Série de aulas (3/3) sobre conflitos contemporâneos na Síria. Os dados, informações e estatísticas foram colhidos até o final de outubro/2016. Integrou Projeto Interdisciplinar (História, Sociologia, Língua Portuguesa) para o 1º ano do Ensino Médio no IFTM, Campus Uberaba.
A EDUCAÇÃO FÍSICA NO NOVO ENSINO MÉDIO: IMPLICAÇÕES E TENDÊNCIAS PROMOVIDAS P...
Conflitos na Síria (03): Estado Islâmico e a questão dos refugiados
1. Estado Islâmico e a Questão
dos Refugiados da Síria
Aula 03
Prof. Munís Pedro (IFTM) – Projeto Interdisciplinar
2. Estado Islâmico (Daesh)
O Estado Islâmico, sob outros nomes, foi um grupo dentro da al-
Qaeda, que dela se separou em 2014, tornando-se independente
Entre as fases do grupo o mesmo foi chamado de Tawhid wal-
Jihad (Monoteísmo e Jihad), al-Qaeda no Iraque (AQI) e Conselho
Shura Mujahidin
O surgimento do Estado Islâmico está ligado às trajetórias de,
pelo menos, quatro homens: Abu Musabi al-Zarqawi (seu
fundador); Osama bin Laden (fundador da al-Qaeda); Abdullah
Yusuf Azzam (clérigo que escreveu manifesto aos mujahidin); e
Ayman al-Zawahiri (emir egípcio que substituiu bin Laden no
comando da al-Qaeda)
3. Abu Musabi al-Zarqawi (1966-2006)
Jordaniano, inicialmente Zarqawi era um criminoso comum,
sendo preso bem jovem. Sua mãe o matriculou num colégio
religioso. Lá se transformou em um fundamentalista
Foi lutar no Afeganistão para expulsar os comunistas soviéticos da terra
sagrada. Nessa viagem conheceu Zawahiri (pediatra egípcio, foi um dos
primeiros a misturar salafismo e takfirismo) e Osama bin Laden
Devido ao envolvimento com atentados, foi preso em 1994 em Swaqa.
A prisão aprimorou seu fundamentalismo, tornando-o brutal. Na
cadeia, conseguiu poder e influência e recrutou vários jihadistas
Quando o rei jordaniano (Abdullah I) deu anistia aos presos políticos,
Zarqawi foi solto em 1999 sem cumprir a pena integral
Ao sair da prisão, Zarqawi foge para o Afeganistão e reencontra bin
Laden
Bin Laden financiou Zarqawi para ser comandante de um campo de
treinamento no deserto do Afeganistão, formando a célula Tawhid wal-
Jihad. Foi ele quem formou os dois idealizadores do atentado do 11 de
setembro
4. Osama bin Laden (1957-2011)
17º filho de um milionário saudita do ramo da construção civil. A
família bin Laden era parceira dos EUA
Morou no Líbano, onde fez ensino médio e tinha uma vida de
ostentação
Teve dois professores decisivos: Mohamed Qutb, irmão de Sayyid
Qutb (teórico da Irmandade Muçulmana e um dos idealizadores da
jihad mundial) e Abdullah Yusuf Azzam
Conheceu Azzam na Universidade de Engenharia que fez na Arábia
Saudita. Resolveu financiar jihadistas para expulsar soviéticos do
Afeganistão com ajuda dos EUA, através da CIA. Em 1988 junto com
seu ex-professor Azzam, fundou a al-Qaeda
Depois da Guerra do Golfo (Iraque vs. Kuwait), no início dos anos 90,
se desentendeu com a família real saudita por conta da ocupação
americana nas terras sagradas (Meca e Medina), tornando-se
adversário do governo dos EUA
5. Zarqawi e a atuação da
Tawhid wal-Jihad
Assim que os EUA entraram em guerra no Afeganistão, Zarqawi fugiu
levando e recrutando pelo caminho centenas de jihadistas para lutarem no
Iraque (contra “inimigos distantes” e “inimigos próximos”)
Chamado de xeique dos chacinadores, Zarqawi notabilizou-se por matar e
atormentar a população xiita, acreditando provocar uma guerra civil que
levaria os sunitas a recuperarem o poder perdido na região – instigar
reação violenta para aliados adormecidos se integrarem à guerra
Começou a praticar decapitações televisionadas devido à repercussão no
Ocidente
Na Primeira Batalha de Fallujah, os drones americanos mataram apenas 14
agentes da Tawhid wal-Jihad, porém vários civis (com isso a rede aumentou
sua força e apelo popular, responsabilizando os EUA)
Zarqawi transmitiu seu voto de lealdade a bin Laden e a rede passou a se
chamar al-Qaeda no Iraque (AQI) e criou o Conselho Shura Mujahidin
Desaparecido desde a Segunda Batalha de Fallujah, Zarqawi foi morto em
