1. Ministério Público do Estado de Pernambuco
Promotorias de Justiça Criminal e de Defesa da Cidadania da Capital
Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública da
Capital
O Ministério Público do Estado de Pernambuco, representado pelos Promotores
de Justiça que a presente subscrevem, no uso de suas atribuições legais em defesa dos
interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis, notadamente do patrimônio
público, diante do que consta das peças de informação em anexo (Inquérito Civil nº
01/2009), na forma e com fundamento nos artigos 37, 127 e 129, III, da Constituição
da República combinados com os artigos 1º, inciso IV e 5º da Lei nº 7.347, de 24 de
julho de 1985 (Lei da Ação Civil Pública); 1º e 25, inciso IV, alínea a da Lei nº 8.625,
de 12 de fevereiro de 1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público); 1º e 4º,
inciso IV, alínea a da Lei Complementar nº 12, de 27 de dezembro de 1994 (Lei
Orgânica do Ministério Público do Estado de Pernambuco) e nos dispositivos legais
adiante invocados, vem a presença de Vossa Excelência propor a presente AÇÃO
CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA pelas
razões de fato e de direito adiante aduzidas contra
SILVIO COSTA FILHO, brasileiro, pedagogo, atualmente exercendo o mandato de
deputado estadual e ex-‐‑vereador da cidade do Recife, inscrito no Cadastro de Pessoas
Físicas do Ministério da Fazenda sob o numero 035.007.204-‐‑39.
DOS FATOS
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Breve Introdução
Os fatos de que tratam a presente Ação Civil Pública tornaram-‐‑se públicos em 05 de
agosto de 2008, quando o Jornal do Commércio publicou a matéria “Auditoria atinge
Vereadores”, através da qual se deu conhecimento à sociedade recifense de Auditoria
Especial realizada pelo Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco sobre as verbas
indenizatórias recebidas pelos Vereadores da Cidade do Recife nos exercícios
financeiros de 2006 e 2007. Tal processo, amplamente divulgado por todos os meios
de imprensa, chocou a comunidade recifense e ficou conhecido como o Caso das
Notas Frias.
Cabe aqui esclarecer que, ainda no início dos trabalhos investigativos do TCE e em
face da gravidade das informações colhidas por seus Auditores, aquela Corte de
Contas, através do Diretor de Controle Municipal, encaminhou o expediente TC-‐‑
DCM nº 373/2006, relativo a irregularidades na aplicação dos recursos decorrentes
da Verba Indenizatória por parte de um grupo de vereadores e, deste modo, o
Ministério Público de Pernambuco, pela Promotoria de Justiça de Defesa da
Cidadania da Capital, instaurou o Procedimento de Investigação Preliminar nº
12/2007, para apuração dos referidos fatos, o qual foi convertido no Inquérito Civil nº
01/2009.
Foram ainda realizadas outras diligências por parte do Ministério Público.
Assim, após tais investigações, o Ministério Público Estadual restou convencido da
ocorrência de ato de improbidade administrativa perpetrado pelo demandado
consistente no desrespeito aos princípios da Administração Pública, na violação dos
deveres de honestidade e lealdade à Instituição Câmara de Vereadores, bem assim na
apropriação indevida de recursos públicos em razão do exercício do mandato de
vereador da Cidade do Recife.
Elementos da investigação conduzida pelo Tribunal de Contas do Estados na
Auditoria Especial nº 0605226-‐‑5
O Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco em obediência à Decisão nº 88/09,
da Segunda Câmara daquela Corte, encaminhou ao Ministério Público Estadual cópia
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da Auditoria Especial nº 0605226-‐‑5, a qual cuidava de uma análise aprofundada das
contas da Câmara no exercício de 2006.
Tal Auditoria Especial foi determinada pelo então Relator, Auditor Ruy Ricardo
Harten, em face da CI nº 095/2006, que, na oportunidade, identificou
“irregularidades (...) durante a auditoria de acompanhamento da gestão
orçamentária, financeira, contábil e patrimonial dos exercícios de 2006 e 2007,
especificamente no que se refere às verbas de gabinete – atualmente denominadas
verbas indenizatórias”.
O item 2.2 do Relatório de Auditoria elaborado pelos Técnicos do Tribunal de Contas
apresenta uma Contextualização da Verba de Gabinete após a CF de 1988 e a
aplicação conferida pela Câmara de Vereadores, o qual, pela sua pertinência e
didática é aqui parcialmente reproduzido. Sem embargo, destacam os Auditores que:
Um dos maiores destaques da CF/88 foi a expressiva autonomia concedida
aos municípios da Federação. Por conseqüência, as Câmaras Municipais
se apropriaram de um volume bastante considerável da receita.
Muito embora os Legislativos fossem e ainda sejam dependentes
economicamente do Executivo quando o assunto é orçamento, o que se
observava eram gastos crescentes com a função legislativa e, em especial,
com a remuneração dos vereadores.
À medida que tais gastos iam surgindo, os debates os acompanhavam. Era
de se perquirir a necessidade do volume desses gastos se comparadas a
ações primárias como saúde e educação.
É fato a intenção do legislador em controlar os gastos das Câmaras
Municipais, e o resultado foi a imposição de diversos limites, com
destaque, no caso deste relatório, para a Emenda Constitucional nº 25/00
promovendo mudanças profundas com a introdução do art. 29 – A da
Constituição Federal que estabeleceu uma base de cálculo para o repasse
feito a Câmara e que desse repasse, não poderia ser gasto mais de 70%
com folha de pagamento.
Tendo em vista que os dispêndios do Poder Legislativo são
majoritariamente de natureza remuneratória, haja vista sua função
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essencial, principal ou precípua ser legislar e fiscalizar os atos do Poder
Executivo, não tendo atribuições de construir escolas, hospitais, estradas -‐‑
nem tão pouco, gastos com a manutenção destas espécies de serviços
públicos -‐‑ a Câmara Municipal do Recife passou a instituir as chamadas
verbas de gabinetes ou verbas indenizatórias de apoio ao exercício
parlamentar, com o fito de não “desperdiçar” parcela dos 30% restantes
do seu repasse, promovendo aquisições das mais variadas. Algumas delas,
como será apresentado, desrespeitam princípios elementares de gestão
pública; já outras nem sequer aconteceram e são acobertadas pela
utilização de documentos fiscais inidôneos.
A verba em questão corresponde a um valor prefixado, pago mensalmente
aos Membros do Legislativo, e destina-‐‑se -‐‑ ao menos em tese -‐‑ ao custeio
de manutenção dos gabinetes parlamentares.
Assim dizia a Lei Municipal nº 17.092/2005 (fls.09):
Art. 1º -‐‑ As despesas de apoio realizadas pelos gabinetes de Vereadores
serão custeadas por verba de gabinete na forma instituída pela Lei 15.887,
de 5 de abril de 1.994 com regulamentação e alterações constantes desta
Lei.
Art. 3º -‐‑ O valor mensal com as despesas de apoio aos gabinetes, através
da verba disciplinada nesta Lei, ficará limitado ao montante de até R$
14.365,00 (quatorze mil, trezentos e sessenta e cinco reais). (Grifo nosso)
A partir de 1º de janeiro de 2006, com o advento da Lei Municipal nº
17.159/2005 (fls.15), foram mantidos os valores mas a sistemática do
suprimento individual, prevista até então como forma de descentralizar
tais recursos, foi alterada, passando-‐‑se a ter caráter de indenização. Em
outras palavras, o vereador realiza, repita-‐‑se, em tese, os gastos com a
manutenção do seu gabinete e requisita o ressarcimento/reembolso destas
despesas mediante documentação comprobatória no valor de até R$
14.365,00.
