armadilhas, bem
de Tannembaum/Schimit        e Vroom/Yetton       como aumentando as oportunidades de satis-
mostram como realmente podem ser comple-         fação pessoal em curso", 7 O papel do líder,
xas asforças que estão em jogo na tentativa do   conforme o enfoque do caminho-objetivo,
líder em adequar seu comportamento à situa-      caracteriza-se  como aquele de agente a
ção",>  Com isso, maior profundidade        é    quem cabe desbloquear      a força motiva-
acrescentada ao estudo da liderança.             cional contida no interior do seguidor.
    Se, para as colocações teóricas iniciais,
o traço de liderança era inato, agora, com
os teóricos da contingência, essa caracte-
rística pode ser desenvolvida. Instala-se, a
partir desse novo enfoque, a crença de
que qualquer um pode ser um bom líder,
basta que seja preparado      para tanto. A
partir desse momento é que começa a sur-
gir um grande número de programas de
treinamento e desenvolvimento      em lide-
rança, avidamente consumido pelas orga-
nizações empresariais do mundo todo.

LIDERANÇA COMO SINÔNIMO DE MOTIVAÇÃO

    Devem existir razões muito especiais
que justifiquem o crescente interesse de
pesquisadores e autores a respeito da ine-
vitável união entre aqueles pontos co-
muns que interligam a dinâmica motiva-              A contribuição feita pelas teorias que
cional e a eficácia da liderança. Esses dois     ressaltaram a importância da motivação
termos, a partir de um determinado mo-           dentro do processo de liderança é inesti-
mento, parecem definitivamente       unidos      mável. Já foi possível perceber que, na
na teoria e na prática por uma relação de        busca da eficácia, não cabe ao líder moti-
causa e efeito.                                  var seus seguidores. Quando aceitam um
    Em 1964, Hollander      propõe a teoria      novo emprego, as pessoas, em geral, es-
das trocas, destacando como importante           tão cheias de esperanças e acalentam ex-
fator de eficácia na liderança o equilíbrio      pectativas, sendo, por isso, depositárias
que deve ocorrer entre as expectativas de        de um rico manancial de motivação. O
um subordinado      e as respostas compor-       potencial sinergético contido nas necessi-
tamentais oferecidas por seu líder. Isso         dades motivacionais constitui um reper-
sugere que a aceitação de um líder será          tório básico de forças pessoais que é ine-
tanto maior quanto mais ele for conside-         rente a cada um. Desconhecer essa fonte
rado como facilitador da consecução da-          natural de motivação representa um im-
queles objetivos almejados pelos seus su-        pulso fatal rumo à desmotivação. Ignorar           6. HAMPTON, D. R., SUMMER,
bordinados.                                      essa predisposição    natural é como assu-         C. E., WEBER, R. A. Organizatio-
    Concomitantemente      House e Mitchel       mir a filosofia taylorista que preconiza a         nal behavior and pratice of ma-
                                                                                                    nagement. USA: Sccot Fores-
propõem a teoria caminho-objetivo, a par-        indolência natural do ser humano.
                                                                                                    man and Company, 1978, p.
tir da qual o líder não somente deve co-            Ao descobrir que a motivação repre-             615.
nhecer os objetivos almejados por seus           senta um elemento-chave à eficácia do lí-
subordinados,     como também desempe-                                                              7. HOUSE, R. J. A path-goal
                                                 der, entende-se que, talvez, o maior de to-
                                                                                                    theory of leader etteciiveness.
nha o papel de facilitador do percurso até       dos os desafios que ele enfrenta seja in-          USA: Adminlstrative     Science
esses objetivos. O próprio House afirma:         viabilizar o processo de degenerescência           Quartely, 1971, p. 324.


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     ARTIGO


                                     do potencial da sinergia motivacional.        tores complementares de satisfação des-
                                    Pode-se perceber, através desse novo en-       sas necessidades, poderá então ser consi-
                                    foque, que o ingênuo" chefe" esteja inva-      derado como um importante agente na
                                    riavelmente à procura de regras para mo-       construção de climas mais favoráveis de
                                    tivar seu novo funcionário, enquanto o lí-     trabalho.
                                    der eficaz estará atento para que a rique-        Kouzes e Posner deixam bem evidente
                                    za contida nas necessidades de cada um         a ligação entre liderança e motivação
                                    não seja drenada e se perca, talvez para       quando propõem: "A motivação absoluta a
                                    sempre.                                        motivadores extrínsecos limita severamente a
                                       Cada vez com maior freqüência, os au-       habilidade de uma organização ultrapassar-se.
                                    tores contemporâneos mostram-se unâni-         Ela limita a habilidade dos gerentes de usar o
                                    mes ao enfatizar a necessidade de se ter       potencial integral dos empregados. Desperdiça
                                    clara a diferença entre o comportamento        o talento humano e drena os recursos organi-
                                    simplesmente condicionado por motiva-          zacionais. É certo que se deva pagar aos em-
                                    dores extrínsecos ao indivíduo e aquele        pregados com justiça e oferecer benefícios
                                    que tipifica as ações do empregado real-       eqüitativos. Isso, definitivamente, está fora de
                                    mente motivado. A motivação intrínseca         cogitação. Todavia, a ênfase sobre incentivos
                                    orienta cada um na busca daquilo que é         externos e pr.essões constrange as pessoas. Isso
                                    valorizado pelas suas predisposições in-       não as libera para darem o melhor de si. Cons-
                                    ternas. Ao considerar a liderança como si-     trange também os gerentes em conseguir
                                    nônimo de motivação, o líder percebe          aprender como conseguir que os outros quei-
                                    esse claro divisor de águas no fluxo das       ram fazer aquilo que necessita ser feito. E,
                                    ações humanas. Muito daquilo que se tem       caso não se consiga aprender a conseguir que
                                    produzido na literatura atual em admi-        as pessoas queiram, nunca se poderá liderá-
                                    nistração aponta como praticamente in-        las". 8 Não há dúvida que liderar sendo
                                    viável liderar sem distinguir o comporta-     capaz de conhecer, valorizar e satisfazer
                                    mento estimulado de fora para dentro das      os apelos vindos das necessidades interio-
                                    ações emitidas pela força das pulsões mo-     res exige muito maior perícia do que ma-
                                    tivacionais interiores.                       nipular prêmios e castigos disponíveis no
                                       Aqueles que acreditam que se possa         ambiente da empresa.
                                   motivar as pessoas estão partindo do               Os teóricos da motivação intrínseca
                                   pressuposto de que elas devam ser chefia-      destacam a importância da percepção no
                                   das e não lideradas. Isso estabelece um        processo de satisfação dos desejos interio-
                                   importante diferencial entre o clássico        res, embora considerem, tanto um quanto
                                   chefe, que, por força da sua autoridade        outro, como elementos pertencentes ao
                                   formal tem recursos para distribuir prê-       mundo subjetivo. "Uma vez que a satisfação
                                   mios e punições ao acaso, e o verdadeiro       envolva a interação entre a pessoa e seu am-
                                   líder. Este último percebe com clareza         biente, sua valorização liga-se, em parte, à na-
                                   que o mundo exterior, cheio de benefícios      tu reza objetiva do mundo exterior da pessoa.
                                   e restrições, não tem sentido para o indi-     A satisfação depende de ambos, a forma real
                                   víduo. Aquilo que qualificará tais elemen-     do mundo ser e como essa realidade é percebi-
                                   tos como verdadeiros prêmios ou castigos       da pela pessoa"." A percepção exerce, as-
                                   reais é o tipo de carência existente, naque-   sim, função importante na valorização
                                   le momento, no interior de cada um. Por        dos traços do meio ambiente, mas para
                                   exemplo, o prêmio de um trabalho mais          tanto, retira dos desejos não satisfeitos as
                                   complexo só é visto como tal pela pessoa       informações necessárias para atribuir sen-
                                   que sinta real necessidade de livrar-se da     tido ao mundo objetivo.
8. KOUZES, J. M., POSNER, B.
Z. O desafio da liderança -        aborrecida rotina de tarefas repetitivas. A
como conseguir feitos extraor-     motivação está, portanto, contida nas ne-      LIDERANÇA COMO ADMINISTRAÇÃO DO
dinários em organizações. Rio      cessidades de cada um. Sendo assim, ao         SENTIDO
de Janeiro: Campus, 1991, p.
34.                                se aceitar que a motivação seja sinônimo
                                   de necessidades, só se conseguirá traba-         Considerando liderança e motivação
9. ALDERFER, D. P. Existence,      lhar com pessoas realmente motivadas           como dois assuntos tão entrelaçados, é
relatedness and growth - nu-
man needs in organizational        caso se tenha suficiente sensibilidade para    possível concluir que guardam uma liga-
settings. London: Collier-McMil-   conhecer tais necessidades. Se além de co-     ção de parentesco forte entre si, a ponto
lan, 1972, p. 8.                   nhecê-las o líder for capaz de oferecer fa-    de serem considerados como sinônimos.

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LIDERANÇA: A ADMINISTRAÇÃO DO SENTIDO


    Assim, a figura do líder toma novo aspec-           ta por Tack: "Os gerentes, muitas vezes, ge-
    to, como propõe Pondy: "A eficácia do líder         renciam departamentos, gerenciam pessoas,
    repousa na sua habilidade de tornar uma ativi-     mas não as lideram. A liderança eficaz os mo-
    dade significativa para aqueles que estão nesse    tiva voluntariamente, e esta é a palavra-chave,
    conjunto de papéis - não é mudar comporta-         a dedicarem suas mentes e atributos físicos
    mentos, mas dar aos outros o senso de com-         para um objetivo maior". 12 Para o autor é
   preensão daquilo que estão fazendo e especial-      axiomático que o valor da boa liderança
    mente articulá-los para que possam comunicar-      esteja com freqüência esquecido, para que
   se sobre o sentido do comportamento deles (...).    o valor da boa administração seja, guase
   Essa dupla capacidade, dar sentido às coisas e      que inevitavelmente, enaltecido. E por
   colocá-las em linguagem significativa para um       isso que para ele gerência e liderança não
   grande número de pessoas, dá ao líder enorme        são necessariamente parentes, embora
   alatancagem"." Para administrar o sentido           acredite que a liderança seja sinônimo de
   que as pessoas dão ao trabalho que fazem,           motivação.
   é necessário conhecer como suas necessi-
   dades motivacionais o valorizam.
      Durante muitos anos, a forma pela
   qual os candidatos a cargos de chefia, ge-
   rência ou administração foram escolhidos
                                                                      '(1:
  baseou-se em padrões que pouco tinham
                                                              1íd4i1!: .será tanto maior
  a ver com o futuro papel de liderança a
  ser desempenhado por essas pessoas. As-
                                                                                    '"   "
                                                                qúantdm,ais ele for                 1*
  sim sendo, a realidade atual das organiza-                     ..          .'..            'tt'
  ções empresariais brasileiras acusa uma
                                                                tons"iderado como
  ausência marcante daqueles que, no exer-
  cício de tais cargos, poderiam ser qualifi-
                                                           facilifador'tJê· consecação
  cados como verdadeiros líderes. Por ou-
  tro lado, os programas de treinamento e
  desenvolvimento dos novos chefes foram
  principalmente planejados para oferecer
  pesadas doses de conhecimentos técnicos
  e administrativos e muito pouco era men-
  cionado sobre aquilo que dizia respeito ao
 processo de interação pessoal no contexto                 Em que pese as diferenças individuais
 da liderança. Sem os cuidados necessá-                entre o líder e seus seguidores, é pela
 rios, instaurou-se em pouco tempo um                  consciência dessas diferenças que a ação
 clima de desmotivação generalizada.                   do líder reconhecidamente eficaz faz sen-
     Conseguir que a motivação não desapa-             tir a importância da sua presença. Sob
 reça é fazer com que se continue vendo                esse aspecto, o líder sabe que pode contar
 sentido naquilo que se está fazendo no                com as necessidades interiores originárias
 trabalho, como salienta Sievers ao propor             da busca de realização pessoal e da pre-
 que "a motivação só passou a ser um tópico-           servação da auto-imagem daqueles que
 tanto para as teorias organizacionais, quanto         aceitam ser dirigidos por ele. Essas pre-
para a organização do trabalho em si - quando          disposições naturais são interpretadas
o sentido do trabalho desapareceu ou então foi        pelo líder como "forças que organizam nos-             10. SMITH, P., PETERSON, M.
perdido (...) Como conseqüência, as teorias mo-                                                              F. Op. cit., p. 10.
                                                      sas percepções, julgamentos e ações para atin-
tivacionais se têm transformado em sucedâ-            gir a competência. A existência de um estado           11. SIEVERS, S. Além do suce-
neos do sentido do trabalho". 11 O desapareci-        de necessidades pressupõe que haja uma con-            dâneo da motivação. In: SER·
mento desse sentido pode ser atribuído                                                                       GAMINI, C., CODA, R. Psicod»
                                                      dição a ser preenchida. Todos têm necessida-           nâmica da vida organizacional:
principalmente ao descaso das organiza-               des complexas que pedem satisfação e que são           motivação e liderança. São Pau-
ções quanto à motivação para o trabalho.              a expressão das personalidades nas quais exis-         lo: Biblioteca Pioneira de Acmi-
     A maioria daqueles que ocupam cargos                                                                    nistração de Negócios, 1990, p.
                                                      tem. A ampla gama de comportamentos hu-                117,
que deveriam ser preenchidos por líderes              manos é composta de múltiplos padrões de ne-
nem mesmo acredita que para trabalhar                 cessidades. Interpretar esses padrões indivi-          12. TACK, A. A liderança moti-
seja necessário estar motivado. O panora-                                                                    vacional. São Paulo: Siamar,
                                                      duais é um dos desafios para compreender e             Serviço Cultural Interamericano
ma organizacional lembra a descrição fei-             aceitar as diferentes necessidades das pessoas e       e Editora ttda, 1989, p. 26.

