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De: Daniel Tobias Athias 1 GCA <dta@gcalaw.com.br>
Enviado em: quinta-feira, 30 de julho de 2020 21:03
Para: Protocolo
Cc: Ricardo Motta 1 GCA; Leonor Cordovil 1 GCA; Lívia Dias de Meio 1 GCA;
Mariana Mello Henriques 1 GCA
Assunto: [Protocolo] [Representação] [Versão Pública] Inquérito Administrativo n.
08700.003599/2018-95
Anexos: MB - Representação 2020.07.30 #V. Pública.pdf
Prezados(as), boa noite
Fazemos referência ao Inquérito Administrativo n. 08700.003599/2018-95.
Solicitamos, em nome do Mercado Bitcoin Serviços Digitais Ltda., o protocolo da Representação anexa.
Essa versão deve ser autuada em apartado de acesso público.
Atenciosamente,
Daniel
Daniel Tobias Athias
dta@gcalaw.com.br AI. Santos, 787, 80 andar
+55 11 3371 5050 São Paulo, Brasil
+55 11 3371 5059 01419-001
CRINBERC CORDOVIL 10
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não é o destinatário desta mensagem, você deve deletá-la, Qualquer divulgação, cópia ou distribuição desta mensagem é estritamente proibida.
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prohibited.
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VERSÃO PÚBLICA
ILMO. SR. ALEXANDRE CORDEIRO MACEDO, SUPERINTENDENTE-GERAL DO
CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA DO MINISTÉRIO DA
JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA - CADE/MJ
Inquérito Administrativo n. 08700.003599/2018-95
MERCADO BITCOIN SERVIÇOS DIGITAIS LTDA., ("Mercado
Bitcoin" ou "Representante"), com sede na Rua Fidêncio Ramos, n. 302, Torre B,
unidades 81 e 83, Vila Olímpia, São Paulo/SP, CEP 04551-010 e inscrita no CNPJ/MF sob
o n. 18.213.434/0001-35, vem, por seus advogados infra-assinados, apresentar
REPRESENTAÇÃO em face de (1) ITAÚ UNIBANCO S.A. ("Itaú") inscrito no CNPJ/MF
sob o n. 60.701.190/0001-04, com sede na Pç. Alfredo Egydio S. Aranha, n. 100, Torre
Olavo Setubal, Parque Jabaquara, São Paulo/SP, CEP 04344-902; (II) BANCO
SANTANDER (BRASIL) S.A. ("Santander") inscrito no CNPJ/MF sob o n.
90.400.888/0001-42, com sede na Av. Presidente Juscelino Kubitschek, n. 2.235, São
Paulo/SP, CEP 04543-011; (III) BANCO BRADESCO S.A. ("Bradesco") inscrito no
CNPJ/MF sob o n. 60.746.948/0001-12, com sede no Núcleo Cidade de Deus, Prédio
Vermelho - 40 andar, Vila Vara, Osasco/SP, CEP 6029-900; (IV) BANCO DO BRASIL S.A.
("Banco do Brasil") inscrito no CNPJ/MF sob o n. 00.000.000/0001-91, com sede na
SAUN Qd 5, Lt B, Torre Norte, Ed BB, 160 andar - Ala Leste - Setor de Autarquias, Asa
Norte, Brasília/DE, CEP 70040-912; (V) COOPERATIVA DE CRÉDITO CLÁSSICA DO
ESTADO DO RIO DE JANEIRO ("Sicoob") inscrita no CNPJ/MF sob o n.
04.120.633/0001-94, com sede na Av. das Américas, n. 3500, Bloco 2 - Grupo 204, Rio de
Janeiro/Ri, CEP 22640-102; e (VI) CAIXA ECONÔMICA FEDERAL ("Caixa") inscrita no
CNPJ/MF sob o n. 00.360.305/0001-04, com sede no SBS, Quadra 04, Lote 3/4, Bloco A,
Asa Sul, Brasília/DF, CEP 70092-900 (conjuntamente denominados "Representados"),
AI. Santos, 787, 80 andar, SP, Brasil +55 11 3371 5050 gcataw.com.br
VERSÃO PÚBLICA
feita em adesão à Representação apresentada pela Associação Brasileira de
Criptomoedas e BLockchain (ABCB), número em epígrafe, por violação ao artigo 36,
incisos 1, II e IV, e §30, incisos III, IV, V e XI da Lei n. 12.529/2011, pelas razões de fato e
de direito a seguir expostas.
Requer-se, com base no disposto nos artigos 51 a 53 do Regimento Interno do Cade,
seja concedido ACESSO RESTRITO apenas ao Mercado Bitcotn e ao Cade aos trechos
indicados como tal na presente petição, uma vez que contêm segredos de empresa que,
se revelados, podem distorcer a concorrência ou prejudicar o Mercado Bitcoin. A fim de
garantir que terceiros não tenham acesso a tais informações, requer-se que essa versão
de acesso restrito seja autuada em apartado.
1. A decisão do Tribunal do Cade, em sessão realizada no dia 20 de maio
de 2020, determinou a continuidade das investigações em sede de inquérito
administrativo, com o envio de ofício a diversas autoridades, como a CVM e o Bacen,
bem como aos Representados, para obtenção de informações adicionais com relação (i)
à efetiva concorrência entre criptomoedas e os bancos Representados, (ii) aos riscos
inerentes da atividade de criptomoedas e (!li) outras implicações regulatórias.
2. A decisão da Superintendência-Geral do Cade ("SG/Cade") que
arquivou o procedimento preparatório se baseou em duas premissas basilares, das quais
decorrem toda a análise para a conclusão pela inexistência de conduta anticompetitiva.
Em primeiro lugar, a SG/Cade entendeu que não existiria concorrência, efetiva ou
potencial, entre as criptomoedas e demais ativos financeiros que pudesse justificar uma
eventual racionalidade da conduta dos bancos em recusar a abertura de contas correntes
(ou fechar as existentes) para as corretoras de criptomoedas. Em segundo lugar, a
SG/Cade entendeu que as características inerentes às criptomoedas implicam risco de
cometimento de crimes como fraudes, lavagem de dinheiro e até pirâmides.
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VERSÃO PÚBLICA
3. Com todo o respeito à decisão dessa SG/Cade, ambas as premissas
estão factualmente erradas. Uma análise mais detalhada da tecnologia por detrás das
criptomoedas, bem como das justificativas que ensejaram a sua criação já consegue
apontar os equívocos das manifestações e respostas dos bancos, sobre as quais a
SG/Cade se pautou na análise. As informações trazidas abaixo também demonstram a
ausência de comprovação das justificativas apresentadas para a conduta.
4. Com relação à primeira premissa, a SG/Cade afastou a concorrência
entre corretoras de criptomoedas e os bancos em virtude de um suposto grau de
Incerteza decorrente da ausência de regulamentação do uso de criptomoedas no Brasil.
A justificativa apontada, no entanto, contradiz o próprio padrão anteriormente aplicado
no caso Uber vs. Taxis', em que o Cade reconheceu que a inexistência de regulação do
transporte de aplicativos não seria suficiente para afastar a concorrência com o serviço
regulamentado de táxis, muito embora esse último tivesse regramentos, custos e
imposições legais completamente distintos. Na ocasião, o Cade acertadamente
reconheceu que a regulação não deve ser um impeditivo para a detecção de
concorrência entre serviços ou produtos. O entendimento contrário expõe o setor de
criptomoedas à um vácuo antitruste não previsto pela legislação concorrencial brasileira.
S. As criptomoedas oferecem (e nasceram com o propósito de oferecer)
um meio alternativo para efetivação de pagamentos, realização de transações
(comerciais e peer-to-peei), bem como uma nova opção de investimento. Esse sistema
alternativo é uma inovação em relação aos serviços oferecidos pelos bancos,
proporcionando alternativas mais baratas e tão confiáveis quanto aos consumidores -
apesar dos infundados argumentos trazidos pelos bancos a esse respeito.
6. Aliás, algumas das características-base das transações envolvendo
criptomoedas, existentes desde a sua concepção, também estão sendo introduzidas no
mercado bancário tradicional. É esse o caso, por exemplo, da rapidez e flexibilização das
transações, que podem ser feitas a qualquer momento (24h / 7 dias por semana) e a
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Processo Administrativo n. 08700.006964/2015-71.
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VERSÃO PÚBLICA
interação direta entre usuários. A esse respeito, o sistema Pix, anunciado pelo Bacen, visa
justamente baratear as taxas de transferência, permitindo pagamentos a qualquer dia e
horário de forma instantânea, com características peer-to-peer
7. Note-se que não se trata unicamente de uma concorrência entre
corretoras de criptomoedas e bancos, mas do próprio sistema de funcionamento das
criptomoedas, que compete com os serviços bancários tradicionais. As criptomoedas
oferecem concorrência efetiva e proporcionam uma oferta alternativa aos mesmos
serviços dos bancos, competindo também por recursos de correntistas a título de
Investimento. Há diversas evidências nos autos que confirmam a concorrência entre
criptomoedas e o setor bancário, tais como:
a. Existem inúmeros exemplos do setor tradicional atuando com
criptomoedas ou sua tecnologia-base, a blockchain, com autoridades
estrangeiras reconhecendo a legalidade da atividade e a convivência
harmoniosa entre ambos os sistemas.
b. Os consumidores brasileiros possuem acesso a diversos fundos
de investimento para aplicarem seus recursos em criptoativos, tal como,
por exemplo, fundo ofertado pelo BTG Pactuat (também disponível na
plataforma da XP Investimentos, da qual o Itaú é o principal acionista).
C. O setor cripto, por meio da tokenização de ativos reais (e.g.,
precatórios, cotas de consórcio contemplado e Ouro), está aumentando
o mercado de interessados em investir nesses instrumentos ao baratear
o acesso ao ativo, reduzindo aplicações para quantias ínfimas (e.g.,
R$100 reais).
d. As corretoras estão se bancarizando, oferecendo contas digitais
gratuitas aos seus usuários, que oferecerão cartões, serviços de
pagamento de boletos e saques, tudo isso a partir dos (com Lastro em)
criptoativos - ou seja, há uma convergência de serviços entre corretoras
e bancos.
8. No que diz respeito à segunda premissa adotada pela SG/Cade, há um
equívoco fundamental quanto à utilização de criptomoedas. É obviamente interessante
aos bancos incutira ideia de que as criptomoedas seriam Largamente utilizadas para fins
ilícitos. Não há evidências, no entanto, a esse respeito. Os bancos utilizam-se de notícias
de jornais para tentar criar um cenário de completa ilegalidade. Estudos indicam baixo
indício de uso de criptomoedas para lavagem de valores de origem ilícita (sendo o
sistema tradicional de transmissão de riquezas a melhor escolha para o cometimento de
crimes).
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VERSÃO PÚBLICA
9. A presunção de ilicitude aplicada às criptomoedas e,
consequentemente, às atividades de corretagem é incabível. Essa presunção decorre de
uma visão deturpada, lastreada em exemplos esparsos de ilícitos praticados com essa
moeda (sendo que ilícitos também são enfrentados por bancos) e o desconhecimento
da tecnologia-base da atividade. Pelo contrário, as características da tecnologia e os
mecanismos de segurança implementados pelas corretoras são eficazes e capazes de
detectar transações suspeitas. O Mercado Bitcoin, por exemplo, possui e aplica diversas
camadas de segurança que lhe permite rastrear e identificar beneficiários de uma
transação.
10. Há ferramentas aplicadas para monitorar transações e o próprio
Mercado Bitcoin possui registro na plataforma do COAF para reportar casos suspeitos,
além de atuar em conjunto com bancos no combate à lavagem de dinheiro. As diversas
medidas adotadas pelo Mercado Bitcoin não delegam ou transferem, em nenhuma
instância, a responsabilidade para os bancos. Por essa razão, a principal justificativa
apresentada pelos bancos, de uma suposta precaução no que tange à medidas de
prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento de terrorismo ("PLD/FT"), não se
sustenta. A aplicação de regra genérica e indiscriminada de encerramento e/ou recusa
de abertura de contas a um setor inteiro é indício claro de conduta anticompetitiva, pois
os próprios bancos já reconheceram que há p/ayersno mercado que adotam medidas
adequadas de monitoramento.
11. Dado que o setor cripto oferece pressão competitiva e que as
justificativas apontadas não se aplicam, é nítido que os bancos atuam de forma
propositalmente exclusionária, criando barreiras desnecessárias para o exercício de
atividade econômica. Os bancos têm incentivos para adotar a conduta, pois querem
estancar a migração de consumidores para outro sistema, sendo que no Brasil 18% dos
consumidores indicam ter criptomoedas, o segundo maior índice no mundo'.
2
https://www.forbes.com/sites/ronshevliri/2020/07/27/the-coronavirus-cryptocurrency-craze-whos-
behind-the- bitcoin-buying-binge/#4883c9752abf
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VERSÃO PÚBLICA
12. A conduta dos bancos não configura mero inconveniente solucionável
por uma única conta corrente. Há sinais claros de que a conduta está se disseminando
para bancos menores - com características de fol/ow the leader. Aliás, o fato de que
bancos com menor poder de mercado não implementaram a conduta logo de início, e
apenas passaram a adotar conduta semelhante após o efetivo fechamento por parte dos
incumbentes é uma evidência significativa da existência da conduta - sendo necessária
a atuação da autoridade concorrência ante o potencial de fechamento de mercado.
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VERSÃO PÚBLICA
1. As CONTAS BANCÁRIAS DO MERCADO BITCOIN QUE FORAM ENCERRADAS PELOS BANCOS
13. A partir de meados de 2015, o Mercado Bitcoin passou a receber
notificações dos principais bancos do país, dos quais era cliente, informando o
encerramento de suas contas correntes sem qualquer justificativa ou motivação
aparente. Outros bancos, para os quais o Mercado Bitcoin solicitou a abertura de conta,
simplesmente recusaram tê-lo como cliente, também não apresentando qualquer
justificativa plausível para a recusa.
14. Foram recebidas notificações dos seguintes bancos: (i) Itaú, em
17.06.2015, informando o encerramento em razão de "desinteresse comercial" (Doc. 01
- Acesso Restrito); (ii) Santander, em 04.12.2017, informando o enceramento em razão
de "desinteresse comercial" (Doc. 02 - Acesso restrito); (iii) Banco do Brasil, em
28.02.2018, informando o encerramento em razão de supostas irregularidades, ocasião
em que também foram encerradas contas dos sócios do Mercado Bitcoin (Doc. 03 -
Acesso restrito); (iv) Sicoob - Empresas Ri, em 07.05.2018 (Doc. 04 - Acesso restrito); e
(v) Caixa Econômica Federal, em 16.12.2015 (Doc. 05 - Acesso restrito). O Mercado
Bitcoin tentou abrir conta no (vi) Bradesco ao longo de 2017, tendo sido realizadas
diversas reuniões e contatos com o banco, havendo, porém, recusa de abertura sem
justificativa ou motivação aparente3.
15. O Mercado Bitcoin ingressou em juízo solicitando a reabertura das
contas correntes, sendo que esses processos se encontram em estágios distintos no
Poder Judiciário. Muito embora quase todos eles já tenham tido alguma decisão judicial,
a grande maioria dessas decisões se limita a escrutinar a conduta sob enquadramento
unicamente privado-contratual, ignorando os aspectos públicos e os impactos
concorrenciais que a conduta desses bancos causou e tem causado.
Atualmente, o Mercado Bitcoin opera principalmente por meio de contas bancárias precárias (Le, ativas por
força de decisão judicial), o que reforça o risco de danos ainda mais graves para a concorrência caso essa d.
SG não decida revisar os fundamentos da decisão que determinaram o arquivamento do inquérito
administrativo. Esse cenário é também replicável para outras corretoras.
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VERSÃO PÚBLICA
16. Para conhecimento da SG/Cade, e atualização em relação à resposta
oferecida ao Ofício n. 4.730/2018, apresenta-se abaixo dados das ações movidas pelo
Mercado Bitcoin:
PROCESSO N. RÉU FORO
1066603-10.2015.8.26.0100 Itaú Unibanco TJ/SP
1126743-39.2017.8.26.0100 Santander TJ/SP
1034225-93.2018.8.26.0100 Banco do Brasil TJ/SP
0022561-41.2018.8.19.0209 Sicoob TJ/RJ
0000055-03.2016.4.03.6100 Caixa JF/SP
17. Como informado nos autos desse inquérito administrativo, diversas
outras corretoras tiveram suas contas encerradas e ajuizaram ações pedindo a
reabertura, o que demonstra uma conduta generalizada por parte dos maiores bancos
brasileiros para inviabitizar a atividade das corretoras que transacionam esse tipo de
ativo financeiro.
18. O que causa maior espanto é que não foram encerradas apenas as
contas corporativas, mas também as contas dos sócios e diretores de diversas corretoras
de criptomoedas, inclusive o Mercado Bitcoin. Ora, se os bancos alegam que o
encerramento das contas das corretoras era justificável por questões atreladas à PLD/FT,
qual a razão para esse encerramento indiscriminado contra administradores de uma
empresa? Aproxima-se muito mais de uma tentativa de retaliação para prejudicar
pessoas físicas criadoras de concorrência do que propriamente uma preocupação com
uma pessoa jurídica.
19. Muito embora a decisão dessa SG/Cade tenha sido pelo arquivamento
da investigação e esse inquérito subsista por determinação do Tribunal do Cade, que
entendeu cabível a realização de diligências adicionais, o Mercado Bitcoin entende que
alguns detalhes escaparam da análise inicial da SG e que uma compreensão melhor do
mercado, da inovação tecnológica que envolve as criptomoedas, da alternativa que essa
SEI 0539128
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tecnologia oferece para os usuários e os impactos disso para o mercado financeiro
tradicional é importante para que se possa melhor desenhar a lógica subjacente à
conduta dos bancos e os efeitos anticompetitivos da prática.
H. As CRIPTOMOEDAS NASCERAM COMO UMA INOVAÇÃO QUE TEM POR FINALIDADE
TRANSFORMAR A FORMA DE PAGAMENTO, A REALIZAÇÃO DE TRANSAÇÕES E CRIAR ALTERNATIVAS
DE INVESTIMENTOS
20. As criptomoedas foram criadas usando como base a tecnologia de
blockchain, que compreende um bloco ou lista de informações crescentes e públicas,
registradas com base em criptografia. Cada bloco de informação é interligado com o
bloco anterior, contendo a identificação e um link acesso, bem como o registro da
transação, código das carteiras (quem enviou e quem recebeu), data e hora. Esse sistema
de registro (cadeia de blocos) é um livro aberto, público, verificável e permanente. Uma
vez registrada, a transação passa a ser verificável por qualquer pessoa e, em regra, não
pode mais ser alterada (permanente).
21. Pela complexidade do seu registro em criptografia, as criptomoedas
oferecem a confiabilidade sobre o ativo e, pela simplicidade de operação, as
criptomoedas permitem a desburocratização em relação ao sistema financeiro
tradicional, já que todo o registro desses ativos é feito publicamente e não conta com
um emaranhado de instituições que controlam essas operações. A consequência é que
esse sistema oferece uma redução significativa de custos para os usuários, pois prescinde
da necessidade de uma conta corrente em uma instituição financeira e, com isso,
também dispensa a cobrança de valores de manutenção de contas e pacotes de serviços
básicos, além das taxas de administração de investimentos. Por essas características, as
criptomoedas viabilizam uma forma confiável, imutável e fácil para a realização de
transações entre partes.
22. As criptomoedas oferecem, com isso, uma alternativa adicional (mais
barata e tão confiável quanto) às transações e serviços normalmente oferecidos pelos
bancos. Por exemplo, ao invés de realizar uma TED / DOC para pagamento de uma
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VERSÃO PÚBLICA
transação, ou ao invés de efetuar o pagamento de um boleto, as partes podem
convencionar que o pagamento seja realizado por meio de uma transação envolvendo
bitcoins. Nesse sentido, com poucos diques (ou por meio de aplicativo no celular), duas
partes podem facilmente realizar uma transação, que pode ir desde a compra e venda
de um doce até a aquisição de um bem imóvel.
23. A segurança dessa operação é garantida por meio de um registro
publicamente acessível e imutável, protegido por criptografia virtualmente 'inquebrável'.
Considerando o exemplo acima, não é apenas o imóvel que fica registrado publicamente,
mas também a transação financeira; ambas as informações ficam garantidas pelo
registro público da tecnologia do blockchain. Pela segurança que esse sistema oferece,
muitas empresas, e órgãos de governo no mundo inteiro já estudam formas de
armazenar registros com base nessa tecnologia.
24. Por essa mesma razão, as criptomoedas também se tornaram uma
forma de as pessoas 'guardarem dinheiro' e acumularem bens. A tecnologia do
blockchain permite que a mesma quantia que alguém poderia guardar em um banco
fique acumulada em, por exemplo, bitcoins. Com isso, os bitcoins tornaram-se uma
forma relevante de investimento, abrindo-se, assim, um novo mercado de investimento
- que cada vez mais passa a ser regulamentado inclusive para compra de títulos de
fundos de investimento.
25. A utilização de criptomoedas também oferece uma possibilidade ainda
mais ampla para a interação direta entre usuários (pessoas físicas e estabelecimentos).
Como destacado pelo Prof. Pauto Furquim5: " Criptomoedas ou, maneira mais geral,
criptoativos, permitem transações de compra e venda de bens e serviços, além da
transferência de valores pela Internet, sem a necessidade de taxas comumente cobradas
por instituições financeiras e bancárias. A ideia fundamental é facilitar a transações
diretas entre investidores (peer-to-peerJ'.
Parecer do Prof. Paulo Furquim juntado nos autos do IA 08700.003599/2018-95 (SEI 0605107).
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VERSÃO PÚBLICA
26. Em suma, é possível dizer que a utilização de criptomoedas (e
criptoativos como um todo) oferece: (i) rapidez e flexibilização das transações, que
podem ser realizadas instantaneamente entre agentes e em qualquer horário; (ii)
descentralização das operações, pois há dispensa de agente validador central das
operações (função geralmente executada por bancos em sistema centralizado); e (iv) um
registro amplo e público de todas as transações, bens e/ou direitos negociados por meio
da tecnologia blockchain6 .
27. Sobre a rapidez e flexibilidade, é justamente a possibilidade de realizar
transações 24 horas por dia, 7 dias por semana, que torna ainda mais atrativa e valiosa
a utilização de criptomoedas. Curiosamente, algumas dessas características, introduzidas
há anos pelo segmento cripto, vêm sendo ora anunciadas para o setor tradicional como
inéditas e como necessárias para introduzir mais concorrência no setor bancário. É
exatamente o que pretende o Banco Central ao inaugurar recentemente o novo sistema
de meio de pagamento, forçando o setor bancário a adotar tecnologias inovadoras e
benéficas aos consumidores.
28. O Banco Central como parte da sua agenda BC#, vem defendendo a
adoção e avanço de pagamentos instantâneos entre usuários como ponto central do
pilar de inovação'. Um dos principais projetos dessa agenda é o lançamento do Pix8, um
novo meio de pagamento que barateia os valores de taxas para transferências, e permite
que pagamentos sejam instantâneos e realizados a qualquer dia e horário. Em breve as
transferências/pagamentos poderão ser realizados inclusive por meio de QR Code,
reforçando o caráter peer-to-peer.
6
Ao analisar textos sobre criptomoedas é usual verificar a replicação de equívocos e desconhecimento sobre
o ativo no que tange a suposta confidencialidade e anonimato. criptomoedas são, na realidade,
pseudoanônimas, pois a tecnologia blockchain armazena dados de todas as transações efetuadas com
determinada unidade de moeda, contendo datas, valores e endereços nesse registro público. A partir do
número de carteira de usuários e possível ter acesso quase que irrestrito a movimentação financeira de
determinado agente, pois essas informações são públicas.
Vide slide 20 de apresentação do Bacen disponível em: https://www.bcb.qov.br/conteudo/home-
ptbr/TextosApresentacoes/ppt_balanco aqenda_bc 201 9.pdf.
