1. DIREITO PROCESSUAL CIVIL – JURISDIÇÃO
Antes de se falar em jurisdição, conceituá-la e especificar suas
características, é necessário conhecer um pouco do seu histórico
e, dessa forma, compreender melhor sua origem e seu conceito.
Bem diferente do que se conhece hoje, o conflito de interesse
entre particulares era resolvidos por eles mesmos, realizando o
que hoje chamamos de autotutela. A autotutela era a sobreposição
dos interesses dos mais fortes sobre os mais fracos. Qualquer
meio poderia ser utilizado para solucionar o conflito, inclusive
a força bruta.
Atualmente, a autotutela é vedada pela lei, salvo em raríssimas
exceções, como por exemplo a autotutela do esbulho, prevista no
art. 1.210, §1º do Código Civil.
Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em
caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de
violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.
§ 1o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou
restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os
atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do
indispensável à manutenção, ou restituição da posse.
A evolução da sociedade resultou no abandono da autotutela e na
participação de um terceiro desinteressado e imparcial, eleito
pelas partes, para dar uma solução ao conflito existente entre
elas. A arbitragem facultativa, chamada assim justamente porque
não eram adotadas, substitui a autotutela e pode ser apontada
como o primeiro passo ao sistema jurídico hoje conhecido.
Outro método de solução de conflitos é a autocomposição que,
apesar de não vedada pelo ordenamento jurídico brasileiro, é
insuficiente para abranger a solução de todos os tipos de
conflitos de interesse. Há três modalidades de autocomposição:
1ª – Renúncia / Desistência – uma das partes abre mão de sua
pretensão em face da outra. Ex.: perdão de uma dívida.
2ª – Submissão – a parte abre mão de se defender, entregando a
outra o que ela pretende receber. Ex.: devedor paga e não exige
recibo, quando cobrado paga novamente.
3ª – Transação – é um acordo, ou seja, há concessões recíprocas
entre as partes. Ex.: credor aceita prolongar o prazo de
pagamento da dívida vencida.
A arbitragem, na concepção atual, também é um dos métodos de
resolução de conflitos, neste caso um terceiro imparcial é
chamado a dar uma solução à lide. As decisões desse terceiro
imparcial, chamado de árbitro, são de cumprimento obrigatório
2. por força de lei. Caso o devedor não cumpra a decisão arbitral
esta deverá ser executada pelo próprio Estado.
Conceito de Jurisdição
A jurisdição é, no âmbito do processo civil, a função que
consiste primordialmente em resolver os conflitos que a ela
sejam apresentados pelas pessoas, naturais ou jurídicas (e
também pelos entes despersonalizados, tais como espólio, a massa
falida e condomínio), em lugar dos interessados, por meio da
aplicação de uma solução prevista pelo sistema jurídico.
A jurisdição pode assumir três papéis:
Poder – as decisões tem poder de império, quando não acolhidas
espontaneamente, são impostas para gerar eficácia;
Função – os órgãos estatais tem o dever de promover a
pacificação dos conflitos, quer individuais, difusos ou
coletivos, realizando o direito justo através do processo;
Atividade – a jurisdição é um conjunto complexo e dinâmico de
atos do juiz no processo, que exerce e cumpri sua função por
meio do princípio da legalidade.
Garantias e Princípios da Jurisdição
-> Devido processo legal – garantia de um julgamento nos termos
da lei, abrangendo contraditório, a ampla defesa e o julgamento
imparcial.
-> Contraditório – garantia de audiência bilateral, resguardando
a paridade dos litigantes nos atos processuais e a oportunidade
de defesa contra quem a pretensão se dirige.
-> Juiz Natural – direito a um juiz independente e imparcial,
previsto como órgão legalmente criado e instalado anteriormente
ao surgimento da lida. A Constituição Federal proíbe aos
tribunais de exceção, ou seja, aqueles que têm competência
estabelecida após a ocorrência do fato e por consequência julgar
um caso que ocorreu antes de sua competência.
-> Indelegabilidade – nenhum dos poderes pode delegar
atribuições políticas. Somente a Constituição pode fixar as
atribuições de cada um dos Órgãos do Judiciário, bem como o seu
conteúdo.
-> Indeclinabilidade – o juiz não pode escusar-se de dizer o
direito, ou seja, a garantido a todos o acesso a Poder
Judiciário e o direito de, através dele, conseguir uma solução a
pretensão deduzida. Nem mesmo a lacuna da lei ou sua obscuridade
deve impedir o juiz de proferir a decisão.
3. -> Ampla defesa – é permitido a todos que estão implicados no
processo a produção de provas de maneira ampla, por todos os
meios lícitos conhecidos.
-> Fundamentação das decisões – todas as decisões devem ser
fundamentadas sob pena de nulidade. A fundamentação, além de
fornecer elementos para que a parte possa recorrer e dar ciência
do motivo da decisão, ela garante o princípio da legalidade.
-> Princípio da Investidura – as pessoas físicas que representam
o Estado precisam de formal investidura para que encarnem o
Estado e tenham poder delegado do mesmo para o exercício da
judicatura.
-> Princípio da aderência ao território – o território físico é
delimitado para que um Estado não possa ferir a soberania de
outro. Por isso, a decisão de um juiz brasileiro só poderá
produzir efeitos nos Estados estrangeiros com a expressa
autorização dos órgãos competentes desses Estados, da mesma
forma quando o caso for o contrário.
-> Inevitabilidade – a autoridade dos órgãos jurisdicionais
advém do poder estatal soberano e impõe-se independentemente da
vontade das partes.
-> Inércia – o juiz deverá manter-se equidistante das partes,
evitando-se que tenha qualquer iniciativa na relação processual.
Há exceções legais que possibilitam ao juiz o início ex officio
de relação processuais.
Divisão da Jurisdição
Não há pluralidade de soberania, isso torna a jurisdição una e
indivisível, tal qual como a soberania. Desse modo, a divisão
jurisdicional se dá apenas para imprimir eficiência e
especialização da prestação jurisdicional, por meio da
competência.
4. Limites da Jurisdição
São limites da jurisdição: limites internacionais, imunidades à
jurisdição brasileira e jurisdição voluntária.
Limites Internacionais – cada Estado, de acordo com suas
normas internas, apresenta os limites de sua jurisdição.
Temos como critérios:
-> conveniência – cada Estada tem os seus próprios valores, que
independem dos valores adotados por outros Estados;
-> viabilidade – cada Estado viabiliza a forma de cumprimento de
sentenças.
O Brasil utiliza-se das seguintes ações para ligar o fato ao seu
território:
1) quando o réu tiver domicílio no Brasil;
2) quando a obrigação tiver de ser cumprida no Brasil;
3) quando o fato gerador ocorreu no Brasil;
4) quando o objeto da pretensão for um imóvel situado no Brasil,
assim como os bens de inventário.
Imunidades à jurisdição brasileira:
-> os Estados estrangeiros;
-> os Chefes de Estados estrangeiros;
-> os agentes diplomáticos.
Jurisdição voluntária
É a administração judicial de interesses privados. A jurisdição
voluntária não resolve conflitos, apenas chancela, por força de
lei, o que os interessados já resolveram. O Poder Judiciário se
manifesta apenas com mero cunho homologatório da vontade dos
interessados. Não faz coisa julgada e a alegação de vícios nela
inseridos se dá por ação anulatória, com prazo de quatro anos.
A separação judicial consensual de casal com filho menores ou
incapazes é um exemplo de jurisdição voluntária. Não há
conflito, mas deve ser homologado pelo judiciário, pois o
interesse é das partes, mas os efeitos são de ordem pública.