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ARTIGO DE REVISÃO
Asma e rinite ocupacionais – visão imunoalérgica
Occupational asthma and rhinitis – immunoallergic view
Clóvis E S Galvão
Resumo
Objetivo: Revisar as características clínicas e diagnósticas
da asma e da rinite ocupacionais, citando dados epidemiológi-
cos e particularidades na terapêutica, com ênfase nos aspectos
imunológicos que devem ser considerados na visão do alergis-
ta.
Fonte de Dados: Revisamos periódicos específicos na área
de alergia e imunologia nos últimos 10 anos (1999-2009), con-
siderando principalmente as publicações em inglês, indexadas
no Medline e capítulos de livros.
Síntese de Dados: São apresentados os aspectos epide-
miológicos, clínicos e diagnósticos das doenças respiratórias
ocupacionais alérgicas (asma e rinite), e ainda as caracterís-
ticas dos agentes ocupacionais mais comumente envolvidos,
descrevendo resumidamente os mecanismos imunológicos e
não imunológicos responsáveis pelo quadro clínico.
Conclusões: A maioria dos quadros de asma/rinite ocupa-
cionais envolvem mecanismos imunológicos com ou sem a par-
ticipação de anticorpos IgE, sendo que os quadros IgE media-
dos correspondem a menos que 5% do total, o que limita o uso
de testes alérgicos no diagnóstico. O padrão ouro para a con-
firmação diagnóstica seria, portanto a provocação específica
que reproduz a exposição no ambiente de trabalho, indepen-
dentemente do mecanismo envolvido. A abordagem multipro-
fissional é muitas vezes necessária para restabelecer a quali-
dade de vida do trabalhador afetado.
Rev. bras. alerg. imunopatol. 2010; 33(1):02-07 asma, rini-
te, doenças ocupacionais, aspectos imunológicos.
Abstract
Objective: To review the clinical and diagnostic features of
occupational asthma and rhinitis, showing epidemiological data
and a summarized therapy, with emphasis on immunological
aspects that should be considered in view of the allergist.
Sources of data: The author reviewed specific journals in
the field of allergy and immunology in the last 10 years (1999-
2009), considering the publications in english, indexed in Me-
dline and also book chapters.
Summary of data: The author reported epidemiological,
clinical and diagnostic data of work-related allergic respiratory
diseases (asthma and rhinitis), and also the characteristics of
the most commonly involved occupational agents, describing
briefly the immunological and not immunological mechanisms
responsible for the cases.
Conclusions: Most of the cases of occupational asthma/rhi-
nitis involve immunological mechanisms with or without the
participation of IgE antibodies, and the IgE-mediated cases
correspond to less than 5% of the total, which limits the use of
allergy tests in the diagnosis. The gold standard for diagnostic
confirmation is therefore the specific challenge tests that in-
tend to reproduce the exposure in the workplace, regardless of
the mechanism involved. A multidisciplinary approach is often
necessary to restore the quality of life of the affected workers.
Rev. bras. alerg. imunopatol. 2010; 33(1):02-07 asthma,
rhinitis, occupational diseases, immunological aspects.
Médico Assistente e Professor Colaborador do Serviço/Disciplina de
Imunologia Clínica e Alergia do Hospital das Clínicas da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo - HC/FMUSP
Artigo submetido em 09.03.2010, aceito em 18.04.2010.
Introdução
Com os novos hábitos de vida, o indivíduo adulto tem
passado muito mais tempo no seu ambiente de trabalho,
onde fica exposto a uma variedade de substâncias poten-
cialmente irritativas e imunogênicas que podem causar do-
enças. Esta maior exposição tem sido considerada um dos
fatores associados ao aumento da prevalência das doenças
ocupacionais. Na verdade, o risco do trabalhador desenvol-
ver doenças devido à exposição a diferentes substâncias
presentes no ambiente de trabalho é conhecido desde a
antiguidade. A incidência das doenças respiratórias ocupa-
cionais é subestimada tanto pela dificuldade de confirma-
ção diagnóstica como pela relutância do trabalhador que
muitas vezes não procura um serviço médico para confir-
mar o diagnóstico com receio de perder o emprego. Mesmo
assim, o crescente aumento observado na incidência das
doenças ocupacionais, vem chamando cada vez mais a
atenção da área de saúde para o ambiente de trabalho.
Nas duas últimas décadas foi observado um considerável
avanço na área das doenças ocupacionais através da iden-
tificação de novos agentes, métodos diagnósticos e de no-
vos conhecimentos sobre sua fisiopatologia e história natu-
ral.
Quando o mecanismo patogênico envolvido nestes qua-
dros ocupacionais é imunológico, por exemplo, uma reação
de hipersensibilidade, pode-se dizer que se trata de uma
alergia ocupacional. Clinicamente os trabalhadores expos-
tos podem desenvolver alergias ocupacionais respiratórias,
como asma e rinite ocupacionais, bem como quadros cutâ-
neos representados principalmente pelas dermatites de
contato ocupacionais. A seguir, citaremos as principais ca-
racterísticas de doenças respiratórias alérgicas desenvolvi-
das no ambiente de trabalho, descrevendo os principais as-
pectos da asma e rinite ocupacionais, como seu diagnóstico
e tratamento, comentando ainda os fatores e/ou situações
de risco, bem como os agentes causadores, enfatizando a
visão imunoalérgica para estas doenças ocupacionais.
Asma Ocupacional
Definição e epidemiologia
Por definição, a asma ocupacional (AO) é caracterizada
pela limitação variável ao fluxo de ar e/ou hiperreatividade
10/33-01/2
Rev. bras. alerg. imunopatol.
Copyright © 2010 by ASBAI
02
das vias aéreas devido a causas e condições presentes, es-
pecificamente, no ambiente de trabalho e não a estímulos
encontrados fora deste1
. A AO foi descrita inicialmente por
Ramazzini no início do século XVIII, e após um período
prolongado com raras publicações a respeito, observou-se
um interesse crescente e renovado sobre esta condição
com os estudos de Jack Pepys, que entre 1960 e 1980 des-
creveu numerosos casos de asma ocupacional2
. É conside-
rada a pneumopatia ocupacional mais prevalente, corres-
pondendo a 26% a 52% das doenças respiratórias ocupa-
cionais nos países industrializados, mas esta freqüência po-
de variar dependendo do tipo de ocupação e do país estu-
dado. Nos EUA, por exemplo, a AO é responsável por 5% a
15% dos quadros de asma em adultos do sexo masculino3
.
Atualmente, o termo asma relacionada ao trabalho é
considerado o mais adequado, pois abrange as duas situa-
ções que podem ser encontradas: 1) asma ocupacional -
que se desenvolve como o resultado direto da exposição no
ambiente de trabalho, nestes casos o paciente geralmente
não apresenta história pessoal prévia de asma, e o início
do quadro clinico se dá na idade adulta; 2) asma agravada
no ambiente de trabalho - quando o indivíduo tem história
de asma pré-existente que piora em decorrência da exposi-
ção a substâncias presentes no trabalho. Ressaltamos que
a história prévia de asma não descarta o diagnóstico de as-
ma ocupacional, pois deve ser levado em conta se o agente
etiológico é o mesmo responsável pelo quadro clínico ante-
rior.
