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BAGNO, Marcos. Preconceito lingüístico: o que é, como se faz. 21. ed. São Paulo:
Loyola, 1999.

                                                                                                     1
                                                                          Adriano Mascarenhas Lima


       Em uma sociedade que, pelo menos externamente, abomina o preconceito, é de se
espantar que uma das formas desse mal seja tão praticada e propagada na atualidade: a
forma lingüística. A gramática normativa tradicional, tratada equivocadamente como se
fosse a própria língua portuguesa em si, tem sido imposta como única forma aceitável da
língua, dando margem ao severo poder opressor do preconceito lingüístico.
       Marcos Bagno, em seu livro “Preconceito lingüístico: o que é, como se faz”, lança
luz muito competentemente sobre esse mecanismo de exclusão social, explicitando suas
causas e efeitos, ao mesmo tempo em que cientificamente põe em descrédito aqueles que
inadvertida e ou insistentemente o cometem.
       Para tanto, ele dedica 165 páginas, divididas em quatro partes, à quebra do
preconceito lingüístico, primeiro prestando-se à desmistificação deste, em seguida,
mostrando suas conseqüências, prosseguindo com elucidações sobre como desfazê-lo, e
finalizando com a explicação do preconceito contra a Lingüística e os lingüistas. Ele
assume que tratar de língua é tratar de política, e que não há como tratar de política sem se
levar em conta uma postura teórica definida, portanto, parcial, e almeja que seu trabalho
incite reflexões sobre a intolerância lingüística da sociedade brasileira.
       Na primeira parte, a metáfora “mitologia do preconceito lingüístico”, empregada
por ele para referir-se ao conjunto de opiniões que sustentam o preconceito, contém uma
direta crítica que desta maneira classifica tais posturas como falaciosas, fantásticas.
Separando os “mitos” em oito capítulos, Bagno discorre sobre cada um deles.
       O primeiro trata de uma hipotética unidade na língua portuguesa falada no Brasil,
uma vez que se confunde o fato de a língua oficial do Brasil ser a portuguesa com a
afirmação sobre não haver variedades nesta, quando o que ocorre é exatamente o contrário.
Ele encara este preconceito como o mais sério, pois, apoiada neste mito, a escola tenta
impor como correta uma norma que não é verdadeiramente própria ao país como um todo,


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 Graduando em Letras pela FUCAMP – Fundação Carmelitana Mário Palmério.
Contato: adriano_mascarenhas@yahoo.com.br
desconsiderando a origem geográfica, condição sócio-econômica e grau de escolaridade
dos alunos. O autor explicita dizendo que os Parâmetros Curriculares Nacionais não portam
esse erro, pregando o respeito à diversidade lingüística nacional, e espera que a inovação
seja vivenciada em breve.
       O segundo mito, que afirma que “o brasileiro não sabe falar português”, e que “só
em Portugal se fala bem português”, reflete, segundo ele, o ainda presente complexo de
inferioridade nacional, como se até hoje o Brasil fosse colônia de Portugal. Lamenta-se
muitas vezes que o brasileiro “corrompa” a língua portuguesa, com queixas freqüentes
também à invasão de galicismos e anglicismos. Bagno afirma que além de tais
incorporações não prejudicarem uma língua, os verdadeiros motivos delas não são
combatidos, pois eles decorrem mais da dependência político-econômica do Brasil em
relação aos centros de poder mundial do que da opção arbitrária da população. Ele
esclarece que a diferença entre o português falado em Portugal e no Brasil é uma verdade
que os defensores desse mito não compreendem. Marcos Bagno, além de evidenciar estas
diferenças, mostra que os portugueses cometem suas próprias infrações contra a gramática
normativa, diferentes das cometidas aqui; portanto, se houvesse uma língua pura, nem
mesmo em Portugal ela seria amplamente falada.