8 Vide apresentação institucional do Bacen disponível em:
https://www.bcb.gov.br/content/estabilidadefinanceira/foru mpireunioes/Pix.pdf.
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VERSÃO PÚBLICA
29. Isso é, o Pix, com tecnologias ditas inéditas, parte justamente das
características base do setor cripto introduzidas na sua concepção. Ou seja, a inovação
pretendida pelo setor tradicional já é há muito defendida, implantada e difundida pelo
setor cripto.
30. Outro ponto essencial do setor cripto é a criação de novos ativos
digitais de investimento por meio de tokens. A tokeni.zação é um processo de utilizar
tokens digitais criptográficos para representar a propriedade de um determinado bem
e/ou direito. Os tokens podem representar ativos tangíveis (imóveis, precatórios, metais
preciosos), instrumentos financeiros (ações, títulos, fundos), propriedade intelectual e
outros ativos intangíveis, sujeitos à regulação de cada país'. Cada token pode
representar, e.g., uma porcentagem daquele ativo.10
31. A título de exemplo, é possível, por meio da tokenização, dividir um
precatório judicial avaliado em R$3 milhões em 30.000 tokens de 100 reais, as quais
poderão ser então adquiridas pelos usuários na plataforma do Mercado Bitcoin. O
procedimento, de dividir um ativo de valor elevado em várias parcelas menores - sendo
que não há limite para a emissão de tokens de valor unitário - torna o mercado de
potenciais interessados significativamente mais amplo, pois qualquer pessoa, ainda que
com valor baixo, pode participar nesse segmento. A redução de custo significa que o
interessado não teria de adquirir um ativo inteiro, de valor inacessível para grande parte
da população, para receber exposição ao ativo, podendo adquirir parcelas menores".
32. As empresas que atuam com criptoativos vêm avançando na
introdução desses novos produtos e oferecendo diversas opções aos seus clientes para
O Mercado Bitcoin informa que somente atua na tokenização de ativos específicos e não regulados, mas
destaca que, em tese, ativos financeiros também podem ser tokenizados.
10
https://b[og.mercadobitcoin.com.br/o-que-e-tokenizacao
11 "Esse processo tem algumas vantagens - tanto para os detentores dos ativos quanto para investidores.
Para os detentores dos ativos, existe um aumento de liquidez. Quando falamos em ativos de alto valor, a
sua conversão rápida e justa em dinheiro pode ser difícil. Podemos usar precatórios como exemplo - se a
pessoa tem um precatório de R$ 1 milhão e deseja vender, o mercado é muito restrito e ela vai se deparar
com um grande desconto sobre o valor de face e provavelmente receber menos da metade do valor.
Contudo, se tokenizamos um ativo alternativo em milhares de tokens de baixo valor unitário, o mercado se
torna mais amplo, e o desconto exigido para venda, menor", cf. https://b[og.mercadobitcoin.com.br/o-gue-
e-tokenizacao
12
gcataw.com.br GCA
VERSÃO PÚBLICA
fins de democratização a ativos que antes eram exclusivos a grandes instituições
financeiras ou agentes especializados. O Mercado Bitcoin, por exemplo, oferece tokens
de precatórios e de cotas de consórcio já contemplado, bem como listará, a partir de
03/08, token ligado a ouro em sua plataforma12. No caso dos precatórios, esse é um ativo
de alto retorno potencial, quando comparado a aplicações tradicionai513, pois os tokens
que foram negociados em 2019, por exemplo, tiveram retornos de 16 a 23% ao ano, com
compras mínimas baixíssimas de R$100. Com a mínima necessidade de capital para
exposição a esses tipos de ativos, a tecnologia combinada com um modelo de negócios
inovador, possibilita mais uma disrupção à atividade previamente explorada de forma
praticamente exclusiva pelas instituições financeiras e grandes fundos de investimento
restrito a investidores qualificados ou profissionais
33. Essa inovação também representa vantagem clara para o proprietário
do ativo, pois, com a utilização da tecnologia blockchain, o mesmo tem autonomia para
negociar os tokens representativos de um ativo real da forma, e na medida, que achar
mais adequada. Assim ao se tokenizar um precatório ou cota de consórcio, é possível
que o proprietário decida vender apenas uma parcela do ativo total e, ainda, definir o
desconto que está disposto a aplicar apenas nessa parte específica do ativo. Dessa forma,
não apenas os clientes do varejo conseguem acessar um ativo antes restrito às carteiras
de grandes bancos, como também o proprietário do ativo alvo da tokenização consegue
negociar descontos mais justos para venda de seu ativo. Isso marca uma possibilidade
de mudança significativa no setor, já que, tipicamente, esses proprietários de ativos são
agressivamente explorados pelas instituições financeiras na negociação, além de, em
regra, serem obrigados a vender a totalidade do ativo, não apenas a fração que precise
para cobrir eventual necessidade de capital.
34. Com a utilização da tecnologia de registro imutável, rastreável e
transparente para representar digitalmente um ativo real ou tangível, é possível, por
12 https://valor.g[obo.com/financas/noticia/2020/07/29/mercado-bitcoin-vai-listar-token-liqado-a-
ouro.ghtml
13 Em comparação à rentabilidade média oferecida para títulos de emissão de instituição financeira (como
Certificado de Depósito Bancário - CDB) para prazos equivalentes.
13
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exemplo, registrar atributos essenciais da oportunidade de negociação e ter confiança
de que eles não poderão ser alterados com o decorrer do tempo. No caso de um
precatório já tokeni.zado14, encontra-se com essa característica de imutabilidade, por
exemplo, informações como o (i) estoque total de ativos digitais emitidos (totalSupply);
e (ii) o identificador único (hash) do documento eletrônico que contém os detalhes
financeiros de uma determinada oportunidade (hashDetalhesFinanceiros); isso significa
que, se for alterado algum dado financeiro desse documento (possivelmente, até mesmo
em sentido contrário aos interesses do comprador do ativo digital), qualquer pessoa no
mundo consegue visualizar essa alteração, contrastar com a versão original e questionar
essa alteração, trazendo um nível de accountability possivelmente inédito no mercado
financeiro global.
35. Outro segmento potencialmente afetado por essas novas tecnologias
e, tradicionalmente, restrito à atuação de instituições financeiras (ou empresas do grupo
econômico) é o de registro e custódia. No caso de criptoativos emitidos de forma
descentralizada (como o bitcoi.n), a partir da venda desse ativo digital pelo titular original
a novo titular, o agente gerador do token pode não ter mais ingerência sobre o token
criado, nos casos em que tal criptoativo já tenha sido transferido para carteira digital
(wallet) de seu novo titular, sendo que, nesse caso, sua circulação seria possível apenas
por comando de seu novo titular. Assim, a atividade do agente gerador se aproximaria
da atividade de custódia prestada em favor do titular (emissor) do ativo de que trata a
Instrução CVM n° 542, de 20 de dezembro de 2013 ("Instrução CVM 542").
36. De forma contrária, é igualmente possível que o ativo digital
transferido a novo titular permaneça em carteira digital (wallet) administrada pelo
agente gerador do criptoativo, caso que se assemelha tanto com a atividade de
escrituração de que trata a Instrução CVM 543 como com a atividade de custódia de que
trata a Instrução CVM 542. Dessa forma, pode-se afirmar que a atividade de geração de
ativos digitais congrega tanto características típicas da escrituração, como atividades
típicas da custódia. Com esse manifesto uso potencial da tecnologia para modernizar e
14 Para um exemplo de atributos registrados em blockchain:
https://etherscari.io/dapp/0x399501d64a25e424eebfea01 b1 2b33441621 5ded#readcontract
14
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tornar mais eficiente o processo de custódia e registro de ativos, atividade exercida
tipicamente por empresas ligadas aos grandes grupos econômicos bancários no Brasil,
é compreensível o incentivo destes agentes para coibir o desenvolvimento das referidas
tecnologias.
37. Vale ressaltar que esse incentivo das instituições financeiras em coibir
o desenvolvimento da inovação é ainda mais intensificado em razão do potencial de
crescimento exponencial do uso dessa tecnologia, decorrente principalmente da
migração de estruturas-legado para novos arranjos jurídicos e tecnológicos. Como bem
destacado em relatório intitulado 'Buiíd Block(chain)s for a Better PIanef, o World
Economfc Forum trouxe à tona a possibilidade de até 10% do PIB global estar
representado em tecnologias de registro distribuído até 202515.
38. Esses serviços nada mais são do que alternativas que surgiram aos
produtos e meios de pagamento já oferecidos pelo setor bancário. O benefício dessa
concorrência é claramente apropriado pelos consumidores, que possuem opções
adicionais àquelas existentes. O benefício dessa concorrência e da introdução de novas
tecnologias também incrementa o próprio setor bancário. O prejuízo decorrente do
encerramento e/ou recusa de abertura de contas, portanto, não é apenas limitado a um
número reduzido de empresas de corretagem de criptomoedas, mas todo um setor de
mercado que oferece opções relevantes de investimento para consumidores,
principalmente a partir de valores módicos, em comparação ao que é exigido, por
exemplo, para investir em determinados fundos (de investimento, multimercado,
imobiliários, etc.).
39. Há concorrência não apenas potencial, mas efetiva entre criptoativos e
diversos serviços / produtos oferecidos pelos bancos. Há, em verdade, a concorrência
desses serviços bancários com a própria criptomoeda em si e, obviamente, atacar as
corretoras que oferecem a oportunidade para os usuários ingressarem nesse sistema é
uma forma de barrar a concorrência e retardar o uso massificado dessa nova tecnologia.
15 Disponível em: http://www3.weforum.org/docs/WEF_Bui[ding-B[ockchains.pdf (acesso em 24/7/20)
15
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A prática dos bancos, se não for coibida, certamente excluirá usuários dessa forma
alternativa de realização de transações, de investimento e meio de pagamento.
III. As CORRETORAS DE CRIPTOMOEDAS CONCORREM DIRETAMENTE COM ATIVOS FINANCEIROS
TRANSACIONADOS PELOS BANCOS
40. A análise empreendida pela SG/Cade e o Tribunal do Cade16 partiu de
uma premissa basilar que não representa o efetivo padrão para a aplicação da legislação
antitruste e/ou aferição de concorrência.
41. Entendeu-se não haver concorrência entre criptomoedas e ativos
financeiros em virtude do alto grau de incerteza atrelado à atividade de criptomoedas,
o que, por sua vez, afastaria a aplicação da legislação ao caso. Segundo a SG/Cade: "as
corretoras de criptomoedas não concorrem atualmente com os bancos, nem podem, no
momento atual, ser consideradas concorrentes potenciais, dado o elevado grau de
incertezas que cercam a atividade de critomoedas. Como dito anteriormente, esta SG
entende que, uma vez regulamentadas, as criptomoedas poderão vir a concorrer com os
produtos financeiros ofertados pelos bancos incumbentes e fintechs, mas essa ainda é
uma hipótese de difícilprevisão".17
42. No entanto, esse não é o padrão aplicável para análise antitruste. O
fato de haver suposto vácuo regulatório não deve afastar a análise e aplicação da
legislação concorrencial. Mesmo que a autoridade antitruste verifique que o mercado de
criptoativos se encontre em alguma fase de vácuo ou incerteza regulatória, isso não
significa que se deve afastar as relações de concorrência e declarar ausência de rivalidade
entre ativos financeiros e, com isso, eliminar a plausibilidade da teoria do dano aventada.
16
Vide o voto do Conselheiro Bandeira Maia: "Por último, ressalto que existem dúvidas razoáveis sobre se
os bancos e as correntistas de criptomoedas competem entre si. Há um elevado grau de incertezas que
cercam as atividades de criptomoedas, ligadas ao fato de existir um vácuo regulatório significativo sobre
esse setor. Tome-se como exemplo a dificuldade de identificação das corretoras de criptomoedas em
decorrência de inexistir ainda um CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) específico para
suas atividades" ( SEI 0758357).
17 Item 342 da Nota Técnica 89/2019, SEI 0699660.
16
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43. No final das contas, o que se sugere é que a ausência de regulação
setorial implica a ausência de proteção concorrencial. Esse raciocínio não se sustenta.
Condicionar o reconhecimento de concorrência entre dois ativos à existência de
regulação do mercado é falho pois ignora e afasta a proteção concorrencial conferida a
qualquer atividade, independentemente de sua regulação (até pelo fato que nem toda
atividade é regulada, sendo, inclusive, que a desregulação é a regra). A existência de
relações competitivas prescinde de regulação.18
44. Esse mesmo princípio pode ser extraído da decisão do Cade no caso
Uber, em que se reconheceu o poder-dever de intervenção concorrencial e o potencial
competitivo de atividade inovadora em cenário de incerteza regulatória do transporte
remunerado privado em relação ao serviço regulado de táxi. Na ocasião, o Conselheiro
Bandeira Maia destacou em seu Voto19 que apesar de o serviço do transporte
remunerado não estar sob regulação, isso não impediria, de maneira alguma, a
prevenção e repressão às infrações, sendo que "a abrangência da legislação antitruste
vai além das atividades econômicas tradicionais ejá reconhecidas pelo ordenamento
jurídico. Ou seja, a proteção concorrencial das atividades empreendidas pelos
Representantes independe das normas e restrições passíveis de serem impostas pelo
Estado como agente normativo e regulador, pois é apoiada nos preceitos da ordem
econômica constitucional que visam incentivar os particulares à exploração de atividades
econômicas e o respeito às formas de concorrência".`
45. Fica claro, portanto, que um cenário de incerteza regulatória não é
motivo para afastar a relação concorrencial existente no mercado e/ou ausência de
concorrência entre o setor tradicional e setor inovador. O mero fato que o Tribunal do
Cade e a SG/Cade reconhecem que a ocorrência ampla e efetiva dependeria de
18
A título de exemplo de regulação do tema, recentemente foi aprovado CNAE especifico para a atividade
de corretagem de criptomoedas.
19
Item 12 do Voto, Processo Administrativo 08700.006964/2015-71, SEI 0496149.
20 A própria SG/cade, ao se deparar com incerteza sobre a Legalidade atividade, destacou que"Nesse cenário
de novidade e incerteza [..] não pode simplesmente presumir que a lei é clara e indiscutível no sentido de
proibir [..]. [..] Assim, a Uber e as demais ERTs devem ser, hoje, consideradas como agentes de mercado
plenamente legítimos à luz do direito antitruste até que haja uma posição mais clara dos Poderes Legislativo,
Executivo e Judiciário. É fundamentalmente esse aspecto que torna possível que as práticas denunciadas
sejam, no caso concreto, relevantes ao antitruste e não apenas ao direito civil e pena!'.
17
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regulamentação formal implica reconhecer, ao menos implicitamente, de que já há
concorrência potencial na prática. De toda a forma, a existência de relações de
concorrência não pode ser afastada pela ideia de que o setor precisa ser mais ou menos
regulado.
46. Aliás, pelas razões expostas no item II, é forçoso reconhecer que (i) há
concorrência efetiva entre o segmento de criptoativos e o setor financeiro tradicional,
independentemente de regulação estatal, ou, ao menos, (li) concorrência potencial clara
entre as atividades. Ainda que isso não seja reconhecido, o que se admite
hipoteticamente, (iii) isso não torna a atividade carente de proteção concorrencial dadas
as práticas exclusionárias.
47. O propósito de cria cão das criptomoedas e a sua utilização como meio
de pagamento, de transações e de investimentos alternativos ao sistema financeiro
tradicional demonstram a concorrência dos bancos com as moedas cripto.
Independentemente da escala, o setor financeiro tradicional vem sendo agressivamente
contestado pelo avanço de fintechs capazes de oferecer concorrência em nichos-serviços
específicos do portfólio abrangente oferecido pelos bancos, reduzindo cada vez mais o
efeito lockedindesse mercado.
48. A pressão competitiva ofertada não se limita a investimentos
financeiros (como se verá abaixo), mas também está se expandindo para serviços
financeiros mais tradicionais, pois as corretoras de criptoativos também estão se
"bancarizando". Nesse sentido, o Mercado Bitcoin21 e ao menos uma outra corretora de
criptoativos (NovaDax22) estão lançando contas digitais gratuitas para os seus usuários,
por meio das quais oferecerão cartões e serviços de pagamento de contas/boletos por
meio de criptomoedas, e até saque com Lastro em criptoativos, aumentando ainda mais
a intersecção entre moedas virtuais e fiat23. Trata-se de iniciativa que contesta os serviços
21 Trata-se do Meubank, vide: https://www.meubank.corn/.
22 Vide: https://www.novadax.corn.br/conta-digitaL
23 Trata-se da moeda Legal de um país regulamentada por autoridade central financeira.
18
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tradicionais oferecidos por bancos de forma direta e implica o ingresso efetivo em
serviços dominados por bancos.24
49. A rivalidade ofertada por essas empresas vem minando
paulatinamente a participação de mercado dos bancos em segmentos específicos, de
forma que os bancos passaram a analisar cuidadosamente esses setores inovadores e
neles ingressando. A título de exemplo, o setor financeiro tradicional, local e estrangeiro,
já está ingressando na oferta de instrumentos atrelados ao criptoativos e/ou utilizando
suas tecnologias base:
(i) JP Morgan, que, em fevereiro de 2019 iniciou testes de
criptomoeda própria, que se vale da tecnologia blockchain para facilitar
pagamentos por seus clientes;
(ii) a Rede Blockchain do Sistema Financeiro Nacional, uma rede de
blockchain inaugurada pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban)
e a Câmara Interbancária de Pagamentos (CIP);
(iii) o Banco Central da Suécia (Riksbank), ao verificar a redução
crescente de uso de moeda física vem avaliando a necessidade de
adotar uma moeda nacional virtual (e-krona), que serviria como
complemento à moeda tradicional`;
(iv) o Banco Central Francês abriu chamada pública em 2020 para
convocar potenciais empresas interessadas no desenvolvimento de
testes para uma moeda virtual para banco central (central bank digital
currency) para fins de liquidação e compensação de ativos financeiros
token izados26;
(v) o Federal Reserve (banco central americano) que está propondo
substituto ao LIBOR, o AN'lERIBOR, instituído e utilizar a partir de versão
Ethereum de b[ockchain27;
(vi) a divisão de Boston do Federal Reserve, conforme relatado pelo
seu Vice-Presidente Adjunto, está adotando as medidas tecnológicas
necessárias que poderiam lhe permitir, futuramente, exercer suas
funções nesse mercado, sendo que o foco atual é blockchain e
criptomoedas;28
24 Destaca-se, ainda, que existem diversas outras contas digitais que permitem aos seus usuários a utilização
de bitcoins no seu dia-a-dia, permitindo movimentações e gastos com essa moeda virtual Nesse sentido,
vide: (i) Afterbank (]ij); (ii) Uzzo (Link); (iii) Zro Bank (Link); (iv) Bancryp ()igj); e (v) Nexo irjç).
25 Iniciou em 2020 o projeto piloto do e-krona, cujo objetivo é mostrar como o uso de criptomoedas pode
ser user-friendly e adotado pela população geral. Vide: https://www.riksbank.se/en-qb/press-and-
krona/.
26 https://www.bangue-france.fr/en/financiat-stabitity/ma rket-infrastructu re-and- payment-systemsfca 11-
applications-central-bank-d igital-currency-experimentations
27 https://www-forbes-com.cd n.ampprolect.orci/c/s/www.forbes.com/sites/jasonbrett/2020/06/03/federal-
endorses-ethereum-backed-atternative-to-libor/amp/
28 https://www.moneytimes.com.br/eua-devem-estar-prontos-para-emitir-um -dolar-digitat/ ; e
https://www.bostonfed.orgfpeople/bank/robert-bench.aspx
19
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(vii.) a Securities and Exchange Commission autorizou, em dezembro
de 2019, a constituição do fundo NYDIG Bitcoin Strategy Fund pela
Stone Ridge Trust VI, voltado para investir no mercado de futuros de
bitco in;29
(viii) o Offíce of the Comptroller of the Currency, responsável por
instituir, regular e supervisionar instituições financeiras nacionais e
federais (e filiais de bancos estrangeiros), que, em julho/2020, ao
responder consulta sobre a possibilidade de bancos nacionais
prestarem serviços de custódia de criptomoedas, reiterou sua posição
de que isso é possível, uma vez que há autorização para prestar serviços
bancários para qualquer atividade legal, que inclui empresas do setor
cripto30, e
(ix) BTG PactuaL, por meio da gestora Hashdex, lançou fundos de
investimento em criptoativos (e.g., Hashdex Criptoativos Discovery FIC
FIM), disponíveis para investimento por titulares cadastrados tanto na
sua plataforma de investimento quanto na XP Investimentos31.
50. A carta do Offi.ce of the Comptrolter of the Currency mencionada no
item 'viii' tem relevância a nível mundial é tremenda, uma vez que afirma claramente
que deve haver harmonia e coexistência entre o setor financeiro tradicional e o setor
cripto, avançando na integração entre ambos os modelos. Isso é, a carta deixa ainda mais
claro o caminho a ser percorrido pela sociedade para maior integração.
51. Conforme dispõe o item 'ix', existem diversos exemplos adicionais de
fundos disponíveis aos consumidores-investidores; brasileiros para aplicarem recursos
no segmento de criptoativos, tais como os fundos geridos pelas corretoras BLP Gestora
de Recursos Ltda32, Vítreo Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários S.A33, QR Asset
29 https://www.sec.gov/Archíves/edgar/data/1764894/000119312519260862/d693146dn2.htm
30 carta disponível em: https://www.occ.treas.gov/topics/charters-and-licensinq/interpretations-and-
actions/2020/Lntll7O.pdf. Para mais detalhes, vide notícia emitida pelo referido órgão:
https://www.occ.treas.qov/news-issuances/news-releases/2020/nr-occ-2020-98.html. A carta também
destaca (i) diversas outras iniciativas do setor cripto que vêm sendo autorizadas pelas autoridades
americanas, vide p. 3, e (ii) o fato que o mercado financeiro vem sendo dominado por iniciativas tecnológicas
que precisam ser acompanhadas pelos reguladores. Na carta conclui-se que: "We conctude a national bank
may provide [ ... }. cryptocurrency custody services on behatf of customers, including by holding the unique
cryptographic keys associated with cryptocurrency. This letter also reaffirms the OcC's position that national
banks may provide permissible banking services to any lawful business they choose, inc[uding
cryptocurrency businesses, so long as they effectively manage the risks and comply with applicab[e law."
31 Em que pese o fato de que a XP Investimentos passou a oferecer fundos de investimento no segmento
cripto em sua plataforma, a mesma encerrou a conta do Mercado Bitcoin na sua plataforma alegando
desinteresse comercial, conforme Doc. 06 - Acesso Restrito em anexo. Ou seja, há uma reação de players
já consolidados de entrarem nesse mercado ao mesmo tempo em que excluem os novos entrantes.
32 https://blperypto.com.br/
33 https://www.vitreo.com.br/investir/fundos-de-investimento/
20
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Management34; esses fundos estão disponíveis em diversas plataformas de investimento
Há, ainda, os fundos geridos pela Transfero Swiss, que permitem investimentos diretos
em criptoativos no exterior. A rivalidade oferecida pelo setor cripto na disputa por
recursos de correntistas voltados para investimento é uma realidade no mercado.