Mecanismos fisiopatológicos e agentes ocupacio-
nais
Dois tipos de asma ocupacional têm sido descritos: AO
caracterizada por um intervalo de tempo entre o início da
exposição e o aparecimento dos sintomas – período de la-
tência – que pode variar de semanas a vários meses; e AO
sem período de latência, onde os sintomas aparecem logo
após a exposição ao agente causador.
A AO com período de latência é a forma clínica mais co-
mum, geralmente causada por substâncias naturais e sin-
téticas de alto peso molecular como proteínas animais e fa-
rinhas, e algumas de baixo peso molecular como sais de
platino e anidridos. Geralmente, envolvem mecanismo
imunológico que pode ser: IgE dependente - agentes ocu-
pacionais induzem a produção de anticorpos específicos da
classe IgE, caracterizando assim a presença de uma Rea-
ção de Hipersensibilidade Tipo I (alergia clássica); ou me-
canismo imunológico não mediado por IgE - nestes casos,
a maioria dos agentes tem baixo peso molecular como os
isocianatos e o ácido plicático e induzem AO por mecanis-
mo imunológico IgE independente, pois existem evidências
de influxo de células inflamatórias e liberação de mediado-
res nas vias aéreas sem demonstrar a participação consis-
tente de IgE específica. Este mecanismo não está comple-
tamente esclarecido, mas são descritos fenômenos imuno-
lógicos como: desgranulação inespecífica de mastócitos,
fixação de complemento e infiltrado de células T2
.A AO sem
latência geralmente envolve mecanismo não imunológico e
é classicamente desencadeada por mecanis-mos irritativos
que incluem irritação direta na mucosa das vias aéreas,
lesão tóxica desencadeada por exposição a al-tas
concentrações de agentes ocupacionais ou ainda efeitos
farmacológicos dos irritantes que podem induzir broncoes-
pasmo. Neste grupo está incluída a Síndrome da Disfunção
Reativa das Vias Aéreas que se segue a uma exposição
aguda a grandes quantidades de fumaças e gases tóxicos
como a amônia. Nestes casos, acredita-se que a descama-
ção do epitélio resulte em inflamação das vias aéreas, de-
vido à perda dos fatores relaxantes derivados do epitélio e
exposição e estimulação de terminações nervosas (inflama-
ção neurogênica)4
.
A AO induzida por diferentes mecanismos também dife-
re em muitos outros aspectos como na apresentação clíni-
ca, característica dos trabalhadores em risco, tipo de rea-
ção produzida na broncoprovocação, entre outros que es-
tão resumidos no Quadro 1, onde observa-se que embora a
asma por mecanismo imunológico seja a mais freqüente os
quadros que envolvem reações mediadas por IgE são mi-
noria.
Quadro 1 - Categorias de asma ocupacional e suas principais características.
Modificado de Chan-Yeung M et al., 19956
.
Existe uma relação dose-resposta entre o grau de expo-
sição e o desenvolvimento de AO demonstrada para vários
agentes como cedro vermelho e colofônia, embora esta
correlação não esteja clara para todos os agentes ocupa-
cionais. Não está estabelecido ainda se picos de exposição
ou exposições menores por mais tempo seriam mais rele-
Asma com latênciaCaracterísticas
IgE dependente IgE Independente
Asma sem latência
Tempo de
Exposição
Longo Curto Em horas
Resposta à
Provocação
Imediata ou
Bifásica
Tardia Desconhecida
Prevalência Menor 5% Maior 5% Desconhecida
Fatores
Predisponentes
Atopia, fumo Desconhecidos Desconhecidos
Ativação de
linfócitos
++++ ++++ +
Ativação de
eosinófilos
++++ +++
Fibrose Subepitelial + + ++++
Espasmo de
Membrana Basal
++++ ++++ ++++
Descamação
epitelial
+ + ++++
Asma e rinite ocupacionais – visão imunoalérgica Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 33, Nº 1, 2010 03
vantes na indução da sensibilização e desenvolvimento de
AO5
.
Alguns estudos mostram que o nível de exposição ao
agente causal é um fator importante para o desenvolvi-
mento de AO, entretanto, observa-se que apenas uma par-
te dos trabalhadores desenvolve sensibilização ou AO,
mesmo considerando um nível de exposição semelhante.
Estes achados sugerem que alguns fatores de susceptibili-
dade ligados ao próprio indivíduo estão também envolvi-
dos. Nos quadros que envolvem agentes de alto peso mo-
lecular, a atopia tem sido constantemente associada, já o
tabagismo tem sido associado ao desenvolvimento de AO
em trabalhadores expostos a sais de platina e compostos
de anidridos que possuem peso molecular mais baixo5
.
Até o momento mais de 400 substâncias já foram des-
critas como agentes ocupacionais, que incluem produtos
naturais e sintéticos encontrados em diferentes processos
industriais. Estes agentes causam asma através de meca-
nismos imunológicos com a participação ou não de IgE. A
AO sem período de latência, induzida por irritantes, é cau-
sada principalmente por gases irritantes, como cloro e
amônia. O Quadro 2 apresenta os principais agentes ocu-
pacionais envolvidos no desenvolvimento de AO6
.
Quadro 2 - Agentes ocupacionais envolvidos na Asma Ocupacional com período de latência.
Modificado de Chan-Yeung M et al., 19956
.
Quadro clínico e Diagnóstico
A manifestação clínica dos sintomas e a prevalência de
sensibilização diferem de acordo com a natureza do agen-
te. De uma maneira geral, quando consideramos a história
natural da AO que envolve mecanismos imunológicos, os
sintomas rinoconjuntivais e a presença de hiperreatividade
brônquica podem preceder os sintomas das vias aéreas in-
feriores. O desenvolvimento dos sintomas pode ocorrer
após algumas semanas até vários anos, e a duração da
exposição tende a ser mais curta para os produtos quími-
cos de baixo peso molecular2
. A Figura 1 resume a história
natural da AO com período de latência.
Modificado de Malo JL, Chan-Yeung M, 20012
Figura 1 - História natural da asma ocupacional com período de latência.
AGENTE CAUSADOR PROFISSÕES DE RISCO
Agentes de Alto PM
Cereais Padeiros e moleiros
Proteínas de animais Tratadores, técnicos de laboratório
Enzimas Padeiros, limpeza, farmácia
Látex Área da saúde
Agentes de Baixo PM
Isocianatos Tintas, plásticos, espumas,
borrachas
Madeiras Marcineiros, movelaria
Anidridos Plásticos, resina-epoxi
Metais Refinarias, soldadores
Corantes Confecções
Formaldeído,glutaraldeído Hospital
Persulfato de amônia Cabeleireiros
04 Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 33, Nº 1, 2010 Asma e rinite ocupacionais – visão imunoalérgica
Na investigação diagnóstica dos quadros de AO, pelo
menos duas etapas diferentes devem ser consideradas. No
primeiro momento, o objetivo é confirmar o diagnóstico de
asma através da história clínica e dos testes de função pul-
monar. A seguir, o objetivo passa a ser o estabelecimento
do nexo causal, e consequentemente do diagnóstico etioló-
gico, através da broncoprovocação específica e testes imu-
nológicos, e da monitorização seriada do pico de fluxo ex-
piratório.
