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Publicado em NOVA ESCOLA 12 de Maio | 2021
Prática pedagógica
Brincar de fazer arte: como
ampliar o lúdico e a criação no
cotidiano da Educação Infantil
Professoras experientes falam sobre a intersecção entre as brincadeiras e a
expressão artística das crianças pequenas, dão sugestões de materiais e
atividades
Camila Cecílio
Crédito: Getty Images
Arnaldo Antunes, músico e compositor brasileiro, cantou: “Saiba, todo mundo teve infância/ Maomé já
foi criança, Arquimedes, Buda, Galileu e também você e eu”. Ao olhar para a letra da canção Saiba, fica
fácil imaginar que as personalidades citadas brincaram quando pequenas, não é mesmo? Afinal, não
importa o tempo, o espaço e as circunstâncias, essa é a ação principal das crianças. Mas brincar
também se aprende e as experiências artísticas se ampliam conforme as oportunidades que os
adultos oferecem. São elas que enriquecem o cotidiano da Educação Infantil.
“A brincadeira está muito entrelaçada com os processos artísticos da criança. Por isso, nessa etapa,
não separamos aquilo que é expressivo e vem da arte do ato de brincar, porque a expressão da
criança surge da ludicidade”, afirma Lucília Helena Franzine, diretora da Escola Grão de Chão, de São
Paulo (SP), e coordenadora de Arte para de 1 a 6 anos. Ela conta que na escola, que segue a
metodologia construtivista, baseada nas ideias de estudiosos como Jean Piaget (1896-1980) e Lev
Vygotsky (1896-1934), os pequenos estão o tempo todo vivendo experiências artísticas. “A criança está
brincando e construindo significados através do pensamento simbólico-imaginativo, e se introduz de
2. forma lúdica nos processos artísticos quando desenha, canta, conta uma história...”
“Tudo isso contribui para acionar aprendizagens por meio das múltiplas linguagens, ampliar
vocabulário e repertório e expandir questões corporais”, acrescenta a professora de Educação Infantil
Lidiane Loiola, hoje coordenadora da EMEI Julio Alves Pereira, em Jaraguá, zona oeste de São Paulo.
Com formação em Artes Visuais, a educadora foi uma das vencedoras do Prêmio Educador Nota 10
em 2013, com o projeto Paisagem sonora e exploração musical, em que levou sua turma de 5 e 6 anos
a explorar sons de forma lúdica, tomar consciência da paisagem ao redor e ampliar seu repertório
cultural. Para Lidiane, há infinitas possibilidades de se fazer isso. “Quando se trabalha com uma
ciranda, por exemplo, é um repertório; uma dança circular é outro, e ele se expande ao
acrescentarmos obras de arte com imagens de cirandas ou canções diferentes”, explica.
Outra vivência marcante foi o dia em que ela levou a turma para uma visita ao Museu Lasar Segall, em
São Paulo, dedicado à vida e a obra do pintor lituano (1891-1957) radicado no Brasil. “Na época,
estávamos trabalhando com cadernos de desenho, como o Lasar Segall tinha. Então, a atividade foi
sobre fazer desenhos do cotidiano”, lembra. A professora deu um caderno para cada um e eles
podiam desenhar livremente. Ainda no museu, os pequenos aprenderam sobre a história do artista
admirando uma apresentação de fantoches.
Durante a pandemia, no entanto, um dos maiores desafios da Educação Infantil é manter a rotina
brincante. Para Lidiane, o maior deles é a falta de interação entre as crianças. Mesmo a escola
atendendo de forma escalonada, em que uma parte da turma tem aulas presenciais e a outra,
remotas, cada criança tem seu kit de brinquedos e as brincadeiras em grupo mal ocorrem.
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Tão importante quanto o brincar, seja na escola ou em casa, é o olhar do professor para as
brincadeiras e expressões artísticas. “A postura de olhar para a criança brincando, dentro da sua
expressividade, é importantíssima porque é quando ela traz suas emoções mais íntimas”, avalia
Lucília. Atento a isso, o educador pode entender melhor a criança, acolhê-la e ajudá-la a criar outras
possibilidades expressivas e lúdicas.
Como todo mundo já brincou na vida, a experiência lúdica está mais presente na trajetória dos
professores. O mesmo não vale para a experiência artística. Uma forma de aguçar esse olhar é por
meio de formação continuada. “O interesse dos professores pela arte é o que movimenta esses
fazeres artísticos”, sustenta. Para ela, quem não tem contato com as inúmeras possibilidades de arte
dificilmente conseguirá levar a prática para o ambiente escolar.