52. Outra iniciativa relevante que também sugere pressão competitiva
atual e significativa é o fato que o Banco Central, por meio do Comunicado 31.379/2017,
destacou que "No Brasil, por enquanto, não se observam riscos relevantes para o Sistema
Financeiro Nacional. Contudo, o Banco Central do Brasil permanece atento à evolução
do uso das moedas virtuais, bem como acompanha as discussões nos foros
internacionais sobre a matéria para fins de adoção de eventuais medidas, se for o caso,
observadas as atribuições dos órgãos e das entidades competentes". Igualmente, o
Bacen, em agosto/2019, destacou na sua Nota para Imprensa sobre Estatísticas do Setor
Externo que está contabilizando criptomoedas na balança comercial do país,
considerada como 'processo produtivo':
O Comitê de Estatísticas de Balanço de Pagamentos, órgão consultivo
sobre metodologia das estatísticas do setor externo ao Departamento
de Estatísticas do Fundo Monetário Internacional (FMI), recomendou
classificar a compra e venda de criptoativos (especificamente aqueles
para os quais não há emissor) como ativos não-financeiros produzidos,
o que implica sua compilação na conta de bens do balanço de
pagamentos. A atividade de mineração de criptomoedas, portanto,
passa a ser tratada como um processo produtivo. A recomendação foi
formalizada no texto "Treatment of Crypto Assets in Macroeconomic
Statístics"
1.Por serem digitais, os criptoativos não tem registro aduaneiro, mas
as compras e vendas por residentes no Brasil implicam a celebração de
contratos de câmbio.
2.As estatísticas de exportação e importação de bens passam, portanto,
a incluir as compras e vendas de criptoativos. O Brasil tem sido
importador líquido de criptoativos, o que tem contribuído para reduzir
o superávit comercial na conta de bens do balanço de pagamentos.
53. Esses fatos denotam que já existe concorrência efetiva e em grande
escala. Além do quanto exposto na seção II quanto aos meios alternativos de pagamento,
transações e investimentos que são viabilizados pelas criptomoedas e pela tecnologia
34 https://grasset.com.br/fundo
21
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de criptoativos em geral, fatos específicos, como a existência de ativos financeiros (i.e.,
fundos de investimentos) disponíveis em plataformas como as do BTG Pactual e XP
Investimentos também denota com clareza que há concorrência atual e clara por
recursos de investidores.
54. Não obstante a concorrência efetiva e atual, há ainda uma perspectiva
futura de acirramento da concorrência. Na verdade, desde a denúncia originalmente
apresentada pela ABCB, as mudanças de mercado sugerem o crescimento significativo
da concorrência, o que é reconhecido pelo avanço regulatório da atividade. Como dito
acima, a regulação não é necessária para a identificação de relações de concorrência
dentro de um mercado - mas serve, por outro lado, como indicador crível de que os
próprios órgãos regulatórios enxergam a concorrência no setor. Esse avanço regulatório
confere ao setor maior proteção e reconhecimento como instrumento jurídico-financeiro
55. O posicionamento mais relevante é o da Comissão de Valores
Mobiliários (CVM), que, por meio da Superintendência de Relações com Investidores
Institucionais (SIN), emitiu o Ofício Circular n. 11/2018 de 19/11/2018 autorizando o
investimento indireto em criptoativos, tal como por meio de fundos em outras
jurisdições que investem nesse segmento, contanto que a atividade fosse admitida e
regulamentada no exterior. O ofício também apresentou recomendações adicionais
sobre esse tipo de investimento, destacando o aporte por meio de corretoras, uma vez
que isso apresentaria uma redução de risco.
56. Além disso, há normas da Receita Federal Brasileira e a Comissão
Nacional de Classificação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Concla/IBGE)
que apresentam diretrizes e reconhecem os investimentos realizados em criptomoedas
No caso da Receita Federal Brasileira, foi determinada a obrigação de declarar a
titutaridade desses bens, de forma que sejam pagos os impostos devidos sobre essas
operações. No caso do Concla/IBGE, houve aprovação de registro específico na
Classificação Nacional de Atividade Econômicas (CNAE) referente à atividade de
22
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corretagem", sendo que a ausência desse registro foi destacada em diversas instâncias
como fator relevante.
57. Note-se, no entanto, tal como se extrai da decisão do Cade no caso
Uber, nenhum desses passos regulatórios acima descritos é necessário para se 'declarar'
as relações de concorrência em um mercado. O raciocínio de que um suposto cenário
de incerteza regulatória seria capaz de afastar a concorrência entre bancos e corretoras
de criptomoedas ignora completamente a lógica do surgimento dessa nova tecnologia
e as razões pelas quais ela se constituiu como uma inovação capaz de criar uma
alternativa viável ao sistema financeiro tradicional.
IV. A ATIVIDADE DE CORRETAGEM DE CRIPTOMOEDAS NÃO PODE SER PRESUMIDA COMO 'DE
RISCO' PARA A PRÁTICA DE ILÍCITOS
58. Os bancos Representados alegam que as atividades de criptomoedas
teriam finalidade ilícita, ou que seriam utilizadas de modo muito amplo para a prática
de crimes, notadamente lavagem de dinheiro.` Apesar de descabido, e mesmo sem a
presença de qualquer evidência concreta, esse argumento foi admitido pela SG/Cade ao
concordar que as atividades do setor de criptoativos "podem conter risco alto,
35 Foi atribuído o número "6619-3/99 Outras atividades auxiliares dos serviços financeiros não especificadas
anteriormente", que inclui "Serviços de corretagem e custódia de criptoativos".
36 Nesse sentido, vide, principalmente a resposta do Itaú ao Ofício 2.488/2018 (SEI 0496076) que destaca
esse ponto de forma mais direta: "No caso de corretoras de criptomoedas, a alegação de que o
encerramento de suas contas tem conotação concorrencial, supostamente relacionando suas atividades
como uma alternativa de investimento/novos negócios para o ítaú Unibanco, não tem qualquer fundamento.
A questão vai para muito além disso. De fato, considerando a situação regula tória imposta ás Instituições
Financeiras, que lhes gera sérios riscos no caso de não observância, a situação é de regulamentação
indefinida quanto â atividade das próprias corretoras de criptomoedas (alguns países regulam e outros
proíbem referida atividade e entre os que regulam não há uniformidade de entendimento sobre a natureza
jurídica da criotomoeda), sendo que em nosso País inexiste norma específica a respeito. Portanto, o ponto
principal é a ausência de regulação quanto á comprovação e rastreabilidade (origem e destino) da
criptomoeda, ou seja, de onde elas são geradas e para que elas são utilizadas, o que inequivocamente
representa um risco não só para a Instituição Financeira contratada, mas para todo o Sistema Financeiro
Nacional. Apesar do argumento libertário por trás das criptomoedas, que possuem como características
intrínsecas (t) sua descentralidade, com total independência de um banco central, e (ii) seu anonimato, o
risco representado pela ausência de uma regulação específica é inegável. Não raro, as criptomoedas estão
diretamente envolvidas com polémicas, dentre as quais seu uso em produtos oferecidos na deep web, onde
podem livremente ser utilizadas para financiar grupos terroristas, propiciar pagamento de sequestros,
instrumentalízar pagamento de corrupção. (CONFIDENCIAL)." Essas mesmas afirmações também são
destacadas, em maior ou menor proporção pelos demais bancos.
23
gcataw.com.br Ci
VERSÃO PÚBLICA
independente da ausência de regulação, mais inerentemente ligado às possibilidades
que envolvem criptomoedas [..] como anonimato total de seus portadores de
transferências internacionais, de fraudes, de pirâmides financeiras"."
59. A concordância com esse argumento, que já situa a atividade do
segmento de criptoativos em posição precária perante a autoridade concorrencial,
invariavelmente impactou a análise das justificativas apresentadas pelos bancos para
praticar as condutas exclusionárias em face das corretoras de criptomoedas. Isso é, caso
já se parta do pressuposto que os bancos estavam se posicionando contra atividade
Ilícita, logo as medidas adotadas - apesar de exclusionárias - seriam adequadas e
essenciais para resguardar a ordem e higidez do setor financeiro.
60. Não obstante, as informações trazidas aos autos a esse respeito não
passam em uma análise mais criteriosa, muito menos comparativa com o sistema e
índice de fraudes ocorridas no próprio sistema bancário. Não foi realizada uma análise
efetiva desses supostos riscos para embasar essas conclusões, nem mesmo se analisou
os reflexos de eventuais fraudes cometidas com criptomoedas com a atividade e as
transações de intermediação de moeda efetivadas pelas corretoras.
61. A presunção de ilicitude adotada - além de inadmissível no
ordenamento jurídico - se finca em pré concepções equivocadas sobre o setor de
criptoativos e, pior, se transfere de modo ilimitado e indiscriminado para todos os
agentes de mercado. Os argumentos utilizados para a pressuposição de ilegalidade da
atividade se lastreiam apenas em notícias38 sobre a utilização de criptomoedas para
atividades ilegais. E o argumento utilizado para tanto respalda-se basicamente (i) em um
suposto anonimato absoluto, que garantiria a possibilidade de mais facilmente realizar
transações ilícitas e (ii) na suposta impossibilidade de rastreamento de operações. Acerca
desse segundo ponto, inclusive, o argumento é desvirtuado dado que a rastreabilidade
37 Item 333 da Nota Técnica 89/2019, SEI 0699660.
38 Nesse sentido, tanto o Itaú (itens 36, 37 e 69 da manifestação SEI 0670936) quanto o Santander (item 10
e ss da manifestação SEI 0699286) fazem alusão a notícias sobre o uso deturpado de criptomoedas como se
apenas esse setor sofresse com atos ilegais.
24
gcataw.com.br c:• ci
VERSÃO PÚBLICA
é uma das características intrínsecas das criptomoedas. Além disso, o risco tão alardeado
pelos bancos não passam de exemplos pontuais de uso de criptoativos para fins ilícitos.
62. Não é que não existam casos de fraudes e transações ilegais
envolvendo criptomoedas - há sim relatos e, como será tratado adiante, o próprio
Mercado Bitcoin possui mecanismos para identificar e reportar para as autoridades
competentes. Esses casos, no entanto, não podem ser extrapolados para se concluir
exceções como regra. As consequências de pessoas e empresas que desvirtuam a sua
utilização não podem espraiar efeitos para a grande maioria das empresas que utilizam
licitamente esses ativos. Aliás, o que se verifica na prática é que a utilização de
criptoativos para essa finalidade não constitui, nem de longe, um patamar representativo
para a avaliação do risco apresentado pelos bancos e assumido por essa SG. Na verdade,
estudos revelam a baixa utilização do setor de criptoativos para finalidades ilícitas39,
justamente pela possibilidade de rastreamento e mapeamento de informações de
transações no blockchain:
"Nonethetess, cryptocurrency's decentratized, semi-anonymous nature
makes it a uniquely appeating option for criminaIs, and theír embrace
of the technotogy has helped shape its overail reputation. But the
upside is that unlike cash and other traditional forms of vatue transfer,
cryptocurrency is inherently transparent. Every transaction is recorded
in a publicty visible ledger. With the right tools, we can see how much
of alI cryptocurrency activity is associated with crime, hone in on the
types of crime that dominate the ecosystem, and share insights with law
enforcement and the industry to curb its impact and stop bad actors
from abusing the system and, in many cases, taking advantage of
vutnerable people."4°
39 Situações relacionadas à utilização de criptomoedas com finalidades de financiamento de terrorismo são
casos excepcionais que representam uma parcela muito pequena do total das transações efetuadas. A título
de exemplo, em estudo encomendado pelo Parlamento Europeu constatou-se que apenas 3-4% de valores
de origem ilícita foram introduzidos no sistema irregularmente a partir do uso de criptomoedas: There is
also evidence suggestíng cryptocurrencies are increasingly usea' in money Iaundering schemes by
organised criminal groups (OCGs). Rob Wainwright, the former director of Europol, has stated that
cryptocurrencies comprise approximately ELIR 3 —4 billion, or three to four percent, of illicit proceeds
Iaundered through Europe annually'i Estudo disponível em: https://bit.ly/2NVMCwc, acesso em 04/07/2020.
40
Trecho extraído de estudo produzido pela Chainanalysis, empresa líder no monitoramento de blockchain,
intitulado The 2020 State of crypto crime: everything you need to know about darknet markets, exchange
hacks, money laundering and more. Nesse estudo é apresentado um panorama geral sobre a atual
conjuntura do uso de criptomoedas para fins ilícitos, tendo sido destacado que transações ilícitas
compreendem apenas 1,1% de transações com criptomoedas (p.5). Dentre as diversas conclusões sobre o
uso desse instrumento para finalidades ilícitas, são apresentados exemplos concretos de identificação de
autores de crimes e ou o mapeamento de atividades ilícitas para colaborar com autoridades policiais,
25
gcataw.com.br G C/
VERSÃO PÚBLICA
63. Nesse sentido, vale citar decisão da 51Corte de Apelações dos Estados
Unidos que julgou caso criminal onde o infrator teria utilizado criptomoedas. A decisão
destaca que é possível determinar o titular de uma carteira de criptomoedas somente a
partir de análise da blockchain e isso foi feito pelas autoridades investigativas que
contrataram um serviço para tanto. Dentre os vários pontos relevantes da decisão,
destaca-se que (i) dados adicionais para a identificação do agente criminoso foram
obtidas a partir de uma corretora de criptomoedas; e (ii) que travou-se discussão sobre
confidencia[idade de dados financeiros de criptomoedas, onde fora reconhecido que o
caráter público da blockchain reduziria a expetativa de privacidade. Ou seja, a utilizada
para fins ilícitos é reduzida:
The owners of the addresses are anonymous on the Bitcoin blockchain,
but it is possibte to discover the owner of a Bitcoin address by analyzing
the blockchain.
For exampte, when an organization creates multiple Bitcoin addresses, it
will often combine its Bitcoin addresses into a separate, central Bitcoin
address (i.e., a "cluster"). It is possible to identify a "cluster' of Bitcoin
addresses held by one organization by ana[yzing the Bitcoin blockchain's
transaction history. Open source tools and private software products can
be used to ana[yze a transaction.
Federal agents used an outside service to analyze the publicLy viewable
Bitcoin blockchain and identify a cluster of Bitcoin addresses controRed
by the Website. Once they identified the Website's Bitcoin addresses,
agents served a grandjury subpoena on Coinbase [.1.
Further, Bitcoin users are unlikety to expect that the information
published on the Bitcoin blockchain will be kept private, thus
undercutting their claim of a "tegitimate expectation of privacy." E ... ]
Granted, they enjoy a greater degree of privacy than those Mo use other
money-transfer means, but it is well known that each Bitcoin transaction
is recorded in a pubticly avaitable blockchain. Every Bitcoin user has
access to the public Bitcoin blockchain and can see every Bitcoin address
and its respective transfers. Due to this pubticity, it is possible to
determine the identities of Bitcoin address owners by analyzing the
blockchain 41
possível justamente pelo fato que a tecnologia do setor permite isso (vide, por exemplo, p. 19, 47 e 62).
Disponível em: https://qo.chainalysis.com/rs/503 -FAP-074/images/2020-Crypto-crime-Report.pdf.
41
Disponível em: https://cases.justia.com/federal/appellate-courts/cas/19-50492/1 9-50492-2020-06-
30.pdf?ts= 1593559812, acesso em: 30/07/2020.
26
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VERSÃO PÚBLICA
64. Da mesma forma, não é possível afastar o uso recorrente do setor
financeiro tradicional para fins de PLD/FT. Isso não é um impeditivo, no entanto, para
que esse sistema continue operando regularmente e sem qualquer questionamento.
Ainda que se alegue, no entanto, que as instituições financeiras tradicionais possuem e
seguem regras de compifance capazes de assegurar o mínimo de segurança, o Mercado
Bitcoin também segue e implementou as mesmas regras de compliance aplicáveis ao
sistema financeiro tradicional, exatamente com o objetivo de garantir para seus clientes
e para o mercado um nível adequado de confiabilidade na realização de suas transações.
65. Por essas razões, e diante de todo avanço da tecnologia disponível,
bem como das inovações que a utilização de criptomoedas representa para o setor
financeiro não é possível (i) tomar como premissa irremediável que a atividade de
criptomoedas está envolvida, de forma generalizada, em operações de risco, por conta
de uma pequena fração de operações ilícitas realizadas, tal como também ocorre com
operações no sistema financeiro tradicional; (ii) ignorar que diversas corretoras de
criptomoedas, inclusive o Mercado Bitcoin, também possuem e implementaram sistema
de compliance hábil e capaz de detectar operações suspeitas, garantindo, portanto, a
idoneidade de suas transações.
a. AS CARACTERÍSTICAS DA TECNOLOGIA E OS MECANISMOS IMPLEMENTADOS
PELAS CORRETORAS, NOTADAMENTE O MERCADO BITCOIN, CONFEREM UM NÍVEL DE
SEGURANÇA COMPATÍVEL AO DO MERCADO FINANCEIRO TRADICIONAL
66. Uma análise um pouco mais aprofundada do funcionamento da
tecnologia envolvendo criptomoedas, bem como dos procedimentos adotados pelas
corretoras de criptomoedas é capaz de dirimir as dúvidas quanto à consistência e
confiabilidade das transações envolvendo esses ativos. É necessário compreender a
rastreabilidade, confidencialidade e identificação de beneficiários a partir de uma noção
de camadas de segurança, que, conjuntamente, permitem o mapeamento das transações
desse setor.
27
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VERSÃO PÚBLICA
67. Primeira camada. Cada unidade de criptomoeda é única e perene,
equiparável a um bem infungível, pois há número [imitado de unidades que serão
emitidas de cada tipo de moeda. Toda a cadeia de propriedade de cada moeda é
registrada de forma delimitada no blockchain, tecnologia-base dos criptoativos, que
funciona como registro público de todas as transações, sendo registradas as carteiras
das contrapartes, sua validação, o volume transacionado e a data da transação.
68. O blockchain possibilita a identificação do "caminho" percorrido por
cada moeda digital de forma individualizada, e em qual carteira ela se encontra a
qualquer momento. Essa rastreabilidade é maior do que possível com cédulas físicas,
onde determinada unidade pode ser retirada de circulação ou substituída por outra a
qualquer momento, não havendo mapeamento de cédulas físicas.
69. É possível verificar na blockchain todas as transações envolvendo
criptomoedas, identificando-se cada unidade de criptomoeda42 específica e todos os
seus detentores ao longo do tempo. Não há, portanto, uma confidencialidade ou
anonimato amplo e irrestrito sem qualquer forma de identificação de contrapartes, pois
tendo acesso ao número da carteira de determinado usuário, logo será possível
identificar todas as transações por ele realizadas43. Além da consulta pública da
transação que pode ser feita via blockchain, o Mercado Bitcoin também contratou os
42
Acerca da imutabilidade dos dados da blockchain:"Blockchains are irnmutable, at Ieast in theory, and this
is one aí their cost functionalities and uti/ities, rhat irreversibiiity aí the consensus and recors guarantees,
once a transaction is recorded on the chain, to be indelibie as it is iinkned to every transaction record that
carne before it. If that were to be changed under regulatory poiicy, blockchain would certain/y be kilíed."
SCHREPEL, Thibautt.. Is blockchain the death of antitrust [aw?. Disponível em:
https://papers.ssrn.com/sot3/papers.cfm?abstract_W=3193576, acesso em 30 de julho de 2020.
43 Esse ponto foi bem destacado por Kevin Werbach, Professor da Universidade de Pensilvânia, em artigo
publicado no New York Times em julho/2018, onde destaca a rastreabilidade das criptomoedas: "Vet what
makes Bitcoin and other cryptocurrencies appealing to criminais aiso limits their use fulness to thern. Bitcoin
transaction records heiped investigators íind the Russian agerits under indictment To cover their tracks, the
perpetrators aí the hacking scheme wouid have been better off using briefcases fuil oícash (..) Sanks know
your pubiic identity, but they keep transaction speciíics secret Bitcoin does the opposite. Identities are
represented with pri vate, seemingiy arbitrary strings aí ietters and numbers known as cíyptographic keys.
Transactions, however, are public. Anyone can see how the money fiows. (..) The probíem for criminais is
that it's possibie ta reconstruct Sitcain identities from transaction patterns. (..) That is also what heiped lead
to the takedown in 2013 aí SiIk Road, a widely used anime marketp/ace for drug transactians and other
iiiegai purchases. BTC-E, a Russian cryptacurrency exchange, iater became the piatíorm aí choice for
criminais because it did not coiiect identification documents from its customers. BTC-E was shut down by
American iaw eníorcement agencies iast year. As these exampies show, governments have more leverage
over cryptocurrency markets than one might expect.
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VERSÃO PÚBLICA
serviços oferecidos pela ferramenta [ACESSO RESTRITO] de rastreamento de transações
envolvendo criptomoedas e que alerta a empresa para possíveis casos de transação
Ilícita.
70. Essa ferramenta fornece dados e análise de blockchain em tempo real
para agências governamentais, bolsas de valores e instituições financeiras em 40 países
e é implementada para garantir a conformidade nas transações realizadas utilizando
criptomoedas. Esse compartilhamento é feito de forma automática, via API (Application
Programming Interface), com as seguintes agências: Cybrecrime Europol, Interpol, FBI,
entre outras.
71. Segunda camada. Para acessarem a plataforma do Mercado Bitcoin, os
clientes precisam realizar cadastro, momento em que diversas informações de
identificação são solicitadas, tal como CPF válido ou CNPJ ativo, data de nascimento,
endereço de e-mail válido, bem como, a depender da categoria de conta", documentos
como: identidade com foto colorida, foto (selfie) contrato social, comprovantes de
residência, comprovantes de renda e patrimônio, entre outros, de forma a garantir a
origem e licitude dos valores transacionados na plataforma.
72. Além das informações exigidas de todos os seus usuários, o Mercado
Bitcoin também mapeia e monitora pessoas politicamente expostas (PPE)45 que utilizam
sua plataforma. Nesse sentido, e em conformidade com a Instrução CVM 563/08,
Resolução COAF 16/07, Circular 3461/09 e Carta Circular 3430/10 do Bacen, o Mercado
Bitcoin deve dedicar especial atenção a essas pessoas". A definição de PPEs abrange
pessoas que desempenham ou tenham desempenhado, nos últimos 5 (cinco) anos),
44
Cada tipo de conta impõe aos seus usuários [imites específicos globais de valores que poderão ser
transacionados na plataforma. Quanto mais exclusiva a categoria (i.e., que possibilita limites maiores para
transações), maior o grau de documentação exigida para comprovação dos valores transacionados. Para
mais informações, vide: https://www.mercadobitcoin.com.br/comissoes-prazos-limites.
' Todo cliente do Mercado Bitcoin é obrigado a se auto declarar como PEP no momento do cadastramento
e o sistema de prevenção à lavagem de dinheiro contratado pela empresa confronta sua base de clientes
com uma lista de PPE5. De tal forma, casa haja cliente que não tenha feito essa autodeclaração ele será
mapeado e a partir de então será assim considerado nas análise de indícios de lavagem de dinheiro.
46
Pessoas politicamente expostas são sujeitas a maior escrutínio na plataforma a depender do volume
transacionado, havendo classificação por tiers. [ACESSO RESTRITO]
29
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VERSÃO PÚBLICA
cargos, empregos ou funções públicas relevantes, no Brasil ou em outros países,
territórios e dependências estrangeiros, assim como seus representantes, familiares e
outras pessoas de seu relacionamento próximo47. Todos os clientes dessa categoria são
definidos pelo sistema como de alto risco de envolvimento com ilícitos associados a
lavagem de dinheiro. Caso os indícios sejam consistentes o Compliance é responsável
por comunicar aos órgãos reguladores.
73. A partir do cadastro o Mercado Bitcoin tem acesso aos dados de
carteira de seus usuários, o que lhe permitirá, a partir da verificação da blockchain,
identificar todas as transações realizadas por seus usuários, inclusive fora da sua
plataforma, com essa carteira. Caso seja identificada alguma transação ilícita, [ACESSO
RESTRITO], que identifica o cliente na base de cadastro, investiga e executa as devidas
tratativas do caso.
74. O Mercado Bitcoin tem a capacidade de identificar a atividade de seus
usuários, o que é feito não só para fins de PLD/FT, mas também para impedir fraudes
realizados na plataforma. As corretoras, portanto, inserem camada adicional de
segurança de controle de informações.
75. Terceira camada. O Mercado Bitcoin, de forma a aumentar o controle
de transações efetuadas em sua plataforma, reduzindo risco de atividades ilícitos,
implantou diversos mecanismos e softwares que avançam ainda mais no mapeamento e
monitora me nto.