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    ARTIGO


                                   pode abrir um longo percurso no sentido de        zão de ser é identificar e responder às necessi-
                                   apreciá-las bem como resolver dificuldades ad-    dades manifestas ou latentes dos consumido-
                                   ministroiioas"." A utilização dos recursos        res. O administrador levará em conta, princi-
                                   pessoais de cada um envolve aquele apro-          palmente, os recursos disponíveis dentro da
                                   veitamento produtivo que se possa fazer           empresa e as oportunidades ou ameaças exis-
                                   das diferenças individuais características        tentes em um determinado mercado. Na outra
                                   dos estilos comportamentais. Esse uso im-         extremidade, o líder, no entanto, apresenta-se
                                   plica como se percebe e se configura o            como uma pessoa que dirige e inicia a empre-
                                   mundo à volta de cada um, como se che-            sa, centrada, antes de mais nada, em sua visão
                                   ga ao sentimento de identidade, satisfa-          pessoal. Este indivíduo reagirá de acordo com
                                   ção e competência pessoal, além de como           a sua realidade interior, pro-agindo posterior-
                                   se capitalizam sobre as forças pessoais           mente em um ambiente ou em determinado
                                   para lidar com situações conflitantes -           mercado. Isto pode implicar - e geralmente
                                   nisso reside a essência básica da adminis-        implica - que o líder acabe levando menos em
                                   tração do sentido.                                conta os recursos disponíveis, ou então, que
                                       Propondo que o líder tenha oportuni-           inicie ou leve a efeito as mudanças necessárias
                                   dade de administrar o sentido que as pes-          no ambiente ou em determinado mercado. O
                                    soas dão ao seu trabalho em particular e à        modo de estruturação é freqüentemente mais
                                    organização como um todo, aceita-se seu           orgânico, mais centrado na pessoa do próprio
                                   poder de interferir junto à cultura organi-        líder, menos regulamentado e hierarquizado.
                                    zacional. Esta maneira de conceber a lide-        Utilizando a tipologia elaborada por Reisman
                                    rança reclama não somente a inclusão dos          (1964), Zalesnick e Ketz de Vries (1975), há
                                    seguidores, como também dos pares e su-           de um lado o dirigente heterodeterminado (ou
                                    periores, pois muito raramente o sentido          extradeterminado), que corresponde ao concei-
                                    percebido pode ser definido de maneira            to de administrador e, de outro, o dirigente in-
                                    unilateral. Isso pode ultrapassar os limites      tradeterminado, representando aqui a defini-
                                    da vida consciente, como coloca Burns:            ção adotada de líder". 15 De maneira mais
                                    "Mas o processo fundamental, um pouco mais         ampla, o administrador parece fazer uso
                                    amplo, é, em larga escala, tomar consciente       mais intenso dos processos racionais, en-
                                    aquilo que permanece inconsciente em seus se-      quanto o líder, na maior parte do tempo,
                                    guiâores"." A eficácia do líder, enquanto          nutre-se da sua própria intuição.
                                    administrador do sentido e conseqüente-               Esclarecer as diferenças entre os tipos
                                    mente agente de mudança, apóia suas ba-            de ações administrativas e de liderança
                                    ses no profundo conhecimento não so-               tem sido alvo de destaque por parte de
                                    mente do contexto cultural da organiza-            importantes autores em administração,
                                    ção, mas também na sua habilidade inter-           como foi recentemente publicado por
                                    pessoal em conhecer aqueles que depen-             Bennis:
                                    dem dele, facilitando sua chegada até a
                                     auto-realização.                                 • "o gerente administra; o líder inova;
                                                                                      • o gerente é uma cópia; o líder é original;
                                    ADMINISTRADORES E LíDERES                         • o gerente focaliza-se em sistemas e estrutu-
                                                                                         ras; o líder focaliza-se nas pessoas;
13. BENFARI, R., KNOX, J. Un-          Embora o pensamento leigo nem sem-             • o gerente tem uma visão a curto prazo; o lí-
derstanding your management         pre o admita, é importante que se ressalte           der tem a perspectiva do longo prazo;
sty/e - beyond the Meyers-          a diferença já sacramentada por muitos            • o gerente pergunta como e quando; o líder
Briggs type indicators. USA: Le-
xington books, 1991, p. 25.         autores no tocante ao que se entende por             pergunta o que e por quê;
                                    líderes e administradores. Lapierre coloca        • o gerente tem seus olhos sempre nos limites;
14. BURNS, J. M. Leadership.        essa distinção nos seguintes termos:                 o líder tem seus olhos sempre nos horizon-
New York: Harper & Raw Pu-
blishers, 1978, p, 40.              "Numa extremidade do contínuo, o adminis-            tes;
                                    trador é caracterizado como uma pessoa que        • o gerente limita; o líder dá origem;
15. LAPIERRE, L. Imaginário,        reage, sobretudo em resposta à situação exte-     • o gerente aceita o status quo; o líder o de-
Administração e Liderança. In:
BERGAMINI, C., CODA, R. Op.         rior. Trata-se de alguém que dirige uma em-          safia;
cit. p. 129.                        presa (aqui considerada na acepção mais am-       • o gerente é o clássico bom soldado; o líder é
                                    pla do termo) de maneira a procurar eficiência       a própria pessoa;
 16. BENNIS, W. On becaming a
 /eader. New York: Reading Ass.,    e eficácia dentro de uma estrutura interna or-     • o gerente faz certo as coisas; o líder faz as
 Adilson Wesley, 1989, p. 45.       denada, regulamentada e hierarquizada. A ra-         coisas certas". 16

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LIDERANÇA: A ADMINISTRAÇÃO     DO SENTIDO


   Diferentemente do administrador que          de erro grosseiro confundir ou pressupor
necessita de grande quantidade de conhe-        que toda pessoa em posição de direção na
cimentos técnicos e administrativos, o lí-      empresa seja, necessariamente, líder.
der eficaz se louva, antes de mais nada, no
seu próprio autoconhecimeto como ponto          TRANSAÇÃO E TRANSFORMAÇÃO
de partida para o desenvolvimento da sua
habilidade interpessoal. Essa característica        Embora apresentada em 1978, a teoria
não só provê os líderes de controle inter-       de Bums que distingue dois importantes
no, como também os habilita a não proje-         aspectos da liderança ainda é pouco conhe-
tar nos seguidores e nas situações que ge-       cida, especialmente dentro das empresas
ralmente enfrenta distorções da realidade        brasileiras. Como propõe textualmente:
próprias à sua maneira pessoal de ser.           "Tratarei a liderança como algo distinto do
   Freqüentemente se vê destacado o fato         mero detentor de poder e oposto à força bruta.
de a influência que pode                                            Serão identificados dois tipos
exercer um líder fluirá tanto                                       básicos de liderança: a transa-
mais facilmente quanto                                                cional e a transformacio-
mais apto ele esteja em                                                     «a:» Essa diferen-
apoiar suas ações no co-                                                    ciação não deve ser
nhecimento tão próxi-                                                       considerada como
mo quanto possível das                                                     uma simples sutileza
crenças, valores e ex-                                                     semântica, mas como
pectativas dos seus se-                                                    uma importante se-
guidores. Apoiando-se                                                     paração entre duas fi-
nesse conhecimen-                                                         losofias frontalmente
to, ele terá capaci-                                                           discordantes em
dade de facilitar                                                              termos da teoria e
as pessoas        a                                                            da prática admi-
atingirem     seus                                                            nistrativa.
próprios objeti-                                                                  Os estudos de
vos. Tal predispo-                                                            [ames McGregor
sição pode impli-                                                             Burns inspiraram
car eventualmente mudanças no próprio            diferentes autores como, por exemplo,
contexto da cultura organizacional. Fre-         Smith: "Na liderança transacional, uma troca
qüentes pesquisas mostram que os líderes         ocorre entre o líder e o seguidor. A troca pode-
mais favoravelmente avaliados são aque-          rá ser econômica, política ou psicológica, mas
les que possuem mais ampla abrangência           não existiria ligação duradoura entre as partes.
de influenciação, o que necessariamente          Essa troca continua somente à medida que am-
inclui superiores e colaterais. Kouzes e         bas as partes acham que isso vem em benefício
Posner afirmam: "As pessoas preferem traba-      próprio. Tais relacionamentos de troca são di-
lhar para gerentes que sejam influentes para    fundidos em muitas organizações de trabalho,
cima e para fora. Os líderes de sucesso sabem    nas quais os subordinados concordam em acei-
que é necessário e importante fazer os outros    tar a liderança por parte dos líderes específicos
saberem o que podem e usam seu poder para        em bases de seu emprego remunerado". 19 Esse
conseguir que completem seu trabalho". 17 O      tipo de liderança aproxima-se muito mais
poder de influência, paradoxalmente, nas-        das formas de comportamento anterior-
ce da percepção e do respeito às caracte-        mente caracterizadas como condicionan-
rísticas individuais daqueles que circun-        tes. Seguindo essa estratégia, o típico ad-
dam o líder.                                     ministrador consegue manter o subordi-
   Os gerentes e administradores, de uma         nado preso a si pelo poder formal que
forma geral, nem sempre apresentarão             possui, habilitado, por ele, a oferecer van-
atributos comportamentais que os caracte-        tagens. Trata-se, nesses casos, de uma               17. KOUZES, J. M., POSNER, B.
rizem como líderes eficazes. Isso também         transação pura e simples, envolvendo, na             Z. Op. cit., p. 117.
equivale a dizer que verdadeiros líderes,        maioria das vezes, benefícios de caráter
                                                                                                      18. BURNS, J. M. Op. cit., p. 4.
na maioria das vezes, podem não possuir          extrínseco. O poder exercido pelo supe-
características gerenciais ou de adminis-        rior, enquanto líder transacional, desapa-           19. SMITH, P., PETERSON, M.
tradores. Portanto, trata-se de uma espécie      recerá à medida que não for mais detentor            P. Op. cit., p. 115.