A educadora Lidiane acrescenta que o professor da Educação Infantil ainda tende a considerar apenas
as artes visuais na prática pedagógica quando, na verdade, a exploração pode – e deve – ir além. “Na
música, por exemplo, muitas vezes o professor coloca apenas faixas do cotidiano infantil, como
Galinha Pintadinha e outras do gênero, mas é possível trabalhar também trilhas contemporâneas,
clássicas e eruditas”, sugere.
Tanto a arte quanto a brincadeira têm muito para ser explorado, conforme frisa Lucília. “Além do
campo sensorial e intuitivo que é estimulado no processo artístico e no brincar, em algum momento
vale acrescentar algo para complementar esse fazer lúdico, e é aí que entram a intencionalidade e o
planejamento do professor”, destaca a especialista.
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Há 14 anos, Elaine de Medeiros Pinto é professora da Educação Infantil no CMEI Hermann Gmeiner,
na zona oeste de Manaus (AM), uma das 21 escolas brasileiras que fazem parte do programa Escola
Transformadora. A educadora de 56 anos cresceu na roça e usava a imaginação para transformar
uma espiga de milho em boneca, uma das experiências determinantes para o trabalho que
desenvolve hoje com sua turma de 3 a 5 anos.
Elaine adora dançar e cantar, o que vivencia também no ambiente escolar. “Acredito que as crianças
sejam a própria arte, o próprio movimento. Então, quando elas se jogam, eu me jogo também. Em
sala, me sinto criança também”, brinca. Mas não só de dança e canto se baseiam as brincadeiras
propostas pela professora. Por conta da pandemia, a escola segue com o ensino remoto e, para aliviar
a saudade dos alunos da escola, Elaine e outros educadores propuseram aos pequenos a criação de
jamaxis, espécie de bolsa usada por povos indígenas, seringueiros e ribeirinhos, com materiais para
brincadeiras e atividades.
“O objetivo é levar a escola para dentro da casa deles por meio do que colocamos dentro da jamaxi,
como sementes, vagens, gravetos, folhas, tudo colhido no quintal do CMEI”, explica Elaine. Com esse
kit, renovado semanalmente, os alunos têm a possibilidade de criar todo o tipo de arte: desenhos,
pinturas, gravuras, tintas de pigmentação natural e também inventam histórias, batucam e dançam
com os itens enviados. Gabriela Riker Sousa, coordenadora do CMEI, diz que as jamaxis refletem
como o brincar aguça o desenvolvimento criativo dos pequenos e o contato com a arte. “Eles
conhecem mais sobre o grafismo e a cultura indígena, mas não só. As criações feitas com as jamaxis
envolvem reaproveitamento de materiais como garrafas pet e embalagens longa vida, além da
exploração dos elementos da natureza”, conta.
Confira sugestões de atividades lúdicas para sensibilização artística que podem ser
realizadas tanto no espaço da escola quanto em casa:
1. Criação de tinta com pigmentos naturais
Utilizando café, açafrão, urucum, beterraba, cenoura, espinafre etc., proponha investigar alimentos in natura
ou sementes que, trituradas e misturadas com água (e quem quiser com cola também), possibilitem a
descoberta de novas cores e texturas para as pinturas.
2. Arte com elementos da natureza
Com elementos naturais coletados nos espaços da escola ou da casa (folhas, galhos, flores e sementes), as
crianças podem brincar de desenhar, organizando espacialmente os elementos naturais no chão. No fim da
atividade, peça para que recolham e guardem os materiais para serem usados em outro dia. A coleção pode
crescer e, a cada dia, ficar mais rica.
3. Brincadeiras sensoriais
A ideia é pegar saquinhos transparentes (resistentes) e colocar dentro um pouco de arroz, água e anilina.
Sugira que, como o saquinho fechado, a criança passe a mão para misturar bem a anilina com o arroz.
Esse procedimento de tatear é muito prazeroso. Depois, com o arroz tingido e seco é possível fazer lindas
colagens.
4. Brincadeira de luz e sombra
Proponha que a criança direcione uma fonte de luz (lanterna ou abajur) para a parede e brinque de fazer
sombra com as mãos ou o corpo. Ao cobrir a lanterna com papel celofane colorido, a luz ganha cor e outra
pesquisa se inicia. Criativamente, outros materiais podem ser acrescentados na brincadeira, como um
lençol pendurado para criar um teatro de sombras.
5. Para produzir sons
Tubos de papelão, latinhas, potes com sementes, tampas de panela e outros são instrumentos e objetos
que podem produzir sons. Aqui, a sugestão é fazer uma cesta e deixar que a criança explore cada um
deles.