Situações conflituosas são inevitáveis no dia-a-dia do ser humano, nos mais variados
contextos – comercial, familiar, laboral, etc. – e, com vista a alcançar uma convivência mais
harmoniosa, é necessária uma gestão adequada dos mesmos, com vista à sua prevenção
e resolução. No caso específico de Portugal, essa gestão está prevista no Artigo 202 da Constituição da República Portuguesa, e pode ser feita tanto pelos Tribunais, como por outros instrumentos não jurisdicionais de resolução de conflitos. Estes são formas de
negociação assistidas, baseadas no diálogo, que incluem métodos adversariais, não adversariais – como a Conciliação e a Mediação - e mistos – a Arbitragem.
1. MEDIAÇÃO E O SEU
PROCEDIMENTO
Licenciatura em Relações
Humanas e Comunicação
Organizacional EaD
2º ano - 1º Semestre
UC Gestão de Conflitos e
Mediação Laboral
Docente Susana Monteiro
David Oliveira nº 1190992
Laura Matos nº 1181154
Leiria
Ano Letivo 2019/2020
2. Índice
g
Introdução ................................................................................................................. 1
1. Mediação............................................................................................................... 2
1.1. Breve história.................................................................................................. 2
1.2. Conflito e Mediação........................................................................................ 2
1.3. O Conceito de Mediação ................................................................................ 4
1.4. Mediação em Portugal.................................................................................... 5
1.4.1. Modelos de Mediação ............................................................................... 6
2. Caraterísticas da Mediação................................................................................... 8
2.1. Elementos constituintes.................................................................................. 8
2.1.1. O Mediador ............................................................................................... 8
2.1.2. Os Mediados ............................................................................................. 9
2.2. Princípios norteadores.................................................................................... 9
2.3. Aplicações da Mediação............................................................................... 12
3. Fases da Mediação............................................................................................. 14
3.1. Juan Carlos Vezzulla.................................................................................... 15
Apresentação do mediador e das regras .......................................................... 15
Exposição do problema pelos mediados........................................................... 15
Resumo e ordenação inicial do problema ......................................................... 16
Descoberta dos interesses ainda ocultos.......................................................... 16
Criação de ideias .............................................................................................. 16
Acordo............................................................................................................... 16
3.2. Cátia Marques Cebola.................................................................................. 17
Pré-mediação.................................................................................................... 17
Mediação em sentido estrito ............................................................................. 18
Pós-mediação ................................................................................................... 19
3.3. Lei da Mediação ........................................................................................... 19
Conclusão ............................................................................................................... 21
Bibliografia .............................................................................................................. 22
Anexos .................................................................................................................... 24
Anexo I - Lei n.º 29/2013, de 19 de Abril (versão actualizada) ............................ 25
3. David Oliveira nº. 1190992
Laura Matos n.ª 1181154
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Introdução
Situações conflituosas são inevitáveis no dia-a-dia do ser humano, nos mais variados
contextos – comercial, familiar, laboral, etc. – e, com vista a alcançar uma convivência mais
harmoniosa, é necessária uma gestão adequada dos mesmos, com vista à sua prevenção
e resolução. No caso específico de Portugal, essa gestão está prevista no Artigo 202 da
Constituição da República Portuguesa, e pode ser feita tanto pelos Tribunais, como por
outros instrumentos não jurisdicionais de resolução de conflitos. Estes são formas de
negociação assistidas, baseadas no diálogo, que incluem métodos adversariais, não
adversariais – como a Conciliação e a Mediação - e mistos – a Arbitragem.
A utilização destas formas de Resolução Alternativa de Litígios (RAL) tem vindo a
aumentar, por trazerem vantagens, nomeadamente diminuirem o número de casos
pendentes nos Tribunais, serem menos dispendiosos, agilizarem os processos e, no caso
específico da Mediação, trabalharem as relações humanas, indo à raiz da questão – que
muitas vezes a legislação desvaloriza -, para evitar conflitos no futuro.
O presente trabalho de investigação debruça-se sobre o procedimento da Mediação,
referindo alguns aspetos essenciais para se conhecer o processo, e focando nas suas
fases. Estas são momentos ao longo do percurso do processo de Mediação, que incluem
várias etapas que, devido à adaptabilidade, flexibilidade e fluidez do mesmo, não têm de
seguir de seguir uma ordem rígida, pois é imprescindível moldar-se às circunstâncias
específicas de cada situação.
Começamos por expor brevemente os momentos mais relevantes da história da
Mediação, cujos “(…) conceito e prática (…) são tão antigos como os conflitos entre duas
pessoas ou dois grupos de indivíduos.” (Schneebalg, in Vasconcelos-Sousa, 2002).
Seguem-se os conceitos de conflito e de Mediação, pilares para o entendimento do
procedimento, após o que se apresentará uma breve resenha acerca da Mediação em
Portugal.
Posteriormente, referimos as caraterísticas da Mediação, mencionando os seus
elementos, princípios e algumas das suas aplicações práticas.
Por último, uma vez que não há consenso relativamente ao número específico de
fases do procedimento por entre variados autores, concentrámos a nossa atenção em dois
modelos de estrutura, o de Juan Carlos Vezzulla e o de Cátia Marques Cebola, bem como
no caso português previsto na Lei da Mediação.
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2
1. Mediação
1.1. Breve história
Vários autores defendem que a prática da Mediação surgiu há centenas de anos
atrás, nos primórdios da civilização, antes da história escrita (Kovach, 2004, in Faleck et
al., n.d.). Esta teoria tem fundamento: visto que o aparecimento de conflitos decorre da
vida em grupo, ambos - conflito e Mediação - devem ter origem na Pré-História.
Na China e no Japão, há séculos atrás, a Mediação era utilizada como meio principal
de resolução de conflitos, e não um meio alternativo, porque um resultado “ganha-perde”
não era aceitável por estas culturas (Kovach, 2004, in Faleck et al., n.d.; Schneebalg, in
Vasconcelos-Sousa, 2002). Também era igualmente empregue em muitas outras culturas
- cristãs, judaicas, islâmicas, hinduístas, budistas - e grupos - como os pescadores
escandinavos, os kibutzim israelitas, tribos africanas (Faleck et al., n.d.; Schneebalg, in
Vasconcelos-Sousa, 2002). O seu uso, de acordo com Vezzulla, tinha como propósito a
busca pela harmonia e a preservação da paz (in Faleck et al., n.d.).