       Em terceiro lugar, vem o mito: “Português é muito difícil”, uma conseqüência do
segundo. O autor o desmente facilmente, alegando que qualquer criança de três a quatro
anos de idade já é uma falante competente de sua língua materna, tendo internalizado a
gramática de sua língua, e precisando do estudo (escrita e leitura) apenas para dominar
particularidades desta estrutura básica. Trata-se de uma conseqüência do segundo mito no
sentido de que se o brasileiro acha difícil aprender estas particularidades, é porque o ensino
insiste em voltar-se para a norma de Portugal, desconsiderando o uso brasileiro do
português. Ele afirma também que esta insistência serve muito bem à manutenção da
diferença entre as classes sociais, uma vez que a “dificuldade do português” justificaria que
poucos soubessem dominá-lo. É como se a metáfora da mitologia lingüística se aplicasse
novamente, transformando o “saber língua” (que na verdade é confundido com “saber
gramática”), em um conhecimento “místico” inacessível, ao qual somente alcançam uns
poucos “iluminados” teriam acesso.
No quarto capítulo, o livro desfaz a idéia de que “pessoas sem instrução falam tudo
errado”. A troca das consoantes “l” e “r”, por exemplo, presente nas formas: “Cráudia”,
“praca” e “pranta”, que se desviam da norma da escola, da gramática e do dicionário, são
marcas de um fenômeno fonético chamado rotacismo, o mesmo que transformou as
palavras latinas “plaga”, “obligare” e “sclavu” respectivamente em “praga”, “obrigar” e
“escravo”, por exemplo. Obviamente não se trata de deficiência mental dos falantes
brasileiros, como pregam alguns radicais do preconceito lingüístico. É uma tendência
natural, já que estas consoantes são aparentadas, e o ensino, ao invés de ridicularizar as
pessoas que usam estas formas em sua língua oral, deveria contribuir para que a criança
aprendesse a forma padrão (a qual muitas vezes lhe é totalmente estranha), mas sempre
numa perspectiva de “adição”, não de “suplantação irracional de suas próprias origens”.
Sendo uma tendência inerente à língua, as pessoas falantes destas variantes não-padrões só
são estigmatizadas pela sociedade devido ao preconceito por estarem fora do âmbito
lingüístico, residindo, portanto, em questões unicamente sociais. Por fim, o autor chama
também a atenção da mídia, que propaga em suas novelas, por exemplo, uma variedade
totalmente pitoresca do dialeto nordestino, caricata, o que contribui para a estigmatização
deste.
         O quinto mito parece, mais uma vez, ter a mesma origem: “O lugar onde melhor se
fala português é o Maranhão”. Ou seja, mais uma vez a adequação às normas de Portugal é
tratada como necessária. Mostrando que o português de Maranhão possui seus desvios, o
autor comprova que não existe variedade “melhor”, “mais pura”, “mais bonita”, ou “mais
correta” do que outra, assim como o português falado em Portugal não possui nenhum
destes atributos em relação ao do Brasil. Trata-se, mais uma vez, da questão da
variabilidade à qual todas as línguas estão intrinsecamente sujeitas.
         “O certo é falar assim porque se escreve assim”. Este sexto mito diz respeito à
supervalorização da ortografia na língua oral. O autor ressalta neste capítulo que a
ortografia não passa de uma convenção, aplicável apenas à língua escrita, e que, portanto,
não faz o menor sentido tentar estendê-la à oralidade. Por mais elaborados que sejam os
sistemas ortográficos, eles não têm subsídios para fazer uma representação totalmente fiel a
uma língua.
O sétimo mito é um dos quais as pessoas menos discordam: “É preciso saber
gramática para falar e escrever bem”. Comprovadamente falando, não há nada a favor da
gramática tradicional nesse sentido. Pelo contrário, sabe-se que a grande dificuldade em
seguir as suas prescrições, gerada no ensino, acaba por inibir muitos escritores. Neste
capítulo, Bagno também discorre sobre a relação entre a gramática e a norma culta. Ele
elucida que objetivo verdadeiro da gramática seria descrever a língua, e não tentar ditar
seus rumos: Se a própria língua falada pelas pessoas cultas da atualidade não segue os
rígidos padrões da gramática normativa tradicional à risca, seria necessário refazê-la, de
forma a acompanhar a língua verdadeira.