O diagnóstico de AO deve ser considerado em todo indi-
víduo com asma que se inicia na idade adulta. Clássica-
mente, na história clínica de AO o trabalhador queixa-se de
piora dos sintomas no ambiente de trabalho, melhorando
nos finais de semana e feriados, entretanto, este padrão
nem sempre está presente. Em alguns casos, os sintomas
são mais intensos após o fim da jornada de trabalho, às
vezes com despertar noturno, e os finais de semana po-
dem não ser longos o suficiente para permitir melhora. Ati-
vidades profissionais anteriores podem estar relacionadas
com o quadro, portanto, o histórico ocupacional do indiví-
duo deve ser considerado, não apenas o emprego atual.
Somente uma história sugestiva de AO, mesmo em tra-
balhador exposto a um sensibilizante conhecido, não é su-
ficiente para fechar o diagnóstico, sendo necessários testes
objetivos adicionais. Sempre que possível uma visita ao lo-
cal de trabalho deve ser realizada, pois ao descrever suas
atividades muitas vezes o trabalhador inconscientemente
omite informações importantes para o diagnóstico7
.
Obstrução reversível do fluxo de ar e/ou aumento da hi-
perreatividade brônquica na presença de espirometria nor-
mal confirmam o diagnóstico de asma, mas não de AO.
Quando a broncoprovocação inespecífica com histamina ou
carbacol/metacolina é realizada com o paciente trabalhan-
do e/ou sintomático, e o resultado é negativo, a AO está
afastada7
.
Em boa parte dos casos, a broncoprovocação específica
não pode ser realizada. A literatura sugere então a realiza-
ção da medida seriada do pico de fluxo expiratório (PFE)
que deve ser feita com o indivíduo trabalhando e afastado
do trabalho, pelo mesmo período de tempo. A medida se-
riada do PFE depende muito da colaboração do trabalha-
dor, que deve ser orientado a registrar 3 a 4 medidas diá-
rias no ambiente de trabalho e fora dele. O período mínimo
de monitorização deve ser de 2 semanas para permitir al-
guma conclusão. A sensibilidade e a especificidade desta
abordagem são de 64% e 77% respectivamente, segundo
alguns autores8
.
A broncoprovocação específica é considerada o padrão
ouro para o diagnóstico de AO, pois permite reproduzir sob
condições controladas a exposição do trabalhador em seu
ambiente de trabalho. O método pode ser realizado em la-
boratório ou no próprio local de trabalho. Estes testes de-
vem ser realizados por médicos e equipe treinados, com
equipamentos para atendimento de reações sistêmicas
graves sempre disponíveis. Não existe um protocolo pa-
drão, mas recomendações gerais com relação ao procedi-
mento devem ser seguidas. Broncodilatadores devem ser
suspensos antes do procedimento, que nunca é realizado
em pacientes sintomáticos ou com VEF1 abaixo de 70% do
predito7
.
Os testes imunológicos, como a determinação da IgE es-
pecífica in vivo e in vitro, têm valor limitado na AO pela fal-
ta de reagentes padronizados comercialmente disponíveis,
e mesmo quando disponíveis, estes reagentes são úteis
apenas na avaliação dos casos mediados por IgE. O diag-
nóstico de AO induzida por irritantes é baseado inteiramen-
te na história clínica e na demonstração de obstrução do
fluxo de ar e hiperreatividade brônquica, ou ambas. Geral-
mente, há história de exposição a grandes quantidades de
determinado agente, seguida por sintomas respiratórios,
na ausência de história prévia de asma2
. Duas novas técni-
cas, a medida do óxido nítrico exalado e a análise do es-
carro induzido, têm sido propostas como métodos não in-
vasivos para avaliar o processo inflamatório e auxiliar no
diagnóstico precoce da AO, porém mais estudos são ainda
necessários antes de preconizar o seu uso na prática clínica
diária9
.
A figura 2 mostra o algoritmo para a abordagem diag-
nóstica do paciente com suspeita de AO no ambulatório de
alergia ocupacional do serviço de alergia do Hospital das
Clínicas, onde dispomos de uma cabine de provocação de-
senhada especialmente para as provocações específicas,
onde é possível controlar diferentes variáveis durante o
teste.
Tratamento
As conseqüências sociais da confirmação do diagnóstico
de asma ocupacional são importantes tanto para o traba-
lhador quanto para o empregador. Os órgãos envolvidos
com previdência e seguridade social exigem diagnóstico
bem documentado através de testes precisos e objetivos
antes de aceitarem um pedido relacionado à AO. A partir
de então, programas de reabilitação adequados devem ser
oferecidos ao trabalhador. Uma vez que o diagnóstico de
AO é confirmado e o trabalhador é afastado da exposição,
o tratamento medicamentoso deve ser iniciado consideran-
do as particularidades de cada caso e seguindo os consen-
sos e diretrizes para o tratamento da asma não-ocupacio-
nal, de acordo com a intensidade do quadro. A fim de obter
melhora clínica e prevenir piora no prognóstico da asma, é
essencial afastar o trabalhador da exposição ao agente
causal. Estudos mostram que a permanência do trabalha-
dor no local de trabalho, ou quando ele permanece exposto
ao agente ocupacional envolvido, agrava o prognóstico da
asma. Aproximadamente 75% dos trabalhadores com AO
permanecem com hiperreatividade brônquica, mesmo após
a remoção da exposição ao agente causal, embora a inten-
sidade dos sintomas seja geralmente leve10
.
Rinite ocupacional
Definição e epidemiologia
A rinite ocupacional (RO) é caracterizada pela presença
de sintomas nasais associados à exposição no ambiente de
trabalho aos agentes de alto ou baixo peso molecular e/ou
substâncias irritantes. Assim como na asma ocupacional,
pode envolver mecanismos imunológicos ou não. Esta con-
dição geralmente coexiste com asma ocupacional e, na
verdade, tem sido apontada como um estágio inicial do
comprometimento das vias aéreas; se a exposição ao
agente persiste a RO pode evoluir para asma, embora os
relatos de RO evoluindo para asma não sejam unânimes na
literatura11
.
A prevalência varia muito entre os diferentes estudos
analisados devido aos critérios usados para o diagnóstico,
a aérea geográfica e o tipo de agente ocupacional e da
ocupação. Entre funcionários de laboratórios de pesquisa
em uma universidade expostos à cobaias, a prevalência foi
de 42% para sintomas auto-relatados de rinite relaciona-
dos ao trabalho, 15% para provável RO (sintomas de rinite
+ testes cutâneos positivos para animais), 6% para RO
confirmada por provocação específica. Estes resultados
confirmam a baixa especificidade dos questionários de sin-
tomas para diagnóstico de RO12
. A incidência de sintomas
rinoconjuntivais relacionados ao trabalho é maior nos pri-
meiros 12 a 20 meses de atividade profissional e aumenta
com a duração da exposição até um período de 24 meses.
Este curto período de latência sugere a necessidade de
maior vigilância nos primeiros anos de exposição. História
de sintomas atópicos é comum em trabalhadores que de-
senvolvem RO alérgica, chamando a atenção para atopia
como um fator de risco para o desenvolvimento de RO11
.
