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Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura
Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193
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LULA: AS VARIAÇÕES E O PRECONCEITO LINGÜÍSTICOS
QUE O CERCAM
Juliana Fogaça Sanches Simm*
Letícia Jovelina Storto*
“Que a escola [...] saiba desenvolver a capacidade dos alunos para
acolher as diferenças, com o máximo respeito por aqueles que as
apresentam, sem o sentimento de que estão fazendo concessões
ou sendo compassivos com os diferentes. Simplesmente, porque a
diferença é a parte mais significativa daquilo que nos faz iguais.”
(Irandé Antunes)
RESUMO: Há muito o ensino de língua portuguesa, no Brasil, está restrito ao estudo
da variedade escrita da língua, sem considerar a oralidade e toda a sua importância no
cotidiano dos alunos. Desse modo, temos enraizado uma perspectiva reducionista em
relação à variação lingüística, pois não a tomamos como objeto de pesquisa em sala de
aula, contribuindo para uma noção preconceituosa da língua. Como todos os
brasileiros, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não está isento de apresentar, em
sua linguagem, variações de cunho estilístico e social. Porém, devido ao cargo de
prestígio que assume, tem sido severamente criticado por não apresentar, em
momentos de fala espontânea, um português conforme as normas arbitrariamente
estabelecidas. Balizado na Sociolingüística, o presente trabalho teve como objetivo
principal analisar as variações lingüísticas existentes no discurso do atual presidente
do Brasil, bem como o de verificar o preconceito lingüístico que o envolve. Por meio
das análises efetuadas, foi possível verificar que a linguagem humana é, inerentemente,
heterogênea e variável, demonstrando-se assim até mesmo na figura ilustre de nosso
governante.
PALAVRAS-CHAVE: Sociolingüística; Variação e Preconceito Lingüísticos; Lula.
ABSTRACT: A long time the teaching of Portuguese language, in Brazil, is restricted
to the study of the language`s writing variety, without considering the orality and its
importance in the student`s daily. Thus, we have rooted a reductionist view in relation
to linguistic variation, because we don´t take it as the object of research in the
classroom, contributing to a prejudiced concept of the language. As all brazilian, the
President Luiz Inácio Lula da Silva is not free to present, in his language, stylistic and
social variations. However, due to the important position he has, Lula has been
severely criticized for not presenting, at moments of spontaneous speech, a portuguese
arbitrarily laid down as the standard. Based on Sociolinguistics, the present study had
as principal aim analyze the linguistic variations that exists in the speech of the
current president of Brazil, besides checking the linguistic prejudice that involves his
speech. Through the analysis done, it was possible to verify that the human language
* Alunas do Curso de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem, nível Mestrado, da Universidade Estadual de
Londrina (UEL). Seus respectivos e-mails: julianaf.sanches@hotmail.com, le_storto@yahoo.com.br.
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is, inherently, heterogeneous and variable, corroborated even in the picture of our
illustrious governor.
KEYWORDS: Sociolinguistics; Variation and Linguistic Prejudice; Lula.
Introdução
O ensino de Língua Portuguesa, ao longo de muitos anos, privilegiou apenas o uso da
forma escrita, deixando de lado a língua falada e as variações existentes em todo o Brasil.
Equivocadamente, considerava-se que, em nosso país, não havia dificuldades de
comunicação, pois a língua era vista como homogênea, sem problemas de inteligibilidade. Isso,
infelizmente, se refletiu no ensino, o qual, por muito tempo, não considerava as variações
lingüísticas existentes em todo território nacional.
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 1998, p. 17):
Na década de 60 e início da de 70, o ensino de Língua Portuguesa orientado pela
perspectiva gramatical ainda parecia adequado, dado que os alunos que freqüentavam a
escola falavam uma variedade lingüística bastante próxima da chamada variedade
padrão e traziam representações de mundo e de língua semelhantes às que ofereciam os
livros e textos didáticos.
Geraldi (1997), no entanto, ao discorrer sobre a democratização do ensino, afirma que
“nos anos 1970-1980, o crescimento da população escolar nas escolas públicas do estado de São
Paulo foi da ordem de um milhão e meio de crianças”. Nesse sentido, as escolas deixaram de
receber somente crianças de classe social privilegiada e passaram a receber crianças de todas as
ordens sociais.
Contudo, existia um conflito entre a variedade trazida pelos alunos e a variedade
lingüística escolar. Camacho (1988, p. 38) aponta que:
É inevitável que resulte dessa relação um conflito entre o sistema de regras normativas
imposto pela escola e o padrão lingüístico aceito na comunidade de que a criança é
membro. Pode-se afirmar sem receio que o prejuízo decorrente desse conflito atinge os
setores menos privilegiados da sociedade.
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Com a democratização do ensino, os professores passaram a trabalhar com diferentes
públicos, porém a prática, em sala de aula, nem sempre acompanhou essas mudanças e, por isso,
os conflitos passaram a ser uma constante no ambiente escolar.
Muitos docentes não consideravam as variedades próprias dos grupos sociais dos alunos,
trabalhando apenas a norma padrão nas aulas de Língua Portuguesa. É importante apontar que,
para os PCNs:
Não existem, portanto, variedades fixas: em um mesmo espaço social convivem
mescladas diferentes variedades lingüísticas, geralmente associadas a diferentes valores
sociais. Mais ainda, em uma sociedade como a brasileira, marcada por intensa
movimentação de pessoas e intercâmbio cultural constante, o que se identifica é um
intenso fenômeno de mescla lingüística, isto é, em um mesmo espaço social convivem
mescladas diferentes variedades lingüísticas, geralmente associadas a diferentes valores
sociais (Brasil, 1998, p. 29).
Sabemos que a língua utilizada no dia-a-dia das pessoas não é a mesma imposta, desde o
início da colonização, pela gramática tradicional. Todavia, de acordo com os PCNs (BRASIL,
1998), o aluno, ao iniciar sua vida escolar, já conhece, pelo menos, uma das variedades que
compõe a sua língua materna, ou seja, aquela que aprendeu pelo fato de estar inserido em uma
comunidade de falantes.
Esse documento explica que o estudante é capaz de perceber que as “formas da língua
apresentam variação e que determinadas expressões ou modos de dizer podem ser apropriados
para certas circunstâncias, mas não para outras” (Brasil, 1998, p. 81). Desta forma, o professor
deve estar preparado para ensinar-lhe como utilizar as variações existentes na língua, dependendo
da situação, visto que há formas mais refletidas de falar e, por outro lado, outras mais
relacionadas à realidade do educando.
É preciso deixar claro que o ambiente escolar deve assumir uma postura na qual o
preconceito lingüístico seja banido. Para isso, os PCNs (BRASIL, 1998) apontam que as
variedades lingüísticas que mais se afastam da gramática padrão não podem ser tratadas como
desvios ou incorreções. Pelo contrário, deve ficar claro ao aluno que existem situações nas quais
o falar deve ser adaptado e que não há uma variedade melhor/ pior ou mais correta/ errada do que
outra.
Nesse sentido, objetivamos analisar as variações existentes no discurso do Presidente Luis
Inácio Lula da Silva, haja vista que o seu falar apresenta, em especial, as variações social e
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estilística. Justifica-se essa escolha pela necessidade de adaptação de seu idioleto à posição de
chefe de estado, visto que, como é sabido por muitos, sofria preconceito lingüístico por não
possuir um linguajar “adequado” ao cargo público que almejava assumir.