Diz a referida lei:
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Art. 1º -‐‑ A verba de que trata a Lei 17.092, de 20 de maio de 2.005,
mantido o limite de valor ali previsto e a possibilidade de seu
contingenciamento por meio de Resolução, fica transformada em verba
indenizatória do exercício parlamentar, destinada exclusivamente ao
ressarcimento das despesas relacionadas ao exercício do mandato
parlamentar.
Art. 2° -‐‑ O ressarcimento das despesas relacionadas com o exercício
parlamentar será efetivado mediante solicitação formulada pelo Vereador,
dirigida à Comissão de Controle Interno, instruída com a necessária
documentação fiscal comprobatória da despesa.
Art. 16 -‐‑ Esta Lei entra em vigor em 1° de janeiro de 2006.1 (Grifamos).
A partir de janeiro de 2007, por meio da Resolução N.º 702/2006 (fls.17),
de 23/12/2006, a Câmara Municipal do Recife reduziu o valor desta verba
para R$ 6.685,00. Esse valor vigorou apenas por quatro meses (janeiro a
abril/07), tendo em vista que ao final do mês de abril, a Câmara
Municipal editou uma outra resolução (Resolução N.º 233/2007, fls.18)
majorando o valor da verba para R$ 10.090,00.
Na seqüência, os Auditores destacam as Irregularidades e Deficiências detectadas
e assim classificadas: a) Notas Fiscais Inidôneas; a.1) Notas fiscais de
estabelecimentos diversos preenchidas pela mesma pessoa; a.2) Notas fiscais
irregulares; a.3) Notas fiscais de estabelecimentos fechados e/ou inexistentes; b) Dos
gastos com combustíveis; c) Gastos indevidos com alimentação; d) Das despesas
irregulares com promoção pessoal; e) Atuação ineficiente do Controle Interno; f)
Descentralização orçamentária e financeira indevida dos recursos para manutenção
dos gabinetes.
No caso específico do demandado, observa-‐‑se que, no período analisado, o então
vereador percebeu, a título de Verba Indenizatória, o montante de R$ 55.577,34,
assim distribuídos:
mai/06 13.777,02
jun/06 13.817,99
1 Lei Municipal nº 17.159/2005.
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jul/06 13.968,00
jan/07 14.014,33
No entanto, para fazer jus a sua percepção, o demandado utilizou 25 (vinte e cinco)
Notas Fiscais inidôneas no valor total de R$ 51.430,00 (cinqüenta e um mil,
quatrocentos e trinta reais), oriundas das seguintes empresas: Aurimendes
Bezerra da Silva (Barraco), Bar e Restaurante Prestígio, Comercial Sette,
Danielle Crhistine Silva Mascarenhas, Galeteria Alvorada, Mansão do
Matuto, Marcia Lourenço Neres (Comercial Lourenço), Osvaldo Gomes de
Lima (Bar do Caboclinho), Papelaria Baraúna, Posto Leão da Ilha, Posto
Lupp, Valgráfica e WR Gráfica e Editora.
Ainda de acordo com aquele órgão de Controle Externo, as irregularidades
constatadas foram as seguintes:
Notas Fiscais emitidas por Aurimendes Bezerra da Silva (Barraco) – o
demandado fez uso das Notas Fiscais nº 5721 e 5724, supostamente emitidas em
07/01/2007 e 10/01/2007, nos valores de R$ 356,00 e R$ 367,00. Contudo, tais
notas fiscais fazem parte do, assim definido pelo TCE, Grupo B de Notas Fiscais
inidôneas2.
No que se refere à Nota Fiscal nº 5721, trata-‐‑se de documento fiscal de numeração
superior a Nota Fiscal nº 5712. Contudo, esta segunda nota fiscal foi emitida em data
posterior, contrariando a ordem cronológica de sua emissão.
Notas Fiscais emitidas pelo Bar e Restaurante Prestígio – o demando fez uso das
Notas Fiscais nº 9239, 9253 e 9299, supostamente emitidas em 16/05/2006,
19/06/2006 e 19/01/2007, nos valores de R$ 750,00, 1.700,00 e 76,00. Contudo, tais
2 Conjunto composto por 50 Notas Fiscais oriundas das empresas Aurimendes Bezerra da Silva
(Barraco), Bar e Restaurante Prestígio, Danielle Crhistine Silva Mascarenhas, Derby Refeições
(Galeteria Alvorada), E S de Oliveira Lanchonete (Tempero da Torre), EBCT, Edvaldo Vieira da
Silva (Gráfica Angelin), Elenilza Viviane Miranda (Novo Horizonte), Luciano de Paula Lima (TGS
Formulários), Marcia Lourenço Neres (Comercial Lourenço), Osvaldo Gomes de Lima (Bar do
Caboclinho), Papelaria Brasil, Papelaria Joaquim Nabuco, Papelaria Unimax, Paraíso da Carne de
Sol, Posto Total Boa Viagem e WR Gráfica e Editora - cujo o preenchimento foi produzido pelo
mesmo punho, conforme apurado no Laudo de Exame Documentoscópico (Grafoscópico) emitido pelo
Setor Técnico Científico da Superitendência Regional do Departamento de Polícia Federal no Estado
de Pernambuco (Laudo Pericial nº 380/2008 – SETEC/SR/DPF/PE
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notas fiscais fazem parte do, assim definido pelo TCE, Grupo N de Notas Fiscais
inidôneas3.
Ainda: no que se refere a Nota Fiscal nº 9253, a equipe de Auditoria localizou a via do
Contribuinte na qual consta que a mesma foi emitida em 12/08/05 no valor de R$
50,00. Razão pela qual o senhor Kan Wing Yat, proprietário do estabelecimento,
forneceu declaração às fls. 658 da referida Auditoria Especial, na qual informa não ter
emitido a referida nota fiscal.
A propósito das Notas Fiscais oriundas de tal estabelecimento, os Auditores
consignaram que em resposta ao Ofício TC/DCM/AUD/AR nº 10/2008 (fls.649) o
proprietário apresentou os talonários contendo as 2ª vias das notas solicitadas (fls.650
a 657), que confrontadas com as notas fiscais apresentadas pelos vereadores com
numeração correspondente (fls.659 a 666), verificou-‐‑se que estas últimas, constantes
das prestações de contas da verba indenizatória, eram falsas, pelos seguintes motivos:
o layout e a grafia das notas eram diferentes; os valores, as quantidades e a data não
correspondiam; a descrição do produto também era diferente, enquanto na via
fornecida pelo estabelecimento os produtos são discriminados (galeto, picanha etc.),
nas vias dos vereadores as discriminações são genéricas: “refeição completa” ou
“almoço completo”. Ademais, ao apresentar ao proprietário as vias que contínhamos,
o mesmo declarou não reconhecer e, portanto, não ter emitido tais notas. (vide
declaração fls.658). Ressaltamos, ainda, que as notas falsas relacionadas abaixo nem
ao menos guardam coerência entre a numeração e a data em que foram emitidas, a
exemplo das notas nº 9243 (30/03/07), 9253 (19/06/06) e que os valores são muito
superiores aos das notas verdadeiras, não condizentes com a movimentação de venda
do estabelecimento, segundo o proprietário.
