Uma crônica é uma reflexão sobre um acontecimento e difere da notícia porque não tem como objetivo principal informar, mas sim refletir sobre o assunto de uma forma subjetiva. A crônica apresenta um discurso entre a reportagem e a literatura com diálogo, monólogo e subjetividade. Ela não morre rápido como uma notícia, mas eventualmente morre, embora use recursos literários. Sua estrutura se assemelha à de um conto.
1. O QUE É UMA CRÓNICA
É uma reflexão sobre o acontecido...
A crónica difere da notícia, e da reportagem porque, embora utilizando o jornal
ou a revista como meio de comunicação, não tem por finalidade principal informar o
destinatário, mas reflectir sobre o acontecido. Desta finalidade resulta que, neste tipo
de texto, podemos ler a visão subjectiva do cronista sobre o universo narrado. Assim, o
foco narrativo situa-se invariavelmente na 1ª pessoa.
Poeta do quotidiano, como alguém chamou ao cronista dos nossos dias,
apresenta um discurso que se move entre a reportagem e a literatura, entre o oral e o
literário, entre a narração impessoal dos acontecimentos e a força da imaginação.
Diálogo e monólogo; diálogo com o leitor, monólogo com o sujeito da enunciação. A
subjectividade percorre todo o discurso.
A crónica não morre depressa, como acontece com a notícia, mas morre, e aqui
se afasta irremediavelmente do texto literário, embora se vista, por vezes, das suas
roupagens, como a metáfora, a ambiguidade, a antítese, a conotação, etc.
A sua estrutura assemelha-se à de um conto, apresentando uma introdução,
um desenvolvimento e uma conclusão.
2. Exemplo de uma Crónica
Ardina
Aquele rapazinho que todas as tardes, ao fim da tarde, anda a
vender jornais por entre carros que estão quase a parar, que estão quase
a arrancar, na faixa central da Avenida, não repara que a morte lhe passa
tangentes constantes. É decerto um rapazinho que ainda não conhece
nada da morte, nem mesmo quer saber se ela existe. Sabe-se leve e
rápido, sabe que tem bons reflexos. Por isso, arrisca. Ao menino e ao
borracho, diz o povo... Mas eu lembro-me, sempre que o vejo, sempreque
por uma ou por outra razão subo a Avenida dentro de um dos traçadores
de tangentes (não quero pensar em secantes), de um conto que li em
tempos, porque ai esta nossa cultura livresca... Não sabíamos nada, ainda
pouco sabemos, das pessoas vivas, decomo elas vivem e lutam, mesmo só
aqui, nesta nossa cidade, grande e confusa cabeça do corpo frágil que é
Portugal, e vamos recordar um ardina de papel, um rapazinho pequeno
encontrado há muitos anos num livro, brasileiro ainda por cima. Era
também, salvo erro, um rapazinho numa cidade grande, um menino de
periferia, do morro, talvez. Ao que me lembro vendia jornais e pendurava-
se nos eléctricos para chegar mais depressa ou talvez por aventura, sim,
creio que era por aventura, que o fazia. Até ao dia em que caiu e a
aventura terminou. Recordo esse ardina dentro de um livro, ao olhar para
este, dentro da vida, e a brincar - a brincar? - com a morte,
ziguezagueando, por entre ela, enquanto apregoa os jornais da tarde.
3. Cuidado menino, estou quase a gritar. Mas nunca vou a tempo.
Porque a luz está, de súbito, verde, e ele está, de súbito, longe. Dir-se-á
que andam à mesma velocidade, ele e a luz.
Maria Judite Carvalho,OHomemdo Arame (1979)