RAE. v.34 • n.3 • Mai./Jun.1994                                                                                                 109
i1~~
   ARTIGO


                                   da prerrogativa de conceder benefícios ou           mundo de trabalho. É esse mundo que se
                                   infligir punições.                                  consubstancia e materializa o principal fa-
                                       Dentro de uma perspectiva nitidamen-            tor de satisfação das necessidades de se-
                                   te oposta, o próprio Bums se refere à lide-         gurança daqueles que vivem na sociedade
                                   rança transformadora propondo: "A lide-             industrial contemporânea.
                                   rança transformadora é uma necessidade exis-            Confrontado pelas diferentes solicita-
                                   tente ou solicitação de um seguidor potencial.      ções oriundas desses dois mundos, inte-
                                   Mas além disso, o líder transformacional pro-       rior e exterior, na maioria das vezes o in-
                                   cura motivos potenciais nos seguidores, pro-        divíduo é levado a questionar a validade
                                   cura satisfazer necessidades de alto nível e as-    daquelas crenças que nele já se achavam
                                   sume o seguidor como uma pessoa total. O re-        enraizadas. Nesse processo, não raro as
                                   sultado da liderança transformacional é o rela-     pessoas podem acabar sucumbindo dian-
                                   cionamento de estímulo mútuo e a elevação           te da necessidade de fazer uma opção
                                   que converte os seguidores em líderes (... )".20    pessoal em favor de apenas uma dessas
                                   Neste caso, está implícita a existência da          propostas que lhe parecem dissonantes,
                                   grande sensibilidade com relação aos de-            senão até mutuamente excludentes. Surge
                                    sejos e necessidades dos seguidores.                a necessidade de distanciar-se do proble-
                                        Pela própria definição, o líder trans-         ma para poder vê-lo por inteiro e por isso
                                    formacional exemplifica com suas ações              cada pessoa sai à busca de uma terceira
                                    o verdadeiro modelo motivacional de re-             opinião. É nessa oportunidade que o líder
                                    lacionamento interpessoal. Supõe-se en-             pode administrar o significado das op-
                                    tão que o líder eficaz conheça as autênti-          ções com as quais se defronta o seu segui-
                                    cas necessidades dos seus seguidores, es-           dor. Não se pode, no entanto, confundi-lo
                                    tando, assim, em condições de interferir            com a figura de pai, terapeuta ou conse-
                                    com maior acerto ao facilitar a satisfação          lheiro, embora esses personagens também
                                    motivacional.                                       possam ser, à sua maneira, líderes espe-
                                        A liderança transformacional propõe             ciais. Ao assumir o papel que lhe é pró-
                                    que a influência ocorra em dupla direção            prio, o líder natural aparece como alguém
                                    para que se estabeleça o clima de respeito          que está apto a equacionar as duas reali-
                                    ao outro enquanto pessoa integral. É da             dades existentes no mundo e na vida pes-
                                    convivência com o seguidor que o líder re-          soal de cada um, naquilo que tanto um
                                    tira a maior fonte de informações de que            como outro possuem de fantasias, de ima-
                                    necessita para o exercício do seu papel;            ginário e de simbólico.
                                    portanto, não somente o influencia como                 Não somente Bums, mas quase todos
                                    também é influenciado por ele, como diz o           os teóricos defensores dos enfoques con-
                                    próprio Bums: "Líderes reais, líderes que en-       tingenciais em liderança são unânimes
                                    sinam e são ensinados por seus seguidores -         em afirmar que líderes e seguidores exer-
                                    adquirem muitas das suas habilidades na expe-       cem papéis ativos na transformação e mu-
                                     riência do dia-a-dia, no treinamento em situa-     dança organizacional. Essa proposição co-
                                     ção de trabalho ao liderarem com outros líderes    meça com Hollander e a teoria das trocas.
                                     e seguidores".21 Colocando-se praticamente         Isso fica também evidente no modelo de
                                     no papel de parceiro do liderado, o líder          Fiedler ao ressaltar que há condições es-
                                     não necessita de sua autoridade formal, o          peciais que asseguram a eficácia do líder.
                                     subordinado voluntariamente o segue                 Igualmente, os pontos de. vista da teoria
                                     pelo vínculo tipicamente afetivo que se es-         caminho-objetívo de House e Mitchel rati-
                                     tabelece entre os dois.                             ficam a hipótese de que o líder tem papel
                                         Devido a uma série de contingências             decisivo na conciliação daqueles objetivos
                                     dos mais diferentes tipos, o ser humano             eleitos pelos subordinados e aqueles pro-
                                     sozinho tem mostrado uma espantosa vul-             postos ou implícitos à cultura organiza-
                                     nerabilidade quanto ao seu equilíbrio pes-          cional. Para o conjunto desses teóricos,
                                     soal. Quando ele adota caracteristicamen-           ater-se ao estudo do líder simplesmente é
                                     te uma atitude indefesa, a desorganização           questionável e precário. Assim como os
                                     intrapsíquica ocorre, principalmente fren-          seguidores precisam forçosamente conhe-
                                     te a solicitações conflitantes vindas, de um        cer as intenções dos líderes, esses líderes;
20. BURNS, J. M. Op. cit., p. 4.
                                     lado, do seu mundo interior e de outro, do          por sua vez, encontram-se diante da con-
21. Idem, ibidem, p. 169.            mundo em que vive, em especial do seu               tingência de considerar atentamente os

110                                                                                                 RAE. v.34 • n.3 • Mai./Jun.1994
LIDERANÇA: A ADMINISTRAÇÃO DO SENTIDO


 propósitos delineados pelos seguidores.               A possibilidade de interferir na cultu-
 Alguém só se deixará liderar por pessoas          ra da organização confere ao líder quali-
 a quem qualifique favoravelmente. Isso            dades carismáticas que o torna mestre da
 permite afirmar que o líder depende da            mudança, inspirando as pessoas a corre-
 aquiescência do seguidor para exercer so-         rem riscos pelo fato de possuir acentua-
 bre ele qualquer influência. Portanto, an-        do senso de oportunidade estratégica.
 tes de mais nada, a eficácia do processo          Conger, no entanto, propõe que esse tipo
 tem que se louvar na autorização explícita        de ação do líder carismático pode se per-
 ou implícita do liderado.                         der, caso as organizações não ofereçam
                                                   condições favoráveis às mudanças. NA
 CULTURA, CARISMA E PODER                          grande tragédia da administração atualmente
                                                   é a falta de liderança em muitas de nossas or-
    Dentro desse contexto de influência mú-
 tua é que o líder desempenha também um
 importante papel junto à cultura organiza-
 cional. Diferentemente dos administrado-                       o§ gerentes e
 res e dos consultores externos, aqueles que
 assumem papéis de liderança conseguem
                                                           adp1iQistraaores, no
 mudar a cultura organizacional devido ao
 profundo conhecimento que têm dela. Em-
                                                            geral, nem, sempre
 bora de maneira lenta, a ação empreendi-
 da por eles modificando o status quo se fará
                                                      apresentam         características
 sentir de forma profunda e duradoura.
    Teóricos e pesquisadores da atualidade            &             z      ~     .
                                                     , comportamentals               que os
 enfatizam cada vez mais insistentemente
 que a cultura organizacional seja, na sua
 essência, o conjunto de realidades social-
 mente construídas. Esse enfoque admite
 que os significados a ela atribuídos estão
 muito mais nas cabeças e mentes dos seus
membros do que explicitadas em conjun-
tos concretos de regras ou formas especí-          ganizações. Devido à escassez de boa lideran-
 ficas de relacionamento. Os aspectos mui-          ça, a maioria de nós supõe que ela seja algo
to mais caracteristicamente operacionais            que poucas pessoas podem exercer. No entan-
são o reflexo daquilo que se encontra den-          to, o potencial para liderar encontra-se laten-
tro do pensamento comum, como propõe                te em muitos de nossos administradores,
Morgan: "A estrutura organizacional, re-           mais do que julgamos. A liderança não é uma
gras, políticas, objetivos, missões, descrições    habilidade mágica limitada a uns poucos. Na
de cargos e procedimentos operacíonais padro-      verdade, a capacidade e o desejo de liderar
nizados desempenham igualmente uma fim-            com freqüência se perdem por falta de opor-
ção interpretativa. Isso porque atuam como         tunidade e pouco investimento nos processos
pontos primários de referência devido à ma-        e recompensas que incentivam o seu cresci-
neira pela qual as pessoas pensam neles e dão      mento. Assim, é uma questão de extrair, de-
sentido aos contextos nos quais trabalham.         senvolver e fomentar essas capacidades laten-
Embora tipicamente vistos entre as caracterís-     tes. Contudo, muitas organizações, o mais
ticas mais objetivas de uma organização, uma       das vezes, fazem o oposto, ativamente deses-
visão representada enfatiza que eles são artifí-   timulando as qualidades de liderança com
cios culturais que ajudam a esboçar a realida-     sua negligência e preocupação com a 'admi-
de habitual dentro de uma organização". 22         nistração' e preservação do status quo. O
Isso permite concluir que cada aspecto in-         preço que pagam é uma grande perda de po-
tegrante do todo organizacional conserva           tencial de liderança e, por sua vez, de eficácia
                                                                                                      22. MORGAN, G. Images of 0[-
uma respeitável dose de significado ima-           organizacional,     que jamais se materiali-       ganization. London: Sage Publi-
ginário e implícito que pode ser entendi-          zam".23 Talvez, por isso, na maioria das           cations, 1986, p. 132.
do como o sentido dado à realidade que             organizações se tenham dificuldades de
                                                                                                      23. CONGER, J. A. Líder caris-
é, por sua vez, compartilhado por todos            assistir mudanças organizacionais con-             mático. São Paulo: Makron
os integrantes dessa cultura.                      duzidas por verdadeiros líderes.                   Books, 1991, p. 167.

RAE.   v.34 • n.3 • Mai./Jun. 1994                                                                                            111
i1~[J
    ARTIGO


                                    Aceitar que os administradores qualifi-   isso, invadidos em suas individualidades
                                cados como verdadeiros líderes possam         ou ameaçados em sua auto-estima. O vín-
                                influenciar na mudança da cultura orga-       culo da liderança é assim visto como um
                                nizacional pelo fato de conhecerem as         relacionamento de duplo sentido e feito
                                conseqüências simbólicas de suas ações        em pé de igualdade sem que a ação de
                                não é admitir que sejam capazes de mani-      um jamais pressuponha a passividade do
                                pular a realidade das pessoas ou das or-      outro. Os autores, em geral, concordam
                                ganizações através dos valores por ele        que o carisma seja uma qualidade atribuí-
                                promovidos. É possível construir ou mo-       da ao líder pelos subordinados e não uma
                                dificar a realidade, mas sempre e em últi-    característica inerente à sua personalida-
                                ma análise, será essa realidade que ditará    de. "Acredita-se que o carisma seja resultado
                                as linhas mestras das ações organizacio-      das percepções que os seguidores têm sobre as
                                nais que não necessariamente seguem o         qualidades e comportamentos dos líderes. Es-
                                curso da própria escolha do líder.            sas percepções são influenciadas pelo contexto
                                    Administrar através da liderança mo-      da situação de liderança, assim como pelas ne-
                                difica a perspectiva de uma filosofia orga-   cessidades dos seguidores individuais e coleti-
                                nizacional de maior rigidez. A sofistica-     vos". 24 Trata-se, portanto, de uma atribui-
                                ção tecnológica não tem deixado lugar         ção feita pelos seguidores que toma como
                                para a adoção de sistemas de controle         base certos comportamentos manifestos
                                como aqueles que foram originalmente          do líder.
                                recomendados pelos representantes da              Quanto mais se aprofundam as pesqui-
                                antiga escola de Administração Científica.    sas a respeito das características do víncu-
                                A produção totalmente automatizada e          lo líder-seguidor, mais se evidencia o
                                eletronicamente controlada vai expulsan-      peso praticamente igual que possuem es-
                                do das organizações as tão conhecidas, ul-    ses dois elementos integrantes de um
                                trapassadas e desgastadas figuras do ca-      mesmo e único processo. Aceitar isso, na
                                pataz, do contramestre, do chefe e, final-    prática, é uma questão que pode determi-
                                mente, do patrão. Surgem modelos admi-        nar, em grande parte, o sucesso organiza-
                                nistrativos que enfatizam não só a impor-     cional. "A confusão entre liderança e autori-
                                tância como também a oportunidade de          dade oficial tem efeito letal sobre as grandes
                                uma administração 'flexível, Dentro de        organizações. Corporações e repartições gover-
                                muitas outras recomendações é sugerido,        namentais, em toda parte, têm executivos que
                                 de forma enfática, o achatamento da pirâ-     imaginam que o lugar que ocupam nas orga-
                                mide de comando. Com isso é incentiva-         nizações lhes deu um corpo de seguidores, e
                                 da a eliminação da maior quantidade pos-      isso, evidentemente, não acontece. Eles ganha-
                                 sível de níveis intermediários de controle    ram subordinados. Se os subordinados se tor-
                                 e tomada de decisão. Por força do am-         narão seguidores, dependerá do fato de o exe-
                                biente de urgência instaurado pelo ritmo       cutivo agir como lider"," Inúmeros exem-
                                 acelerado de mudanças, a empresa que se       plos práticos confirmam a importância de
                                 proponha a assegurar a sua sobrevivência      aceitar a veracidade dessa suposição.
                                 tem que necessariamente agilizar seus            O verdadeiro poder está vinculado à
                                 procedimentos administrativos. Um teste-      habilidade interpessoal, sendo assim an-
                                 munho concreto dessa renovação é dado         terior ao poder formal e não podendo ser
                                 pelo crescente número de organizações         confundido com autoritarismo. Personali-
                                 que vêm procurando adotar modelos par-        dades autoritárias tendem naturalmente a
                                 ticipativos de gestão.                        reagir através de ações que privilegiam
                                    A revisão atual dos modelos de lide-       esquemas punitivos, tais como penalida-
                                 rança tem permitido a retomada do con-        des financeiras ou avaliações negativas
                                 ceito de carisma, bem como uma reavalia-      dos subordinados. Esse poder se liga,
                                 ção das fontes de póderdentro das orga-       portanto, à credibilidade que o adminis-
24. YUKL, G. A. Leadership in                                                  trador consegue construir em tomo de si.
organizations. USA: Prentice-
                                 nizações. A simples posição hierárquica
Hall, 1989, p. 205.              não parece garantir mais a obediência dos      "Credibilidade, como reputação, é algo conse-
                                 seguidores. Inquestionavelmente, o poder      guido com o tempo. Ela não vem automatica-
25. GARDNER, J. W. Liderança.    maior do líder emana do fato de que seus      mente com o cargo ou título. Começa cedo em
Rio de Janeiro: Distribuidora
Record de Serviços de Impren-    seguidores o acompanham de maneira            nossas vidas e carreiras. As pessoas tendem a
sa, 1990, p. 19.                 habitual sem se sentirem diminuídos por       assumir, de início, que alguém que foi elevado

