Este documento discute como a personalidade influencia a adaptação dos adolescentes no contexto escolar. Os autores analisaram os resultados de 351 estudantes no MMPI-A e em um questionário sobre a vida escolar. Eles encontraram que dimensões como desinibição, neuroticismo e introversão estavam associadas a problemas de comportamento e desempenho escolar. O MMPI-A mostrou ser útil para identificar características de personalidade ligadas à adaptação dos adolescentes no ambiente escolar.
Relação entre personalidade e adaptação escolar dos adolescentes
1. O MMPI-A na Compreensão do Comportamento Adaptativo na
Adolescência
Renato Gomes Carvalho & Rosa Ferreira Novo
Centro de Investigação em Psicologia, Universidade de Lisboa, Portugal
Resumo
Neste trabalho, sistematizamos os principais resultados de uma investigação, composta por
vários estudos, em que analisámos a relação entre a organização da personalidade e a
adaptação dos adolescentes aos seus contextos de vida, nomeadamente o escolar. Para tal,
além de um questionário sobre a vida escolar, utilizámos a versão experimental portuguesa
do Inventário Multifásico da Personalidade de Minnesota – Adolescente (MMPI-A), um
instrumento de auto-relato de avaliação da personalidade e da psicopatologia adolescente, e
que se encontra em fase de aferição para a população portuguesa. A amostra foi constituída
por 351 estudantes, com idades entre os 14 e os 18 anos. As análises efetuadas aos
resultados das escalas clínicas (básicas) e às de personalidade (PSY-5) do Inventário
permitem identificar características reveladoras do padrão de adaptação dos adolescentes
ao contexto escolar. Entre as dimensões mais explicativas da variância dos resultados,
destacam-se as características da personalidade associadas ao controlo e gestão dos
impulsos, à emocionalidade positiva e ao desejo de envolvimento social. Os resultados são
analisados tendo em conta a influência da personalidade na capacidade de resposta dos
jovens aos desafios da adolescência. É ainda considerada a relevância do MMPI-A na
avaliação na identificação de sinais de vulnerabilidade à psicopatologia por parte de jovens
que apresentam dificuldades adaptativas.
Palavras-chave: Personalidade; adolescência; percurso escolar; MMPI-A
Abstract
In this paper, we present the main results of a research in which we analysed the
relationship between personality organisation and adolescents’ adaptation to their life
contexts, namely school. The sample involved 351 students, aged 14 to 18 years. Instruments
were the Portuguese experimental version of the Minnesota Multiphasic Personality
Inventory – Adolescent, a self-report personality and psychopathology assessment
instrument, and a survey on school life that included several domains. The analyses carried
out on the results of clinical (basic) and personality scales (PSY-5) of the Inventory allow the
identification of characteristics revealing the pattern of adolescents’ adaptation in the school
context. Among the dimensions more explanatory of the results variance, we highlight the
personality characteristics associated with self-control and impulse management, positive
emotionality, and desire for social involvement. Results are analyzed taking into account the
influence of personality on adolescents’ ability to deal with the challenges of this
developmental period. It is still considered the relevance of the MMPI-A in identifying and
assessing signs of vulnerability to psychopathology in youngsters who present adaptive
difficulties.
Keywords: Personality; adolescence; school pathway; MMPI-A
2. Introdução
A adolescência corresponde a um dos períodos mais significativos do desenvolvimento humano.