1. Variação Lingüística
Todos os falantes de uma língua apresentam distinções, ora coletivas, ora individuais, que
se refletem na sua linguagem, de modo a que os “membros de uma nação, ligados por traços
socioculturais, econômicos e políticos, tradicionalmente firmados, identificam-se e distinguem-se
dos membros de outra pelo seu instrumento de comunicação” (CAMACHO, 1988, p.29). Desse
modo, não há língua sem variação, pois a língua, como os seus falantes, é heterogênea.
É por meio do contato entre línguas (ou o contato entre falantes) que elas se
individualizam, modificam e variam. Assim, a língua pode caracterizar e identificar os naturais
de uma região. Além disso, não só pelo contato, mas também historicamente as línguas sofrem
alterações, pois “uma língua é um objeto histórico, enquanto saber transmitido, estando, portanto,
sujeita às eventualidades próprias de tal tipo de objeto. Isso significa que se transforma no tempo
e se diversifica no espaço” (CAMACHO, 1988, p.29).
Mas os fatores de diversidade lingüística não ficam limitados a esses dois aspectos, são
também condicionados às características sociais (idade, sexo, classe social, escolaridade etc.) e
estilísticas (estilo formal, informal, coloquial, culto etc.). Isso nos faz considerar que a variação
lingüística ocorre também individualmente, isto é, um mesmo sujeito utiliza diferentemente a
língua que fala, situando-a com o tempo, espaço, interlocutor(es), objetivo(s) etc. da interação.
Assim, “um sujeito que se dirige a um dos membros de sua família, em nenhuma hipótese, usará
as mesmas formas de outra situação em que se encontre perante um superior hierárquico”
(CAMACHO, 1988, p.30). Podemos, então, separar as variações lingüísticas em quatro
modalidades: histórica, geográfica, social e estilística.
Na histórica, as mudanças ocorrem gradativamente com o tempo, pois uma forma
prestigiada será, futuramente, substituída por outra, a qual, em princípio, é utilizada por um grupo
de falantes como uma variação da norma padrão. Assim, “as duas variantes diacrônicas, a
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substituta e a substituída, a rigor não coexistem num mesmo plano temporal, uma vez que uma
deve cair em desuso para que a outra sobreviva” (CAMACHO, 1988, p.30). É interessante
verificar que a variante substituta, “ao se propagar, é adotada por um grupo
socioeconomicamente expressivo” (CAMACHO, 1988, p.30), ou seja, a partir do instante em que
a elite da sociedade aceita essa variante, ela passa a ser prestigiada, substituindo a anterior, e é
dicionarizada.
A variação geográfica, por sua vez, é aquela que ocorre espacialmente. Desse modo,
falantes brasileiros da região sul do país têm variantes (fonéticas, lexicais, semânticas etc.)
distintas dos falantes da região nordeste, por exemplo.
Já a variação social decorre de muitos fatores: escolaridade, classe social, faixa etária,
sexo, profissão etc., isolados ou conjugados entre si. “A variação social é o resultado da tendência
para maior semelhança entre os atos verbais dos membros de um mesmo setor sociocultural da
comunidade” (Ibidem, p.32). Como exemplo disso, Camacho (1988) observa que há distinção
entre: a) o falar dos homens e o das mulheres, as quais apresentam uma linguagem mais afetiva,
mais sonora; b) o falar dos jovens, marcado principalmente pelas gírias, como forma de
identificação do grupo e de negação do considerado ultrapassado. O autor ressalta, ainda, a
existência de comunicação entre os falantes de estratos sociais distintos e a possibilidade de
influência mútua entre padrões lingüísticos, pois, “o intercâmbio cultural e profissional entre
indivíduos de meio diverso possibilita a adaptação das formas de expressão de um para outro
grupo” (Ibidem, p.33).
A variação estilística é determinada pelo contexto da interação, pois os falantes
modificam o seu modo de falar conforme as circunstâncias em que se encontram e os objetivos
que almejam. Desse modo, não falamos numa entrevista de emprego da mesma forma como
falamos num jogo de futebol, por exemplo. “Tal adequação decorre de uma seleção dentre o
conjunto de formas que constitui o saber lingüístico individual, de um modo mais ou menos
consciente” (CAMACHO, 1988, p.34). Assim, a atividade lingüística pode apresentar-se ora mais
formalmente, ora mais informalmente.
Salientamos, por fim, que as variações lingüísticas não coexistem de forma independente,
mas entrelaçam-se, completam-se, de modo que um mesmo falante apresente mais de uma dessas
modalidades num só momento de fala.
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2. As variações de Lula em 1989: candidato à presidência
Não há como negar que o Brasil é um país culturalmente diversificado, basta relembrar
seu passado de colonização e toda a influência advinda de seus colonizadores e imigrantes,
resultando numa miscigenação de raças. Diante de toda essa heterogeneidade lingüística torna-se
impossível uniformizar ou aprisionar a língua, isso seria negar toda a história de uma nação, pois
“a língua é um lugar de marcação de identidades” (POSSENTI, 2002, p.109). No que se refere à
diversidade de um idioma Camacho (1988, p. 29) declara:
As diferenças entre os idiomas, que caracterizam e mesmo identificam os
nativos de uma nação, estão longe de ser o único e mesmo principal fator da diversidade
lingüística. Uma língua é um objeto histórico, enquanto saber transmitido, estando,
portanto, sujeita às eventualidades próprias de tal tipo de objeto. Isso significa que se
transforma no tempo e se diversifica no espaço.
Bortoni-Ricardo (1986) aponta ser um mito pensar que somos um país privilegiado, no
qual a comunicação ocorre sem problemas de intergibilidade, o que é um equivoco já que a
sociedade (e a língua) é heterogênea e diversificada, daí a existência de variações e variantes
lingüísticas. Essa não homogeneidade, que é própria da linguagem, pode ser notada até mesmo
nos discursos de Lula, os quais comportam muitas variedades, dependendo do contexto.
Durante a campanha presidencial de 1989, em um programa de auditório do canal SBT
1
,
o então candidato foi entrevistado por artistas sobre suas propostas. Seguem trechos de algumas
de suas respostas:
Silvio primeiru eu queria cumprimentá você
segundu eu queria cumprimentá o auditóriu
e cumprimentá o telespectadores purque eu achu
muintu importanti o momentu políticu qui estamus vivendu.
é um momentu qui por mais qui as pessoas não goste
di política dipois di trinta anus essi é o momentu mais rico
qui nossu está vivendu
e é importanti que as pessoas saibam tirar proveitu dissu
analisandu cada candidatu
1
Extraído de <http://www.youtube.com/watch?v=pzXVFy9QZkU> e transcrito grafematicamente pelas autoras.
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analisandu as propostas
o programa di governu
purque a partir do dia 15 de novembru
se Deus quisé
nós teremus um novu país
primeiru suspensão du pagamentu da dívida externa
terceru acabá: cum a especulação financera nessi país
baixandu as taxa de juru
dipois nóis teríamus qui adotá uma política di: ... agrícula ...
e uma política di reforma agrária...
i eu achu qui fazendu isso nóis iríamos terminá
a inflação nessi país a curto espaçu de tempu
Lula deixa transparecer o seu lugar de cidadão comum de infância humilde, pois comete
vários desvios em relação à língua culta
2
, conseqüência do pouco estudo que teve.