112                                                                                        RAE • v. 34 • n. 3 • Mai./Jun. 1994
LIDERANÇA: A ADMINISTRAÇÃO DO SENTIDO


 a um certo status na vida, galgou degraus, ou      não existem líderes universais que se
 atingiu objetivos significativos, merece a sua     saiam bem em qualquer circunstância,
 confiança. Mas a confiança completa é assegu-      com qualquer tipo de grupo ou em qual-
 rada (ou não) somente depois que as pessoas        quer espécie de ambiente organizacional.
 tiveram a oportunidade de conhecer mais o in-         Num exame mais amplo do histórico
 divíduo. Os alicerces da credibilidade são         da liderança é possível destacar três
 construídos tijolo por tijolo". 26 Esse clima de   grandes aspectos que podem ser conside-
 credibilidade pressupõe transparência e            rados como verdadeiramente relevantes.
 honestidade de princípios evidentes nas            Numa primeira fase, atribui-se à figura
 ações do líder em qualquer momento e               do líder traços pessoais específicos, certos
 diante de qualquer desafio.                        tipos de motivações e determinados esti-
    O autoconhecimento, a segurança pes-            los comportamentais considerados como
 soal e a maturidade emocional parecem              elementos-chave do processo de lideran-
 ser ingredientes indispensáveis ao líder. É        ça. Para os primeiros teóricos, os subordi-
 importante que não se sinta ameaçado ao            nados são entendidos como sujeitos que
 admitir a influência ascendente que ema-           sofrem passivos a ação do líder.
 na do seguidor sobre ele. A influenciação
 exercida em duplo sentido e a transfor-
 mação mútua são requisitos de valor in-
 questionável quando se pretende liderar
 eficazmente."Nunca deveríamos fingir sobre
 aquilo que não sabemos, não deveríamos ter
 medo de perguntar e aprender com pessoas in-
feriores e deveríamos ouvir cuidadosamente os
 quadros de pessoal nos mais baixos níveis. Ser
 um aluno, antes de tornar-se professor, apren-           organização
                                                                  )         .
                                                                                confere ao
 der com os quadros de níveis inferiores antes
 de expedir ordens" . 27                                        rder        quª,lidades .
CONCLUSÕES                                              carismátiGas"'qop o torna
                                                        Yi;            .•

   Como foi possível acompanhar através
da evolução histórica pela qual passaram
                                                              mestre        da mudança.
                                                                                ~      .

os principais estudos e pesquisas sobre li-
derança, muitos trabalhos sistemáticos fo-
ram desenvolvidos. Cada um desses dife-
rentes enfoques foi responsável pelo en-               Em segundo lugar na seqüência de es-
tendimento de aspectos indispensáveis ao            tudos, surge a figura do liderado como
processo de interação e influência entre o          uma importante variável interferindo de-
líder e seu seguidor, tanto no sentido des-         cisivamente no contexto da eficácia dos
cendente como ascendente.                           líderes. Os seguidores são reconhecidos
   A principal lição que se pode extrair            como possuidores de necessidades, moti-
dessas inúmeras abordagens continua                 vações e expectativas que devem ser co-
sendo aquela que, de maneira geral, apli-           nhecidas pelo líder, cabendo a ele facili-
ca-se à grande maioria dos temas que                tar que esse seguidor chegue aos fins que
compõem o corolário dos assuntos liga-              deseja. Passa-se a aceitar que liderar efi-
dos às ciências comportamentais. A lide-            cazmente esteja ligado à aquiescência dos
rança, como tantos outros aspectos, guar-           liderados. Os líderes precisam ser favora-
da dimensões profundas que nascem das               velmente percebidos por seus seguidores
características próprias às personalidades          a fim de exercerem sua influência.
de cada um. Não pode existir, portanto,                Finalmente, depois de explorados os            26. KOUZES, J. M., POSNER, B.
                                                                                                      Z. CredilJitity - how leaders gain
uma fórmula única, uma receita pronta               aspectos que dizem respeito à comple-             and tose it, why peopte demand
ou uma solução geral que forneça com                mentaridade do vínculo líder-subordina-           it. San Francisco: Jossey-Bass
precisão matemática aquelas recomenda-              do, são levantadas as variáveis e princi-         Publishers, 1993.
ções capazes de promover a indiscutível             pais características do ambiente que po-          27. BURNS, J. M. Op. cít., p.
eficácia dos líderes. A proposta é de que           dem facilitar ou comprometer a eficácia           238.

RAE • v. 34 • n. 3 • Mai./Jun. 1994                                                                                             113
jJ~tJARTIGO


                                    da liderança. Descobre-se que as organi-           no status quo. Sua ação na mudança da
                                    zações podem treinar seus líderes, mas             cultura, diferentemente daquela em-
                                    que além disso precisam garantir condi-            preendida por consultores externos e ad-
                                   ções para que os potenciais de liderança            ministradores em geral, se faz sentir de
                                   se transformem em ações efetivas.                   maneira duradoura, embora gradual e
                                      Em condições organizacionais propí-              lenta.
                                   cias, os líderes são aqueles que têm o po-             O mais importante em todas essas
                                   der de atuarem como reais agentes da mu-            constatações não é apontar aquilo que
                                   dança organizacional. Sendo profundos               ainda está por ser feito dentro do campo
                                   conhecedores do significado contido na              de estudo da liderança. Já existem condi-
                                   rede de simbologias dessa cultura, pos-             ções suficientes para retirar de todas es-
                                   suem condições de agir sintonizando as              sas descobertas o produto que podem
                                   expectativas dos contribuintes individuais          oferecer em termos do que representam
                                   e grupais com o sentido dessa dimensão              de verdadeiramente científico a respeito
                                   organizacional percebida por eles.                  do assunto. É preciso compreender a im-
                                      Cabendo ao líder eficaz administrar o            portância de se contar com líderes real-
                                   sentido que seus seguidores atribuem à              mente eficazes para que as organizações
                                   cultura organizacional, ele pode interferir         possam se suplantar.




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                                       York:Oxford   University
                                                                        ning ot work: an interna tio-     management and organiza-
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                                                                        na! víew. New York: Acade-        tion. Berlin: Water de
      N. loward a behavioral                                            mic Press, 1987 .                 Gryter & Co, 1994.
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      dership in organizational        R. Path-goal theory of lea-    •. MINNER, J. B. The uncer-       • STOGDILL, R. M. Hand-
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114                            Artigo recebido pela Redação da RAE em março/94, avaliado e aprovado para publicação em maio/94.

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Liderança - administração do sentido - rae

