Coletânea de textos realizada a partir de um concurso cultural solidário (desde 2011). Atividade atrelada ao Sarau AfroBiblioBrasileiro, criado pelo Projeto OFICINATIVA e pela BiblioEquipe do CEU 3 Pontes.
2. Texto da primeira
publicação AfroPoemas, em
novembro de 2011
(ainda atual):
“É crescente a necessidade
de falar sobre temáticas
sociais que ainda hoje são
nós pessoais e coletivos na
constituição psicológica de
nossa nação. E se
conseguimos fazê-lo por
caminhos artísticos /
poéticos, acreditamos que
tais debates e reflexões
podem experimentar
processos e resultados
impressionantes. Essa foi
justamente a proposta do
concurso solidário
AfroPoemas e agora
apresentamos a publicação
que nos dá muito orgulho.
E certamente vontade de
fazer outras...”
A partir de agora, estamos em
estado permanente de
CONFLUÊNCIA
AFROPINDORÂMICA e de
BIOINTERAÇÃO
CONTRACOLONIAL em
relação ao EURO CRISTÃO
MONOTEÍSTA nesse INÍCIO
– MEIO – INÍCIO,
sempre afropoétic@s…
Eterno AXÉ Nego Bispo
Odé
19
uma produção / publicação:
Demoramos um pouco para chegar
à potente e necessária obra do
quilombola e pensador Antônio
Bispo dos Santos - uma obra
reflexiva, política, educativa e
poética. Mas como ele mesmo
gostava de pontuar: “enquanto
falarem de mim, eu estarei vivo /
presente”. Aqui na AfroEscola
certamente falaremos muito do
senhor, por muitos e muitos
tempos, grande Mestre…
Nego Bispo
1959 - 2023
VIVAS,
VIVAS!!!
3. 3
18
- Ananse
- Fabi Menassi
- Maria Dias
- Odé
Publicação inspirada /
provocada pela obra de
Nego Bispo
Cabelos
Cabelo de branca é liso, Cabelo de branca balança
Cabelo de branca escova, Cabelo de branca faz
prancha
Cabelo de branca é bonito, Mas não enrola nem
segura trança
Cabelo de nega alisa, Cabelo de nega balança
Cabelo de nega enrola, Cabelo de nega entrança
Por que essa nega é faiçola? Porque seu cabelo
entrança e enrola
A branca sambando rebola, A nega sambando faz
ginga
A branca rezando é devota, A nega rezando faz
mandinga
A branca escrevendo explica, A negra falando
ensina
Eu vi essa branca no shopping, Eu vi essa nega
na feira
A branca olhando é charmosa, A nega olhando
faceira
Da branca eu sinto saudades, Da nega eu sinto
banzeira
Nego Bispo
4. AGORA É LEI
Dá cadeia para quem me chamar de
negro analfabeto
Só não dá cadeia para quem impõe o
analfabetismo,
obstruindo meu acesso às escolas
Dá cadeia para quem me chamar de
negro burro
Só não dá cadeia para quem me
chamar de “moreno”,
Mesmo sabendo que com isso querem
me transformar em um híbrido
E assim como aos burros, negar as
condições de reprodução da minha
raça
Nego Bispo
4
5. JONGAR
Religiosamente jonguei cedo eu
as noites herdadas do oral
como jongas tu cada episódio
que aperta, arrocha a corda colonial
e jongará sempre à roda uma mestra
ele e você e ela...
Filhas, netos, jongávamos nós
confluindo nas festas lutas tantas
fogueira chovida de terreiros ardidos
jongais vós memórias bantas
seguem em ritmo rito, tod@s jongarão
eles e vocês e elas...
Odé
Ancestralidade
Conexão ancestral,
Sabedoria,
Identidade,
Pertencimento,
Saúde.
Reconhecer os que vieram
Antes de nós
Honrar os ancestrais
É a vida em sua plenitude!