Ele
3
foi um menino pobre, filho de lavradores, nascido em Garanhus, interior de
Pernambuco, seus pais são Aristides Inácio da Silva e Eurídice Ferreira de Mello. Em 1952, aos
sete anos, ele acompanhou a família que deixou as dificuldades da seca no Nordeste para se
instalar em Vicente de Carvalho (SP), onde vendia amendoim e tapioca no centro da cidade
praiana.
Foi vendedor ambulante, engraxate, trabalhou em uma tinturaria e, aos 19 anos, perdeu o
dedo mínimo da mão esquerda numa fábrica no ABC paulista, amputação essa que se tornou uma
referência a ele, estigmatizando-o, conforme figura
4
abaixo:
2
Optamos pelo termo culta por se tratar de língua falada.
3
As informações sobre a biografia de Lula foram retiradas dos sites:
<http://groups.msn.com/LULAPRESIDENTE/biografiadelulaii.msnw> e http://www.afolhanet.com.br/biografias/lula.htm.
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A figura só é coerente a partir do momento que se conhece a referência a ela feita por meio da ausência do dedo.
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Retornando à entrevista, podemos verificar variações de duas ordens: estilística e social.
Observamos, no exemplo, desvios fonéticos e sintáticos em relação ao padrão culto, como
a falta de concordância nominal em “o telespectadores”, “baixandu as taxa de juru”, metaplasmo
por apócope como em “cumprimentá” e “acabá” e alçamentos, “segundu”, “qui” e “vivendu”.
Esses fenômenos são característicos da variação social, a qual decorre de muitos fatores:
escolaridade, classe social, faixa etária, sexo, profissão etc., isolados ou conjugados entre si
(CAMACHO, 1988). No caso de Lula, os desvios ocorrem devido à pouca escolarização, à
origem humilde e ao fato de ter sido líder sindical. Como dito anteriormente, as variedades
sociais, ao interagirem, se influenciam, pois, retomando a citação de Camacho (1988, p.33), “o
intercâmbio cultural e profissional entre indivíduos de meio diverso possibilita a adaptação das
formas de expressão de um para outro grupo”.
Esse fato é percebido quando Lula usa a concordância nominal, mostrando que não são
em todos os momentos que ele deixa de usar tal recurso, visto que a situação de comunicação
analisada exige uma linguagem mais formal, pois era candidato a presidente.
Ainda, por causa do preconceito lingüístico que a pode envolver, a variação social pode
ser um fator de estigma, pois os falantes das formas estereotipadas são, em muitos casos,
repreendidos pelo seu idioleto. Isso não foi diferente com Lula, o qual, até hoje, tem sido
ridicularizado por sua falta de estudo e por suas origens – longe da norma culta da língua.
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Esse exemplo comprova que, infelizmente, a questão do preconceito lingüístico não
ocorre somente dentro do ambiente escolar. A sociedade também impõe que o falar “correto” é
aquele pertencente à variedade socialmente privilegiada. A respeito disso, Camacho (1988, p. 38)
corrobora apontando que “é comum a imposição da norma lingüística do grupo dominante, dos
setores mais favorecidos da sociedade, como a correta ou de prestígio”, e explica que “o cultivo
de uma gramática essencialmente normativa (...) coincide com o padrão geralmente aceito pelos
setores privilegiados da sociedade”. A “gramática do tipo normativo decorre de uma concepção
não só conservadora, mas sobretudo elitista”.
A outra modalidade de variação apresentada pelo entrevistado, a estilística, se caracteriza/
qualifica de acordo com as condições de produção da língua, porque os falantes modificam o seu
modo de falar conforme as circunstâncias em que se encontram e os objetivos que almejam.
Assim, não falamos em uma entrevista da mesma forma como falamos em um jogo de futebol,
por exemplo. “Tal adequação decorre de uma seleção dentre o conjunto de formas que constitui o
saber lingüístico individual, de um modo mais ou menos consciente” (CAMACHO, 1988, p.34).
No exemplo seguinte, podemos verificar que os termos que Lula utiliza não são próprios
de uma linguagem coloquial, mas de uma situação formal, adequados ao tema em pauta:
suspensãu du pagamentu da dívida externa
terceru acabá: cum a especulaçãu financera nessi país
baixandu as taxa de juru
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As palavras “suspensão”, “dívida externa”, “especulação financeira” “taxas de juros” não
foram escolhidas arbitrariamente, mas de modo a estarem em conformidade com o cargo visado
por ele.
Isso nos faz considerar, como no exemplo, que a variação lingüística ocorre também
individualmente, isto é, um mesmo sujeito utiliza diferentemente a língua que fala, situando-a
com o tempo, espaço, interlocutor(es), objetivos etc. da interação. Em outras palavras, de acordo
com as condições de produção em que o falante da língua se encontra, ele moldará a sua
linguagem, pois “um sujeito que se dirige a um dos membros de sua família, em nenhuma
hipótese, usará as mesmas formas de outra situação em que se encontre perante um superior
hierárquico” (CAMACHO, 1988, p.30).
O falante, ao dizer algo, deve adequar a sua fala aos tipos de receptores. Nesse caso,
convém refletir sobre o papel do professor. Muitas vezes o docente impõe a norma culta como a
única aceitável, não considerando que existe uma variação estilística, que determina como cada
falante deve se comportar diante as diferentes situações de sua vida. Antunes (2007) também fala
a esse respeito, afirmando que um dos equívocos sustentados pela falta de perspectiva é o de que:
Toda atuação verbal deve estar conforme as regras da norma culta. Ou seja, norma culta,
sempre; a qualquer hora, em todo lugar, independentemente das condições de realização
da atividade. Uma espécie de uniformidade incondicional; de nivelamento ‘por cima’,
como acreditam alguns. Ora, essa pretensão não passa de uma idealização, sem condição
alguma de poder vir a realizar-se. Em nenhuma língua. Os próprios usuários se
encarregam de desmistificar essa idealização. (ANTUNES, 2007, p.103)
Nenhum indivíduo consegue, a todo tempo, ter uma fala homogênea, como se a língua
fosse uniforme em todos os momentos. Antunes afirma que “o bom uso da língua é aquele que é
adequado às condições de uso” (2007, p. 104)
Assim, conforme a análise realizada, ratificamos a coexistência de características
essenciais de cada tipo de variação num mesmo enunciado, pois não existem de forma
independente (CAMACHO, 1988).
3. Lula, Presidente do Brasil, as variações permanecem?
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Apesar da análise acima exposta, Lula, após a sua primeira eleição à presidência,
modificou a sua linguagem em relação à candidatura em 1989. Isso se deve ao trabalho realizado
pelo seu marqueteiro, Duda Mendonça, o qual objetivava transparecer um “Lula light”, o
“Lulinha paz e amor”. Além disso, almejou alterar o modo de falar e a postura do presidente, que,
cansado de derrotas, desejava mudar de imagem para alterar o seu destino e, quem sabe, o do
Brasil.
No documentário de João Moreira Salles, “Entreatos”, Lula, ex-operário, sem qualquer
formação intelectual, porém mais maduro, cita Duda Mendonça, para dizer que o “importante não
é o que se diz às pessoas, mas como as pessoas compreendem o que se tenta dizer a elas”. Silva
(2006) expõe que essa é uma síntese perfeita da transformação de Lula.