76. Na plataforma do Mercado Bitcoin foram implantados os seguintes
gatilhos adicionais para flagrar transações potencialmente suspeitas: (1) qualquer
transação com valor acima de [ACESSO RESTRITO] é automaticamente sinalizada para
maior avaliação das suas contrapartes e padrões anteriores; (2) quaisquer transações que
47 São exemplos de situações que caracterizam relacionamento próximo e acarretam o enquadramento de
cliente permanente como pessoa politicamente exposta: (i) Constituição de pessoa politicamente exposta
como procurador ou preposto; e (ii) Controle, direto ou indireto, cliente pessoa jurídico por pessoa
politicamente exposta.
30
gcataw.com.br Ci
VERSÃO PÚBLICA
não sejam compatíveis com as rendas do usuário cadastrado na plataforma, são
automaticamente suspensas e sujeitas a avaliação da equipe de compliance do Mercado
Bitcoin;" (3) transações realizadas por pessoas politicamente expostas sempre são
sujeitas a maior escrutínio, tal como a verificação de mídias desabonadoras relacionadas
a clientes, processos criminais, inclusão de clientes em listas restritivas da RFB, GAFI,
CGU, OFAC, ONU, Interpol; e, finalmente (4) transações tidas como suspeitas.
77. O [ACESSO RESTRITO], por sua vez, foi instalado em 2017 para
[ACESSO RESTRITO] Por essa razão, o Mercado Bitcoin trabalha com grau de
probabilidade elevado em relação à certeza da origem lícita dos valores transacionados.
78. Quarta camada. Além dos referidos mecanismos, cumpre destacar o
tratamento dos dados coletados, as políticas internas da empresa para lidar com o uso
inadequado da plataforma para fins ilícitos, e o histórico de cooperação tanto com
autoridades investigativas (e.g., COAF) quanto instituições financeiras (e.g., Banco do
Brasil) na identificação e bloqueio de valores.
79. O Mercado Bitcoin possui: (i) Política de Prevenção à Lavagem de
Dinheiro e Financiamento ao Terrorismo (Doc. 07); [ACESSO RESTRITO] e (v) Política
de Gerenciamento de Gestão do Risco Corporativo (Doc. 10), acerca dos quais todos os
seus funcionários são treinados.
80. Essas políticas auxiliam na identificação de transações suspeitas e
como proceder quando confirmadas essas suspeitas. O Mercado Bitcoin possui
departamento interno de compliance que, a partir de experiência adquirida, vem
participando de diálogos interinstitucionais de PLD/FT. Nesse sentido, o Mercado Bitcoin
48 O Mercado Bitcoin confronta os valores declarados pelos seus clientes-usuários, [ACESSO RESTRITO]
49 A Política de Prevenção à Lavagem de Dinheiro ("PLD") apresenta diretrizes de conduta pelos funcionários
do Mercado Bitcoin; estrutura cuidados adicionais para clientes-usuários que possam ser enquadrados como
pessoas politicamente expostas ou suspeitas (know your client, vide item 8); dispõe sobre técnicas de
identificação de indícios de lavagem de dinheiro; e sobre procedimento de monitoramento e denúncia de
eventual caso flagrado.
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obteve registro na plataforma do Coaf (Sistema de Controle de Atividades Financeiras -
SISCOAF)50.
81. Quinta camada. Os mecanismos de controle implementados pelo
Mercado Bitcoin resultaram no envio de cerca de [ACESSO RESTRITO] alertas que
viraram objeto de investigações internas, dos quais em [ACESSO RESTRITO] casos
foram confirmadas práticas ilícitas. Destes [ACESSO RESTRITO] casos, [ACESSO
RESTRITO] trataram de fraudes, tendo o Mercado Bitcoin atuado para bloquear valores
em suas contas para evitar a consumação do ilícito. Nesse sentido, a empresa destaca
que, até a presente data, possui [ACESSO RESTRITO] bloqueados em sua plataforma;
tendo sido [ACESSO RESTRITO].
82. [ACESSO RESTRITO]
83. Sexta camada. Como já mencionado no acima (item 56), a Receita
Federal, por meio das Instruções Normativas 1.888/2019 e 1.899/2019, impôs a
obrigação de indivíduos declararem a titularidade de criptomoedas em seu imposto de
renda, permitindo que a Receita Federal tenha dimensão ampla dos titulares de
c ripto ativos.
84. Todas as camadas acima descritas dizem respeito unicamente a
mecanismos e protocolos criados internamente pelas corretoras de criptomoedas ou
impostos aos agentes que atuam nesse segmento. Nenhum dos filtros de segurança
acima adotados e/ou advindos da própria tecnologia inerente às criptomoedas depende
de qualquer atuação dos bancos.
85. Logo, é improcedente a alegação dos bancos, replicada pela SG/Cade,
que as corretoras estariam delegando a fiscalização a terceiros. Eventual interação com
os bancos poderia ajudar na criação de uma sétima camada de fiscalização, que seria
ainda mais útil para as autoridades fiscalizadoras no combate a crimes referentes à
° Informações poderão ser verificadas no Sistema de Controle de Atividades Financeiras - SISCOAF:
https://siscoaf.fazenda.gov.br/siscoaf-internet/pages/consuftaPO/consu LtarPO.jsf
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VERSÃO PÚBLICA
PLD/FT. Embora isso tenha sido ignorado, o Mercado Bitcoin informa que tem histórico
de atuação junto às instituições financeiras. Nesse sentido, a empresa possui diversos
exemplos de atuação na identificação de transações suspeitas e fraudes, auxiliando
bancos no bloqueio de valores. Atualmente, a empresa possui interação com cerca de
12 bancos para combater as práticas de transações ilícitas.
86. Em conclusão, os mecanismos expostos acima demonstram que as
corretoras de criptomoedas podem e efetivamente monitoram as transações nas suas
plataformas, interagindo com autoridades de fiscalização. Se o problema é efetivamente
a "comprovação e rastreabilidade (origem e destino) da criptomoeda", o que
representaria "um risco não só para a Instituição Financeira contratada, mas para todo o
Sistema Financeiro Naciona!', os controles descritos são suficientes para amenizar
qualquer preocupação quanto à credibilidade das transações realizadas na plataforma
do Mercado Bitcoin.
V. ANÁLISE DAS JUSTIFICATIVAS APRESENTADAS PELOS BANCOS DEMONSTRA A
IRRACIONALIDADE DE SE JULGAR COMO ARRISCADA TODA ATIVIDADE DE CRIPTOMOEDAS
87. Os motivos apresentados para o encerramento e recusa de abertura de
contas correntes não servem para justificar sua prática, principalmente no caso do
Mercado Bitcoin. As práticas das Representadas, adotadas de forma genérica, ampla e
irrestrita, tiveram como objeto um segmento e players específicos que, porventura,
estivessem transgredindo normas aplicáveis.
88. A conduta indiscriminada contra um setor inteiro denota que não se
trata de um exercício regular de direito, adotado por precaução, e uma suposta
preocupação do setor financeiro de se resguardar sobre eventual responsabilização. O
que há é um veto irrestrito a um setor específico, pois os motivos apresentados e
parcialmente encampados não justificam as condutas denunciadas.
89. De forma a justificar a prática anticompetitiva adotada, as instituições
financeiras alegaram que as atividades desenvolvidas no segmento cripto poderiam -
33
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VERSÃO PÚBLICA
i.e., não necessariamente são - ser utilizadas com finalidades ilícitas, notadamente em
vista da ausência de procedimentos como know your customer (i.e., mapeamento e
monitoramento de usuários na plataforma e dados financeiros correspondentes) e
PLD/FT (i.e., mecanismos de prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento de
terrorismo). Os bancos alegam que o fato de esses mecanismos não serem adotados, tal
como feito pelas instituições financeiras, seria um risco ao mercado financeiro como um
todo e para a possível responsabilização dos bancos.
90. Contudo, os próprios bancos reconhecem que essa afirmação não seria
aplicável ao setor como um todo, destacando que determinadas corretoras teriam
adotado instrumentos de monitoramento em suas manifestações, como destacado pela
SG/Cade51:
É fato que, até o momento, não há obrigação legal, exceto pela recente
IN REB 1888, ou regulação sobre as corretoras de criptomoedas, mas,
em Linhas gerais, esta SG concorda com a argumentação dos
Representados sobre a inadequação dessa abordagem de diversas
corretoras de criptomoedas quanto à aplicação de políticas de PCLD.
Ademais, a falta de uniformidade na apLicação de políticas de
PCLD por parte das corretoras reforça a racionaLidade por trás dos
encerramentos de contas de algumas corretoras de criptomoedas,
haja vista que eta coloca em risco a segurança dos bancos aqui
representados.
Considerando as informações trazidas aos autos pelas corretoras de
criptomoedas sobre suas políticas de PCLD, esta SG conclui que a
intensidade de aplicação de políticas de PCLD por parte das corretoras
não é uniforme, oscila, com exemplos de corretoras declarando não ter
recursos para isso e, em outro extremo, algumas corretoras
descrevendo políticas aparentemente bem desenhadas e efetivas, entre
as quais, corretoras que atenderam as exigências (ACESSO RESTRITO
AO CADE) para manter as contas correntes abertas. Na opinião desta
SG, ao responder sobre medidas que adotam relacionadas a PCLD,
predomina nas corretoras a percepção de que isso seria uma obrigação
dos bancos e somente a aplicação de políticas de PCLD por parte dos
bancos seria suficiente. E isso confirma a argumentação dos
Representados quanto a não aplicação efetiva de normas de PCLD por
parte das corretoras. Em suma, verifica-se a assimetria argumentada
pelos Representados quanto à regulação e aplicação de políticas de
PCLD."
Si Item 328 da Nota Técnica n° 89/2019/CGAA2/SGA1/SG/cADE, registrada no SEI 0699660.
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gcataw.com.br GICA
VERSÃO PÚBLICA
91. Ou seja, tanto os bancos quanto a SG/Cade reconhecem que o motivo
apresentado para justificar o encerramento ou recusa de abertura sequer se aplica a
todos os agentes de mercado ao destacar a "falta de uniformidade". Não há, portanto,
correlação direta entre a conduta das Representadas e o seu 'fato determinante'.
92. O Mercado Bitcoin possui mecanismos de compliance, notadamente
sobre questões de PLD/FT e KYC, de forma a supervisionar as transações realizadas na
sua plataforma e a sua potencial deturpação para fins ilícitos. Atualmente, a empresa
possui departamento de compliance devidamente estruturado, tendo, inclusive, relações
institucionais ativas com autoridades de investigação, tais como o COAF. Claramente, as
supostas justificativas apresentadas pelas Representadas em sede do Inquérito
Administrativo não se aplicam ao Mercado Bitcoín e, possivelmente, sequer a outras
corretoras de criptomoedas que também possuem mecanismos internos estruturados.
93. Caso efetivamente houvesse suspeita de qualquer aspecto de lavagem
de dinheiro, os bancos teriam o poder-dever de realizar denúncia e submetê-las ao
escrutínio da autoridade competente. No caso, o Mercado Bitcoin jamais foi acionado
por qualquer órgão do governo, notadamente aqueles responsáveis pela fiscalização de
questões atreladas à lavagem de dinheiro, para prestar esclarecimentos em decorrência
de denúncia. Isso é, ou não houve qualquer suspeita efetiva merecedora de denúncia,
ou, caso houve, os órgãos de controle não identificaram qualquer situação que
merecesse uma intervenção e/ou maior investigação. Logo, a alegação dos bancos
carece de fundamento.
94. Em não havendo qualquer imputação específica ou constatação efetiva
carente de maior escrutínio, o que há é uma recusa indiscriminada e discriminatória52
contra corretoras sem uma avaliação efetiva das condições concretas aplicáveis ao caso.
Houve recusa de abertura ou encerramento indiscriminado e injustificado por um motivo
genérico inexistente. A chancela dessas justificativas inaplicáveis implica, em última
52 A discriminação ocorreria exatamente no ponto em que os bancos estariam tratando de forma uniforme
empresas / corretoras que estão em situação completamente diferente, alegando como nexo de causalidade
do tratamento dispensado exatamente o fato que as distingue.
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instância, conceder discricionariedade ampla aos bancos para praticarem encerramentos
anticompetitivos, tal como ocorre no caso em tela.
95. Não se defende a impossibilidade de os bancos avaliarem situações de
risco quando existentes de fato e, nesse caso, promoverem o encerramento de contas.
O que se pleiteia, no entanto, é que os bancos não se utilizem de um subterfúgio de
rigorismo regulatório para convenientemente promover o encerramento de atividades
nascentes que competem com seus próprios serviços. Mesmo nos casos em que uma
recusa seria 'aceitável', isso não significa autorização irrestrita, pelo simples fato de que
os próprios bancos também sofrem com uso deturpado de seus serviços para fins de
lavagem de dinheiro e/ou falhas em mecanismos internos de controle que possam
implicar a sua responsabilização (e.g., vide os casos do Bradesco53, Banco do Brasil`,
Caixa55 etc.56).
96. Nessa questão, inclusive, e conforme demonstrado no item III, acima,
é preciso que se inverta a lógica incutida pelos bancos de que a atividade de
criptomoedas implica risco sistêmico e irremediável. Esse racional, baseado praticamente
em notícias de jornais, esparsas, que narram transações ilícitas realizadas com
criptomoedas, não retrata a realidade do mercado. Como já demonstrado, no entanto,
essas transações são exceções e não regra, e não podem macular todo o sistema. Caso
contrário, poderiam ser trazidas aqui diversas outras notícias e informações de
transações ilícitas e fraudes realizadas pelos sistema bancário, que existem mesmo com
toda a regulação aventada, e que nem por isso ameaçam a credibilidade do sistema. O
que se verifica, com isso, é que a conduta dos bancos é desproporcional e, como se verá
adiante, possui caráter exclusionário.
53 Vide: https://economia.iq.com.br/2O2O-O6-01/banco-centra-mutia-bradesco-em-r-922-miLhoes.htmL
https://noticias.uoLcom.br/iotitica/u ttimas-noticias/20 1 9/05/28/Lava-jato-gerentes-do-bradesco-cianham-
rropina-para-aiudar-a-tavar-dinheiro.htm?cmrid=coriaecoa; e
https://wwwl .folh&uoLcom.br/mercado/2020/06/bradesco-paciara-r-95-mi-ao-bc-por-falhas-na-
comunicacao-de-operacoes-suspeitas-de-Lavaqem -de-dinheiro.shtm L
54 Vide: https://g 1 .globo.com/pr/parana/noticia/2020/04/27/tava -ato-ex-gerente-do-banco-do-brasiL-e-
operadores-financeiros-sao-denunciados-por-Iavagem-de-dinheiro.ghtmt.
55 Vide: https://politica.estadao.com.br/noticias/gerat,caixa-admite-uso-de-Ioterias-em-Lavagem-de-
dinheiro20070227p27790
56
Vide: https://noticias.uol.com.br/potitica/ultimas-roticias/2019/1 O/02/Lava- jato -tiga-5 -ma iores-baricos-
do-pais-a-Lavagem-de-r-1 3-bilhao.htm.
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VERSÃO PÚBLICA
97. O que se requer é que os bancos não promovam convenientemente
um fechamento generalizado de contas. A aplicação indiscriminada e horizontal de regra
singular e sem justificativa, direcionada claramente a um setor específico, é indício
relevante de que os supostos motivos fundamentadores não se sustentam, fator esse
que não foi analisado efetivamente pela SG/Cade. No caso, houve e há encerramentos e
recusas de abertura de contas de forma anticompetitiva.
VI. HÁ INCENTIVOS ECONÔMICOS PARA A CONDUTA EXCLUSIONÁRIA DOS BANCOS
98. Uma vez que as justificativas apresentadas pelos bancos parecem não
se sustentar diante de uma análise mais aprofundada, aflorando-se, na verdade,
desproporcionais para os fins que pretendem proteger, é importante então entender os
incentivos econômicos que justificam a conveniência da exclusão, por parte dos bancos,
de uma competição nascente para, então, se determinar as consequências dessa conduta
para as corretoras de criptomoedas e para a concorrência.
99. Como se verá, os bancos têm incentivos e há, portanto, racional
anticompetitivo para o encerramento e recusa de abertura de contas correntes para
corretoras de criptomoedas. Mais que isso, há efetivamente efeitos exclusionários sobre
esse sistema que envolve pagamentos, transações e até investimentos, razão pela qual
a conduta é anticompetitiva.
100. Em primeiro lugar, a conduta impacta substancialmente a atividade das
corretoras pois cria barreiras desnecessárias para a realização de transações comuns. As
corretoras funcionam como ponto de intersecção entre moedas fiat e moedas virtuais,
de forma que necessitam de acesso a contas correntes para que conseguir intermediar
um número significativo de transações. No caso, os usuários que utilizam a plataforma
do Mercado Bitcoin transferem valores para a conta corrente da empresa, a qual faz a
conversão da quantia depositada em montante equivalente da criptomoeda.
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VERSÃO PÚBLICA
101. Ao longo da investigação desenvolvida por essa SG/Cade, essa questão
foi tratada como de "menor importância" porque isso seria apenas um 'inconveniente'17
para as corretoras, mas que o efeito seria sanado pelo fato de que bastaria a corretora
ter acesso a apenas uma conta, em um único banco, para que ela pudesse continuar
desenvolvendo suas atividades normalmente - bastante apenas o pagamento de
TED/DOC para realização de transferências de usuários que não detenham conta no
banco escolhido.
102. Ocorre, no entanto, que esse pequeno "inconveniente", na visão dos
bancos, acarretou e ainda acarreta prejuízos significativos para a atividades das
corretoras de criptomoedas. Não só por esse motivo, como se verá abaixo, mas a
conduta dos bancos expulsa e repele usuários desse modelo de negócios, já que são os
usuários (muitos deles pessoas físicas) que precisam suportar os custos dessas
transações. Ao final, pequenos investidores, por exemplo, que precisam imputar esse
custo em cada transação, se veem desincentivados a investir em criptomoedas, optando
por outras formas de investimento - o que inclusive confirma a efetiva concorrência entre
criptomoedas e outros ativos também para esse fim.
103. No final das contas, os usuários se veem desincentivados a comprar
esse tipo de moeda virtual, simplesmente pelos custos envolvidos na transferência e
transição para moedas fiat. A elevação desses custos de transação para os usuários finais
precisa ser analisada pelo Cade, dado ser este um dos principais efeitos econômicos de
uma prática anticompetitiva. A fuga desses usuários causa prejuízos relevantes também
para as corretoras e pode assim ser mensurada.
104. Ou seja, um dos principais efeitos da prática é exatamente a exclusão
de usuários desse sistema de transações. Mais que isso, a conduta dos bancos impacta
diretamente também a liquidez do sistema. Basicamente, conforme explicado no item II,
uma das grandes vantagens oferecidas pelo sistema de criptomoedas é a possibilidade
57 "Assim, na opinião desta SG, pode-se dizer que o encerramento de uma conta corrente pode ser visto
apenas como uma inconveniência, pois existem diversos outros bancos instalados no pais onde é possível
abrir uma conta corrente, podendo também serem consideradas instituições de pagamento como eventuais
alternativas a uma conta corrente", item 305 da Nota Técnica 89/2019, SEI 0699660.
38
gcataw.com.br Ci
VERSÃO PÚBLICA
de fechamento de transações nos 7 (sete) dias da semana, 24 (vinte e quatro) horas por
dia. O benefício de ser um sistema 24/7 é que isso garante agilidade e dinamismo para
as criptomoedas, na medida em que os usuários, no mundo inteiro, podem transacionar
entre si a qualquer momento, sem a necessidade de se aguardar um dia útil para
efetivação da operação".
105. Ao limitar o acesso a diversas contas bancárias, os bancos também
afetam o coração desse sistema, já que operações entre bancos diferentes (TED/DOC)
também precisam aguardar a liquidação em dia/horário útil. Ou seja, apesar de as
transações poderem continuar sendo feitas em criptomoedas em 24/7, a transição da
moeda virtual para fiat apenas pode ocorrer em dias/horário útil em virtude da limitação
que os bancos impõem para que as corretoras possam ter contas correntes nas diversas
Instituições financeiras.
106. Mais do que um mero "inconveniente", a conduta dos bancos cria
entraves significativos para Investidores interessados em operar no mercado de
criptomoedas em dias/horários não úteis para o sistema bancário tradicional, e acaba
por impedir a entrada de uma franja de pequenos usuários que não utilizam ou
transferem grandes valores e, por isso, se veem desincentivados a utilizar essa tecnologia
alternativa.
107. Por fim, a conduta dos bancos impacta algo ainda mais importante,
que é a credibilidade do sistema e das próprias corretoras. Os bancos têm conhecimento
da tecnologia, eles sabem do crescimento e das facilidades que a inovação do sistema
58 Um dos principais atrativos do segmento de criptoativos - que reforça a dependência do segmento em
várias contas correntes de diversas instituições financeiras - é o fato que o sistema, por ser 'descentralizado'
opera 24 horas por dia 7 dias por semanas, sem qualquer interrupção ou limitaçâo de horário imposta pelo
Sistema de Pagamentos Brasileiro, que possui prazos delimitados e instituições que operam com horários
distintos para os seus correntistas. O setor tradicional está justamente migrando para esse sistema
ininterrupto de pagamentos e transferências entre usuários e até estabelecimentos, como resta claro pela
inauguração do sistema Pix de pagamentos instantâneos do Banco Central, vide:
https://www.bcb.gov.br/content/estabilidadefinanceira/foru mpireunioes/Pix.pdf. Igualmente, cumpre
destacar a parceria estabelecia entre o Facebook, cielo e agentes do setor financeiro para oferecer
pagamentos via aplicativo de mensagens (i.e., WhatsApp), como já escrutinizado pelo próprio Cade (e.g.,
http://www.cade.gov.br/noticias/cade-revoga -suspensao -de- parceria-entre-facebooke -cielo - para-
pagamentos-por-whatsapp).
39
gcataw.com.br c:- c,
VERSÃO PÚBLICA
de criptoativos trouxe para o mercado, e eles têm pleno conhecimento sobre o potencial
de crescimento desse tipo de transações entre os usuários do sistema financeiro
tradicional. Ao tentar, com toda a sua força, minar a credibilidade desse sistema e evitar
que corretoras tenham contas correntes nos principais bancos, os bancos conseguem
(como tem conseguido até o momento) evitar a expansão dessa tecnologia. Isso porque,
assim como eles fizeram nesse caso, eles conseguem incutir a ideia de que atividades
com criptoativos são ilícitas.
108. A resistência dos bancos, nesse quesito, tem propósitos adicionais à
simples exclusão de corretoras desse tipo de transação, embora os principais efeitos
recaia sobre as corretoras. É claro o propósito de impedir, efetivamente, o avanço dessa
tecnologia e inovação, que tenderá a substituir, não completamente, mas em alguma
medida, as transações que antes poderiam ser realizadas dentro do sistema bancário
tradicional. Isto porque, contrapartes que estão negociando e transacionando por
criptomoedas, por exemplo, estão deixando de transacionar dentro do sistema bancário,
deixando também de pagar as altíssimas tarifas impostas pelos bancos e, com isso,
reduzindo a rotatividade interna do dinheiro.
109. A racionalidade da conduta, independente de qual a roupagem
fornecida pelos bancos, é a de impedir o desenvolvimento e a credibilidade de um
sistema inovativo e alternativo, que certamente compete com o próprio sistema
bancário. O prejuízo, novamente, ultrapassa a barreira das próprias corretoras, mas recai
substancialmente sobre os usuários, sobre os quais são criadas barreiras adicionais para
acesso a essa plataforma alternativa de transação.