Notas Fiscais emitidas pela empresa Comercial Sette – o demandado fez uso das
Notas Fiscais nºs 1332 e 1314, supostamente emitidas em 20/7/2006 e 16/6/2006, nos
valores de R$ 3.500,00 e 4.650,00. Contudo, a primeira nota fiscal faz parte do
3
Conjunto composto por 17 Notas Fiscais oriundas das empresas Bar e Restaurante Prestígio, Posto
Lupp, Valgráfica, Churrascaria e Pizzaria Mansão do Matuto, Papelaria Baraúna, Comercial Sette,
Osvaldo Gomes de Lima (Bar do Caboclinho), Danielle Crhistine Silva Mascarenhas e Marcia
Lourenço Neres (Comercial Lourenço) - cujo o preenchimento foi produzido pelo mesmo punho,
conforme apurado no Laudo de Exame Documentoscópico (Grafoscópico) emitido pelo Setor Técnico
Científico da Superitendência Regional do Departamento de Polícia Federal no Estado de Pernambuco
(Laudo Pericial nº 380/2008 – SETEC/SR/DPF/PE
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Grupo N de Notas Fiscais inidôneas, assim definido pelo TCE, enquanto a
segunda nota fiscal faz parte do Grupo O de Notas Fiscais inidôneas4.
Em relação ao citado estabelecimento restou consignado no Relatório Preliminar, que
duas observações se fazem necessárias: a primeira é o fato de inexistir estabelecimento
no endereço indicado, e a segunda diz respeito à verificação de grafia idêntica em
vários grupos de notas, comentado no subitem 3.1.1. deste relatório. Embora se
encontre apenas uma residência no endereço indicado, foram apresentadas 12 notas
fiscais que somam a quantia de R$ 44.100,90. (dentre as quais as utilizadas pelo
demandado).
Notas Fiscais emitidas pela empresa Danielle Christine Silva Mascarenhas – o
demandado fez uso das Notas Fiscais nº 388 e 393, supostamente emitidas em
15/01/2007 e 17/01/2007, nos valores de R$ 341,00 e R$ 261,00. Contudo, tais notas
fiscais fazem parte do, assim definido pelo TCE, Grupo N de Notas Fiscais
inidôneas.
4
Conjunto composto por 5 Notas Fiscais oriundas das empresas Comercial Sette, Derby Refeições
(Galeteria Alvorada), Posto Leão da Ilha e Aurimendes Bezerra da Silva (Barraco) - cujo o
preenchimento foi produzido pelo mesmo punho, conforme apurado no Laudo de Exame
Documentoscópico (Grafoscópico) emitido pelo Setor Técnico Científico da Superitendência Regional
do Departamento de Polícia Federal no Estado de Pernambuco (Laudo Pericial nº 380/2008 –
SETEC/SR/DPF/PE
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Segundo consta do Relatório de Auditoria, até o dia 14/02/2008, não haviam ainda
sido emitidas notas fiscais com tal numeração.
Com efeito, consta do referido documento que Em resposta ao Ofício
TC/DCM/AUD/AR nº 04/2008 (fls. 749) o proprietário apresentou os talonários
contendo as 2as vias das notas solicitadas, no entanto, nenhuma delas tinha sido
emitida ainda, na data da visita, conforme cópias em branco fornecidas pelo mesmo
(fls. 750 a 754). Portanto, constatou-‐‑se que as notas constantes das prestações de
contas da verba indenizatória (fls.756 a 764), eram falsas, também pelos seguintes
motivos: o layout das notas eram diferentes e o número da autorização para emissão
de notas fiscais não coincidia. Ademais, ao apresentar ao proprietário as vias que
contínhamos, o mesmo declarou não reconhecer e, portanto, não ter emitido tais
notas. (vide declaração fls. 755). Ressaltamos, ainda, que as notas falsas relacionadas
abaixo possuem, em alguns casos, numeração duplicada emitida para vereadores
diferentes, a exemplo das notas nº 388 e 393 e que os valores são muito superiores aos
das notas verdadeiras, não condizentes com a movimentação de venda do
estabelecimento, segundo o proprietário.
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Nota Fiscal emitida pelo estabelecimento Derby Refeições (Galeteria Alvorada) –
o demandado fez uso da Nota Fiscal nº 4995, supostamente emitida em 20/07/2006,
no valor de R$ 1.390,00.
No tocante a este documento fiscal, têm-‐‑se que a Autorização para Impressão de
Documento Fiscal – AIDF nº 013-‐‑93042/2005 é inexistente. De igual modo, faz
parte do Grupo O de Notas Fiscais inidôneas.
A propósito das Notas Fiscais oriundas de tal estabelecimento, os Auditores
consignaram que Em resposta ao Ofício TC/DCM/AUD/AR nº 08/2008 (fls.639) o
proprietário apresentou os talonários contendo as 2as vias das notas solicitadas
(fls.640 a 642), que confrontadas com as notas fiscais apresentadas pelos vereadores
com numeração correspondente (fls.644 a 648), verificou-‐‑se que estas últimas,
constantes das prestações de contas da verba indenizatória, eram falsas, pelos
seguintes motivos: o layout e a grafia das notas eram diferentes; os valores, as
quantidades e a data não correspondiam; a descrição do produto também era diferente,
enquanto na via fornecida pelo estabelecimento os produtos são discriminados (galeto,
picanha etc.), nas vias dos vereadores as discriminações são genéricas: “refeição
completa”. Ademais, ao apresentar ao proprietário as vias que contínhamos, o mesmo
declarou não reconhecer e, portanto, não ter emitido tais notas. (vide declaração fls.
643). Ressaltamos, ainda, que as notas falsas relacionadas abaixo nem ao menos
guardam coerência entre a numeração e a data em que foram emitidas, a exemplo das
notas nº 7540 (29/08/07) e 8201 (13/04/07) e que os valores são muito superiores aos
das notas verdadeiras, não condizentes com a movimentação de venda do
estabelecimento, segundo o proprietário.
Notas Fiscais emitidas pela empresa Churrascaria e Pizzaria Mansão do Matuto
– o demandado fez uso das Notas Fiscais nº 969 e 974, supostamente emitidas em
19/05/2006 e 14/07/2006, nos valores de R$ 1.200,00 e 1.110,00. Ainda conforme os
auditores, tais notas fiscais fazem parte do Grupo N de Notas Fiscais inidôneas.
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Notas Fiscais emitidas pela empresa Marcia Lourenço Neres (Comercial
Lourenço) – o demandado fez uso da Nota Fiscal nº 407, supostamente emitidas em
23/01/2007, no valor de R$ 4.515,00.
Em relação à citada empresa os auditores do TCE firmaram que, de acordo com os
dados do SINTEGRA, o estabelecimento encontra-‐‑se não habilitado (Ativo
Cancelado) pela SEFAZ-‐‑PE (fls.786) Em consulta ao sistema da Junta Comercial
(JUCEPE) foram encontrados um Requerimento de Cancelamento da empresa por
motivo de Fraude (fls.787), o Boletim de Ocorrência n° 07E0325000029 (fls.802),
bem como o Parecer JUCEPE nº 38/2007 (fls.795), nos quais a suposta proprietária
do estabelecimento declara nunca ter aberto a referida empresa e que foi informada da
existência da mesma por um auditor fiscal que esteve em sua residência para
constatar o endereço da empresa. Tal informação também foi confirmada através de
circularização com a Secretaria da Fazenda, a qual informa através do Ofício nº
12/2008 – DRR – I RF (fls.807 a 812) que a citada empresa teve sua inscrição
cancelada por declarações inexatas em documentos apresentados à SEFAZ e por
obtenção de inscrição estadual por meio de fraude, dolo e simulação. Ressalta-‐‑se que
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somente na amostra referente ao exercício de 2007 (7 meses) foram apresentadas pelos
vereadores 58 notas fiscais que totalizaram R$ 168.108,75 desta empresa
“fantasma”.
Ainda conforme os auditores, tais notas fiscais fazem parte do Grupo N de Notas
Fiscais inidôneas.