2006 por um drone a 14km de uma base americana em Bagdá
6. Estado Islâmico e os dois
Baghdadis
O Conselho Shura Mujahidin apontou o egípcio Abu Ayyub al-
Masri como emir da franquia. E ele disse que o grupo passaria a
se chamar “Estado Islâmico do Iraque”, escolheu o iraquiano Abu
Omar al-Baghdadi para substituir o líder morto e adotaram uma
política ambígua com relação à al-Qaeda Matriz
A dupla foi morta em 2010, escondidos no subsolo de uma casa
O substituto foi Ibrahin Awwad al-Badari (1971-), que adotou o
nome de guerra: Abu Bakr al-Baghdadi [imagem]. Foi membro da
Irmandade Muçulmana e se tornou wahhabista, defendendo
fratricídio contra xiitas. Mais intelectualizado que al-Baghdadi I,
tem doutorado em Assuntos Islâmicos
Ficou preso no Campo Bucca em 2004, lá era aplicador da sharia e
formou uma rede de contatos (foi solto em 2009 após acordo
EUA-Iraque)
7. Estado Islâmico entra na
Síria
Quando bin Laden morreu, aliados de Baghdadi
aproveitaram o contexto conturbado do país vizinho,
invadiram a Síria e tomaram Raqqa (“o hotel da revolução”).
Em 2013, ele tenta fundir grupo à al-Nusra sob o nome de
Estado Islâmico do Iraque e do Levante (ISIS), mas líder da
al-Nusra recusa. O chefe da al-Qaeda Matriz, Zawahiri
critica a posição e explica a geografia de cada grupo
Baghdadi não aceita e o acusa de seguir o Sykes-Picot.
Inicia-se uma guerra civil dentro da Guerra Civil e al-Qaeda
rompe com Estado Islâmico
No mesmo ano, 2013, Baghdadi se autoproclama califa do
Estado Islâmico – séquito acredita que ele é descendente da
mesma tribo do profeta Maomé, os coraixitas
8. Práticas comuns do Estado Islâmico:
destruição de patrimônio histórico
Cidades, ruínas, sítios arqueológicos, monumentos e museus na Síria e no
Iraque aparecem sendo destruídos por brocas e martelos em vídeos
divulgados pelo grupo
Grande colunata de Apameia, cidade histórica do
Império Selêucita (300 a.C.), foi herança do Império
Bizantino (imagem abaixo)
Ruínas da cidade síria Palmira, fundada no
período neolítico (de 10 a 3 mil a.C.) e
localizada num oásis. O local era ponto de
parada obrigatória na chamada Rota da
Seda (tráfego Ocidente-Oriente durante a
Idade Antiga)
9. Práticas comuns do Estado Islâmico:
recrutamento coagido de crianças
Coação de crianças para torturarem e matarem reféns do grupo. Estas são
treinadas e disciplinadas para comporem o exército de jihadistas
10. Práticas comuns do Estado Islâmico:
execução pública de homossexuais
Conforme vídeos veiculados pelo próprio grupo, a pena para homossexuais
tem sido o lançamento de edifícios sob os olhares de dezenas de pessoas
11. Práticas comuns do Estado Islâmico:
crucificações
Uma das formas de execução é a crucificação, sobretudo para cristãos
12. Práticas comuns do Estado Islâmico:
incinerações de pessoas vivas
Na imagem abaixo, um piloto jordaniano é queimado dentro de uma jaula
13. Práticas comuns do Estado Islâmico:
decapitações
A prática foi difundida por Zarqawi devido à repercussão no Ocidente
14. Práticas comuns do Estado Islâmico:
outras formas cruéis de tortura e execução
Nas imagens, vemos homens sendo amarrados a explosivos e afogados
15. Práticas comuns do Estado Islâmico:
genocídio
A minoria étnica-religiosa yazidi tem sido uma das principais vítimas
16. Práticas comuns do Estado Islâmico:
escravidão sexual
O principal alvo são mulheres e meninas yazidis, curdas e cristãs. Algumas
são vendidas, outras são abusadas pelos membros do grupo
No livro Escravas do Daesh, a curda Jinan de 18 anos, conta sua
experiência no cativeiro: “Eles nos torturavam, queriam nos
converter à força. Se negávamos, éramos agredidas, presas do lado
de fora em pleno sol, obrigadas a beber água onde flutuavam ratos
mortos. Às vezes, nos submetiam a choques elétricos. Esses homens
não são humanos, só pensam em morte, em matar. Usam drogas
sem parar. Querem se vingar de todo o mundo. Afirmam que um dia
o Estado Islâmico reinará no mundo inteiro”.