       O oitavo e último mito tem o seguinte título: “O domínio da norma culta é um
instrumento de ascensão social”. Humoradamente, Bagno diz que “os professores
ocupariam o topo da pirâmide social, econômica e política do país” (p. 69) se isso fosse
verdade. Retomando a idéia de que tratar da língua é tratar de política, ele diz que na
verdade a questão das diferenças de classe jamais poderia ser resolvidas apenas com o
ensino de uma língua padrão, e acreditar nisso é ingenuidade ou cinismo, uma vez que a
questão está na verdade muito mais ligada às relações de poder existentes no país.
       Numa segunda parte, Bagno retrata o ciclo vicioso formado por três elementos
responsáveis pelo preconceito lingüístico: a gramática normativo-prescritivista, o ensino
tradicional e os livros didáticos. É um ciclo que se inicia quando a escola se apóia na
gramática tradicional para desenvolver sua metodologia, o que gera a indústria do livro
didático, perpetuadora desta tradição. Segundo Bagno, um quarto elemento agrava a
situação: o dos chamados “comandos paragramaticais”, grupos de gramáticos que vendem
seu conhecimento da gramática normativa em diversos meios de comunicação, valendo-se
das opiniões classificadas por Bagno como “mitos”, para se fazer de “fonte de solução dos
problemas da língua”. São posturas que estão completamente permeadas por preconceito
lingüístico, de forma que o autor dedica os próximos três capítulos aos autores: Napoleão
Mendes de Almeida, Luiz Antônio Sacconi e Dad Squarisi, a fim de mostrar o quanto suas
opiniões estão em desacordo com a Lingüística moderna.
       A terceira parte é reservada à desconstrução do preconceito lingüístico. O primeiro
passo reside no reconhecimento da crise. Professores contemporâneos já reconhecem que
gramática tradicional já não serve como único instrumento de ensino, e que o ensino de
língua portuguesa encontra-se em um momento sensível, porque não há material didático
que substitua ou complemente essa gramática a fim de permitir o ensino da norma culta.
Bagno então retoma uma idéia lançada na desarticulação do sétimo mito, “o que é e onde
está essa norma culta?” (p. 105), e, recorrendo a três argumentos, mostra que esta é algo
reservado a poucas pessoas no país: Primeiro devido à grande quantidade de analfabetos
plenos e funcionais existentes aqui. Segundo devido ao fato de grande parte das pessoas
escolarizadas não ter a prática da leitura e da escrita inserida em seus hábitos, por razões
histórico-culturais. E terceiro porque a concepção de norma culta feita pela gramática
normativa não corresponde (como dito na explicação sobre o primeiro mito) a nenhuma
modalidade da língua real usada no Brasil, nem mesmo à praticada pelas pessoas cultas.
Trata-se, na verdade, de um ideal atado ao português de Portugal, à opção estilística de
grandes escritores do passado, à proximidade com a gramática latina ou até mesmo ao
gosto pessoal do gramático.
       Bagno afirma que é necessária a criação de uma nova gramática brasileira, que
atente para a verdadeira norma culta falada no Brasil. Enquanto esta não for criada, as
pessoas precisam de uma mudança de atitude. Usuários comuns da língua precisam rejeitar
que a prescrição ilógica da gramática tradicional menospreze seu saber lingüístico, e
professores precisam assumir uma postura reflexiva perante o ensino de língua, pondo em
dúvida, em investigação e levantamento de hipóteses todas as diferenças entre o que a
gramática prega e a língua culta realmente usada no país.
       Ao aprofundar-se na atividade investigativa do professor, o autor questiona então “o
que é ensinar português.” Segundo ele, quando uma pessoa aprende a dirigir, ela não tem
que saber o funcionamento do motor de seu carro para ser uma boa motorista, sendo que o
mesmo vale para o ensino da língua: os alunos precisam tornar-se usuários competentes de
sua língua materna, não conhecedores das minúcias de seu funcionamento, as quais quem
tem que conhecer é o instrutor, o técnico da área.