Com a abolição da Monarquia Absoluta, e o advento dos Regimes Democráticos,
deu-se a separação dos poderes anteriormente concentrados no Rei, sendo que somente
o Poder Judiciário poderia aplicar a Justiça. A Mediação foi, pois, esquecida em termos
constitucionais. A sua utilização foi retomada devido ao desenvolvimento da justiça
comunitária e à resolução de conflitos trabalhistas nos Estados Unidos da América, devido
a ser essencial resolver os conflitos com celeridade, pois não o fazer podia assinalar o fim
do negócio (Faleck et al., n.d.).
O famoso discurso “Variedades de Processos de Resolução de Disputas” de Frank
Sander, professor de Harvard, na Conferência Roscoe Pound, em 1976, fez constatar que
casos de litígio, em vez de exclusivamente tratados pelos tribunais, poderiam ser
direcionados para outros meios de resolução de disputas, como a Mediação, a Conciliação
e a Arbitragem. Surge, pois então o movimento ADR (Alternative Dispute Resolution),
através do qual os métodos alternativos de resolução de disputas alastraram pelos EUA
(Kovach, 2004, in Faleck et al., n.d.; Schneebalg, in Vasconcelos-Sousa, 2002).
1.2. Conflito e Mediação
Consultando o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, verificamos que a palavra
“conflito” deriva do latim “conflictus”, que significa “choque, embate, combate, luta” (in
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Carvalho, 2015). Tão antigo quanto a Humanidade, o conflito é um fenómeno inerente à
vida em sociedade.
O conflito é comummente dividido em duas categorias, intrapessoais e interpessoais,
sendo que os primeiros “ocorrem no âmbito da individualidade do sujeito, dentro de si,
estando geralmente associados, de forma intrínseca, à consciência do ser, que se encontra
em conflito. Costumam proporcionar manifestas incompatibilidades internas de ideias,
reflexões, pensamentos, valores, emoções e predisposições”, e os segundos “têm sua
origem muitas vezes ligadas a incompatibilidades entre crenças, experiências,
sentimentos, percepções e princípios contrastantes (…) entre dois indivíduos –
pessoa/pessoa –, podendo, no entanto, também ocorrer entre um indivíduo e um grupo ou
entre dois grupos distintos.” (Carvalho, 2015, pp. 21-22). Estes últimos são alvo de
negociações, de modo a solucionar confrontos pontuais e específicos.
Por conseguinte, a definição de conflito é profusa e plural, não existindo grande
consenso. No entanto, há concordância quanto à sua inevitabilidade e à necessidade
premente de mecanismos adequados que possibilitem a sua resolução. Neste sentido, os
conflitos encontram na Mediação o foco da sua resolução – seja uma briga de vizinhos,
uma separação familiar, um desentendimento entre alunos, “(...) fruto de percepções e
posições divergentes quanto a fatos e condutas que envolvem expectativas, valores ou
interesses comuns” (Vasconcelos, 2008, p. 19).
Podemos definir o conflito como um processo de oposição e confronto que pode
ocorrer entre indivíduos ou grupos nas organizações, quando as partes exercem poder na
busca de metas ou objetivos valorizados e se obstruem entre si no progresso do
cumprimento de uma ou mais metas. Contudo, pode-se dizer que conflito em si não é
problema, pois a principal dificuldade é a forma de como lidar com ele. De uma perspetiva
positiva, pode ser encarado como oportunidade de crescimento e aprendizagem:
oportunidade de progresso. No entanto, sob esse prisma, as pessoas que se encontram
em conflito ficam relegadas ao último plano, pois o que realmente importa não são as
pessoas, mas o fim do conflito, que deve ser alcançado a qualquer custo. O fazer justiça
com as próprias mãos reflete, portanto, essa conceção negativa de lidar com o conflito.
Através da Mediação encontramos ferramentas para prevenir conflitos idênticos por
via do esclarecimento de normas, resoluções e promover os comportamentos a adotar para
abordar questões que estiveram na base de conflitos anteriores. Este propósito é obtido
quando se trabalha a relação humana futura e não o conflito momentâneo.
É fundamental perceber que o foco da Mediação não está no conflito em si, mas nas
relações humanas entre as partes. Segundo Vezzulla, “Precisamos trabalhar a relação
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como um todo, temos que pensar nas pessoas e no futuro que desejam construir. Não
estamos aqui para os conflitos, e sim para trabalhar relacionamentos humanos.” (in O
Globo). Centrar a atenção na relação confere à Mediação um carácter Flexível, pois no seu
processo é necessário atender às pretensões das partes e ao que poderá ser a interação
futura em prol de um relacionamento humano futuro o mais saudável possível.
Em suma, “(…) independentemente do motivo, o conflito é inevitável, e a sua
existência não se pode impedir, mas, sim, gerir, encaminhando-se a lida a uma solução
menos danosa possível aos conflitantes. Para a realização dessa tarefa, no entanto, é
imprescindível o conhecimento pelas partes dos motivos do conflito, como ponto de partida
do desenlace do litígio.” (Carvalho, 2015, p. 20).
1.3. O Conceito de Mediação
Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2009), o termo “mediação”
advém do latim “mediatĭo”, que significa “ato ou efeito de mediar”, “ato de servir de
intermediário entre pessoas ou grupos; intervenção, intermédio” (in Carvalho, 2015). A
partir da sua etimologia, conseguimos perceber que o processo de Mediação compreende
duas partes, entre as quais uma terceira parte intervém. Essa intervenção é, ao fim e ao
cabo, o incentivo ao diálogo, de modo a que as pessoas envolvidas no conflito colaborem
para chegar a um acordo.
A Mediação é uma forma de Resolução Alternativa de Litígios (RAL) que, tal como o
nome indica, procura ajudar a alcançar um acordo sem recorrer aos tribunais. São
inúmeras as definições de Mediação. José Vasconcelos-Sousa (2002) afirma que “(…) é
uma variante da negociação, uma forma sofisticada de realização da interacção entre
pessoas, a que chamamos negociação. (…) A mediação é um meio de procura de acordo
em eu as pessoas envolvidas são ajudadas por um especialista que orienta o processo.”
(p. 19).