17. Como o Estado Islâmico se mantém?
A BBC descreveu seis fontes de renda do grupo:
• Doações: há dinheiro vindo de pessoas e de instituições de caridade no
Oriente Médio, sobretudo Arábia Saudita e Catar (o intuito seria derrubar o
presidente al-Assad)
• Petróleo: o Estado Islâmico teria lucrado em 2014, 100 milhões de dólares
com venda deste produto e de derivados (entre os compradores, Turquia,
Irã e a própria Síria). Contudo ataques aéreos a refinarias têm diminuído
essa fonte
• Sequestros: teriam gerado cerca de 20 milhões de dólares em 2014
(jornalistas são principais alvos). Esta prática também serve como
propaganda
• Roubos, pilhagens e extorsões: em troca de serviço ou proteção, para
quem utiliza vias, assaltos a bancos, venda de antiguidades e roubos
diversos como gado
• Imposto sobre minorias religiosas: as opções são: aderir ao Islã, pagar este
imposto (jizya) ou execução
• Escravidão: dinheiro gerado ao vender meninas e mulheres como escravas
sexuais
18. E a responsabilidade de países para Estado Islâmico
chegar até aqui?
Governos corruptos e grupos terroristas se retroalimentam
Irã: incentivou e treinou seguidores de Zarqawi, na época, para lutar contra
exército de Saddam, no Iraque
Iraque: Saddam Hussein ajudou a al-Qaeda no Iraque contra americanos.
Muitos ex-generais de Saddam se integraram ao EI para lutar contra
primeiro ministro iraquiano da Era Americana, al-Maliki. Este por sua vez
libertou inúmeros jihadistas
Síria: o próprio al-Assad colaborou com seguidores de Zarqawi na época da
guerra do Iraque. Entraram neste país através da fronteira síria. Depois al-
Assad soltou inúmeros terroristas, que integram hoje Estado Islâmico
Turquia: fez vista grossa a jihadistas para derrotar al-Assad e curdos
EUA: Intervenção desastrosa no Iraque acirrou problemas sectários.