  • 1. ,..., LIDERANÇA: A ADMINISTRAÇAO DO SENTIDO ARTIGO * Cecília Whitaker Bergamini Uma revisão da evolução histórica dos estudos e pesquisas sobre liderança enfatiza a importância de líderes organizacionais eficazes. A review of ihe historical eoolution of the studies and surveys on leadership strengh the imporiance of effective organizacional leadere. PALAVRAS-CHAVE: Liderança, interação, poder, ÚJ- ttuêncie, autoridade, carisma, cultura organizacional, motiva- ção, atitude. KEY WOROS: Leaders/Jip, interaction, power, inttuence. authority, cnerism, organizationa/ cu/ture, motiva- tion, altitude. , Professora do Departamento de Administração Geral e Re- cursos Humanos da EAESPI FGV. 102 Revista de Administração de Empresas São Paulo, v. 34, n. 3, p.102-114 Mai./Jun. 1994
  • 2. LIDERANÇA: A ADMINISTRAÇÃO DO SENTIDO o tema da liderança tem um forte ape- liderança, é indispensável que se conheça lo tanto para aqueles que dirigem como o que veio sendo pesquisado anterior- para aqueles que são dirigidos. Muitas mente. É importante que se tenha em vezes esse conceito assume uma conota- mente os trabalhos especiais publicados ção de "dom" mágico, responsável por pela literatura sobre o assunto a partir do uma espécie de atração inexplicável que início do presente século. Conhecendo certas pessoas exercem sobre as outras. A como se deram as tentativas anteriores imaginação daqueles que se envolveram voltadas à explicação do fenômeno e do com o assunto fez com que ele fosse in- processo de liderança é que se poderá ca- vestigado a partir dos mais diferentes en- racterizar mais precisamente o mérito das foques, trazendo à luz do conhecimento obras divulgadas na atualidade, atribuin- da ciência comportamental as mais varia- do a elas o verdadeiro grau de confiança das inferências. que merecem receber. Não é de estranhar, portanto, que a pa- lavra "liderança" reflita conceitos aparen- o COMEÇO DA HISTÓRIA temente diferentes para diferentes pessoas. Os pesquisadores passam, assim, a definir Embora o termo liderança venha sendo liderança partindo de uma perspectiva in- usado há aproximadamente duzentos dividual, ressaltando aquele aspecto do fe- anos na língua inglesa, Stogdill (1974) nômeno que lhes pareça mais significativo. acredita que ele tenha aparecido por volta Devido ao grande interesse despertado do ano 1300 da era cristã. Fiedler afirma pelo tema da liderança, nota-se, no mo- que: "A preocupação com a liderança é tão mento atual, o aparecimento de incontá- antiga quanto a história escrita: A república veis conceitos emitidos pelos pesquisado- de Platão constitui um bom exemplo dessas res em comportamento organizacional, o preocupações iniciais ao falar da adequada que permite afirmar: "Assim como o amor, a educação e treinamento dos líderes políticos, liderança continuou a ser algo que todos sa- assim como da grande parte dos filósofos polí- biam que existia, mas ninguém podia definir". 1 ticos que desde essa época procuraram lidar Dois aspectos parecem ser comuns à com esse problema". 3 Isso permite dizer que grande maioria das definições de lideran- a liderança tem sido investigada desde há ça existentes na atualidade. Em primeiro muito e, como tal, é justo que apresente as lugar, elas conservam o denominador co- mais variadas interpretações. Somente o mum de que a liderança esteja ligada a conjunto de todos esses pontos de vista um fenômeno grupal, isto é, envolve duas oferece a possibilidade de uma visão mais ou mais pessoas. Em segundo lugar, fica abrangente a respeito do tema. evidente tratar-se de um processo de in- Dentro de toda multiplicidade de as- fluenciação exercido de forma intencional pectos sob os quais se estudou liderança, por parte dos líderes sobre seus seguido- percebe-se que alguns teóricos preocupa- res. Hollander consegue abranger a gran- ram-se em especial com aquilo que o líder de maioria desses aspectos propondo: "O é, procurando retratar traços ou caracte- processo da liderança normalmente envolve rísticas de personalidade que sejam os um relacionamento de influência em duplo responsáveis por sua eficácia. Outros im- sentido, orientado principalmente para o aten- primiram maior dinâmica quanto à con- dimento de objetivos mútuos, tais como aque- cepção do líder, buscando investigar les de um grupo, organização ou sociedade. aquilo que o líder faz, isto é, procuraram Portanto, a liderança não é apenas o cargo do delinear diferentes estilos de liderança. 1. BENNIS, W., NANUS, B. Lí- Um terceiro grupo de pesquisadores em deres: estratégias para assumir líder mas também requer esforços de coopera- a verdadeira liderança. São Pau- ção por parte de outras pessoas". 2 Dentro liderança procura analisá-la em função lo: Harbra, 1988, p. 5. desse processo considera-se que, embora daquelas circunstâncias que determinam a eficácia do líder, buscando conhecer que 2. HOLLANDER, E. P. Leadership o líder seja quem geralmente inicia as dynamics - a praticai guide to ações, os seus seguidores precisam ser variáveis do meio ambiente podem influir efectíve relatíonshíps. New sensíveis a ele, isto é, levá-lo em conta na- no desenvolvimento do vínculo líder-se- York: lhe Free Press, 1978. quilo que diga respeito às suas idéias e guidor. Existe também um grupo repre- 3. FIEDLER, F. A theory of lea- programas. sentativo de teóricos que se dedicou ao dershíp effectiveness. New Embora ainda se continuem publican- estudo das motivações subjacentes às ati- York: McGraw-Hill Book Com- do trabalhos inéditos dentro do campo da vidades de dirigir pessoas. pany, 1967, p. 3. © 1994, Revista de Administração de Empresas / EAESP / FGV, São Paulo, Brasil. 103
  • 3. iJ!J/J ARTIGO Cronologicamente, a seqüência históri- como os responsáveis pelos primeiros ca do estudo da liderança mostra várias passos rumo à sistematização do estudo etapas. A teoria dos traços originou-se de em liderança. A contribuição desses pes- pesquisas disponíveis a respeito de lide- quisadores ficou, por assim dizer, mais rança dentro dos períodos compreendi- restrita ao estudo do líder em si, tendo dos entre 1904-1948.Uma revisão dessas suas pesquisas se omitido na considera- pesquisas conseguiu isolar cerca de 34 ção de aspectos ligados às circunstâncias traços de personalidade considerados ambientais que envolvem o vínculo líder- como típicos de bons líderes. O enfoque seguidor. Avaliando o trabalho desenvol- dos estilos de liderança aparece logo no vido dentro desses primeiros enfoques, início da década de 50. Nesse momento, Smith e Peterson comentam: "Esses pes- um grande esforço de pesquisa foi mobili- quisadores em liderança agiam como se eles zado buscando saber como o bom líder fossem alquimistas medievais à procura da pe- deve agir. dra filoeofal", 5 Está subentendido nessa Essa segunda etapa da história da lide- crítica que esses pesquisadores preten- rança inicia-se no pós-guerra, especial- diam como que" destilar a essência" da li- mente nos Estados Unidos. Nesse mo- derança para encontrar aquilo que pudes- mento foram criados inúmeros instru- se distinguir os líderes como pessoas es- mentos de análise do comportamento em peciais, diferentes, portanto, do restante liderança, representados principalmente dos mortais. pelos questionários. Como testemunha Numa etapa subseqüente surgem as Guiot: "Numerosas pesquisas foram levadas a teorias situacionais que possuem como efeito tendo em vista colocar em evidência as principal foco de interesse o estudo do relações entre os tipos de comportamento do comportamento contingente em lideran- líder e a eficácia de sua liderança. A hipótese ça. A ênfase já não é mais colocada unica- subjacente, orientadora da pesquisa, é aquela mente sobre uma variável isolada cir- que propõe ser o estilo de liderança manifesto cunscrita à ação do líder sobre um tipo de pelo líder, o determinante do nível de desem- atitude passiva do subordinado. De ma- penho atingido pelo grupo (ou unidade orga- neira um pouco mais complexa, a princi- nizacional por ele comandada)".» É sabido pal preocupação desse novo grupo de es- que nesse momento todo o esforço de tudos será dirigida também às caracterís- pesquisa contava com ambientes onde ha- ticas comportamentais dos liderados. Os via maior controle das variáveis. defensores das proposições conhecidas A liderança tem sido também estudada como contingenciais levantam novas va- como um processo de interação que envol- riáveis que passam a ser objeto de investi- ve trocas sociais. Sob esse aspecto, o líder é gação. Esse posicionamento determina o visto como alguém que traz um benefício, caráter de maior abrangência dessas teo- não só ao grupo em geral, como a cada rias com relação às anteriores. O ambiente membro em particular, fazendo nascer organizacional, bem como as característi- desse intercâmbio o valor que seus segui- cas comportamentais dos seguidores, pas- dores lhe atribuem. Em troca, os membros sa agora a fazer parte integrante do qua- do grupo devolverão ao líder seu reconhe- dro geral das investigações voltadas ao cimento e aceitação como forma de lhe estudo sistemático da ciência da lideran- conferir a autoridade para dirigir pessoas. ça. Os enfoques contingenciais propuse- Dentro desse apanhado de estudos ram que as organizações poderiam contar mais sistemáticos, alguns nomes se desta- com bons líderes desde que lhes dispen- cam. Nas pesquisas sobre traços de perso- sassem treinamento adequado e promo- nalidade surgem Stogdil e Mann. Lewin, vessem um ambiente favorável onde pu- Fleshman, Coons, Likert e outros conheci- dessem agir com eficácia. 4. GUIOT, J. M. Organisations dos, como os pesquisadores dos grupos Hampton, Summer e Weber assim re- socia/es et comportements. Montreal: Les Éditions Agenee das Universidades de Ohio e Michigan, sumem a contribuição oferecida nessa d'Are INC, 1987, p. 142. foram os principais responsáveis pelas in- fase do estudo da liderança: "Os três enfo- vestigações feitas em tomo dos estilos de ques situacionais acrescentam muito à nossa 5. SMITH, R., PETERSON, M. F. Leadership, organization and- liderança. McClellan e Minner investiga- atual compreensão de liderança. O modelo cu/ture. London: Sage Publica- ram a motivação para a liderança. Todos contingencial de Fiedler mostra que existe si- tion, 1989, p. 11. eles são reconhecidamente considerados tuações favoráveis e desfavoráveis para o líder 104 RAE. v.34 • n.3 • Mai./Jun.1994
  • 4. LIDERANÇA: A ADMINISTRAÇÃO DO SENTIDO e que alguns tipos de líderes saem-se melhor /I A função motivacional do líder reside nas em situações favoráveis, enquanto que outros, crescentes recompensas pessoais dos subordi- em situações desfavoráveis. O enfoque do ca- nados no sentido da chegada aos objetivos do minho-objetivo deu vida à noção de que os su- trabalho, fazendo com que o caminho para es- bordinados tentam ser pessoas bem-intencio- sas recompensas se torne mais fácil de ser per- nadas e que o líder que puder ajudá-las nesse corrido ao deixá-lo mais evidente, reduzindo processo terá sucesso. Finalmente, os enfoques os bloqueios do percurso e as armadilhas, bem de Tannembaum/Schimit e Vroom/Yetton como aumentando as oportunidades de satis- mostram como realmente podem ser comple- fação pessoal em curso", 7 O papel do líder, xas asforças que estão em jogo na tentativa do conforme o enfoque do caminho-objetivo, líder em adequar seu comportamento à situa- caracteriza-se como aquele de agente a ção",> Com isso, maior profundidade é quem cabe desbloquear a força motiva- acrescentada ao estudo da liderança. cional contida no interior do seguidor. Se, para as colocações teóricas iniciais, o traço de liderança era inato, agora, com os teóricos da contingência, essa caracte- rística pode ser desenvolvida. Instala-se, a partir desse novo enfoque, a crença de que qualquer um pode ser um bom líder, basta que seja preparado para tanto. A partir desse momento é que começa a sur- gir um grande número de programas de treinamento e desenvolvimento em lide- rança, avidamente consumido pelas orga- nizações empresariais do mundo todo. LIDERANÇA COMO SINÔNIMO DE MOTIVAÇÃO Devem existir razões muito especiais que justifiquem o crescente interesse de pesquisadores e autores a respeito da ine- vitável união entre aqueles pontos co- muns que interligam a dinâmica motiva- A contribuição feita pelas teorias que cional e a eficácia da liderança. Esses dois ressaltaram a importância da motivação termos, a partir de um determinado mo- dentro do processo de liderança é inesti- mento, parecem definitivamente unidos mável. Já foi possível perceber que, na na teoria e na prática por uma relação de busca da eficácia, não cabe ao líder moti- causa e efeito. var seus seguidores. Quando aceitam um Em 1964, Hollander propõe a teoria novo emprego, as pessoas, em geral, es- das trocas, destacando como importante tão cheias de esperanças e acalentam ex- fator de eficácia na liderança o equilíbrio pectativas, sendo, por isso, depositárias que deve ocorrer entre as expectativas de de um rico manancial de motivação. O um subordinado e as respostas compor- potencial sinergético contido nas necessi- tamentais oferecidas por seu líder. Isso dades motivacionais constitui um reper- sugere que a aceitação de um líder será tório básico de forças pessoais que é ine- tanto maior quanto mais ele for conside- rente a cada um. Desconhecer essa fonte rado como facilitador da consecução da- natural de motivação representa um im- queles objetivos almejados pelos seus su- pulso fatal rumo à desmotivação. Ignorar 6. HAMPTON, D. R., SUMMER, bordinados. essa predisposição natural é como assu- C. E., WEBER, R. A. Organizatio- Concomitantemente House e Mitchel mir a filosofia taylorista que preconiza a nal behavior and pratice of ma- nagement. USA: Sccot Fores- propõem a teoria caminho-objetivo, a par- indolência natural do ser humano. man and Company, 1978, p. tir da qual o líder não somente deve co- Ao descobrir que a motivação repre- 615. nhecer os objetivos almejados por seus senta um elemento-chave à eficácia do lí- subordinados, como também desempe- 7. HOUSE, R. J. A path-goal der, entende-se que, talvez, o maior de to- theory of leader etteciiveness. nha o papel de facilitador do percurso até dos os desafios que ele enfrenta seja in- USA: Adminlstrative Science esses objetivos. O próprio House afirma: viabilizar o processo de degenerescência Quartely, 1971, p. 324. RAE. v.34 • n.3 • Mai./Jun. 1994 105
