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O CÓDIGO DO
APOCALIPSE
Adam Blake
Tradução
Camila Fernandes
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Parte 1
Uma Trombeta
Profere o
Julgamento
O codigo do demonio_miolo.indd 9 27/01/2014 14:27:47
10
CAPÍTULO 1
Heather Kennedy, ex­‑detetive sargento Kennedy, registro 4031 na Di-
visão de Combate ao Crime Organizado da Polícia Metropolitana de
Londres, agora sem posto, saiu do hall de entrada do número 32 da
London Bridge, também conhecido como The Shard1
, ou “Caco de
Vidro”, para o brilhante sol do verão. Ela desceu os degraus muito
apressadamente, mas, quando finalmente chegou ao fim da escadaria,
deteve­‑se no meio da calçada, sendo empurrada aleatoriamente pelos
transeuntes, sem saber o que faria a seguir.
Sua mão direita doía.
Sua mão direita doía porque os nós dos dedos sangravam.
Os nós dos dedos sangravam porque ela os havia ferido ao acertar o
queixo do homem que até cinco minutos atrás havia sido seu empregador.
Era uma equação cujo resultado ela ainda estava tentando entender.
Kennedy estava decepcionada com o acesso de fúria que tivera, e
muito surpresa. Normalmente, se o cliente tivesse feito algum co-
mentário sexista, tentado tirar uma casquinha dela ou mesmo con-
testado sua integridade profissional, ela teria lidado com a situação
de modo hábil e calmo, permanecendo imperturbável. De forma al-
guma, e sob nenhuma circunstância, ela teria dado um murro na
cara dele.
No entanto não conseguia se lembrar da última vez que se senti-
ra normal.
Massageando cuidadosamente a mão machucada, ela embarcou no
fluxo constante de trabalhadores e turistas. Queria ir para casa e colo-
car a mão na água fria. Em seguida, queria tomar um bom drinque,
bem forte, seguido por um mais forte ainda.
O único problema desse plano todo era Izzy. Kennedy não tinha
certeza de quão pior seu dia poderia ficar sem chegar ao fundo do
poço. Ou de quais seriam as consequências de topar com Izzy bem no
meio de sua jornada de trabalho, sem aviso prévio. Da última vez que
isso havia acontecido...
1
O prédio mais alto da Europa ocidental, projetado pelo arquiteto italiano Renzo
Piano e coberto por 11 mil placas de vidro. (N. T.)
O codigo do demonio_miolo.indd 10 27/01/2014 14:27:47
O CÓDIGO DO APOCALIPSE
11
Kennedy afastou na marra esses pensamentos, mas não antes de
mais uma vez encarar a imagem mental que estivera tentando evitar e
de ser atingida pelos mesmos sentimentos que essa visão sempre ins-
pirava: uma raiva amarga sobreposta a um terrível vazio, como uísque
barato servido com gelo.
Então, ela não foi para casa. Foi para um bar — um desses esta-
belecimentos de rede sem a menor personalidade, com um nome
falso e extravagante que mencionava barris — e tomou aquele uísque
não metaforicamente, mas para valer. Melancólica, ela o sorveu de-
vagar, perguntando­‑se o que viria a seguir. O trabalho na Sandhurst
Ballantyne era para ter sido o começo de algo bom, mas agredir fisica-
mente seu patrão reduzira significativamente as chances de ele indicá­
‑la para os amigos. Então, aqui estava ela, com uma lista de clientes
zerada, uma agenda de compromissos vazia e uma namorada infiel
(talvez compulsivamente infiel). Seu futuro parecia brilhante.
A aparência bela e escultural de Kennedy e seu longo cabelo loiro
logo atraíram a atenção dos outros bebedores diurnos. Seria isso ou
aquele fetiche chato de sempre com a mulher de uniforme. O dela era
severo ao extremo — um rígido macacão de segurança, azul como o
dos policiais, com botas militares pretas —, no entanto, para alguns
homens, o fato de ser um uniforme já é o suficiente.
Ela estava acabando de liquidar o uísque quando seu telefone to-
cou. Pegou­‑o com um lampejo momentâneo de esperança: às vezes,
uma porta se abria logo depois que outra se fechava.
Mas era Emil Gassan. Ele era um acadêmico, historiador de uma
universidade escocesa que ela conhecera no decorrer de um caso antigo
— e essa era a única coisa sobre a qual ele sempre queria falar com ela.
Kennedy recusou a chamada e jogou o telefone de volta na bolsa.
