Toma lá Poesia Folhetos de Promoção do Concurso Literário Prof.ª Conceição Ludovino 2 2 A 6 2 09
1. ARMA SECRETA
Tenho uma arma secreta
ao serviço das nações.
Não tem carga nem espoleta
mas dispara em linha recta
mais longe que os foguetões.
Não é Júpiter, nem Thor,
nem Snark ou outros que tais.
É coisa muito melhor
que todo o vasto teor
dos Cabos Canaverais.
A potência destinada
às rotações da turbina
não vem da nafta queimada,
nem é de água oxigenada
nem de ergóis de furalina.
Erecta, na noite erguida,
em alerta permanente,
Suy, 1983
espera o sinal da partida.
Podia chamar-se VIDA.
Chama-se AMOR, simplesmente.
António Gedeão, pseudónimo de Rómulo de Carvalho (1906-1997)
INFÂNCIA
Um gosto de amora
comida com sol. A vida Suy, 1982
chamava-se “Agora”.
Guilherme de Almeida (1890-1969)
2. O PORTUGAL FUTURO AMOSTRA SEM VALOR
O Portugal futuro é um país
Eu sei que o meu desespero não interessa a ninguém.
aonde o puro pássaro é possível
Cada um tem o seu, pessoal e intransmissível:
e sobre o leito negro do asfalto da estrada
com ele se entretém
as profundas crianças desenharão a giz
e se julga intangível.
esse peixe da infância que vem na enxurrada
e me parece que se chama sável.
Eu sei que a Humanidade é mais gente do que eu,
Mas desenhem elas o que desenharem
sei que o Mundo é maior do que o bairro onde habito,
é essa a forma do meu país
que o respirar de um só, mesmo que seja o meu,
e chamem elas o que lhe chamarem
não pesa num total que tende para infinito.
Portugal será e lá serei feliz.
Poderá ser pequeno como este
Eu sei que as dimensões impiedosas da Vida
Suy, 1995
ter a oeste o mar e a Espanha a leste
ignoram todo o homem, dissolvem-no, e, contudo,
tudo nele será novo desde os ramos à raiz.
nesta insignificância, gratuita e desvalida,
À sombra dos plátanos as crianças dançarão
Universo sou eu, com nebulosas e tudo.
e na avenida que houver à beira-mar
pode o tempo mudar será Verão.
António Gedeão, pseudónimo de Rómulo de Carvalho (1906-1997)
Gostaria de ouvir as horas do relógio da matriz
mas isso era o passado e podia ser duro
edificar sobre ele o Portugal futuro.
Ruy Belo (1933-1978)
AMADOR SEM COISA AMADA
Resolvi andar na rua
com os olhos postos no chão.
Quem me quiser que me chame
ou que me toque com a mão.
Quando a angústia embaciar
de tédio os olhos vidrados,
olharei para os prédios altos,
para as telhas dos telhados.
Amador sem coisa amada,
aprendiz colegial.
Suy, 1984
Sou amador da existência,
não chego a profissional. Suy, 1993
António Gedeão, pseudónimo de Rómulo de Carvalho (1906-1997)