Notas Fiscais emitidas por Osvaldo Gomes de Lima (Bar do Caboclinho) – o
demandado fez uso da Nota Fiscal nº 291, supostamente emitida em 04/01/2007, no
valor de R$ 334,00. Entretanto, conforme constatado pela Auditoria, ela faz parte do
Grupo N de Notas Fiscais inidôneas.
Nota Fiscal emitida pela Papelaria Baraúna -‐‑ o demandado fez uso da Nota Fiscal
nº 5664, supostamente emitida em 19/05/2006, no valor de R$ 4.500,00. Entretanto,
conforme constatado pela Auditoria, ela faz parte do Grupo N de Notas Fiscais
inidôneas.
Além disto, a Autorização para Impressão de Documento Fiscal – AIDF nº
001.00780/2005 pertence a Gustavo Henrique Travassos.
Nota Fiscal emitida pelo Posto Leão da Ilha -‐‑ o demandado fez uso da Nota Fiscal
nº 213, supostamente emitida em 20/07/2006, no valor de R$ 4.000,00. Entretanto,
conforme constatado pela Auditoria, ela faz parte do Grupo O de Notas Fiscais
inidôneas.
Além disto, a Autorização para Impressão de Documento Fiscal – AIDF nº
003.02269/2004 pertence à empresa J. D. Material de Contrução.
Notas Fiscais emitidas pelo Posto Lupp – o demandado fez uso das Notas Fiscais nº
1153, 1127, 1140, 1145 e 1157, supostamente emitidas em 13/06/2006, 18/05/2006,
19/05/2006, 08/06/2006 e 16/06/2006, nos valores de R$ 2.001,92, 1.800,00,
1.800,00, 1.400,80 e 597,28. Entretanto, conforme constatado pela Auditoria, elas
fazem parte do Grupo D5 (a primeira Nota Fiscal) e N (as demais NFs) de Notas
Fiscais inidôneas.
5
Conjunto composto por 2 Notas Fiscais oriundas das empresas Posto Lupp e WR Gráfica e Editora-
cujo o preenchimento foi produzido pelo mesmo punho, conforme apurado no Laudo de Exame
Documentoscópico (Grafoscópico) emitido pelo Setor Técnico Científico da Superitendência Regional
Rua 1º de Março nº 100 – Santo Antonio – Recife/PE – CEP: 50010-070 – Fone (81) 3182-7273
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Além disto, a Autorização para Impressão de Documento Fiscal – AIDF nº
001.04302/2004 pertence à empresa Osvaldo Gomes de Lima ME.
Nota Fiscal emitida pelo empreendimento Valgráfica – o demandado ainda fez uso
das Notas Fiscais nº 4318, 4331 e 4323, supostamente emitidas em 18/05/2006,
18/06/2006 e 19/07/2006, nos valores de R$ 3.780,00, 3.500,00 e 4.000,00.
Ocorre que as Notas Fiscais nº 4318 e 4323 são clones posto que conforme apurado
junto ao referido estabelecimento as verdadeiras Notas Fiscais foram emitida em
07/07/04, nos valores de R$ 170,00 e 200,00.
No que concerne à Nota Fiscal nº 4331, tem-‐‑se que a mesma é falsa posto que a AIDF
que consta em seu rodapé de nº 3.0874/50-‐‑8 não corresponde à verdadeira autorização
fiscal concedida sob o nº 0887/83.
Acerca das Notas Fiscais da referida gráfica, consta o seguinte no Relatório de
Auditoria: Em resposta ao Ofício TC/DCM/AUD/AR nº 17/2008 (fls.681) o
proprietário apresentou os talonários contendo as 2as vias das notas solicitadas (fls.
do Departamento de Polícia Federal no Estado de Pernambuco (Laudo Pericial nº 380/2008 –
SETEC/SR/DPF/PE
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682 a 688), que confrontadas com as notas fiscais apresentadas pelos vereadores com
numeração correspondente (fls.690 a 698), verificou-‐‑se que estas últimas, constantes
das prestações de contas da verba indenizatória, eram falsas, pelos seguintes motivos:
o layout e a grafia das notas eram diferentes; os valores, as quantidades e a data não
correspondiam; o número da autorização da Prefeitura para emissão de notas fiscais
não coincidia; a descrição do serviço também era diferente. Ademais, ao apresentar ao
proprietário as vias que contínhamos, o mesmo declarou não reconhecer e, portanto,
não ter emitido tais notas. (vide declaração fls. 689).
Por derradeiro, cabe o registro de que tal documento fiscal faz parte do Grupo N de
Notas Fiscais inidôneas.
Notas Fiscais emitidas pela WR Gráfica e Editora – o demandado fez uso da Nota
Fiscal nº 656, supostamente emitida em 22/01/2007, no valor de R$ 3.500,00.
Entretanto, consta do Relatório de Auditoria que em resposta ao Ofício
TC/DCM/AUD/AR nº 18/2008 (fls. 727) o proprietário apresentou os talonários
contendo as 2 as vias das notas solicitadas (fls. 728 a 737), que confrontadas com as
notas fiscais apresentadas pelos vereadores com numeração correspondente (fls. 739 a
748), verificou-‐‑se que estas últimas, constantes das prestações de contas da verba
indenizatória, eram falsas, pelos seguintes motivos: o layout e a grafia das notas eram
diferentes; os valores, as quantidades e a data não correspondiam; o número da
autorização da Prefeitura para emissão de notas fiscais não coincidia; a descrição do
serviço também era diferente; o estabelecimento, até a data da visita, não havia
emitido a nota fiscal de nº 678 (a última NF emitida foi a nº 675 – vide NF nº 676 em
branco fls.737). Ademais, ao apresentar ao proprietário as vias que contínhamos, o
mesmo declarou não reconhecer e, portanto, não ter emitido tais notas. (vide
declaração fls.738). Ressaltamos, ainda, que as notas falsas relacionadas abaixo nem
ao menos guardam coerência entre a numeração e a data em que foram emitidas, a
exemplo das notas nº 656 (22/01/07) e 658 (16/01/07) e que os valores são muito
superiores aos das notas verdadeiras, não condizentes com a movimentação de venda
do estabelecimento, segundo o proprietário.
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No tocante à Nota Fiscal nº 656, consta no estabelecimento correspondente 2ª Via da
mesma no valor de R$ 395,00, emitida em 10/01/2008, em nome de Concórdia
Veículos, sendo a via apresentada pelo vereador clonada.
Por fim, verifica-‐‑se que tal documento fiscal faz parte do Grupo D de Notas
Fiscais inidôneas.
Cumpre enfatizar que o conjunto de 25 notas fiscais acima descrito corresponde à R$
51.430,00 (cinqüenta e um mil, quatrocentos e trinta reais), o que equivale a
93% do total da Verba Indenizatória percebida no período de maio a julho de 2006 e
janeiro de 2007 pelo réu.
