O mundo se defronta na era contemporânea com várias crises. A cada dia que se passa, essas crises se aprofundam nas áreas econômica, política, social e ambiental, seja nos planos nacionais, seja em escala planetária. Mas, a maior crise vivida hoje pela humanidade é a crise intelectual do pensamento que se constitui no principal obstáculo à superação das demais crises e à construção de uma nova sociedade centrada no real progresso econômico, político, social e ambiental. A crise intelectual do pensamento da era contemporânea é que faz com que o mundo em que vivemos funcione de forma caótica como uma nave à deriva rumo ao desastre. Precisamos de um novo Iluminismo para o século XXI.
SOCIAL REVOLUTIONS, THEIR TRIGGERS FACTORS AND CURRENT BRAZIL
Novo Iluminismo para enfrentar a crise intelectual
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CRISE INTELECTUAL ATUAL DO PENSAMENTO EXIGE NOVO
ILUMINISMO
Fernando Alcoforado*
O mundo se defronta na era contemporânea com várias crises. A cada dia que se passa,
essas crises se aprofundam nas áreas econômica, política, social e ambiental, seja nos
planos nacionais, seja em escala planetária. Mas, a maior crise vivida hoje pela
humanidade é a crise intelectual do pensamento que se constitui no principal obstáculo à
superação das demais crises e à construção de uma nova sociedade centrada no real
progresso econômico, político, social e ambiental. A crise intelectual do pensamento da
era contemporânea é que faz com que o mundo em que vivemos funcione de forma caótica
como uma nave à deriva rumo ao desastre.
No século XVIII, vários pensadores começaram a se mobilizar em torno da defesa de
ideias que pautavam a renovação de práticas e instituições vigentes em toda Europa.
Levantando questões filosóficas que pensavam a condição e a felicidade do homem, o
movimento iluminista atacou sistematicamente tudo o que era considerado contrário à
busca da felicidade, da justiça e da igualdade social. O movimento iluminista foi baseado
na crença do poder da razão e do progresso, na liberdade de pensamento e na emancipação
política. O iluminismo foi um movimento global, filosófico, político, social, econômico
e cultural, que defendia o uso da razão como o melhor caminho para se alcançar a
liberdade, a autonomia e a emancipação política. O Iluminismo do século XVIII usou
valores da ciência clássica para forjar uma nova visão de mundo, baseada na igualdade
de todos.
Com o iluminismo passa-se a ter uma visão otimista do mundo que não teria como
interromper seu progresso na medida em que o homem contava com o pleno uso de sua
racionalidade. Os direitos naturais, o respeito à diversidade de ideias e a justiça social
deveriam promover a melhoria da condição humana. Oferecendo essas ideias, o
iluminismo motivou as revoluções burguesas na França e em todo o mundo no século
XVIII que trouxeram o fim do Antigo Regime e a instalação de doutrinas de caráter liberal
que predominam no mundo até a era contemporânea.
O Iluminismo forneceu o lema da Revolução Francesa (Liberdade, Igualdade e
Fraternidade) e fecundou-a na medida em que seus seguidores se opunham às injustiças,
à intolerância religiosa e aos privilégios do absolutismo. No entanto, desde a Revolução
Francesa até o presente momento, as promessas políticas do Iluminismo foram
abandonadas em todo o mundo com a adoção de práticas desumanas cada vez mais
sofisticadas pelos governos e imperialistas pelas grandes potências capitalistas, o
desencadeamento de 3 guerras mundiais (1ª Guerra Mundial, 2ª Guerra Mundial e a
Guerra Fria), o advento do fascismo, do nazismo e do neofascismo, a realização de
intervenções militares e realização de golpes de estado em vários países do mundo.
A Modernidade nasceu com a 1ª Revolução Industrial ocorrida em 1876 na Inglaterra
significando um extraordinário esforço intelectual dos pensadores iluministas para
desenvolver a ciência e a razão e descobrir as leis universais para serem postas a serviço
da humanidade. Com a Revolução Industrial, a ciência e a tecnologia adquiriram uma
importância fundamental para o progresso humano, mediante as contínuas inovações
tecnológicas. A ideia era usar o acúmulo de conhecimento gerado em busca da felicidade
humana e do enriquecimento da vida diária.