Apesar disso, o presidente não abandonou por completo suas origens, pois, em alguns
momentos, recorre a figuras de linguagem, como a metáfora, e “escorrega” na norma culta. Isso
ocorre, principalmente, nos discursos improvisados, quando, por exemplo, convidou “os patrícios
a tirarem ‘o traseiro da cadeira’ para procurar juros mais baixos em outros bancos, que não os em
que são presentemente enforcados”
5
. Traseiro não é um termo adequado para um governante
utilizar ao falar com a população. Esse vocábulo informal não está bem colocado no seu discurso,
pois sua fala deveria estar de acordo com a posição que assume, não sendo plausível esta variação
estilística no contexto no qual está inserida.
Assim, nas improvisações, Lula deixa transparecer o seu lugar de cidadão comum de
infância humilde. Mesmo depois do seu primeiro mandato, durante a campanha eleitoral de 2006,
Lula ainda apresentava desvios da norma culta, levando-o novamente à estigmatização, de modo
a ridicularizarem-no em vídeos presentes no site You Tube, dos quais analisamos alguns trechos
6
.
Na frase, “pegá dinheiro pra pagá as conta”, Lula apresenta alguns metaplasmos
7
que são
estereotipados para um presidente como a apócope em “pegá” e “pagá” e a síncope em “pra”,
5 Extraído do site < http://revistalingua.uol.com.br/textos.asp?codigo=10945>.
6
Trechos copiados do site <http://www.youtube.com/watch?v=qA_cSoDhOes&feature=related>
7
“Las figuras de metaplasmo consisten en la utilización de formas léxicas que serían, en teoría, incorrectas en la
lengua ordinaria. Las más conocidas de estas figuras son las licencias métricas. “Las figuras de metaplasmo son las
siguientes: prótesis, epéntesis, parágoge, aféresis, síncopa, apócope, diástole o éctasis, sístole, diéresis, sinéresis,
sinalefa, ecthlipsis y metátesis” (http://es.wikipedia.org/wiki/Metaplasmo#Figuras_de_metaplasmo).
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além da falta de concordância nominal em “as conta”, que é ressaltada no comentário
preconceituoso do autor do vídeo:
Outro exemplo é “da mesma forma que ela descobriu o caso sanguessunga”, no qual
ocorre uma nasalização, “sanguessunga”, com o acréscimo de um fonema no interior da palavra.
Para esse enunciado, o vídeo traz uma pequena ironia:
Encontramos outro fenômeno fonético, uma paragoge (acréscimo de fonema final do
vocabulário), na seguinte frase: “um carro flexil”. Para a qual, temos o comentário:
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Além desses, temos outros excertos que exemplificam a coloquialidade do linguajar lulino.
Em “não queira qui em quatro anus eu conserto o que vocêis destruiru em quatro séculu”,
notamos alçamentos (“qui”, “anus”, “séculu”), ausência de concordância verbal (“conserto”) e
nominal (“quatro seculu”, “vocêis destruiru”) e epêntese (“vocêis”). Como em todos os desvios
de Lula apresentados no vídeo, esses apresentam uma crítica bastante pejorativa, tanto que o
enunciador busca imitar o que considera “tropeços lingüísticos” do presidente:
Em um último trecho selecionado, “qui sabe perfeitamente bem cumé qui a sociedade
brasileira...”, observamos, além dos fenômenos já analisados, a presença de uma aglutinação em
“cumé”. De acordo com Possenti (2002), este termo carrega um forte valor estereotipado, por não
ser comum na fala de pessoas cultas, e, principalmente, por causar impacto social.
Mais uma vez, o vídeo satiriza a expressão usada por Lula:
Na análise dos exemplos ocorrem, segundo Possenti (2002, p. 322), dois tipos de
“problemas”: marcadores. Neles, as formas lingüísticas distinguem falantes de classes diversas de
uma mesma região e indicam, por exemplo, formalidade maior ou menor. (POSSENTI, 2002).
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Com esses exemplos é possível notar o preconceito lingüístico em relação a variação
social. Lula, por causa da posição que assume, é incisivamente criticado por não se apropriar
devidamente da norma culta em todos os momentos de fala formal, exceto na leitura de discursos
previamente preparados por seus assessores.
Desta forma, observamos novamente a presença de variação estilística e social nos dizeres
de Lula, demonstrando que mesmo após quase duas décadas ele ainda não dominava o padrão
culto exigido a um presidente, por isso tantos estereótipos e preconceitos.
Considerações Finais
A linguagem é um lugar de interação, pois é por meio dela que os sujeitos se comunicam
e interagem sócio-culturalmente. Para Barboza (2007, p.14), “a língua não é usada de modo
homogêneo por todos os seus falantes”, uma vez que até os falantes são heterogêneos em muitos
sentidos: histórico, psicológico, social, familiar etc. Já que “a língua só existe em sociedade, e
toda sociedade é inevitavelmente heterogênea, múltipla, variável e, por conseguinte, com usos
diversificados da própria língua” (ANTUNES, 2007, p.104). Desse modo,
A língua não é una [...], ou seja, não é indivisível; ela pode ser considerada um conjunto
de dialetos. Alguém já disse que em país algum se fala uma língua só. Há várias línguas
dentro da oficial. E no Brasil não é diferente. Cada região tem seus falares, cada grupo
sociocultural tem o seu. Pode-se até afirmar que cada cidadão tem o seu. A essa
característica da Língua damos o nome de variação lingüística (CATARINO, 2008)
Portanto, a análise desenvolvida neste trabalho demonstrou, por meio dos exemplos, que a
variação é latente à língua, principalmente pelo fato de uma importante figura nacional estar
sujeito a ela. Enfim, esperamos ter aguçado a curiosidade a respeito do que, de fato, a língua nos
oferece e dos estudos sobre esse importante fenômeno lingüístico, a variação.
Referências
ANTUNES, Irandé. Muito além da gramática: por um ensino de línguas sem pedras no caminho.
São Paulo: Parábola, 2007.
Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura
Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193
15
BARBOZA, Teresinha Pereira. Pensando a língua em suas diferentes formas: uma nova
abordagem em relação ao ensino de língua portuguesa. 2007. 55p. Monografia (Especialização
em Língua Portuguesa) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina.
BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Problemas de comunicação interdialetal. Tempo Brasileiro,
n.53/54, jul.-dez. 1986, p.09-31.
Brasil. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e
quarto ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa/ Secretaria de Educação Fundamental.
Brasília: MEC/SEF, 1998.
CAMACHO, Roberto Gomes. A variação lingüística. In: SÃO PAULO. Secretaria de Educação.
Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas. Subsídios à Proposta Curricular de Língua
Portuguesa para os 1º e 2º graus: coletânea de textos. São Paulo: SE/CENP. 1988, v.I, 53-9,
p.29-41.
CASTILHO, Ataliba Teixeira de. Variação dialetal e ensino institucionalizado da língua
portuguesa. In: BAGNO, Marcos. Lingüística da norma. São Paulo: Loyola, 2002, p.27-36.
CATARINO, Dílson. Variação lingüística. Disponível em:
http://dilsoncatarino.blogspot.com/2008/02/variao-lingstica.html, acessado em 03/10/2008.
GERALDI, João Wanderley. Portos de Passagem. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
POSSENTI, Sírio. Um programa mínimo. In: BAGNO, Marcos. Lingüística da norma. São Paulo:
Loyola, 2002.
