1. O Brasil antes da Semana de Arte Moderna
O início do século XX
Editora
Abril
2. O Brasil antes da Semana de Arte Moderna
• A vida brasileira e os acontecimentos políticos e sociais do início do século XX foram
retratados em inúmeros jornais, revistas e semanários.
• Desenvolvimento da imprensa no Brasil: em 14 de fevereiro de 1837 foi publicada a
primeira charge na imprensa brasileira. Charges e caricaturas fizeram história no Segundo
Império e após a proclamação da República e sua trajetória está ligada ao desenvolvimento
da imprensa no Brasil.
Benedito Bastos Barreto, o Belmonte (1896-1947), foi um
dos principais chargistas da primeira metade do século XX
e ilustrou vários livros de Monteiro Lobato.
Charge de Belmonte publicada em "Caricatura dos Tempos",
da Melhoramentos, São Paulo, 1948. c) Coleção particular,
São Paulo - cortesia de Aloísio José Rosa Jr.
Coleção
Particular
3. Que país é este?
• A busca de uma resposta a essa pergunta marcou a arte brasileira do século XX e perdura
até hoje.
• Já no Pré-Modernismo (1902-1922) percebia-se a preocupação de alguns autores em
denunciar a realidade brasileira, descortinando um Brasil não oficial, dos marginalizados,
desde o sertão nordestino até os subúrbios cariocas, passando pelas áreas rurais do estado
de São Paulo.
• Os primeiros autores a negar o Brasil idealizado pelos autores românticos, buscando
entender o país foram:
Euclides da Cunha (em Os Sertões, 1902) – Relato da Revolta de Canudos em que
mostra os contrastes entre o Brasil europeizado e aquele do sertão nordestino;
Lima Barreto (em Triste fim de Policarpo Quaresma, 1911) – Discute o nacionalismo,
faz críticas à sociedade e ao positivismo;
Monteiro Lobato – Intelectual que atuou em várias frentes, sempre buscando entender
o país; produziu literatura adulta e infantil e criou personagens como Jeca Tatu e Emília.
• A partir da Semana de Arte Moderna, as discussões sobre a realidade brasileira se
intensificaram, tomaram novos rumos e criaram uma sequência de estilos de época.
O Brasil antes da Semana de Arte Moderna
4. O Brasil antes da Semana de Arte Moderna
• Em 1893, parte da Marinha brasileira se
rebelou contra o governo de Floriano Peixoto,
questionando sua legalidade. A Revolta
também refletia uma disputa entre o Exército e
a Marinha.
• Os revoltosos se organizaram no sul e
dirigiram-se à Baía de Guanabara, apontando
seus canhões para a Capital Federal.
• A Revolta da Armada terminou com a vitória do
governo federal, em agosto de 1895, e forma o
pano de fundo do romance Triste fim de
Policarpo Quaresma, de Lima Barreto (1911).
A Guerra de Canudos
• Em 1896, em um arraial no norte da Bahia,
viviam cerca de 25 mil pessoas lideradas por
Antônio Conselheiro, beato que fazia pregações
que concorriam com a Igreja tradicional,
arregimentava a mão de obra de fazendeiros e, por
não entender a separação entre Igreja e Estado,
aprovada na Constituição de 1891, atacava a
República.
• A repressão, estimulada por fazendeiros e religiosos,
partiu do governo baiano, que teve suas forças
derrotadas. Entendido como “foco monarquista”, o
ocorrido ganhou contorno federal e tropas do
Exército intervieram; também foram
derrotadas.
• Na expedição final, em 1897, tropas federais com
mais de 10 mil homens destruíram o arraial e
degolaram os prisioneiros. Até hoje não se sabe
ao certo o número de mortos nos combates de
Canudos.
A jovem República e seus conflitos
A Revolta da Armada
5. O Brasil antes da Semana de Arte Moderna
Então o sertão virará praia e a praia virará sertão.
Profecia de Antônio Conselheiro, escrita em um pequeno
caderno encontrado em Canudos
E o sertão vai virá mar e o mar virá sertão
o homem não pode ser escravo do homem
o homem tem que deixá as terra que não é dele
e buscá as terra verde do céu
quem é pobre vai ficá rico no lado de Deus
e quem é rico vai ficá pobre nas profunda do
inferno.