Pensou em passar o dia vagando à toa por Londres: visitar uma
galeria, assistir a um filme. Contudo, isso seria ridículo. Ela não estava
matando aula, estava desempregada, e não havia nenhum sentido em
adiar suas decisões. Endireitou os ombros e se dirigiu para casa.
Sua casa ficava em Pimlico — era uma curta viagem de metrô,
mas, em seguida, uma caminhada razoavelmente longa até a Vauxhall
Bridge Road. Longa o suficiente, de todo jeito, para que, até o momen-
to em que chegasse à porta da frente do seu apartamento, Kennedy ti-
vesse revisto aquela pergunta retórica anterior. Onde exatamente era o
fundo do poço hoje em dia? E será que ela queria mesmo saber?
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Adam Blake
12
Fez muito barulho com a chave na fechadura, arrastou os pés no
chão e fechou a porta com um baque alto demais. Quando estava na
metade do corredor, Izzy saiu para cumprimentá­‑la — da sala de es-
tar, e não do quarto, para alívio de Kennedy.
Mais baixa e mais morena do que Kennedy, Izzy era ao mesmo tempo
muito mais intensa: lasciva e ágil, dotada de um apelo sexual que seus lar-
gos quadris não faziam nada para diminuir. Irradiando surpresa e ao mes-
mo tempo desconfiança enquanto encarava Kennedy no outro extremo do
corredor, ela retirou uma mecha de cabelo de seus olhos cor de chocolate.
— Oi — disse ela.
— E aí? — Kennedy replicou.
— Eu não ganho um beijo?
Era uma boa pergunta, mas Kennedy não tinha uma boa resposta
— nem uma boa evasão. Sentindo­‑se culpada, avançou pelo corredor,
beijou Izzy na bochecha e, em seguida, deixou­‑a para trás.
Izzy se virou para vê­‑la passar.
— Você veio mais cedo pra casa — comentou. — O que foi, está me
vigiando agora?
— Não — respondeu Kennedy. — Por quê, eu deveria estar?
— Não.
— Tá bom, então.
Elas pareciam ter chegado ao fim daquela conversa. Kennedy en-
trou na sala e dirigiu­‑se à cozinha para colocar um pouco de gelo em
um copo. Mas, quando abriu o armário de bebidas e viu­‑se encarando
seu próprio olhar invertido no espelho, perdeu um pouco do seu en-
tusiasmo. Já havia tomado um drinque hoje. Ficar de porre às 11 da
manhã seria praticamente um grito de socorro.
Izzy a havia seguido para o quarto.
— Algum problema? — perguntou ela. — Não era pra você estar
hoje na Sandbosta Valentina?
— É Sandhurst Ballantyne.
— Isso. Eles.
— Eu estava. — Kennedy voltou­‑se para encará­‑la, garrafa na mão.
— E você entregou seu relatório?
— Eu tentei.
Izzy inclinou a cabeça para um lado e pareceu intrigada de um jeito
cômico. Em outro estado de espírito, Kennedy teria achado isso atraen-
te. Agora, isso só conseguia irritá­‑la.
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O CÓDIGO DO APOCALIPSE
13
— O cliente recusou­‑se a ser informado. Ele me pediu para não
apresentar o relatório. E se ofereceu para me pagar um “bônus por
bom desempenho” se eu abafasse o caso e desse à porcaria do depar-
tamentozinho dele um atestado de saúde.
— Não entendi — disse Izzy.
Kennedy colocou a garrafa de uísque de volta no armário, depois a
tirou novamente e, por fim, serviu­‑se de uma dose.
— Negação plausível2
— ela murmurou enquanto servia. — O re-
latório diz que há pelo menos uma, provavelmente duas pessoas na
empresa usando informações privilegiadas para valorizar ações do
cliente. Se o Kenwood souber disso, vai ter de fazer algo a respeito. E,
uma vez que um dos dois safados — o definitivo, não o provável — é
o chefe dele, ele decidiu que prefere não saber.
— Então, por que é que ele contratou você, afinal? — Izzy exigiu
saber. — Isso é idiotice.
Kennedy concordou e tomou um gole do forte uísque. Fez uma
careta. O gosto de Izzy para bebida era notoriamente horrendo. Mas
ela seguiu em frente mesmo assim, esvaziando o copo.
— A condescendência faz parte do trabalho dele. O cara precisava
fingir que estava fazendo alguma coisa, mas tinha esperança de que eu
voltasse de mãos vazias. Então, quando não fiz isso...
Ela ficou em silêncio.
— Então, você aceitou? — perguntou Izzy.
— Aceitei o quê?
— O bônus por bom desempenho?
Kennedy suspirou e baixou o copo vazio.
