O documento discute os elementos e pressupostos dos atos administrativos. Apresenta o conceito de ato administrativo e destaca que os elementos são o conteúdo e a forma. Os pressupostos de existência são o objeto e os pressupostos de validade são o sujeito, motivo, requisitos procedimentais, finalidade, causa e formalização. Por fim, analisa um caso concreto de demissão de servidor para identificar os elementos e pressupostos.
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Elementos do Ato Administrativo e Pressuposto: Análise de um caso
concreto
Eunice Folador*
1. Conceito de Ato Administrativo
A identificação correta dos elementos e pressupostos, de existência e validade, de
um ato administrativo é de importância singular para aquele que queira argumentar sobre a
sua perfeição, validade e eficácia; nulidade ou anulabilidade.
O ato administrativo é uma espécie de atos da administração, que se dividem em:
atos administrativos; atos materiais; atos políticos e atos de direito privado.
Tem-se como conceito de ato administrativo a declaração jurídica que decorre da
função administrativa, sob o regime jurídico de direito público. Tal conceito contém, no
mínimo, três idéias: ato jurídico; função administrativa e regime jurídico público.
Assim, é ato jurídico, posto que produz efeitos no mundo jurídico, necessariamente.
Deve ser decorrente da atuação de sujeito em função administrativa, para obter a
característica que o individualiza no mundo dos atos jurídicos. E, ainda, a execução deve
ocorrer sob o regime jurídico público, advindo do Estado ou de quem lhe faça as vezes.
Celso Antônio Bandeira de Mello acrescenta a este conceito mais duas
características: concreção e unilateralidade.[1] Por concreção entende-se a necessária
produção de efeitos concretos, afastando-se os efeitos abstratos, dos atos normativos por
exemplo. Por unilateralidade tem-se a idéia da hiperatividade, afastando a bilateralidade,
característica dos contratos – atos bilaterais.
A partir do conceito e dessas idéias prévias, pode-se adentrar no assunto elementos
e pressupostos do ato administrativo.
2. Elementos e Pressupostos do Ato Administrativo
2. A doutrina não chegou a um consenso sobre o que se entende por elementos do ato
administrativo e quais seriam eles.
Nesse sentido, pertinente o comentário de Régis Fernandes de Oliveira:
Inicialmente, aponte-se que se tem feito verdadeira tormenta em torno dos elementos do ato
administrativo, no tocante à terminologia empregada. Cada autor utiliza-se de determinado
termo para significar uma coisa, sem atentar a que outro doutrinador dele se utilizou
emprestando-lhe outra significação. Surgem, assim, verdadeiras discrepâncias de rótulo.
Discute-se em torno de simples nome, sem que cada um atente ao que de real entende por
aquilo e como os demais autores o trataram.[2]
Não obstante, tradicionalmente apresentam-se cinco elementos a constituírem o ato
administrativo, sendo eles: sujeito; finalidade; forma; motivo e objeto.
Nesse trabalho, entretanto, adotar-se-á o ensinamento do doutrinador Celso Antônio
Bandeira de Mello, sem desprezo a qualquer outro entendimento doutrinário.
Este doutrinador parte do conceito de elemento para definir o que é elemento e o
que passa a ser pressuposto do ato. Diz que a palavra elemento significa a parte
componente de um todo, e, por óbvio, o que é externo ou antecedente ao ato não pode ser
parte dele, não pode ser um elemento.[3]
Desse modo, dois são, realmente, elementos, ou seja, realidades intrínsecas do ato.
Em uma palavra, componentes dele, a saber: o conteúdo e a forma. Não, porém, os outros.
Dali separarmos os elementos do ato e os pressupostos do ato. Estes últimos, de seu turno,
distinguem-se em pressupostos de existência, ou seja, condicionantes de sua existência, e
pressupostos de validade, ou seja, condicionantes de sua lisura jurídica.[4](Grifos nosso)
2.1. Elementos
Em breves palavras, como elemento do ato administrativo, o conteúdo é a
disposição sobre alguma coisa, sobre um objeto. Por isso se distinguem entre si, não sendo
iguais, malgrado entendimento diverso.
O conteúdo é aquilo que o ato dispõe, isto é, o que o ato decide, enuncia, certifica, opina ou
modifica na ordem jurídica.[5]
Régis Fernandes de Oliveira descreve que objeto não é conteúdo, porque antecede o
ato administrativo e deve ser lícito, possível, física e juridicamente certo e determinado,
razoável e moral.[6] O conteúdo versará sobre o objeto, no ato administrativo.
A forma, por sua vez, refere-se à exteriorização do ato administrativo, do conteúdo,
e pode ou não estar prevista em lei.
3. Esclareça-se que não se deve confundir forma com formalização, que é o modo
específico de apresentação da forma, ou seja, uma dada solenização requerida para o ato.
Esta última é um pressuposto formalístico, de validade. [7]
Os demais elementos tradicionalmente apresentados serão aqui tratados como
pressupostos.
