1) A interpretação do sonho apresentado pela paciente revela que um desejo sempre se vincula a outro desejo através de significantes;
2) Na histeria, a vinculação de desejos atrela o sujeito a uma falta, como mostra a identificação histérica da paciente com a amiga magra;
3) A interpretação é alusiva pois aponta para significados além do explícito, vinculando desejos através do jogo significante.
HOSPITAL SÃO JOÃO DE DEUS (parte 1): A ESCUTA PSICANALÍTICA NO HOSPITAL GERAL
Análise Alusiva: Sonho Reveala Desejo
1. A Condução da Análise:
Tema:
A palavra do analista é alusiva:
onde isto se localiza na clínica?
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2. por definição, é algo que se apresenta por
meio do e para o
equívoco
Significante
Isto quer dizer que o significante remete a
várias significações possíveis e a efeitos
diversos
3. Voltemos à questão inicial:
A palavra do analista é alusiva:
onde isto se localiza na clínica?
5. A estrutura da interpretação não deve ser
explicativa, nem mesmo sugestiva ou
imperativa
6. Ela deve ser ALUSIVA e EQUÍVOCA,
pois a interpretação não é para ser
estritamente compreendida, mas para
"provocar ondas"
(Lacan, Conférences et entretiens dans les universités nord-américaines.
1975)
7. Especialmente a partir da obra de Freud,
em que ponto podemos localizar
com mais precisão a estrutura da
interpretação?
10. Há uma passagem muito conhecida d’A interpretação
dos sonhos, na qual Freud apresenta a seguinte
situação de uma de suas pacientes:
Transferencialmente, a paciente se posicionava como
uma crítica à sua afirmação de que os sonhos são
realizações de desejo.
Desta forma, ela se empenhava por refutar o saber do
Outro.
11. Em certa ocasião, ela levou para a sua sessão de
análise um sonho e assim o apresentou:
12. “O senhor sempre me diz que o sonho é um
desejo realizado. Pois bem, vou lhe contar um
sonho cujo tema foi exatamente o oposto -
um sonho em que um de meus desejos não
foi realizado. Como o senhor enquadra isso
em sua teoria? Foi este o sonho:”
13. “Eu queria oferecer uma ceia, mas não
tinha nada em casa além de um pequeno
salmão defumado. Pensei em sair e
comprar alguma coisa, mas então me
lembrei que era domingo à tarde e que
todas as lojas estariam fechadas. Em
seguida, tentei telefonar para alguns
fornecedores, mas o telefone estava com
defeito. Assim, tive que abandonar meu
desejo de oferecer a ceia.”
(cf. A interpretação dos sonhos, capítulo IV)
14. À primeira vista, não há nada neste sonho que possa nos levar à
pensar em um desejo realizado. Na análise do sonho, Freud
recorre aos elementos que dão textura ao sonho. Nas palavras de
Freud: “... a investigação de um sonho é sempre encontrada nos
acontecimentos da véspera.”
(A interpretação dos sonhos, p. 161; edição de 1980)
15. Indo aos elementos diurnos do sonho, Freud faz o
seguinte comentário: “O marido de minha paciente, um
açougueiro atacadista, honesto e competente, comentara
com ela, na véspera, que estava ficando muito gordo e
que, por isso, pretendia começar um regime de
emagrecimento. Propunha-se levantar cedo, fazer
exercícios, ater-se a uma dieta rigorosa e, acima de tudo,
não aceitar mais convites para cear. Ela acrescentou,
rindo, que o marido, no lugar onde almoçava
regularmente, travara conhecimento com um pintor que o
pressionara a lhe permitir que pintasse seu retrato, pois
nunca vira feições tão expressivas. O marido, contudo,
replicara, à sua maneira rude, que ficava muito
agradecido, mas tinha a certeza de que o pintor preferiria
parte do traseiro de uma bonita garota a todo o seu rosto.”
16. Dando sequência à
associação livre, a
paciente, que estava
muito apaixonada
pelo marido e
brincava muito com
ele, diz a Freud que
lhe implorou para
que ele não lhe
desse nenhum
caviar.
17. “Perguntei-lhe o que significava isso, e ela explicou que há
muito tempo desejava poder comer um sanduíche de caviar
todas as manhãs, mas refutava fazer essa despesa.
Naturalmente, o marido a deixaria obter isso
imediatamente, se ela tivesse pedido. Mas, ao contrário, ela
lhe pedira que não lhe desse caviar, para poder continuar a
mexer com ele por causa disso.” (cf., p. 162)
18. Na argumentação de Freud:
“Vi que ela fora obrigada a criar para si mesma um
desejo não realizado na vida real ....” - no caso em
questão não simplesmente o não ter caviar ou abrir
mão do sanduíche matinal de caviar, mas demandar
que o amado não lhe desse caviar - “e o sonho
representava essa renúncia posta em prática.”
Freud faz uma pergunta bem interessante, que pode
nos auxiliar a melhor localizar a estrutura histérica:
“Mas por que precisaria ela de um desejo não
realizado?”
(cf. p. 162)
19. Prosseguindo em seu discurso, a
paciente menciona que na véspera
ela visitou uma amiga
“... de quem confessava ter ciúmes
porque seu marido (de minha
paciente) estava constantemente a
elogiá-la. Felizmente, essa sua
amiga é muito ossuda e magra, e o
marido de minha paciente admirava
figuras mais cheinhas.”
(cf. p. 162)
21. Voltando ao encontro da paciente com a amiga
magra
“Perguntei-lhe o que havia
conversado com sua
amiga magra.
Naturalmente, respondeu,
sobre o desejo dela de
engordar um pouco. A
amiga também lhe
perguntara: „quando é
que você vai nos convidar
para outro jantar? Os que
você oferece são sempre
ótimos.‟” (cf. p. 162)
22. Freud vai entrar em mais detalhes na interpretação
deste sonho. Todavia, o ponto que agora nos
interessa é aquilo que foi mediado pelo significante
salmão defumado:
“ „Como foi‟, perguntei, „que a senhora chegou ao
salmão que aparece no sonho?‟ „Oh‟, exclamou ela,
„salmão defumado é o prato predileto de minha
amiga‟ ” (cf. p. 163)
23. “ ... o próprio desejo de minha
paciente era que o de sua amiga
(engordar) não se realizasse. Mas,
em vez disso, ela sonhou que um
de seus próprios desejos não era
realizado. Portanto, o sonho
adquirirá nova interpretação se
supusermos que a pessoa nele
indicada não era ela mesma, e sim
a sua amiga: que ela se colocara no
lugar da amiga, ou, como
poderíamos dizer, que se
„identificara‟ com a amiga.”
(cf. p. 163)
24. “Qual é o sentido da
identificação histérica?
(...)
A identificação é um
fator altamente
importante no
mecanismo dos
sintomas histéricos.”
(cf. p. 163)
25. Por meio deste sonho, podemos extrair dois pontos cruciais
para a estrutura da interpretação:
1) Um desejo sempre se vincula a outro
desejo
2) Na histeria, a vinculação de um desejo
a outro atrela o sujeito a uma falta
26. O que há de alusivo na interpretação?
sujeito
falta
27. Prosseguiremos com a pergunta
Os lugares do sentido e do não-sentido na
análise:
há indicadores clínicos para isto?
Até lá!
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