— Não, Izzy, não aceitei. Ele queria tirar o dele da reta e colocar o
meu no lugar. Se eu aceitasse o suborno, e se um ou dois anos depois
houvesse um inquérito interno ou uma investigação da FSA, ele pode-
ria dizer que eu soneguei informações. Então ele ficaria livre e o de-
partamento de combate à fraude viria atrás de mim.
— Ah. Tá bom. — A expressão de Izzy se alterou. — E depois?
Kennedy mostrou a ela os nós dos dedos cobertos com seu próprio
sangue coagulado. Izzy tomou a mão dela e beijou­‑a.
2
Negação plausível (plausible deniability) é um termo legal, criado pela CIA durante o
governo Kennedy. Descreve o poder de uma pessoa ou instituição de negar conheci-
mento de um assunto ou ocultar informações de seus superiores para protegê­‑los de
escândalos: se alegarem não saber, não podem ser culpados. (N. T.)
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Adam Blake
14
— Fez bem, amor — disse. — A menos que ele resolva te processar.
Será que ele faria isso?
— Acho que não. Sempre que estou a sós com um cliente, eu ligo um
gravador. Então, tenho toda a proposta dele numa fita de áudio. E vou
enviar o relatório de qualquer maneira, para ele, o chefe dele e o CEO da
empresa. Infelizmente, ele ainda me devia metade do meu pagamento.
E, quando saí, não parecia que ele estivesse para me passar um cheque.
— Tem algum outro cliente em vista?
— Estou sem clientes em vista até o Dia do Juízo Final, Izzy. Eu
esperava que esse trabalho me conseguisse um monte de indicações
para outras empresas da cidade com problemas de segurança que não
soubessem resolver sozinhas. Mas acho que isso não vai mais rolar.
Izzy parecia perversamente animada com a má notícia.
— Tá legal — disse ela. — Assim você pode ser minha teúda e man-
teúda por um tempo e viver dos meus ganhos imorais.
Ela estava brincando, mas Kennedy não conseguiu rir. Não se sen-
tia capaz de dar a Izzy a menor colher de chá.
— Francamente — disse ela —, isso soa como ir parar no quinto
dos infernos.
Percebeu nesse momento que viera para casa procurando uma bri-
ga — uma sessão de acusações sobre fidelidade e responsabilidade que
provavelmente pareceria catártica nos primeiros cinco minutos, mas
depois disso seria como se estivesse enfiando punhados de vidro que-
brado goela abaixo da mulher que ela deveria amar. Precisava sair
dali. Não havia lugar para ir, na verdade; apesar disso ela tinha de sair.
— Eu vou lá pra baixo — murmurou. — Vou encaixotar mais umas
coisas do meu pai. Se eu ficar aqui, vou acabar atrapalhando você.
— Ou me inspirando — Izzy disse, contudo Kennedy já estava ca-
minhando em direção à porta. — Heather...
— Estou bem.
— Não preciso começar o expediente agora mesmo. A gente pode...
— Eu disse que estou bem.
Ela percebeu outro som escapar de Izzy. Um suspiro, talvez, ou
apenas sua respiração. Não olhou para trás.
No andar de baixo, em seu próprio apartamento, ela jogou objetos
aleatórios dentro de caixas, abriu portas de guarda­‑roupas e fechou­‑as
novamente com estardalhaço, andou de um cômodo a outro em uma
inútil pantomima de agitação e propósito.
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O CÓDIGO DO APOCALIPSE
15
Ir morar com Izzy parecera a coisa mais lógica a fazer depois que o
pai de Kennedy morrera. No último ano e meio de sua vida, Izzy ha-
via sido a enfermeira de Peter Kennedy, ou talvez sua babá, ou talvez
ambas. Fora isso que as unira. Na época, Kennedy era uma estrela em
ascensão na divisão de detetives da polícia: seus turnos eram longos e
imprevisíveis, e ela precisava de alguém à mão que pudesse vir rapida-
mente assim que ela pedisse. Izzy era perfeita, pois, embora já tivesse
um emprego, tratava­‑se de um disque­‑sexo. Bancar a gatinha manho-
sa para que outros se masturbassem era um trabalho leve que ela po-
deria fazer praticamente de qualquer lugar. Tudo de que precisava
como equipamento era um telefone celular e uma mente suja, e pos-
suía ambos.
