O documento discute a estratégia comercial brasileira no exterior e argumenta que o foco nas "relações Sul-Sul" impediu o Brasil de avançar em acordos com os principais mercados globais. Defende que o agronegócio brasileiro pode ampliar suas oportunidades em novos mercados por meio de uma estratégia multilateral mais abrangente.
Nematoides são responsaveis por perdas de até 30% dos canaviais
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1. Revista Canavieiros - Junho de 2016
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Ponto de Vista II
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promissoras, tendo em vista a fragilida-
de da economia brasileira. No acumula-
do do ano até abril, a demanda por com-
bustíveis de Ciclo Otto caiu 2% sobre
2015, e, no caso do hidratado, a redução
foi de 13%, muito inluenciada pelos
elevados preços na entressafra (piora
da paridade com a gasolina). Ainda que
esperemos que o consumo por hidrata-
do já tenha voltado a crescer no mês de
maio sobre as médias do início do ano,
diante da desvalorização das cotações
do produto, o consumo total do ano
deve oscilar ao redor ou até um pouco
abaixo do que foi observado em 2015.
Mesmo assim, a melhor remuneração
do ATR para o açúcar sugere um preço
sombra maior pelo etanol, possibilitan-
do uma preciicação média melhor por
esse combustível em 2016. Não se pode
descartar também a possibilidade de um
novo aumento da CIDE, o que abriria a
possibilidade para uma provável eleva-
ção do etanol, e o que poderia compen-
sar perdas de competitividade com o im
do crédito presumido de PIS/Coins.
É nesse contexto que a situação do se-
tor sucroenergético tende a voltar a me-
lhorar e, consequentemente, a dos forne-
cedores de cana. De acordo com nossas
estimativas, preços do ATR no acumula-
do da safra acima de R$0,60/kg de ATR
já voltam a propiciar margens bem su-
periores às observadas nos últimos anos.
Além disso, o risco de crédito, ou seja,
de pagamento pelo volume de ATR en-
tregue à usina, também deverá cair.
Essa expectativa de melhora de mar-
gens e o alívio que isso trará ao bolso
do produtor devem abrir uma boa opor-
tunidade de “colocar a casa em ordem”.
Isso signiica voltar a investir na reno-
vação de canaviais e a adotar práticas
agronômicas e tecnologias de ponta,
visando sempre a elevar os níveis de
produtividade e, portanto, a eiciência
da operação. O relexo disso será a me-
lhora da competitividade do fornecedor,
tornando-o mais forte para enfrentar
períodos de “vacas magras” que podem
assolar o setor no futuro.
*analista sênior na Diretoria de
Produtores Rurais do Itaú BBA
Agora vamos para o século XXI
Coriolano Xavier*
Coriolano Xavier
D
ê no que der a questão do im-
peachment daqui a 166 dias,
toda a fervura política para a
organização de uma nova governan-
ça brasileira já provocou um resultado
positivo: a discussão da estratégia co-
mercial brasileira no exterior, que, nos
últimos 10 a 15 anos, priorizou as “re-
lações Sul-Sul”, dando peso maior aos
países emergentes (além do Mercosul).
Muitos acham que foi um equívoco,
pois teria impedido o país de avançar
em acordos multilaterais com os polos
mais dinâmicos da economia mundial –
uma tendência que marcou o comércio
global na última década, com o impasse
das negociações no âmbito da OMC –
Organização Mundial do Comércio.
Tanto é que, nesse período, lores-
ceram vários pactos multilaterais de
comércio em todos os continentes, até
o recente e gigante Tratado Transpací-
ico, entre EUA, Japão e mais dez paí-
ses (2015), envolvendo economias que
representam cerca de 40% da produção
mundial. Foram cerca de 80 Acordos
Internacionais Preferenciais de Comér-
cio desde 2005 e, de um modo geral, o
Brasil esteve fora desse jogo, apesar de
ser uma das grandes potencias do mun-
do. Pior: os países com os quais temos
acordos representam somente cerca de
10% do comércio mundial.
Agora, parece que esse tema voltou à
pauta e já se falam em estratégias para
se fortalecerem exportações, por meio
de acordos comerciais com os principais
mercados do mundo. Uma boa notícia
é que o agronegócio engaja-se nesse
debate com fé e atitude. Apesar do pro-
tagonismo atual do Brasil no comércio
internacional de produtos agropecuários,
o setor ainda pode construir muito em
termos de oportunidades em novos mer-
cados e integração nas cadeias globais
de produção alimentar e de ibras.
Não vamos ter ilusões: em todo o
mundo, o Brasil é visto como potência
do agronegócio. Portanto, o país não
terá vida fácil em negociações globais
como a OMC. De outro lado, o Brasil
é, ao mesmo tempo, um parceiro rele-
vante e pode buscar oportunidades e
alianças estratégicas em todo o globo.
E não se pode pensar pequeno em uma
hora dessas. Claro que é fundamental
crescer e rentabilizar o comércio bra-
sileiro de commodities agropecuárias,
pois temos uma expertise única nisso,
mas também é preciso “descomoditi-
zar” e comercializar produtos e serviços
de valor agregado, como mostram casos
bem-sucedidos como o da rede Giraffas
(fast food e casual food) nos Estados
Unidos. Ou o exemplo da Agropecu-
ária AH, que produz café com certi-
icação internacional, conferindo um
diferencial de origem ao seu produto,
que hoje está abastecendo diretamente
clientes europeus. Sem falar das opor-
tunidades em inteligência agropecuária
tropical, como uma EMBRAPA ou um
pequeno CEA-IAC, cuja expertise em
avaliação de equipamentos para prote-
ção de cultivos já cruzou o Atlântico.
Esses são apenas alguns exemplos.
O agronegócio tem muitos outros e
pode ampliar o seu papel de protagonis-
ta também sob esse novo olhar para o
nosso comércio internacional. Ainal, o
país é o segundo maior player do co-
mércio agrícola mundial (atrás apenas
dos EUA) e tem muito a dar (e a ga-
nhar) em uma real estratégia multila-
teral de comércio exterior. Em política
comercial, o Brasil precisa entrar dei-
nitivamente no século XXI.
*Vice-Presidente de Comunicação do
CCAS (Conselho Cientíico para Agricul-
tura Sustentável), professor do Núcleo de
Estudos do Agronegócio da ESPM.