O documento descreve o romance entre o arquiteto modernista Le Corbusier e a atriz e dançarina norte-americana Josephine Baker. Eles se conheceram a bordo de um navio que passava pelo Rio de Janeiro nos anos 1920. Passaram tempo juntos na cidade, aproveitando a atmosfera sensual e moderna. Desenhos e cartas sugerem que o encontro foi além de uma mera amizade.
1. história le corbusier e joséphine baker
UM affair CARIOCA
MARCIO ALVES ROITER
DESCREVE DETALHES
DO ROMANCE ENTRE LE
CORBUSIER E JOSÉPHINE
BAKER. O ARQUITETO E
A EXPLOSIVA ATRIZ SE
ENCONTRARAM A BORDO
DE UM NAVIO COM
PASSAGEM PELO RIO.
JUNTOS, APROVEITARAM
“A CIDADE MAIS BONITA
DO MUNDO” NOS ANOS
DOURADOS NA CAPITAL
BRASILEIRA NO APAGAR
DA DÉCADA DE 20
Nesta página, desenho de Le
Corbusier Joséphine Endormie
(Fundação Le Corbusier)
Na página ao lado, Desenho
de Di Cavalcanti Le Corbusier,
1923 (Museu de Arte
Contemporânea da USP)
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2. história le corbusier e joséphine baker
À direita, o arquiteto e Alberto
Monteiro de Carvalho, seu
anfitrião no Rio de Janeiro
(Fundação Le Corbusier)
Abaixo, desenho dos carnets
de voyage de Le Corbusier:
ele e Joséphine Baker
passeando no Rio de Janeiro
(Fundação Le Corbusier)
Acima, Joséphine Baker, Em sua autobiografia, Joséphine Baker comenta a festa da travessia do Equador a
aquarela de J. Carlos bordo do Lutétia, em dezembro de 1929, após deixar o Rio de Janeiro a caminho da
(coleção Art Déco Brasileiro Europa: “Havia duas Joséphines ali: eu e ele. Ele se pintou de preto, com um
Adolpho e Fulvia Leirner) cinturão de plumas. Foi irresistivelmente cômico. Ah, senhor Le Corbusier, uma
pena que seja um arquiteto! Que boa dupla teríamos sido!”
Ao lado, Le Corbusier, Dois personagens de capital importância na história do século 20, o francossuíço
Joséphine Baker e amigos Le Corbusier (1887-1965), considerado o pai da arquitetura moderna, e Joséphine
no convés do Lutétia Baker (1906-1975), a vedete sensual que deixou os EUA para triunfar na Paris de
(Fundação Le Corbusier) 1925, encontram-se a bordo do navio que saía de Buenos Aires, passava pela então
capital do Brasil e seguia para a Europa. Era a primeira turnê sul-americana da
atriz, cercada de protestos e ameaças da igreja católica e de moralistas. A apresen-
tação dela em São Paulo chegou a ser censurada, tudo por causa da performance
seminua e provocante que estreara em Paris anos antes.
Le Corbusier vinha ao Rio para fazer palestras e procurar trabalho. Apesar da fama,
de editar a revista L’Esprit Nouveau (uma das mais vanguardistas da época, com assi-
nantes do naipe de Mario de Andrade, Jaime da Silva Teles e Oswald de Andrade), não
recebia encomendas de projetos como gostaria, e aceitava essas viagens como um
reforço de caixa. Ao conhecer Paulo Prado, na casa de Tarsila do Amaral, em Paris,
ouviu do mecenas da Semana de Arte Moderna de 1922 os planos do governo brasi-
leiro de transferir a capital do País para o Centro Oeste – plano que só se concretizou
em 1960, com Brasília. Ironicamente, não foi Le Corbusier que assinou os projetos ou
o plano diretor, e sim seus alunos e seguidores Oscar Niemeyer e Lucio Costa.
Os carnês de viagem do arquiteto repletos de desenhos da vedete, as cartas à sua mãe
e à própria Joséphine sugerem que o encontro dos dois foi além de mera amizade. No
último trabalho – e mais completo até hoje sobre o arquiteto, Le Corbusier, le Grand,
editado em 2008 pela Phaidon, aparece duas cartas do francossuíço reclamando da
indiferença de Joséphine aos seus sentimentos. Ali se vê, também, um dos dese-
nhos que fez da artista, dormindo. Na resenha sobre o livro publicada pela revista
Antiquariato, da editora italiana Mondadori, de fevereiro 2009, mais uma vez o affair
é comentado. Sabe-se que, na intimidade, enquanto o arquiteto desenhava, a vedete
cantarolava canções da sua Saint Louis natal. A atmosfera da cidade, naquele começo
de verão, era sensual, tolerante e ávida de modernidade. E os dois dividiam, ainda, a
mesma opinião: estavam na mais bela capital do mundo.
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