A coincidência entre, por um lado, os anos de reorganização e de transformação física e
psicossocial que marcam a adolescência e, por outro, uma intensificação de desafios e exigências
de auto-regulação, típicos dos vários contextos em que os adolescentes se integram, em que se
inclui o escolar, faz com que seja importante compreender o modo como se desenha o processo
de adaptação dos adolescentes a este e identificar potenciais factores de risco e de protecção
(Cicchetti & Cohen, 2006). Uma vez que a diversidade de domínios e tarefas associadas ao
percurso escolar na adolescência exige uma capacidade de organização e de gestão dos próprios
recursos psicológicos, podemos perspectivar a personalidade, enquanto organização dinâmica
dos sistemas físicos e psicológicos que está subjacentes aos padrões de acção, pensamento e
sentimento do indivíduo (Allport, 1961), como um factor central na construção de trajectórias
de desenvolvimento geradoras de bem-estar para o indivíduo (Cicchetti & Rogosch, 2002). De
facto, a investigação tem vindo a evidenciar a importância da personalidade para o modo como
os adolescentes se adaptam aos desafios do desenvolvimento, sendo assinaladas relações
significativas entre dimensões estruturais/traços (e.g., conscienciosidade) e motivacionais (e.g.,
perspectiva temporal de futuro) de personalidade e a adaptabilidade dos padrões de
comportamento dos indivíduos em diversos contextos (Carvalho & Novo, 2014; Caspi & Shiner,
2006). Numa perspectiva desenvolvimentista e do ciclo de vida, a capacidade de integração
entre a individualidade e a inter-relação (Novo, 2003) corresponde a uma tarefa central para a
geração de condições de maior adaptabilidade e bem-estar psicológico para os indivíduos.
Face à importância que a personalidade assume na definição de trajectórias de desenvolvimento
na adolescência, do ponto de vista da ciência psicológica e particularmente da avaliação, assume
especial relevo a identificação de estratégias e instrumentos que permitam a compreensão da
complexidade do funcionamento e dos padrões de comportamento dos jovens, isto é, há a
necessidade de adequar as práticas de avaliação a esta fase do desenvolvimento, não sendo
assumida apenas uma lógica descritiva e de diagnóstico de potenciais perturbações já existentes,
mas também de identificação de adolescentes em situações de vulnerabilidade. Trata-se, em
suma, no quadro da avaliação psicológica, de promover a compreensão do funcionamento dos
indivíduos e de prevenir o desenvolvimento de trajectórias “sub-ideais” (Steinberg, 2005).
No presente trabalho, apresentamos os resultados obtidos numa investigação em que utilizámos
a versão experimental portuguesa do Minnesota Multiphasic Personality Inventory – Adolescent
(Butcher et al, 1992; Silva, Novo; Prazeres, & Pires, 2006), e na qual procurámos analisar a sua
eficácia na identificação de relações entre dimensões da personalidade e da psicopatologia e
padrões de comportamento em contexto escolar, bem como compreender em que medida a
prova é eficaz na identificação de diferentes situações de potencial vulnerabilidade.
Metodologia
Participantes
A amostra foi constituída por 351 estudantes portugueses (212 do sexo feminino, cerca de 60%),
a frequentarem o ensino básico (9º ano; n = 123), secundário (n = 202) e profissional (n = 26). A
3. maioria dos estudantes residia em áreas rurais (n = 223, 64%) e as suas idades encontravam-se
compreendidas entre os 14 e os 18 anos (MIdade = 16 anos; DP = 1.4).
Instrumentos
Minnesota Multiphasic Personality Inventory – Adolescent (MMPI-A). Utilizámos a versão
portuguesa do MMPI-A, um inventário de auto-relato de avaliação da personalidade e da
psicopatologia, constituído por 478 itens. Neste estudo, os resultados do MMPI-A são
considerados em dois níveis de análise. O primeiro corresponde às dimensões PSY-5 (McNulty,
Harkness, Ben-Porath, & Williams, 1997), um modelo descritivo e dimensional da personalidade,
baseado num sistema conceptual de cinco factores principais (Archer, 2005), em que se incluem
a Agressividade (20 itens; α de Cronbach com os resultados da presente amostra: .729), o
Psicoticismo (21 itens; α = .728), a Desinibição (24 itens; α = .721), que se relaciona com a
tendência para acções impulsivas e dificuldades no auto-controlo, o Neuroticismo (22 itens; α =
.739) e a Introversão (22 itens; α = .739), que reflecte baixa emocionalidade positiva e ausência
de energia para o envolvimento em actividades (low drive) e relações sociais. O segundo nível de
análise dos resultados do MMPI-A inclui as escalas básicas, nomeadamente as escalas de
validade e atitude de resposta (VRIN, TRIN, F-Infrequency, L-Lie, K-Defensividade) e as escalas
clínicas: Hs-Hipocondria, D-Depressão, Hy-Histeria, Pd-Desvio Psicopático, Mf-Masculinidade-
Feminilidade, Pa-Paranóia, Pt-Psicastenia, Sc-Esquizofrenia, Ma-Hipomania, Si-Introversão
Social. Estas escalas correspondem ao perfil clínico de MMPI-A, cuja análise permite a
identificação de atitudes na resposta à prova e a conceptualização dos casos e da natureza das
dificuldades apresentadas pelos adolescentes.
