O documento relata um inquérito sobre um tiroteio em Paraisópolis durante uma campanha eleitoral. A investigação concluiu que o tiroteio envolveu criminosos atirando contra policiais, que revidaram em legítima defesa, matando um homem. Não houve envolvimento da equipe do candidato ou uso político dos eventos. Dois jornalistas podem ter cometido infração ao divulgar informações falsas sobre o caso.
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1. MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA 1ª ZONA ELEITORAL DO ESTADO DE SÃO PAULO
Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz Eleitoral da 1.ª Zona Eleitoral – Bela Vista da
Capital de São Paulo.
IP n.º 0600152-61.2023.6.26.0001
PROMOÇÃO DE ARQUIVAMENTO
O presente inquérito policial foi instaurado para se apurar as circunstâncias
advindas da notícia de fato exarada por Wilson Oliveira Santos, diante de eventual
questionamento sobre o crime previsto no art. 323 do Código Eleitoral, em face do, então,
candidato ao governo do Estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas e de seus apoiadores,
em razão dos acontecimentos de tiroteio em Paraisópolis, que teria ocorrido em local de
campanha eleitoral por parte do primeiro.
Em resumo, segundo a notícia de fato, o tiroteio teria sido captado por
imagens registradas por um cinegrafista da rede Jovem Pan, sendo que o fato seria
utilizado para “simular” um atentado fraudulento contra o candidato, amplamente
divulgado por seus apoiadores, para fins eleitoreiros. Ainda segundo a notícia
apresentada, o candidato e membros de sua equipe teriam ordenado que o cinegrafista
suprimisse as imagens gravadas, porque um segurança do candidato seria o responsável
por tais disparos.
Segundo os documentos colacionados aos autos, além do noticiante
Wilson Oliveira Santos, Joaquim de Carvalho (fls. 15 – ID 116844438) e Artur Rodrigues
(fls. 16 – ID116844438) também teriam informado em reportagens os fatos, com a
imputação ao candidato e aos apoiadores das ordens de apagamento das imagens e da
possível organização de uma farsa em Paraisópolis para fraudar as eleições.
Diante dos fatos em comento, foram obtidas informações oficiais de que,
no referido tiroteio, houve uma vítima fatal, oportunidade em que houve a instauração de
inquérito policial pelo DHPP –São Paulo para apuração do crime de homicídio, o que
teve decretação de segredo de justiça.
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Os autos criminais n.º 1501279-19.2022.6.26.0052 (que tramita pela 1.ª
Vara do Júri da Capital) versa sobre o referido homicídio.
Segundo a promoção de arquivamento daqueles autos, o Ministério
Público dispôs: “Trata-se de inquérito policial instaurado para apurar os fatos ocorridos
no dia 17 de outubro de 2022, às 11h30, na Rua Manoel Antônio Pinto, altura do número
223, Comunidade do Paraisópolis, Vila Andrade, nesta cidade e comarca, envolvendo a
morte de Felipe da Silva Lima após confronto com a Polícia Militar”.
Prosseguiu o Ministério Público: “O caso é de arquivamento do inquérito
policial. Realizadas as diligências necessárias, é certo que os elementos de provas
juntados aos autos evidenciam que os policiais militares efetuaram disparos de arma de
fogo contra indivíduos armados que os atacaram, que houve troca de tiros, e que durante
o confronto Felipe da Silva Lima, que estava em uma motocicleta junto com os indivíduos
ainda não identificados, foi atingido por um disparo de fuzil efetuado pelo policial militar
Ronald Quintino Correia Camacho.
Assim, forçoso reconhecer que o policial militar Ronald e os demais
policiais usaram os meios necessários para repelir atual e injusta agressão, sem incorrer
em excesso, tendo em vista que agiram dentro dos rígidos limites da lei. Com efeito, os
policiais agiram em legítima defesa própria e de terceiros, e agiram também em estrito
cumprimento de dever legal – duas excludentes que afastam a ilicitude de suas condutas.
Nesse sentido, foi demonstrado que os policiais fizeram uso moderado dos meios
necessários para repelir injusta agressão por parte de indivíduos armados: Felipe foi
atingido por um único disparo durante o confronto, e não há elementos que indiquem que
outras pessoas tenham sido atingidas).