Adolfo Braga Neto considera-a “(...) uma técnica não adversarial de resolução de
conflitos, por intermédio da qual duas ou mais pessoas (físicas, jurídicas, públicas, etc.)
recorrem a um especialista neutro, capacitado, que realiza reuniões conjuntas e/ou
separadas, com o intuito de estimulá-las a obter uma solução consensual e satisfatória,
salvaguardando o bom relacionamento entre elas”; de acordo com Vezzulla, é “(...) um
conjunto de técnicas e ciências e, essencialmente, uma filosofia diferente de enfrentar os
conflitos que só pode ser coordenada por um mediador em trabalho interdisciplinar” (in
Barbosa. 2014, p. 21).
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No entendimento de Goldberg, Sander, Rogers e Cole (2007), Mediação é “[a]
negotiation carried out with the assistance of a third party (...) [which] has no power to
impose an outcome on disputing parties”; Silvia Barona Vilar (1999) interpreta-a como “[la]
intervención de un tercero, ajeno al conflicto, que asume la función de reunir a las partes y
ayudar a resolver desacuerdos” (in Cebola, 2011, p. 134).
Barbosa (2014) diz que “(...) a mediação é mais do que um método para solucionar
conflitos uma vez que permite manter relações saudáveis ao despertar um clima de
cooperação entre as pessoas que, por sua vez, aprendem a lidar com conflitos futuros.”
(p.21).
Apesar de não haver consenso nas várias definições, verifica-se que todas
mencionam caraterísticas inerentes ao procedimento de Mediação: existência de uma
terceira parte, informalidade, neutralidade, interdisciplinaridade, não-adversarialidade,
preocupação em entender os conflitos.
1.4. Mediação em Portugal
O início da introdução oficial da Mediação em Portugal ocorreu em 1990, com a
formação de um grupo multidisciplinar, que criou o Instituto Português de Mediação
Familiar. Em parceria com o Centro de Estudos Judiciários, este Instituto realizou – em
1994 – o primeiro Curso de Formação de Mediadores Familiares.
No ano de 1997, o instituto organizou o primeiro Congresso Internacional de
Mediação, intitulado “Mediação, uma Cultura de Paz”, após o que o Ministério da Justiça e
a Ordem dos Advogados celebraram um protocolo que criou, em caráter de experiência,
um projeto cujo objetivo era implantar um serviço de mediação relacionado com a
regulação do poder paternal, “Mediação Familiar em Conflito Parental”.
Seguiram-se outras leis que possibilitaram a aplicação da Mediação de Conflitos,
nesta e em várias outras áreas: a Lei Tutelar Educativa (166/99, de 16 de setembro), mais
tarde alterada pela Lei n.º 4/2015, de 15 de janeiro, tratou da possibilidade de aplicação da
Mediação no caso de menores que praticaram crimes; o Decreto-Lei nº. 146/99
regulamentou esse tipo de resolução extrajudicial de conflitos sobre o consumo; o Decreto
Lei 486/99, que aprovou o Novo Código de Valores Mobiliários, incluiu a implementação
de mecanismos de mediação em conflitos entre investidores e entidades intervenientes
nos mercados de valores mobiliários.
Com a promulgação da Lei 78/2001 foram criados os Julgados de Paz, medida que
marcou a aceitação deste método no ordenamento jurídico português. Esta lei inclui a
mediação como fase processual dos conflitos. Com os Julgados de Paz, procura-se
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desburocratizar o processo judicial português e o seu objetivo é permitir a participação
cívica dos interessados e a estimular a resolução dos litígios por acordo das partes.
Em 2008, o processo de Mediação alcança maior reconhecimento ao ser incluído no
Código Civil, com a Lei n.º 61/2008, de 31 de outubro, que estabeleceu que, antes do início
de qualquer processo de divórcio, os cônjuges tinham de ser informados sobre a existência
e os objetivos dos serviços de mediação familiar.
A ordem jurídica portuguesa, com a Lei 29/2009, vulgarmente conhecida como Lei
do Inventário, incorporou a Diretiva 2008/52/CE, na qual o Parlamento Europeu e o
Conselho da União Europeia promovem a regulação da mediação em matérias civis e
comerciais pelos Estados Membros. Também nesse ano se deu a regulamentação da
Mediação no Código de Processo Civil.
A Lei da Mediação – a Lei 29/2013 de 19 de abril - procurou colmatar lacunas nos
conceitos e no contexto da Mediação de Conflitos e procurou regular todo o processo de
forma mais consistente, passando o instituto Português de Mediação a ter um tratamento
normativo no quadro da lei geral do país. A partir daqui, o Instituto Português de Mediação
passou a abranger a área do direito privado, bem com a organização de sistemas públicos
de Mediação. A Lei 29/2013 unificou, num único diploma, regimes que estavam dispersos,
fazendo-o através de princípios estruturantes e diretrizes de sentido amplo, por forma a
não diminuir a flexibilidade e a informalidade que caracterizam este método. Nela também
se consagra o estatuto dos Mediadores de Conflitos e atribui-se ao Governo competência
para certificar entidades formadoras dos mesmos. (Alves, 2017).
Atualmente, “As partes, o tribunal, o Ministério Público ou as conservatórias do
registo civil podem solicitar o início do procedimento do sistema público de mediação”,
devendo “o procedimento de mediação ser o mais célere possível e concentrar-se no
menor número de sessões.” (Batista, 2016, p. 18)
Apesar de todos os avanços, estatísticas comprovam que: “(…) em média por ano
em Portugal os casos de mediação são escassos, têm pouca aderência, falta de
divulgação, etc” (Batista, 2016, p. 37) o que “(…) acarreta insegurança para as pessoas
que recorrem a este método extrajudicial, porque se demonstra um método desconhecido
do qual não existe feedback das suas vantagens.” (Batista, 2016, p. 43)
1.4.1. Modelos de Mediação
Citando Barbosa (2014), “(…) a Doutrina tem debatido se a mediação deve ser
meramente facilitadora, ou seja, através de um mediador que trabalhe no sentido de
auxiliar as partes a comunicarem, conduzindo-as ao caminho do acordo (…) com uma
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7
intervenção o menos visível embora determinante, ou (…) pelo contrário, interventora, o
que pressupõe uma atitude do mediador mais ativa, não se limitando a facilitar a
comunicação (…), com a possibilidade de apresentação de propostas de acordo. (p.42).