2.2. Pressuposto de existência
É pressuposto de existência do ato administrativo o objeto. Este é aquilo que
antecedo o ato; sobre o que este dispõe; sobre o que versa o conteúdo. E como já dito, deve
ser juridicamente possível, lícito, moral, razoável e determinado. Além disso, deve ser
pertinente à função administrativa, para que seja considerado também objeto de ato
administrativo.
Sem objeto – material e juridicamente possível – não pode urgir ato jurídico algum,
seja ele administrativo ou de qualquer outra tipologia. Um ato, isto é, um conteúdo
exteriorizado, que incida sobre um objeto inexistente é um ato inexistente, um não-ato.
Vale dizer: pode ter existência material, apenas, ou então, apresentar-se como mero fato.
Juridicamente relevante, mas ato jurídico não será. Logo, não poderá ser ato
administrativo.[8]
São exemplos de ato administrativo sem objeto, pois que tido como impossíveis,
citados por Lafayette Pondé: decreto que exonera servidor por motivo de falecimento;
edital de citação de pessoa falecida e licença deferida a pessoa desconhecida.[9]
2.3. Pressupostos de Validade
Foram apresentados até agora como elementos: o conteúdo e a forma; e como
pressuposto de existência: o objeto.
Na seqüência, como pressupostos de validade, são comentados: sujeito; motivo;
requisitos procedimentais; finalidade; causa e formalização.
Sujeito é aquele que pratica o ato. Não basta ser capaz, como no Direito privado,
deve ser competente para tal. A competência sempre estará estabelecida em lei.
4. Não pode ser considerado elemento, porque não faz parte do ato, já que se refere a
quem o pratica. Também não o antecede, mas existe de forma paralela, devendo ser
considerado pressuposto de validade.
O Motivo é o pressuposto de fato que autoriza a prática do ato e nele está presente,
não como parte ou pressuposto de existência. Como existe no mundo empírico, exterioriza
o ato, não sendo elemento.
O motivo legal, como espécie de motivo, é pressuposto
legal ou previsão abstrata (em ato normativo) de uma situação fática. Alguns doutrinadores
colocam o motivo como pressuposto de fato e de direito, num único conceito.
Não se deve confundir o motivo com o objeto, porque este deve anteceder o ato com
a condição de ser possível (por exemplo, não se exonera pessoa já morta). O motivo é o
fato já possível, com a previsão explícita ou implícita na lei (como exemplo, exonerar
pessoa viva, conforme legislação correspondente).
Outro exemplo: motivo de dissolução de uma passeata perturbadora da ordem
pública é a real ocorrência de um acontecimento tumultuoso[10] (na análise do objeto, a
passeata deve ser de pessoas capazes de assim agir).
Todo ato administrativo possui um motivo, podendo ocorrer de este estar ou não
expresso no ato, conforme o caso concreto. Isto porque, existem atos que não exigem a
explicitação do motivo, não significando isso que ele não exista. É o caso da exoneração de
servidor ocupante de cargo de livre nomeação e exoneração, cujo motivo é a faculdade de
não apresentar algum, admitida em lei, excepcionalmente.
Caso contenha referido ato administrativo expressado o motivo, mesmo que a lei
dispense, sua validade dependerá da existência daquele enunciado, nos moldes da Teoria
dos Motivos Determinantes, a qual exige a correlação entre o motivo e o ato.
A exposição de motivos nos atos administrativos, como regra geral, decorre do Princípio da
Motivação do Ato Administrativo.
Celso Antônio Bandeira de Mello coloca, outrossim, como pressuposto de validade
do ato administrativo, atos que devem, por imposição normativa, preceder a um
determinado ato[11], chamando isso de Requisitos Procedimentais.
Por exemplo: a nomeação de candidato para cargo efetivo dependerá da aprovação
em concurso público e demais atos correspondentes; a demissão de servidor efetivo deverá
ser fundamentada em decisão decorrente de processo administrativo disciplinar.
A Finalidade, ao seu turno, é o resultado a ser alcançado, a conseqüência do ato
administrativo. Para achar a finalidade do ato administrativo faz-se a pergunta “para que?”,
enquanto que para determinar-se o motivo do ato faz-se a pergunta “por que?”.
No ensinamento de Petrônio Braz, a finalidade ou a ‘causa finalis’, como
pressuposto teleológico, é o fim público exigido em todo o ato administrativo.[12] Deste
5. modo, não se busca apenas o aspecto concreto do ato, mas também uma finalidade pública
específica.
A edição de um ato que não contenha finalidade pública, ou que tenha esta
desvinculada do ato produzido, culmina em desvio de finalidade e invalidade.
Prosseguindo a dissertação, pode-se visualizar também como pressuposto de
validade do ato administrativo, a sua Causa, que é o vínculo de pertinência lógica entre o
motivo e o conteúdo do ato. Nos dizeres de André Gonçalves Pereira, citado por Celso
Antônio Bandeira de Mello, é uma relação de adequação entre os pressupostos do ato e o
seu objeto.[13]
Tal como ocorre no pressuposto finalidade, a falta de “causa”, congruente ao
motivo, invalida o ato administrativo.