SILVA, Juremir Machado da. O governo Lula em revista: o jornalismo como fenômeno de
descobrimento (a cobertura de Veja). Revista FAMECOS, Porto Alegre, nº 29, abril 2006.

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  • 1. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 1 LULA: AS VARIAÇÕES E O PRECONCEITO LINGÜÍSTICOS QUE O CERCAM Juliana Fogaça Sanches Simm* Letícia Jovelina Storto* “Que a escola [...] saiba desenvolver a capacidade dos alunos para acolher as diferenças, com o máximo respeito por aqueles que as apresentam, sem o sentimento de que estão fazendo concessões ou sendo compassivos com os diferentes. Simplesmente, porque a diferença é a parte mais significativa daquilo que nos faz iguais.” (Irandé Antunes) RESUMO: Há muito o ensino de língua portuguesa, no Brasil, está restrito ao estudo da variedade escrita da língua, sem considerar a oralidade e toda a sua importância no cotidiano dos alunos. Desse modo, temos enraizado uma perspectiva reducionista em relação à variação lingüística, pois não a tomamos como objeto de pesquisa em sala de aula, contribuindo para uma noção preconceituosa da língua. Como todos os brasileiros, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não está isento de apresentar, em sua linguagem, variações de cunho estilístico e social. Porém, devido ao cargo de prestígio que assume, tem sido severamente criticado por não apresentar, em momentos de fala espontânea, um português conforme as normas arbitrariamente estabelecidas. Balizado na Sociolingüística, o presente trabalho teve como objetivo principal analisar as variações lingüísticas existentes no discurso do atual presidente do Brasil, bem como o de verificar o preconceito lingüístico que o envolve. Por meio das análises efetuadas, foi possível verificar que a linguagem humana é, inerentemente, heterogênea e variável, demonstrando-se assim até mesmo na figura ilustre de nosso governante. PALAVRAS-CHAVE: Sociolingüística; Variação e Preconceito Lingüísticos; Lula. ABSTRACT: A long time the teaching of Portuguese language, in Brazil, is restricted to the study of the language`s writing variety, without considering the orality and its importance in the student`s daily. Thus, we have rooted a reductionist view in relation to linguistic variation, because we don´t take it as the object of research in the classroom, contributing to a prejudiced concept of the language. As all brazilian, the President Luiz Inácio Lula da Silva is not free to present, in his language, stylistic and social variations. However, due to the important position he has, Lula has been severely criticized for not presenting, at moments of spontaneous speech, a portuguese arbitrarily laid down as the standard. Based on Sociolinguistics, the present study had as principal aim analyze the linguistic variations that exists in the speech of the current president of Brazil, besides checking the linguistic prejudice that involves his speech. Through the analysis done, it was possible to verify that the human language * Alunas do Curso de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem, nível Mestrado, da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Seus respectivos e-mails: julianaf.sanches@hotmail.com, le_storto@yahoo.com.br.
  • 2. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 2 is, inherently, heterogeneous and variable, corroborated even in the picture of our illustrious governor. KEYWORDS: Sociolinguistics; Variation and Linguistic Prejudice; Lula. Introdução O ensino de Língua Portuguesa, ao longo de muitos anos, privilegiou apenas o uso da forma escrita, deixando de lado a língua falada e as variações existentes em todo o Brasil. Equivocadamente, considerava-se que, em nosso país, não havia dificuldades de comunicação, pois a língua era vista como homogênea, sem problemas de inteligibilidade. Isso, infelizmente, se refletiu no ensino, o qual, por muito tempo, não considerava as variações lingüísticas existentes em todo território nacional. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 1998, p. 17): Na década de 60 e início da de 70, o ensino de Língua Portuguesa orientado pela perspectiva gramatical ainda parecia adequado, dado que os alunos que freqüentavam a escola falavam uma variedade lingüística bastante próxima da chamada variedade padrão e traziam representações de mundo e de língua semelhantes às que ofereciam os livros e textos didáticos. Geraldi (1997), no entanto, ao discorrer sobre a democratização do ensino, afirma que “nos anos 1970-1980, o crescimento da população escolar nas escolas públicas do estado de São Paulo foi da ordem de um milhão e meio de crianças”. Nesse sentido, as escolas deixaram de receber somente crianças de classe social privilegiada e passaram a receber crianças de todas as ordens sociais. Contudo, existia um conflito entre a variedade trazida pelos alunos e a variedade lingüística escolar. Camacho (1988, p. 38) aponta que: É inevitável que resulte dessa relação um conflito entre o sistema de regras normativas imposto pela escola e o padrão lingüístico aceito na comunidade de que a criança é membro. Pode-se afirmar sem receio que o prejuízo decorrente desse conflito atinge os setores menos privilegiados da sociedade.
  • 3. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 3 Com a democratização do ensino, os professores passaram a trabalhar com diferentes públicos, porém a prática, em sala de aula, nem sempre acompanhou essas mudanças e, por isso, os conflitos passaram a ser uma constante no ambiente escolar. Muitos docentes não consideravam as variedades próprias dos grupos sociais dos alunos, trabalhando apenas a norma padrão nas aulas de Língua Portuguesa. É importante apontar que, para os PCNs: Não existem, portanto, variedades fixas: em um mesmo espaço social convivem mescladas diferentes variedades lingüísticas, geralmente associadas a diferentes valores sociais. Mais ainda, em uma sociedade como a brasileira, marcada por intensa movimentação de pessoas e intercâmbio cultural constante, o que se identifica é um intenso fenômeno de mescla lingüística, isto é, em um mesmo espaço social convivem mescladas diferentes variedades lingüísticas, geralmente associadas a diferentes valores sociais (Brasil, 1998, p. 29). Sabemos que a língua utilizada no dia-a-dia das pessoas não é a mesma imposta, desde o início da colonização, pela gramática tradicional. Todavia, de acordo com os PCNs (BRASIL, 1998), o aluno, ao iniciar sua vida escolar, já conhece, pelo menos, uma das variedades que compõe a sua língua materna, ou seja, aquela que aprendeu pelo fato de estar inserido em uma comunidade de falantes. Esse documento explica que o estudante é capaz de perceber que as “formas da língua apresentam variação e que determinadas expressões ou modos de dizer podem ser apropriados para certas circunstâncias, mas não para outras” (Brasil, 1998, p. 81). Desta forma, o professor deve estar preparado para ensinar-lhe como utilizar as variações existentes na língua, dependendo da situação, visto que há formas mais refletidas de falar e, por outro lado, outras mais relacionadas à realidade do educando. É preciso deixar claro que o ambiente escolar deve assumir uma postura na qual o preconceito lingüístico seja banido. Para isso, os PCNs (BRASIL, 1998) apontam que as variedades lingüísticas que mais se afastam da gramática padrão não podem ser tratadas como desvios ou incorreções. Pelo contrário, deve ficar claro ao aluno que existem situações nas quais o falar deve ser adaptado e que não há uma variedade melhor/ pior ou mais correta/ errada do que outra. Nesse sentido, objetivamos analisar as variações existentes no discurso do Presidente Luis Inácio Lula da Silva, haja vista que o seu falar apresenta, em especial, as variações social e
