Este documento discute as implicações da psicanálise na fotografia em três frases. Apresenta como a psicanálise analisa nossa relação de identificação e afeto com imagens fotográficas, e como conceitos como inconsciente, pulsões e desejo influenciam nossa percepção e apreciação de fotos. Também aborda como a fotografia pode servir como sintoma revelador de processos psíquicos.
3. ■ Por que somos impelidos a olhar?
■ Qual é a fotografia que “convence”?
■ Como se dá a nossa relação de identificação com
a fotografia?
■ Como se dá a nossa relação de afeto com a
fotografia?
■ Por que gostamos mais de algumas fotos e não
de outras?
4. A imagem e a psicanálise
■ Jacques Aumont: A Imagem (2002)
■ O espectador é um sujeito com afetos, pulsões e emoções
■ Freud: dois níveis de atividade psíquica:
– Nível primário: organização dos processos do inconsciente
(sintomas neuróticos, sonhos)
– Nível secundário: pensamento consciente (expressão social,
civilizada, discursos racionais)
■ Na psicanálise: imagem interfere no inconsciente / imagem
artística como sintoma
5. Arte como sintoma
■ Freud relacionava as obras de arte em seu aspecto subjetivo e
realizava um estudo do seu produtor, do artista.
■ Encarava a imagem como um discurso do inconsciente: “por que
querer exprimir esse estado psicológico, e não outro?”
■ Psicanalista: não interpretar o que está representado, mas o que
está reprimido; não o produto final, mas as operações
inconscientes de que ele traz a marca
■ Nova abordagem: a obra não é mais sintoma de uma neurose,
mas é apenas uma demonstração da produção organizada
segundo as regras do inconsciente em geral
6. “A lembrança infantil de Leonardo da
Vinci”, Sigmund Freud (1910)
■ “A Sant’Ana, aVirgem e o Menino”
7. Jacques Lacan:
imagem = imaginário identificação
■ A noção do imaginário na teoria lacaniana: É a relação do sujeito com
suas identificações formadoras e a relação ilusória do sujeito com o real
■ É através das imagens que o sujeito identifica os objetos com o real (ex:
espelho)
■ O sujeito se relaciona com o simbólico através de formações
imaginárias
■ Relação do sujeito com o simbólico é feita de
duas formações imaginárias:
– Objetos de desejo
– Identificações
8. Cinema e na fotografia – matrizes do
imaginário
■ Christian Metz (1977) – cinema aprofundou a noção de imaginário
■ “O cinema faz com que a percepção surja maciçamente, mas para
logo deixá-la cair em sua própria ausência, que é entretanto o único
significante presente.”
■ Metz – identificação do espectador em dois níveis:
– “primária”: do sujeito espectador com seu próprio olhar (“Toda
imagem encontra o imaginário, provocando redes
identificadoras e acionando a identificação do espectador
consigo mesmo como espectador que olha”)
– “secundária”: do sujeito com elementos da imagem
9. Metz: dois tipos de identificação do
espectador com as imagens
primária: como eu olho
essa imagem?
secundária: com o que eu me
identifico nessa imagem?
10. A pulsão escópica (Ou: por que somos
impelidos a olhar?)
■ Pulsão: lugar do encontro entre uma excitação corporal e sua
expressão em um aparalho psíquico que visa dominar essa
excitação. Humano se guia mais pelas pulsões do que pelos
instintos
■ Pulsão escópica: necessidade de ver – por meio do olhar (Jacques
Lacan)
■ Olhar, diferente da visão, é realizado de modo ativo e mais ou
menos deliberado
■ O cinema, ao conjugar imagem visual e narração, articula mais
manifestamente o desejo e as pulsões
11. Dois estudos do olhar na abordagem
psicanalítica (Lacan)
Os olhares representados na
imagem e como eles
implicam no olhar do
espectador (processo de
identificação)
O olhar do espectador como
satisfação parcial do seu
voyeurismo básico (objeto
de desejo)
Daniel Berehulak/The NewYorkTImes
Foto: Gabriel Reis e André Freitas /Agnews
12. “Jogo intersubjetivo complexo”
■ De um lado, o espectador que habilita e censura o seu olhar; de outro, os olhares
trocados dentro da narrativa e os que se dirigem ao espectador (“ser apanhado”)
13. Laura Mulvey (1975): diferença sexual
■ Laura Mulvey (1975): Diferenças entre personagens masculinos e femininos: um
é dotado do poder de olhar, outro feito para ser olhado. Mulher como imagem,
homem como portador do olhar.