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A Modernidade está geralmente associada à 2ª Revolução Industrial resultante de
transformações socioeconômicas com a industrialização da Inglaterra, da França, da
Alemanha, da Itália, dos Estados Unidos e do Japão, caracterizadas especialmente pelo
desenvolvimento de novas fontes de energia (eletricidade e petróleo), pela substituição
do ferro pelo aço e pelo surgimento de novas máquinas, ferramentas e produtos químicos
(como o plástico). Entre 1909, quando Henry Ford criou a linha de montagem e inaugurou
a produção em série, e o final do século XX, quase todas as indústrias se mecanizaram e
a automação se estendeu a todos os setores fabris.
A Modernidade é identificada com a crença no progresso e nos ideais do Iluminismo.
Entretanto, a evolução da Modernidade foi marcada por eventos que marcaram
negativamente a sociedade atual. O principal deles foi sem dúvida às catástrofes da I e da
II Guerra Mundial. Na verdade, a ciência e a tecnologia contribuíram para a barbárie de
duas guerras mundiais com a invenção de armamentos bélicos poderosos e destrutivos. A
ciência e a tecnologia passaram a ser utilizadas numa escala sem precedentes tanto para
o bem como para o mal. Todo esse desenvolvimento científico e tecnológico culminou
na era atual com uma crise ecológica mundial que pode resultar em uma mudança
climática global catastrófica que pode ameaçar a sobrevivência da humanidade em
meados do século XXI. Nesse sentido pode-se duvidar dos reais benefícios trazidos pelo
progresso científico e tecnológico com o advento da Modernidade.
As teses políticas do Iluminismo fracassaram desde a Revolução Inglesa (1640), a
Revolução Americana (1776) e a Revolução Francesa (1789). Este fracasso abriu
caminho para o advento da ideologia marxista em todo o mundo que se propunha a dar
um passo à frente em relação ao Iluminismo buscando o fim da exploração do homem
pelo homem com a redução das desigualdades econômicas entre as classes sociais e, no
futuro, sua completa abolição com a implantação do comunismo. Os fatos da história
demonstram que as teses iluministas que nortearam as revoluções burguesas no século
XVIII e o Marxismo com base nas quais foram realizadas as revoluções socialistas no
século XX fracassaram porque não cumpriram suas promessas históricas de conquista da
felicidade humana e do progresso econômico compartilhado por todos.
O fim do socialismo na União Soviética e nos países da Europa Oriental, o fracasso do
desenvolvimento econômico em Cuba e na Coréia do Norte e o abandono pela China do
socialismo baseado no modelo soviético, com a adoção de uma economia híbrida do
capitalismo de estado, demonstram a inviabilidade do modelo socialista soviético. Para
evoluir em direção a uma sociedade comunista defendida por Marx, é necessário passar
por um estágio intermediário de economia mista nos moldes da social-democracia dos
países escandinavos. O comunismo preconizado por Marx só poderá ser construído
quando existir o Estado de Bem-Estar Social em cada país e o mundo alcançar a
integração econômica, social e política com a existência de um governo mundial que
assegure o ordenamento da economia global para evitar o caos atual, o ordenamento nas
relações internacionais para evitar as guerras e assegurar a paz mundial e o ordenamento
do meio ambiente global para evitar a degradação da natureza.
O fracasso do Iluminismo e do Marxismo na realização do progresso da humanidade e na
conquista da felicidade para os seres humanos abriu caminho para o advento da Pós-
Modernidade que representa uma reação cultural à perda de confiança no potencial
universal do projeto iluminista e Marxista de sociedade. A Pós-modernidade significa,
portanto, uma reação àquilo que é moderno. Na Pós- Modernidade, o mundo construído
de objetos duráveis foi substituído pelo de produtos disponíveis e projetados para
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imediata obsolescência e descarte. A Pós-Modernidade pode ser caracterizada como uma
reação à cultura ao modo como se desenvolveram historicamente os ideais da
Modernidade, associada à perda de otimismo e confiança no potencial universal do
projeto iluminista e marxista. Configura-se, também, como uma rejeição à tentativa de
colonização pela ciência e pela tecnologia das demais esferas da vida do homem.
Na era contemporânea, a razão e a ciência entraram também em crise profunda com a
derrota dos paradigmas do Iluminismo e do Marxismo na segunda metade do século XX
que foram substituídos pelo novo paradigma da Pós-Modernidade que, segundo seus
ideólogos, não existem verdades. Após constatar que todos os sistemas anteriores estavam
errados, o pós-modernismo chegou à trágica conclusão de que nada pode ser conhecido.
Os pós-modernistas não acreditam na razão. Para os pós-modernistas, mesmo a ciência
seria apenas uma entre várias formas de se conhecer a realidade, sem nada dizer respeito
à verdade.