Questionário sobre o Percurso Escolar (QPE). De forma a obter informação ampla sobre a
vida escolar dos adolescentes, construímos um questionário de auto-relato que foca diversas
dimensões da vida escolar, nomeadamente o desempenho, que inclui a percepção dos
adolescentes acerca do seu trabalho, progressão escolar, métodos de estudo e cumprimento de
tarefas escolares (8 itens; α de Cronbach = .737); adaptação a transições escolares, isto é, a
adaptação a mudanças de escola e de ano (6 itens; α = .842); problemas de comportamento,
nomeadamente comportamentos disruptivos, de passagem ao acto e de indisciplina (10 itens; α
= .845); comportamentos de risco, incluindo comportamentos sexuais de risco, abuso de
substância e problemas ao nível do comportamento alimentar (11 itens; α = .763); dificuldades
interpessoais, incluindo conflitos, percepção de falta de apoio social, isolamento social (11 itens;
α = .729); participação em actividades extracurriculares (7 itens; α = .841); e satisfação global
com a vida escolar, que correspondeu a uma avaliação subjectiva global sobre o percurso de vida
na escola e a um sentimento de realização ou de sucesso (9 itens; α = .750).
Procedimentos
Os instrumentos foram aplicados em dois momentos e em contexto de grupo, em sala de aula,
após consentimento informado dos adolescentes e respectivos encarregados de educação. O QPE
foi aplicado na primeira sessão e o MMPI-A (versão caderno) na segunda. Após a recolha de
dados, efectuou-se uma leitura óptica dos protocolos de MMPI-A, tendo os dados sido
transferidos para uma base de dados SPSS, a qual foi depois completada com os dados dos
restantes questionários. Os protocolos de MMPI-A foram escrutinados relativamente aos
indicadores de validade e consistência de resposta. Não estavam identificados previamente
4. casos de psicopatologia na amostra. Esta investigação é de natureza quantitativa e inscreve-se
numa metodologia diferencial, em que utilizamos análises de correlações e análises
multivariadas de variância para verificar a relação entre as dimensões PSY-5 e as dimensões da
vida escolar, bem como para diferenciar os participantes relativamente às dimensões PSY-5 e
escalas básicas do MMPI-A.
Resultados
Personalidade e Vida Escolar
Começamos por analisar a relação entre a personalidade e a psicopatologia, expressa nas
dimensões PSY-5 do MMPI-A, e o modo como os adolescentes vivenciam o seu percurso escolar,
operacionalizado em diversos indicadores de desempenho, integração social e satisfação.
Procurámos, numa análise global, identificar as dimensões estruturais da personalidade, isto é,
as de primeiro nível no modelo de McAdams e colaborares (McAdams, 1997; McAdams & Olson,
2010), que indiciam um valor psicopatológico e a sua potencial associação a marcadores
específicos do percurso escolar dos adolescentes. No Quadro 1 apresentamos as correlações
obtidas, cuja maioria é significativa e moderada e que configuram uma associação entre
personalidade e variáveis escolares.