17. Imagem como fonte de afetos
■ Kant: “o sentimento de um prazer ou de um desprazer (...) que
não deixa o sujeito chegar à reflexão”
■ WilhemWorringer (1913): Abstraktion und Einfühlung
■ “Estética psicológica” no início do século que se baseia em
dois conceitos:
– Abstração: produção artística decorrente de um “querer”
artístico, formas artísticas concebidas no modo da
estilização geométrica, fundadas em uma relação menos
ótica e mais tátil com a realidade
– Empatia (Einfühlung): com a natureza a com o mundo, a
partir de uma relação feliz e identificatória com o mundo
exterior
18. “Estética psicológica” da abstração
Estilo claro, inorgânico, baseado na linha reta e superfície plana,
geométrico, valores coletivos
Profunda necessidade psicológica de ordem para compensar a angústia
do contato com o mundo exterior
19. “Estética psicológica” da empatia
Naturalismo, orgânico, fundado no arredondado e tridimensionalidade,
tendências e aspirações individuais
Arte imitativa, naturalista, provém da relação empática com o mundo
20. As imagens e as emoções
■ Na psicanálise, há duas abordagens sobre a emoção: neutra e
desvalorizadora
– Neutra: emoção é reguladora da passagem da emoção à
ação (FrancisVanoye, 1989)
– Negativa: sinal de disfunção correlata a uma baixa dos
desempenhos do sujeito
“Na maioria dos casos, as imagens provocam processos
emocionais incompletos, já que não já nem passagem da emoção
à ação, nem verdadeira comunicação entre espectador e
imagem” (AUMONT,Jacques)
21. Relação negativa das emoções com as
imagens: sensacionalismo
Guerra doVietnã por Donald McCullin.
Foto:
Agência
Press/2015
22. Relação afetiva: a foto como fetiche
■ Christian Metz – várias características da
fotografia facilitam a sua fetichização:
– Tamanho pequeno
– Interrupção do olhar que ela provoca
– Indicador de algo que foi e não é mais
– Ausência de som e movimento – ligação
simbólica com a morte
– Relação com o fora-de-campo: relação com
a castração
23. Qual é a fotografia que “convence”?
■ Retórica de Aristóteles
– Ethos: a credibilidade e verossimilhança da foto; a
autoridade de quem a tira (precisamos acreditar
que aquilo representa o real)
– Logos: a lógica da narrativa: harmonia entre
conteúdo, enquadramento, luz
– Pathos: fotografia com apelo emocional (Valores
humanos compartilhados)
33. Por que gostamos de algumas
fotografias e não de outras?
■ Roland Barthes: A CâmaraClara (1980) – teoriza a relação do
espectador com a imagem fotográfica
– Foto do fotógrafo: studium – a informação contida na foto,
sinais objetivos, campo codificado intencionalmente
– Foto do espectador: punctum – o acaso, associações
subjetivas, descobrir na foto um objeto parcial de desejo
não-intencional, identificação
“Cada espectador se investirá de forma singular ao
apropriar-se de certos elementos da foto que serão, para
ele, como pequenos pedaços destacados do real. A foto
satisfaz, assim, em particular, a pulsão escópica, já que
permite ver mas também olhar.” (AUMONT, p. 128)
34. Studium
■ O studium possui afeto médio,
interesse geral, às vezes emocionado,
emoção que passa pela cultura moral e
política. “É pelo studium que me
interesso por muitas fotografias, quer
as receba como testemunhos políticos,
quer as aprecie como bons quadros
históricos” (p. 45 – 46). É um interesse
“investido”, que se busca.
O presidente John F. Kennedy e o ex-
presidente Dwight D. Eisenhower
estão passeando em Camp David
(Foto: Paul Vathis, 1962)
35. Studium: a grande maioria das fotos
Grevistas da Ford. (Milton Brooks, 1941)
Mulher abandonada pelo marido. (Fotos: Lilo
Clareto/Reporter Brasil)
Gol do Palmeiras.
(Agustin Marcarian/AP Photo)
36. Punctum: algo que “punge”
individualmente
■ O punctum não pode ser
objetivado nem
universalizado, é próprio de
cada espectador. “É ele que
parte da cena, como uma
flecha, e vem me
transpassar.” Deixa uma
marca. O acaso que na foto
me punge, me mortifica, me
fere.
Charles Clifford: Alhambra, 1854-1856
57. “Estou deprimido, sem
telefone, sem dinheiro para
pagar a renda, sem dinheiro
para ajudar ao sustento da
minha criança, sem dinheiro
para pagar as dívidas, sem
dinheiro! Sou assombrado
pelas vívidas memórias de
mortes e cadáveres e raiva e
dor, de crianças feridas e
esfomeadas, de loucos que
assassinam alegremente,
alguns deles polícias (…). A dor
de viver ultrapassa a alegria ao
ponto em que esta deixa de
existir.”
(Bilhete de Kevin Carter,
27/07/1994)
Foto: Guy Adams
60. Sebastião adquiriu uma
doença autoimune e
quase abandonou a
fotografia após o trabalho
realizado em Êxodos.
“Você viu tanta morte que
você mesmo está
morrendo”