Por outras palavras, a Mediação facilitadora apresenta a característica da não
apresentação de propostas de solução por parte do mediador, centrando-se o seu trabalho
na difícil tarefa de promover o diálogo entre os mediados. Já na interventiva, o mediador
possui um papel mais ativo, sendo de esperar neste tipo de Mediação que o profissional
avance com propostas de solução para solucionar o caso em questão.
Ao fim e ao cabo, o essencial é o Mediador estabelecer a comunicação entre os
mediados. Ainda que o Artigo 26º da Lei da Mediação (ver anexo I) estabeleça que o
mediador se deverá abster de impor qualquer acordo – portanto, um modelo de Mediação
puramente facilitadora -, podem existir vários níveis de intervenção do mesmo, justificando-
se uma postura mais ativa nuns casos, e mais passiva noutros.
No entanto, há quem defenda que a imposição de um acordo pressupõe que se
exerce algum tipo de pressão para que esse acordo seja aceite, o que não é aceitável na
mediação, uma vez que contende com o princípio da voluntariedade; mas a mera
formulação de propostas, pelo contrário, não o faz.
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2. Caraterísticas da Mediação
A Mediação é munida de certas particularidades que a diferenciam de outros meios
de RLA, designadamente no que toca aos seus elementos, aos seus princípios e às suas
aplicações.
2.1. Elementos constituintes
Tal como tem vindo a ser referido, o processo de Mediação integra o conflito, sem o
qual não é necessária; as partes em conflito, os mediados; e a terceira parte interveniente,
o mediador.
Para Cebola (2011) “Los sujetos principales de la mediación son sin duda el mediador
y los mediados, toda vez que sin ellos no hay mediación.” (p. 150). A sua relação é baseada
num círculo de interrelação, anulando a competitividade inerente ao conflito e incitando à
cooperação dos participantes a fim de solucionar o conflito.
2.1.1. O Mediador
“Mediação, método dialógico de resolução de conflitos, consiste na intervenção de
um terceiro, pessoa física, independente, imparcial, competente, diligente e escolhido em
consenso, que coordena reuniões conjuntas ou separadas para que as pessoas envolvidas
em conflitos construam conjuntamente a melhor e mais criativa solução” (Neto, 2010. p.19).
Esta definição de Adolfo Braga Neto tem grande foco na pessoa do mediador. Isto leva-
nos à conclusão que aprofundar-se no conhecimento da mediação é, basicamente, estudar
qual deve ser o comportamento do mediador, pois, de seu profissionalismo dependerá, em
grande proporção, que as partes encontrem o caminho do acordo.
Na opinião de Vezzulla (2001), uma das vias mais efetivas para definir o mediador é
dizendo o que ele não é: o mediador não é um juiz, porque nem impõe um veredito, nem
tem o poder outorgado pela sociedade para decidir pelos demais, nem é um árbitro que
emite um laudo ou decisão. Diferentemente do juiz, ele não é indicado para as partes por
distribuição ou sorteio das causas, mas escolhido pelas partes; não é um negociador que
toma parte na negociação, como interessado direto dos resultados
Na Mediação, o mediador, ainda que seja um perito no tema tratado, e ao contrário
do que sucede na Arbitragem, não pode doutrinar sobre a questão em discussão – é o
“profissional do não-saber”. Ele cuida especialmente da interrelação entre as partes e a
descoberta dos interesses reais de cada uma delas. O árbitro, que tal como o mediador, é
escolhido de comum acordo, pelas partes, não se preocupa com inter-relacionamento.
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Ditará um laudo - somente baseado em dados técnicos - que as partes se comprometeram
a aceitar.
Resumindo, o mediador é um terceiro neutral. Conduz, sem decidir. É neutral em
tudo o que seja esperado dele como intervenção na decisão. E sendo assim, deve fazer
com que as partes envolvidas participem ativamente, na busca das soluções que serão as
que melhor se ajustem a seus interesses, pois ninguém melhor do que as próprias partes
para decidir sobre si. Ficar no meio, entre duas pessoas que brigam, sabemos pelo
conhecimento popular, é ficar como o marisco entre a rocha e o mar, na pior das posições.
Mas essa é a posição do mediador.
Na Mediação tudo deve acontecer entre as partes. O mediador é tão somente a
parteira, que ajuda a dar à luz os reais interesses que possibilitarão o acordo final. o tempo
é marcado pelas partes e o Mediador não pode urgi-las, nem as demorar (Vezzulla, 2001).
É neste equilíbrio frágil que se situa o mediador, com o objetivo de incrementar as
relações futuras das pessoas aplicando um conjunto de técnicas que, apesar de
quantificadas e mensuradas, terão sempre que encontrar na Flexibilidade do processo as
respostas para que o Mediador chame à resolução as partes desavindas, olhando para as
características únicas dos envolvidos e da situação em si.
2.1.2. Os Mediados
Cátia Cebola (2011) sublinha a importância dos mediados, cuja função não é
simplesmente eleger o Mediador, ou aceitar ou não o acordo. A Mediação devolve o
controlo da situação às partes interessadas e, por isso mesmo, são os mediados que
procuram a resolução da disputa, cooperando ativamente para encontrar uma solução.
Contrariamente ao que sucede na Arbitragem e no processo Judicial, na Mediação
os mediados "no son solamente las piezas del tablero de ajedrez que es el conflicto, sino
los verdaderos jugadores que buscan la solución y la victoria de sus posiciones, a través
del diálogo” (Cebola, 2011, p. 150). É isto que diferencia a Mediação de outros métodos
de resolução de conflitos: o papel ativo dos mediados.
2.2. Princípios norteadores
No seu livro Mediação: teoria e prática: guia para utilizadores e profissionais, Juan
Carlos Vezulla refere-se ao processo de Mediação como sendo de natureza flexível, o que,
desde já, pelo que já foi exposto, faz todo o sentido. O processo de Mediação deverá fugir
do estereótipo da estrutura rígida e formal de um Tribunal, pois o foco não está no conflito
em si, mas na resolução dos problemas que possam colocar em causa as relações
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humanas futuras. É neste sentido que, desde o espaço onde decorrerá a Mediação e ao
processo em si, deverão acomodar o mais possível a natureza intrínseca dos Mediados
com os olhos postos à relação futura.