110. Tendo isso em vista, e muito embora os bancos convenientemente
acenem para uma questão de compliance, a verdade é que a própria justificativa
apontada pelos bancos é parte de sua estratégia para impedir o crescimento da
plataforma de criptomoedas e, consequentemente, das próprias corretoras que operam
e criam a ponte para ambos os segmentos do mercado. Os bancos atuam de forma
racional ao encerrar as contas das corretoras de criptomoedas, uma vez que isso lhes
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gcataw.com.br GCA
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  • 1. De: Daniel Tobias Athias 1 GCA <dta@gcalaw.com.br> Enviado em: quinta-feira, 30 de julho de 2020 21:03 Para: Protocolo Cc: Ricardo Motta 1 GCA; Leonor Cordovil 1 GCA; Lívia Dias de Meio 1 GCA; Mariana Mello Henriques 1 GCA Assunto: [Protocolo] [Representação] [Versão Pública] Inquérito Administrativo n. 08700.003599/2018-95 Anexos: MB - Representação 2020.07.30 #V. Pública.pdf Prezados(as), boa noite Fazemos referência ao Inquérito Administrativo n. 08700.003599/2018-95. Solicitamos, em nome do Mercado Bitcoin Serviços Digitais Ltda., o protocolo da Representação anexa. Essa versão deve ser autuada em apartado de acesso público. Atenciosamente, Daniel Daniel Tobias Athias dta@gcalaw.com.br AI. Santos, 787, 80 andar +55 11 3371 5050 São Paulo, Brasil +55 11 3371 5059 01419-001 CRINBERC CORDOVIL 10 Esta mensagem (incluindo qualquer anexo) contém Informações privilegiadas e confidenciais para fins específicos e é protegida por lei Se você não é o destinatário desta mensagem, você deve deletá-la, Qualquer divulgação, cópia ou distribuição desta mensagem é estritamente proibida. This message (including any attachments) contains privileged and confidential Information lntended for a specific individual purpose and is protected by Law. If you are not the recipient, you should delete this message. Any disclosure, copylng or distributioni of this message is strictly prohibited.
  • 2. GRINBERG CORDOVIL VERSÃO PÚBLICA ILMO. SR. ALEXANDRE CORDEIRO MACEDO, SUPERINTENDENTE-GERAL DO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA DO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA - CADE/MJ Inquérito Administrativo n. 08700.003599/2018-95 MERCADO BITCOIN SERVIÇOS DIGITAIS LTDA., ("Mercado Bitcoin" ou "Representante"), com sede na Rua Fidêncio Ramos, n. 302, Torre B, unidades 81 e 83, Vila Olímpia, São Paulo/SP, CEP 04551-010 e inscrita no CNPJ/MF sob o n. 18.213.434/0001-35, vem, por seus advogados infra-assinados, apresentar REPRESENTAÇÃO em face de (1) ITAÚ UNIBANCO S.A. ("Itaú") inscrito no CNPJ/MF sob o n. 60.701.190/0001-04, com sede na Pç. Alfredo Egydio S. Aranha, n. 100, Torre Olavo Setubal, Parque Jabaquara, São Paulo/SP, CEP 04344-902; (II) BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. ("Santander") inscrito no CNPJ/MF sob o n. 90.400.888/0001-42, com sede na Av. Presidente Juscelino Kubitschek, n. 2.235, São Paulo/SP, CEP 04543-011; (III) BANCO BRADESCO S.A. ("Bradesco") inscrito no CNPJ/MF sob o n. 60.746.948/0001-12, com sede no Núcleo Cidade de Deus, Prédio Vermelho - 40 andar, Vila Vara, Osasco/SP, CEP 6029-900; (IV) BANCO DO BRASIL S.A. ("Banco do Brasil") inscrito no CNPJ/MF sob o n. 00.000.000/0001-91, com sede na SAUN Qd 5, Lt B, Torre Norte, Ed BB, 160 andar - Ala Leste - Setor de Autarquias, Asa Norte, Brasília/DE, CEP 70040-912; (V) COOPERATIVA DE CRÉDITO CLÁSSICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO ("Sicoob") inscrita no CNPJ/MF sob o n. 04.120.633/0001-94, com sede na Av. das Américas, n. 3500, Bloco 2 - Grupo 204, Rio de Janeiro/Ri, CEP 22640-102; e (VI) CAIXA ECONÔMICA FEDERAL ("Caixa") inscrita no CNPJ/MF sob o n. 00.360.305/0001-04, com sede no SBS, Quadra 04, Lote 3/4, Bloco A, Asa Sul, Brasília/DF, CEP 70092-900 (conjuntamente denominados "Representados"), AI. Santos, 787, 80 andar, SP, Brasil +55 11 3371 5050 gcataw.com.br
  • 3. VERSÃO PÚBLICA feita em adesão à Representação apresentada pela Associação Brasileira de Criptomoedas e BLockchain (ABCB), número em epígrafe, por violação ao artigo 36, incisos 1, II e IV, e §30, incisos III, IV, V e XI da Lei n. 12.529/2011, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas. Requer-se, com base no disposto nos artigos 51 a 53 do Regimento Interno do Cade, seja concedido ACESSO RESTRITO apenas ao Mercado Bitcotn e ao Cade aos trechos indicados como tal na presente petição, uma vez que contêm segredos de empresa que, se revelados, podem distorcer a concorrência ou prejudicar o Mercado Bitcoin. A fim de garantir que terceiros não tenham acesso a tais informações, requer-se que essa versão de acesso restrito seja autuada em apartado. 1. A decisão do Tribunal do Cade, em sessão realizada no dia 20 de maio de 2020, determinou a continuidade das investigações em sede de inquérito administrativo, com o envio de ofício a diversas autoridades, como a CVM e o Bacen, bem como aos Representados, para obtenção de informações adicionais com relação (i) à efetiva concorrência entre criptomoedas e os bancos Representados, (ii) aos riscos inerentes da atividade de criptomoedas e (!li) outras implicações regulatórias. 2. A decisão da Superintendência-Geral do Cade ("SG/Cade") que arquivou o procedimento preparatório se baseou em duas premissas basilares, das quais decorrem toda a análise para a conclusão pela inexistência de conduta anticompetitiva. Em primeiro lugar, a SG/Cade entendeu que não existiria concorrência, efetiva ou potencial, entre as criptomoedas e demais ativos financeiros que pudesse justificar uma eventual racionalidade da conduta dos bancos em recusar a abertura de contas correntes (ou fechar as existentes) para as corretoras de criptomoedas. Em segundo lugar, a SG/Cade entendeu que as características inerentes às criptomoedas implicam risco de cometimento de crimes como fraudes, lavagem de dinheiro e até pirâmides. 2 gcataw.com.br GCA
  • 4. VERSÃO PÚBLICA 3. Com todo o respeito à decisão dessa SG/Cade, ambas as premissas estão factualmente erradas. Uma análise mais detalhada da tecnologia por detrás das criptomoedas, bem como das justificativas que ensejaram a sua criação já consegue apontar os equívocos das manifestações e respostas dos bancos, sobre as quais a SG/Cade se pautou na análise. As informações trazidas abaixo também demonstram a ausência de comprovação das justificativas apresentadas para a conduta. 4. Com relação à primeira premissa, a SG/Cade afastou a concorrência entre corretoras de criptomoedas e os bancos em virtude de um suposto grau de Incerteza decorrente da ausência de regulamentação do uso de criptomoedas no Brasil. A justificativa apontada, no entanto, contradiz o próprio padrão anteriormente aplicado no caso Uber vs. Taxis', em que o Cade reconheceu que a inexistência de regulação do transporte de aplicativos não seria suficiente para afastar a concorrência com o serviço regulamentado de táxis, muito embora esse último tivesse regramentos, custos e imposições legais completamente distintos. Na ocasião, o Cade acertadamente reconheceu que a regulação não deve ser um impeditivo para a detecção de concorrência entre serviços ou produtos. O entendimento contrário expõe o setor de criptomoedas à um vácuo antitruste não previsto pela legislação concorrencial brasileira. S. As criptomoedas oferecem (e nasceram com o propósito de oferecer) um meio alternativo para efetivação de pagamentos, realização de transações (comerciais e peer-to-peei), bem como uma nova opção de investimento. Esse sistema alternativo é uma inovação em relação aos serviços oferecidos pelos bancos, proporcionando alternativas mais baratas e tão confiáveis quanto aos consumidores - apesar dos infundados argumentos trazidos pelos bancos a esse respeito. 6. Aliás, algumas das características-base das transações envolvendo criptomoedas, existentes desde a sua concepção, também estão sendo introduzidas no mercado bancário tradicional. É esse o caso, por exemplo, da rapidez e flexibilização das transações, que podem ser feitas a qualquer momento (24h / 7 dias por semana) e a 1 Processo Administrativo n. 08700.006964/2015-71. 3 gcataw.com.br GCA
  • 5. VERSÃO PÚBLICA interação direta entre usuários. A esse respeito, o sistema Pix, anunciado pelo Bacen, visa justamente baratear as taxas de transferência, permitindo pagamentos a qualquer dia e horário de forma instantânea, com características peer-to-peer 7. Note-se que não se trata unicamente de uma concorrência entre corretoras de criptomoedas e bancos, mas do próprio sistema de funcionamento das criptomoedas, que compete com os serviços bancários tradicionais. As criptomoedas oferecem concorrência efetiva e proporcionam uma oferta alternativa aos mesmos serviços dos bancos, competindo também por recursos de correntistas a título de Investimento. Há diversas evidências nos autos que confirmam a concorrência entre criptomoedas e o setor bancário, tais como: a. Existem inúmeros exemplos do setor tradicional atuando com criptomoedas ou sua tecnologia-base, a blockchain, com autoridades estrangeiras reconhecendo a legalidade da atividade e a convivência harmoniosa entre ambos os sistemas. b. Os consumidores brasileiros possuem acesso a diversos fundos de investimento para aplicarem seus recursos em criptoativos, tal como, por exemplo, fundo ofertado pelo BTG Pactuat (também disponível na plataforma da XP Investimentos, da qual o Itaú é o principal acionista). C. O setor cripto, por meio da tokenização de ativos reais (e.g., precatórios, cotas de consórcio contemplado e Ouro), está aumentando o mercado de interessados em investir nesses instrumentos ao baratear o acesso ao ativo, reduzindo aplicações para quantias ínfimas (e.g., R$100 reais). d. As corretoras estão se bancarizando, oferecendo contas digitais gratuitas aos seus usuários, que oferecerão cartões, serviços de pagamento de boletos e saques, tudo isso a partir dos (com Lastro em) criptoativos - ou seja, há uma convergência de serviços entre corretoras e bancos. 8. No que diz respeito à segunda premissa adotada pela SG/Cade, há um equívoco fundamental quanto à utilização de criptomoedas. É obviamente interessante aos bancos incutira ideia de que as criptomoedas seriam Largamente utilizadas para fins ilícitos. Não há evidências, no entanto, a esse respeito. Os bancos utilizam-se de notícias de jornais para tentar criar um cenário de completa ilegalidade. Estudos indicam baixo indício de uso de criptomoedas para lavagem de valores de origem ilícita (sendo o sistema tradicional de transmissão de riquezas a melhor escolha para o cometimento de crimes). 4 gcataw.com.br GICA
  • 6. VERSÃO PÚBLICA 9. A presunção de ilicitude aplicada às criptomoedas e, consequentemente, às atividades de corretagem é incabível. Essa presunção decorre de uma visão deturpada, lastreada em exemplos esparsos de ilícitos praticados com essa moeda (sendo que ilícitos também são enfrentados por bancos) e o desconhecimento da tecnologia-base da atividade. Pelo contrário, as características da tecnologia e os mecanismos de segurança implementados pelas corretoras são eficazes e capazes de detectar transações suspeitas. O Mercado Bitcoin, por exemplo, possui e aplica diversas camadas de segurança que lhe permite rastrear e identificar beneficiários de uma transação. 10. Há ferramentas aplicadas para monitorar transações e o próprio Mercado Bitcoin possui registro na plataforma do COAF para reportar casos suspeitos, além de atuar em conjunto com bancos no combate à lavagem de dinheiro. As diversas medidas adotadas pelo Mercado Bitcoin não delegam ou transferem, em nenhuma instância, a responsabilidade para os bancos. Por essa razão, a principal justificativa apresentada pelos bancos, de uma suposta precaução no que tange à medidas de prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento de terrorismo ("PLD/FT"), não se sustenta. A aplicação de regra genérica e indiscriminada de encerramento e/ou recusa de abertura de contas a um setor inteiro é indício claro de conduta anticompetitiva, pois os próprios bancos já reconheceram que há p/ayersno mercado que adotam medidas adequadas de monitoramento. 11. Dado que o setor cripto oferece pressão competitiva e que as justificativas apontadas não se aplicam, é nítido que os bancos atuam de forma propositalmente exclusionária, criando barreiras desnecessárias para o exercício de atividade econômica. Os bancos têm incentivos para adotar a conduta, pois querem estancar a migração de consumidores para outro sistema, sendo que no Brasil 18% dos consumidores indicam ter criptomoedas, o segundo maior índice no mundo'. 2 https://www.forbes.com/sites/ronshevliri/2020/07/27/the-coronavirus-cryptocurrency-craze-whos- behind-the- bitcoin-buying-binge/#4883c9752abf 5 gcataw.com.br GCA
  • 7. VERSÃO PÚBLICA 12. A conduta dos bancos não configura mero inconveniente solucionável por uma única conta corrente. Há sinais claros de que a conduta está se disseminando para bancos menores - com características de fol/ow the leader. Aliás, o fato de que bancos com menor poder de mercado não implementaram a conduta logo de início, e apenas passaram a adotar conduta semelhante após o efetivo fechamento por parte dos incumbentes é uma evidência significativa da existência da conduta - sendo necessária a atuação da autoridade concorrência ante o potencial de fechamento de mercado. 6 gcataw.com.br GCA
  • 8. VERSÃO PÚBLICA 1. As CONTAS BANCÁRIAS DO MERCADO BITCOIN QUE FORAM ENCERRADAS PELOS BANCOS 13. A partir de meados de 2015, o Mercado Bitcoin passou a receber notificações dos principais bancos do país, dos quais era cliente, informando o encerramento de suas contas correntes sem qualquer justificativa ou motivação aparente. Outros bancos, para os quais o Mercado Bitcoin solicitou a abertura de conta, simplesmente recusaram tê-lo como cliente, também não apresentando qualquer justificativa plausível para a recusa. 14. Foram recebidas notificações dos seguintes bancos: (i) Itaú, em 17.06.2015, informando o encerramento em razão de "desinteresse comercial" (Doc. 01 - Acesso Restrito); (ii) Santander, em 04.12.2017, informando o enceramento em razão de "desinteresse comercial" (Doc. 02 - Acesso restrito); (iii) Banco do Brasil, em 28.02.2018, informando o encerramento em razão de supostas irregularidades, ocasião em que também foram encerradas contas dos sócios do Mercado Bitcoin (Doc. 03 - Acesso restrito); (iv) Sicoob - Empresas Ri, em 07.05.2018 (Doc. 04 - Acesso restrito); e (v) Caixa Econômica Federal, em 16.12.2015 (Doc. 05 - Acesso restrito). O Mercado Bitcoin tentou abrir conta no (vi) Bradesco ao longo de 2017, tendo sido realizadas diversas reuniões e contatos com o banco, havendo, porém, recusa de abertura sem justificativa ou motivação aparente3. 15. O Mercado Bitcoin ingressou em juízo solicitando a reabertura das contas correntes, sendo que esses processos se encontram em estágios distintos no Poder Judiciário. Muito embora quase todos eles já tenham tido alguma decisão judicial, a grande maioria dessas decisões se limita a escrutinar a conduta sob enquadramento unicamente privado-contratual, ignorando os aspectos públicos e os impactos concorrenciais que a conduta desses bancos causou e tem causado. Atualmente, o Mercado Bitcoin opera principalmente por meio de contas bancárias precárias (Le, ativas por força de decisão judicial), o que reforça o risco de danos ainda mais graves para a concorrência caso essa d. SG não decida revisar os fundamentos da decisão que determinaram o arquivamento do inquérito administrativo. Esse cenário é também replicável para outras corretoras. 7 gcataw.com.br GCA
  • 9. VERSÃO PÚBLICA 16. Para conhecimento da SG/Cade, e atualização em relação à resposta oferecida ao Ofício n. 4.730/2018, apresenta-se abaixo dados das ações movidas pelo Mercado Bitcoin: PROCESSO N. RÉU FORO 1066603-10.2015.8.26.0100 Itaú Unibanco TJ/SP 1126743-39.2017.8.26.0100 Santander TJ/SP 1034225-93.2018.8.26.0100 Banco do Brasil TJ/SP 0022561-41.2018.8.19.0209 Sicoob TJ/RJ 0000055-03.2016.4.03.6100 Caixa JF/SP 17. Como informado nos autos desse inquérito administrativo, diversas outras corretoras tiveram suas contas encerradas e ajuizaram ações pedindo a reabertura, o que demonstra uma conduta generalizada por parte dos maiores bancos brasileiros para inviabitizar a atividade das corretoras que transacionam esse tipo de ativo financeiro. 18. O que causa maior espanto é que não foram encerradas apenas as contas corporativas, mas também as contas dos sócios e diretores de diversas corretoras de criptomoedas, inclusive o Mercado Bitcoin. Ora, se os bancos alegam que o encerramento das contas das corretoras era justificável por questões atreladas à PLD/FT, qual a razão para esse encerramento indiscriminado contra administradores de uma empresa? Aproxima-se muito mais de uma tentativa de retaliação para prejudicar pessoas físicas criadoras de concorrência do que propriamente uma preocupação com uma pessoa jurídica. 19. Muito embora a decisão dessa SG/Cade tenha sido pelo arquivamento da investigação e esse inquérito subsista por determinação do Tribunal do Cade, que entendeu cabível a realização de diligências adicionais, o Mercado Bitcoin entende que alguns detalhes escaparam da análise inicial da SG e que uma compreensão melhor do mercado, da inovação tecnológica que envolve as criptomoedas, da alternativa que essa SEI 0539128 8 gcataw.com.br GCA
  • 10. VERSÃO PÚBLICA tecnologia oferece para os usuários e os impactos disso para o mercado financeiro tradicional é importante para que se possa melhor desenhar a lógica subjacente à conduta dos bancos e os efeitos anticompetitivos da prática. H. As CRIPTOMOEDAS NASCERAM COMO UMA INOVAÇÃO QUE TEM POR FINALIDADE TRANSFORMAR A FORMA DE PAGAMENTO, A REALIZAÇÃO DE TRANSAÇÕES E CRIAR ALTERNATIVAS DE INVESTIMENTOS 20. As criptomoedas foram criadas usando como base a tecnologia de blockchain, que compreende um bloco ou lista de informações crescentes e públicas, registradas com base em criptografia. Cada bloco de informação é interligado com o bloco anterior, contendo a identificação e um link acesso, bem como o registro da transação, código das carteiras (quem enviou e quem recebeu), data e hora. Esse sistema de registro (cadeia de blocos) é um livro aberto, público, verificável e permanente. Uma vez registrada, a transação passa a ser verificável por qualquer pessoa e, em regra, não pode mais ser alterada (permanente). 21. Pela complexidade do seu registro em criptografia, as criptomoedas oferecem a confiabilidade sobre o ativo e, pela simplicidade de operação, as criptomoedas permitem a desburocratização em relação ao sistema financeiro tradicional, já que todo o registro desses ativos é feito publicamente e não conta com um emaranhado de instituições que controlam essas operações. A consequência é que esse sistema oferece uma redução significativa de custos para os usuários, pois prescinde da necessidade de uma conta corrente em uma instituição financeira e, com isso, também dispensa a cobrança de valores de manutenção de contas e pacotes de serviços básicos, além das taxas de administração de investimentos. Por essas características, as criptomoedas viabilizam uma forma confiável, imutável e fácil para a realização de transações entre partes. 22. As criptomoedas oferecem, com isso, uma alternativa adicional (mais barata e tão confiável quanto) às transações e serviços normalmente oferecidos pelos bancos. Por exemplo, ao invés de realizar uma TED / DOC para pagamento de uma 9 gcataw.com.br GCA
  • 11. VERSÃO PÚBLICA transação, ou ao invés de efetuar o pagamento de um boleto, as partes podem convencionar que o pagamento seja realizado por meio de uma transação envolvendo bitcoins. Nesse sentido, com poucos diques (ou por meio de aplicativo no celular), duas partes podem facilmente realizar uma transação, que pode ir desde a compra e venda de um doce até a aquisição de um bem imóvel. 23. A segurança dessa operação é garantida por meio de um registro publicamente acessível e imutável, protegido por criptografia virtualmente 'inquebrável'. Considerando o exemplo acima, não é apenas o imóvel que fica registrado publicamente, mas também a transação financeira; ambas as informações ficam garantidas pelo registro público da tecnologia do blockchain. Pela segurança que esse sistema oferece, muitas empresas, e órgãos de governo no mundo inteiro já estudam formas de armazenar registros com base nessa tecnologia. 24. Por essa mesma razão, as criptomoedas também se tornaram uma forma de as pessoas 'guardarem dinheiro' e acumularem bens. A tecnologia do blockchain permite que a mesma quantia que alguém poderia guardar em um banco fique acumulada em, por exemplo, bitcoins. Com isso, os bitcoins tornaram-se uma forma relevante de investimento, abrindo-se, assim, um novo mercado de investimento - que cada vez mais passa a ser regulamentado inclusive para compra de títulos de fundos de investimento. 25. A utilização de criptomoedas também oferece uma possibilidade ainda mais ampla para a interação direta entre usuários (pessoas físicas e estabelecimentos). Como destacado pelo Prof. Pauto Furquim5: " Criptomoedas ou, maneira mais geral, criptoativos, permitem transações de compra e venda de bens e serviços, além da transferência de valores pela Internet, sem a necessidade de taxas comumente cobradas por instituições financeiras e bancárias. A ideia fundamental é facilitar a transações diretas entre investidores (peer-to-peerJ'. Parecer do Prof. Paulo Furquim juntado nos autos do IA 08700.003599/2018-95 (SEI 0605107). 10 gcataw.com.br G CJ
  • 12. VERSÃO PÚBLICA 26. Em suma, é possível dizer que a utilização de criptomoedas (e criptoativos como um todo) oferece: (i) rapidez e flexibilização das transações, que podem ser realizadas instantaneamente entre agentes e em qualquer horário; (ii) descentralização das operações, pois há dispensa de agente validador central das operações (função geralmente executada por bancos em sistema centralizado); e (iv) um registro amplo e público de todas as transações, bens e/ou direitos negociados por meio da tecnologia blockchain6 . 27. Sobre a rapidez e flexibilidade, é justamente a possibilidade de realizar transações 24 horas por dia, 7 dias por semana, que torna ainda mais atrativa e valiosa a utilização de criptomoedas. Curiosamente, algumas dessas características, introduzidas há anos pelo segmento cripto, vêm sendo ora anunciadas para o setor tradicional como inéditas e como necessárias para introduzir mais concorrência no setor bancário. É exatamente o que pretende o Banco Central ao inaugurar recentemente o novo sistema de meio de pagamento, forçando o setor bancário a adotar tecnologias inovadoras e benéficas aos consumidores. 28. O Banco Central como parte da sua agenda BC#, vem defendendo a adoção e avanço de pagamentos instantâneos entre usuários como ponto central do pilar de inovação'. Um dos principais projetos dessa agenda é o lançamento do Pix8, um novo meio de pagamento que barateia os valores de taxas para transferências, e permite que pagamentos sejam instantâneos e realizados a qualquer dia e horário. Em breve as transferências/pagamentos poderão ser realizados inclusive por meio de QR Code, reforçando o caráter peer-to-peer. 6 Ao analisar textos sobre criptomoedas é usual verificar a replicação de equívocos e desconhecimento sobre o ativo no que tange a suposta confidencialidade e anonimato. criptomoedas são, na realidade, pseudoanônimas, pois a tecnologia blockchain armazena dados de todas as transações efetuadas com determinada unidade de moeda, contendo datas, valores e endereços nesse registro público. A partir do número de carteira de usuários e possível ter acesso quase que irrestrito a movimentação financeira de determinado agente, pois essas informações são públicas. Vide slide 20 de apresentação do Bacen disponível em: https://www.bcb.qov.br/conteudo/home- ptbr/TextosApresentacoes/ppt_balanco aqenda_bc 201 9.pdf. 8 Vide apresentação institucional do Bacen disponível em: https://www.bcb.gov.br/content/estabilidadefinanceira/foru mpireunioes/Pix.pdf. 11 gcataw.com.br GCA