  • 5. iJ~1J ARTIGO do potencial da sinergia motivacional. tores complementares de satisfação des- Pode-se perceber, através desse novo en- sas necessidades, poderá então ser consi- foque, que o ingênuo" chefe" esteja inva- derado como um importante agente na riavelmente à procura de regras para mo- construção de climas mais favoráveis de tivar seu novo funcionário, enquanto o lí- trabalho. der eficaz estará atento para que a rique- Kouzes e Posner deixam bem evidente za contida nas necessidades de cada um a ligação entre liderança e motivação não seja drenada e se perca, talvez para quando propõem: "A motivação absoluta a sempre. motivadores extrínsecos limita severamente a Cada vez com maior freqüência, os au- habilidade de uma organização ultrapassar-se. tores contemporâneos mostram-se unâni- Ela limita a habilidade dos gerentes de usar o mes ao enfatizar a necessidade de se ter potencial integral dos empregados. Desperdiça clara a diferença entre o comportamento o talento humano e drena os recursos organi- simplesmente condicionado por motiva- zacionais. É certo que se deva pagar aos em- dores extrínsecos ao indivíduo e aquele pregados com justiça e oferecer benefícios que tipifica as ações do empregado real- eqüitativos. Isso, definitivamente, está fora de mente motivado. A motivação intrínseca cogitação. Todavia, a ênfase sobre incentivos orienta cada um na busca daquilo que é externos e pr.essões constrange as pessoas. Isso valorizado pelas suas predisposições in- não as libera para darem o melhor de si. Cons- ternas. Ao considerar a liderança como si- trange também os gerentes em conseguir nônimo de motivação, o líder percebe aprender como conseguir que os outros quei- esse claro divisor de águas no fluxo das ram fazer aquilo que necessita ser feito. E, ações humanas. Muito daquilo que se tem caso não se consiga aprender a conseguir que produzido na literatura atual em admi- as pessoas queiram, nunca se poderá liderá- nistração aponta como praticamente in- las". 8 Não há dúvida que liderar sendo viável liderar sem distinguir o comporta- capaz de conhecer, valorizar e satisfazer mento estimulado de fora para dentro das os apelos vindos das necessidades interio- ações emitidas pela força das pulsões mo- res exige muito maior perícia do que ma- tivacionais interiores. nipular prêmios e castigos disponíveis no Aqueles que acreditam que se possa ambiente da empresa. motivar as pessoas estão partindo do Os teóricos da motivação intrínseca pressuposto de que elas devam ser chefia- destacam a importância da percepção no das e não lideradas. Isso estabelece um processo de satisfação dos desejos interio- importante diferencial entre o clássico res, embora considerem, tanto um quanto chefe, que, por força da sua autoridade outro, como elementos pertencentes ao formal tem recursos para distribuir prê- mundo subjetivo. "Uma vez que a satisfação mios e punições ao acaso, e o verdadeiro envolva a interação entre a pessoa e seu am- líder. Este último percebe com clareza biente, sua valorização liga-se, em parte, à na- que o mundo exterior, cheio de benefícios tu reza objetiva do mundo exterior da pessoa. e restrições, não tem sentido para o indi- A satisfação depende de ambos, a forma real víduo. Aquilo que qualificará tais elemen- do mundo ser e como essa realidade é percebi- tos como verdadeiros prêmios ou castigos da pela pessoa"." A percepção exerce, as- reais é o tipo de carência existente, naque- sim, função importante na valorização le momento, no interior de cada um. Por dos traços do meio ambiente, mas para exemplo, o prêmio de um trabalho mais tanto, retira dos desejos não satisfeitos as complexo só é visto como tal pela pessoa informações necessárias para atribuir sen- que sinta real necessidade de livrar-se da tido ao mundo objetivo. 8. KOUZES, J. M., POSNER, B. Z. O desafio da liderança - aborrecida rotina de tarefas repetitivas. A como conseguir feitos extraor- motivação está, portanto, contida nas ne- LIDERANÇA COMO ADMINISTRAÇÃO DO dinários em organizações. Rio cessidades de cada um. Sendo assim, ao SENTIDO de Janeiro: Campus, 1991, p. 34. se aceitar que a motivação seja sinônimo de necessidades, só se conseguirá traba- Considerando liderança e motivação 9. ALDERFER, D. P. Existence, lhar com pessoas realmente motivadas como dois assuntos tão entrelaçados, é relatedness and growth - nu- man needs in organizational caso se tenha suficiente sensibilidade para possível concluir que guardam uma liga- settings. London: Collier-McMil- conhecer tais necessidades. Se além de co- ção de parentesco forte entre si, a ponto lan, 1972, p. 8. nhecê-las o líder for capaz de oferecer fa- de serem considerados como sinônimos. 106 RAE. v.34 • n.3 • Mai./Jun.1994
  • 6. LIDERANÇA: A ADMINISTRAÇÃO DO SENTIDO Assim, a figura do líder toma novo aspec- ta por Tack: "Os gerentes, muitas vezes, ge- to, como propõe Pondy: "A eficácia do líder renciam departamentos, gerenciam pessoas, repousa na sua habilidade de tornar uma ativi- mas não as lideram. A liderança eficaz os mo- dade significativa para aqueles que estão nesse tiva voluntariamente, e esta é a palavra-chave, conjunto de papéis - não é mudar comporta- a dedicarem suas mentes e atributos físicos mentos, mas dar aos outros o senso de com- para um objetivo maior". 12 Para o autor é preensão daquilo que estão fazendo e especial- axiomático que o valor da boa liderança mente articulá-los para que possam comunicar- esteja com freqüência esquecido, para que se sobre o sentido do comportamento deles (...). o valor da boa administração seja, guase Essa dupla capacidade, dar sentido às coisas e que inevitavelmente, enaltecido. E por colocá-las em linguagem significativa para um isso que para ele gerência e liderança não grande número de pessoas, dá ao líder enorme são necessariamente parentes, embora alatancagem"." Para administrar o sentido acredite que a liderança seja sinônimo de que as pessoas dão ao trabalho que fazem, motivação. é necessário conhecer como suas necessi- dades motivacionais o valorizam. Durante muitos anos, a forma pela qual os candidatos a cargos de chefia, ge- rência ou administração foram escolhidos '(1: baseou-se em padrões que pouco tinham 1íd4i1!: .será tanto maior a ver com o futuro papel de liderança a ser desempenhado por essas pessoas. As- '" " qúantdm,ais ele for 1* sim sendo, a realidade atual das organiza- .. .'.. 'tt' ções empresariais brasileiras acusa uma tons"iderado como ausência marcante daqueles que, no exer- cício de tais cargos, poderiam ser qualifi- facilifador'tJê· consecação cados como verdadeiros líderes. Por ou- tro lado, os programas de treinamento e desenvolvimento dos novos chefes foram principalmente planejados para oferecer pesadas doses de conhecimentos técnicos e administrativos e muito pouco era men- cionado sobre aquilo que dizia respeito ao processo de interação pessoal no contexto Em que pese as diferenças individuais da liderança. Sem os cuidados necessá- entre o líder e seus seguidores, é pela rios, instaurou-se em pouco tempo um consciência dessas diferenças que a ação clima de desmotivação generalizada. do líder reconhecidamente eficaz faz sen- Conseguir que a motivação não desapa- tir a importância da sua presença. Sob reça é fazer com que se continue vendo esse aspecto, o líder sabe que pode contar sentido naquilo que se está fazendo no com as necessidades interiores originárias trabalho, como salienta Sievers ao propor da busca de realização pessoal e da pre- que "a motivação só passou a ser um tópico- servação da auto-imagem daqueles que tanto para as teorias organizacionais, quanto aceitam ser dirigidos por ele. Essas pre- para a organização do trabalho em si - quando disposições naturais são interpretadas o sentido do trabalho desapareceu ou então foi pelo líder como "forças que organizam nos- 10. SMITH, P., PETERSON, M. perdido (...) Como conseqüência, as teorias mo- F. Op. cit., p. 10. sas percepções, julgamentos e ações para atin- tivacionais se têm transformado em sucedâ- gir a competência. A existência de um estado 11. SIEVERS, S. Além do suce- neos do sentido do trabalho". 11 O desapareci- de necessidades pressupõe que haja uma con- dâneo da motivação. In: SER· mento desse sentido pode ser atribuído GAMINI, C., CODA, R. Psicod» dição a ser preenchida. Todos têm necessida- nâmica da vida organizacional: principalmente ao descaso das organiza- des complexas que pedem satisfação e que são motivação e liderança. São Pau- ções quanto à motivação para o trabalho. a expressão das personalidades nas quais exis- lo: Biblioteca Pioneira de Acmi- A maioria daqueles que ocupam cargos nistração de Negócios, 1990, p. tem. A ampla gama de comportamentos hu- 117, que deveriam ser preenchidos por líderes manos é composta de múltiplos padrões de ne- nem mesmo acredita que para trabalhar cessidades. Interpretar esses padrões indivi- 12. TACK, A. A liderança moti- seja necessário estar motivado. O panora- vacional. São Paulo: Siamar, duais é um dos desafios para compreender e Serviço Cultural Interamericano ma organizacional lembra a descrição fei- aceitar as diferentes necessidades das pessoas e e Editora ttda, 1989, p. 26. RAE • v. 34 • n. 3 • Mai./Jun. 1994 107
  • 7. i1~lJ ARTIGO pode abrir um longo percurso no sentido de zão de ser é identificar e responder às necessi- apreciá-las bem como resolver dificuldades ad- dades manifestas ou latentes dos consumido- ministroiioas"." A utilização dos recursos res. O administrador levará em conta, princi- pessoais de cada um envolve aquele apro- palmente, os recursos disponíveis dentro da veitamento produtivo que se possa fazer empresa e as oportunidades ou ameaças exis- das diferenças individuais características tentes em um determinado mercado. Na outra dos estilos comportamentais. Esse uso im- extremidade, o líder, no entanto, apresenta-se plica como se percebe e se configura o como uma pessoa que dirige e inicia a empre- mundo à volta de cada um, como se che- sa, centrada, antes de mais nada, em sua visão ga ao sentimento de identidade, satisfa- pessoal. Este indivíduo reagirá de acordo com ção e competência pessoal, além de como a sua realidade interior, pro-agindo posterior- se capitalizam sobre as forças pessoais mente em um ambiente ou em determinado para lidar com situações conflitantes - mercado. Isto pode implicar - e geralmente nisso reside a essência básica da adminis- implica - que o líder acabe levando menos em tração do sentido. conta os recursos disponíveis, ou então, que Propondo que o líder tenha oportuni- inicie ou leve a efeito as mudanças necessárias dade de administrar o sentido que as pes- no ambiente ou em determinado mercado. O soas dão ao seu trabalho em particular e à modo de estruturação é freqüentemente mais organização como um todo, aceita-se seu orgânico, mais centrado na pessoa do próprio poder de interferir junto à cultura organi- líder, menos regulamentado e hierarquizado. zacional. Esta maneira de conceber a lide- Utilizando a tipologia elaborada por Reisman rança reclama não somente a inclusão dos (1964), Zalesnick e Ketz de Vries (1975), há seguidores, como também dos pares e su- de um lado o dirigente heterodeterminado (ou periores, pois muito raramente o sentido extradeterminado), que corresponde ao concei- percebido pode ser definido de maneira to de administrador e, de outro, o dirigente in- unilateral. Isso pode ultrapassar os limites tradeterminado, representando aqui a defini- da vida consciente, como coloca Burns: ção adotada de líder". 15 De maneira mais "Mas o processo fundamental, um pouco mais ampla, o administrador parece fazer uso amplo, é, em larga escala, tomar consciente mais intenso dos processos racionais, en- aquilo que permanece inconsciente em seus se- quanto o líder, na maior parte do tempo, guiâores"." A eficácia do líder, enquanto nutre-se da sua própria intuição. administrador do sentido e conseqüente- Esclarecer as diferenças entre os tipos mente agente de mudança, apóia suas ba- de ações administrativas e de liderança ses no profundo conhecimento não so- tem sido alvo de destaque por parte de mente do contexto cultural da organiza- importantes autores em administração, ção, mas também na sua habilidade inter- como foi recentemente publicado por pessoal em conhecer aqueles que depen- Bennis: dem dele, facilitando sua chegada até a auto-realização. • "o gerente administra; o líder inova; • o gerente é uma cópia; o líder é original; ADMINISTRADORES E LíDERES • o gerente focaliza-se em sistemas e estrutu- ras; o líder focaliza-se nas pessoas; 13. BENFARI, R., KNOX, J. Un- Embora o pensamento leigo nem sem- • o gerente tem uma visão a curto prazo; o lí- derstanding your management pre o admita, é importante que se ressalte der tem a perspectiva do longo prazo; sty/e - beyond the Meyers- a diferença já sacramentada por muitos • o gerente pergunta como e quando; o líder Briggs type indicators. USA: Le- xington books, 1991, p. 25. autores no tocante ao que se entende por pergunta o que e por quê; líderes e administradores. Lapierre coloca • o gerente tem seus olhos sempre nos limites; 14. BURNS, J. M. Leadership. essa distinção nos seguintes termos: o líder tem seus olhos sempre nos horizon- New York: Harper & Raw Pu- blishers, 1978, p, 40. "Numa extremidade do contínuo, o adminis- tes; trador é caracterizado como uma pessoa que • o gerente limita; o líder dá origem; 15. LAPIERRE, L. Imaginário, reage, sobretudo em resposta à situação exte- • o gerente aceita o status quo; o líder o de- Administração e Liderança. In: BERGAMINI, C., CODA, R. Op. rior. Trata-se de alguém que dirige uma em- safia; cit. p. 129. presa (aqui considerada na acepção mais am- • o gerente é o clássico bom soldado; o líder é pla do termo) de maneira a procurar eficiência a própria pessoa; 16. BENNIS, W. On becaming a /eader. New York: Reading Ass., e eficácia dentro de uma estrutura interna or- • o gerente faz certo as coisas; o líder faz as Adilson Wesley, 1989, p. 45. denada, regulamentada e hierarquizada. A ra- coisas certas". 16 108 RAE. V.34 • n.3 • Mai./Jun.1994