Profecia do beato Sebastião, personagem do filme Deus e o Diabo na Terra do Sol,
de Gláuber Rocha, inspirado na figura de Antônio Conselheiro.
O Homem chega e já desfaz a Natureza
Tira a gente põe represa, diz que tudo vai mudar
O São Francisco lá pra cima da Bahia
Diz que dia menos dia vai subir bem devagar
E passo a passo vai cumprindo a profecia do beato que dizia
Que o sertão ia alagar
O sertão vai virar mar, dá no coração
O medo que algum dia o mar também vire sertão
Vai virar mar, dá no coração
O medo que algum dia o mar também vire sertão
Sá & Guarabyra. “Sobradinho”. In: 10 anos juntos (CD). Sony & BMG, 1995. Disponível em:
<www.mpbnet.com.br/musicos/sa.guarabyra/index.html>. Acesso em: dez. 2010.
Hoje, passados mais de 100 anos do episódio de Canudos, o sertão
virou mar: ruínas do arraial de Canudos no fundo do açude de
Cocorobó (Parque Estadual de Canudos, Euclides da Cunha, BA). Para
reforçar a profecia do beato, outra região do sertão baiano virou mar.
No vale do rio São Francisco foi construída a barragem de Sobradinho,
deixando submersas várias cidades. Esse fato inspirou a música da
dupla Sá & Guarabyra.
Parque
Estadual
de
Canudos,
Euclides
da
Cunha,
BA.
Editora
Abril
6. O Brasil antes da Semana de Arte Moderna
A Revolta da Vacina
• Em 1904, no Rio de Janeiro, o prefeito resolveu
reurbanizar a cidade, promovendo inúmeras
desapropriações; o sanitarista Oswaldo Cruz
iniciou uma campanha de vacinação
obrigatória, tentando combater a febre
amarela e a varíola
• A população, contrariada com as obras e
influenciada pelos opositores a respeito da
vacina (pois não sabiam exatamente do que se
tratava), transformou Oswaldo Cruz em vilão e
iniciou uma revolta que durou quatro dias.
A Revolta da Chibata
• Em 22 de novembro de 1910, na Capital
Federal, um marinheiro foi condenado a
receber 250 chibatadas.
• Comandados por João Cândido, o “Almirante
Negro”, os marinheiros se rebelaram, tomaram
vários navios e apontaram os canhões para o
Rio de Janeiro.
• Houve vários marinheiros mortos, mas deu-se
fim aos castigos corporais.
Caricatura de Oswaldo Cruz na
capa da Revista da Semana, de
autoria de Amaro (1904).
Coleção Particular
Coleção
Particular
7. O Brasil antes da Semana de Arte Moderna
FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Edusp, 1996.
As greves proletárias urbanas
A greve de 1917
O crescimento das cidades e a diversificação de
suas atividades foram os requisitos mínimos de
constituição de um movimento da classe
trabalhadora. As cidades concentraram fábricas e
serviços, reunindo centenas de trabalhadores que
participavam de uma condição comum.
Entre 1917 e 1920, um ciclo de greves de grandes
proporções surgiu nas principais cidades do país,
especialmente Rio de Janeiro e São Paulo. [...]
Dentre as três greves gerais do período, a de
junho/julho de 1917 em São Paulo permaneceu
mais forte na memória histórica. Começando por
duas fábricas têxteis, ela abrangeu praticamente
toda a classe trabalhadora da cidade, em um total
de 50 mil pessoas. Durante alguns dias, os bairros
operários do Brás, da Mooca e do Ipiranga
estiveram em mãos dos grevistas.
8. Características comuns às obras pré-modernistas
• Denúncia da realidade brasileira – nega-se o Romantismo e o Parnasianismo e
apresenta-se o Brasil não oficial (do sertão nordestino, dos caboclos interioranos, dos
subúrbios).
• Regionalismo – monta-se um painel brasileiro: o Norte e o Nordeste com Euclides da
Cunha; o Vale do Paraíba e o interior paulista com Monteiro Lobato; o Espírito Santo com
Graça Aranha; o subúrbio carioca com Lima Barreto.
• Tipos humanos marginalizados – o sertanejo nordestino, o caipira, os funcionários
públicos, os mulatos.
