1. PETIÇÃO 7.603 RONDÔNIA
RELATOR : MIN. EDSON FACHIN
REQTE.(S) :DOMINGOS BORGES DA SILVA
ADV.(A/S) :ANDRE LUIZ LIMA
REQDO.(A/S) :UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) :ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
REQDO.(A/S) :BANCO CENTRAL DO BRASIL-BACEN
ADV.(A/S) :PROCURADOR-GERAL DO BANCO CENTRAL DO
BRASIL
REQDO.(A/S) :BANCO DO BRASIL S.A.
ADV.(A/S) :SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
REQDO.(A/S) :ESTADO DE RONDÔNIA
PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DE RONDÔNIA
REQDO.(A/S) :HENRIQUE DE CAMPOS MEIRELLES
ADV.(A/S) :SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
REQDO.(A/S) :VALDIR RAUPP DE MATOS
ADV.(A/S) :SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
REQDO.(A/S) :CONFUCIO AIRES MOURA
ADV.(A/S) :SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
DECISÃO: Trata-se de ação popular proposta pelo cidadão Domingos
Borges da Silva em face da União Federal, do Banco Central do Brasil, do
Banco do Brasil S. A., do Estado de Rondônia, do Ministro da Fazenda,
Henrique Campos Meirelles, do Senador Valdir Raupp de Matos e do ex-
governador do Estado de Rondônia, Confúcio Aires Moura.
O autor sustenta, preliminarmente, a competência desta Corte para o
julgamento da presente ação, tendo em conta a existência das Ações
Cíveis Originárias nº 1119, 1265 e 3089. Neste sentido, aponta a redação
do art. 5º, §§ 2º e 3º da Lei nº 4.717/1965.
Alega, em síntese, a nulidade da intervenção do Banco Central do
Brasil no Banco de Estado de Rondônia – BERON, bem como da
submissão deste ao Regime de Administração Temporária – RAET,
narrando o seguinte (eDOC 1, p. 2-6):
“2.1.- Em janeiro de 1995, o então Governador do Estado
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de Rondônia, o hoje Senador Valdir Raupp de Matos procurou
uma empresa de Consultoria e Auditória, sediada em São Paulo
e por ser supostamente de notória especialização, a contratou
para realizar um levantamento contábil-financeiro no Banco do
Estado de Rondônia S.A. – BERON.
2.2.- A empresa tinha como principal sócio, Gustavo Loiola
que mais tarde se tornaria Presidente do Banco Central –
BACEN e baseado nas informações obtidas através de sua
empresa, decretaria em 20 de fevereiro do mesmo ano
Intervenção no Banco do Estado de Rondônia S.A. – BERON.
2.3.- Um dos sócios da empresa de Gustavo Loiola era
nada mais nada menos que Maílson da Nóbrega, então Ministro
da Fazenda no governo de Fernando Henrique Cardoso. Outro
que mais tarde veio a fazer parte do quadro societário da
empresa de Gustavo Loiola foi Gustavo Franco, que também
presidiu o Banco Central.
2.4- Decretada a intervenção no BERON em 20 de
fevereiro de 1995, logo os Interventores criaram dois fundos de
investimentos, um a curto prazo e outro com prazo de 60
(sessenta) dias. Como fonte de investimentos, investidores
utilizaram-se de Títulos da Dívida Pública (Precatórios), que
eram caucionados por Certificados de Depósitos Bancários -
CDBs, que serviriam para serem comercializados no mercado
financeiro.
2.5.- Em outras palavras, o BERON recebeu títulos de
valores duvidosos e emitia Certificados de Depósitos Bancários
que possuíam credibilidade e valor nominal passível de serem
comercializados no mercado financeiro.
(...)
2.10.- Por ocasião da auditoria realizada pela empresa de
Gustavo Loiola junto ao BERON e RONDONPOUP, o passivo
liquido a descoberto do Banco, era de um pouco mais de R$ 21
milhões de reais, ainda que os resultados da autoria não
espelhasse bem a realidade financeira da Instituição pois o
principal devedor na época era o próprio Estado de Rondônia,
acionista majoritário do Banco.
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2.11.- Na sobredita Ação Popular ficou provado ainda que
para deixar o BERON na situação encontrada pela empresa de
auditória de Gustavo Loiola, o Estado de Rondônia deixou de
aportar no Banco, os valores que eram devidos à União por
conta do Imposto de Renda Redito na Fonte, o que se houvesse
realizado não haveria necessidade de decretação da intervenção
na Instituição.