Quadro 1
Coeficientes de Correlação de Pearson Entre as Dimensões PSY-5 e as Variáveis Escolares,
por Sexo
Variável AGGR PSYC DISC NEGE INTR
Feminino
Desempenho Escolar -.259** -.202** -.264** -.170* -.197**
Transições Escolares -.089 -.115 -.088 -.169* -.215**
Problemas Comportamento .423** .262** .474** .164* -.062
Comportamentos de Risco .327** .317** .472** .286** .014
Dificuldades Interpessoais .275** .299** .171* .206** .325**
Actividades Extracurriculares -.013 .074 -.067 -.044 -.302**
Balanço do Percurso Escolar -.391** -.258** -.357** -.280** -.256**
Masculino
Desempenho Escolar -.279** -.320** -.348** -.249** -.228**
Transições Escolares -.132 -.203* .030 -.211* .001
Problemas Comportamento .354** .190* .478** .114 .028
Comportamentos de Risco .056 .097 .384** .000 -.021
Dificuldades Interpessoais .314** .399** .180* .289** .261**
Actividades Extracurriculares -.160 -.166 -.134 -.092 -.247**
Balanço do Percurso Escolar -.232** -.349** -.349** -.270** -.283**
Nota. AGG – Agressividade; PSYC – Psicoticismo; DISC – Desinibição; NEGE – Neuroticismo; INTR
– Introversão. *p < .05. **p < .01.
Numa análise de regressão com selecção stepwise, por sexo, identificamos modelos significativos
de predição dos resultados das variáveis escolares em função das dimensões da personalidade.
No caso do balanço do percurso escolar, foram preditores as dimensões Agressividade,
Introversão e Desinibição, num modelo significativo para o sexo feminino, F(3,208) = 21.33, p <
.001, R² = .24, e as dimensões Desinibição, Psicoticismo e Introversão para o sexo masculino,
F(3,135) = 13.64, p < .001, R² = .23. No que concerne aos indicadores específicos de inserção na vida
escolar, verificamos que a personalidade contribui para a explicação da variabilidade dos
5. problemas de comportamento e dos comportamentos de risco. No sexo feminino, as dimensões
Desinibição e Agressividade contribuem para a obtenção de um modelo significativo de predição
dos problemas de comportamento em contexto escolar, F(2,209) = 35.12, p < .001, R² = .25, ao
passo que no sexo masculino a Desinibição é, por si só, responsável pela explicação de uma
percentagem considerável da variabilidade, F(1,137) = 40.59, p < .001, R² = .23. O mesmo padrão é
observado nos comportamentos de risco, em que a Desinibição e Neuroticismo surgem como
dimensões importantes na explicação dos resultados do sexo feminino, F(2,209) = 35.36, p < .001,
R² = .25, e a Desinibição no sexo masculino, F(1,137) = 23.74, p < .001, R² = .15. Quanto às
dificuldades interpessoais, é obtido um modelo parcimonioso no qual surgem como preditores
significativos a Introversão e a Agressividade, no sexo feminino, F(2,209) = 22.59, p < .001, R² = .18,
e o Psicoticismo e a Introversão no sexo masculino, F(2,136) = 16.31, p < .001, R² = .19.
Relativamente às actividades extracurriculares, é de referir a relevância das dimensões
Introversão, Psicoticismo e Desinibição no sexo feminino, F(3,208) = 10.72, p < .001, R² = .13, e da
Introversão no sexo masculino, F(1,137) = 8.90, p = .003, R² = .06. Não obstante a reduzida
percentagem de variabilidade explicada, são também obtidos modelos significativos para as
transições escolares, em que se destacam, enquanto preditores, a Introversão no sexo feminino,
F(1,210) = 10.21, p = .002, R² = .05, e o Neuroticismo no sexo masculino, F(1,137) = 6.38, p < .001, R² =
.05. Por fim, no que respeita ao desempenho escolar, verificamos de novo a importância da
Desinibição e da Introversão na explicação da variabilidade dos resultados no sexo feminino,
F(2,209) = 12.44, p < .001, R² = .11, e da Desinibição, Psicoticismo e Introversão na explicação da
variabilidade dos resultados no sexo masculino, F(3,135) = 11.18, p < .001, R² = .20.
Dificuldades de Adaptação, Personalidade e Psicopatologia
Verificámos ainda se dificuldades adaptativas em contexto escolar, expressas em frequências
elevadas de comportamentos problemáticos de indisciplina, comportamentos de risco e
dificuldades no relacionamento interpessoal, encontram uma expressão diferenciada ao nível
das dimensões estruturais e clínicas da personalidade, nomeadamente nas dimensões PSY-5 e
no perfil clínico de MMPI-A. Partimos da hipótese que aquelas dificuldades adaptativas podem
ter subjacentes características de personalidade e que, pela sua intensidade ou frequência, terão
uma expressão no perfil de personalidade ou perfil clínico de MMPI-A. Assim, com base na
frequência reportada de problemas de comportamento, comportamentos de risco e dificuldades
interpessoais, foram criados, para cada variável, 2 grupos, um com elevada frequência daqueles
comportamentos (acima do percentil 90 da distribuição das respectivas variáveis) e outro com
os restantes estudantes.