  • 4. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 4 estilística. Justifica-se essa escolha pela necessidade de adaptação de seu idioleto à posição de chefe de estado, visto que, como é sabido por muitos, sofria preconceito lingüístico por não possuir um linguajar “adequado” ao cargo público que almejava assumir. 1. Variação Lingüística Todos os falantes de uma língua apresentam distinções, ora coletivas, ora individuais, que se refletem na sua linguagem, de modo a que os “membros de uma nação, ligados por traços socioculturais, econômicos e políticos, tradicionalmente firmados, identificam-se e distinguem-se dos membros de outra pelo seu instrumento de comunicação” (CAMACHO, 1988, p.29). Desse modo, não há língua sem variação, pois a língua, como os seus falantes, é heterogênea. É por meio do contato entre línguas (ou o contato entre falantes) que elas se individualizam, modificam e variam. Assim, a língua pode caracterizar e identificar os naturais de uma região. Além disso, não só pelo contato, mas também historicamente as línguas sofrem alterações, pois “uma língua é um objeto histórico, enquanto saber transmitido, estando, portanto, sujeita às eventualidades próprias de tal tipo de objeto. Isso significa que se transforma no tempo e se diversifica no espaço” (CAMACHO, 1988, p.29). Mas os fatores de diversidade lingüística não ficam limitados a esses dois aspectos, são também condicionados às características sociais (idade, sexo, classe social, escolaridade etc.) e estilísticas (estilo formal, informal, coloquial, culto etc.). Isso nos faz considerar que a variação lingüística ocorre também individualmente, isto é, um mesmo sujeito utiliza diferentemente a língua que fala, situando-a com o tempo, espaço, interlocutor(es), objetivo(s) etc. da interação. Assim, “um sujeito que se dirige a um dos membros de sua família, em nenhuma hipótese, usará as mesmas formas de outra situação em que se encontre perante um superior hierárquico” (CAMACHO, 1988, p.30). Podemos, então, separar as variações lingüísticas em quatro modalidades: histórica, geográfica, social e estilística. Na histórica, as mudanças ocorrem gradativamente com o tempo, pois uma forma prestigiada será, futuramente, substituída por outra, a qual, em princípio, é utilizada por um grupo de falantes como uma variação da norma padrão. Assim, “as duas variantes diacrônicas, a
  • 5. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 5 substituta e a substituída, a rigor não coexistem num mesmo plano temporal, uma vez que uma deve cair em desuso para que a outra sobreviva” (CAMACHO, 1988, p.30). É interessante verificar que a variante substituta, “ao se propagar, é adotada por um grupo socioeconomicamente expressivo” (CAMACHO, 1988, p.30), ou seja, a partir do instante em que a elite da sociedade aceita essa variante, ela passa a ser prestigiada, substituindo a anterior, e é dicionarizada. A variação geográfica, por sua vez, é aquela que ocorre espacialmente. Desse modo, falantes brasileiros da região sul do país têm variantes (fonéticas, lexicais, semânticas etc.) distintas dos falantes da região nordeste, por exemplo. Já a variação social decorre de muitos fatores: escolaridade, classe social, faixa etária, sexo, profissão etc., isolados ou conjugados entre si. “A variação social é o resultado da tendência para maior semelhança entre os atos verbais dos membros de um mesmo setor sociocultural da comunidade” (Ibidem, p.32). Como exemplo disso, Camacho (1988) observa que há distinção entre: a) o falar dos homens e o das mulheres, as quais apresentam uma linguagem mais afetiva, mais sonora; b) o falar dos jovens, marcado principalmente pelas gírias, como forma de identificação do grupo e de negação do considerado ultrapassado. O autor ressalta, ainda, a existência de comunicação entre os falantes de estratos sociais distintos e a possibilidade de influência mútua entre padrões lingüísticos, pois, “o intercâmbio cultural e profissional entre indivíduos de meio diverso possibilita a adaptação das formas de expressão de um para outro grupo” (Ibidem, p.33). A variação estilística é determinada pelo contexto da interação, pois os falantes modificam o seu modo de falar conforme as circunstâncias em que se encontram e os objetivos que almejam. Desse modo, não falamos numa entrevista de emprego da mesma forma como falamos num jogo de futebol, por exemplo. “Tal adequação decorre de uma seleção dentre o conjunto de formas que constitui o saber lingüístico individual, de um modo mais ou menos consciente” (CAMACHO, 1988, p.34). Assim, a atividade lingüística pode apresentar-se ora mais formalmente, ora mais informalmente. Salientamos, por fim, que as variações lingüísticas não coexistem de forma independente, mas entrelaçam-se, completam-se, de modo que um mesmo falante apresente mais de uma dessas modalidades num só momento de fala.
  • 6. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 6 2. As variações de Lula em 1989: candidato à presidência Não há como negar que o Brasil é um país culturalmente diversificado, basta relembrar seu passado de colonização e toda a influência advinda de seus colonizadores e imigrantes, resultando numa miscigenação de raças. Diante de toda essa heterogeneidade lingüística torna-se impossível uniformizar ou aprisionar a língua, isso seria negar toda a história de uma nação, pois “a língua é um lugar de marcação de identidades” (POSSENTI, 2002, p.109). No que se refere à diversidade de um idioma Camacho (1988, p. 29) declara: As diferenças entre os idiomas, que caracterizam e mesmo identificam os nativos de uma nação, estão longe de ser o único e mesmo principal fator da diversidade lingüística. Uma língua é um objeto histórico, enquanto saber transmitido, estando, portanto, sujeita às eventualidades próprias de tal tipo de objeto. Isso significa que se transforma no tempo e se diversifica no espaço. Bortoni-Ricardo (1986) aponta ser um mito pensar que somos um país privilegiado, no qual a comunicação ocorre sem problemas de intergibilidade, o que é um equivoco já que a sociedade (e a língua) é heterogênea e diversificada, daí a existência de variações e variantes lingüísticas. Essa não homogeneidade, que é própria da linguagem, pode ser notada até mesmo nos discursos de Lula, os quais comportam muitas variedades, dependendo do contexto. Durante a campanha presidencial de 1989, em um programa de auditório do canal SBT 1 , o então candidato foi entrevistado por artistas sobre suas propostas. Seguem trechos de algumas de suas respostas: Silvio primeiru eu queria cumprimentá você segundu eu queria cumprimentá o auditóriu e cumprimentá o telespectadores purque eu achu muintu importanti o momentu políticu qui estamus vivendu. é um momentu qui por mais qui as pessoas não goste di política dipois di trinta anus essi é o momentu mais rico qui nossu está vivendu e é importanti que as pessoas saibam tirar proveitu dissu analisandu cada candidatu 1 Extraído de <http://www.youtube.com/watch?v=pzXVFy9QZkU> e transcrito grafematicamente pelas autoras.