Ante tais evidências e em que pese as razões expendidas na defesa do demandado na
dita Auditoria Especial, o Tribunal de Contas do Estado, em sessão realizada em 05
de fevereiro de 2009, concluiu a sua análise e, à unanimidade dos integrantes da sua
2ª Câmara, assim decidiu:
Julgo IRREGULARES as contas objeto da presente Auditoria Especial
realizada nas verbas indenizatórias de apoio ao gabinete da
Câmara Municipal do Recife, quando:
I. DETERMINO aos vereadores abaixo referidos que restituam aos cofres
municipais os valores relativos às despesas impugnadas, atualizados
monetariamente, a partir do primeiro dia do exercício financeiro
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subseqüente ao das contas ora analisadas, segundo os índices e condições
estabelecidos na legislação local para atualização dos créditos da Fazenda
Pública Municipal, no prazo de 15 (quinze) dias do trânsito em julgado à
presente deliberação, encaminhando cópia da Guia de Recolhimento a este
Tribunal para baixa do débito. Não o fazendo, que seja extraída Certidão
do Débito e encaminhada ao atual Prefeito do Município, que deverá
inscrever o débito na Dívida Ativa e proceder a sua execução, sob pena de
responsabilidade:
Notas Fiscais Inidôneas
VEREADOR
VICENTE MANOEL LEITE ANDRÉ GOMES -‐‑ R$ 44.093,27
II. APLICO, aos vereadores e membros da Comissão de Controle Interno
devidamente nominados abaixo, multa, nos termos do artigo 73, incisos I,
II e III, da Lei Estadual n°12.600/04, pelas irregularidades citadas e nos
valores descritos no corpo principal deste voto, em favor do Fundo de
Aperfeiçoamento Profissional e Reequipamento Técnico do Tribunal,
conta corrente nº 9500322, Agência nº 1016, Banco nº 356, Real S/A,
valor a ser recolhido no prazo de 15 (quinze) dias do trânsito em julgado
da presente decisão, oportunidade em que deverá ser encaminhada a este
Tribunal a respectiva guia de quitação para baixa do débito:
Irregularidade: Notas Fiscais Inidôneas
Hipótese Normativa: ato de gestão ilegal, ilegítimo ou
antieconômico de que resulte injustificado dano à Fazenda (art.
73, II, da Lei Orgânica deste Tribunal)
VEREADOR
VICENTE MANOEL LEITE ANDRÉ GOMES -‐‑ R$ 9.000,00
Irregularidade: Notas Fiscais Inidôneas
Hipótese Normativa: ato praticado com grave infração a norma
legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira,
orçamentária, operacional ou patrimonial (art. 73, III, da Lei
Orgânica deste Tribunal)
VEREADOR
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ANDRÉ FERREIRA RODRIGUES -‐‑ R$ 2.500,00
ANTÔNIO LUIZ DA SILVA NETO -‐‑ R$ 5.000,00
AUGUSTO JOSE CARRERAS CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE
-‐‑ R$ 2.500,00
CARLOS FREDERICO GOMES FRED OLIVEIRA -‐‑ R$ 4.000,00
DANIEL PIRES COELHO -‐‑ R$ 3.000,00
EDUARDO AMORIM MARQUES DA CUNHA -‐‑ R$ 5.500,00
ELEDIAK FRANCISCO CORDEIRO -‐‑ R$ 2.500,00
FRANCISMAR MENDES PONTES -‐‑ R$ 3.000,00
GILVAN CAVALCANTI DA SILVA -‐‑ R$ 5.000,00
GUSTAVO VASCONCELOS NEGROMONTE -‐‑ R$ 5.500,00
JOÃO ALBERTO DE FREITAS MARINS -‐‑ R$ 3.000,00
JOSE ERIBERTO MEDEIROS DE OLIVEIRA -‐‑ R$ 2.500,00
LIBERATO PERREIRA COSTA JUNIOR -‐‑ R$ 5.500,00
LUIZ CARLOS CAVALCANTI PIRES -‐‑ R$ 3.000,00
LUIZ EUSTÁQUIO RAMOS NETO -‐‑ R$ 5.500,00
LUIZ HELVÉCIO DE SANTIAGO ARAÚJO -‐‑ R$ 5.500,00
LUIZ VIDAL SILVA -‐‑ R$ 5.500,00
MARCOS ANTONIO DE SOUZA MENEZES -‐‑ R$ 2.500,00
MOZART JULIO TABOSA SALES -‐‑ R$ 2.500,00
OSMAR RICARDO CABRAL BARRETO -‐‑ R$ 4.500,00
ROMILDO JOSE FERREIRA GOMES FILHO -‐‑ R$ 6.000,00
SEVERINO GABRIEL BELTRÃO -‐‑R$ 2.500,00
SILVIO SERAFIM COSTA FILHO -‐‑ R$ 5.000,00
VALDIR FACIONI -‐‑ R$ 4.000,00
HENRIQUE JOSÉ LEITE DE MELO -‐‑ R$ 6.000,00
Entre os considerandi da referida decisão, destacam-‐‑se:
CONSIDERANDO que foram utilizadas como comprovantes da despesa notas fiscais
“clonadas”, notas de estabelecimentos fechados ou inexistentes, notas com numeração
repetida, notas de estabelecimentos diversos preenchidas com a mesma grafia, notas
grosseiramente falsificadas, dentre tantas outras irregularidades, o que configura o
ato de improbidade administrativa previsto no art. 9º, XI, da Lei Federal nº 8.429/92;
CONSIDERANDO que, apesar de quase todos os vereadores responsáveis pela
prestação de contas com base em notas fiscais inidôneas terem devolvido os
respectivos recursos aos cofres da Prefeitura Municipal, as irregularidades subsistem,
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porquanto a devolução voluntária dos recursos significa reconhecimento da
irregularidade cometida (presunção legal de veracidade do alegado);
Merece menção o Item V da referida Decisão, o qual determinou a remessa de cópia da
Auditoria Especial ao Ministério Público de Pernambuco.
Da devolução dos valores apropriados
O demandado, uma vez notificado nos autos da Auditoria Especial acima
mencionada, recolheu o valor indicado no Relatório Prévio.
Com efeito, consta dos autos da referida Auditoria Especial o comprovante bancário,
relativo ao valor de R$ 51.430,00, depositado pelo demandado na Conta Única do
Município em 15 de julho de 2008.
Tal devolução, no entanto, não constitui óbice à propositura da presente ação civil
pública por ato de improbidade administrativa, conforme delineado no artigo 12 da
Lei de Improbidade Administrativa.
DO DIREITO
Conforme leciona Norberto Bobbio, “a distinção entre bem comum (bonum
commune) e bem próprio (bonum proprium) é, aliás, aquela que desde Aristóteles
serve para distinguir as formas de governo boas das formas de governo corruptas: o
bom governo é aquele que se preocupa com o bem comum, o mau olha o próprio bem,
vale-‐‑se do poder para satisfazer a interesses pessoais”6.
Em consonância com tal premissa, o constituinte originário estabeleceu, no artigo 37,
que a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e também que (...)
6 Norberto Bobbio, in Teoria Geral da Política, Editora Campus, 15ª Tiragem , 2000, página 219
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§ 4º -‐‑ Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos
políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao
erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
Trata-‐‑se de uma opção clara e direta no sentido de que a gestão da coisa pública deva
se guiar pela consecução do bonum commune referido por Norberto Bobbio. De resto,
aspiração comum ao nosso povo e, fundamentalmente, fator legitimador do exercício
do poder, vez que aproveitar o exercício de cargo ou mandato eletivo para, através
dele, implementar o bonum proprium macula a representação eleitoralmente
concedida pela população.
No espectro infraconstitucional, foi promulgada a Lei nº 8.429/92 que dispõe sobre as
sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no
exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta,
indireta ou fundacional.
No tocante à delimitação dos sujeitos ativos da improbidade administrativa, têm-‐‑se no
artigo 2º que reputa-‐‑se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce,
ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação,
contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo,
emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.
Na outra ponta, são passíveis de sofrer ato de improbidade administrativa, nos termos
do artigo 1º da citada lei, a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer
dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de
Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja
criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por
cento do patrimônio ou da receita anual.
Pois bem.
A conduta de Silvio Costa Filho demonstra à saciedade que este é sujeito ativo do
ato de improbidade administrativa pelo uso reiterado de notas fiscais inidôneas para
fins de percepção da verba indenizatória pelo exercício de mandato.