Vezulla (2001) refere que “Podemos saber como começar (semelhante à partida de
xadrez), mas nunca como continuará, nem muito menos como culminará. Cada cliente é
um mundo especial e, segundo isso, o mediador tomará tal ou qual caminho dentro das
regras de não imposição e imparcialidade. Como a mediação deve ficar liberada de rituais
e de demarcações excessivas, somente indicar-se-ão estruturas (unidades de tempo e
objetivo) ou passos possíveis. Com plena consciência de que em muitas mediações se
pularão etapas e em outras nos deteremos, e até, em muitos casos, voltaremos a etapas
já ultrapassadas.” (p. 65).
Adolfo Braga Neto (2010) reforça a importância do caráter voluntário da Mediação,
já que as pessoas a escolheram com a intenção de solucionar os seus conflitos e, portanto,
têm interesse em ser mediadas. Também frisa a confidencialidade do processo, um aspeto
aliciante para os mediados, no sentido que os põe à vontade para falar abertamente da
situação, com a certeza de que tudo o que estiver relacionado com esta – incluindo as
soluções encontradas -, não será exposto a terceiros; em adição a isto, não permite a
interferência de fatores externos que possam comprometer e/ou influenciar o caso. Neto
salienta que “A mediação de conflitos trabalha com pessoas e não casos. (…) Para
compreender a mediação de conflitos, convém apontar o que ela não é. Não é conciliação,
por esta ser um instrumento previsto na legislação e de caráter eminentemente judicial.
Não é aconselhamento, pois o profissional que a coordenará, o mediador, não dá nenhum
conselho, sob pena de colocar em causa sua imparcialidade. Não é terapia, por não ter um
diagnóstico e um tratamento a longo prazo a ser seguido. Não é justiça restaurativa, por
não se restringir à questão penal, muito embora as características e princípios
anteriormente comentados sejam preservados em ambos, evidentemente de maneiras
diferentes.” (p.20).
A Mediação é um método inter e multidisciplinar, que reúne conhecimentos das mais
variadas áreas das Ciências Sociais e Humanas – Direito, Sociologia, Psicologia, etc. – o
que a torna verdadeiramente eficaz na resolução de conflitos (Carvalho, 2015). Aliás,
Vasconcelos-Sousa (2002) defende que “Em matéria de eficácia, não é obrigatório, nem
por vezes desejável, que o mediador seja formado em direito.” (p.24), por ser mais
vantajoso haver um leque de mediadores com diferentes formações e experiências, que
se possam dedicar a litígios que maior relação tenham com as suas competências.
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A já mencionada Lei da Mediação (Lei n.º 29/2013, de 19 de Abril, in
http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=1907&tabela=leis) refere no
Capítulo II, dos artigos 4.º a 9.º (ver anexo I), os princípios gerais aplicáveis a todas as
mediações realizadas em Portugal, independentemente da natureza do litígio que seja
objeto de mediação. A saber:
Princípio da voluntariedade
O procedimento de mediação é voluntário, mas é obrigatório o consentimento
esclarecido e informado das partes para a sua realização, cabendo-lhes a responsabilidade
pelas decisões tomadas no decurso do procedimento.
Princípio da confidencialidade
O procedimento de mediação tem natureza confidencial, devendo o mediador manter
sob sigilo todas as informações de que venha a ter conhecimento, delas não podendo fazer
uso em proveito próprio ou de outrem.
As informações prestadas a título confidencial ao mediador por uma das partes não
podem ser comunicadas, sem o seu consentimento, às restantes partes envolvidas no
procedimento.
O dever de confidencialidade sobre a informação respeitante ao conteúdo da
mediação só pode cessar por razões de ordem pública, nomeadamente para assegurar a
proteção do superior interesse da criança, quando esteja em causa a proteção da
integridade física ou psíquica de qualquer pessoa, ou quando tal seja necessário para
efeitos de aplicação ou execução do acordo obtido por via da mediação, na estrita medida
do que, em concreto, se revelar necessário para a proteção dos referidos interesses.
Princípio da igualdade e da imparcialidade
As partes devem ser tratadas de forma equitativa durante todo o procedimento de
mediação, o que se repercute na exigência de imparcialidade por parte do mediador.
Princípio da independência
O mediador tem o dever de salvaguardar a independência inerente à sua função,
livre de qualquer pressão, seja esta resultante dos seus próprios interesses, valores
pessoais ou de influências externas.
Princípio da competência e da responsabilidade
O mediador de conflitos que viole os deveres de exercício da respetiva atividade,
nomeadamente os constantes da presente lei e, no caso da mediação em sistema público,
dos atos constitutivos ou regulatórios dos sistemas públicos de mediação, é civilmente
responsável pelos danos causados, nos termos gerais de direito.
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Princípio da executoriedade
O acordo de Mediação tem força executiva, sem necessidade de homologação
judicial, desde que se verifique: (1) que o litígio possa ser objeto de mediação e para o qual
a lei não exija homologação judicial; (2) que as partes tenham capacidade para a sua
celebração; (3) que a mediação se realize nos termos legalmente previstos; (4) que o
conteúdo do acordo não viole a ordem pública; (5) que o mediador do acordo final tenha
sido um profissional inscrito na lista de mediadores de conflitos organizada pelo Ministério
da Justiça.
2.3. Aplicações da Mediação
Para Vasconcelos-Sousa (2002), a Mediação pode ser aplicada “(…) na melhoria das
relações entre os cidadãos e entre estes e instituições, organismos de Estado ou
empresas, a nível local.” (p. 49).
No âmbito do sistema público português, pode ser ministrada nos seguintes setores
(Batista, 2016):
Mediação Penal
Complemento informal do sistema de justiça, que tem objetivo incitar à participação
dos cidadãos, dar relevo à vítima, bem como proceder à inserção do infrator na sociedade.
Mediação Laboral
Atua na resolução de conflitos laborais, exceto aqueles em que estejam em causa
direitos indisponíveis, ou resultantes de acidentes de trabalho.
Mediação Familiar
Utilizada em instância de divórcio, como tentativa de resolver desavenças de maneira
satisfatória para ambas as partes, especialmente tendo em conta os interesses das
crianças – se as houver
Mediação Civil e Comercial
Aplicada em litígios civis e comerciais relacionados com patrimonialidade, quando
assim não ocorra, sempre “que as partes possam celebrar transação sobre o direito
controvertido” (Art. 11º da Lei 29/2013).