  • 7. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 7 analisandu as propostas o programa di governu purque a partir do dia 15 de novembru se Deus quisé nós teremus um novu país primeiru suspensão du pagamentu da dívida externa terceru acabá: cum a especulação financera nessi país baixandu as taxa de juru dipois nóis teríamus qui adotá uma política di: ... agrícula ... e uma política di reforma agrária... i eu achu qui fazendu isso nóis iríamos terminá a inflação nessi país a curto espaçu de tempu Lula deixa transparecer o seu lugar de cidadão comum de infância humilde, pois comete vários desvios em relação à língua culta 2 , conseqüência do pouco estudo que teve. Ele 3 foi um menino pobre, filho de lavradores, nascido em Garanhus, interior de Pernambuco, seus pais são Aristides Inácio da Silva e Eurídice Ferreira de Mello. Em 1952, aos sete anos, ele acompanhou a família que deixou as dificuldades da seca no Nordeste para se instalar em Vicente de Carvalho (SP), onde vendia amendoim e tapioca no centro da cidade praiana. Foi vendedor ambulante, engraxate, trabalhou em uma tinturaria e, aos 19 anos, perdeu o dedo mínimo da mão esquerda numa fábrica no ABC paulista, amputação essa que se tornou uma referência a ele, estigmatizando-o, conforme figura 4 abaixo: 2 Optamos pelo termo culta por se tratar de língua falada. 3 As informações sobre a biografia de Lula foram retiradas dos sites: <http://groups.msn.com/LULAPRESIDENTE/biografiadelulaii.msnw> e http://www.afolhanet.com.br/biografias/lula.htm. 4 A figura só é coerente a partir do momento que se conhece a referência a ela feita por meio da ausência do dedo.
  • 8. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 8 Retornando à entrevista, podemos verificar variações de duas ordens: estilística e social. Observamos, no exemplo, desvios fonéticos e sintáticos em relação ao padrão culto, como a falta de concordância nominal em “o telespectadores”, “baixandu as taxa de juru”, metaplasmo por apócope como em “cumprimentá” e “acabá” e alçamentos, “segundu”, “qui” e “vivendu”. Esses fenômenos são característicos da variação social, a qual decorre de muitos fatores: escolaridade, classe social, faixa etária, sexo, profissão etc., isolados ou conjugados entre si (CAMACHO, 1988). No caso de Lula, os desvios ocorrem devido à pouca escolarização, à origem humilde e ao fato de ter sido líder sindical. Como dito anteriormente, as variedades sociais, ao interagirem, se influenciam, pois, retomando a citação de Camacho (1988, p.33), “o intercâmbio cultural e profissional entre indivíduos de meio diverso possibilita a adaptação das formas de expressão de um para outro grupo”. Esse fato é percebido quando Lula usa a concordância nominal, mostrando que não são em todos os momentos que ele deixa de usar tal recurso, visto que a situação de comunicação analisada exige uma linguagem mais formal, pois era candidato a presidente. Ainda, por causa do preconceito lingüístico que a pode envolver, a variação social pode ser um fator de estigma, pois os falantes das formas estereotipadas são, em muitos casos, repreendidos pelo seu idioleto. Isso não foi diferente com Lula, o qual, até hoje, tem sido ridicularizado por sua falta de estudo e por suas origens – longe da norma culta da língua.
  • 9. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 9 Esse exemplo comprova que, infelizmente, a questão do preconceito lingüístico não ocorre somente dentro do ambiente escolar. A sociedade também impõe que o falar “correto” é aquele pertencente à variedade socialmente privilegiada. A respeito disso, Camacho (1988, p. 38) corrobora apontando que “é comum a imposição da norma lingüística do grupo dominante, dos setores mais favorecidos da sociedade, como a correta ou de prestígio”, e explica que “o cultivo de uma gramática essencialmente normativa (...) coincide com o padrão geralmente aceito pelos setores privilegiados da sociedade”. A “gramática do tipo normativo decorre de uma concepção não só conservadora, mas sobretudo elitista”. A outra modalidade de variação apresentada pelo entrevistado, a estilística, se caracteriza/ qualifica de acordo com as condições de produção da língua, porque os falantes modificam o seu modo de falar conforme as circunstâncias em que se encontram e os objetivos que almejam. Assim, não falamos em uma entrevista da mesma forma como falamos em um jogo de futebol, por exemplo. “Tal adequação decorre de uma seleção dentre o conjunto de formas que constitui o saber lingüístico individual, de um modo mais ou menos consciente” (CAMACHO, 1988, p.34). No exemplo seguinte, podemos verificar que os termos que Lula utiliza não são próprios de uma linguagem coloquial, mas de uma situação formal, adequados ao tema em pauta: suspensãu du pagamentu da dívida externa terceru acabá: cum a especulaçãu financera nessi país baixandu as taxa de juru
  • 10. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 10 As palavras “suspensão”, “dívida externa”, “especulação financeira” “taxas de juros” não foram escolhidas arbitrariamente, mas de modo a estarem em conformidade com o cargo visado por ele. Isso nos faz considerar, como no exemplo, que a variação lingüística ocorre também individualmente, isto é, um mesmo sujeito utiliza diferentemente a língua que fala, situando-a com o tempo, espaço, interlocutor(es), objetivos etc. da interação. Em outras palavras, de acordo com as condições de produção em que o falante da língua se encontra, ele moldará a sua linguagem, pois “um sujeito que se dirige a um dos membros de sua família, em nenhuma hipótese, usará as mesmas formas de outra situação em que se encontre perante um superior hierárquico” (CAMACHO, 1988, p.30). O falante, ao dizer algo, deve adequar a sua fala aos tipos de receptores. Nesse caso, convém refletir sobre o papel do professor. Muitas vezes o docente impõe a norma culta como a única aceitável, não considerando que existe uma variação estilística, que determina como cada falante deve se comportar diante as diferentes situações de sua vida. Antunes (2007) também fala a esse respeito, afirmando que um dos equívocos sustentados pela falta de perspectiva é o de que: Toda atuação verbal deve estar conforme as regras da norma culta. Ou seja, norma culta, sempre; a qualquer hora, em todo lugar, independentemente das condições de realização da atividade. Uma espécie de uniformidade incondicional; de nivelamento ‘por cima’, como acreditam alguns. Ora, essa pretensão não passa de uma idealização, sem condição alguma de poder vir a realizar-se. Em nenhuma língua. Os próprios usuários se encarregam de desmistificar essa idealização. (ANTUNES, 2007, p.103) Nenhum indivíduo consegue, a todo tempo, ter uma fala homogênea, como se a língua fosse uniforme em todos os momentos. Antunes afirma que “o bom uso da língua é aquele que é adequado às condições de uso” (2007, p. 104) Assim, conforme a análise realizada, ratificamos a coexistência de características essenciais de cada tipo de variação num mesmo enunciado, pois não existem de forma independente (CAMACHO, 1988). 3. Lula, Presidente do Brasil, as variações permanecem?