2.12.- Em outras palavras, houve toda uma maquiagem
financeira, para ensejar a decretação de intervenção pelo
BACEN no BERON, já que a política do Banco Central era
estatizar todas as instituições bancárias estaduais do País, a
qualquer custo.
(...)
2.14.- Prorrogado por várias vezes o RAET, essas
sucessivas prorrogações foram ilegais, porque ao arrepio das
normas citadas e meros pedidos do Governador do Estado de
Rondônia à época, para as prorrogações, isto sem qualquer
amparo legal e em desacordo com as normas vigentes, não
respaldariam as legalidades dos atos de prorrogação.
(...)
2.16.- Existindo normas à época que respaldariam os
legítimos saneamentos das instituições, inegável que os atos
contrários, praticados, inclusive em descumprimento às citadas
normas, insofismável a presença das ilegalidades e lesividades,
inclusive patrimoniais ao erário público.
(...)
2.20.- Douto Ministro, as centenas de empréstimos
concedidos a pessoas físicas e jurídicas que não possuíam
capacidade financeira para honrar compromissos deram causa
ao déficit levado a efeito para o Banco do Estado de Rondônia
S.A. – BERON, eis que, os seus Interventores para
supostamente capitalizar a Instituição, tomam empréstimos a
juros extorsivos junto a Caixa Economia e Banco do Brasil e
emprestavam àquelas pessoas cobrando taxas de juros
inferiores, ficando o BERON com os prejuízos.
(...)
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2.23.- Porquanto Eminente Ministro Relator/Julgador, é
induvidoso que os Agentes do BACEN, sob a omissão do
mesmo, causaram sérios danos financeiros ao Banco do Estado
de Rondônia S.A., - BERON, em detrimento do erário público,
posteriormente assumidos pelo Estado, através dos atos que se
impugna com a presente demanda.” (grifos no original).
Objetiva, desta forma, o reconhecimento da nulidade do Contrato de
Confissão, Assunção, Consolidação e Refinanciamento de Dívidas nº
003/98/STN/COAFI e seus termos aditivos, “que tem por objeto a
exigibilidade dos valores inerentes ao passivo líquido a descoberto do
Banco do Estado de Rondônia, apurado no período de intervenção”
(eDOC 1, p. 14).
É o relatório. Decido.
Como se sabe, a jurisprudência desta Corte há muito assentou-se no
sentido de que as hipóteses que justificam o conhecimento originário do
Supremo Tribunal Federal são apenas as que estão taxativamente
previstas no art. 102, I, da Constituição da República.
Não consta, entre as alíneas do referido inciso, menção à ação
prevista pela Lei 4.717, de 29 de junho de 1965, razão pela qual, ante a
ausência de previsão constitucional, não pode dela conhecer o Supremo
Tribunal Federal. Nesse sentido, confiram-se:
“E M E N T A: “AÇÃO POPULAR” – AJUIZAMENTO
CONTRA JUÍZES DO TRABALHO – AUSÊNCIA DE
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL –
AÇÃO POPULAR DE QUE NÃO SE CONHECE – PARECER
DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA PELO NÃO
PROVIMENTO DO RECURSO – RECURSO DE AGRAVO
IMPROVIDO. O PROCESSO E O JULGAMENTO DE AÇÕES
POPULARES CONSTITUCIONAIS (CF, ART. 5º, LXXIII) NÃO
SE INCLUEM NA ESFERA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA
DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – O Supremo Tribunal
Federal – por ausência de previsão constitucional – não dispõe
de competência originária para processar e julgar ação popular
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promovida contra qualquer outro órgão ou autoridade da
República, mesmo que o ato cuja invalidação se pleiteie tenha
emanado do Presidente da República, das Mesas da Câmara
dos Deputados ou do Senado Federal ou, ainda, de qualquer
dos Tribunais Superiores da União. Jurisprudência. Doutrina. A
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL,
CUJOS FUNDAMENTOS REPOUSAM NA CONSTITUIÇÃO
DA REPÚBLICA, SUBMETE-SE A REGIME DE DIREITO
ESTRITO – A competência originária do Supremo Tribunal
Federal, por qualificar-se como um complexo de atribuições
jurisdicionais de extração essencialmente constitucional – e ante
o regime de direito estrito a que se acha submetida –, não
comporta a possibilidade de ser estendida a situações que
extravasem os limites fixados, em “numerus clausus”, pelo rol
exaustivo inscrito no art. 102, I, da Constituição da República.