       Uma outra noção que precisa ser esclarecida diz respeito ao erro. O autor explica
que é comum o equívoco de classificar “erro de ortografia” como “erro de português”. Já
tendo discorrido algo sobre a ortografia no sexto mito, ele ressalta que a ortografia é uma
convenção cujo rompimento dificilmente prejudica a gramaticalidade de um enunciado. Em
outras palavras, os erros verdadeiros estariam na produção de enunciados que
desrespeitassem a aceitabilidade, o que os falantes raramente fazem. Diz-se então que, em
contrapartida, com a eliminação do conceito de erro, haveria então um total descaso com a
língua, uma situação de “vale-tudo”. O autor resolve o questionamento com duas páginas
apenas, explicando que a língua é um acervo do qual se pode retirar a palavra para qualquer
ocasião, tudo depende “de quem diz o quê, a quem, como, quando, onde, por quê e visando
que efeito” (p.131). A tal “paranóia ortográfica” dos professores mostra-se então
injustificada, porque o conhecimento da ortografia não possui uma relação direta com o
conhecimento da língua. É a qualidade do que é dito (em todos os sentidos) que deve ser
analisada.
       Para a subversão do preconceito lingüístico, Marcos Bagno sugere que algumas
medidas sejam tomadas pelos professores. A primeira delas é a tomada de consciência, para
que, além de terem uma formação sólida, os professores de língua estejam sempre
informados, rejeitando a abordagem tradicional de ensino, que preza a repetição, em favor
de uma posição científica, investigadora e produtora de conhecimento. Uma segunda
medida, mais técnica, seria transformar a prática de ensino dentro da sala de aula, que se
não for desprender-se totalmente da gramática prescritiva, que pelo menos a questione
exaustivamente com os alunos. A terceira medida seria mostrar aos pais de alunos, diretores
e donos de escolas que as ciências avançam, e que com a ciência da língua isso não é
diferente. Em quarto lugar, Bagno exibe dez importantes noções “para um ensino de língua
não (ou menos) preconceituoso”: as dez cisões, uma orientadora síntese dos pontos que ele
elucidou ao longo da obra.
       Na quarta parte de seu livro, Marcos Bagno discorre sobre o preconceito contra a
Lingüística e os lingüistas, fazendo um contraponto com outras áreas de estudo. Embora a
Lingüística tenha se firmado como ciência há mais de cem anos, recebendo contribuições
constantes desde então, todas as áreas da educação atualizaram-se com os progressos de
suas respectivas ciências, exceto a língua portuguesa, que continuou presa às práticas da
gramática prescritiva tradicional. Com as mudanças acentuadas pela qual a língua
portuguesa tem passado recentemente, criou-se uma distância ainda maior entre a gramática
e a língua, e as pessoas erroneamente classificam isso como uma crise. A crise existe sim,
na escola pública, devido aos problemas sócio-econômicos do país, mas a língua
portuguesa permanece totalmente funcional e difundida pelos diversos meios de
comunicação através do globo, expandindo sua influência a cada dia. O autor, então, fala
sobre os ataques dos “comandos paragramaticais” contra a Lingüística, sustentados por
Napoleão Mendes de Almeida e Pasquale Cipro Neto, que, sem fundamento aceitável
algum, proferem inverdades sobre a Lingüística e os lingüistas. Bagno termina seu livro
lançando a reflexão: “A quem interessa calar os lingüistas?”. É uma questão cuja resposta
ele não fornece. Se a tradição e os “comandos paragramaticais” são tomados como leis
quando a ciência é que deveria orientar a população e a escola, mantendo os graves
problemas pedagógicos que perpetuam as desigualdades sociais, algo está errado. Deixando
a reflexão para o leitor, Bagno encerra seu livro.
       “Preconceito lingüístico: o que é, como se faz” é uma obra fascinante, uma leitura
fácil, com linguagem acessível até mesmo para leigos na área da Lingüística, mas sem
vulgaridade, que esclarece muitos pontos permeados pelo obscurantismo científico ao qual
estão sujeitas muitas pessoas. O autor trata da discriminação lingüística com tamanha
propriedade e responsabilidade política ao longo de todo o livro que é tecnicamente
impossível a não-reflexão quanto à questão da ciência Lingüística no Brasil. O único ponto
que pode ser apresentado como negativo é o fato de, por vezes, Bagno ser muito
contundente    em    sua   retaliação   (completamente    argumentada)    aos   “comandos
paragramaticais”, mas isso não tira a veracidade e pertinência de nada do que é exposto.