Relativamente aos comportamentos problema, verificam-se diferenças significativas entre os
grupos nas dimensões PSY-5, F(5,343) = 7.88, p < .001, Λ de Wilks = .89, ηp
2 = .10, com uma
dimensão do efeito que podemos considerar moderada. Especificamente, as diferenças
significativas ocorrem nas dimensões Desinibição, F(1,347) = 36.69, p < .001, ηp
2 = .10,
Agressividade, F(1,347) = 21.56, p < .001, ηp
2 = .06, e Psicoticismo, F(1,347) = 7.55, p < .01, ηp
2 = .02.
Em todas as dimensões, é o grupo com maior frequência de comportamentos problema que
apresenta resultados superiores no MMPI-A. Verificamos ainda que o MMPI-A apresenta
sensibilidade na detecção daquelas dificuldades adaptativas, ainda que em contexto normal,
encontrando-se um efeito significativo da frequência de comportamentos problema nas escalas
do perfil clínico, F(15,333) = 3.29, p < .001, Λ de Wilks = .87, ηp
2 = .13. Destacam-se os resultados
superiores do grupo de maior frequência de comportamentos problema nas escalas Ma-
6. Hipomania, F(1,347) = 20.53, p < .001, ηp
2 = .06, F-Infrequency, F(1,347) = 14.92, p < .001, ηp
2 = .04,
Pd-Desvio Psicopático, F(1,347) = 12.06, p < .01, ηp
2 = .03, Sc-Esquizofrenia, F(1,347) = 11.28, p < .01,
ηp
2 = .03, Pa-Paranóia, F(1,347) = 5.07, p < .05, ηp
2 = .01, e L-Lie, , F(1,347) = 4.91, p < .05, ηp
2 = .01.
No que concerne aos comportamentos de risco, foi também possível identificar um padrão em
que os jovens que reportam maior frequência daqueles comportamentos apresentam
similarmente resultados superiores nas dimensões PSY-5 e nos resultados brutos das escalas do
perfil de MMPI-A. Verifica-se um efeito significativo, F(5,343) = 8.60, p < .001, Λ de Wilks = .89, ηp
2 =
.11, que se estende a todas as dimensões PSY-5, nomeadamente, Desinibição, F(1,347) = 30.57, p <
.001, ηp2 = .08, Psicoticismo, F(1,347) = 20.66, p < .001, ηp2 = .06, Agressividade, F(1,347) = 11.57, p <
.001, ηp
2 = .03, Neuroticismo, F(1,347) = 8.90, p < .01, ηp
2 = .03, e Introversão, F(1,347) = 5.46, p < .05,
ηp
2 = .02. Os resultados da MANOVA indicam também diferenças significativas entre os grupos de
comportamentos de risco nas escalas básicas do MMPI-A, F(15,333) = 2.27, p < .01, Λ de Wilks = .91,
ηp
2 = .09. As escalas em que essas distinções se verificam são indicadas no Quadro 2.
Por fim, no que concerne às dificuldades interpessoais, os resultados são igualmente
significativos, indicando uma relação entre esta variável e os resultados da maioria dimensões
da personalidade, F(5,343) = 5.67, p < .001, Λ de Wilks = .92, ηp
2 = .08, nomeadamente o
Psicoticismo, F(1,347) = 16.41, p < .001, ηp
2 = .05, a Introversão, F(1,347) = 14.42, p < .001, ηp
2 = .04, o
Neuroticismo, F(1,347) = 11.20, p < .01, ηp
2 = .03, e a Agressividade, F(1,347) = 6.91, p < .05, ηp
2 = .02. O
mesmo padrão é observado no perfil clínico de MMPI-A, cujos resultados brutos médios são
significativamente distintos, F(15,333) = 3.69, p < .001, Λ de Wilks = .86, ηp
2 = .14, e com efeitos
aplicáveis à generalidade das escalas, como referido no Quadro 2. São os jovens que reportam
mais dificuldades interpessoais que apresentam resultados tendencialmente superiores.