Enfatizamos, porém, que com a promulgação da Lei da Mediação em 2013, e
segundo o Artigo 3º (ver anexo I), a Mediação deixa de estar restringida ao sistema público:
“Os princípios consagrados no presente capítulo são aplicáveis a todas as mediações
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realizadas em Portugal, independentemente da natureza do litígio que seja objeto de
mediação.” (in PGDL). Alguns exemplos de Mediação no âmbito do sistema privado:
Mediação Organizacional
Aborda os conflitos e a negociação no âmbito das organizações, devendo o
mediador, neste contexto, ter habilidades necessárias para uma adequada gestão do
conflito organizacional.
Alguém que promova o diálogo entre os empregados, lidere novos projetos sob uma
perspetiva neutra, e que ajude a gerar vínculos novos baseados na confiança e na boa
comunicação.
Mediação Escolar
A mediação surge para tentar prevenir e solucionar quaisquer conflitos que ocorram
na instituição de ensino.
O uso da mediação, neste contexto, pode ser para resolver disputas e controvérsias
na escola, entre alunos, docente, diretores, coordenadores e pais, visando uma melhor
convivência.
Mediação Comunitária
Vamos perceber a criação de espaços de diálogos em que as pessoas, com suas
diferenças, vão construir seus lugares na sociedade de forma pacífica, dinâmica e
colaborativa.
Estabelece canais para a intervenção política, institucional e social, permitindo uma
reflexão sobre a realidade atual, preservando as características de uma comunidade
pluralista, igualitária e integradora.
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3. Fases da Mediação
No que toca à forma como está estruturado todo o processo de mediação, não há
consenso entre os vários autores que se debruçaram sobre a temática.
Por exemplo, segundo Folberg e Taylor, os procedimentos encontram-se
organizados em sete fases, cada uma delas com várias etapas. Já Christopher Moore
divide-o em duas fases, a de pré-mediação e a de mediação, contando estas com 5 e 7
etapas, respetivamente, num total de uma dúzia de etapas (in Cebola, 2011).
Todavia, Barbosa defende que “(...) deverão existir sempre alguns momentos
obrigatórios, independentemente da fase do processo em que se verifiquem.” (p. 31) Por
essa razão, alguns peritos defendem que deve haver toda uma preparação anterior ao
início do processo, com um conhecimento anterior das particularidades do litígio por parte
do mediador. Em Portugal, tal não é aplicável, pois o sistema português não prevê o aceder
prévio do mediador ao caso, pelo menos no que diz respeito aos Julgados de Paz: este vai
compreendendo as características do caso à medida que este lhe vai sendo exposto pelos
mediados, com notável exceção de ocorrências que, pela sua complexidade, requerem de
alguma preparação anterior para que seja alcançado acordo.
O Processo de Mediação caracteriza-se pela sua adaptabilidade, flexibilidade e
fluidez, pelo que serão os mediados quem – mediante as circunstâncias do litígio em
questão – decidirão a ordem a seguir, após terem sido informados pelo mediador das
opções disponíveis. Cada processo de Mediação apresenta um percurso único e irrepetível
e tal característica faz parte da natureza do processo, sendo aceitável e desejável, desde
que mantenham sempre intactos os princípios e os objetivos da Mediação.
No presente trabalho destacamos o procedimento de acordo as visões de dois
autores, Vezzulla (2001) e Cátia Cebola (2011), e posteriormente faremos uma
comparação deste último com a Lei da Mediação em Portugal.
Todas as fases da Mediação requerem a implicação dos mediados e a melhoria ou
restabelecimento da comunicação: todos os envolvidos poderão falar e deverão escutar.
Para tal, aplicam-se técnicas como a escuta ativa, em que se deve ter em atenção não só
a comunicação verbal, como à não verbal, pois esta última tende a ser mais honesta; a
empatia, em que se procura entender a realidade do outro, colocar-se na sua situação; o
parafraseamento ou reflexão, em que o mediador reorganiza, sintetiza e confirma o
conteúdo do que foi dito, sem mudar o seu sentido, de forma a que todos compreendam
os factos e os interesses dos envolvidos; o feedback, essencial à escuta ativa, que consiste
no retorno das mensagens recebidas através de troca de informações; as perguntas
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abertas, que visam facilitar a partilha de todos os factos pertinentes ao caso, sem
julgamentos, técnica na qual a questão é colocada de maneira a que toda a resposta seja
da responsabilidade de quem responde, despertando a capacidade de raciocínio dos
envolvidos, o que respeita o não envolvimento ativo do mediador e o envolvimento ativo
dos mediados; o já referido “caucus”, que consiste em reunir separadamente com cada
uma das partes; o resumo, em que o mediador relata, resumidamente, o que foi dito entre
os litigantes, confirmando depois se está correto ou se estes têm algo a acrescentar; o
brainstorming, aplicado quando os mediados não conseguem sugerir opções de resolução
e que visa gerar ideias, estimular a partilha destas, analisando e selecionando aquelas
mais importantes; anotações, em que o mediador aponta o que foi dito pelos envolvidos,
usando as palavras utilizadas por estes, técnica ligada à do resumo; gravações e
filmagens, mais raras, mas eficazes, permitem reavaliar formas de falar e de agir. Estas
são alguma das técnicas à disposição, tendo sempre em atenção que tudo o que for dito
ao longo do processo é sigiloso.
Ao longo do processo, o mediador deverá ser realista e verificar de forma objetiva a
viabilidade das opções selecionadas pelos envolvidos no processo, no qual a ênfase se
centra no próprio conflito e nas pessoas que o vivem.
3.1. Juan Carlos Vezzulla
De acordo com Vezzulla (2001) as seis etapas seguintes são desenvolvidas numa
sequência lógica.
Apresentação do mediador e das regras
A primeira etapa representa a fase em que o mediador se apresenta e deve explicar
como funciona o processo da mediação, assim como os princípios que o regem, tais como
imparcialidade do mediador, confidencialidade de tudo que for discutido, poder de decisão
dos mediados, responsabilidade das partes pela decisão, igualdade de tratamento,
formas de pagamento, caso seja mediação privada, enfim, todas as dúvidas relacionadas
a esse procedimento devem ser explicadas nesta primeira fase.
Exposição do problema pelos mediados
Nesta sequência, a segunda etapa é o momento em que as partes podem falar sobre
o conflito em questão, cabendo a elas, inclusive, a escolha de quem deve começar a falar.
Neste momento o mediador deve ouvi-las com atenção, em igualdade de tempo e
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tratamento. Deve guiar o processo harmoniosamente, facilitando o diálogo entre eles, mas
sem opinar e nem sugerir soluções.