Conclui-se, portanto, pela configuração das causas de excludente de
ilicitude de legítima defesa e estrito cumprimento do dever legal. Além disso, não foi
confirmada a participação de pessoas integrantes da equipe do então candidato Tarcísio
de Freitas na troca de tiros.
Aparentemente, a ação dos criminosos foi dirigida contra os policiais
militares. De todo modo, ainda que se demonstrasse que algum integrante da equipe
também trocou tiros com os indivíduos armados, a conclusão, por inexistir qualquer
elemento que apontasse excesso, seria a mesma mencionada acima, ou seja, de que teria
agido acobertado por excludente de ilicitude.
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Deste modo, esclarecidas as circunstâncias dos fatos aqui apurados, por
entender configurada a ocorrência das referidas excludentes de ilicitude, requeiro o
ARQUIVAMENTO do presente inquérito policial, com as ressalvas do artigo 18 do
Código de Processo Penal” (fls. 452/462 – daqueles autos).
Por fim, o Magistrado competente (fls. 464/465 – daqueles autos),
exercendo o papel de garantidor dos direitos fundamentais na análise dos motivos do
arquivamento pelo Ministério Público, homologou com as seguintes expressões:
“Homologo o quanto requerido pelo Ministério Público, eis que reconhecida a prática
dos fatos sob o manto da legítima defesa e do estrito cumprimento do dever legal, e
DETERMINO O ARQUIVAMENTO DO PRESENTE INQUÉRITO POLICIAL,
ressalvado o disposto no artigo 18 do Código de Processo Penal, com observância à
Súmula 524 do Supremo Tribunal Federal”.
Houve, então, a juntada das peças nos presentes autos para a demonstração
da apuração efetivada naquela oportunidade.
Este é o breve relato. O feito comporta arquivamento.
Ao contrário do que noticiado pelo representante e pelos repórteres que
divulgaram as matérias discrepantes da realidade, os fatos (tiroteio e morte) ocorreram em
circunstâncias diametralmente diversas. O alvejado e os demais comparsas (ainda a serem
investigados) identificaram a presença de policiais militares disfarçados na multidão e,
por se tratar de local com alta periculosidade conflituosa, investiram contra os servidores
públicos no exercício de suas funções de manutenção da paz social com disparos de arma
de fogo.
Em qualquer espécie de aglomeração de pessoas, como uma campanha
eleitoral, o trabalho exercido pela Polícia Militar será desempenhado para manutenção da
segurança de todos os indivíduos que estão em tais circunstâncias, claramente no sentido
de proteção de toda a população envolvida.
Neste sentido, cumpre-nos salientar as provas colhidas pelos depoimentos
das pessoas que participaram dos fatos.
Em depoimentos colhidos pela Autoridade Policial Federal, em
31/10/2023, Wilson Oliveira Santos relatou, em síntese, que: foi autor da petição de fls.
09/12, protocolada no dia 27/10/2022; que o depoente tinha escritório no HOLLIDAY
NORTE HOTEL, localizado na Rua da Aviação, nº 98, Santana, São Paulo/SP; que
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ocupava o apto 20 do Hotel; que: não informou em sua petição o quarto em que estava
hospedado no Hotel; que deixou de trabalhar no Hotel em 2022; que somente passou a
residir na Rua Almirante Matoso Mais, 15, apto 02, no presente ano; que: seu CPF é
014.020.685-06; que admite que cometeu erro material em sua petição, onde consta como
seu CPF 014.020.685-05; que todas as fontes de sua petição foram obtidas na internet em
sites como "www.brasil247.com"; que não tem qualquer gravação, vídeo ou
propaganda política do Candidato Tarcísio, em que o mesmo ou outro membro de
sua campanha eleitoral tenha relatado ter sofrido atentado político no dia
17/10/2022; que o depoente foi filiado ao PTC até o ano de 2013; que participou da
campanha eleitoral do candidato para Deputado Estadual Rodrigo Feitosa do PODEMOS
nas eleições de 2022.