       É um livro que, como outras obras da área, precisa ser difundido rapidamente entre
o professorado brasileiro, em prol de um ensino de língua portuguesa realmente
responsável, comprometido com a sociedade e não com os mecanismos excludentes que
nela estão enraizados.

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14.resenha adriano - preconceito linguistico

  • 1. BAGNO, Marcos. Preconceito lingüístico: o que é, como se faz. 21. ed. São Paulo: Loyola, 1999. 1 Adriano Mascarenhas Lima Em uma sociedade que, pelo menos externamente, abomina o preconceito, é de se espantar que uma das formas desse mal seja tão praticada e propagada na atualidade: a forma lingüística. A gramática normativa tradicional, tratada equivocadamente como se fosse a própria língua portuguesa em si, tem sido imposta como única forma aceitável da língua, dando margem ao severo poder opressor do preconceito lingüístico. Marcos Bagno, em seu livro “Preconceito lingüístico: o que é, como se faz”, lança luz muito competentemente sobre esse mecanismo de exclusão social, explicitando suas causas e efeitos, ao mesmo tempo em que cientificamente põe em descrédito aqueles que inadvertida e ou insistentemente o cometem. Para tanto, ele dedica 165 páginas, divididas em quatro partes, à quebra do preconceito lingüístico, primeiro prestando-se à desmistificação deste, em seguida, mostrando suas conseqüências, prosseguindo com elucidações sobre como desfazê-lo, e finalizando com a explicação do preconceito contra a Lingüística e os lingüistas. Ele assume que tratar de língua é tratar de política, e que não há como tratar de política sem se levar em conta uma postura teórica definida, portanto, parcial, e almeja que seu trabalho incite reflexões sobre a intolerância lingüística da sociedade brasileira. Na primeira parte, a metáfora “mitologia do preconceito lingüístico”, empregada por ele para referir-se ao conjunto de opiniões que sustentam o preconceito, contém uma direta crítica que desta maneira classifica tais posturas como falaciosas, fantásticas. Separando os “mitos” em oito capítulos, Bagno discorre sobre cada um deles. O primeiro trata de uma hipotética unidade na língua portuguesa falada no Brasil, uma vez que se confunde o fato de a língua oficial do Brasil ser a portuguesa com a afirmação sobre não haver variedades nesta, quando o que ocorre é exatamente o contrário. Ele encara este preconceito como o mais sério, pois, apoiada neste mito, a escola tenta impor como correta uma norma que não é verdadeiramente própria ao país como um todo, 1 Graduando em Letras pela FUCAMP – Fundação Carmelitana Mário Palmério. Contato: adriano_mascarenhas@yahoo.com.br
  • 2. desconsiderando a origem geográfica, condição sócio-econômica e grau de escolaridade dos alunos. O autor explicita dizendo que os Parâmetros Curriculares Nacionais não portam esse erro, pregando o respeito à diversidade lingüística nacional, e espera que a inovação seja vivenciada em breve. O segundo mito, que afirma que “o brasileiro não sabe falar português”, e que “só em Portugal se fala bem português”, reflete, segundo ele, o ainda presente complexo de inferioridade nacional, como se até hoje o Brasil fosse colônia de Portugal. Lamenta-se muitas vezes que o brasileiro “corrompa” a língua portuguesa, com queixas freqüentes também à invasão de galicismos e anglicismos. Bagno afirma que além de tais incorporações não prejudicarem uma língua, os verdadeiros motivos delas não são combatidos, pois eles decorrem mais da dependência político-econômica do Brasil em relação aos centros de poder mundial do que da opção arbitrária da população. Ele esclarece que a diferença entre o português falado em Portugal e no Brasil é uma verdade que os defensores desse mito não compreendem. Marcos Bagno, além de evidenciar estas diferenças, mostra que os portugueses cometem suas próprias infrações contra a gramática normativa, diferentes das cometidas aqui; portanto, se houvesse uma língua pura, nem mesmo em Portugal ela seria amplamente falada. Em terceiro lugar, vem o mito: “Português é muito difícil”, uma conseqüência do segundo. O autor o desmente facilmente, alegando que qualquer criança de três a quatro anos de idade já é uma falante competente de sua língua materna, tendo internalizado a gramática de sua língua, e precisando do estudo (escrita e leitura) apenas para dominar particularidades desta estrutura básica. Trata-se de uma conseqüência do segundo mito no sentido de que se o brasileiro acha difícil aprender estas particularidades, é porque o ensino insiste em voltar-se para a norma de Portugal, desconsiderando o uso brasileiro do português. Ele afirma também que esta insistência serve muito bem à manutenção da diferença entre as classes sociais, uma vez que a “dificuldade do português” justificaria que poucos soubessem dominá-lo. É como se a metáfora da mitologia lingüística se aplicasse novamente, transformando o “saber língua” (que na verdade é confundido com “saber gramática”), em um conhecimento “místico” inacessível, ao qual somente alcançam uns poucos “iluminados” teriam acesso.