Resumo e ordenação inicial do problema
Na terceira etapa, após perguntar se as partes desejam acrescentar mais alguma
coisa, o mediador deve ser mais cauteloso ainda, pois deve fazer um resumo de tudo que
foi dito, permitindo às partes que interfiram caso percebam algum engano do mediador.
Neste resumo deve conter as palavras dos mediados, porém deve dar ênfase aos pontos
de convergência e aos pontos positivos. Mais uma vez o mediador deve deixar claro que o
conflito é algo natural, inerente aos seres humanos, momentâneo, e que se bem
administrado, pode resultar em crescimento e em posterior momento de paz. Esta terceira
etapa é o momento em que o mediador organiza as ideias, verifica as diferenças e as
semelhanças para trabalhá-las.
Descoberta dos interesses ainda ocultos
A quarta etapa é o momento em que podem surgir agressões mútuas, descontrole
emocional entre os mediados, pois é neste momento que, após ouvir o resumo do
mediador, as partes iniciam um diálogo mais intenso, com mais contradições, acusações,
que nada contribuem para a solução. Nesta fase o mediador deve ser prudente, sensato
para acalmar a possível desarmonia. Cabe ao mediador decidir se são necessárias
reuniões individuais (caucus) para o melhor andamento do processo objetivando alcançar
resultados satisfatórios para as partes.
Criação de ideias
A quinta etapa representa o início das conclusões, na qual o mediador resume as
questões que já foram abordadas e esclarecidas, ajudando as partes a pensar com lógica
em busca de soluções satisfatórias e possíveis de serem cumpridas.
Acordo.
A sexta e última etapa corresponde à elaboração do acordo que deve ser consentido
por ambas as partes, escrito em linguagem clara, de fácil entendimento e que contenha
todas as condições e exigências que foram tratadas pelo diálogo na reunião da mediação.
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3.2. Cátia Marques Cebola
Cátia Cebola (2011) é da opinião de que o procedimento de Mediação se divide em
três momentos essenciais, deixando claro, contudo, que não se trata de um método mágico
que qualquer mediador deverá obrigatoriamente aplicar.
Pré-mediação
Nesta fase prévia, pretende-se informar; organizar; e validar a mediação. O mediador
e as partes reúnem-se, e o primeiro explica aos segundos como funciona a mediação e as
suas regras. É importante que os mediados estejam em pé de igualdade relativamente ao
conhecimento do processo, para que não surjam desconfianças, nem sentimentos de
desigualdade.
Os princípios da Mediação – voluntariedade e confidencialidade – e suas técnicas –
como, por exemplo, o caucus - deverão ser explicitados, bem como a possibilidade de
desistência do procedimento a qualquer momento e a proibição de testemunharem num
eventual processo judicial.
O Mediador deverá manifestar claramente o seu papel, se adota uma postura
interventiva, apresentando propostas de resolução, ou se adota o modelo facilitador.
Deve também ser explicado aos mediados que podem ter apoio de representante
legal - um advogado, ou um assessor jurídico – e das consequências jurídicas da resolução
do litígio por Mediação.
É essencial que as partes estejam bem informadas, e que qualquer dúvida seja
esclarecida, para facilitar a sua participação.
As sessões de Mediação são minuciosamente planeadas - para que assim as
sessões decorram sem incidentes e sejam usufruídas ao máximo –, especificando (1) a
ordem de intervenção dos mediados; (2) interrupções do discurso; (3) intervalos e pausas;
(4) duração do processo; (5) intervenções de terceiros (6) a forma como o desacordo
deverá ser ultrapassado (7) regras relativas a encontros privados com as partes.
Após todas as informações terem sido dadas e de a organização estar feita, deve
proceder-se à validação da Mediação. Primeiro que tudo, o Mediador tem de ouvir as
versões de ambas as partes, de modo a que se possa inteirar da situação na sua
globalidade e assim perceber se o conflito é mediável. Seguidamente, tendo sido reunidas
todas as condições necessárias para dar início às sessões, os participantes têm de assinar
um documento de consentimento, através do qual dão o seu aval para que a disputa seja
resolvida pela Mediação e se estabelecem regras e princípios e respeitar – o caráter
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voluntário da participação, a aceitação do sigilo, objeto e alcance da mediação e previsão
do número de sessões.
Mediação em sentido estrito
Fase relativa à resolução do conflito, cujo objetivo é, pois, o Mediador auxiliar os
mediados a solucionar o mesmo.
Deve ser levada a cabo uma investigação pelo Mediador, para entender as razões
da disputa, focando-se não só nos relatos dos mediados, mas também nos seus
sentimentos e pretensões. Tal irá permitir ao Mediador distinguir o conflito visível, que
abrange os interesses e as posições das partes, e o conflito oculto, que inclui outros
problemas, que ou não querem revelar, ou que não sabem sequer da sua existência.
Esta divisão entre conflitos visíveis e ocultos é frequente, por exemplo, em disputas
relacionadas com o poder paternal, em que o verdadeiro problema (oculto) é muitas vezes
um divórcio mal resolvido.
Também posições e interesses merecem distinção, visto que os primeiros se referem
ao que as partes dizem que querem, e os segundos dizem respeito à razão subjacente à
pretensão dos mediados. Sabendo os interesses das partes, é mais fácil atingir uma
situação ganhar/ganhar. Investigar os verdadeiros interesses é esencial.
Existem processos diretos e indiretos de investigação, que permitem descobrir os
interesses inerentes às posições dos mediados. Exemplo de um método direto é o
questionário, em que o mediador pergunta diretamente às partes quais os seus interesses.
Quanto aos métodos indiretos, existe o testing e o hypothetical modeling. No testing, o
mediador ouve atentamente o mediado e repete o que acha que este disse e, através de
perguntas e respostas dadas, deduz os intereses em causa. O hypothetical modeling
consiste em apresentar diversas opções de acordo que não estão em cima da mesa, mas
que permitem distinguir quais as mais e menos satisfatórias para as partes.
Estando a par dos interesses e das posições das partes, o Mediador orienta a
atenção das mesmas para as questões que importa resolver, distinguindo os verdadeiros
interesses que deverão ser satisfeitos com a resolução.