O processo por meio do qual as duas se tornaram amantes havia
sido simplesmente inevitável. Começara mais ou menos na época em
que Kennedy havia sido demitida de supetão da polícia, o que signifi-
cava que ela passara a ficar muito mais tempo no apartamento en-
quanto Izzy estava lá. O relacionamento evoluíra ao longo dos meses
seguintes e, após Peter finalmente morrer, parecia até natural que
Kennedy fosse morar com Izzy. O apartamento que ela dividia com o
pai parecia uma peça de museu, impregnado com as memórias asso-
ciadas a ele. Sair dele — ainda que só mudasse para o andar de cima
— havia sido, para ela, como uma fuga de pelo menos algumas dessas
memórias.
No entanto a fuga dependia de uma porção de coisas e tinha suas
próprias regras. Uma delas era que você não pode fugir de coisas que
ainda carrega consigo. Por mais apelativo e degradante que fosse o
trabalho de Izzy, ela nunca pensara em deixá­‑lo. Gostava muito de
sexo, e, quando não estava fazendo, gostava de falar a respeito.
E, no final das contas, gostava de fazer sexo mesmo quando Kennedy
não estava por perto.
A vida conjunta delas estagnara: tornara­‑se um retrato vivo do
adultério, com Izzy correndo para se cobrir, um rapaz acanhado ten-
tando entender o que estava acontecendo e Kennedy parada à porta,
atordoada, de olhos arregalados.
Izzy nunca prometera ser fiel e, de todo modo, traçara uma distin-
ção absoluta entre mulheres e homens. Mulheres eram amantes, par-
ceiras, almas gêmeas. Homens eram uma coceirinha à qual ela ocasio-
nalmente cedia. Kennedy nunca pensara que exigir promessas fosse
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Adam Blake
16
necessário ou mesmo desejável. Na acidentada história de sua vida
sexual, um era o número mais alto de amantes que ela já mantivera ao
mesmo tempo, e geralmente parecera o suficiente.
Precisava perdoar Izzy. Ou precisava terminar tudo com algum co-
mentário afiado do tipo “olha só o que você está perdendo, querida”.
Não conseguia fazer nenhuma das duas coisas. A culpa passivo­
‑agressiva, a censura e o afastamento ranzinza constituíam o meio­
‑termo horrendo e inescapável.
O telefone de Kennedy tocou. Ela olhou de relance para a tela e viu
que era Emil Gassan novamente. Desistiu de evitá­‑lo e atendeu, mas
apenas para lhe dizer que era um mau momento para conversar.
Gassan falou primeiro:
— Heather, tentei falar com você o dia todo. Estou tão feliz por fi-
nalmente ter conseguido!
Ela tentou interrompê­‑lo:
— Professor...
— Emil — ele contrapôs. Ela o ignorou. Não queria entrar nessa
de usar o primeiro nome com Gassan: de alguma forma, parecia er-
rado que aquele estudioso seco e agressivo até mesmo tivesse um
primeiro nome.
— Professor, eu realmente não posso conversar agora. Estou no
meio de algo importante.
— Ah.
Gassan pareceu mais desanimado do que de costume, e Kennedy
sentiu um remorso momentâneo. Sabia por que ele estava ligando e o
que isso significava para ele. Tinha a ver com aquele antigo caso. O
maior achado de sua carreira acadêmica era algo que ele jamais pode-
ria discutir, sob risco de morte, exceto com ela. De vez em quando, ele
precisava desabafar. Precisava contar­‑lhe coisas que ambos já sabiam e
ela tinha de ouvir — como um serviço personalizado. Isso lhe dava
uma medida do tipo de coisa que Izzy deveria enfrentar ao longo de
um dia de trabalho.
— É só que... sabe... as pressões profissionais — ela contemporizou.
— Te ligo depois, esta semana.
— Então sua agenda está cheia? — Gassan perguntou. — Não está
livre para aceitar um trabalho?
— Aceitar...? — Kennedy sentiu­‑se aturdida e, apesar de seu próprio
humor azedo, deliciada. — Que foi, está precisando de um detetive,
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O CÓDIGO DO APOCALIPSE
17
Emil? Quer que eu encontre um livro perdido da sua biblioteca ou
coisa assim?
— Sim. Mais ou menos. Se você estivesse livre, eu lhe pediria para
fazer um trabalho, muito delicado e muito bem pago, para meu atual
empregador.
Kennedy hesitou. Parecia hipócrita e ridículo mudar de ideia de
forma tão rápida e sem­‑vergonha, mas ela realmente precisava do di-
nheiro. Mais que isso, precisava de algo que a mantivesse fora do apar-
tamento até que conseguisse decidir o que faria em relação a Izzy.
— Então, quem é seu atual empregador, professor?
Ele contou, e as sobrancelhas dela se ergueram. Definitivamente
aquilo era maior que um escândalo político.
— Vou para aí agora mesmo — Kennedy disse.