O demandado, na qualidade de parlamentar municipal e por força do contido nos
artigos 1º e 2º da Lei nº 8.429/92, deve responder pelos atos de improbidade
administrativa praticados.
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Resta patente que, no campo delineado na Lei de Improbidade Administrativa, tal
conduta pode ser praticada por vereador (sujeito ativo) em detrimento da sua
Instituição – Câmara Municipal (sujeito passivo). Efetivamente a hipótese em tela.
Assente a pertinência subjetiva na presente contenda, cabe-‐‑nos demonstrar a
correspondência entre os atos acima descritos e os dispositivos legais delimitadores do
ato de improbidade administrativa. É o que se segue.
Da leitura do artigo 9º, inciso XI, têm-‐‑se que constitui ato de improbidade
administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem
patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou
atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente: XI -‐‑
incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores
integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei.
Sem muito esforço, observa-‐‑se a plena coincidência entre o citado dispositivo: ato de
improbidade administrativa consubstanciado em enriquecimento ilícito com o caso em
comento.
Sustenta Emerson Garcia7 que quatro são os elementos formadores do enriquecimento
ilícito sob a ótica da Improbidade Administrativa:
l O enriquecimento do agente;
l Que se trate de agente que ocupe cargo, mandato, função, emprego ou
atividade nas entidades elencadas no artigo 1º, ou mesmo o extraneus que
concorra para a prática do ato ou dele se beneficie;
l A ausência de justa causa, devendo se tratar de vantagem indevida, sem
qualquer correspondência com os subsídios ou vencimentos recebidos pelo
agente público;
l Relação de causalidade entre a vantagem indevida e o exercício do cargo.
Tais elementos estão efetivamente configurados na hipótese sob análise: o demandado
– agente político -‐‑ incorporou verba pública a seu patrimônio, com isto gerando o seu
7 Emerson Garcia, in Improbidade Administrativa, Lúmen Júris, 2ª Edição, 2004, página 270
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enriquecimento, não havendo justa causa para que ele dispusesse do referido
numerário e sendo certo que o seu acesso ao dito enriquecimento decorreu do exercício
do mandato, posto que, não sendo vereador, não obteria à Verba Indenizatória.
Neste ponto, cumpre evidenciar o significativo Acórdão do Tribunal Regional Federal
da 5ª Região acerca de hipótese similar a da presente demanda:
AC Nº 357235 -‐‑ RN (2002.84.00.005125-‐‑0)
APTE: MARCELINO DA SILVA ANDRADE
ADV: EDUARDO SERRANO DA ROCHA E OUTRO
APDO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
APDO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL CESAR CARVALHO
(CONVOCADO)
EMENTA
APELAÇÃO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART.
9º, XI, DA LEI N.º 8.429/92. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO
ADVINDO DA APROPRIAÇÃO DE VALORES AOS QUAIS SE
TEM ACESSO EM RAZÃO DO CARGO OCUPADO. ALEGADO
ESTADO DE NECESSIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO.
RESSARCIMENTO EFETUADO APENAS QUANDO
DESCOBERTO O ATO DE IMPROBIDADE. COMINAÇÃO DE
PENAS CUMULATIVAS TENDO EM CONTA O GRAU DE
CULPABILIDADE E REPROVABILIDADE DA CONDUTA.
OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E
PROPORCIONALIDADE. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS SEARAS
CRIMINAL E NÃO-‐‑CRIMINAL. VALOR DA MULTA FIXADO
DENTRO DO PERMISSIVO LEGAL ESCULPIDO PELO ART. 12,
III, DA LEI N.º 8.429/92. SENTENÇA QUE SE MANTÉM POR
SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO IMPROVIDO.
-‐‑ Funcionário público que, valendo-‐‑se do cargo ocupado, apropria-‐‑se de
montante do qual tinha posse pratica o ato de improbidade previsto pelo
art. 9º, XI, da Lei n.º 8.429/92.
-‐‑ Estado de necessidade não configurado por inexistência de provas do
perigo eminente aventado. Ademais, ainda que houvesse comprovação, a
existência de alternativas legais para saldar as supostas dívidas seria
evento apto a afastar o estado de necessidade nos moldes em que foi
sugerido.
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-‐‑ No caso dos autos, dadas as peculiaridades observadas, o grau de
culpabilidade do agente e de reprovabilidade do ato perpetrado,
consistente no enriquecimento ilícito, mais do que cabível a cominação
cumulativa de sanções, sendo irrelevante a resposta dada na seara
criminal.
-‐‑ A independência entre as searas criminal e não-‐‑criminal inviabiliza a
exigência de tratamento simétrico.
-‐‑ As penalidades aplicadas prestigiaram os princípios da razoabilidade e
proporcionalidade e não o contrário.
-‐‑ Sentença que se mantém por seus próprios fundamentos.
-‐‑ Apelação improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Primeira Turma do egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por
maioria, negar provimento à apelação, nos termos do voto do relator e
notas taquigráficas constantes dos autos, que integram o presente
julgado.
Recife, 06 de setembro de 2007 (data do julgamento).
DESEMBARGADOR FEDERAL CESAR CARVALHO
RELATOR (CONVOCADO).
Em outra mão, a ação perpetrada pelo demandado atentou contra os princípios da
legalidade, impessoalidade e da moralidade. Todos norteadores das atividades da
administração pública.
Segundo Celso Antonio Bandeira de Mello, “o princípio da legalidade explicita a
subordinação da atividade administrativa à lei e surge como decorrência natural da
indisponibilidade do interesse público, noção esta que, conforme foi visto, informa o
caráter da relação de administração”.
Em outra oportunidade, obtempera: “fora da lei, portanto, não há espaço para atuação
regular da Administração. Donde, todos os agentes do Executivo, desde o que lhe
ocupa a cúspede até o mais modesto dos servidores que detenha algum poder
decisório, hão de ter perante a lei -‐‑ para cumprirem corretamente seus misteres -‐‑ a
mesma humildade e a mesma obsequiosa reverência para com os desígnios
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normativos. É que todos exercem função administrativa, a dizer, função subalterna à
lei, ancilar -‐‑ que vem de ancilla, serva, escrava8.
Assim é que, ao agente político não é possível, ao seu bel prazer e sob o pretexto de se
ressarcir de gastos inerentes à função parlamentar, apropriar-‐‑se sem justa causa de
verbas públicas mediante o ardil consubstanciado na utilização sistemática de
documentos falsos para materializar uma despesa fictícia.
No caso concreto, é inafastável a desconformidade da conduta realizada com o
princípio constitucional acima invocado.
No tocante à impessoalidade, é oportuno relembrar a sempre valiosa lição de Hely
Lopes Meirelles, segundo a qual este princípio “referido na Constituição de 1988
(artigo 37, caput), nada mais é que o clássico princípio da finalidade, o qual impõe ao
administrador público que só pratique o ato para o seu fim legal. E o fim legal é
unicamente aquele que a norma de direito indica expressa ou virtualmente como
objetivo do ato, de forma impessoal” 9
No caso sob exame, é incontrastável que o referido parlamentar municipal, quando da
utilização de documentos falsos para a percepção da verba indenizatória, subverteu o
princípio da finalidade de modo a favorecer-‐‑se diretamente.