  • 11. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 11 Apesar da análise acima exposta, Lula, após a sua primeira eleição à presidência, modificou a sua linguagem em relação à candidatura em 1989. Isso se deve ao trabalho realizado pelo seu marqueteiro, Duda Mendonça, o qual objetivava transparecer um “Lula light”, o “Lulinha paz e amor”. Além disso, almejou alterar o modo de falar e a postura do presidente, que, cansado de derrotas, desejava mudar de imagem para alterar o seu destino e, quem sabe, o do Brasil. No documentário de João Moreira Salles, “Entreatos”, Lula, ex-operário, sem qualquer formação intelectual, porém mais maduro, cita Duda Mendonça, para dizer que o “importante não é o que se diz às pessoas, mas como as pessoas compreendem o que se tenta dizer a elas”. Silva (2006) expõe que essa é uma síntese perfeita da transformação de Lula. Apesar disso, o presidente não abandonou por completo suas origens, pois, em alguns momentos, recorre a figuras de linguagem, como a metáfora, e “escorrega” na norma culta. Isso ocorre, principalmente, nos discursos improvisados, quando, por exemplo, convidou “os patrícios a tirarem ‘o traseiro da cadeira’ para procurar juros mais baixos em outros bancos, que não os em que são presentemente enforcados” 5 . Traseiro não é um termo adequado para um governante utilizar ao falar com a população. Esse vocábulo informal não está bem colocado no seu discurso, pois sua fala deveria estar de acordo com a posição que assume, não sendo plausível esta variação estilística no contexto no qual está inserida. Assim, nas improvisações, Lula deixa transparecer o seu lugar de cidadão comum de infância humilde. Mesmo depois do seu primeiro mandato, durante a campanha eleitoral de 2006, Lula ainda apresentava desvios da norma culta, levando-o novamente à estigmatização, de modo a ridicularizarem-no em vídeos presentes no site You Tube, dos quais analisamos alguns trechos 6 . Na frase, “pegá dinheiro pra pagá as conta”, Lula apresenta alguns metaplasmos 7 que são estereotipados para um presidente como a apócope em “pegá” e “pagá” e a síncope em “pra”, 5 Extraído do site < http://revistalingua.uol.com.br/textos.asp?codigo=10945>. 6 Trechos copiados do site <http://www.youtube.com/watch?v=qA_cSoDhOes&feature=related> 7 “Las figuras de metaplasmo consisten en la utilización de formas léxicas que serían, en teoría, incorrectas en la lengua ordinaria. Las más conocidas de estas figuras son las licencias métricas. “Las figuras de metaplasmo son las siguientes: prótesis, epéntesis, parágoge, aféresis, síncopa, apócope, diástole o éctasis, sístole, diéresis, sinéresis, sinalefa, ecthlipsis y metátesis” (http://es.wikipedia.org/wiki/Metaplasmo#Figuras_de_metaplasmo).
  • 12. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 12 além da falta de concordância nominal em “as conta”, que é ressaltada no comentário preconceituoso do autor do vídeo: Outro exemplo é “da mesma forma que ela descobriu o caso sanguessunga”, no qual ocorre uma nasalização, “sanguessunga”, com o acréscimo de um fonema no interior da palavra. Para esse enunciado, o vídeo traz uma pequena ironia: Encontramos outro fenômeno fonético, uma paragoge (acréscimo de fonema final do vocabulário), na seguinte frase: “um carro flexil”. Para a qual, temos o comentário:
  • 13. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 13 Além desses, temos outros excertos que exemplificam a coloquialidade do linguajar lulino. Em “não queira qui em quatro anus eu conserto o que vocêis destruiru em quatro séculu”, notamos alçamentos (“qui”, “anus”, “séculu”), ausência de concordância verbal (“conserto”) e nominal (“quatro seculu”, “vocêis destruiru”) e epêntese (“vocêis”). Como em todos os desvios de Lula apresentados no vídeo, esses apresentam uma crítica bastante pejorativa, tanto que o enunciador busca imitar o que considera “tropeços lingüísticos” do presidente: Em um último trecho selecionado, “qui sabe perfeitamente bem cumé qui a sociedade brasileira...”, observamos, além dos fenômenos já analisados, a presença de uma aglutinação em “cumé”. De acordo com Possenti (2002), este termo carrega um forte valor estereotipado, por não ser comum na fala de pessoas cultas, e, principalmente, por causar impacto social. Mais uma vez, o vídeo satiriza a expressão usada por Lula: Na análise dos exemplos ocorrem, segundo Possenti (2002, p. 322), dois tipos de “problemas”: marcadores. Neles, as formas lingüísticas distinguem falantes de classes diversas de uma mesma região e indicam, por exemplo, formalidade maior ou menor. (POSSENTI, 2002).
  • 14. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 14 Com esses exemplos é possível notar o preconceito lingüístico em relação a variação social. Lula, por causa da posição que assume, é incisivamente criticado por não se apropriar devidamente da norma culta em todos os momentos de fala formal, exceto na leitura de discursos previamente preparados por seus assessores. Desta forma, observamos novamente a presença de variação estilística e social nos dizeres de Lula, demonstrando que mesmo após quase duas décadas ele ainda não dominava o padrão culto exigido a um presidente, por isso tantos estereótipos e preconceitos. Considerações Finais A linguagem é um lugar de interação, pois é por meio dela que os sujeitos se comunicam e interagem sócio-culturalmente. Para Barboza (2007, p.14), “a língua não é usada de modo homogêneo por todos os seus falantes”, uma vez que até os falantes são heterogêneos em muitos sentidos: histórico, psicológico, social, familiar etc. Já que “a língua só existe em sociedade, e toda sociedade é inevitavelmente heterogênea, múltipla, variável e, por conseguinte, com usos diversificados da própria língua” (ANTUNES, 2007, p.104). Desse modo, A língua não é una [...], ou seja, não é indivisível; ela pode ser considerada um conjunto de dialetos. Alguém já disse que em país algum se fala uma língua só. Há várias línguas dentro da oficial. E no Brasil não é diferente. Cada região tem seus falares, cada grupo sociocultural tem o seu. Pode-se até afirmar que cada cidadão tem o seu. A essa característica da Língua damos o nome de variação lingüística (CATARINO, 2008) Portanto, a análise desenvolvida neste trabalho demonstrou, por meio dos exemplos, que a variação é latente à língua, principalmente pelo fato de uma importante figura nacional estar sujeito a ela. Enfim, esperamos ter aguçado a curiosidade a respeito do que, de fato, a língua nos oferece e dos estudos sobre esse importante fenômeno lingüístico, a variação. Referências ANTUNES, Irandé. Muito além da gramática: por um ensino de línguas sem pedras no caminho. São Paulo: Parábola, 2007.
  • 15. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Língua Portuguesa, Lingüística e Literatura Ano 05 n.10 - 1º Semestre de 2009- ISSN 1807-5193 15 BARBOZA, Teresinha Pereira. Pensando a língua em suas diferentes formas: uma nova abordagem em relação ao ensino de língua portuguesa. 2007. 55p. Monografia (Especialização em Língua Portuguesa) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina. BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Problemas de comunicação interdialetal. Tempo Brasileiro, n.53/54, jul.-dez. 1986, p.09-31. Brasil. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa/ Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998. CAMACHO, Roberto Gomes. A variação lingüística. In: SÃO PAULO. Secretaria de Educação. Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas. Subsídios à Proposta Curricular de Língua Portuguesa para os 1º e 2º graus: coletânea de textos. São Paulo: SE/CENP. 1988, v.I, 53-9, p.29-41. CASTILHO, Ataliba Teixeira de. Variação dialetal e ensino institucionalizado da língua portuguesa. In: BAGNO, Marcos. Lingüística da norma. São Paulo: Loyola, 2002, p.27-36. CATARINO, Dílson. Variação lingüística. Disponível em: http://dilsoncatarino.blogspot.com/2008/02/variao-lingstica.html, acessado em 03/10/2008. GERALDI, João Wanderley. Portos de Passagem. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997. POSSENTI, Sírio. Um programa mínimo. In: BAGNO, Marcos. Lingüística da norma. São Paulo: Loyola, 2002. SILVA, Juremir Machado da. O governo Lula em revista: o jornalismo como fenômeno de descobrimento (a cobertura de Veja). Revista FAMECOS, Porto Alegre, nº 29, abril 2006.