Precedentes.”
(Pet 5191 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO,
Segunda Turma, julgado em 16/12/2014, PROCESSO
ELETRÔNICO DJe-039 DIVULG 27-02-2015 PUBLIC 02-03-
2015)
“EMENTA Agravo regimental em petição. Ação Popular.
Decisão singular de não conhecimento da ação por
incompetência da Corte para seu julgamento, com fundamento
no art. 21, § 1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal
Federal e nos precedentes jurisprudenciais. Suscitada nulidade
por falta de prévia oitiva da Procuradoria-Geral da República.
Desnecessidade de remessa dos autos à PGR diante de
controvérsia de caráter iterativo. Procedimento autorizado pelo
art. 52, parágrafo único, do RISTF. Precedentes. Alegação de
nulidade rejeitada. Competência originária do Supremo
Tribunal Federal. Regime de direito estrito. Hipóteses
taxativamente previstas no art. 102, inciso I, da Constituição
Federal. Incompetência da Corte para apreciar ação popular.
Precedentes. Agravo regimental não provido. 1. O Regimento
Interno do Supremo Tribunal Federal, em seu art. 52, parágrafo
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único, autoriza o relator a dispensar a vista à Procuradoria-
Geral da República diante de controvérsia de caráter iterativo.
Precedentes. Alegação de nulidade rejeitada. 2. A competência
originária do Supremo Tribunal Federal submete-se a regime de
direito estrito, estando suas atribuições jurisdicionais
originárias taxativamente enunciadas no art. 102, inciso I, da
Constituição Federal de 1988, dentre as quais não se inclui o
processamento e o julgamento de ação popular. Precedentes da
Corte. 3. Para efeito de aplicabilidade da norma de competência
inscrita no art. 102, inciso I, alínea n, da Constituição, a
Suprema Corte firmou orientação no sentido de que não basta a
mera alegação de ocorrência de impedimento e/ou suspeição
dos magistrados que compõem o Tribunal para fins de
deslocamento para o Supremo Tribunal Federal da competência
para julgar determinada causa. Precedente do Plenário. 4.
Agravo regimental não provido.”
(Pet 6375 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI,
Segunda Turma, julgado em 05/05/2017, PROCESSO
ELETRÔNICO DJe-111 DIVULG 25-05-2017 PUBLIC 26-05-
2017)
Registre-se que tal entendimento conta também com o suporte da
doutrina:
“Esclareça-se que a ação popular, ainda que ajuizada
contra o Presidente da República, o Presidente do Senado, o
Presidente da Câmara dos Deputados, o Governador ou o
Prefeito, será processada e julgada perante a Justiça perante a
Justiça de primeiro grau (Federal ou Comum).”
(MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnoldo; MENDES,
Gilmar Ferreira. Mandado de Segurança e Ações
Constitucionais. São Paulo: Malheiros Editores, 2010, p. 187).
Digna de nota, é, ainda, a observação feita pelo e. Ministro Celso de
Melo, quando do julgamento da Pet 5191, já referida nesta manifestação:
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“A “ratio” subjacente a esse entendimento, que acentua o
caráter absolutamente estrito da competência constitucional do
Supremo Tribunal Federal, vincula-se à necessidade de inibir
indevidas ampliações descaracterizadoras da esfera de
atribuições institucionais desta Suprema Corte, conforme
ressaltou, a propósito do tema em questão, em voto vencedor, o
saudoso Ministro ADALÍCIO NOGUEIRA (RTJ 39/56-59, 57).”
Por essas razões, não se depreende do contexto em análise qualquer
justificativa que atraia a competência originária deste Supremo Tribunal
Federal para processar e julgar o litígio instaurado.
Acrescente-se, por fim, que, a despeito do que assevera o autor, a
simples existência, nesta Corte, de ações que tem como pano de fundo o
mesmo panorama fático apontado não tem o condão de deslocar para o
Supremo a competência para o conhecimento originário da presente ação
popular.
Ante o exposto, nos termos do art. 21, § 1º, do RISTF, não conheço da
ação popular.
Publique-se.
Brasília, 10 de maio de 2018.
Ministro EDSON FACHIN
Relator
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