Historicamente tem estimulado conflitos entre facções para destituir
governos que não servem seus interesses. Retiraram tropas deixando
inúmeros armamentos nas mãos de jihadistas. E fizeram vista grossa ao
Estado Islâmico no início do conflito, para retirar al-Assad
19. Refugiados da Síria
DEFINIÇÃO: “Refugiado é qualquer pessoa que por medo bem fundado de perseguição
por razões de raça, religião, nacionalidade, pertencimento a grupo social em particular ou
opinião política, está fora de seu país de nacionalidade e está incapaz, ou devido a tal
temor, não pode se valer da proteção de tal país; ou que não tendo nacionalidade e
estando fora do país de sua residência habitual, está incapaz, ou devido a tal temor, no
pode voltar ao país”. (Estatuto dos Refugiados assinado na Convenção de Viena em 1951)
Segundo a ONU, há 65,3 milhões de refugiados no mundo hoje
• Boa parte destes é proveniente do norte da África e Oriente Médio onde
acontecem nove guerras civis (da Nigéria ao Paquistão)
A Síria possui 23 milhões de habitantes
• 11 milhões destes foram deslocados de suas casas
• 4,5 milhões estão em cinco países: Turquia (2,5); Líbano (1,1); Jordânia (0,6);
Iraque (0,24); e Egito (0,11)
• 13,5 milhões de sírios precisam urgentemente de assistência humanitária
21. Refugiados no
Brasil
Desde o início da Guerra
Civil, o Brasil recebeu em
torno de 2.300 pessoas
oriundas da Síria
• A maior parte delas está em
São Paulo, onde a comunidade
síria já residente presta auxílio
aos que chegam
• O governo federal discute a
criação de uma nova lei de
imigração para acolhimento
humanitário
22. Refugiados: problemas
• Devido à quantidade de pessoas, países
não estão preparados economicamente e
socialmente para receber refugiados
Refugiado é visto como “estranho” – alteridade
necessária
Vigilância constante
• Irresponsabilidade de países receptores
Violação de Carta dos Direitos Humanos: especialmente direito de crença
Países mais ricos tem ajudado abaixo de suas capacidades (ex. Inglaterra)
Rússia, Japão, Cingapura, Coreia do Sul e países árabes do Golfo Pérsico (Qatar,
Emirados Árabes, Arábia Saudita, Kuwait e Bahrein) não ofereceram nenhuma
vaga para refugiados
• Países ocidentais têm medo de receber jihadistas infiltrados entre
refugiados
Hungria está construindo um muro na fronteira
23. Refugiados: problemas
• Inadequação de políticas públicas para
assegurar direitos de Estatuto dos Refugiados
• Pedidos de fundos pela ONU foram atendidos apenas em 61% (2015)
• Refugiados estão em bolsões de miséria
Acampamentos lembram guetos nazistas: a população está espremida, sem
higiene, sem água potável, escassez de alimentos, falta de segurança e de
assistência social
Atualmente 75 mil estão retidos no deserto entre Jordânia e Síria (set. 2016)
• Travessia de refugiados pelo Mediterrâneo é perigosa
300 mil já chegaram à Europa através deste mar (166 mil na Grécia e 130 mil na
Itália)
4 mil desapareceram ou se afogaram no caminho
Há tráfico de seres humanos (coiotes) e viajam em embarcações frágeis [imagens]
26. Imagem-símbolo dos
refugiados sírios:
Identificado inicialmente
como Aylan, o nome do
menino é Alan. Ele era sírio,
tinha três anos e morreu
após bote naufragar entre
Turquia e Grécia
(em setembro de 2015)
27. Material consultado
• ANDRADE, G.B. de. A guerra civil síria e a condição dos refugiados... Revistas de Estudos
Internacionais, n. 2, vol. 2, p. 121-138, 2011.
• ANISTIA INTERNACIONAL. Síria: os números da crise de refugiados. Publicado em 9 set. 2016.
Disponível em: https://anistia.org.br/noticias/siria-os-numeros-da-crise-de-refugiados/
• BBC. Conheça seis fontes de renda do Estado Islâmico. Publicado em 19 nov. 2015. Disponível em:
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/11/151119_financiamento_estado_islamico_lgb
• COGGIOLA, O. Islã histórico e islamismo político. Porto Alegre: Pradense, 2011.
• COSTA, P.P. Uma história da Síria no século XXI para além do sectarismo religioso. 2016. 136f.
Dissertação (mestrado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São
Paulo, São Paulo, 2016.
• G1. 75.000 refugiados estão retidos em deserto entre Síria e Jordânia, diz ONG. Publicado em 15
set. 2016. Disponível em: goo.gl/nJqGz1
• EL PAÍS. Caos perto da Europa. Publicado em 7 out. 2016. Disponível em https://goo.gl/IVqnUV
• PATARO, A.C.B.; RIBEIRO, J. Direito humanitário, Foucault e refugiados sírios no Brasil. In: Anais do
XVII Encontro de História da ANPUH-Rio: entre o local e global. Campus Nova Iguaçu, ago. 2016.
• SANCHES, S.M. Nós e os outros – o fundamentalismo como sintoma de uma interação grupal
primitiva. Grupo Análise Online, Nova Série, vol. I, 2010.
• WEISS, M.; HASSAN, H. Estado islâmico: desvendando o exército do terror. São Paulo: Seoman,
2015.