  • 3. No quarto capítulo, o livro desfaz a idéia de que “pessoas sem instrução falam tudo errado”. A troca das consoantes “l” e “r”, por exemplo, presente nas formas: “Cráudia”, “praca” e “pranta”, que se desviam da norma da escola, da gramática e do dicionário, são marcas de um fenômeno fonético chamado rotacismo, o mesmo que transformou as palavras latinas “plaga”, “obligare” e “sclavu” respectivamente em “praga”, “obrigar” e “escravo”, por exemplo. Obviamente não se trata de deficiência mental dos falantes brasileiros, como pregam alguns radicais do preconceito lingüístico. É uma tendência natural, já que estas consoantes são aparentadas, e o ensino, ao invés de ridicularizar as pessoas que usam estas formas em sua língua oral, deveria contribuir para que a criança aprendesse a forma padrão (a qual muitas vezes lhe é totalmente estranha), mas sempre numa perspectiva de “adição”, não de “suplantação irracional de suas próprias origens”. Sendo uma tendência inerente à língua, as pessoas falantes destas variantes não-padrões só são estigmatizadas pela sociedade devido ao preconceito por estarem fora do âmbito lingüístico, residindo, portanto, em questões unicamente sociais. Por fim, o autor chama também a atenção da mídia, que propaga em suas novelas, por exemplo, uma variedade totalmente pitoresca do dialeto nordestino, caricata, o que contribui para a estigmatização deste. O quinto mito parece, mais uma vez, ter a mesma origem: “O lugar onde melhor se fala português é o Maranhão”. Ou seja, mais uma vez a adequação às normas de Portugal é tratada como necessária. Mostrando que o português de Maranhão possui seus desvios, o autor comprova que não existe variedade “melhor”, “mais pura”, “mais bonita”, ou “mais correta” do que outra, assim como o português falado em Portugal não possui nenhum destes atributos em relação ao do Brasil. Trata-se, mais uma vez, da questão da variabilidade à qual todas as línguas estão intrinsecamente sujeitas. “O certo é falar assim porque se escreve assim”. Este sexto mito diz respeito à supervalorização da ortografia na língua oral. O autor ressalta neste capítulo que a ortografia não passa de uma convenção, aplicável apenas à língua escrita, e que, portanto, não faz o menor sentido tentar estendê-la à oralidade. Por mais elaborados que sejam os sistemas ortográficos, eles não têm subsídios para fazer uma representação totalmente fiel a uma língua.