As partes cooperam então para criar opções de solução que agrade a ambas, o que
os faz tomar consciência que são efetivamente responsáveis pela resolução do problema
e que o acordo final poderá ser tão diferente quanto a sua criatividade o permita. Podem
recorrer, por exemplo, a um brainstorming, sugerindo diversas possibilidades, após o que
o mediador solicita a análise das mesmas.
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Os mediados devem ponderar os prós e contras das várias possibilidades de acordo,
nomeadamente os efeitos económicos e pessoais que implicam. Isto propicia a que os
mediados reflitam sobre soluções e repercussões, pensem no futuro, para que a situação
conflituosa não se repita.
Ainda que a Mediação procure a resolução do conflito, nem sempre sucede a
obtenção de um acordo. O fim do procedimento pode ser (1) um impasse, por falta de
cooperação ou de comunicação entre as partes; (2) uma solução de compromisso, em que
cada uma das partes atinge alguns objetivos em detrimento de outros; (3) um acordo
ganhar-perder, com uma das partes a satisfazer os seus interesses; (4) um acordo ganhar-
ganhar, em que ambos os mediados se sentem satisfeitos com a solução.
Obtido o acordo, o Mediador terá de se certificar que este é da livre vontade das
partes e de assegurar que estar têm consciência do alcance prático da solução.
O acordo de Mediação deverá constar num documento autónomo, que só será
divulgado se os mediados assim o quiserem ou, em caso de necessidade, para obter título
executivo através da sua homologação ou execução forçada direta.
Pós-mediação
Fase inerente à conclusão do acordo, que acrescenta ao procedimento o controlo da
aplicação e cumprimento do acordo obtido pelas partes.
A verificação desta última etapa dependerá obviamente do tipo de disputa, mas
também do acordo concreto previsto pelas partes. Se a solução prevista era o pagamento
de uma determinada indemnização, o papel do mediador na fase de pós-mediação é
praticamente irrelevante, pois não vale a pena retomar a negociação. Se a parte devedora
não cumpre, o caminho a seguir é a execução forçada – exceto, claro, se se verificarem
outras circunstâncias que justifiquem o incumprimento.
3.3. Lei da Mediação
A Lei n.º 29/2013, de 19 de abril explicita, no Capítulo III, dos artigos 16.º a 22.º (ver
anexo I), um Procedimento de Mediação com a mesma sucessão de etapas que o referido
por Cátia Cebola.
O decorrer do processo de Mediação em Portugal apresenta, por regra, uma fase de
pré-mediação, na qual se assiste à introdução dos intervenientes no processo, ao
conhecimento e aceitação das regras que regem o método em questão, à tomada de
algumas decisões que facilitaram a seleção das estratégias mais adequadas e à
preparação da sessão de Mediação propriamente dita. Só após estas é que se prossegue
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para a Mediação propriamente dita, tendo o tempo decorrido entre as diferentes etapas
tido a vantagem extra de atenuar o sentimento de adversidade entre os disputantes.
Durante todo o desenvolver do procedimento relativo à pré-mediação, o mediador
deve procurar mostrar a sua confiabilidade e esclarecer dúvidas atinentes à definição de
Mediação, a como esta se organiza, aos seus fins, às suas regras e se esta será a mais
adequada a resolver o conflito em questão. Por sua vez, os mediados – ao longo do
procedimento de Mediação – devem decidir se querem recorrer a esta forma de resolução
de conflitos, selecionar o mediador que lhes pareça mais eficiente e disponibilizar-se para
tentar alcançar acordo, embora por vezes se torne necessário reunir separadamente com
cada uma das partes, devido a excesso de desconfiança para com a outra parte envolvida
ou a insegurança em relação a todo o processo e ao papel do mediador, de maneira a
clarificar interesses ou partilhar informações de carácter mais melindroso e difícil de
partilhar, embora tal estratégia possa aumentar a desconfiança, por colocar em causa a
imparcialidade do mediador.
No momento que se segue, os litigantes trabalham em conjunto com o mediador,
partilhando os seus pontos de vista sobre o conflito e as necessidades e interesses que
têm, no sentido de chegar a acordo.
Caso o procedimento termine com acordo, este é reduzido a escrito - o Protocolo de
Mediação - e é assinado por todos os participantes.
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Conclusão
Na sociedade atual, em que tudo acontece com grande rapidez, a Mediação, um
processo adaptativo, e, como tal, inerentemente flexível, é a resposta mais cabal para, de
uma forma preventiva, dirimir eventuais conflitos que o Legislador tem ainda dificuldade
em legislar, ou por serem demasiado recentes, ou por não conseguir abarcar todas as
micro-particularidades de cada conflito nos vários contextos em que estes se inserem. No
que concerne à justiça, não se reagiu preventivamente a esta vicissitude.
Pode-se mesmo falar em “crise de justiça”, quando, por exemplo, os prazos legais e
os prazos razoáveis não são respeitados e grande parte da população desconfia ou mesmo
não acredita no bom funcionamento da justiça, i.e., dada a inadaptação dos sistemas
jurídicos face à rápida evolução das sociedades do mundo moderno, podemos afirmar que
nos encontramos numa conjuntura de inflação jurídica. Diversos fatores contribuíram para
esta alegada situação, quer ao nível dos vários sistemas quer ao nível das sociedades em
geral, tornando-se urgente apaziguar este impasse, ou seja, surgiu a necessidade de se
fazer algumas mudanças, de se encontrar alternativas, respostas e soluções para fazer
face a este problema. Na realidade, não existem soluções mágicas, mas parece pertinente
abordar um tema como o da Mediação, enquanto um possível incentivo ou contributo para
o sistema de Justiça.
É necessário dar o devido ênfase ao papel preventivo, como é exemplo na Mediação
Escolar, como forma de aproximar todas as partes num propósito comum que dará as
linhas de orientação para os comportamentos a adotar em situações que geraram já
conflitos. Utilizar soluções já encontradas para resolver conflitos via Mediação como
ferramenta educacional geradora de comportamentos mais amplamente aceitáveis é
fundamental, mas será fácil? Encontramos resistência nos profissionais de Direito, mas o
que para já pode parecer uma ameaça, poderá ser uma oportunidade para atuar mais de
uma forma preventiva junto dos seus constituintes. O caminho de evolução da Mediação
em Portugal é o mesmo que o Poder central pretender estimular porque, do ponto de vista
da Mediação, a Judicial ainda não tem o aspeto preventivo mencionado, mas urge ter como
forma de agilizar os processos de obtenção de Justiça em Portugal.
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