  • 13. VERSÃO PÚBLICA 29. Isso é, o Pix, com tecnologias ditas inéditas, parte justamente das características base do setor cripto introduzidas na sua concepção. Ou seja, a inovação pretendida pelo setor tradicional já é há muito defendida, implantada e difundida pelo setor cripto. 30. Outro ponto essencial do setor cripto é a criação de novos ativos digitais de investimento por meio de tokens. A tokeni.zação é um processo de utilizar tokens digitais criptográficos para representar a propriedade de um determinado bem e/ou direito. Os tokens podem representar ativos tangíveis (imóveis, precatórios, metais preciosos), instrumentos financeiros (ações, títulos, fundos), propriedade intelectual e outros ativos intangíveis, sujeitos à regulação de cada país'. Cada token pode representar, e.g., uma porcentagem daquele ativo.10 31. A título de exemplo, é possível, por meio da tokenização, dividir um precatório judicial avaliado em R$3 milhões em 30.000 tokens de 100 reais, as quais poderão ser então adquiridas pelos usuários na plataforma do Mercado Bitcoin. O procedimento, de dividir um ativo de valor elevado em várias parcelas menores - sendo que não há limite para a emissão de tokens de valor unitário - torna o mercado de potenciais interessados significativamente mais amplo, pois qualquer pessoa, ainda que com valor baixo, pode participar nesse segmento. A redução de custo significa que o interessado não teria de adquirir um ativo inteiro, de valor inacessível para grande parte da população, para receber exposição ao ativo, podendo adquirir parcelas menores". 32. As empresas que atuam com criptoativos vêm avançando na introdução desses novos produtos e oferecendo diversas opções aos seus clientes para O Mercado Bitcoin informa que somente atua na tokenização de ativos específicos e não regulados, mas destaca que, em tese, ativos financeiros também podem ser tokenizados. 10 https://b[og.mercadobitcoin.com.br/o-que-e-tokenizacao 11 "Esse processo tem algumas vantagens - tanto para os detentores dos ativos quanto para investidores. Para os detentores dos ativos, existe um aumento de liquidez. Quando falamos em ativos de alto valor, a sua conversão rápida e justa em dinheiro pode ser difícil. Podemos usar precatórios como exemplo - se a pessoa tem um precatório de R$ 1 milhão e deseja vender, o mercado é muito restrito e ela vai se deparar com um grande desconto sobre o valor de face e provavelmente receber menos da metade do valor. Contudo, se tokenizamos um ativo alternativo em milhares de tokens de baixo valor unitário, o mercado se torna mais amplo, e o desconto exigido para venda, menor", cf. https://b[og.mercadobitcoin.com.br/o-gue- e-tokenizacao 12 gcataw.com.br GCA
  • 14. VERSÃO PÚBLICA fins de democratização a ativos que antes eram exclusivos a grandes instituições financeiras ou agentes especializados. O Mercado Bitcoin, por exemplo, oferece tokens de precatórios e de cotas de consórcio já contemplado, bem como listará, a partir de 03/08, token ligado a ouro em sua plataforma12. No caso dos precatórios, esse é um ativo de alto retorno potencial, quando comparado a aplicações tradicionai513, pois os tokens que foram negociados em 2019, por exemplo, tiveram retornos de 16 a 23% ao ano, com compras mínimas baixíssimas de R$100. Com a mínima necessidade de capital para exposição a esses tipos de ativos, a tecnologia combinada com um modelo de negócios inovador, possibilita mais uma disrupção à atividade previamente explorada de forma praticamente exclusiva pelas instituições financeiras e grandes fundos de investimento restrito a investidores qualificados ou profissionais 33. Essa inovação também representa vantagem clara para o proprietário do ativo, pois, com a utilização da tecnologia blockchain, o mesmo tem autonomia para negociar os tokens representativos de um ativo real da forma, e na medida, que achar mais adequada. Assim ao se tokenizar um precatório ou cota de consórcio, é possível que o proprietário decida vender apenas uma parcela do ativo total e, ainda, definir o desconto que está disposto a aplicar apenas nessa parte específica do ativo. Dessa forma, não apenas os clientes do varejo conseguem acessar um ativo antes restrito às carteiras de grandes bancos, como também o proprietário do ativo alvo da tokenização consegue negociar descontos mais justos para venda de seu ativo. Isso marca uma possibilidade de mudança significativa no setor, já que, tipicamente, esses proprietários de ativos são agressivamente explorados pelas instituições financeiras na negociação, além de, em regra, serem obrigados a vender a totalidade do ativo, não apenas a fração que precise para cobrir eventual necessidade de capital. 34. Com a utilização da tecnologia de registro imutável, rastreável e transparente para representar digitalmente um ativo real ou tangível, é possível, por 12 https://valor.g[obo.com/financas/noticia/2020/07/29/mercado-bitcoin-vai-listar-token-liqado-a- ouro.ghtml 13 Em comparação à rentabilidade média oferecida para títulos de emissão de instituição financeira (como Certificado de Depósito Bancário - CDB) para prazos equivalentes. 13 gcataw.com.br Ci
  • 15. VERSÃO PÚBLICA exemplo, registrar atributos essenciais da oportunidade de negociação e ter confiança de que eles não poderão ser alterados com o decorrer do tempo. No caso de um precatório já tokeni.zado14, encontra-se com essa característica de imutabilidade, por exemplo, informações como o (i) estoque total de ativos digitais emitidos (totalSupply); e (ii) o identificador único (hash) do documento eletrônico que contém os detalhes financeiros de uma determinada oportunidade (hashDetalhesFinanceiros); isso significa que, se for alterado algum dado financeiro desse documento (possivelmente, até mesmo em sentido contrário aos interesses do comprador do ativo digital), qualquer pessoa no mundo consegue visualizar essa alteração, contrastar com a versão original e questionar essa alteração, trazendo um nível de accountability possivelmente inédito no mercado financeiro global. 35. Outro segmento potencialmente afetado por essas novas tecnologias e, tradicionalmente, restrito à atuação de instituições financeiras (ou empresas do grupo econômico) é o de registro e custódia. No caso de criptoativos emitidos de forma descentralizada (como o bitcoi.n), a partir da venda desse ativo digital pelo titular original a novo titular, o agente gerador do token pode não ter mais ingerência sobre o token criado, nos casos em que tal criptoativo já tenha sido transferido para carteira digital (wallet) de seu novo titular, sendo que, nesse caso, sua circulação seria possível apenas por comando de seu novo titular. Assim, a atividade do agente gerador se aproximaria da atividade de custódia prestada em favor do titular (emissor) do ativo de que trata a Instrução CVM n° 542, de 20 de dezembro de 2013 ("Instrução CVM 542"). 36. De forma contrária, é igualmente possível que o ativo digital transferido a novo titular permaneça em carteira digital (wallet) administrada pelo agente gerador do criptoativo, caso que se assemelha tanto com a atividade de escrituração de que trata a Instrução CVM 543 como com a atividade de custódia de que trata a Instrução CVM 542. Dessa forma, pode-se afirmar que a atividade de geração de ativos digitais congrega tanto características típicas da escrituração, como atividades típicas da custódia. Com esse manifesto uso potencial da tecnologia para modernizar e 14 Para um exemplo de atributos registrados em blockchain: https://etherscari.io/dapp/0x399501d64a25e424eebfea01 b1 2b33441621 5ded#readcontract 14 gcataw.com.br GCA
  • 16. VERSÃO PÚBLICA tornar mais eficiente o processo de custódia e registro de ativos, atividade exercida tipicamente por empresas ligadas aos grandes grupos econômicos bancários no Brasil, é compreensível o incentivo destes agentes para coibir o desenvolvimento das referidas tecnologias. 37. Vale ressaltar que esse incentivo das instituições financeiras em coibir o desenvolvimento da inovação é ainda mais intensificado em razão do potencial de crescimento exponencial do uso dessa tecnologia, decorrente principalmente da migração de estruturas-legado para novos arranjos jurídicos e tecnológicos. Como bem destacado em relatório intitulado 'Buiíd Block(chain)s for a Better PIanef, o World Economfc Forum trouxe à tona a possibilidade de até 10% do PIB global estar representado em tecnologias de registro distribuído até 202515. 38. Esses serviços nada mais são do que alternativas que surgiram aos produtos e meios de pagamento já oferecidos pelo setor bancário. O benefício dessa concorrência é claramente apropriado pelos consumidores, que possuem opções adicionais àquelas existentes. O benefício dessa concorrência e da introdução de novas tecnologias também incrementa o próprio setor bancário. O prejuízo decorrente do encerramento e/ou recusa de abertura de contas, portanto, não é apenas limitado a um número reduzido de empresas de corretagem de criptomoedas, mas todo um setor de mercado que oferece opções relevantes de investimento para consumidores, principalmente a partir de valores módicos, em comparação ao que é exigido, por exemplo, para investir em determinados fundos (de investimento, multimercado, imobiliários, etc.). 39. Há concorrência não apenas potencial, mas efetiva entre criptoativos e diversos serviços / produtos oferecidos pelos bancos. Há, em verdade, a concorrência desses serviços bancários com a própria criptomoeda em si e, obviamente, atacar as corretoras que oferecem a oportunidade para os usuários ingressarem nesse sistema é uma forma de barrar a concorrência e retardar o uso massificado dessa nova tecnologia. 15 Disponível em: http://www3.weforum.org/docs/WEF_Bui[ding-B[ockchains.pdf (acesso em 24/7/20) 15 gcataw.com.br GCA
  • 17. VERSÃO PÚBLICA A prática dos bancos, se não for coibida, certamente excluirá usuários dessa forma alternativa de realização de transações, de investimento e meio de pagamento. III. As CORRETORAS DE CRIPTOMOEDAS CONCORREM DIRETAMENTE COM ATIVOS FINANCEIROS TRANSACIONADOS PELOS BANCOS 40. A análise empreendida pela SG/Cade e o Tribunal do Cade16 partiu de uma premissa basilar que não representa o efetivo padrão para a aplicação da legislação antitruste e/ou aferição de concorrência. 41. Entendeu-se não haver concorrência entre criptomoedas e ativos financeiros em virtude do alto grau de incerteza atrelado à atividade de criptomoedas, o que, por sua vez, afastaria a aplicação da legislação ao caso. Segundo a SG/Cade: "as corretoras de criptomoedas não concorrem atualmente com os bancos, nem podem, no momento atual, ser consideradas concorrentes potenciais, dado o elevado grau de incertezas que cercam a atividade de critomoedas. Como dito anteriormente, esta SG entende que, uma vez regulamentadas, as criptomoedas poderão vir a concorrer com os produtos financeiros ofertados pelos bancos incumbentes e fintechs, mas essa ainda é uma hipótese de difícilprevisão".17 42. No entanto, esse não é o padrão aplicável para análise antitruste. O fato de haver suposto vácuo regulatório não deve afastar a análise e aplicação da legislação concorrencial. Mesmo que a autoridade antitruste verifique que o mercado de criptoativos se encontre em alguma fase de vácuo ou incerteza regulatória, isso não significa que se deve afastar as relações de concorrência e declarar ausência de rivalidade entre ativos financeiros e, com isso, eliminar a plausibilidade da teoria do dano aventada. 16 Vide o voto do Conselheiro Bandeira Maia: "Por último, ressalto que existem dúvidas razoáveis sobre se os bancos e as correntistas de criptomoedas competem entre si. Há um elevado grau de incertezas que cercam as atividades de criptomoedas, ligadas ao fato de existir um vácuo regulatório significativo sobre esse setor. Tome-se como exemplo a dificuldade de identificação das corretoras de criptomoedas em decorrência de inexistir ainda um CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) específico para suas atividades" ( SEI 0758357). 17 Item 342 da Nota Técnica 89/2019, SEI 0699660. 16 gcataw.com.br GCA
  • 18. VERSÃO PÚBLICA 43. No final das contas, o que se sugere é que a ausência de regulação setorial implica a ausência de proteção concorrencial. Esse raciocínio não se sustenta. Condicionar o reconhecimento de concorrência entre dois ativos à existência de regulação do mercado é falho pois ignora e afasta a proteção concorrencial conferida a qualquer atividade, independentemente de sua regulação (até pelo fato que nem toda atividade é regulada, sendo, inclusive, que a desregulação é a regra). A existência de relações competitivas prescinde de regulação.18 44. Esse mesmo princípio pode ser extraído da decisão do Cade no caso Uber, em que se reconheceu o poder-dever de intervenção concorrencial e o potencial competitivo de atividade inovadora em cenário de incerteza regulatória do transporte remunerado privado em relação ao serviço regulado de táxi. Na ocasião, o Conselheiro Bandeira Maia destacou em seu Voto19 que apesar de o serviço do transporte remunerado não estar sob regulação, isso não impediria, de maneira alguma, a prevenção e repressão às infrações, sendo que "a abrangência da legislação antitruste vai além das atividades econômicas tradicionais ejá reconhecidas pelo ordenamento jurídico. Ou seja, a proteção concorrencial das atividades empreendidas pelos Representantes independe das normas e restrições passíveis de serem impostas pelo Estado como agente normativo e regulador, pois é apoiada nos preceitos da ordem econômica constitucional que visam incentivar os particulares à exploração de atividades econômicas e o respeito às formas de concorrência".` 45. Fica claro, portanto, que um cenário de incerteza regulatória não é motivo para afastar a relação concorrencial existente no mercado e/ou ausência de concorrência entre o setor tradicional e setor inovador. O mero fato que o Tribunal do Cade e a SG/Cade reconhecem que a ocorrência ampla e efetiva dependeria de 18 A título de exemplo de regulação do tema, recentemente foi aprovado CNAE especifico para a atividade de corretagem de criptomoedas. 19 Item 12 do Voto, Processo Administrativo 08700.006964/2015-71, SEI 0496149. 20 A própria SG/cade, ao se deparar com incerteza sobre a Legalidade atividade, destacou que"Nesse cenário de novidade e incerteza [..] não pode simplesmente presumir que a lei é clara e indiscutível no sentido de proibir [..]. [..] Assim, a Uber e as demais ERTs devem ser, hoje, consideradas como agentes de mercado plenamente legítimos à luz do direito antitruste até que haja uma posição mais clara dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. É fundamentalmente esse aspecto que torna possível que as práticas denunciadas sejam, no caso concreto, relevantes ao antitruste e não apenas ao direito civil e pena!'. 17 gcataw.com.br GCA
  • 19. VERSÃO PÚBLICA regulamentação formal implica reconhecer, ao menos implicitamente, de que já há concorrência potencial na prática. De toda a forma, a existência de relações de concorrência não pode ser afastada pela ideia de que o setor precisa ser mais ou menos regulado. 46. Aliás, pelas razões expostas no item II, é forçoso reconhecer que (i) há concorrência efetiva entre o segmento de criptoativos e o setor financeiro tradicional, independentemente de regulação estatal, ou, ao menos, (li) concorrência potencial clara entre as atividades. Ainda que isso não seja reconhecido, o que se admite hipoteticamente, (iii) isso não torna a atividade carente de proteção concorrencial dadas as práticas exclusionárias. 47. O propósito de cria cão das criptomoedas e a sua utilização como meio de pagamento, de transações e de investimentos alternativos ao sistema financeiro tradicional demonstram a concorrência dos bancos com as moedas cripto. Independentemente da escala, o setor financeiro tradicional vem sendo agressivamente contestado pelo avanço de fintechs capazes de oferecer concorrência em nichos-serviços específicos do portfólio abrangente oferecido pelos bancos, reduzindo cada vez mais o efeito lockedindesse mercado. 48. A pressão competitiva ofertada não se limita a investimentos financeiros (como se verá abaixo), mas também está se expandindo para serviços financeiros mais tradicionais, pois as corretoras de criptoativos também estão se "bancarizando". Nesse sentido, o Mercado Bitcoin21 e ao menos uma outra corretora de criptoativos (NovaDax22) estão lançando contas digitais gratuitas para os seus usuários, por meio das quais oferecerão cartões e serviços de pagamento de contas/boletos por meio de criptomoedas, e até saque com Lastro em criptoativos, aumentando ainda mais a intersecção entre moedas virtuais e fiat23. Trata-se de iniciativa que contesta os serviços 21 Trata-se do Meubank, vide: https://www.meubank.corn/. 22 Vide: https://www.novadax.corn.br/conta-digitaL 23 Trata-se da moeda Legal de um país regulamentada por autoridade central financeira. 18 gcataw.com.br GCA
  • 20. VERSÃO PÚBLICA tradicionais oferecidos por bancos de forma direta e implica o ingresso efetivo em serviços dominados por bancos.24 49. A rivalidade ofertada por essas empresas vem minando paulatinamente a participação de mercado dos bancos em segmentos específicos, de forma que os bancos passaram a analisar cuidadosamente esses setores inovadores e neles ingressando. A título de exemplo, o setor financeiro tradicional, local e estrangeiro, já está ingressando na oferta de instrumentos atrelados ao criptoativos e/ou utilizando suas tecnologias base: (i) JP Morgan, que, em fevereiro de 2019 iniciou testes de criptomoeda própria, que se vale da tecnologia blockchain para facilitar pagamentos por seus clientes; (ii) a Rede Blockchain do Sistema Financeiro Nacional, uma rede de blockchain inaugurada pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e a Câmara Interbancária de Pagamentos (CIP); (iii) o Banco Central da Suécia (Riksbank), ao verificar a redução crescente de uso de moeda física vem avaliando a necessidade de adotar uma moeda nacional virtual (e-krona), que serviria como complemento à moeda tradicional`; (iv) o Banco Central Francês abriu chamada pública em 2020 para convocar potenciais empresas interessadas no desenvolvimento de testes para uma moeda virtual para banco central (central bank digital currency) para fins de liquidação e compensação de ativos financeiros token izados26; (v) o Federal Reserve (banco central americano) que está propondo substituto ao LIBOR, o AN'lERIBOR, instituído e utilizar a partir de versão Ethereum de b[ockchain27; (vi) a divisão de Boston do Federal Reserve, conforme relatado pelo seu Vice-Presidente Adjunto, está adotando as medidas tecnológicas necessárias que poderiam lhe permitir, futuramente, exercer suas funções nesse mercado, sendo que o foco atual é blockchain e criptomoedas;28 24 Destaca-se, ainda, que existem diversas outras contas digitais que permitem aos seus usuários a utilização de bitcoins no seu dia-a-dia, permitindo movimentações e gastos com essa moeda virtual Nesse sentido, vide: (i) Afterbank (]ij); (ii) Uzzo (Link); (iii) Zro Bank (Link); (iv) Bancryp ()igj); e (v) Nexo irjç). 25 Iniciou em 2020 o projeto piloto do e-krona, cujo objetivo é mostrar como o uso de criptomoedas pode ser user-friendly e adotado pela população geral. Vide: https://www.riksbank.se/en-qb/press-and- krona/. 26 https://www.bangue-france.fr/en/financiat-stabitity/ma rket-infrastructu re-and- payment-systemsfca 11- applications-central-bank-d igital-currency-experimentations 27 https://www-forbes-com.cd n.ampprolect.orci/c/s/www.forbes.com/sites/jasonbrett/2020/06/03/federal- endorses-ethereum-backed-atternative-to-libor/amp/ 28 https://www.moneytimes.com.br/eua-devem-estar-prontos-para-emitir-um -dolar-digitat/ ; e https://www.bostonfed.orgfpeople/bank/robert-bench.aspx 19 gcaLaw.corn.br GCA
  • 21. VERSÃO PÚBLICA (vii.) a Securities and Exchange Commission autorizou, em dezembro de 2019, a constituição do fundo NYDIG Bitcoin Strategy Fund pela Stone Ridge Trust VI, voltado para investir no mercado de futuros de bitco in;29 (viii) o Offíce of the Comptroller of the Currency, responsável por instituir, regular e supervisionar instituições financeiras nacionais e federais (e filiais de bancos estrangeiros), que, em julho/2020, ao responder consulta sobre a possibilidade de bancos nacionais prestarem serviços de custódia de criptomoedas, reiterou sua posição de que isso é possível, uma vez que há autorização para prestar serviços bancários para qualquer atividade legal, que inclui empresas do setor cripto30, e (ix) BTG PactuaL, por meio da gestora Hashdex, lançou fundos de investimento em criptoativos (e.g., Hashdex Criptoativos Discovery FIC FIM), disponíveis para investimento por titulares cadastrados tanto na sua plataforma de investimento quanto na XP Investimentos31. 50. A carta do Offi.ce of the Comptrolter of the Currency mencionada no item 'viii' tem relevância a nível mundial é tremenda, uma vez que afirma claramente que deve haver harmonia e coexistência entre o setor financeiro tradicional e o setor cripto, avançando na integração entre ambos os modelos. Isso é, a carta deixa ainda mais claro o caminho a ser percorrido pela sociedade para maior integração. 51. Conforme dispõe o item 'ix', existem diversos exemplos adicionais de fundos disponíveis aos consumidores-investidores; brasileiros para aplicarem recursos no segmento de criptoativos, tais como os fundos geridos pelas corretoras BLP Gestora de Recursos Ltda32, Vítreo Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários S.A33, QR Asset 29 https://www.sec.gov/Archíves/edgar/data/1764894/000119312519260862/d693146dn2.htm 30 carta disponível em: https://www.occ.treas.gov/topics/charters-and-licensinq/interpretations-and- actions/2020/Lntll7O.pdf. Para mais detalhes, vide notícia emitida pelo referido órgão: https://www.occ.treas.qov/news-issuances/news-releases/2020/nr-occ-2020-98.html. A carta também destaca (i) diversas outras iniciativas do setor cripto que vêm sendo autorizadas pelas autoridades americanas, vide p. 3, e (ii) o fato que o mercado financeiro vem sendo dominado por iniciativas tecnológicas que precisam ser acompanhadas pelos reguladores. Na carta conclui-se que: "We conctude a national bank may provide [ ... }. cryptocurrency custody services on behatf of customers, including by holding the unique cryptographic keys associated with cryptocurrency. This letter also reaffirms the OcC's position that national banks may provide permissible banking services to any lawful business they choose, inc[uding cryptocurrency businesses, so long as they effectively manage the risks and comply with applicab[e law." 31 Em que pese o fato de que a XP Investimentos passou a oferecer fundos de investimento no segmento cripto em sua plataforma, a mesma encerrou a conta do Mercado Bitcoin na sua plataforma alegando desinteresse comercial, conforme Doc. 06 - Acesso Restrito em anexo. Ou seja, há uma reação de players já consolidados de entrarem nesse mercado ao mesmo tempo em que excluem os novos entrantes. 32 https://blperypto.com.br/ 33 https://www.vitreo.com.br/investir/fundos-de-investimento/ 20 gcataw.com.br GCA