  • 4. O sétimo mito é um dos quais as pessoas menos discordam: “É preciso saber gramática para falar e escrever bem”. Comprovadamente falando, não há nada a favor da gramática tradicional nesse sentido. Pelo contrário, sabe-se que a grande dificuldade em seguir as suas prescrições, gerada no ensino, acaba por inibir muitos escritores. Neste capítulo, Bagno também discorre sobre a relação entre a gramática e a norma culta. Ele elucida que objetivo verdadeiro da gramática seria descrever a língua, e não tentar ditar seus rumos: Se a própria língua falada pelas pessoas cultas da atualidade não segue os rígidos padrões da gramática normativa tradicional à risca, seria necessário refazê-la, de forma a acompanhar a língua verdadeira. O oitavo e último mito tem o seguinte título: “O domínio da norma culta é um instrumento de ascensão social”. Humoradamente, Bagno diz que “os professores ocupariam o topo da pirâmide social, econômica e política do país” (p. 69) se isso fosse verdade. Retomando a idéia de que tratar da língua é tratar de política, ele diz que na verdade a questão das diferenças de classe jamais poderia ser resolvidas apenas com o ensino de uma língua padrão, e acreditar nisso é ingenuidade ou cinismo, uma vez que a questão está na verdade muito mais ligada às relações de poder existentes no país. Numa segunda parte, Bagno retrata o ciclo vicioso formado por três elementos responsáveis pelo preconceito lingüístico: a gramática normativo-prescritivista, o ensino tradicional e os livros didáticos. É um ciclo que se inicia quando a escola se apóia na gramática tradicional para desenvolver sua metodologia, o que gera a indústria do livro didático, perpetuadora desta tradição. Segundo Bagno, um quarto elemento agrava a situação: o dos chamados “comandos paragramaticais”, grupos de gramáticos que vendem seu conhecimento da gramática normativa em diversos meios de comunicação, valendo-se das opiniões classificadas por Bagno como “mitos”, para se fazer de “fonte de solução dos problemas da língua”. São posturas que estão completamente permeadas por preconceito lingüístico, de forma que o autor dedica os próximos três capítulos aos autores: Napoleão Mendes de Almeida, Luiz Antônio Sacconi e Dad Squarisi, a fim de mostrar o quanto suas opiniões estão em desacordo com a Lingüística moderna. A terceira parte é reservada à desconstrução do preconceito lingüístico. O primeiro passo reside no reconhecimento da crise. Professores contemporâneos já reconhecem que gramática tradicional já não serve como único instrumento de ensino, e que o ensino de
  • 5. língua portuguesa encontra-se em um momento sensível, porque não há material didático que substitua ou complemente essa gramática a fim de permitir o ensino da norma culta. Bagno então retoma uma idéia lançada na desarticulação do sétimo mito, “o que é e onde está essa norma culta?” (p. 105), e, recorrendo a três argumentos, mostra que esta é algo reservado a poucas pessoas no país: Primeiro devido à grande quantidade de analfabetos plenos e funcionais existentes aqui. Segundo devido ao fato de grande parte das pessoas escolarizadas não ter a prática da leitura e da escrita inserida em seus hábitos, por razões histórico-culturais. E terceiro porque a concepção de norma culta feita pela gramática normativa não corresponde (como dito na explicação sobre o primeiro mito) a nenhuma modalidade da língua real usada no Brasil, nem mesmo à praticada pelas pessoas cultas. Trata-se, na verdade, de um ideal atado ao português de Portugal, à opção estilística de grandes escritores do passado, à proximidade com a gramática latina ou até mesmo ao gosto pessoal do gramático. Bagno afirma que é necessária a criação de uma nova gramática brasileira, que atente para a verdadeira norma culta falada no Brasil. Enquanto esta não for criada, as pessoas precisam de uma mudança de atitude. Usuários comuns da língua precisam rejeitar que a prescrição ilógica da gramática tradicional menospreze seu saber lingüístico, e professores precisam assumir uma postura reflexiva perante o ensino de língua, pondo em dúvida, em investigação e levantamento de hipóteses todas as diferenças entre o que a gramática prega e a língua culta realmente usada no país. Ao aprofundar-se na atividade investigativa do professor, o autor questiona então “o que é ensinar português.” Segundo ele, quando uma pessoa aprende a dirigir, ela não tem que saber o funcionamento do motor de seu carro para ser uma boa motorista, sendo que o mesmo vale para o ensino da língua: os alunos precisam tornar-se usuários competentes de sua língua materna, não conhecedores das minúcias de seu funcionamento, as quais quem tem que conhecer é o instrutor, o técnico da área. Uma outra noção que precisa ser esclarecida diz respeito ao erro. O autor explica que é comum o equívoco de classificar “erro de ortografia” como “erro de português”. Já tendo discorrido algo sobre a ortografia no sexto mito, ele ressalta que a ortografia é uma convenção cujo rompimento dificilmente prejudica a gramaticalidade de um enunciado. Em outras palavras, os erros verdadeiros estariam na produção de enunciados que