• Ligação com fatos políticos, econômicos e sociais contemporâneos – diminui a
distância entre a realidade e a ficção: Triste fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto
(que retrata o governo de Floriano e a Revolta da Armada), Os Sertões, de Euclides da
Cunha (um relato da Guerra de Canudos), Cidades mortas, de Monteiro Lobato (que mostra
a passagem do café pelo Vale do Paraíba paulista).
• Ruptura com o passado – há certo caráter inovador em determinadas obras, como na
linguagem de Augusto dos Anjos, que afronta a poesia parnasiana com palavras “não
poéticas”.
O Brasil antes da Semana de Arte Moderna
9. Produção literária
aproximadamente 25 mil pessoas no interior
baiano. Se, a princípio, Euclides pretendia apenas
fazer um relato da luta, acabou realizando um
verdadeiro painel do sertão nordestino.
Euclides da Cunha: a denúncia de um crime
• Embora apresente uma visão de mundo
determinista, cientificista e naturalista, Euclides da
Cunha é considerado pré-modernista pela denúncia
que faz da realidade brasileira, trazendo à luz as
verdadeiras condições de vida do Nordeste
brasileiro.
• Sua obra trata da Campanha de Canudos,
contrastando o Brasil “que vive parasitariamente à
beira do Atlântico” e aquele dos “extraordinários
patrícios” do sertão nordestinoAssim que pisou o
solo baiano, Euclides da Cunha percebeu que não
se tratava de uma luta por um sistema de governo,
mas sim contra uma estrutura que já se arrastava
por três séculos.
• Outra denúncia do livro é a do extermínio de
Euclides Rodrigues Pimenta da Cunha (1866-1909)
formou-se em Engenharia e fez carreira militar, ainda
nos anos finais da Monarquia. Positivista e republicano,
foi expulso do Exército; mais tarde, com a proclamação
da República, retornou para a Escola Superior de
Guerra. Em 1896, discordando dos rumos dos governos
republicanos, abandonou definitivamente a carreira
militar. Em 1897 foi enviado a Canudos como
correspondente do jornal O Estado de S. Paulo; na
volta, escreveu Os Sertões. Teve fim trágico, pois foi
assassinado por motivos nunca devidamente
esclarecidos, misturando vida pessoal e política.
O Brasil antes da Semana de Arte Moderna
Bloch
Editores
S.A,
1982
10. O Brasil antes da Semana de Arte Moderna
Euclides da Cunha: a denúncia de um crime
A obra Os Sertões é dividida em três partes:
• A terra – uma detalhada descrição da região: sua geologia, seu clima, seu relevo. Essa
parte é ilustrada por mapas do relevo e da hidrografia feitos pelo próprio autor.
• O homem – um elaborado trabalho sobre a etnologia brasileira: a ação do meio na fase
inicial da formação das raças, a gênese dos mestiços; uma brilhante análise de tipos
distintos, como o gaúcho e o jagunço; nesse cenário introduz a figura mística de Antônio
Conselheiro. Ao falar sobre o homem do sertão, Euclides da Cunha cunhou o bordão: “O
sertanejo é, antes de tudo, um forte”.
• A luta – descritos o cenário e as personagens, Euclides relata então o conflito e justifica a
luta. Seu relato do dia a dia da guerra é a denúncia de um crime.
11. O Brasil antes da Semana de Arte Moderna
tema central do livro é o nacionalismo – absurdo,
porém, honesto – de Policarpo Quaresma e também
aquele nacionalismo que se torna perigoso quando
manipulado por mãos férreas, como as do marechal
Floriano Peixoto.
• O autor critica a educação recebida pelas mulheres,
que eram preparadas apenas para o casamento (o
romancista foi uma das primeiras vozes a defender
o voto feminino); critica também a República e o
exagerado militarismo na política da época.
• T
odos os seus romances trazem um traço
autobiográfico (o do preconceito racial) e oferecem
um retrato perfeito dos subúrbios cariocas e de sua
população.
Lima Barreto: uma crítica ao nacionalismo exagerado e aos preconceitos
• Lima Barreto é considerado pré-modernista pois é
consciente de nossos verdadeiros problemas e
critica o nacionalismo ufanista do Romantismo. Seu
estilo é leve, fluente, aproximando-se da linguagem
jornalística.