  • 22. VERSÃO PÚBLICA Management34; esses fundos estão disponíveis em diversas plataformas de investimento Há, ainda, os fundos geridos pela Transfero Swiss, que permitem investimentos diretos em criptoativos no exterior. A rivalidade oferecida pelo setor cripto na disputa por recursos de correntistas voltados para investimento é uma realidade no mercado. 52. Outra iniciativa relevante que também sugere pressão competitiva atual e significativa é o fato que o Banco Central, por meio do Comunicado 31.379/2017, destacou que "No Brasil, por enquanto, não se observam riscos relevantes para o Sistema Financeiro Nacional. Contudo, o Banco Central do Brasil permanece atento à evolução do uso das moedas virtuais, bem como acompanha as discussões nos foros internacionais sobre a matéria para fins de adoção de eventuais medidas, se for o caso, observadas as atribuições dos órgãos e das entidades competentes". Igualmente, o Bacen, em agosto/2019, destacou na sua Nota para Imprensa sobre Estatísticas do Setor Externo que está contabilizando criptomoedas na balança comercial do país, considerada como 'processo produtivo': O Comitê de Estatísticas de Balanço de Pagamentos, órgão consultivo sobre metodologia das estatísticas do setor externo ao Departamento de Estatísticas do Fundo Monetário Internacional (FMI), recomendou classificar a compra e venda de criptoativos (especificamente aqueles para os quais não há emissor) como ativos não-financeiros produzidos, o que implica sua compilação na conta de bens do balanço de pagamentos. A atividade de mineração de criptomoedas, portanto, passa a ser tratada como um processo produtivo. A recomendação foi formalizada no texto "Treatment of Crypto Assets in Macroeconomic Statístics" 1.Por serem digitais, os criptoativos não tem registro aduaneiro, mas as compras e vendas por residentes no Brasil implicam a celebração de contratos de câmbio. 2.As estatísticas de exportação e importação de bens passam, portanto, a incluir as compras e vendas de criptoativos. O Brasil tem sido importador líquido de criptoativos, o que tem contribuído para reduzir o superávit comercial na conta de bens do balanço de pagamentos. 53. Esses fatos denotam que já existe concorrência efetiva e em grande escala. Além do quanto exposto na seção II quanto aos meios alternativos de pagamento, transações e investimentos que são viabilizados pelas criptomoedas e pela tecnologia 34 https://grasset.com.br/fundo 21 gcataw.com.br GCA
  • 23. VERSÃO PÚBLICA de criptoativos em geral, fatos específicos, como a existência de ativos financeiros (i.e., fundos de investimentos) disponíveis em plataformas como as do BTG Pactual e XP Investimentos também denota com clareza que há concorrência atual e clara por recursos de investidores. 54. Não obstante a concorrência efetiva e atual, há ainda uma perspectiva futura de acirramento da concorrência. Na verdade, desde a denúncia originalmente apresentada pela ABCB, as mudanças de mercado sugerem o crescimento significativo da concorrência, o que é reconhecido pelo avanço regulatório da atividade. Como dito acima, a regulação não é necessária para a identificação de relações de concorrência dentro de um mercado - mas serve, por outro lado, como indicador crível de que os próprios órgãos regulatórios enxergam a concorrência no setor. Esse avanço regulatório confere ao setor maior proteção e reconhecimento como instrumento jurídico-financeiro 55. O posicionamento mais relevante é o da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que, por meio da Superintendência de Relações com Investidores Institucionais (SIN), emitiu o Ofício Circular n. 11/2018 de 19/11/2018 autorizando o investimento indireto em criptoativos, tal como por meio de fundos em outras jurisdições que investem nesse segmento, contanto que a atividade fosse admitida e regulamentada no exterior. O ofício também apresentou recomendações adicionais sobre esse tipo de investimento, destacando o aporte por meio de corretoras, uma vez que isso apresentaria uma redução de risco. 56. Além disso, há normas da Receita Federal Brasileira e a Comissão Nacional de Classificação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Concla/IBGE) que apresentam diretrizes e reconhecem os investimentos realizados em criptomoedas No caso da Receita Federal Brasileira, foi determinada a obrigação de declarar a titutaridade desses bens, de forma que sejam pagos os impostos devidos sobre essas operações. No caso do Concla/IBGE, houve aprovação de registro específico na Classificação Nacional de Atividade Econômicas (CNAE) referente à atividade de 22 gcataw.com.br GCA
  • 24. VERSÃO PÚBLICA corretagem", sendo que a ausência desse registro foi destacada em diversas instâncias como fator relevante. 57. Note-se, no entanto, tal como se extrai da decisão do Cade no caso Uber, nenhum desses passos regulatórios acima descritos é necessário para se 'declarar' as relações de concorrência em um mercado. O raciocínio de que um suposto cenário de incerteza regulatória seria capaz de afastar a concorrência entre bancos e corretoras de criptomoedas ignora completamente a lógica do surgimento dessa nova tecnologia e as razões pelas quais ela se constituiu como uma inovação capaz de criar uma alternativa viável ao sistema financeiro tradicional. IV. A ATIVIDADE DE CORRETAGEM DE CRIPTOMOEDAS NÃO PODE SER PRESUMIDA COMO 'DE RISCO' PARA A PRÁTICA DE ILÍCITOS 58. Os bancos Representados alegam que as atividades de criptomoedas teriam finalidade ilícita, ou que seriam utilizadas de modo muito amplo para a prática de crimes, notadamente lavagem de dinheiro.` Apesar de descabido, e mesmo sem a presença de qualquer evidência concreta, esse argumento foi admitido pela SG/Cade ao concordar que as atividades do setor de criptoativos "podem conter risco alto, 35 Foi atribuído o número "6619-3/99 Outras atividades auxiliares dos serviços financeiros não especificadas anteriormente", que inclui "Serviços de corretagem e custódia de criptoativos". 36 Nesse sentido, vide, principalmente a resposta do Itaú ao Ofício 2.488/2018 (SEI 0496076) que destaca esse ponto de forma mais direta: "No caso de corretoras de criptomoedas, a alegação de que o encerramento de suas contas tem conotação concorrencial, supostamente relacionando suas atividades como uma alternativa de investimento/novos negócios para o ítaú Unibanco, não tem qualquer fundamento. A questão vai para muito além disso. De fato, considerando a situação regula tória imposta ás Instituições Financeiras, que lhes gera sérios riscos no caso de não observância, a situação é de regulamentação indefinida quanto â atividade das próprias corretoras de criptomoedas (alguns países regulam e outros proíbem referida atividade e entre os que regulam não há uniformidade de entendimento sobre a natureza jurídica da criotomoeda), sendo que em nosso País inexiste norma específica a respeito. Portanto, o ponto principal é a ausência de regulação quanto á comprovação e rastreabilidade (origem e destino) da criptomoeda, ou seja, de onde elas são geradas e para que elas são utilizadas, o que inequivocamente representa um risco não só para a Instituição Financeira contratada, mas para todo o Sistema Financeiro Nacional. Apesar do argumento libertário por trás das criptomoedas, que possuem como características intrínsecas (t) sua descentralidade, com total independência de um banco central, e (ii) seu anonimato, o risco representado pela ausência de uma regulação específica é inegável. Não raro, as criptomoedas estão diretamente envolvidas com polémicas, dentre as quais seu uso em produtos oferecidos na deep web, onde podem livremente ser utilizadas para financiar grupos terroristas, propiciar pagamento de sequestros, instrumentalízar pagamento de corrupção. (CONFIDENCIAL)." Essas mesmas afirmações também são destacadas, em maior ou menor proporção pelos demais bancos. 23 gcataw.com.br Ci
  • 25. VERSÃO PÚBLICA independente da ausência de regulação, mais inerentemente ligado às possibilidades que envolvem criptomoedas [..] como anonimato total de seus portadores de transferências internacionais, de fraudes, de pirâmides financeiras"." 59. A concordância com esse argumento, que já situa a atividade do segmento de criptoativos em posição precária perante a autoridade concorrencial, invariavelmente impactou a análise das justificativas apresentadas pelos bancos para praticar as condutas exclusionárias em face das corretoras de criptomoedas. Isso é, caso já se parta do pressuposto que os bancos estavam se posicionando contra atividade Ilícita, logo as medidas adotadas - apesar de exclusionárias - seriam adequadas e essenciais para resguardar a ordem e higidez do setor financeiro. 60. Não obstante, as informações trazidas aos autos a esse respeito não passam em uma análise mais criteriosa, muito menos comparativa com o sistema e índice de fraudes ocorridas no próprio sistema bancário. Não foi realizada uma análise efetiva desses supostos riscos para embasar essas conclusões, nem mesmo se analisou os reflexos de eventuais fraudes cometidas com criptomoedas com a atividade e as transações de intermediação de moeda efetivadas pelas corretoras. 61. A presunção de ilicitude adotada - além de inadmissível no ordenamento jurídico - se finca em pré concepções equivocadas sobre o setor de criptoativos e, pior, se transfere de modo ilimitado e indiscriminado para todos os agentes de mercado. Os argumentos utilizados para a pressuposição de ilegalidade da atividade se lastreiam apenas em notícias38 sobre a utilização de criptomoedas para atividades ilegais. E o argumento utilizado para tanto respalda-se basicamente (i) em um suposto anonimato absoluto, que garantiria a possibilidade de mais facilmente realizar transações ilícitas e (ii) na suposta impossibilidade de rastreamento de operações. Acerca desse segundo ponto, inclusive, o argumento é desvirtuado dado que a rastreabilidade 37 Item 333 da Nota Técnica 89/2019, SEI 0699660. 38 Nesse sentido, tanto o Itaú (itens 36, 37 e 69 da manifestação SEI 0670936) quanto o Santander (item 10 e ss da manifestação SEI 0699286) fazem alusão a notícias sobre o uso deturpado de criptomoedas como se apenas esse setor sofresse com atos ilegais. 24 gcataw.com.br c:• ci
  • 26. VERSÃO PÚBLICA é uma das características intrínsecas das criptomoedas. Além disso, o risco tão alardeado pelos bancos não passam de exemplos pontuais de uso de criptoativos para fins ilícitos. 62. Não é que não existam casos de fraudes e transações ilegais envolvendo criptomoedas - há sim relatos e, como será tratado adiante, o próprio Mercado Bitcoin possui mecanismos para identificar e reportar para as autoridades competentes. Esses casos, no entanto, não podem ser extrapolados para se concluir exceções como regra. As consequências de pessoas e empresas que desvirtuam a sua utilização não podem espraiar efeitos para a grande maioria das empresas que utilizam licitamente esses ativos. Aliás, o que se verifica na prática é que a utilização de criptoativos para essa finalidade não constitui, nem de longe, um patamar representativo para a avaliação do risco apresentado pelos bancos e assumido por essa SG. Na verdade, estudos revelam a baixa utilização do setor de criptoativos para finalidades ilícitas39, justamente pela possibilidade de rastreamento e mapeamento de informações de transações no blockchain: "Nonethetess, cryptocurrency's decentratized, semi-anonymous nature makes it a uniquely appeating option for criminaIs, and theír embrace of the technotogy has helped shape its overail reputation. But the upside is that unlike cash and other traditional forms of vatue transfer, cryptocurrency is inherently transparent. Every transaction is recorded in a publicty visible ledger. With the right tools, we can see how much of alI cryptocurrency activity is associated with crime, hone in on the types of crime that dominate the ecosystem, and share insights with law enforcement and the industry to curb its impact and stop bad actors from abusing the system and, in many cases, taking advantage of vutnerable people."4° 39 Situações relacionadas à utilização de criptomoedas com finalidades de financiamento de terrorismo são casos excepcionais que representam uma parcela muito pequena do total das transações efetuadas. A título de exemplo, em estudo encomendado pelo Parlamento Europeu constatou-se que apenas 3-4% de valores de origem ilícita foram introduzidos no sistema irregularmente a partir do uso de criptomoedas: There is also evidence suggestíng cryptocurrencies are increasingly usea' in money Iaundering schemes by organised criminal groups (OCGs). Rob Wainwright, the former director of Europol, has stated that cryptocurrencies comprise approximately ELIR 3 —4 billion, or three to four percent, of illicit proceeds Iaundered through Europe annually'i Estudo disponível em: https://bit.ly/2NVMCwc, acesso em 04/07/2020. 40 Trecho extraído de estudo produzido pela Chainanalysis, empresa líder no monitoramento de blockchain, intitulado The 2020 State of crypto crime: everything you need to know about darknet markets, exchange hacks, money laundering and more. Nesse estudo é apresentado um panorama geral sobre a atual conjuntura do uso de criptomoedas para fins ilícitos, tendo sido destacado que transações ilícitas compreendem apenas 1,1% de transações com criptomoedas (p.5). Dentre as diversas conclusões sobre o uso desse instrumento para finalidades ilícitas, são apresentados exemplos concretos de identificação de autores de crimes e ou o mapeamento de atividades ilícitas para colaborar com autoridades policiais, 25 gcataw.com.br G C/
  • 27. VERSÃO PÚBLICA 63. Nesse sentido, vale citar decisão da 51Corte de Apelações dos Estados Unidos que julgou caso criminal onde o infrator teria utilizado criptomoedas. A decisão destaca que é possível determinar o titular de uma carteira de criptomoedas somente a partir de análise da blockchain e isso foi feito pelas autoridades investigativas que contrataram um serviço para tanto. Dentre os vários pontos relevantes da decisão, destaca-se que (i) dados adicionais para a identificação do agente criminoso foram obtidas a partir de uma corretora de criptomoedas; e (ii) que travou-se discussão sobre confidencia[idade de dados financeiros de criptomoedas, onde fora reconhecido que o caráter público da blockchain reduziria a expetativa de privacidade. Ou seja, a utilizada para fins ilícitos é reduzida: The owners of the addresses are anonymous on the Bitcoin blockchain, but it is possibte to discover the owner of a Bitcoin address by analyzing the blockchain. For exampte, when an organization creates multiple Bitcoin addresses, it will often combine its Bitcoin addresses into a separate, central Bitcoin address (i.e., a "cluster"). It is possible to identify a "cluster' of Bitcoin addresses held by one organization by ana[yzing the Bitcoin blockchain's transaction history. Open source tools and private software products can be used to ana[yze a transaction. Federal agents used an outside service to analyze the publicLy viewable Bitcoin blockchain and identify a cluster of Bitcoin addresses controRed by the Website. Once they identified the Website's Bitcoin addresses, agents served a grandjury subpoena on Coinbase [.1. Further, Bitcoin users are unlikety to expect that the information published on the Bitcoin blockchain will be kept private, thus undercutting their claim of a "tegitimate expectation of privacy." E ... ] Granted, they enjoy a greater degree of privacy than those Mo use other money-transfer means, but it is well known that each Bitcoin transaction is recorded in a pubticly avaitable blockchain. Every Bitcoin user has access to the public Bitcoin blockchain and can see every Bitcoin address and its respective transfers. Due to this pubticity, it is possible to determine the identities of Bitcoin address owners by analyzing the blockchain 41 possível justamente pelo fato que a tecnologia do setor permite isso (vide, por exemplo, p. 19, 47 e 62). Disponível em: https://qo.chainalysis.com/rs/503 -FAP-074/images/2020-Crypto-crime-Report.pdf. 41 Disponível em: https://cases.justia.com/federal/appellate-courts/cas/19-50492/1 9-50492-2020-06- 30.pdf?ts= 1593559812, acesso em: 30/07/2020. 26 gcataw.com.br GCA
  • 28. VERSÃO PÚBLICA 64. Da mesma forma, não é possível afastar o uso recorrente do setor financeiro tradicional para fins de PLD/FT. Isso não é um impeditivo, no entanto, para que esse sistema continue operando regularmente e sem qualquer questionamento. Ainda que se alegue, no entanto, que as instituições financeiras tradicionais possuem e seguem regras de compifance capazes de assegurar o mínimo de segurança, o Mercado Bitcoin também segue e implementou as mesmas regras de compliance aplicáveis ao sistema financeiro tradicional, exatamente com o objetivo de garantir para seus clientes e para o mercado um nível adequado de confiabilidade na realização de suas transações. 65. Por essas razões, e diante de todo avanço da tecnologia disponível, bem como das inovações que a utilização de criptomoedas representa para o setor financeiro não é possível (i) tomar como premissa irremediável que a atividade de criptomoedas está envolvida, de forma generalizada, em operações de risco, por conta de uma pequena fração de operações ilícitas realizadas, tal como também ocorre com operações no sistema financeiro tradicional; (ii) ignorar que diversas corretoras de criptomoedas, inclusive o Mercado Bitcoin, também possuem e implementaram sistema de compliance hábil e capaz de detectar operações suspeitas, garantindo, portanto, a idoneidade de suas transações. a. AS CARACTERÍSTICAS DA TECNOLOGIA E OS MECANISMOS IMPLEMENTADOS PELAS CORRETORAS, NOTADAMENTE O MERCADO BITCOIN, CONFEREM UM NÍVEL DE SEGURANÇA COMPATÍVEL AO DO MERCADO FINANCEIRO TRADICIONAL 66. Uma análise um pouco mais aprofundada do funcionamento da tecnologia envolvendo criptomoedas, bem como dos procedimentos adotados pelas corretoras de criptomoedas é capaz de dirimir as dúvidas quanto à consistência e confiabilidade das transações envolvendo esses ativos. É necessário compreender a rastreabilidade, confidencialidade e identificação de beneficiários a partir de uma noção de camadas de segurança, que, conjuntamente, permitem o mapeamento das transações desse setor. 27 gcataw.com.br GCA
  • 29. VERSÃO PÚBLICA 67. Primeira camada. Cada unidade de criptomoeda é única e perene, equiparável a um bem infungível, pois há número [imitado de unidades que serão emitidas de cada tipo de moeda. Toda a cadeia de propriedade de cada moeda é registrada de forma delimitada no blockchain, tecnologia-base dos criptoativos, que funciona como registro público de todas as transações, sendo registradas as carteiras das contrapartes, sua validação, o volume transacionado e a data da transação. 68. O blockchain possibilita a identificação do "caminho" percorrido por cada moeda digital de forma individualizada, e em qual carteira ela se encontra a qualquer momento. Essa rastreabilidade é maior do que possível com cédulas físicas, onde determinada unidade pode ser retirada de circulação ou substituída por outra a qualquer momento, não havendo mapeamento de cédulas físicas. 69. É possível verificar na blockchain todas as transações envolvendo criptomoedas, identificando-se cada unidade de criptomoeda42 específica e todos os seus detentores ao longo do tempo. Não há, portanto, uma confidencialidade ou anonimato amplo e irrestrito sem qualquer forma de identificação de contrapartes, pois tendo acesso ao número da carteira de determinado usuário, logo será possível identificar todas as transações por ele realizadas43. Além da consulta pública da transação que pode ser feita via blockchain, o Mercado Bitcoin também contratou os 42 Acerca da imutabilidade dos dados da blockchain:"Blockchains are irnmutable, at Ieast in theory, and this is one aí their cost functionalities and uti/ities, rhat irreversibiiity aí the consensus and recors guarantees, once a transaction is recorded on the chain, to be indelibie as it is iinkned to every transaction record that carne before it. If that were to be changed under regulatory poiicy, blockchain would certain/y be kilíed." SCHREPEL, Thibautt.. Is blockchain the death of antitrust [aw?. Disponível em: https://papers.ssrn.com/sot3/papers.cfm?abstract_W=3193576, acesso em 30 de julho de 2020. 43 Esse ponto foi bem destacado por Kevin Werbach, Professor da Universidade de Pensilvânia, em artigo publicado no New York Times em julho/2018, onde destaca a rastreabilidade das criptomoedas: "Vet what makes Bitcoin and other cryptocurrencies appealing to criminais aiso limits their use fulness to thern. Bitcoin transaction records heiped investigators íind the Russian agerits under indictment To cover their tracks, the perpetrators aí the hacking scheme wouid have been better off using briefcases fuil oícash (..) Sanks know your pubiic identity, but they keep transaction speciíics secret Bitcoin does the opposite. Identities are represented with pri vate, seemingiy arbitrary strings aí ietters and numbers known as cíyptographic keys. Transactions, however, are public. Anyone can see how the money fiows. (..) The probíem for criminais is that it's possibie ta reconstruct Sitcain identities from transaction patterns. (..) That is also what heiped lead to the takedown in 2013 aí SiIk Road, a widely used anime marketp/ace for drug transactians and other iiiegai purchases. BTC-E, a Russian cryptacurrency exchange, iater became the piatíorm aí choice for criminais because it did not coiiect identification documents from its customers. BTC-E was shut down by American iaw eníorcement agencies iast year. As these exampies show, governments have more leverage over cryptocurrency markets than one might expect. 28 gcataw.com.br GCA
  • 30. VERSÃO PÚBLICA serviços oferecidos pela ferramenta [ACESSO RESTRITO] de rastreamento de transações envolvendo criptomoedas e que alerta a empresa para possíveis casos de transação Ilícita. 70. Essa ferramenta fornece dados e análise de blockchain em tempo real para agências governamentais, bolsas de valores e instituições financeiras em 40 países e é implementada para garantir a conformidade nas transações realizadas utilizando criptomoedas. Esse compartilhamento é feito de forma automática, via API (Application Programming Interface), com as seguintes agências: Cybrecrime Europol, Interpol, FBI, entre outras. 71. Segunda camada. Para acessarem a plataforma do Mercado Bitcoin, os clientes precisam realizar cadastro, momento em que diversas informações de identificação são solicitadas, tal como CPF válido ou CNPJ ativo, data de nascimento, endereço de e-mail válido, bem como, a depender da categoria de conta", documentos como: identidade com foto colorida, foto (selfie) contrato social, comprovantes de residência, comprovantes de renda e patrimônio, entre outros, de forma a garantir a origem e licitude dos valores transacionados na plataforma. 72. Além das informações exigidas de todos os seus usuários, o Mercado Bitcoin também mapeia e monitora pessoas politicamente expostas (PPE)45 que utilizam sua plataforma. Nesse sentido, e em conformidade com a Instrução CVM 563/08, Resolução COAF 16/07, Circular 3461/09 e Carta Circular 3430/10 do Bacen, o Mercado Bitcoin deve dedicar especial atenção a essas pessoas". A definição de PPEs abrange pessoas que desempenham ou tenham desempenhado, nos últimos 5 (cinco) anos), 44 Cada tipo de conta impõe aos seus usuários [imites específicos globais de valores que poderão ser transacionados na plataforma. Quanto mais exclusiva a categoria (i.e., que possibilita limites maiores para transações), maior o grau de documentação exigida para comprovação dos valores transacionados. Para mais informações, vide: https://www.mercadobitcoin.com.br/comissoes-prazos-limites. ' Todo cliente do Mercado Bitcoin é obrigado a se auto declarar como PEP no momento do cadastramento e o sistema de prevenção à lavagem de dinheiro contratado pela empresa confronta sua base de clientes com uma lista de PPE5. De tal forma, casa haja cliente que não tenha feito essa autodeclaração ele será mapeado e a partir de então será assim considerado nas análise de indícios de lavagem de dinheiro. 46 Pessoas politicamente expostas são sujeitas a maior escrutínio na plataforma a depender do volume transacionado, havendo classificação por tiers. [ACESSO RESTRITO] 29 gcataw.com.br Ci