  • 6. desrespeitassem a aceitabilidade, o que os falantes raramente fazem. Diz-se então que, em contrapartida, com a eliminação do conceito de erro, haveria então um total descaso com a língua, uma situação de “vale-tudo”. O autor resolve o questionamento com duas páginas apenas, explicando que a língua é um acervo do qual se pode retirar a palavra para qualquer ocasião, tudo depende “de quem diz o quê, a quem, como, quando, onde, por quê e visando que efeito” (p.131). A tal “paranóia ortográfica” dos professores mostra-se então injustificada, porque o conhecimento da ortografia não possui uma relação direta com o conhecimento da língua. É a qualidade do que é dito (em todos os sentidos) que deve ser analisada. Para a subversão do preconceito lingüístico, Marcos Bagno sugere que algumas medidas sejam tomadas pelos professores. A primeira delas é a tomada de consciência, para que, além de terem uma formação sólida, os professores de língua estejam sempre informados, rejeitando a abordagem tradicional de ensino, que preza a repetição, em favor de uma posição científica, investigadora e produtora de conhecimento. Uma segunda medida, mais técnica, seria transformar a prática de ensino dentro da sala de aula, que se não for desprender-se totalmente da gramática prescritiva, que pelo menos a questione exaustivamente com os alunos. A terceira medida seria mostrar aos pais de alunos, diretores e donos de escolas que as ciências avançam, e que com a ciência da língua isso não é diferente. Em quarto lugar, Bagno exibe dez importantes noções “para um ensino de língua não (ou menos) preconceituoso”: as dez cisões, uma orientadora síntese dos pontos que ele elucidou ao longo da obra. Na quarta parte de seu livro, Marcos Bagno discorre sobre o preconceito contra a Lingüística e os lingüistas, fazendo um contraponto com outras áreas de estudo. Embora a Lingüística tenha se firmado como ciência há mais de cem anos, recebendo contribuições constantes desde então, todas as áreas da educação atualizaram-se com os progressos de suas respectivas ciências, exceto a língua portuguesa, que continuou presa às práticas da gramática prescritiva tradicional. Com as mudanças acentuadas pela qual a língua portuguesa tem passado recentemente, criou-se uma distância ainda maior entre a gramática e a língua, e as pessoas erroneamente classificam isso como uma crise. A crise existe sim, na escola pública, devido aos problemas sócio-econômicos do país, mas a língua portuguesa permanece totalmente funcional e difundida pelos diversos meios de
  • 7. comunicação através do globo, expandindo sua influência a cada dia. O autor, então, fala sobre os ataques dos “comandos paragramaticais” contra a Lingüística, sustentados por Napoleão Mendes de Almeida e Pasquale Cipro Neto, que, sem fundamento aceitável algum, proferem inverdades sobre a Lingüística e os lingüistas. Bagno termina seu livro lançando a reflexão: “A quem interessa calar os lingüistas?”. É uma questão cuja resposta ele não fornece. Se a tradição e os “comandos paragramaticais” são tomados como leis quando a ciência é que deveria orientar a população e a escola, mantendo os graves problemas pedagógicos que perpetuam as desigualdades sociais, algo está errado. Deixando a reflexão para o leitor, Bagno encerra seu livro. “Preconceito lingüístico: o que é, como se faz” é uma obra fascinante, uma leitura fácil, com linguagem acessível até mesmo para leigos na área da Lingüística, mas sem vulgaridade, que esclarece muitos pontos permeados pelo obscurantismo científico ao qual estão sujeitas muitas pessoas. O autor trata da discriminação lingüística com tamanha propriedade e responsabilidade política ao longo de todo o livro que é tecnicamente impossível a não-reflexão quanto à questão da ciência Lingüística no Brasil. O único ponto que pode ser apresentado como negativo é o fato de, por vezes, Bagno ser muito contundente em sua retaliação (completamente argumentada) aos “comandos paragramaticais”, mas isso não tira a veracidade e pertinência de nada do que é exposto. É um livro que, como outras obras da área, precisa ser difundido rapidamente entre o professorado brasileiro, em prol de um ensino de língua portuguesa realmente responsável, comprometido com a sociedade e não com os mecanismos excludentes que nela estão enraizados.