No tocante ao princípio da moralidade é necessário observar o ensinamento de
Maria Sylvia Zanella de Pietro no sentido em que “não é preciso penetrar na intenção
do agente, porque do próprio objeto resulta a imoralidade. Isto ocorre quando o
conteúdo de determinado ato contrariar o senso comum de honestidade,
retidão, equilíbrio, justiça, respeito à dignidade do ser humano, à boa-‐‑fé, ao
trabalho, à ética das instituições. A moralidade exige proporcionalidade entre os
meios e os fins a atingir; entre os sacrifícios impostos à coletividade e os benefícios por
ela auferidos; entre as vantagens usufruídas pelas autoridades públicas e os
encargos impostos à maioria dos cidadãos. Por isso mesmo, a imoralidade salta
aos olhos quando a Administração Pública é pródiga em despesas legais, porém
inúteis, como propaganda ou mordomia, quando a população precisa de assistência
médica, alimentação, moradia, segurança, educação, isso sem falar no mínimo
indispensável à existência digna. Não é preciso, para invalidar despesas desse tipo,
8
Celso Antonio Bandeira de Mello in “Desvio de Poder”, in RDP 89/24, p. 24. e “Discricionariedade e Controle
Jurisdicional”, Malheiros Editores, 2ª ed., 1993, p. 50.
9 Hely Lopes Meirelles. Direito Administrativo brasileiro, 21ª Edição, São Paulo, Malheiros, 1995,
página 82
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entrar na difícil análise dos fins que inspiraram a autoridade; o ato em si, o seu objeto,
o seu conteúdo, contraria a ética da instituição, afronta a norma de conduta aceita
como legítima pela coletividade administrada. Na aferição da imoralidade
administrativa, é essencial o princípio da razoabilidade10”.
À toda evidência que a conduta do demandado ofende ao senso comum de honestidade
e justiça do cidadão recifense trabalhador e pagador de seus impostos. Revela ainda
má fé escancarada na conduta do demandado e profundo desequilíbrio entre o seu
aproveitamento da res publica e o ônus imposto ao cidadão seja pela carga tributária,
seja pela ausência e ou deficiência na prestação de serviços próprios do ente municipal
em virtude da sempre recorrente limitação orçamentária.
Da Responsabilidade do Réu
Conforme expressa Emerson Garcia, o dolo necessário à configuração da improbidade
administrativa corresponde à vontade livre e consciente dirigida ao resultado ilícito11
Deste modo, observa-‐‑se pelo conjunto probatório que o demandado, consciente e
voluntariamente, aproveitou do exercício do mandato de vereador, para se apropriar
de verba pública: Verba Indenizatória instituída mediante a Lei Municipal nº
17.159/2005. Cumpre notar que as elementares de deslealdade e desonestidade
também estão presentes na conduta.
Assim é que temos os elementos necessários para o enquadramento da conduta
narrada no presente caso como ato de improbidade administrativa que importa em
enriquecimento ilícito e em desrespeito aos princípios que norteiam a Administração
Pública.
Do Dano Moral suportado pelo Poder Legislativo municipal e pelos
cidadãos recifenses
10
Maria Sylvia Zanella di Pietro, in Discricionariedade administrativa na Constituição de 1998. São Paulo, Atlas,
1991, pagina 111
11 Emerson Garcia, in Improbidade Administrativa, Editora Lumen Júris, 2ª Edição, página 296
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A apropriação indevida de recursos provenientes do pagamento de verba
indenizatória, indubitavelmente, constituiu uma inversão do exercício do mandato
parlamentar. Sem embargo, o interesse privado do demandado se sobrepôs ao interesse
público, o qual, repita-‐‑se, deve sempre nortear a atuação do ente público.
Indo além. A utilização de documentos fiscais inidôneos para justificar a percepção,
em sua integralidade, da dita verba revela um total descompromisso com aqueles que
o demandado deveria representar.
Em outra vertente, nunca é demais lembrar a dramática realidade dos serviços
públicos ofertados à população, os quais ainda se encontram distantes da meta de
universalidade prevista constitucionalmente nas áreas essenciais de saúde e educação,
sempre premidos pela reserva do possível conforme alegação eterna do Poder
Executivo quando acionado judicialmente a atendê-‐‑los.
Mais ainda. A ação deliberada de apropriação de recursos públicos engendrada pelo
demandado atingiu frontalmente a credibilidade do próprio Poder Legislativo
municipal. Vamos reconquistar o apoio do povo, fazer com que a sociedade acompanhe
os trabalhos da Câmara e compreenda o papel do Legislativo. [...] A Casa vai voltar a
ter a simpatia que merece. [...] Seremos transparentes não só com as contas, mas com
nosso trabalho: Estas foram as palavras do ex-‐‑Presidente da Câmara de Vereadores,
Múcio Magalhães, em entrevista ao Diário de Pernambuco (edição de 02 de fevereiro
de 2009), na qual enfatiza a árdua tarefa de reconstruir frente à população a imagem
da Câmara de Vereadores após a veiculação do Escândalo das Notas Frias.
Sem embargo, as conseqüências foram sentidas ainda no processo eleitoral de 2008,
no qual grande parte dos vereadores envolvidos no atos irregulares apurados através
da Auditoria Especial nº 0605226-‐‑5 não obteve a renovação do seu mandato. A
questão foi destacada na imprensa local, conforme se observa na matéria do Diário de
Pernambuco (edição de 06 de outubro de 2008)12.
Posto isto, resta patente que a imagem da Câmara Municipal restou maculada e que
os cidadãos recifenses tiveram que suportar intensa frustração em face do completo
desvirtuamento do exercício do mandato parlamentar por parte de um grupo de
vereadores, entre os quais o demandado.
12 Dos 26 atuais vereadores da capital que constam na auditoria do Tribunal de Contas como responsáveis
por um rombo de mais de R$ 1 milhão em emissão de notas fiscais frias, 14 foram reeleitos. Os doze restantes
foram derrotados nas urnas ou não lançaram candidatura. Diário de Pernambuco, 06/10/2008
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Em socorro a tal situação, têm-‐‑se no direito positivo o seguinte:
Orlando Gomes13 estabelece que a expressão dano moral deve ser reservada
exclusivamente para designar o agravo que não produz qualquer efeito patrimonial.
Será dano moral a lesão sofrida ao patrimônio ideal, em contraposição ao material.
Daí a necessidade de ressarcir, sendo cumuláveis os ressarcimentos por dano moral e
patrimonial oriundos do mesmo fato.
Yussef Said Cahali14 caracteriza o dano moral como a privação ou diminuição
daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a
tranqüilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade física, a honra. Diz que
há dano que afeta a parte social do patrimônio moral (honra) e o dano que diz respeito
a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza).
Em outro prisma, é oportuno observar que o atual Código Civil estabelece a reparação
do dano moral no seu artigo 186: aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência, violar direito ou causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Já a Constituição da República, em seu artigo 5º, V, assegura o direito de resposta,
proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.
Destaque-‐‑se que a reparação por dano moral pode se dar inclusive quando atingido os
ditos direitos e interesses difusos.
Como assenta Alberto Bittar Filho, consiste o dano moral coletivo na injusta lesão
da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, na violação antijurídica de um
determinado círculo de valores coletivos. Quando se fala em dano moral coletivo, está-‐‑
se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade
(maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente
injustificável do ponto de vista jurídico. Tal como se dá na seara do dano moral
individual, aqui também não há que se cogitar de prova da culpa, devendo-‐‑se
responsabilizar o agente pelo simples fato da violação (damnum in re ipsa).”