  • 31. VERSÃO PÚBLICA cargos, empregos ou funções públicas relevantes, no Brasil ou em outros países, territórios e dependências estrangeiros, assim como seus representantes, familiares e outras pessoas de seu relacionamento próximo47. Todos os clientes dessa categoria são definidos pelo sistema como de alto risco de envolvimento com ilícitos associados a lavagem de dinheiro. Caso os indícios sejam consistentes o Compliance é responsável por comunicar aos órgãos reguladores. 73. A partir do cadastro o Mercado Bitcoin tem acesso aos dados de carteira de seus usuários, o que lhe permitirá, a partir da verificação da blockchain, identificar todas as transações realizadas por seus usuários, inclusive fora da sua plataforma, com essa carteira. Caso seja identificada alguma transação ilícita, [ACESSO RESTRITO], que identifica o cliente na base de cadastro, investiga e executa as devidas tratativas do caso. 74. O Mercado Bitcoin tem a capacidade de identificar a atividade de seus usuários, o que é feito não só para fins de PLD/FT, mas também para impedir fraudes realizados na plataforma. As corretoras, portanto, inserem camada adicional de segurança de controle de informações. 75. Terceira camada. O Mercado Bitcoin, de forma a aumentar o controle de transações efetuadas em sua plataforma, reduzindo risco de atividades ilícitos, implantou diversos mecanismos e softwares que avançam ainda mais no mapeamento e monitora me nto. 76. Na plataforma do Mercado Bitcoin foram implantados os seguintes gatilhos adicionais para flagrar transações potencialmente suspeitas: (1) qualquer transação com valor acima de [ACESSO RESTRITO] é automaticamente sinalizada para maior avaliação das suas contrapartes e padrões anteriores; (2) quaisquer transações que 47 São exemplos de situações que caracterizam relacionamento próximo e acarretam o enquadramento de cliente permanente como pessoa politicamente exposta: (i) Constituição de pessoa politicamente exposta como procurador ou preposto; e (ii) Controle, direto ou indireto, cliente pessoa jurídico por pessoa politicamente exposta. 30 gcataw.com.br Ci
  • 32. VERSÃO PÚBLICA não sejam compatíveis com as rendas do usuário cadastrado na plataforma, são automaticamente suspensas e sujeitas a avaliação da equipe de compliance do Mercado Bitcoin;" (3) transações realizadas por pessoas politicamente expostas sempre são sujeitas a maior escrutínio, tal como a verificação de mídias desabonadoras relacionadas a clientes, processos criminais, inclusão de clientes em listas restritivas da RFB, GAFI, CGU, OFAC, ONU, Interpol; e, finalmente (4) transações tidas como suspeitas. 77. O [ACESSO RESTRITO], por sua vez, foi instalado em 2017 para [ACESSO RESTRITO] Por essa razão, o Mercado Bitcoin trabalha com grau de probabilidade elevado em relação à certeza da origem lícita dos valores transacionados. 78. Quarta camada. Além dos referidos mecanismos, cumpre destacar o tratamento dos dados coletados, as políticas internas da empresa para lidar com o uso inadequado da plataforma para fins ilícitos, e o histórico de cooperação tanto com autoridades investigativas (e.g., COAF) quanto instituições financeiras (e.g., Banco do Brasil) na identificação e bloqueio de valores. 79. O Mercado Bitcoin possui: (i) Política de Prevenção à Lavagem de Dinheiro e Financiamento ao Terrorismo (Doc. 07); [ACESSO RESTRITO] e (v) Política de Gerenciamento de Gestão do Risco Corporativo (Doc. 10), acerca dos quais todos os seus funcionários são treinados. 80. Essas políticas auxiliam na identificação de transações suspeitas e como proceder quando confirmadas essas suspeitas. O Mercado Bitcoin possui departamento interno de compliance que, a partir de experiência adquirida, vem participando de diálogos interinstitucionais de PLD/FT. Nesse sentido, o Mercado Bitcoin 48 O Mercado Bitcoin confronta os valores declarados pelos seus clientes-usuários, [ACESSO RESTRITO] 49 A Política de Prevenção à Lavagem de Dinheiro ("PLD") apresenta diretrizes de conduta pelos funcionários do Mercado Bitcoin; estrutura cuidados adicionais para clientes-usuários que possam ser enquadrados como pessoas politicamente expostas ou suspeitas (know your client, vide item 8); dispõe sobre técnicas de identificação de indícios de lavagem de dinheiro; e sobre procedimento de monitoramento e denúncia de eventual caso flagrado. 31 gcataw.com.br GCA
  • 33. VERSÃO PÚBLICA obteve registro na plataforma do Coaf (Sistema de Controle de Atividades Financeiras - SISCOAF)50. 81. Quinta camada. Os mecanismos de controle implementados pelo Mercado Bitcoin resultaram no envio de cerca de [ACESSO RESTRITO] alertas que viraram objeto de investigações internas, dos quais em [ACESSO RESTRITO] casos foram confirmadas práticas ilícitas. Destes [ACESSO RESTRITO] casos, [ACESSO RESTRITO] trataram de fraudes, tendo o Mercado Bitcoin atuado para bloquear valores em suas contas para evitar a consumação do ilícito. Nesse sentido, a empresa destaca que, até a presente data, possui [ACESSO RESTRITO] bloqueados em sua plataforma; tendo sido [ACESSO RESTRITO]. 82. [ACESSO RESTRITO] 83. Sexta camada. Como já mencionado no acima (item 56), a Receita Federal, por meio das Instruções Normativas 1.888/2019 e 1.899/2019, impôs a obrigação de indivíduos declararem a titularidade de criptomoedas em seu imposto de renda, permitindo que a Receita Federal tenha dimensão ampla dos titulares de c ripto ativos. 84. Todas as camadas acima descritas dizem respeito unicamente a mecanismos e protocolos criados internamente pelas corretoras de criptomoedas ou impostos aos agentes que atuam nesse segmento. Nenhum dos filtros de segurança acima adotados e/ou advindos da própria tecnologia inerente às criptomoedas depende de qualquer atuação dos bancos. 85. Logo, é improcedente a alegação dos bancos, replicada pela SG/Cade, que as corretoras estariam delegando a fiscalização a terceiros. Eventual interação com os bancos poderia ajudar na criação de uma sétima camada de fiscalização, que seria ainda mais útil para as autoridades fiscalizadoras no combate a crimes referentes à ° Informações poderão ser verificadas no Sistema de Controle de Atividades Financeiras - SISCOAF: https://siscoaf.fazenda.gov.br/siscoaf-internet/pages/consuftaPO/consu LtarPO.jsf 32 gcataw.com.br GCA
  • 34. VERSÃO PÚBLICA PLD/FT. Embora isso tenha sido ignorado, o Mercado Bitcoin informa que tem histórico de atuação junto às instituições financeiras. Nesse sentido, a empresa possui diversos exemplos de atuação na identificação de transações suspeitas e fraudes, auxiliando bancos no bloqueio de valores. Atualmente, a empresa possui interação com cerca de 12 bancos para combater as práticas de transações ilícitas. 86. Em conclusão, os mecanismos expostos acima demonstram que as corretoras de criptomoedas podem e efetivamente monitoram as transações nas suas plataformas, interagindo com autoridades de fiscalização. Se o problema é efetivamente a "comprovação e rastreabilidade (origem e destino) da criptomoeda", o que representaria "um risco não só para a Instituição Financeira contratada, mas para todo o Sistema Financeiro Naciona!', os controles descritos são suficientes para amenizar qualquer preocupação quanto à credibilidade das transações realizadas na plataforma do Mercado Bitcoin. V. ANÁLISE DAS JUSTIFICATIVAS APRESENTADAS PELOS BANCOS DEMONSTRA A IRRACIONALIDADE DE SE JULGAR COMO ARRISCADA TODA ATIVIDADE DE CRIPTOMOEDAS 87. Os motivos apresentados para o encerramento e recusa de abertura de contas correntes não servem para justificar sua prática, principalmente no caso do Mercado Bitcoin. As práticas das Representadas, adotadas de forma genérica, ampla e irrestrita, tiveram como objeto um segmento e players específicos que, porventura, estivessem transgredindo normas aplicáveis. 88. A conduta indiscriminada contra um setor inteiro denota que não se trata de um exercício regular de direito, adotado por precaução, e uma suposta preocupação do setor financeiro de se resguardar sobre eventual responsabilização. O que há é um veto irrestrito a um setor específico, pois os motivos apresentados e parcialmente encampados não justificam as condutas denunciadas. 89. De forma a justificar a prática anticompetitiva adotada, as instituições financeiras alegaram que as atividades desenvolvidas no segmento cripto poderiam - 33 gcataw.com.br Ci
  • 35. VERSÃO PÚBLICA i.e., não necessariamente são - ser utilizadas com finalidades ilícitas, notadamente em vista da ausência de procedimentos como know your customer (i.e., mapeamento e monitoramento de usuários na plataforma e dados financeiros correspondentes) e PLD/FT (i.e., mecanismos de prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento de terrorismo). Os bancos alegam que o fato de esses mecanismos não serem adotados, tal como feito pelas instituições financeiras, seria um risco ao mercado financeiro como um todo e para a possível responsabilização dos bancos. 90. Contudo, os próprios bancos reconhecem que essa afirmação não seria aplicável ao setor como um todo, destacando que determinadas corretoras teriam adotado instrumentos de monitoramento em suas manifestações, como destacado pela SG/Cade51: É fato que, até o momento, não há obrigação legal, exceto pela recente IN REB 1888, ou regulação sobre as corretoras de criptomoedas, mas, em Linhas gerais, esta SG concorda com a argumentação dos Representados sobre a inadequação dessa abordagem de diversas corretoras de criptomoedas quanto à aplicação de políticas de PCLD. Ademais, a falta de uniformidade na apLicação de políticas de PCLD por parte das corretoras reforça a racionaLidade por trás dos encerramentos de contas de algumas corretoras de criptomoedas, haja vista que eta coloca em risco a segurança dos bancos aqui representados. Considerando as informações trazidas aos autos pelas corretoras de criptomoedas sobre suas políticas de PCLD, esta SG conclui que a intensidade de aplicação de políticas de PCLD por parte das corretoras não é uniforme, oscila, com exemplos de corretoras declarando não ter recursos para isso e, em outro extremo, algumas corretoras descrevendo políticas aparentemente bem desenhadas e efetivas, entre as quais, corretoras que atenderam as exigências (ACESSO RESTRITO AO CADE) para manter as contas correntes abertas. Na opinião desta SG, ao responder sobre medidas que adotam relacionadas a PCLD, predomina nas corretoras a percepção de que isso seria uma obrigação dos bancos e somente a aplicação de políticas de PCLD por parte dos bancos seria suficiente. E isso confirma a argumentação dos Representados quanto a não aplicação efetiva de normas de PCLD por parte das corretoras. Em suma, verifica-se a assimetria argumentada pelos Representados quanto à regulação e aplicação de políticas de PCLD." Si Item 328 da Nota Técnica n° 89/2019/CGAA2/SGA1/SG/cADE, registrada no SEI 0699660. 34 gcataw.com.br GICA
  • 36. VERSÃO PÚBLICA 91. Ou seja, tanto os bancos quanto a SG/Cade reconhecem que o motivo apresentado para justificar o encerramento ou recusa de abertura sequer se aplica a todos os agentes de mercado ao destacar a "falta de uniformidade". Não há, portanto, correlação direta entre a conduta das Representadas e o seu 'fato determinante'. 92. O Mercado Bitcoin possui mecanismos de compliance, notadamente sobre questões de PLD/FT e KYC, de forma a supervisionar as transações realizadas na sua plataforma e a sua potencial deturpação para fins ilícitos. Atualmente, a empresa possui departamento de compliance devidamente estruturado, tendo, inclusive, relações institucionais ativas com autoridades de investigação, tais como o COAF. Claramente, as supostas justificativas apresentadas pelas Representadas em sede do Inquérito Administrativo não se aplicam ao Mercado Bitcoín e, possivelmente, sequer a outras corretoras de criptomoedas que também possuem mecanismos internos estruturados. 93. Caso efetivamente houvesse suspeita de qualquer aspecto de lavagem de dinheiro, os bancos teriam o poder-dever de realizar denúncia e submetê-las ao escrutínio da autoridade competente. No caso, o Mercado Bitcoin jamais foi acionado por qualquer órgão do governo, notadamente aqueles responsáveis pela fiscalização de questões atreladas à lavagem de dinheiro, para prestar esclarecimentos em decorrência de denúncia. Isso é, ou não houve qualquer suspeita efetiva merecedora de denúncia, ou, caso houve, os órgãos de controle não identificaram qualquer situação que merecesse uma intervenção e/ou maior investigação. Logo, a alegação dos bancos carece de fundamento. 94. Em não havendo qualquer imputação específica ou constatação efetiva carente de maior escrutínio, o que há é uma recusa indiscriminada e discriminatória52 contra corretoras sem uma avaliação efetiva das condições concretas aplicáveis ao caso. Houve recusa de abertura ou encerramento indiscriminado e injustificado por um motivo genérico inexistente. A chancela dessas justificativas inaplicáveis implica, em última 52 A discriminação ocorreria exatamente no ponto em que os bancos estariam tratando de forma uniforme empresas / corretoras que estão em situação completamente diferente, alegando como nexo de causalidade do tratamento dispensado exatamente o fato que as distingue. 35 gcataw.com.br GCA
  • 37. VERSÃO PÚBLICA instância, conceder discricionariedade ampla aos bancos para praticarem encerramentos anticompetitivos, tal como ocorre no caso em tela. 95. Não se defende a impossibilidade de os bancos avaliarem situações de risco quando existentes de fato e, nesse caso, promoverem o encerramento de contas. O que se pleiteia, no entanto, é que os bancos não se utilizem de um subterfúgio de rigorismo regulatório para convenientemente promover o encerramento de atividades nascentes que competem com seus próprios serviços. Mesmo nos casos em que uma recusa seria 'aceitável', isso não significa autorização irrestrita, pelo simples fato de que os próprios bancos também sofrem com uso deturpado de seus serviços para fins de lavagem de dinheiro e/ou falhas em mecanismos internos de controle que possam implicar a sua responsabilização (e.g., vide os casos do Bradesco53, Banco do Brasil`, Caixa55 etc.56). 96. Nessa questão, inclusive, e conforme demonstrado no item III, acima, é preciso que se inverta a lógica incutida pelos bancos de que a atividade de criptomoedas implica risco sistêmico e irremediável. Esse racional, baseado praticamente em notícias de jornais, esparsas, que narram transações ilícitas realizadas com criptomoedas, não retrata a realidade do mercado. Como já demonstrado, no entanto, essas transações são exceções e não regra, e não podem macular todo o sistema. Caso contrário, poderiam ser trazidas aqui diversas outras notícias e informações de transações ilícitas e fraudes realizadas pelos sistema bancário, que existem mesmo com toda a regulação aventada, e que nem por isso ameaçam a credibilidade do sistema. O que se verifica, com isso, é que a conduta dos bancos é desproporcional e, como se verá adiante, possui caráter exclusionário. 53 Vide: https://economia.iq.com.br/2O2O-O6-01/banco-centra-mutia-bradesco-em-r-922-miLhoes.htmL https://noticias.uoLcom.br/iotitica/u ttimas-noticias/20 1 9/05/28/Lava-jato-gerentes-do-bradesco-cianham- rropina-para-aiudar-a-tavar-dinheiro.htm?cmrid=coriaecoa; e https://wwwl .folh&uoLcom.br/mercado/2020/06/bradesco-paciara-r-95-mi-ao-bc-por-falhas-na- comunicacao-de-operacoes-suspeitas-de-Lavaqem -de-dinheiro.shtm L 54 Vide: https://g 1 .globo.com/pr/parana/noticia/2020/04/27/tava -ato-ex-gerente-do-banco-do-brasiL-e- operadores-financeiros-sao-denunciados-por-Iavagem-de-dinheiro.ghtmt. 55 Vide: https://politica.estadao.com.br/noticias/gerat,caixa-admite-uso-de-Ioterias-em-Lavagem-de- dinheiro20070227p27790 56 Vide: https://noticias.uol.com.br/potitica/ultimas-roticias/2019/1 O/02/Lava- jato -tiga-5 -ma iores-baricos- do-pais-a-Lavagem-de-r-1 3-bilhao.htm. 36 gcaLaw.corn.br GCA
  • 38. VERSÃO PÚBLICA 97. O que se requer é que os bancos não promovam convenientemente um fechamento generalizado de contas. A aplicação indiscriminada e horizontal de regra singular e sem justificativa, direcionada claramente a um setor específico, é indício relevante de que os supostos motivos fundamentadores não se sustentam, fator esse que não foi analisado efetivamente pela SG/Cade. No caso, houve e há encerramentos e recusas de abertura de contas de forma anticompetitiva. VI. HÁ INCENTIVOS ECONÔMICOS PARA A CONDUTA EXCLUSIONÁRIA DOS BANCOS 98. Uma vez que as justificativas apresentadas pelos bancos parecem não se sustentar diante de uma análise mais aprofundada, aflorando-se, na verdade, desproporcionais para os fins que pretendem proteger, é importante então entender os incentivos econômicos que justificam a conveniência da exclusão, por parte dos bancos, de uma competição nascente para, então, se determinar as consequências dessa conduta para as corretoras de criptomoedas e para a concorrência. 99. Como se verá, os bancos têm incentivos e há, portanto, racional anticompetitivo para o encerramento e recusa de abertura de contas correntes para corretoras de criptomoedas. Mais que isso, há efetivamente efeitos exclusionários sobre esse sistema que envolve pagamentos, transações e até investimentos, razão pela qual a conduta é anticompetitiva. 100. Em primeiro lugar, a conduta impacta substancialmente a atividade das corretoras pois cria barreiras desnecessárias para a realização de transações comuns. As corretoras funcionam como ponto de intersecção entre moedas fiat e moedas virtuais, de forma que necessitam de acesso a contas correntes para que conseguir intermediar um número significativo de transações. No caso, os usuários que utilizam a plataforma do Mercado Bitcoin transferem valores para a conta corrente da empresa, a qual faz a conversão da quantia depositada em montante equivalente da criptomoeda. 37 gcataw.com.br GCA
  • 39. VERSÃO PÚBLICA 101. Ao longo da investigação desenvolvida por essa SG/Cade, essa questão foi tratada como de "menor importância" porque isso seria apenas um 'inconveniente'17 para as corretoras, mas que o efeito seria sanado pelo fato de que bastaria a corretora ter acesso a apenas uma conta, em um único banco, para que ela pudesse continuar desenvolvendo suas atividades normalmente - bastante apenas o pagamento de TED/DOC para realização de transferências de usuários que não detenham conta no banco escolhido. 102. Ocorre, no entanto, que esse pequeno "inconveniente", na visão dos bancos, acarretou e ainda acarreta prejuízos significativos para a atividades das corretoras de criptomoedas. Não só por esse motivo, como se verá abaixo, mas a conduta dos bancos expulsa e repele usuários desse modelo de negócios, já que são os usuários (muitos deles pessoas físicas) que precisam suportar os custos dessas transações. Ao final, pequenos investidores, por exemplo, que precisam imputar esse custo em cada transação, se veem desincentivados a investir em criptomoedas, optando por outras formas de investimento - o que inclusive confirma a efetiva concorrência entre criptomoedas e outros ativos também para esse fim. 103. No final das contas, os usuários se veem desincentivados a comprar esse tipo de moeda virtual, simplesmente pelos custos envolvidos na transferência e transição para moedas fiat. A elevação desses custos de transação para os usuários finais precisa ser analisada pelo Cade, dado ser este um dos principais efeitos econômicos de uma prática anticompetitiva. A fuga desses usuários causa prejuízos relevantes também para as corretoras e pode assim ser mensurada. 104. Ou seja, um dos principais efeitos da prática é exatamente a exclusão de usuários desse sistema de transações. Mais que isso, a conduta dos bancos impacta diretamente também a liquidez do sistema. Basicamente, conforme explicado no item II, uma das grandes vantagens oferecidas pelo sistema de criptomoedas é a possibilidade 57 "Assim, na opinião desta SG, pode-se dizer que o encerramento de uma conta corrente pode ser visto apenas como uma inconveniência, pois existem diversos outros bancos instalados no pais onde é possível abrir uma conta corrente, podendo também serem consideradas instituições de pagamento como eventuais alternativas a uma conta corrente", item 305 da Nota Técnica 89/2019, SEI 0699660. 38 gcataw.com.br Ci
  • 40. VERSÃO PÚBLICA de fechamento de transações nos 7 (sete) dias da semana, 24 (vinte e quatro) horas por dia. O benefício de ser um sistema 24/7 é que isso garante agilidade e dinamismo para as criptomoedas, na medida em que os usuários, no mundo inteiro, podem transacionar entre si a qualquer momento, sem a necessidade de se aguardar um dia útil para efetivação da operação". 105. Ao limitar o acesso a diversas contas bancárias, os bancos também afetam o coração desse sistema, já que operações entre bancos diferentes (TED/DOC) também precisam aguardar a liquidação em dia/horário útil. Ou seja, apesar de as transações poderem continuar sendo feitas em criptomoedas em 24/7, a transição da moeda virtual para fiat apenas pode ocorrer em dias/horário útil em virtude da limitação que os bancos impõem para que as corretoras possam ter contas correntes nas diversas Instituições financeiras. 106. Mais do que um mero "inconveniente", a conduta dos bancos cria entraves significativos para Investidores interessados em operar no mercado de criptomoedas em dias/horários não úteis para o sistema bancário tradicional, e acaba por impedir a entrada de uma franja de pequenos usuários que não utilizam ou transferem grandes valores e, por isso, se veem desincentivados a utilizar essa tecnologia alternativa. 107. Por fim, a conduta dos bancos impacta algo ainda mais importante, que é a credibilidade do sistema e das próprias corretoras. Os bancos têm conhecimento da tecnologia, eles sabem do crescimento e das facilidades que a inovação do sistema 58 Um dos principais atrativos do segmento de criptoativos - que reforça a dependência do segmento em várias contas correntes de diversas instituições financeiras - é o fato que o sistema, por ser 'descentralizado' opera 24 horas por dia 7 dias por semanas, sem qualquer interrupção ou limitaçâo de horário imposta pelo Sistema de Pagamentos Brasileiro, que possui prazos delimitados e instituições que operam com horários distintos para os seus correntistas. O setor tradicional está justamente migrando para esse sistema ininterrupto de pagamentos e transferências entre usuários e até estabelecimentos, como resta claro pela inauguração do sistema Pix de pagamentos instantâneos do Banco Central, vide: https://www.bcb.gov.br/content/estabilidadefinanceira/foru mpireunioes/Pix.pdf. Igualmente, cumpre destacar a parceria estabelecia entre o Facebook, cielo e agentes do setor financeiro para oferecer pagamentos via aplicativo de mensagens (i.e., WhatsApp), como já escrutinizado pelo próprio Cade (e.g., http://www.cade.gov.br/noticias/cade-revoga -suspensao -de- parceria-entre-facebooke -cielo - para- pagamentos-por-whatsapp). 39 gcataw.com.br c:- c,
  • 41. VERSÃO PÚBLICA de criptoativos trouxe para o mercado, e eles têm pleno conhecimento sobre o potencial de crescimento desse tipo de transações entre os usuários do sistema financeiro tradicional. Ao tentar, com toda a sua força, minar a credibilidade desse sistema e evitar que corretoras tenham contas correntes nos principais bancos, os bancos conseguem (como tem conseguido até o momento) evitar a expansão dessa tecnologia. Isso porque, assim como eles fizeram nesse caso, eles conseguem incutir a ideia de que atividades com criptoativos são ilícitas. 108. A resistência dos bancos, nesse quesito, tem propósitos adicionais à simples exclusão de corretoras desse tipo de transação, embora os principais efeitos recaia sobre as corretoras. É claro o propósito de impedir, efetivamente, o avanço dessa tecnologia e inovação, que tenderá a substituir, não completamente, mas em alguma medida, as transações que antes poderiam ser realizadas dentro do sistema bancário tradicional. Isto porque, contrapartes que estão negociando e transacionando por criptomoedas, por exemplo, estão deixando de transacionar dentro do sistema bancário, deixando também de pagar as altíssimas tarifas impostas pelos bancos e, com isso, reduzindo a rotatividade interna do dinheiro. 109. A racionalidade da conduta, independente de qual a roupagem fornecida pelos bancos, é a de impedir o desenvolvimento e a credibilidade de um sistema inovativo e alternativo, que certamente compete com o próprio sistema bancário. O prejuízo, novamente, ultrapassa a barreira das próprias corretoras, mas recai substancialmente sobre os usuários, sobre os quais são criadas barreiras adicionais para acesso a essa plataforma alternativa de transação. 110. Tendo isso em vista, e muito embora os bancos convenientemente acenem para uma questão de compliance, a verdade é que a própria justificativa apontada pelos bancos é parte de sua estratégia para impedir o crescimento da plataforma de criptomoedas e, consequentemente, das próprias corretoras que operam e criam a ponte para ambos os segmentos do mercado. Os bancos atuam de forma racional ao encerrar as contas das corretoras de criptomoedas, uma vez que isso lhes 40 gcataw.com.br GCA