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O Código do Apocalipse é Revelado

  • 1. O CÓDIGO DO APOCALIPSE Adam Blake Tradução Camila Fernandes O codigo do demonio_miolo.indd 1 27/01/2014 14:27:46
  • 2. Parte 1 Uma Trombeta Profere o Julgamento O codigo do demonio_miolo.indd 9 27/01/2014 14:27:47
  • 3. 10 CAPÍTULO 1 Heather Kennedy, ex­‑detetive sargento Kennedy, registro 4031 na Di- visão de Combate ao Crime Organizado da Polícia Metropolitana de Londres, agora sem posto, saiu do hall de entrada do número 32 da London Bridge, também conhecido como The Shard1 , ou “Caco de Vidro”, para o brilhante sol do verão. Ela desceu os degraus muito apressadamente, mas, quando finalmente chegou ao fim da escadaria, deteve­‑se no meio da calçada, sendo empurrada aleatoriamente pelos transeuntes, sem saber o que faria a seguir. Sua mão direita doía. Sua mão direita doía porque os nós dos dedos sangravam. Os nós dos dedos sangravam porque ela os havia ferido ao acertar o queixo do homem que até cinco minutos atrás havia sido seu empregador. Era uma equação cujo resultado ela ainda estava tentando entender. Kennedy estava decepcionada com o acesso de fúria que tivera, e muito surpresa. Normalmente, se o cliente tivesse feito algum co- mentário sexista, tentado tirar uma casquinha dela ou mesmo con- testado sua integridade profissional, ela teria lidado com a situação de modo hábil e calmo, permanecendo imperturbável. De forma al- guma, e sob nenhuma circunstância, ela teria dado um murro na cara dele. No entanto não conseguia se lembrar da última vez que se senti- ra normal. Massageando cuidadosamente a mão machucada, ela embarcou no fluxo constante de trabalhadores e turistas. Queria ir para casa e colo- car a mão na água fria. Em seguida, queria tomar um bom drinque, bem forte, seguido por um mais forte ainda. O único problema desse plano todo era Izzy. Kennedy não tinha certeza de quão pior seu dia poderia ficar sem chegar ao fundo do poço. Ou de quais seriam as consequências de topar com Izzy bem no meio de sua jornada de trabalho, sem aviso prévio. Da última vez que isso havia acontecido... 1 O prédio mais alto da Europa ocidental, projetado pelo arquiteto italiano Renzo Piano e coberto por 11 mil placas de vidro. (N. T.) O codigo do demonio_miolo.indd 10 27/01/2014 14:27:47
  • 4. O CÓDIGO DO APOCALIPSE 11 Kennedy afastou na marra esses pensamentos, mas não antes de mais uma vez encarar a imagem mental que estivera tentando evitar e de ser atingida pelos mesmos sentimentos que essa visão sempre ins- pirava: uma raiva amarga sobreposta a um terrível vazio, como uísque barato servido com gelo. Então, ela não foi para casa. Foi para um bar — um desses esta- belecimentos de rede sem a menor personalidade, com um nome falso e extravagante que mencionava barris — e tomou aquele uísque não metaforicamente, mas para valer. Melancólica, ela o sorveu de- vagar, perguntando­‑se o que viria a seguir. O trabalho na Sandhurst Ballantyne era para ter sido o começo de algo bom, mas agredir fisica- mente seu patrão reduzira significativamente as chances de ele indicá­ ‑la para os amigos. Então, aqui estava ela, com uma lista de clientes zerada, uma agenda de compromissos vazia e uma namorada infiel (talvez compulsivamente infiel). Seu futuro parecia brilhante. A aparência bela e escultural de Kennedy e seu longo cabelo loiro logo atraíram a atenção dos outros bebedores diurnos. Seria isso ou aquele fetiche chato de sempre com a mulher de uniforme. O dela era severo ao extremo — um rígido macacão de segurança, azul como o dos policiais, com botas militares pretas —, no entanto, para alguns homens, o fato de ser um uniforme já é o suficiente. Ela estava acabando de liquidar o uísque quando seu telefone to- cou. Pegou­‑o com um lampejo momentâneo de esperança: às vezes, uma porta se abria logo depois que outra se fechava. Mas era Emil Gassan. Ele era um acadêmico, historiador de uma universidade escocesa que ela conhecera no decorrer de um caso antigo — e essa era a única coisa sobre a qual ele sempre queria falar com ela. Kennedy recusou a chamada e jogou o telefone de volta na bolsa. Pensou em passar o dia vagando