Asma e rinite ocupacionais – visão imunoalérgica Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 33, Nº 1, 2010 05
Figura 2 - Fluxograma para diagnóstico de asma ocupacional
Mecanismos fisiopatológicos
A inflamação das vias aéreas nasais pode ocorrer atra-
vés de sensibilização específica, irritação aguda ou crônica
da mucosa, ou ambos. As sensibilizações aos compostos de
alto peso molecular são classicamente mediadas pela IgE,
enquanto a sensibilização aos de baixo peso molecular en-
volve tanto resposta IgE mediada como outras por meca-
nismos menos esclarecidos. Agentes irritantes como partí-
culas grandes, gases hidrossolúveis e vapores levam à le-
são direta da mucosa, sem o envolvimento de resposta
imunológica específica11
. A exposição a substâncias como a
fumaça de cigarro, formol e capsaicina, resulta na liberação
de neuropeptídeos como a Substância P que são neuro-
transmissores responsáveis pelo desencadeamento de res-
posta inflamatória neurogênica13
.
Em 1995, Bardana14
sugeriu uma classificação para RO:
1) Incômoda (do inglês annoyance) – ocorre quando o indi-
víduo apresenta sensibilidade olfativa muito alta, apresen-
tando sintomas quando se expõe a substâncias como per-
fumes e detergentes; 2) Irritativa – definida quando ocorre
inflamação inespecífica no nariz sem envolver mecanismos
imunológicos mais elaborados ou alérgicos; 3) Corrosiva –
ocorre após exposição a altas concentrações de gases quí-
micos solúveis e irritantes, como cloro e amônia, que oca-
siona inflamação intensa com lesão da mucosa nasal e al-
terações permanentes nas funções fisiológicas do nariz, co-
mo o olfato; 4) Alérgica (ou imunológica) que pode envol-
ver mecanismo mediado por IgE e outros.
Quadro clínico e Diagnóstico
Os sintomas da RO são os mesmos das outras rinites, e
aparecem como resultado da resposta da mucosa nasal a
estímulos externos do ambiente de trabalho. Assim, o indi-
víduo acometido vai apresentar a congestão nasal resul-
tante da vasodilatação e do aumento da permeabilidade
vascular; o prurido e os espirros decorrentes da estimula-
ção nervosa sensorial; e a coriza, como resultado da esti-
mulação das glândulas e do aumento da permeabilidade
vascular13
. Mesmo nos grupos de risco para RO, a alta fre-
quência dos sintomas de rinite pode levar a uma incidência
superestimada, portanto, é essencial a confirmação do ne-
xo causal entre o agente ocupacional suspeito e os sinto-
mas através de medidas objetivas.
O teste cutâneo de leitura imediata pode ser usado para
avaliar a presença de sensibilização, e só significa doença
se as manifestações clínicas forem associadas à sensibiliza-
ção demonstrada no teste. Além disso, a maioria dos agen-
tes ocupacionais não dispõe de extratos padronizados para
a realização destes testes que ajudam apenas na avaliação
dos casos mediados por IgE11
. Assim, a nasoprovocação
específica, realizada sob condições controladas, seria o mé-
todo mais adequado para a confirmação diagnóstica de RO.
A resposta à nasoprovocação pode ser medida através de
escore de sintomas, análise de mediadores inflamatórios e
avaliação da congestão nasal através de rinomanometria,
rinometria acústica e pico de fluxo inspiratório nasal15,16
.
Este procedimento, entretanto, carece de uma melhor pa-
dronização tanto na sua realização, como na interpretação,
e não é realizado na rotina da maioria dos centros.
Tratamento
A abordagem mais eficaz para o controle da RO seria
evitar a exposição ao agente ocupacional quando o mesmo
é identificado. Para o controle dos sintomas devem-se se-
guir as recomendações convencionais de farmacoterapia
Reavaliar o diagnóstico
Broncoprovocação inespecífica
História Sugestiva de Asma ocupacional
Negativa
Positiva
Diagnóstico etiológico/Nexo causalidentificado
não identificado
Teste cutâneo/RAST
negativo
positivo
Asma
Ocupacional
Provocação
positivonegativo Asma não
Ocupacional
Monitorar PEF
sugestivo não
sugestivo
Espirometria
Asma Não
Ocupacional
-Adaptado de Malo & Chan-Yeung, 20012
.
06 Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 33, Nº 1, 2010 Asma e rinite ocupacionais – visão imunoalérgica
com antihistamínicos e corticóides tópicos nasais, de acor-
do com diretrizes e consensos vigentes para as rinites alér-
gicas não ocupacionais. Entre as medidas preconizadas pa-
ra evitar ou diminuir a exposição, temos a substituição do
agente ocupacional causal por outra substância, melhoria
das condições de ventilação da área de trabalho, redução
do tempo de exposição e o uso de equipamentos de prote-
ção individual pelo trabalhador17
.
Considerações finais
Os quadros respiratórios associados ao ambiente de tra-
balho podem ser considerados alérgicos quando envolvem
mecanismos imunológicos. Muitos estudos têm sido reali-
zados com o objetivo de entender melhor os fatores de ris-
co relacionados ao agente ocupacional, ao ambiente de tra-
balho e ao próprio trabalhador, na tentativa de desenvolver
métodos mais precisos para seu diagnóstico e tratamento.
Quanto mais precocemente esta condição é diagnosticada,
melhor é o prognóstico para o trabalhador. Cada vez mais
está sendo valorizada a abordagem multiprofissional com a
participação não apenas de profissionais da área de saúde,
mas também de engenheiros, higienistas, assistentes so-
ciais, psicólogos considerando o importante impacto sócio-
-econômico das doenças ocupacionais para os trabalhado-
res e para a sociedade em geral. Portanto, lidando com as
doenças ocupacionais o médico alergista tem a oportunida-
de de praticar a medicina preventiva, pois identificando
substâncias no ambiente de trabalho que podem causar
doenças, várias intervenções podem ser propostas em be-
nefício de outros trabalhadores que ainda não adoeceram.
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17. Hellgren J, Karlsson G, Toren K. The dilemma of occupational
rhinitis: management options. Am J Respir Med 2003: 2:333-
41.