Quadro 2
Escalas do MMPI-A onde se observaram diferenças significativas entre os grupos de
comportamentos de risco e entre os grupos de dificuldades interpessoais
Comportamentos de risco Dificuldades interpessoais
Escala F(1,347) ηp
2 Escala F(1,347) ηp
2
F-Infrequency 13.92*** .04 F-Infrequency 25.85*** .07
Hs-Hipocondria 8.82** .03 K-Defensividade 7.30** .02
D-Depressão 7.26** .02 Hs-Hipocondria 27.82*** .07
Hy-Histeria 4.34* .02 D-Depressão 32.59*** .09
Pd-Desvio Psicopático 14.93*** .04 Hy-Histeria 14.63*** .04
Pa-Paranóia 13.53*** .04 Pd-Desvio Psicopático 20.49*** .06
Pt-Psicastenia 13.95*** .04 Mf-Masculinidade-Feminilidade 6.33* .02
Sc-Esquizofrenia 20.09*** .06 Pa-Paranóia 26.20*** .07
Ma-Hipomania 13.17*** .04 Pt-Psicastenia 28.07*** .08
Si-Introversão Social 6.51* .02 Sc-Esquizofrenia 38.27*** .10
Ma-Hipomania 8.19** .02
Si-Introversão Social 13.10*** .04
Nota. *p < .05; **p < .01; ***p < .001
7. Na Figura 1, apresentamos os perfis médios de resultados-T no MMPI-A dos diferentes grupos
de comportamento problema, comportamentos de risco e dificuldades interpessoais. Apesar de
se tratar de perfis médios e, nesse sentido, ser importante considerar que há variabilidade intra-
grupo, os traçados obtidos evidenciam uma distinção entre os grupos: a existência de maiores
dificuldades adaptativas reflecte-se em maior elevação na generalidade das escalas clínicas. Este
padrão é evidenciado sobretudo ao nível dos comportamentos de risco e das dificuldades
interpessoais.
Figura 1. Perfil clínico médio de MMPI-A, por grupo de comportamentos problema, comportamentos
de risco e dificuldades interpessoais. *p < .05. **p < .01. ***p < .001
8. Discussão
Com este trabalho, sistematizámos os resultados obtidos com uma investigação composta por
vários estudos e que focou a relação entre a personalidade e a adaptação ao percurso escolar na
adolescência. A análise dos resultados evidencia que a forma como a personalidade se está a
organizar constitui um importante indicador da adaptação dos adolescentes aos diferentes
contextos de desenvolvimento e apoia a ideia da personalidade enquanto conceito agregador e
de ligação entre o passado e o futuro, subjacente aos padrões de comportamento dos indivíduos.
Sublinhamos, assim, a centralidade das características individuais ao nível da personalidade em
contexto escolar e no quadro do desenvolvimento, nomeadamente na capacidade de resposta
dos jovens aos desafios da adolescência. Ao nível das dimensões estruturais da personalidade,
destacam-se as características associadas à impulsividade (controlo de impulsos, baixa aversão
ao risco, reduzida orientação para o planeamento e para o cumprimento de regras) e à
introversão/reduzida emocionalidade positiva (baixa energia para a realização de actividades,
isolamento social e insatisfação na interacção social) como aquelas que mais contribuíram para
a explicação da variabilidade dos resultados. Do ponto de vista da avaliação, verificamos ainda
que o MMPI-A é útil na demonstração da relação entre organização da personalidade e
comportamento adaptativo na adolescência, como também se configura como um instrumento
que nos oferece confiança relativamente à identificação e à análise da natureza das dificuldades
dos jovens em diferentes situações de vulnerabilidade, nomeadamente ao nível das relações
interpessoais e de padrões problemáticos de comportamento (indisciplina e comportamentos de
risco).