à toa por Londres: visitar uma galeria, assistir a um filme. Contudo, isso seria ridículo. Ela não estava matando aula, estava desempregada, e não havia nenhum sentido em adiar suas decisões. Endireitou os ombros e se dirigiu para casa. Sua casa ficava em Pimlico — era uma curta viagem de metrô, mas, em seguida, uma caminhada razoavelmente longa até a Vauxhall Bridge Road. Longa o suficiente, de todo jeito, para que, até o momen- to em que chegasse à porta da frente do seu apartamento, Kennedy ti- vesse revisto aquela pergunta retórica anterior. Onde exatamente era o fundo do poço hoje em dia? E será que ela queria mesmo saber? O codigo do demonio_miolo.indd 11 27/01/2014 14:27:47
  • 5. Adam Blake 12 Fez muito barulho com a chave na fechadura, arrastou os pés no chão e fechou a porta com um baque alto demais. Quando estava na metade do corredor, Izzy saiu para cumprimentá­‑la — da sala de es- tar, e não do quarto, para alívio de Kennedy. Mais baixa e mais morena do que Kennedy, Izzy era ao mesmo tempo muito mais intensa: lasciva e ágil, dotada de um apelo sexual que seus lar- gos quadris não faziam nada para diminuir. Irradiando surpresa e ao mes- mo tempo desconfiança enquanto encarava Kennedy no outro extremo do corredor, ela retirou uma mecha de cabelo de seus olhos cor de chocolate. — Oi — disse ela. — E aí? — Kennedy replicou. — Eu não ganho um beijo? Era uma boa pergunta, mas Kennedy não tinha uma boa resposta — nem uma boa evasão. Sentindo­‑se culpada, avançou pelo corredor, beijou Izzy na bochecha e, em seguida, deixou­‑a para trás. Izzy se virou para vê­‑la passar. — Você veio mais cedo pra casa — comentou. — O que foi, está me vigiando agora? — Não — respondeu Kennedy. — Por quê, eu deveria estar? — Não. — Tá bom, então. Elas pareciam ter chegado ao fim daquela conversa. Kennedy en- trou na sala e dirigiu­‑se à cozinha para colocar um pouco de gelo em um copo. Mas, quando abriu o armário de bebidas e viu­‑se encarando seu próprio olhar invertido no espelho, perdeu um pouco do seu en- tusiasmo. Já havia tomado um drinque hoje. Ficar de porre às 11 da manhã seria praticamente um grito de socorro. Izzy a havia seguido para o quarto. — Algum problema? — perguntou ela. — Não era pra você estar hoje na Sandbosta Valentina? — É Sandhurst Ballantyne. — Isso. Eles. — Eu estava. — Kennedy voltou­‑se para encará­‑la, garrafa na mão. — E você entregou seu relatório? — Eu tentei. Izzy inclinou a cabeça para um lado e pareceu intrigada de um jeito cômico. Em outro estado de espírito, Kennedy teria achado isso atraen- te. Agora, isso só conseguia irritá­‑la. O codigo do demonio_miolo.indd 12 27/01/2014 14:27:47
  • 6. O CÓDIGO DO APOCALIPSE 13 — O cliente recusou­‑se a ser informado. Ele me pediu para não apresentar o relatório. E se ofereceu para me pagar um “bônus por bom desempenho” se eu abafasse o caso e desse à porcaria do depar- tamentozinho dele um atestado de saúde. — Não entendi — disse Izzy. Kennedy colocou a garrafa de uísque de volta no armário, depois a tirou novamente e, por fim, serviu­‑se de uma dose. — Negação plausível2 — ela murmurou enquanto servia. — O re- latório diz que há pelo menos uma, provavelmente duas pessoas na empresa usando informações privilegiadas para valorizar ações do cliente. Se o Kenwood souber disso, vai ter de fazer algo a respeito. E, uma vez que um dos dois safados — o definitivo, não o provável — é o chefe dele, ele decidiu que prefere não saber. — Então, por que é que ele contratou você, afinal? — Izzy exigiu saber. — Isso é idiotice. Kennedy concordou e tomou um gole do forte uísque. Fez uma careta. O gosto de Izzy para bebida era notoriamente horrendo. Mas ela seguiu em frente mesmo assim, esvaziando o copo. — A condescendência faz parte do trabalho dele. O cara precisava fingir que estava fazendo alguma coisa, mas tinha esperança de que eu voltasse de mãos vazias. Então, quando não fiz isso... Ela ficou em silêncio. — Então, você aceitou? — perguntou Izzy. — Aceitei o quê? — O bônus por bom desempenho? Kennedy suspirou e baixou o copo vazio. — Não, Izzy, não aceitei. Ele queria tirar o dele da reta e colocar o meu no lugar. Se eu aceitasse o suborno, e se