Correspondencia:
Clóvis E S Galvão
Av Dr Eneas de Carvalho Aguiar, 155 – 8º andar, Bloco 3
Cerqueira Cesar
05403-000 - São Paulo – SP
Fone: 0XX-11-3069.6098
Fax: 0XX-11-3069.7975
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Asma e rinite ocupacionais – visão imunoalérgica Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 33, Nº 1, 2010 07

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Asma e rinite ocupacionais – visão imunoalérgica

  • 1. ARTIGO DE REVISÃO Asma e rinite ocupacionais – visão imunoalérgica Occupational asthma and rhinitis – immunoallergic view Clóvis E S Galvão Resumo Objetivo: Revisar as características clínicas e diagnósticas da asma e da rinite ocupacionais, citando dados epidemiológi- cos e particularidades na terapêutica, com ênfase nos aspectos imunológicos que devem ser considerados na visão do alergis- ta. Fonte de Dados: Revisamos periódicos específicos na área de alergia e imunologia nos últimos 10 anos (1999-2009), con- siderando principalmente as publicações em inglês, indexadas no Medline e capítulos de livros. Síntese de Dados: São apresentados os aspectos epide- miológicos, clínicos e diagnósticos das doenças respiratórias ocupacionais alérgicas (asma e rinite), e ainda as caracterís- ticas dos agentes ocupacionais mais comumente envolvidos, descrevendo resumidamente os mecanismos imunológicos e não imunológicos responsáveis pelo quadro clínico. Conclusões: A maioria dos quadros de asma/rinite ocupa- cionais envolvem mecanismos imunológicos com ou sem a par- ticipação de anticorpos IgE, sendo que os quadros IgE media- dos correspondem a menos que 5% do total, o que limita o uso de testes alérgicos no diagnóstico. O padrão ouro para a con- firmação diagnóstica seria, portanto a provocação específica que reproduz a exposição no ambiente de trabalho, indepen- dentemente do mecanismo envolvido. A abordagem multipro- fissional é muitas vezes necessária para restabelecer a quali- dade de vida do trabalhador afetado. Rev. bras. alerg. imunopatol. 2010; 33(1):02-07 asma, rini- te, doenças ocupacionais, aspectos imunológicos. Abstract Objective: To review the clinical and diagnostic features of occupational asthma and rhinitis, showing epidemiological data and a summarized therapy, with emphasis on immunological aspects that should be considered in view of the allergist. Sources of data: The author reviewed specific journals in the field of allergy and immunology in the last 10 years (1999- 2009), considering the publications in english, indexed in Me- dline and also book chapters. Summary of data: The author reported epidemiological, clinical and diagnostic data of work-related allergic respiratory diseases (asthma and rhinitis), and also the characteristics of the most commonly involved occupational agents, describing briefly the immunological and not immunological mechanisms responsible for the cases. Conclusions: Most of the cases of occupational asthma/rhi- nitis involve immunological mechanisms with or without the participation of IgE antibodies, and the IgE-mediated cases correspond to less than 5% of the total, which limits the use of allergy tests in the diagnosis. The gold standard for diagnostic confirmation is therefore the specific challenge tests that in- tend to reproduce the exposure in the workplace, regardless of the mechanism involved. A multidisciplinary approach is often necessary to restore the quality of life of the affected workers. Rev. bras. alerg. imunopatol. 2010; 33(1):02-07 asthma, rhinitis, occupational diseases, immunological aspects. Médico Assistente e Professor Colaborador do Serviço/Disciplina de Imunologia Clínica e Alergia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - HC/FMUSP Artigo submetido em 09.03.2010, aceito em 18.04.2010. Introdução Com os novos hábitos de vida, o indivíduo adulto tem passado muito mais tempo no seu ambiente de trabalho, onde fica exposto a uma variedade de substâncias poten- cialmente irritativas e imunogênicas que podem causar do- enças. Esta maior exposição tem sido considerada um dos fatores associados ao aumento da prevalência das doenças ocupacionais. Na verdade, o risco do trabalhador desenvol- ver doenças devido à exposição a diferentes substâncias presentes no ambiente de trabalho é conhecido desde a antiguidade. A incidência das doenças respiratórias ocupa- cionais é subestimada tanto pela dificuldade de confirma- ção diagnóstica como pela relutância do trabalhador que muitas vezes não procura um serviço médico para confir- mar o diagnóstico com receio de perder o emprego. Mesmo assim, o crescente aumento observado na incidência das doenças ocupacionais, vem chamando cada vez mais a atenção da área de saúde para o ambiente de trabalho. Nas duas últimas décadas foi observado um considerável avanço na área das doenças ocupacionais através da iden- tificação de novos agentes, métodos diagnósticos e de no- vos conhecimentos sobre sua fisiopatologia e história natu- ral. Quando o mecanismo patogênico envolvido nestes qua- dros ocupacionais é imunológico, por exemplo, uma reação de hipersensibilidade, pode-se dizer que se trata de uma alergia ocupacional. Clinicamente os trabalhadores expos- tos podem desenvolver alergias ocupacionais respiratórias, como asma e rinite ocupacionais, bem como quadros cutâ- neos representados principalmente pelas dermatites de contato ocupacionais. A seguir, citaremos as principais ca- racterísticas de doenças respiratórias alérgicas desenvolvi- das no ambiente de trabalho, descrevendo os principais as- pectos da asma e rinite ocupacionais, como seu diagnóstico e tratamento, comentando ainda os fatores e/ou situações de risco, bem como os agentes causadores, enfatizando a visão imunoalérgica para estas doenças ocupacionais. Asma Ocupacional Definição e epidemiologia Por definição, a asma ocupacional (AO) é caracterizada pela limitação variável ao fluxo de ar e/ou hiperreatividade 10/33-01/2 Rev. bras. alerg. imunopatol. Copyright © 2010 by ASBAI 02
  • 2. das vias aéreas devido a causas e condições presentes, es- pecificamente, no ambiente de trabalho e não a estímulos encontrados fora deste1 . A AO foi descrita inicialmente por Ramazzini no início do século XVIII, e após um período prolongado com raras publicações a respeito, observou-se um interesse crescente e renovado sobre esta condição com os estudos de Jack Pepys, que entre 1960 e 1980 des- creveu numerosos casos de asma ocupacional2 . É conside- rada a pneumopatia ocupacional mais prevalente, corres- pondendo a 26% a 52% das doenças respiratórias ocupa- cionais nos países industrializados, mas esta freqüência po- de variar dependendo do tipo de ocupação e do país estu- dado. Nos EUA, por exemplo, a AO é responsável por 5% a 15% dos quadros de asma em adultos do sexo masculino3 . Atualmente, o termo asma relacionada ao trabalho é considerado o mais adequado, pois abrange as duas situa- ções que podem ser encontradas: 1) asma ocupacional - que se desenvolve como o resultado direto da exposição no ambiente de trabalho, nestes casos o paciente geralmente não apresenta história pessoal prévia de asma, e o início do quadro clinico se dá na idade adulta; 2) asma agravada no ambiente de trabalho - quando o indivíduo tem história de asma pré-existente que piora em decorrência da exposi- ção a substâncias presentes no trabalho. Ressaltamos que a história prévia de asma não descarta o diagnóstico de as- ma