Ensina sobre nós
Revisitar o passado,
Ressignificar o presente
E construir um futuro
Saudável
Potente Fabi
Menassi
5
16
6. Aiii, a negrura
grandeza em fissura
potência à lonjura
lhe dizem feiura
ou mística (im)pura
a milenar andadura
nossa eminente cura
existencial aventura
saber de fundura
que protege da agrura
ancestral armadura
contrasta a brancura
em inteligência e altura
nobreza, lisura
certeza que dura
ódio não perfura
enrijece a estrutura
intacto à ranhura
é espaço e largura
guerra em ternura
paz de sempre tortura
Aiii, a negrura!!!
Negros da Capital
No metrô dentro
Da composição
Grupo de dança
Necessitados pedindo ajuda
O homem desabafando
Da força policial
Nos carros de aplicativo
Nas enfermarias
Na faxina
Na guarda
Enfim situações mal remuneradas
A sobrevivência
Que determina
Extermina
A essência
Colonização, patrão
Fabi
Menassi
15
6
Odé
7. Natureza
Terra,
que dela provém alimento, fruto
para o corpo e a alma
Um banho de folha
mar, cachoeira
para saudar os guardiões do universo
Saúdo os meus ancestrais
que estiveram antes de mim
me nutro com a terra em minhas mãos
Pássaro com seu canto
pela manhã e ao anoitecer
que vem me dar um boa noite
e até amanhã
com as fases da Lua
nos lembrando dos ciclos
Maria Dias
14
8. Angola desfeita
muxiba, respeita
mancha de outra seita
hum-hum...
Nkisi largado
preto desbotado
tumbeiro apertado
hum-hum...
De sonho banguela
colher e gamela
cravo, sal, canela
hum-hum...
Odé
13
Recorro aos meus bantos
revivo seus cantos
não confundo os santos
hum-hum...
Quilombola já ginga
Bimba é mandinga
pena de quem xinga
hum-hum...
Nenê que afronta
amontoa e desmonta
Zambi sempre apronta
hum-hum...
9. Fogo!... Queimaram Palmares,
Nasceu Canudos.
Fogo!... Queimaram Canudos,
Nasceu Caldeirões.
Fogo!... Queimaram Caldeirões,
Nasceu Pau de Colher.
Fogo!... Queimaram Pau de Colher...
E nasceram, e nascerão tantas outras comunidades
que os vão cansar se continuarem queimando
Porque mesmo que queimem a escrita,
Não queimarão a oralidade.
Mesmo que queimem os símbolos,
Não queimarão os significados.
Mesmo queimando o nosso povo,
Não queimarão a ancestralidade.
Nego Bispo
Solidão
Ser mulher,
mãe solo que falta apoio
de várias maneiras,
Crianças pretas que precisam de colo
abraço singelo,
Mães que necessitam
de uma rede de apoio
com trocas sinceras,
quando hei de ver os meus lutando
por dias melhores
RACISTAS NÃO PASSARÃO...
Maria Dias
9
12
10. Ananse
11
10
Minha avó por parte de pai
Falava de benzimentos, banhos,
orações e orixás
Meu avô trabalhava em nosso prol…
Varrendo rua, levantando poeira…
Falando cantigas, de sol a sol
Que aprendeu na capoeira
Minha avó por parte de mãe
Vendia salgados e fazia bolos de mandioca
Para mim, deliciosas tapiocas
Meu avô, mascate: feirante, ambulante…
Trabalhava com qualquer coisa honesta e relevante
Sambista de primeira
Morreu sem ver um desfile
de perto da escola Mangueira
O que aprendi com eles: Nada!
Porque tudo isso acima
são histórias inventadas
Pequenos fragmentos de histórias
que meus avós nunca contaram…
Ou são o que o espiral ancestral
me revelaram…
Sonhei com um pássaro,
corpo preto como a noite
Pescoço voltado para trás
Representa quem lutou contra os açoites
Pretos e pretas e indígenas,
meus ancestrais
Sankofa, falou:
As histórias dos que vieram antes,
não morre jamais…
- Acorda menina, Cangoma ecoou!
Escreve o que sente na alma dos que aqui jaz…
- Revela para o mundo! E depois disso, ele voou…
ADINKRA