O documento descreve a dicotomia entre o campo e a cidade na obra do poeta português Cesário Verde. Apresenta três pontos principais: 1) Cesário Verde encontra no campo a vitalidade, alegria e saúde que lhe faltam na cidade doente; 2) Na cidade há miséria, sofrimento e poluição, enquanto o campo é um espaço puro e fértil; 3) Poemas como "Nós" e "O Sentimento de um Ocidental" ilustram a preferência do poeta pelo campo e a visão negativa
2. «De acordo com a mitologia grega, Anteu, filho da Gea (Terra) e de Poseidon , era um
gigante muito possante, que vivia na região de Marrocos, e que era invencível enquanto
estivesse em contacto com a mãe-terra. Desafiava todos os recém-chegados em luta
até à morte. Vencidos e mortos, os seus cadáveres passavam a ornar o templo do Deus
do mar, Poseidon. Hércules, de passagem pela Líbia, entrou em combate contra Anteu
e, descobrindo o segredo da sua invencibilidade, conseguiu esmagá-lo, mantendo-o no
ar.»
Em Cesário Verde, o campo, simboliza a terra, apresenta-se fértil. Quando Cesário
verde se encontra a viver afastado da terra da sua infância, como refere no
poema Em Petiz, e enfraquecido pela cidade doente, o poeta reencontra as suas
energias ao regressar para o campo. Por isso, também, como refere em Nós, desde
as epidemias que se manifestaram em Lisboa, a sua família passou a encontrar no
espaço rústico o retempero das suas forças.
O mito de Anteu permite-nos caracterizar o novo vigor que se manifesta quando há
um reencontro com as suas origens, com a mãe-terra. Deste modo, poderemos
falar deste mito em Cesário Verde na medida em que o contacto com o campo
parece reanimá-lo, dando-lhe forças, energias e saúde. O mito de Anteu surge em
Cesário de modo a transmitir o seu esgotamento originado pelo afastamento da
cidade para se refugiar no campo.
Dicotomia Campo - Cidade
3. O contacto com o campo na infância de Cesário Verde determina a visão que ele
nos dá e a sua preferência. Ao contrário de outros poetas anteriores, Cesário Verde
afirma que campo não tem um aspeto idílico, paradisíaco, bucólico, susceptível de
devaneio poético, mas sim um espaço real, concreto, autêntico, que lhe confere
liberdade. O campo é um espaço de vitalidade, alegria, beleza, vida saudável, onde
se podem observar os camponeses no seu trabalho diário , aí as alegrias
manifestam-se face aos prazeres da vida, enquanto as tristezas surgem quando os
acontecimentos não seguem um curso normal.
Para Cesário Verde, o campo está associado à vida, à fertilidade, à vitalidade, ao
rejuvenescimento, já que é visto como um local puro, saudável e fértil. O campo
também pode surgir, através da visão transfiguradora do poeta, a invadir
simbolicamente a cidade.
Dicotomia Campo - Cidade
4. Na cidade, o ambiente físico, cheio de contrastes, apresenta ruas esburacadas,
casas apalaçadas, edifícios cinzentos e sujos…
O ambiente humano é caracterizado pelos calceteiros, cuja coluna nunca se
endireita, pelos padeiros cobertos de farinha, pelas vendedeiras enfezadas, pelas
burguesinhas…
É neste sentido que podemos reconhecer a capacidade de Cesário Verde em trazer
para a poesia o real quotidiano do homem citadino.
A cidade, é descrita pelo poeta como um local aonde fogem da febre e da cólera,
onde há miséria constrangedora, sofrimento, poluição, cheiros nauseabundos.
O espaço citadino “ empareda” o poeta, incomoda-o tal como o incomodam os
pobres trabalhadores que na cidade procuram melhores condições de vida.
O poema que melhor retrata o ambiente citadino é “ O Sentimento dum Ocidental”.
Dicotomia Campo - Cidade
6. Os Poemas de Cesário Verde invocam o que este sente relativamente ao Campo e
à Cidade, tanto que se a cidade é um local onde se sente oprimido, é natural que os
seres femininos que aí se encontrem sejam apresentados sob uma imagem
denegrida e em contraste com as figuras femininas do campo.
Os poemas onde são mais visíveis esta Dicotomia Campo-Cidade, são o “Nós”,
“Em Petiz”, “ O Sentimento dum Ocidental”…
A preferência do poeta pelo campo está expressa nos seus poemas , onde
desaparecem a aspereza e a doença ligadas à vida citadina e surge o elogio ao
ambiente campesino.
A arte de Cesário Verde é, pois, reveladora de uma preocupação social e intervém
criticamente. O campo oferece ao poeta uma lição de vida multifacetada que ele
transmite com objetividade e realismo. Trata-se, pois, de uma visão concreta do
campo e não da abstração da Natureza.
A força inspiradora de Cesário é a terra-mãe, sendo nela que Cesário encontra os
seus temas.
Dicotomia Campo - Cidade
7. “ O Sentimento de um Ocidental”
Nas nossas ruas, ao anoitecer,
Há tal soturnidade, há tal melancolia,
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.
O céu parece baixo e de neblina,
O gás extravasado enjoa-me, perturba-me;
E os edifícios, com as chaminés, e a turba
Toldam-se duma cor monótona e londrina.
Batem os carros de aluguer, ao fundo,
Levando à via-férrea os que se vão. Felizes!
Cesário Verde Ocorrem-me em revista, exposições, países:
Madrid, Paris, Berlim, Sampetersburgo, o mundo!
Cesário Verde
Dicotomia Campo - Cidade
8. “Pinto quadros por letras, por sinais"
Cesário Verde
“Eu sou como muitos que estão no meio de um grande
ajuntamento de gente e completamente isolados e abstratos. A
mim o que me rodeia é o que me preocupa"
Cesário Verde
Dicotomia Campo - Cidade