Ainda, em 14/11/2023, foi realizada via "teams" a oitiva de Marcos
Vinicius de Andrade, onde relata, em síntese, que trabalhou como prestador de serviços,
pessoa jurídica, para o grupo Jovem Pan, entre novembro de 2011 até outubro de 2022;
que fez filmagens da campanha do então candidato para Governador de São Paulo,
Tarcísio de Freitas, junto a favela Paraisópolis, no dia 17/10/2022; que filmou a
ocorrência após serem ouvidos disparos no local; que não filmou o momento em que
Felipe da Lima Silva foi alvejado; que filmou o autor dos disparos, bem como de Felipe
atingido no chão; que um membro da comitiva de Tarcísio que tinha um distintivo do
ABIN pediu para o depoente apagar as imagens; que o depoente não apagou as imagens;
que as imagens foram encaminhadas para o grupo Jovem Pan; que não tem conhecimento
que as imagens foram alteradas pelo Grupo Jovem Pan; que Tarcísio de Freitas não
afirmou em nenhum momento que o fato era um atentado político contra ele; que o
depoente não foi ouvido na Polícia Civil sobre os fatos do dia 17/10/2022; que o grupo
Jovem Pan pediu para que o depoente fizesse um depoimento favorável ao candidato
Tarcísio de Freitas; que o depoimento seria utilizado na campanha de Tarcísio; que o
depoente não aceitou o pedido; que não sabe qual seria o teor do depoimento; que o
depoente pediu o seu desligamento da Jovem Pan; que não houve qualquer contato por
parte de membro da campanha de Tarcísio sobre o depoimento; que o depoente deu
entrevista para o jornalista Artur Rodrigues da Folha de São Paulo, sendo que, em
nenhum momento, relatou que o fato acontecido no dia 17/10/2022 foi uma farsa da
campanha eleitoral de Tarcísio, quando ouvido pelos jornalistas do TV 24/7
(Joaquim de Carvalho) e da Folha de São Paulo (Arthur Rodrigues), quando
indagado sobre as notícias; que não sofreu qualquer ameaça ou contato de membros da
campanha de Tarcísio ou Grupo Jovem Pan, após seu desligamento da última; que não
viu nenhuma menção na propaganda de Tarcísio que o fato pode ter sido um atentado
político contra o candidato; que o depoente nunca foi filiado a um partido político, sendo
que nunca participou de qualquer campanha eleitoral.
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Por fim, quanto ao candidato e aos apoiadores de campanha não houve
qualquer identificação de utilização dos fatos a favor político do candidato.
Infelizmente, os meios de comunicação, representados pelas matérias de
fls. 15/16, TV 24/7 (Joaquim de Carvalho) e da Folha de São Paulo (Arthur
Rodrigues), propagaram menções inverídicas dos fatos relatados por Marcos Vinícios de
Andrade, o que se amolda no art. 323 do Código Eleitoral, com o pretexto de influenciar
na campanha eleitoral de forma negativa do então candidato ora averiguado nos autos.
Ante o exposto, quanto à imputação efetivada ao candidato e aos
apoiadores de campanha, sem qualquer identificação, por razões claras, promovo o
ARQUIVAMENTO do presente feito, em relação ao disposto no art. 323 do Código
Eleitoral, diante da ausência de elementos de materialidade delitiva, pois não houve
qualquer utilização dos fatos para aproveitamento eleitoral positivo.
Sem prejuízo, o feito merece prosseguimento, diante do aproveitamento
eleitoral negativo, por parte dos averiguados Arthur Rodrigues e Joaquim de Carvalho,
para a feitura de matérias que contém conteúdo inverídico, diante da negativa do próprio
cinegrafista, com fundamento no art. 323 do Código Eleitoral, bem como em face dos
diretores de reportagem que autorizaram a divulgação das matérias constantes dos autos,
com as diligências a serem desempenhadas pela Autoridade Policial Federal.
Em complementação às diligências anteriormente solicitadas, há
necessidade de realização dos interrogatórios de Arthur Rodrigues e de Joaquim de
Carvalho, com as respectivas qualificações, para análise de infrações penais eleitorais em
face das matérias constantes de fls. 15/16 (ID 116844438), bem como dos diretores
responsáveis pela divulgação das respectivas notícias em comento.
São Paulo, 04 de dezembro de 2023.
Fabiano Augusto Petean
Promotor Eleitoral