Tendo em conta que os jovens passam mais tempo na escola do que em qualquer outro local fora
de casa (Eccles, 2004), os resultados desta investigação, considerados numa perspectiva mais
ampla, assinalam a importância da valorização da saúde mental e da adaptação dos jovens aos
seus contextos de vida. Ao nível da prática, consideramos importante a identificação atempada
de situações de vulnerabilidade ou de risco psicopatológico, tendo em vista a avaliação
psicológica, a conceptualização das dificuldades e, no seguimento, a definição de estratégias de
intervenção, que evitem o desenvolvimento de trajectórias inadaptativas.
A realização deste trabalho incentiva, por fim, algumas propostas de investigação futura, em que
se incluem os estudos longitudinais sobre a evolução da personalidade e a sua relação com a
adaptação dos indivíduos ao longo do tempo, e de um debate sobre o modo como as práticas em
contexto escolar se poderão organizar num sentido favorável à promoção de percursos bem-
sucedidos de desenvolvimento por parte dos jovens.
Contacto para Correspondência
Renato Gomes Carvalho / Rosa Ferreira Novo
CIPUL, Faculdade de Psicologia, Universidade de Lisboa
Alameda da Universidade, 1649-103 Lisboa
Correio electrónico: renatoggc@gmail.com
9. Referências
Allport, G.W. (1961). Pattern and growth in personality. New York: Holt, Rinehart & Winston.
Archer, R.P. (2005). MMPI-A: Assessing adolescent psychopathology (3rd ed.). Mahwah, NJ:
Lawrence Erlbaum Associates.
Butcher, J.N., Williams, C.L., Graham, J.R., Archer, R.P., Tellegen, A., Ben-Porath, Y.S. & Kaemmer,
B. (1992). Minnesota Multiphasic Personality Inventory – A (MMPI-A): Manual for
administration, scoring, and interpretation. Minneapolis: University of Minnesota Press.
Carvalho, R.G., & Novo, R.F. (2014). The relationship between structural dimensions of
personality and school life in adolescence. Psicologia: Reflexão e Crítica/Psychology, 27
(2), 368-376. doi: 10.1590/1678-7153.201427218
Caspi, A. & Shiner, R.L. (2006). Personality Development. In N. Eisenberg (Ed.), Handbook of Child
Psychology, vol. 3: Social, Emotional, and Personality Development (pp. 300-365). New
York: Wiley.
Cicchetti, D., & Cohen, D.J. (2006). Developmental psychopathology: Theory and method (vol. 1, 2nd
ed.). New York: Wiley.
Cicchetti, D., & Rogosch, F. A. (2002). A developmental psychopathology perspective on
adolescence. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 70, 6-20.
Eccles, J. S. (2004). Schools, academic motivation, and stage-environment fi t. In R. M. Lerner & L.
Steinberg (Eds.), Handbook of adolescent psychology (2nd ed., pp. 125-154).Hoboken, NJ:
John Wiley & Sons.
McAdams, D.P. (1997). A conceptual history of personality psychology. In R. Hogan, J. Johnson &
S. Briggs (Eds.), Handbook of personality psychology (pp. 4-39). New York: Guilford Press.
McAdams, D.P., & Olson, B.D. (2010). Personality development: Continuity and change over the
life course. Annual Review of Psychology, 61, 517-542.
McNulty, J.L., Harkness, A.R., Ben-Porath, Y.S. & Williams, C.L. (1997). Assessing the personality
psychopathology five (PSY-5) in adolescents: New MMPI-A scales. Psychological
Assessment, 9 (3), 250-259.
Novo, R.F. (2003). Para além da Eudaimonia – O bem-estar psicológico em mulheres na idade
adulta avançada. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian/Fundação para a Ciência e a
Tecnologia.
Silva, D., Novo, R., Prazeres, N., & Pires, R. (2006). Inventário Multifásico de Personalidade de
Minnesota (Adolescentes): Versão experimental portuguesa do MMPI-A. Lisboa: Centro de
Investigação em Psicologia e Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da
Universidade de Lisboa. (Texto não publicado).
Steinberg, L. (2005). Cognitive and affective development in adolescence. Trends in Cognitive
Science, 9 (2), 69-74.