• Triste fim de Policarpo Quaresma, lançado em
1911, é uma mistura de crítica, análise e humor. O
Afonso Henrique de Lima Barreto (1881-1922) era filho
de pai português e mãe escrava. Chegou a cursar
Engenharia na Escola Politécnica, mas foi obrigado a
abandoná-la para cuidar do pai, que enfrentava
distúrbios mentais. Mulato, pobre e socialista, vítima de
toda espécie de preconceitos, com o pai louco, viveu
intensamente todas as contradições do início do século
XX e passou por profundas crises depressivas.
Alcoólatra, teve passagens pelo Hospício Nacional.
Escreveu artigos para jornal em que defendia a
Revolução Russa e o voto feminino.
Reprodução,
1919
12. • Monteiro Lobato é considerado pré-modernista por
duas características de sua obra de ficção: o
regionalismo e a denúncia da realidade brasileira.
No entanto, no plano puramente estético, assumiu
posições antimodernistas.
• Como regionalista, o autor nos dá a dimensão exata
do Vale da Paraíba paulista do início do século XX:
sua decadência após a passagem da economia
cafeeira, seus costumes e sua gente.
• Nesse aspecto – a gente do Vale do Paraíba –, está
o traço mais importante de sua obra: a descrição e
a análise do tipo humano característico da região, o
caboclo Jeca Tatu.
• A literatura infantil, além de moralista e
pedagógica, trata da luta do autor pelos interesses
nacionais, com personagens representativos do
povo e o Sítio do Picapau Amarelo, que é a imagem
do próprio Brasil.
Monteiro Lobato: metáforas do Brasil
José Bento Monteiro Lobato (1882-1948), formado em
Direito, herdou uma fazenda de seu avô, localizada no Vale
do Paraíba paulista. Em 1914, cansado de enfrentar as
diversas queimadas praticadas por seus empregados, escreve
os artigos “Velha praga” e “Urupês”: nascia, assim, seu
primeiro livro e a figura simbólica de Jeca Tatu.
Foi uma figura empreendedora em todos os sentidos: fundou
a primeira editora nacional; impressionado com a importância
do petróleo, fundou o Sindicato do Ferro e a Companhia
Petróleos do Brasil e se dedicou à exploração mineral; criticou
violentamente a política de exploração mineral do governo
Getúlio Vargas, o que lhe valeu a prisão e o exílio na
Argentina.
Produziu abundante literatura tanto para o público adulto
como para o infantil e sua obra traz geniais metáforas do
Brasil.
O Brasil antes da Semana de Arte Moderna
Reprodução
13. O Brasil antes da Semana de Arte Moderna
Augusto dos Anjos: palavras antipoéticas
• Augusto dos Anjos utilizou imagens e palavras
antipoéticas para nos transmitir sua visão de
mundo. O poeta rompeu os limites estéticos do belo
e do feio, em uma postura característica dos
expressionistas.
• O que mais aproximou o poeta dos leitores foi
exatamente seu pessimismo, sua angústia em face
aos problemas e distúrbios pessoais, bem como das
incertezas do novo século que despontava, trazendo
consigo a ameaça de uma guerra mundial. Por isso
impregna constantemente sua obra a morte e,
depois dela, a desintegração, os vermes apenas.
Augusto Carvalho Rodrigues dos Anjos (1884-1914),
filho de uma família de proprietários de engenho, na
Paraíba, assistiu à decadência da antiga estrutura
latifundiária. Formado em Direito, dedicou-se ao
magistério em Recife e, depois, no Rio de Janeiro. Aos
28 anos publicou Eu, seu único volume de poesias.
Faleceu dois anos depois.
Bloch
Editores,
1982
14. O Brasil antes da Semana de Arte Moderna
Augusto dos Anjos: palavras antipoéticas
Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.
Profundíssimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.
Já o verme – este operário das ruínas –
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,
Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!
Psicologia de um vencido.
E, em vez de achar a luz que os Céus inflama,
Somente achei moléculas de lama
E a mosca alegre da putrefação!
Idealização da humanidade futura.
Ah! Para ele é que a carne podre fica,
E no inventário da matéria rica
Cabe aos seus filhos a maior porção!
O Deus-Verme.
A obra de Augusto dos Anjos está disponível em:
<www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000054.pdf>.
Acesso em: mar. 2010.