Outrossim, causa não se confunde com motivo. Motivo é o pressuposto de fato; causa é a
relação entre ele e o conteúdo do ato em vista da finalidade que a lei lhe assinou como
própria. (...) Através da causa vai-se examinar se os motivos em que se calçou o agente,
ainda que não previstos em lei, guardam nexo lógico de pertinência com a decisão tomada,
em face da finalidade que, de direito, cumpre atender.[14]
Por último, a Formalização do ato administrativo, pressuposto de validade, é
entendida como a maneira pela qual o ato deve ser externado. Enquanto forma significa a
exteriorização, a formalização significa o modo específico, o modo próprio desta
exteriorização.[15]
Veja-se que o ato administrativo sempre terá uma forma (elemento), independentemente da
sua previsão legal, enquanto que a sua formalização (pressuposto de validade) deverá ser
aquela prevista em lei.
Normalmente a formalização é escrita, entretanto podem ocorrer atos
administrativos verbais, como, por exemplo, a ordem do guarda de trânsito que determina o
“pare”.
Aspectos irrelevantes na formalização do ato não têm o condão de invalidá-lo, como
vêm entendendo a doutrina e jurisprudência.
A finalidade da formalização é padronizar ou uniformizar o instrumento de
veiculação de distintos atos administrativos, prevendo-se quais são exteriorizados por
portarias, decretos e etc..
Em síntese, estes são os elementos e pressupostos do ato administrativo.
3. Análise de um caso concreto
6. Como último tópico da explanação, segue análise e identificação dos elementos e
pressupostos do seguinte caso concreto: Ato administrativo que demite servidor público
acusado de improbidade administrativa.
1 – É conteúdo do ato administrativo de demissão, como elemento: a decisão,
constante no ato administrativo, de demissão do servidor acusado de improbidade
administrativa;
2 – É forma do ato administrativo de demissão, na condição de elemento: o decreto
de demissão, na forma prevista em lei;
3 – É objeto do ato administrativo de demissão, na condição de pressuposto de
existência: a possibilidade fática, e também jurídica, de demissão de servidor público em
efetivo cumprimento das atribuições do cargo, por ter ele praticado ato de improbidade
administrativa;
4 – É sujeito do ato, na condição de pressuposto de validade: o agente competente
para emanação do decreto de demissão, a mais alta autoridade do ente administrativo ao
qual pertence o servidor demitido. No caso de decreto municipal, a mais alta autoridade é o
Prefeito;
5 – É motivo do ato de demissão, na condição também de pressuposto de validade:
o pressuposto de fato, sendo no caso em análise a infração cometida pelo agente
administrativo que resulta em ato de improbidade; bem como o pressuposto de direito, que
prevê sanção administrativa de demissão para o que aconteceu no mundo dos fatos;
6 – São requisitos procedimentais do ato de demissão, na condição também de
pressuposto de validade: processo administrativo disciplinar prévio, para garantir-se o
devido processo legal, na forma estabelecida em lei;
7 - É finalidade do ato de demissão, como pressuposto de validade: a punição do
servidor que cometeu o ato punível em lei.
8 – É causa do ato administrativo ora em comento, como pressuposto de validade: a
ligação lógica entre a prática do ato de improbidade administrativa com a compatível e
razoável pena de demissão;
9 – É formalização do ato administrativo de demissão, como pressuposto de
validade: a previsão de que o ato de demissão deve ocorrer mediante decreto.
4. Conclusão
7. O texto trata dos elementos e pressupostos dos atos administrativos de forma
sintetizada.
Seu principal objetivo é dar subsídios mínimos para a análise de um caso concreto, de
modo a identificar e individualizar elementos e pressupostos, de suma importância para
aquele que trabalha ou estuda o Direito Administrativo.
Independentemente da classificação ora adotada, necessária é a identificação dos
elementos e pressupostos do ato administrativo para qualquer impugnação da sua validade
ou existência.
-------------------------------------------------------------------------------[1]
MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22a., São
Paulo – SP, Editora Malheiros, 2007, p. 370.
[2]
OLIVEIRA. Régis Fernandes de. Ato Administrativo. 5a. ed. , São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2007, p. 73.
[3]
Idem nota 1, p. 374.
[4]
Idem nota 1, p. 375-375.
[5]
Idem nota 1, p. 376
[6]
Idem nota 2, p. 80.
[7] Idem nota 1, p. 377.
[8]
Idem nota 1, p. 378.
[9]
Idem.
[10] Idem nota 1, p. 380.
[11] Idem nota 1, p. 386.
[12] BRÁS. Petrônio. Tratado de Direito Municipal – Volume I – Direito Administrativo,
Administração Pública e Direito Municipal. 2ª ed., Editora Mundo Jurídico: Leme – SP,
2007, p. 208.
[13] Idem nota 1, p. 390.
8. [14] Idem nota 1, p. 391.
[15] Idem nota 1, p. 394.
*Advogada
Disponível
em:
<
http://www.direitopositivo.com.br/modules.php?name=Juridico&file=display&jid=79
>. Acesso em: 23 ago. 2007.