13 Orlando Gomes, in Direito das Obrigações, Rio de Janeiro, Forense, 12ª edição, 1990, n.195, pág. 332
14 Yussef Said Cahali, in Dano Moral, 2ª edição, São Paulo, Revista dos Tribunais, pág. 20
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Nesta linha, têm-‐‑se a oportuna análise do Procurador Regional da República, André
de Carvalho Santos, quando sustenta que é preciso sempre enfatizar o imenso dano
moral coletivo causado pelas agressões aos interesses transindividuais. Afeta-‐‑se a
boa-‐‑imagem da proteção legal a estes direitos e afeta-‐‑se a tranqüilidade do cidadão,
que se vê em verdadeira selva, onde a lei do mais forte impera. (...) Tal
intranqüilidade e sentimento de desapreço gerado pelos danos coletivos, justamente
por serem indivisíveis, acarreta lesão moral que também deve ser reparada
coletivamente. Ou será que alguém duvida que o cidadão brasileiro, a cada notícia de
lesão a seus direitos, não se vê desprestigiado e ofendido no seu sentimento de
pertencer a uma comunidade séria, onde as leis são cumpridas? A expressão popular o
Brasil é assim mesmo deveria sensibilizar todos os operadores do Direito sobre a
urgência na reparação do dano moral coletivo.15
Com acerto, Emerson Garcia sustenta que é indiscutível que determinados atos
podem diminuir o conceito da pessoa jurídica junto à coletividade, ainda que não haja
uma repercussão imediata sobre o seu patrimônio.16
Segundo Hugo Nigro Mazzilli, com a nova redação do caput do art. 1° da lei de ação
civil pública, hoje não só os danos patrimoniais, como os danos morais devem
expressamente ser objeto da ação de responsabilidade, devendo-‐‑se considerar todas as
conseqüências decorrentes da quebra da moralidade administrativa.
Nelson Nery Júnior afirma que muito embora o CDC 6° VI já preveja a possibilidade
de haver indenização do dano moral coletivo ou difuso, bem como sua cumulação com
o patrimonial (STJ 37), a LAT 88, modificando o caput da LACP 1°, deixou expressa
essa circunstância quanto aos danos difusos e coletivos, que são indenizáveis quer
sejam patrimoniais, quer sejam morais, permitida sua cumulação.
Enfrentando o tema, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu do
seguinte modo:
RECURSO ESPECIAL Nº 960.926 -‐‑ MG (2007⁄0066794-‐‑2)
RELATOR : MINISTRO CASTRO MEIRA
RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
15 André de Carvalho Santos, in “A ação civil pública e o dano moral coletivo” Direito do Consumidor,
vol. 25 – Ed. RT, pg. 83
16 Emerson Garcia, in Improbidade Administrativa, Editora Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2004, 2ª Edição,
página 470
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RECORRIDO : MANOEL FERREIRA BRANDÃO
ADVOGADO : MAURO JORGE DE PAULA BOMFIM E
OUTRO
RECORRIDO : SELMI JOSÉ RODRIGUES
ADVOGADO : RÚSVEL BELTRAME ROCHA E OUTRO
EMENTA
ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DANO
AO ERÁRIO. MULTA CIVIL. DANO MORAL. POSSIBILIDADE.
PRESCRIÇÃO.
(...)
3. Não há vedação legal ao entendimento de que cabem danos
morais em ações que discutam improbidade administrativa seja
pela frustração trazida pelo ato ímprobo na comunidade, seja pelo
desprestígio efetivo causado à entidade pública que dificulte a
ação estatal.
4. A aferição de tal dano deve ser feita no caso concreto com base em
análise detida das provas dos autos que comprovem efetivo dano à
coletividade, os quais ultrapassam a mera insatisfação com a atividade
administrativa.
5. Superado o tema da prescrição, devem os autos retornar à origem para
julgamento do mérito da apelação referente ao recorrido Selmi José
Rodrigues e quanto à ocorrência e mensuração de eventual dano moral
causado por ato de improbidade administrativa.
6. Recurso especial conhecido em parte e provido também em parte.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior
Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer parcialmente do recurso
e, nessa parte, dar-‐‑lhe parcial provimento nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator. Os Srs. Ministros Humberto Martins, Herman
Benjamin, Carlos Fernando Mathias (Juiz convocado do TRF 1ª Região) e
Eliana Calmon votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 18 de março de 2008 (data do julgamento).
Ministro Castro Meira Relator
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Destaca-‐‑se o seguinte trecho contido no voto do Relator:
“Esta Corte de Justiça pacificou a sua jurisprudência, reconhecendo a
possibilidade de dano moral contra a pessoa jurídica, nos termos da
Súmula 227, que assim preconiza:
'ʹA pessoa jurídica pode sofrer dano moral.'ʹ
Nada justifica a exclusão da pessoa jurídica de direito público, já que um
ato ímprobo pode gerar um descrédito, um desprestígio que pode acarretar
o desânimo dos agentes públicos e a descrença da população que,
inclusive, prejudique a consecução dos diversos fins da atividade da
Administração Pública, com repercussões na esfera econômica e
financeira.”
Ora, a ação empreendida pelo demandado promoveu incontrastavelmente uma
mácula na imagem da Câmara Municipal do Recife, a qual constitui verdadeiro dano
moral coletivo. E não se deve olvidar da frustração a qual foram submetidos os
cidadãos recifenses ao ver o poder legislativo municipal desvirtuado no cumprimento
de sua missão institucional.
Assim, havendo o dano moral coletivo, necessário se faz o seu ressarcimento, o qual,
conforme lição de Emerson Garcia, deverá ser feito com o arbitramento de numerário
compatível com a qualidade dos envolvidos, as circunstâncias da infração e a extensão
do dano.
DOS PEDIDOS
Ante todo o exposto, depois de autuada e recebida a presente petição inicial com os
documentos que a instruem (arts. 282/283 do Código de Processo Civil), requer o
Ministério Público a Vossa Excelência seja julgada procedente a presente ação para:
1. nos termos do artigo 12, I, da Lei nº 8.429/92, condenar o réu na suspensão
dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil e proibição
de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou
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creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa
jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos;
2. sucessivamente, na remota hipótese de não ser acolhido o pedido acima
formulado, nos termos do artigo 12, III, da Lei nº 8.429/92, condenar o réu
na suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa
civil de cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de
contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou
creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa
jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos;
3. condenar a ressarcir os danos morais suportados pela Cidade do Recife e seus
cidadãos mediante o pagamento de quantia não inferior a R$ 514.300,00
(quinhentos e catorze mil e trezentos reais).
Seja o valor relativo à multa civil destinados aos cofres da Fazenda da Cidade do
Recife.
Dos Requerimentos Finais
Como medida de ordem processual, requer a notificação e posterior citação para que,
querendo, apresente resposta, no prazo legal, sob pena de presumirem-‐‑se verdadeiros
os fatos ora alegados (art. 17 da Lei n. 8.429/1992) do demandado:
Silvio Serafim da Costa Filho, residente na Rua Vigário Barreto, 127,
apartamento 3201, Edf. Barreto Costa, Espinheiro, Recife, PE; e
A intimação do Município do Recife, na pessoa do seu Procurador-‐‑Chefe, para que,
querendo, intervenha nos presentes autos;
Requer, por derradeiro:
O recebimento da presente ação sob o rito ordinário;
Isenção de custas, emolumentos, honorários e outras despesas na conformidade do que
dispõe o artigo 18 da LACP;
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Condenação do Réu no pagamento das custas processuais, honorários advocatícios,
estes calculados à base de 20% (vinte por cento) sobre o valor total da condenação e
demais cominações de direito decorrentes da sucumbência;
A produção de todos os meios de prova em direito permitidos.
Dá à causa o valor de R$ 514.300,00 (quinhentos e catorze mil e trezentos reais).
Nestes Termos
P. Deferimento
Recife, 12 de janeiro de 2012.
Charles Hamilton Santos Lucila Varejão Dias
Lima Martins
26º Promotor de Justiça de Defesa da 15ª Promotora de Justiça de Defesa da
Cidadania da Capital Cidadania da Capital
Ana Joêmia Marques da Rocha
14ª Promotora de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital
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