um ou dois anos depois houvesse um inquérito interno ou uma investigação da FSA, ele pode- ria dizer que eu soneguei informações. Então ele ficaria livre e o de- partamento de combate à fraude viria atrás de mim. — Ah. Tá bom. — A expressão de Izzy se alterou. — E depois? Kennedy mostrou a ela os nós dos dedos cobertos com seu próprio sangue coagulado. Izzy tomou a mão dela e beijou­‑a. 2 Negação plausível (plausible deniability) é um termo legal, criado pela CIA durante o governo Kennedy. Descreve o poder de uma pessoa ou instituição de negar conheci- mento de um assunto ou ocultar informações de seus superiores para protegê­‑los de escândalos: se alegarem não saber, não podem ser culpados. (N. T.) O codigo do demonio_miolo.indd 13 27/01/2014 14:27:47
  • 7. Adam Blake 14 — Fez bem, amor — disse. — A menos que ele resolva te processar. Será que ele faria isso? — Acho que não. Sempre que estou a sós com um cliente, eu ligo um gravador. Então, tenho toda a proposta dele numa fita de áudio. E vou enviar o relatório de qualquer maneira, para ele, o chefe dele e o CEO da empresa. Infelizmente, ele ainda me devia metade do meu pagamento. E, quando saí, não parecia que ele estivesse para me passar um cheque. — Tem algum outro cliente em vista? — Estou sem clientes em vista até o Dia do Juízo Final, Izzy. Eu esperava que esse trabalho me conseguisse um monte de indicações para outras empresas da cidade com problemas de segurança que não soubessem resolver sozinhas. Mas acho que isso não vai mais rolar. Izzy parecia perversamente animada com a má notícia. — Tá legal — disse ela. — Assim você pode ser minha teúda e man- teúda por um tempo e viver dos meus ganhos imorais. Ela estava brincando, mas Kennedy não conseguiu rir. Não se sen- tia capaz de dar a Izzy a menor colher de chá. — Francamente — disse ela —, isso soa como ir parar no quinto dos infernos. Percebeu nesse momento que viera para casa procurando uma bri- ga — uma sessão de acusações sobre fidelidade e responsabilidade que provavelmente pareceria catártica nos primeiros cinco minutos, mas depois disso seria como se estivesse enfiando punhados de vidro que- brado goela abaixo da mulher que ela deveria amar. Precisava sair dali. Não havia lugar para ir, na verdade; apesar disso ela tinha de sair. — Eu vou lá pra baixo — murmurou. — Vou encaixotar mais umas coisas do meu pai. Se eu ficar aqui, vou acabar atrapalhando você. — Ou me inspirando — Izzy disse, contudo Kennedy já estava ca- minhando em direção à porta. — Heather... — Estou bem. — Não preciso começar o expediente agora mesmo. A gente pode... — Eu disse que estou bem. Ela percebeu outro som escapar de Izzy. Um suspiro, talvez, ou apenas sua respiração. Não olhou para trás. No andar de baixo, em seu próprio apartamento, ela jogou objetos aleatórios dentro de caixas, abriu portas de guarda­‑roupas e fechou­‑as novamente com estardalhaço, andou de um cômodo a outro em uma inútil pantomima de agitação e propósito. O codigo do demonio_miolo.indd 14 27/01/2014 14:27:47
  • 8. O CÓDIGO DO APOCALIPSE 15 Ir morar com Izzy parecera a coisa mais lógica a fazer depois que o pai de Kennedy morrera. No último ano e meio de sua vida, Izzy ha- via sido a enfermeira de Peter Kennedy, ou talvez sua babá, ou talvez ambas. Fora isso que as unira. Na época, Kennedy era uma estrela em ascensão na divisão de detetives da polícia: seus turnos eram longos e imprevisíveis, e ela precisava de alguém à mão que pudesse vir rapida- mente assim que ela pedisse. Izzy era perfeita, pois, embora já tivesse um emprego, tratava­‑se de um disque­‑sexo. Bancar a gatinha manho- sa para que outros se masturbassem era um trabalho leve que ela po- deria fazer praticamente de qualquer lugar. Tudo de que precisava como equipamento era um telefone celular e uma mente suja, e pos- suía ambos. O processo por meio do qual as duas se tornaram amantes havia sido simplesmente inevitável. Começara mais ou menos na época em que Kennedy havia sido demitida de supetão da polícia, o que signifi- cava que ela passara a ficar muito mais tempo no apartamento en- quanto Izzy estava lá. O relacionamento evoluíra ao longo dos meses seguintes e, após