O pensamento pós-moderno é convergente com o niilismo do filósofo alemão Friedrich
Nietzsche, o filósofo da Alemanha nazista, que em sua obra, A Vontade de Potência
(Petrópolis: Editora Vozes, 2011), afirmou que a solução para a crise estava na rejeição
da razão e no retorno dos profetas, que deveriam, não através da razão, mas da
determinação, fundar novos valores que iriam guiar os povos e erguer novas civilizações.
Se prevalecer o pensamento niilista de Friedrich Nietzsche, a humanidade caminhará
inevitavelmente para o desastre econômico, político, social e ambiental que poderá
ameaçar sua sobrevivência. O grande desafio dos homens e mulheres de pensamento da
era contemporânea consiste em reinventar o Iluminismo ajustado aos tempos atuais para
que ele possa indicar os caminhos que a humanidade terá de trilhar visando a construção
de um mundo melhor.
Conclui-se, pelo exposto, que o desaparecimento no mundo de hoje das últimas reservas
de racionalidade crítica preconizada pelo Iluminismo e pelo Marxismo abriram caminho
para a Pós-Modernidade que representa uma gigantesca ameaça para o progresso da
humanidade. Diante deste fato, trata-se de um imenso desafio para os pensadores
contemporâneos estabelecer novos paradigmas e novos valores de comportamento
racional a serem formulados para a sociedade humana na era atual visando derrotar a
nefasta influência política e ideológica da Pós-Modernidade. Os pensadores
contemporâneos precisam se mobilizar na reinvenção de um novo projeto iluminista
como fizeram os pensadores do século XVIII visando a construção de um mundo novo
que leve ao fim o calvário da humanidade.
Precisamos de um novo Iluminismo para o século XXI. No centro do novo pensamento,
deve estar a proteção de todas as formas de vida e do planeta. O único progresso
humanamente relevante é o que contribui de fato para o bem-estar de todos os seres
humanos e a preservação da natureza que os automatismos do crescimento econômico
não bastam para assegurá-lo. O progresso, nesse sentido, não deve ser visto como uma
doação espontânea da técnica, mas uma construção intencional pela qual os homens
decidem o que deve ser produzido, como e para quem, evitando ao máximo os custos
sociais e ecológicos de uma industrialização selvagem. Esse progresso não pode depender
nem de decisões empresariais isoladas, como é preconizado pelos ideólogos do
neoliberalismo, nem das diretrizes burocráticas de um Estado centralizador, como é
defendido pelos ideólogos do socialismo nos moldes soviéticos, e sim de impulsos
emanados da própria sociedade.
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O Iluminismo do século XXI mantém sua fé na ciência, mas sabe que ela precisa ser
controlada socialmente e que a pesquisa científica e tecnológica precisa obedecer aos fins
e valores estabelecidos com base no consenso social, para que ela não se converta numa
força cega, a serviço da guerra e da dominação. Assume como sua bandeira mais valiosa
a doutrina dos direitos humanos, sem ignorar que na maior parte da humanidade só
profundas reformas sociais e políticas podem assegurar sua fruição efetiva. Combate o
poder ilegítimo, consciente de que ele não se localiza apenas no Estado tirânico, mas
também na sociedade, em que ele se tornou invisível e total, molecular e difuso,
aprisionando o indivíduo em suas malhas tão seguramente como na época da monarquia
absoluta. Luta sem quartel pela liberdade e contra a opressão de qualquer espécie. Edificar
uma nova ordem mundial que seja capaz de organizar não apenas as relações entre os
homens na face da Terra, mas também suas relações com a natureza. Elaborar um contrato
social planetário que possibilite o desenvolvimento econômico e social e o uso racional
dos recursos da natureza em benefício de toda a humanidade.
* Fernando Alcoforado, 80, condecorado com a Medalha do Mérito da Engenharia do Sistema
CONFEA/CREA, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento
Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor
nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de
sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC-
O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil
(Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de
doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003),
Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI
ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary
Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr.
Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe
Planetária (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia Sustentável-
Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio
Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora
CRV, Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no
Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015), As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que
Mudaram o Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016), A Invenção de um novo Brasil (Editora CRV, Curitiba,
2017), Esquerda x Direita e a sua convergência (Associação Baiana de Imprensa, Salvador, 2018, em co-
autoria) e Como inventar o futuro para mudar o mundo (Editora CRV, Curitiba, 2019).