ocupacional, pois deve ser levado em conta se o agente etiológico é o mesmo responsável pelo quadro clínico ante- rior. Mecanismos fisiopatológicos e agentes ocupacio- nais Dois tipos de asma ocupacional têm sido descritos: AO caracterizada por um intervalo de tempo entre o início da exposição e o aparecimento dos sintomas – período de la- tência – que pode variar de semanas a vários meses; e AO sem período de latência, onde os sintomas aparecem logo após a exposição ao agente causador. A AO com período de latência é a forma clínica mais co- mum, geralmente causada por substâncias naturais e sin- téticas de alto peso molecular como proteínas animais e fa- rinhas, e algumas de baixo peso molecular como sais de platino e anidridos. Geralmente, envolvem mecanismo imunológico que pode ser: IgE dependente - agentes ocu- pacionais induzem a produção de anticorpos específicos da classe IgE, caracterizando assim a presença de uma Rea- ção de Hipersensibilidade Tipo I (alergia clássica); ou me- canismo imunológico não mediado por IgE - nestes casos, a maioria dos agentes tem baixo peso molecular como os isocianatos e o ácido plicático e induzem AO por mecanis- mo imunológico IgE independente, pois existem evidências de influxo de células inflamatórias e liberação de mediado- res nas vias aéreas sem demonstrar a participação consis- tente de IgE específica. Este mecanismo não está comple- tamente esclarecido, mas são descritos fenômenos imuno- lógicos como: desgranulação inespecífica de mastócitos, fixação de complemento e infiltrado de células T2 .A AO sem latência geralmente envolve mecanismo não imunológico e é classicamente desencadeada por mecanis-mos irritativos que incluem irritação direta na mucosa das vias aéreas, lesão tóxica desencadeada por exposição a al-tas concentrações de agentes ocupacionais ou ainda efeitos farmacológicos dos irritantes que podem induzir broncoes- pasmo. Neste grupo está incluída a Síndrome da Disfunção Reativa das Vias Aéreas que se segue a uma exposição aguda a grandes quantidades de fumaças e gases tóxicos como a amônia. Nestes casos, acredita-se que a descama- ção do epitélio resulte em inflamação das vias aéreas, de- vido à perda dos fatores relaxantes derivados do epitélio e exposição e estimulação de terminações nervosas (inflama- ção neurogênica)4 . A AO induzida por diferentes mecanismos também dife- re em muitos outros aspectos como na apresentação clíni- ca, característica dos trabalhadores em risco, tipo de rea- ção produzida na broncoprovocação, entre outros que es- tão resumidos no Quadro 1, onde observa-se que embora a asma por mecanismo imunológico seja a mais freqüente os quadros que envolvem reações mediadas por IgE são mi- noria. Quadro 1 - Categorias de asma ocupacional e suas principais características. Modificado de Chan-Yeung M et al., 19956 . Existe uma relação dose-resposta entre o grau de expo- sição e o desenvolvimento de AO demonstrada para vários agentes como cedro vermelho e colofônia, embora esta correlação não esteja clara para todos os agentes ocupa- cionais. Não está estabelecido ainda se picos de exposição ou exposições menores por mais tempo seriam mais rele- Asma com latênciaCaracterísticas IgE dependente IgE Independente Asma sem latência Tempo de Exposição Longo Curto Em horas Resposta à Provocação Imediata ou Bifásica Tardia Desconhecida Prevalência Menor 5% Maior 5% Desconhecida Fatores Predisponentes Atopia, fumo Desconhecidos Desconhecidos Ativação de linfócitos ++++ ++++ + Ativação de eosinófilos ++++ +++ Fibrose Subepitelial + + ++++ Espasmo de Membrana Basal ++++ ++++ ++++ Descamação epitelial + + ++++ Asma e rinite ocupacionais – visão imunoalérgica Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 33, Nº 1, 2010 03
  • 3. vantes na indução da sensibilização e desenvolvimento de AO5 . Alguns estudos mostram que o nível de exposição ao agente causal é um fator importante para o desenvolvi- mento de AO, entretanto, observa-se que apenas uma par- te dos trabalhadores desenvolve sensibilização ou AO, mesmo considerando um nível de exposição semelhante. Estes achados sugerem que alguns fatores de susceptibili- dade ligados ao próprio indivíduo estão também envolvi- dos. Nos quadros que envolvem agentes de alto peso mo- lecular, a atopia tem sido constantemente associada, já o tabagismo tem sido associado ao desenvolvimento de AO em trabalhadores expostos a sais de platina e compostos de anidridos que possuem peso molecular mais baixo5 . Até o momento mais de 400 substâncias já foram des- critas como agentes ocupacionais, que incluem produtos naturais e sintéticos encontrados em diferentes processos industriais. Estes agentes causam asma através de meca- nismos imunológicos com a participação ou não de IgE. A AO sem período de latência, induzida por irritantes, é cau- sada principalmente por gases irritantes, como cloro e amônia. O Quadro 2 apresenta os principais agentes ocu- pacionais envolvidos no desenvolvimento de AO6 . Quadro 2 - Agentes ocupacionais envolvidos na Asma Ocupacional com período de latência. Modificado de Chan-Yeung M et al., 19956 . Quadro clínico e Diagnóstico A manifestação clínica dos sintomas e a prevalência de sensibilização diferem de acordo com a natureza do agen- te. De uma maneira geral, quando consideramos a história natural da AO que envolve mecanismos imunológicos, os sintomas rinoconjuntivais e a presença de hiperreatividade brônquica podem preceder os sintomas das vias aéreas in- feriores. O desenvolvimento dos sintomas pode ocorrer após algumas semanas até vários anos, e a duração da exposição tende a ser mais curta para os produtos quími- cos de baixo peso molecular2 . A Figura 1 resume a história natural da AO com período de latência. Modificado de Malo JL, Chan-Yeung M, 20012 Figura 1 - História natural da asma ocupacional com período de latência. AGENTE CAUSADOR PROFISSÕES DE RISCO Agentes de Alto PM Cereais Padeiros e moleiros Proteínas de animais Tratadores, técnicos de laboratório Enzimas Padeiros, limpeza, farmácia Látex Área da saúde Agentes de Baixo PM Isocianatos Tintas, plásticos, espumas, borrachas Madeiras Marcineiros, movelaria Anidridos Plásticos, resina-epoxi Metais Refinarias, soldadores Corantes Confecções Formaldeído,glutaraldeído Hospital Persulfato de amônia Cabeleireiros 04 Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 33, Nº 1, 2010 Asma e rinite ocupacionais – visão imunoalérgica