  • 8. LIDERANÇA: A ADMINISTRAÇÃO DO SENTIDO Diferentemente do administrador que de erro grosseiro confundir ou pressupor necessita de grande quantidade de conhe- que toda pessoa em posição de direção na cimentos técnicos e administrativos, o lí- empresa seja, necessariamente, líder. der eficaz se louva, antes de mais nada, no seu próprio autoconhecimeto como ponto TRANSAÇÃO E TRANSFORMAÇÃO de partida para o desenvolvimento da sua habilidade interpessoal. Essa característica Embora apresentada em 1978, a teoria não só provê os líderes de controle inter- de Bums que distingue dois importantes no, como também os habilita a não proje- aspectos da liderança ainda é pouco conhe- tar nos seguidores e nas situações que ge- cida, especialmente dentro das empresas ralmente enfrenta distorções da realidade brasileiras. Como propõe textualmente: próprias à sua maneira pessoal de ser. "Tratarei a liderança como algo distinto do Freqüentemente se vê destacado o fato mero detentor de poder e oposto à força bruta. de a influência que pode Serão identificados dois tipos exercer um líder fluirá tanto básicos de liderança: a transa- mais facilmente quanto cional e a transformacio- mais apto ele esteja em «a:» Essa diferen- apoiar suas ações no co- ciação não deve ser nhecimento tão próxi- considerada como mo quanto possível das uma simples sutileza crenças, valores e ex- semântica, mas como pectativas dos seus se- uma importante se- guidores. Apoiando-se paração entre duas fi- nesse conhecimen- losofias frontalmente to, ele terá capaci- discordantes em dade de facilitar termos da teoria e as pessoas a da prática admi- atingirem seus nistrativa. próprios objeti- Os estudos de vos. Tal predispo- [ames McGregor sição pode impli- Burns inspiraram car eventualmente mudanças no próprio diferentes autores como, por exemplo, contexto da cultura organizacional. Fre- Smith: "Na liderança transacional, uma troca qüentes pesquisas mostram que os líderes ocorre entre o líder e o seguidor. A troca pode- mais favoravelmente avaliados são aque- rá ser econômica, política ou psicológica, mas les que possuem mais ampla abrangência não existiria ligação duradoura entre as partes. de influenciação, o que necessariamente Essa troca continua somente à medida que am- inclui superiores e colaterais. Kouzes e bas as partes acham que isso vem em benefício Posner afirmam: "As pessoas preferem traba- próprio. Tais relacionamentos de troca são di- lhar para gerentes que sejam influentes para fundidos em muitas organizações de trabalho, cima e para fora. Os líderes de sucesso sabem nas quais os subordinados concordam em acei- que é necessário e importante fazer os outros tar a liderança por parte dos líderes específicos saberem o que podem e usam seu poder para em bases de seu emprego remunerado". 19 Esse conseguir que completem seu trabalho". 17 O tipo de liderança aproxima-se muito mais poder de influência, paradoxalmente, nas- das formas de comportamento anterior- ce da percepção e do respeito às caracte- mente caracterizadas como condicionan- rísticas individuais daqueles que circun- tes. Seguindo essa estratégia, o típico ad- dam o líder. ministrador consegue manter o subordi- Os gerentes e administradores, de uma nado preso a si pelo poder formal que forma geral, nem sempre apresentarão possui, habilitado, por ele, a oferecer van- atributos comportamentais que os caracte- tagens. Trata-se, nesses casos, de uma 17. KOUZES, J. M., POSNER, B. rizem como líderes eficazes. Isso também transação pura e simples, envolvendo, na Z. Op. cit., p. 117. equivale a dizer que verdadeiros líderes, maioria das vezes, benefícios de caráter 18. BURNS, J. M. Op. cit., p. 4. na maioria das vezes, podem não possuir extrínseco. O poder exercido pelo supe- características gerenciais ou de adminis- rior, enquanto líder transacional, desapa- 19. SMITH, P., PETERSON, M. tradores. Portanto, trata-se de uma espécie recerá à medida que não for mais detentor P. Op. cit., p. 115. RAE. v.34 • n.3 • Mai./Jun.1994 109
  • 9. i1~~ ARTIGO da prerrogativa de conceder benefícios ou mundo de trabalho. É esse mundo que se infligir punições. consubstancia e materializa o principal fa- Dentro de uma perspectiva nitidamen- tor de satisfação das necessidades de se- te oposta, o próprio Bums se refere à lide- gurança daqueles que vivem na sociedade rança transformadora propondo: "A lide- industrial contemporânea. rança transformadora é uma necessidade exis- Confrontado pelas diferentes solicita- tente ou solicitação de um seguidor potencial. ções oriundas desses dois mundos, inte- Mas além disso, o líder transformacional pro- rior e exterior, na maioria das vezes o in- cura motivos potenciais nos seguidores, pro- divíduo é levado a questionar a validade cura satisfazer necessidades de alto nível e as- daquelas crenças que nele já se achavam sume o seguidor como uma pessoa total. O re- enraizadas. Nesse processo, não raro as sultado da liderança transformacional é o rela- pessoas podem acabar sucumbindo dian- cionamento de estímulo mútuo e a elevação te da necessidade de fazer uma opção que converte os seguidores em líderes (... )".20 pessoal em favor de apenas uma dessas Neste caso, está implícita a existência da propostas que lhe parecem dissonantes, grande sensibilidade com relação aos de- senão até mutuamente excludentes. Surge sejos e necessidades dos seguidores. a necessidade de distanciar-se do proble- Pela própria definição, o líder trans- ma para poder vê-lo por inteiro e por isso formacional exemplifica com suas ações cada pessoa sai à busca de uma terceira o verdadeiro modelo motivacional de re- opinião. É nessa oportunidade que o líder lacionamento interpessoal. Supõe-se en- pode administrar o significado das op- tão que o líder eficaz conheça as autênti- ções com as quais se defronta o seu segui- cas necessidades dos seus seguidores, es- dor. Não se pode, no entanto, confundi-lo tando, assim, em condições de interferir com a figura de pai, terapeuta ou conse- com maior acerto ao facilitar a satisfação lheiro, embora esses personagens também motivacional. possam ser, à sua maneira, líderes espe- A liderança transformacional propõe ciais. Ao assumir o papel que lhe é pró- que a influência ocorra em dupla direção prio, o líder natural aparece como alguém para que se estabeleça o clima de respeito que está apto a equacionar as duas reali- ao outro enquanto pessoa integral. É da dades existentes no mundo e na vida pes- convivência com o seguidor que o líder re- soal de cada um, naquilo que tanto um tira a maior fonte de informações de que como outro possuem de fantasias, de ima- necessita para o exercício do seu papel; ginário e de simbólico. portanto, não somente o influencia como Não somente Bums, mas quase todos também é influenciado por ele, como diz o os teóricos defensores dos enfoques con- próprio Bums: "Líderes reais, líderes que en- tingenciais em liderança são unânimes sinam e são ensinados por seus seguidores - em afirmar que líderes e seguidores exer- adquirem muitas das suas habilidades na expe- cem papéis ativos na transformação e mu- riência do dia-a-dia, no treinamento em situa- dança organizacional. Essa proposição co- ção de trabalho ao liderarem com outros líderes meça com Hollander e a teoria das trocas. e seguidores".21 Colocando-se praticamente Isso fica também evidente no modelo de no papel de parceiro do liderado, o líder Fiedler ao ressaltar que há condições es- não necessita de sua autoridade formal, o peciais que asseguram a eficácia do líder. subordinado voluntariamente o segue Igualmente, os pontos de. vista da teoria pelo vínculo tipicamente afetivo que se es- caminho-objetívo de House e Mitchel rati- tabelece entre os dois. ficam a hipótese de que o líder tem papel Devido a uma série de contingências decisivo na conciliação daqueles objetivos dos mais diferentes tipos, o ser humano eleitos pelos subordinados e aqueles pro- sozinho tem mostrado uma espantosa vul- postos ou implícitos à cultura organiza- nerabilidade quanto ao seu equilíbrio pes- cional. Para o conjunto desses teóricos, soal. Quando ele adota caracteristicamen- ater-se ao estudo do líder simplesmente é te uma atitude indefesa, a desorganização questionável e precário. Assim como os intrapsíquica ocorre, principalmente fren- seguidores precisam forçosamente conhe- te a solicitações conflitantes vindas, de um cer as intenções dos líderes, esses líderes; 20. BURNS, J. M. Op. cit., p. 4. lado, do seu mundo interior e de outro, do por sua vez, encontram-se diante da con- 21. Idem, ibidem, p. 169. mundo em que vive, em especial do seu tingência de considerar atentamente os 110 RAE. v.34 • n.3 • Mai./Jun.1994
  • 10. LIDERANÇA: A ADMINISTRAÇÃO DO SENTIDO propósitos delineados pelos seguidores. A possibilidade de interferir na cultu- Alguém só se deixará liderar por pessoas ra da organização confere ao líder quali- a quem qualifique favoravelmente. Isso dades carismáticas que o torna mestre da permite afirmar que o líder depende da mudança, inspirando as pessoas a corre- aquiescência do seguidor para exercer so- rem riscos pelo fato de possuir acentua- bre ele qualquer influência. Portanto, an- do senso de oportunidade estratégica. tes de mais nada, a eficácia do processo Conger, no entanto, propõe que esse tipo tem que se louvar na autorização explícita de ação do líder carismático pode se per- ou implícita do liderado. der, caso as organizações não ofereçam condições favoráveis às mudanças. NA CULTURA, CARISMA E PODER grande tragédia da administração atualmente é a falta de liderança em muitas de nossas or- Dentro desse contexto de influência mú- tua é que o líder desempenha também um importante papel junto à cultura organiza- cional. Diferentemente dos administrado- o§ gerentes e res e dos consultores externos, aqueles que assumem papéis de liderança conseguem adp1iQistraaores, no mudar a cultura organizacional devido ao profundo conhecimento que têm dela. Em- geral, nem, sempre bora de maneira lenta, a ação empreendi- da por eles modificando o status quo se fará apresentam características sentir de forma profunda e duradoura. Teóricos e pesquisadores da atualidade & z ~ . , comportamentals que os enfatizam cada vez mais insistentemente que a cultura organizacional seja, na sua essência, o conjunto de realidades social- mente construídas. Esse enfoque admite que os significados a ela atribuídos estão muito mais nas cabeças e mentes dos seus membros do que explicitadas em conjun- tos concretos de regras ou formas especí- ganizações. Devido à escassez de boa lideran- ficas de relacionamento. Os aspectos mui- ça, a maioria de nós supõe que ela seja algo to mais caracteristicamente operacionais que poucas pessoas podem exercer. No entan- são o reflexo daquilo que se encontra den- to, o potencial para liderar encontra-se laten- tro do pensamento comum, como propõe te em muitos de nossos administradores, Morgan: "A estrutura organizacional, re- mais do que julgamos. A liderança não é uma gras, políticas, objetivos, missões, descrições habilidade mágica limitada a uns poucos. Na de cargos e procedimentos operacíonais padro- verdade, a capacidade e o desejo de liderar nizados desempenham igualmente uma fim- com freqüência se perdem por falta de opor- ção interpretativa. Isso porque atuam como tunidade e pouco investimento nos processos pontos primários de referência devido à ma- e recompensas que incentivam o seu cresci- neira pela qual as pessoas pensam neles e dão mento. Assim, é uma questão de extrair, de- sentido aos contextos nos quais trabalham. senvolver e fomentar essas capacidades laten- Embora tipicamente vistos entre as caracterís- tes. Contudo, muitas organizações, o mais ticas mais objetivas de uma organização, uma das vezes, fazem o oposto, ativamente deses- visão representada enfatiza que eles são artifí- timulando as qualidades de liderança com cios culturais que ajudam a esboçar a realida- sua negligência e preocupação com a 'admi- de habitual dentro de uma organização". 22 nistração' e preservação do status quo. O Isso permite concluir que cada aspecto in- preço que pagam é uma grande perda de po- tegrante do todo organizacional conserva tencial de liderança e, por sua vez, de eficácia 22. MORGAN, G. Images of 0[- uma respeitável dose de significado ima- organizacional, que jamais se materiali- ganization. London: Sage Publi- ginário e implícito que pode ser entendi- zam".23 Talvez, por isso, na maioria das cations, 1986, p. 132. do como o sentido dado à realidade que organizações se tenham dificuldades de 23. CONGER, J. A. Líder caris- é, por sua vez, compartilhado por todos assistir mudanças organizacionais con- mático. São Paulo: Makron os integrantes dessa cultura. duzidas por verdadeiros líderes. Books, 1991, p. 167. RAE. v.34 • n.3 • Mai./Jun. 1994 111