Peter finalmente morrer, parecia até natural que Kennedy fosse morar com Izzy. O apartamento que ela dividia com o pai parecia uma peça de museu, impregnado com as memórias asso- ciadas a ele. Sair dele — ainda que só mudasse para o andar de cima — havia sido, para ela, como uma fuga de pelo menos algumas dessas memórias. No entanto a fuga dependia de uma porção de coisas e tinha suas próprias regras. Uma delas era que você não pode fugir de coisas que ainda carrega consigo. Por mais apelativo e degradante que fosse o trabalho de Izzy, ela nunca pensara em deixá­‑lo. Gostava muito de sexo, e, quando não estava fazendo, gostava de falar a respeito. E, no final das contas, gostava de fazer sexo mesmo quando Kennedy não estava por perto. A vida conjunta delas estagnara: tornara­‑se um retrato vivo do adultério, com Izzy correndo para se cobrir, um rapaz acanhado ten- tando entender o que estava acontecendo e Kennedy parada à porta, atordoada, de olhos arregalados. Izzy nunca prometera ser fiel e, de todo modo, traçara uma distin- ção absoluta entre mulheres e homens. Mulheres eram amantes, par- ceiras, almas gêmeas. Homens eram uma coceirinha à qual ela ocasio- nalmente cedia. Kennedy nunca pensara que exigir promessas fosse O codigo do demonio_miolo.indd 15 27/01/2014 14:27:47
  • 9. Adam Blake 16 necessário ou mesmo desejável. Na acidentada história de sua vida sexual, um era o número mais alto de amantes que ela já mantivera ao mesmo tempo, e geralmente parecera o suficiente. Precisava perdoar Izzy. Ou precisava terminar tudo com algum co- mentário afiado do tipo “olha só o que você está perdendo, querida”. Não conseguia fazer nenhuma das duas coisas. A culpa passivo­ ‑agressiva, a censura e o afastamento ranzinza constituíam o meio­ ‑termo horrendo e inescapável. O telefone de Kennedy tocou. Ela olhou de relance para a tela e viu que era Emil Gassan novamente. Desistiu de evitá­‑lo e atendeu, mas apenas para lhe dizer que era um mau momento para conversar. Gassan falou primeiro: — Heather, tentei falar com você o dia todo. Estou tão feliz por fi- nalmente ter conseguido! Ela tentou interrompê­‑lo: — Professor... — Emil — ele contrapôs. Ela o ignorou. Não queria entrar nessa de usar o primeiro nome com Gassan: de alguma forma, parecia er- rado que aquele estudioso seco e agressivo até mesmo tivesse um primeiro nome. — Professor, eu realmente não posso conversar agora. Estou no meio de algo importante. — Ah. Gassan pareceu mais desanimado do que de costume, e Kennedy sentiu um remorso momentâneo. Sabia por que ele estava ligando e o que isso significava para ele. Tinha a ver com aquele antigo caso. O maior achado de sua carreira acadêmica era algo que ele jamais pode- ria discutir, sob risco de morte, exceto com ela. De vez em quando, ele precisava desabafar. Precisava contar­‑lhe coisas que ambos já sabiam e ela tinha de ouvir — como um serviço personalizado. Isso lhe dava uma medida do tipo de coisa que Izzy deveria enfrentar ao longo de um dia de trabalho. — É só que... sabe... as pressões profissionais — ela contemporizou. — Te ligo depois, esta semana. — Então sua agenda está cheia? — Gassan perguntou. — Não está livre para aceitar um trabalho? — Aceitar...? — Kennedy sentiu­‑se aturdida e, apesar de seu próprio humor azedo, deliciada. — Que foi, está precisando de um detetive, O codigo do demonio_miolo.indd 16 27/01/2014 14:27:47
  • 10. O CÓDIGO DO APOCALIPSE 17 Emil? Quer que eu encontre um livro perdido da sua biblioteca ou coisa assim? — Sim. Mais ou menos. Se você estivesse livre, eu lhe pediria para fazer um trabalho, muito delicado e muito bem pago, para meu atual empregador. Kennedy hesitou. Parecia hipócrita e ridículo mudar de ideia de forma tão rápida e sem­‑vergonha, mas ela realmente precisava do di- nheiro. Mais que isso, precisava de algo que a mantivesse fora do apar- tamento até que conseguisse decidir o que faria em relação a Izzy. — Então, quem é seu atual empregador, professor? Ele contou, e as sobrancelhas dela se ergueram. Definitivamente aquilo era maior que um escândalo político. — Vou para aí agora mesmo — Kennedy disse. O codigo do demonio_miolo.indd 17 27/01/2014 14:27:47