  • 4. Na investigação diagnóstica dos quadros de AO, pelo menos duas etapas diferentes devem ser consideradas. No primeiro momento, o objetivo é confirmar o diagnóstico de asma através da história clínica e dos testes de função pul- monar. A seguir, o objetivo passa a ser o estabelecimento do nexo causal, e consequentemente do diagnóstico etioló- gico, através da broncoprovocação específica e testes imu- nológicos, e da monitorização seriada do pico de fluxo ex- piratório. O diagnóstico de AO deve ser considerado em todo indi- víduo com asma que se inicia na idade adulta. Clássica- mente, na história clínica de AO o trabalhador queixa-se de piora dos sintomas no ambiente de trabalho, melhorando nos finais de semana e feriados, entretanto, este padrão nem sempre está presente. Em alguns casos, os sintomas são mais intensos após o fim da jornada de trabalho, às vezes com despertar noturno, e os finais de semana po- dem não ser longos o suficiente para permitir melhora. Ati- vidades profissionais anteriores podem estar relacionadas com o quadro, portanto, o histórico ocupacional do indiví- duo deve ser considerado, não apenas o emprego atual. Somente uma história sugestiva de AO, mesmo em tra- balhador exposto a um sensibilizante conhecido, não é su- ficiente para fechar o diagnóstico, sendo necessários testes objetivos adicionais. Sempre que possível uma visita ao lo- cal de trabalho deve ser realizada, pois ao descrever suas atividades muitas vezes o trabalhador inconscientemente omite informações importantes para o diagnóstico7 . Obstrução reversível do fluxo de ar e/ou aumento da hi- perreatividade brônquica na presença de espirometria nor- mal confirmam o diagnóstico de asma, mas não de AO. Quando a broncoprovocação inespecífica com histamina ou carbacol/metacolina é realizada com o paciente trabalhan- do e/ou sintomático, e o resultado é negativo, a AO está afastada7 . Em boa parte dos casos, a broncoprovocação específica não pode ser realizada. A literatura sugere então a realiza- ção da medida seriada do pico de fluxo expiratório (PFE) que deve ser feita com o indivíduo trabalhando e afastado do trabalho, pelo mesmo período de tempo. A medida se- riada do PFE depende muito da colaboração do trabalha- dor, que deve ser orientado a registrar 3 a 4 medidas diá- rias no ambiente de trabalho e fora dele. O período mínimo de monitorização deve ser de 2 semanas para permitir al- guma conclusão. A sensibilidade e a especificidade desta abordagem são de 64% e 77% respectivamente, segundo alguns autores8 . A broncoprovocação específica é considerada o padrão ouro para o diagnóstico de AO, pois permite reproduzir sob condições controladas a exposição do trabalhador em seu ambiente de trabalho. O método pode ser realizado em la- boratório ou no próprio local de trabalho. Estes testes de- vem ser realizados por médicos e equipe treinados, com equipamentos para atendimento de reações sistêmicas graves sempre disponíveis. Não existe um protocolo pa- drão, mas recomendações gerais com relação ao procedi- mento devem ser seguidas. Broncodilatadores devem ser suspensos antes do procedimento, que nunca é realizado em pacientes sintomáticos ou com VEF1 abaixo de 70% do predito7 . Os testes imunológicos, como a determinação da IgE es- pecífica in vivo e in vitro, têm valor limitado na AO pela fal- ta de reagentes padronizados comercialmente disponíveis, e mesmo quando disponíveis, estes reagentes são úteis apenas na avaliação dos casos mediados por IgE. O diag- nóstico de AO induzida por irritantes é baseado inteiramen- te na história clínica e na demonstração de obstrução do fluxo de ar e hiperreatividade brônquica, ou ambas. Geral- mente, há história de exposição a grandes quantidades de determinado agente, seguida por sintomas respiratórios, na ausência de história prévia de asma2 . Duas novas técni- cas, a medida do óxido nítrico exalado e a análise do es- carro induzido, têm sido propostas como métodos não in- vasivos para avaliar o processo inflamatório e auxiliar no diagnóstico precoce da AO, porém mais estudos são ainda necessários antes de preconizar o seu uso na prática clínica diária9 . A figura 2 mostra o algoritmo para a abordagem diag- nóstica do paciente com suspeita de AO no ambulatório de alergia ocupacional do serviço de alergia do Hospital das Clínicas, onde dispomos de uma cabine de provocação de- senhada especialmente para as provocações específicas, onde é possível controlar diferentes variáveis durante o teste. Tratamento As conseqüências sociais da confirmação do diagnóstico de asma ocupacional são importantes tanto para o traba- lhador quanto para o empregador. Os órgãos envolvidos com previdência e seguridade social exigem diagnóstico bem documentado através de testes precisos e objetivos antes de aceitarem um pedido relacionado à AO. A partir de então, programas de reabilitação adequados devem ser oferecidos ao trabalhador. Uma vez que o diagnóstico de AO é confirmado e o trabalhador é afastado da exposição, o tratamento medicamentoso deve ser iniciado consideran- do as particularidades de cada caso e seguindo os consen- sos e diretrizes para o tratamento da asma não-ocupacio- nal, de acordo com a intensidade do quadro. A fim de obter melhora clínica e prevenir piora no prognóstico da asma, é essencial afastar o trabalhador da exposição ao agente causal. Estudos mostram que a permanência do trabalha- dor no local de trabalho, ou quando ele permanece exposto ao agente ocupacional envolvido, agrava o prognóstico da asma. Aproximadamente 75% dos trabalhadores com AO permanecem com hiperreatividade brônquica, mesmo após a remoção da exposição ao agente causal, embora a inten- sidade dos sintomas seja geralmente leve10 . Rinite ocupacional Definição e epidemiologia A rinite ocupacional (RO) é caracterizada pela presença de sintomas nasais associados à exposição no ambiente de trabalho aos agentes de alto ou baixo peso molecular e/ou substâncias irritantes. Assim como na asma ocupacional, pode envolver mecanismos imunológicos ou não. Esta con- dição geralmente coexiste com asma ocupacional e, na verdade, tem sido apontada como um estágio inicial do comprometimento das vias aéreas; se a exposição ao agente persiste a RO pode evoluir para asma, embora os relatos de RO evoluindo para asma não sejam unânimes na literatura11 . A prevalência varia muito entre os diferentes estudos analisados devido aos critérios usados para o diagnóstico, a aérea geográfica e o tipo de agente ocupacional e da ocupação. Entre funcionários de laboratórios de pesquisa em uma universidade expostos à cobaias, a prevalência foi de 42% para sintomas auto-relatados de rinite relaciona- dos ao trabalho, 15% para provável RO (sintomas de rinite + testes cutâneos positivos para animais), 6% para RO confirmada por provocação específica. Estes resultados confirmam a baixa especificidade dos questionários de sin- tomas para diagnóstico de RO12 . A incidência de sintomas rinoconjuntivais relacionados ao trabalho é maior nos pri- meiros 12 a 20 meses de atividade profissional e aumenta com a duração da exposição até um período de 24 meses. Este curto período de latência sugere a necessidade de maior vigilância nos primeiros anos de exposição. História de sintomas atópicos é comum em trabalhadores que de- senvolvem RO alérgica, chamando a atenção para atopia como um fator de risco para o desenvolvimento de RO11 . Asma e rinite ocupacionais – visão imunoalérgica Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 33, Nº 1, 2010 05