  • 11. i1~[J ARTIGO Aceitar que os administradores qualifi- isso, invadidos em suas individualidades cados como verdadeiros líderes possam ou ameaçados em sua auto-estima. O vín- influenciar na mudança da cultura orga- culo da liderança é assim visto como um nizacional pelo fato de conhecerem as relacionamento de duplo sentido e feito conseqüências simbólicas de suas ações em pé de igualdade sem que a ação de não é admitir que sejam capazes de mani- um jamais pressuponha a passividade do pular a realidade das pessoas ou das or- outro. Os autores, em geral, concordam ganizações através dos valores por ele que o carisma seja uma qualidade atribuí- promovidos. É possível construir ou mo- da ao líder pelos subordinados e não uma dificar a realidade, mas sempre e em últi- característica inerente à sua personalida- ma análise, será essa realidade que ditará de. "Acredita-se que o carisma seja resultado as linhas mestras das ações organizacio- das percepções que os seguidores têm sobre as nais que não necessariamente seguem o qualidades e comportamentos dos líderes. Es- curso da própria escolha do líder. sas percepções são influenciadas pelo contexto Administrar através da liderança mo- da situação de liderança, assim como pelas ne- difica a perspectiva de uma filosofia orga- cessidades dos seguidores individuais e coleti- nizacional de maior rigidez. A sofistica- vos". 24 Trata-se, portanto, de uma atribui- ção tecnológica não tem deixado lugar ção feita pelos seguidores que toma como para a adoção de sistemas de controle base certos comportamentos manifestos como aqueles que foram originalmente do líder. recomendados pelos representantes da Quanto mais se aprofundam as pesqui- antiga escola de Administração Científica. sas a respeito das características do víncu- A produção totalmente automatizada e lo líder-seguidor, mais se evidencia o eletronicamente controlada vai expulsan- peso praticamente igual que possuem es- do das organizações as tão conhecidas, ul- ses dois elementos integrantes de um trapassadas e desgastadas figuras do ca- mesmo e único processo. Aceitar isso, na pataz, do contramestre, do chefe e, final- prática, é uma questão que pode determi- mente, do patrão. Surgem modelos admi- nar, em grande parte, o sucesso organiza- nistrativos que enfatizam não só a impor- cional. "A confusão entre liderança e autori- tância como também a oportunidade de dade oficial tem efeito letal sobre as grandes uma administração 'flexível, Dentro de organizações. Corporações e repartições gover- muitas outras recomendações é sugerido, namentais, em toda parte, têm executivos que de forma enfática, o achatamento da pirâ- imaginam que o lugar que ocupam nas orga- mide de comando. Com isso é incentiva- nizações lhes deu um corpo de seguidores, e da a eliminação da maior quantidade pos- isso, evidentemente, não acontece. Eles ganha- sível de níveis intermediários de controle ram subordinados. Se os subordinados se tor- e tomada de decisão. Por força do am- narão seguidores, dependerá do fato de o exe- biente de urgência instaurado pelo ritmo cutivo agir como lider"," Inúmeros exem- acelerado de mudanças, a empresa que se plos práticos confirmam a importância de proponha a assegurar a sua sobrevivência aceitar a veracidade dessa suposição. tem que necessariamente agilizar seus O verdadeiro poder está vinculado à procedimentos administrativos. Um teste- habilidade interpessoal, sendo assim an- munho concreto dessa renovação é dado terior ao poder formal e não podendo ser pelo crescente número de organizações confundido com autoritarismo. Personali- que vêm procurando adotar modelos par- dades autoritárias tendem naturalmente a ticipativos de gestão. reagir através de ações que privilegiam A revisão atual dos modelos de lide- esquemas punitivos, tais como penalida- rança tem permitido a retomada do con- des financeiras ou avaliações negativas ceito de carisma, bem como uma reavalia- dos subordinados. Esse poder se liga, ção das fontes de póderdentro das orga- portanto, à credibilidade que o adminis- 24. YUKL, G. A. Leadership in trador consegue construir em tomo de si. organizations. USA: Prentice- nizações. A simples posição hierárquica Hall, 1989, p. 205. não parece garantir mais a obediência dos "Credibilidade, como reputação, é algo conse- seguidores. Inquestionavelmente, o poder guido com o tempo. Ela não vem automatica- 25. GARDNER, J. W. Liderança. maior do líder emana do fato de que seus mente com o cargo ou título. Começa cedo em Rio de Janeiro: Distribuidora Record de Serviços de Impren- seguidores o acompanham de maneira nossas vidas e carreiras. As pessoas tendem a sa, 1990, p. 19. habitual sem se sentirem diminuídos por assumir, de início, que alguém que foi elevado 112 RAE • v. 34 • n. 3 • Mai./Jun. 1994
  • 12. LIDERANÇA: A ADMINISTRAÇÃO DO SENTIDO a um certo status na vida, galgou degraus, ou não existem líderes universais que se atingiu objetivos significativos, merece a sua saiam bem em qualquer circunstância, confiança. Mas a confiança completa é assegu- com qualquer tipo de grupo ou em qual- rada (ou não) somente depois que as pessoas quer espécie de ambiente organizacional. tiveram a oportunidade de conhecer mais o in- Num exame mais amplo do histórico divíduo. Os alicerces da credibilidade são da liderança é possível destacar três construídos tijolo por tijolo". 26 Esse clima de grandes aspectos que podem ser conside- credibilidade pressupõe transparência e rados como verdadeiramente relevantes. honestidade de princípios evidentes nas Numa primeira fase, atribui-se à figura ações do líder em qualquer momento e do líder traços pessoais específicos, certos diante de qualquer desafio. tipos de motivações e determinados esti- O autoconhecimento, a segurança pes- los comportamentais considerados como soal e a maturidade emocional parecem elementos-chave do processo de lideran- ser ingredientes indispensáveis ao líder. É ça. Para os primeiros teóricos, os subordi- importante que não se sinta ameaçado ao nados são entendidos como sujeitos que admitir a influência ascendente que ema- sofrem passivos a ação do líder. na do seguidor sobre ele. A influenciação exercida em duplo sentido e a transfor- mação mútua são requisitos de valor in- questionável quando se pretende liderar eficazmente."Nunca deveríamos fingir sobre aquilo que não sabemos, não deveríamos ter medo de perguntar e aprender com pessoas in- feriores e deveríamos ouvir cuidadosamente os quadros de pessoal nos mais baixos níveis. Ser um aluno, antes de tornar-se professor, apren- organização ) . confere ao der com os quadros de níveis inferiores antes de expedir ordens" . 27 rder quª,lidades . CONCLUSÕES carismátiGas"'qop o torna Yi; .• Como foi possível acompanhar através da evolução histórica pela qual passaram mestre da mudança. ~ . os principais estudos e pesquisas sobre li- derança, muitos trabalhos sistemáticos fo- ram desenvolvidos. Cada um desses dife- rentes enfoques foi responsável pelo en- Em segundo lugar na seqüência de es- tendimento de aspectos indispensáveis ao tudos, surge a figura do liderado como processo de interação e influência entre o uma importante variável interferindo de- líder e seu seguidor, tanto no sentido des- cisivamente no contexto da eficácia dos cendente como ascendente. líderes. Os seguidores são reconhecidos A principal lição que se pode extrair como possuidores de necessidades, moti- dessas inúmeras abordagens continua vações e expectativas que devem ser co- sendo aquela que, de maneira geral, apli- nhecidas pelo líder, cabendo a ele facili- ca-se à grande maioria dos temas que tar que esse seguidor chegue aos fins que compõem o corolário dos assuntos liga- deseja. Passa-se a aceitar que liderar efi- dos às ciências comportamentais. A lide- cazmente esteja ligado à aquiescência dos rança, como tantos outros aspectos, guar- liderados. Os líderes precisam ser favora- da dimensões profundas que nascem das velmente percebidos por seus seguidores características próprias às personalidades a fim de exercerem sua influência. de cada um. Não pode existir, portanto, Finalmente, depois de explorados os 26. KOUZES, J. M., POSNER, B. Z. CredilJitity - how leaders gain uma fórmula única, uma receita pronta aspectos que dizem respeito à comple- and tose it, why peopte demand ou uma solução geral que forneça com mentaridade do vínculo líder-subordina- it. San Francisco: Jossey-Bass precisão matemática aquelas recomenda- do, são levantadas as variáveis e princi- Publishers, 1993. ções capazes de promover a indiscutível pais características do ambiente que po- 27. BURNS, J. M. Op. cít., p. eficácia dos líderes. A proposta é de que dem facilitar ou comprometer a eficácia 238. RAE • v. 34 • n. 3 • Mai./Jun. 1994 113
  • 13. jJ~tJARTIGO da liderança. Descobre-se que as organi- no status quo. Sua ação na mudança da zações podem treinar seus líderes, mas cultura, diferentemente daquela em- que além disso precisam garantir condi- preendida por consultores externos e ad- ções para que os potenciais de liderança ministradores em geral, se faz sentir de se transformem em ações efetivas. maneira duradoura, embora gradual e Em condições organizacionais propí- lenta. cias, os líderes são aqueles que têm o po- O mais importante em todas essas der de atuarem como reais agentes da mu- constatações não é apontar aquilo que dança organizacional. Sendo profundos ainda está por ser feito dentro do campo conhecedores do significado contido na de estudo da liderança. Já existem condi- rede de simbologias dessa cultura, pos- ções suficientes para retirar de todas es- suem condições de agir sintonizando as sas descobertas o produto que podem expectativas dos contribuintes individuais oferecer em termos do que representam e grupais com o sentido dessa dimensão de verdadeiramente científico a respeito organizacional percebida por eles. do assunto. É preciso compreender a im- Cabendo ao líder eficaz administrar o portância de se contar com líderes real- sentido que seus seguidores atribuem à mente eficazes para que as organizações cultura organizacional, ele pode interferir possam se suplantar. • BARDARACO JR., J., ELLS- • CROSBY, P. B. Liderança- • HUNT, J. G. Leadership - a ctioloçy, USA, v. 31, p . WORTY, R. Leadership and a arte de tornar-se um exe- new synthesis. London: 739-60, 1982. quest for integrity. Boston, cutivo. São Paulo: Makron Sage Publications, 1991. Harvard Business, 1989. Books, 1991. + MISUMI, J. The behavioral + JEsuíNO, J. D. Processo de science of leadership. Ann • BASS, B. M. Handbook of liderança. Lisboa: Livros Arbor, Michigan University • DAVIS, K., NEWSTROM, J. feadershíp: survey of Horizonte Ltda., 1987. Human Bettsviot at work - - Michigan Press, 1985. theory and research. New organizational bebsvioi. York: Free Press, 1990. .• LÉVI-LEBOYER, C. A Crise • NANUS, B. Visionary tee- New York: McGraw-Hill, 1969. das motivações. São Pau- .dership> creating a compet- + BASS, B. M. Leadershíp lo: Atlas, 1994. fing sense of direction for and performance beyond yout organizatíon. San expectations. New York: • DECY, E. L., RYAN, R. M. • MANZ, C. Selt-leadershíp: Francisco: Jossey Bass Pu- Free Press, 1985. fntrinsec motivetton and toward an expanded theory blishers, 1992. selt determinatíon in nu- of self-influence process in • BERGAMINI, C. Motivação. man behavior. New York: orpanízatíons. Academy of • RETO, L. Leadershíp en si- São Paulo: Atlas, 1991. Plenum Press, 1985. management Review, USA, tustions égalítaíres. Le cas v. 11, p. 585-600, 1986. des cooperatives de produ- • BRYMAN, A. Carisma and + EVANS, M. G. Extensions of tions au Portugal, Bélgique, leadershíp in organizations. path-goaltheory of motiva- • MCLEAN, J. M., WETZEL, Tese apresentada à Univer- London: Sage Pualícatons, tion. Journal of applied W. Leadership, magia, sité Catholique de Louvain, 1992. myth or mefhod? USA: Faculté de Psychologie So- psychology, USA, v. 59, p. 172-78,1974. American Management As- ciale du Travail, Louvain-Ia- + CLEMENS, J. K., MEYER, sociation, 1992. Neuve, 1991. D. F. Liderança, um toque • HOLLANDER, E. P. Leaders, clássico. São Paulo: Best + MEANING of Working Inter- • SIEVERS, B. Work, Death Seller, 1989. çroups and tnüuence. New national team. The mee- and Life Itself - Essays of York:Oxford University ning ot work: an interna tio- management and organiza- + CONGER, J., KANUNGO, R. Press, 1964. na! víew. New York: Acade- tion. Berlin: Water de N. loward a behavioral mic Press, 1987 . Gryter & Co, 1994. theory of carismatic lea- • HOUSE, R. J., MllCHEL, T. dership in organizational R. Path-goal theory of lea- •. MINNER, J. B. The uncer- • STOGDILL, R. M. Hand- settings. Academy of ma- dership. Contemporary Bu- tain future of leadership book os leadership. New nagement Review, USA, v. siness, v. 3, p. 81-98, concept revisions and ela- York McMillan/Free Press, 12, n. 4, p. 639-47, 1987. 1974. rifications. Persona/ Psy- 1974.Q 114 Artigo recebido pela Redação da RAE em março/94, avaliado e aprovado para publicação em maio/94.