  • 5. Figura 2 - Fluxograma para diagnóstico de asma ocupacional Mecanismos fisiopatológicos A inflamação das vias aéreas nasais pode ocorrer atra- vés de sensibilização específica, irritação aguda ou crônica da mucosa, ou ambos. As sensibilizações aos compostos de alto peso molecular são classicamente mediadas pela IgE, enquanto a sensibilização aos de baixo peso molecular en- volve tanto resposta IgE mediada como outras por meca- nismos menos esclarecidos. Agentes irritantes como partí- culas grandes, gases hidrossolúveis e vapores levam à le- são direta da mucosa, sem o envolvimento de resposta imunológica específica11 . A exposição a substâncias como a fumaça de cigarro, formol e capsaicina, resulta na liberação de neuropeptídeos como a Substância P que são neuro- transmissores responsáveis pelo desencadeamento de res- posta inflamatória neurogênica13 . Em 1995, Bardana14 sugeriu uma classificação para RO: 1) Incômoda (do inglês annoyance) – ocorre quando o indi- víduo apresenta sensibilidade olfativa muito alta, apresen- tando sintomas quando se expõe a substâncias como per- fumes e detergentes; 2) Irritativa – definida quando ocorre inflamação inespecífica no nariz sem envolver mecanismos imunológicos mais elaborados ou alérgicos; 3) Corrosiva – ocorre após exposição a altas concentrações de gases quí- micos solúveis e irritantes, como cloro e amônia, que oca- siona inflamação intensa com lesão da mucosa nasal e al- terações permanentes nas funções fisiológicas do nariz, co- mo o olfato; 4) Alérgica (ou imunológica) que pode envol- ver mecanismo mediado por IgE e outros. Quadro clínico e Diagnóstico Os sintomas da RO são os mesmos das outras rinites, e aparecem como resultado da resposta da mucosa nasal a estímulos externos do ambiente de trabalho. Assim, o indi- víduo acometido vai apresentar a congestão nasal resul- tante da vasodilatação e do aumento da permeabilidade vascular; o prurido e os espirros decorrentes da estimula- ção nervosa sensorial; e a coriza, como resultado da esti- mulação das glândulas e do aumento da permeabilidade vascular13 . Mesmo nos grupos de risco para RO, a alta fre- quência dos sintomas de rinite pode levar a uma incidência superestimada, portanto, é essencial a confirmação do ne- xo causal entre o agente ocupacional suspeito e os sinto- mas através de medidas objetivas. O teste cutâneo de leitura imediata pode ser usado para avaliar a presença de sensibilização, e só significa doença se as manifestações clínicas forem associadas à sensibiliza- ção demonstrada no teste. Além disso, a maioria dos agen- tes ocupacionais não dispõe de extratos padronizados para a realização destes testes que ajudam apenas na avaliação dos casos mediados por IgE11 . Assim, a nasoprovocação específica, realizada sob condições controladas, seria o mé- todo mais adequado para a confirmação diagnóstica de RO. A resposta à nasoprovocação pode ser medida através de escore de sintomas, análise de mediadores inflamatórios e avaliação da congestão nasal através de rinomanometria, rinometria acústica e pico de fluxo inspiratório nasal15,16 . Este procedimento, entretanto, carece de uma melhor pa- dronização tanto na sua realização, como na interpretação, e não é realizado na rotina da maioria dos centros. Tratamento A abordagem mais eficaz para o controle da RO seria evitar a exposição ao agente ocupacional quando o mesmo é identificado. Para o controle dos sintomas devem-se se- guir as recomendações convencionais de farmacoterapia Reavaliar o diagnóstico Broncoprovocação inespecífica História Sugestiva de Asma ocupacional Negativa Positiva Diagnóstico etiológico/Nexo causalidentificado não identificado Teste cutâneo/RAST negativo positivo Asma Ocupacional Provocação positivonegativo Asma não Ocupacional Monitorar PEF sugestivo não sugestivo Espirometria Asma Não Ocupacional -Adaptado de Malo & Chan-Yeung, 20012 . 06 Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 33, Nº 1, 2010 Asma e rinite ocupacionais – visão imunoalérgica
  • 6. com antihistamínicos e corticóides tópicos nasais, de acor- do com diretrizes e consensos vigentes para as rinites alér- gicas não ocupacionais. Entre as medidas preconizadas pa- ra evitar ou diminuir a exposição, temos a substituição do agente ocupacional causal por outra substância, melhoria das condições de ventilação da área de trabalho, redução do tempo de exposição e o uso de equipamentos de prote- ção individual pelo trabalhador17 . Considerações finais Os quadros respiratórios associados ao ambiente de tra- balho podem ser considerados alérgicos quando envolvem mecanismos imunológicos. Muitos estudos têm sido reali- zados com o objetivo de entender melhor os fatores de ris- co relacionados ao agente ocupacional, ao ambiente de tra- balho e ao próprio trabalhador, na tentativa de desenvolver métodos mais precisos para seu diagnóstico e tratamento. Quanto mais precocemente esta condição é diagnosticada, melhor é o prognóstico para o trabalhador. Cada vez mais está sendo valorizada a abordagem multiprofissional com a participação não apenas de profissionais da área de saúde, mas também de engenheiros, higienistas, assistentes so- ciais, psicólogos considerando o importante impacto sócio- -econômico das doenças ocupacionais para os trabalhado- res e para a sociedade em geral. Portanto, lidando com as doenças ocupacionais o médico alergista tem a oportunida- de de praticar a medicina preventiva, pois identificando substâncias no ambiente de trabalho que podem causar doenças, várias intervenções podem ser propostas em be- nefício de outros trabalhadores que ainda não adoeceram. Referências 1. Bernstein IL, Chan-Yeung M, Malo JL, Bernstein DI, ed. Asthma in the workplace. 2a ed. New York: Marcel Dekker; 1999. 2. Malo JL, Chan-Yeung M. Occupational Asthma. J Allergy Clin Immunol 2001; 108:317-28. 3. Mihalas LS. An approach to the diagnosis of occupational asth- ma. Ann Allergy Asthma Immunol 1999; 83:577-82. 4. Maestrelli P, Boschetto P, Fabbri LM, Mapp CE. Mechanisms of occupational asthma. J Allergy Clin Immunol 2009;123:531- 42. 5. Becklake MR, Malo JL, Chang-Yeung M. Epidemiological appro- aches in occupational asthma. Reactive airways dysfunction syndrome, or irritant-induced asthma. In: Bernstein IL, Chan- Yeung M, Malo JL, Bernstein DI, ed. Asthma in the workplace, 2ª ed. New York: Marcel Dekker; 1999. p. 27-65. 6. Chan-Yeung M, Malo JL. Occupational Asthma. Review article. N Engl J Med 1995; 333:107-112. 7. Cartier A. Diagnosing occupational asthma. Allergy Clin Immu- nol Int 2003;15:197-202. 8. Dykewicz MS. Occupational asthma: current concepts in patho- genesis, diagnosis and management. J Allergy Clin Immunol 2009;123:519-28. 9. Lemiere C. Non-invasive assessment of airway inflammation in occupational lung disease. Curr Opin Allergy Clin Immunol 2002;2:109-14. 10. Chang-Yeung M, Malo JL. Natural history of occupational asth- ma. In: Bernstein IL, Chan-Yeung M, Malo JL, Bernstein DI, ed. Asthma in the workplace, 2a ed. New York: Marcel Dekker; 1999. p. 129-43. 11. Gautrin D, Desrosiers M, Castano R. Occupational rhinitis. Curr Opin Allergy Clin Immunol 2006; 6:77-84. 12. Ruoppi P, Koistinen T, Susitaival P, Honkanen J, Soininen H. Frequency of allergic rhinitis to laboratory animals in university emploees as confirmed by chamber challenges. Allergy 2004; 59:295-301. 13. Slavin RG. Occupational rhinitis. Ann Allergy Asthma Immunol 2003; 90:2-6. 14. Bardana EJ Jr. Occupational asthma and related respiratory di- sorders. Dis month 1995; 41:143-99. 15. Howarth PH, Persson CG, Meltzer EO, Jacobson MR, Durham SR, Silkoff PE. Objective monitoring of nasal airway inflamma- tion in rhinitis. J Allergy Clin Immunol 2005; 11:S414-41. 16. Nathan RA, Eccles R, Howarth PH, Steinsvåg SK, Togias A. Ob- jective monitoring of nasal patency and nasal physiology in rhi- nitis. J Allergy Clin Immunol 2005; 11: S442-59. 17. Hellgren J, Karlsson G, Toren K. The dilemma of occupational rhinitis: management options. Am J Respir Med 2003: 2:333- 41. Correspondencia: Clóvis E S Galvão Av Dr Eneas de Carvalho Aguiar, 155 – 8º andar, Bloco 3 Cerqueira Cesar 05403-000 - São Paulo – SP Fone: 0XX-11-3069.6098 Fax: 0XX-11-3069.7975 e-mail: cdgalvao@usp.br Asma e rinite ocupacionais – visão imunoalérgica Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 33, Nº 1, 2010 07