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Pacote nacional de projeto e maquinário
de embarcações de apoio marítimo
à produção de petróleo no mar
Pesquisa Apoiada pela FINEP
Coordenação
COPPE IPT USP
Subprojeto
Avaliação de desafios institucionais
e capacitações industriais
de empresas potencialmente fornecedoras
de componentes no projeto de um PSV nacional
Pesquisador: Jean Carlo Viterbo, MSc.
Relatório Final
PNV, USP, Setembro 2013
Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas
potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional.
Relatório de atividades e resultados.
Jean Carlo Viterbo, MSc.
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In: Visão Estratégica Espírito Santo 2025, Reunião Técnica Macroplan - Benchmarking Petróleo, 31/12/05; fonte desconhecida.
Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas
potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional.
Relatório de atividades e resultados.
Jean Carlo Viterbo, MSc.
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Sumário
1. Preâmbulo ............................................................................................................................................................5
2. Aspectos de economia industrial sobre o desenvolvimento da indústria parapetroleira ...................................6
3. Aspectos da teoria de inovação e competitividade orientados à construção naval............................................9
4. O caso norueguês do desenvolvimento da indústria parapetroleira.................................................................14
5. Desafios jurídicos à política brasileira de conteúdo local para o setor parapetrolífero ....................................20
6. Aspectos da demanda dos barcos de apoio a plataformas (PSV’s)....................................................................23
7. Tipologia, figuras e dados do setor de embarcações de apoio marítimo no Brasil............................................26
8. Aspectos do debate empresarial sobre conteúdo local.....................................................................................36
9. Conclusões e sugestões de passos em prol da cadeia nacional de fornecimento de navipeças .......................49
10. Referências .....................................................................................................................................................52
11. Anexo 1 - Frota de embarcações de apoio registrada na ABEAM..................................................................55
12. Anexo 2 - Frota de embarcações de apoio registrada na ANTAQ, com dados técnicos ................................63
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potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional.
Relatório de atividades e resultados.
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Lista de Tabelas
Tabela 1 – Estrutura de custos de produção e índice de nacionalização de embarcações de apoio no Brasil 25
Tabela 2 – As 36 empresas associadas à ABEAM, tal como em agosto de 2013 32
Tabela 3 – Frota associada à ABEAM por classe de embarcação e bandeira, tal como agosto de 2013 32
Tabela 4 – 17 notícias sobre conteúdo local no Jornal Valor Econômico durante o 1º semestre de 2012 37
Tabela 5 – 16 notícias sobre conteúdo local no Jornal O Estado de São Paulo durante o 1º semestre de 2012 39
Lista de Figuras
Figura 1- Estrutura de custos de produção para três tipos de navios em estaleiro europeu (2004) 24
Figura 2- Proporções da frota associada à ABEAM, segundo a bandeira e segundo a classe da embarcação 32
Figura 3 - Evolução da Frota Nacional de Embarcações de Apoio Offshore (fonte: ABEAM) 35
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potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional.
Relatório de atividades e resultados.
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1. Preâmbulo
Os projetos internacionais de embarcações de apoio marítimo têm evoluído à medida que a exploração de petróleo
e gás avança para águas cada vez mais profundas e distantes da costa. Para atender aos requisitos operacionais das
regiões produtoras de petróleo e gás localizadas no Pré-Sal, uma nova geração de embarcações de apoio marítimo
deverá ser desenvolvida. Isso porque a região, distante cerca de 300 quilômetros da costa, apresenta prevalência
de condições ambientais mais adversas ou bastante distintas daquelas encontradas em outras localidades do
mundo.
Por exemplo, as fortes correntezas (que frequentemente atingem 4 nós) combinadas com intenso swell têm
representado um desafio para as operações de suprimento na Bacia de Campos. Para as operações na região do
Pré-sal, na bacia de Santos, são esperadas condições ambientais ainda mais críticas. Surge então a oportunidade
para o desenvolvimento nacional de um projeto conceitual de embarcação destinada a atender às necessidades
operacionais e às funcionalidades exigidas para as operações marítimas na região do Pré-sal.
Diante da perspectiva de significativo aumento da demanda por embarcações de apoio a plataformas (PSV) no
Brasil e da mudança tecnológica para sistemas de propulsão diesel-elétricos, esta pesquisa aponta, no seu nível
macro e também no subprojeto aqui relatado, algumas oportunidades de desenvolvimento de máquinas e
equipamentos nacionais que poderão ser introduzidas nessas embarcações, bem como as suas dificuldades para o
fornecimento para os estaleiros. Em vista destas peculiaridades a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a
Universidade de São Paulo (USP) e o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), estão desenvolvendo dois projetos
conceituais de embarcações de apoio, preocupando-se com o conteúdo local dos componentes a bordo. O objetivo
final da pesquisa em seu nível macro é selecionar concepções de projeto, maquinário e equipamentos a serem
introduzidos no pacote de projeto e maquinário de uma embarcação de apoio de 4500 DWT. O projeto conta com
o apoio financeiro da FINEP.
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potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional.
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2. Aspectos de economia industrial sobre o desenvolvimento da indústria parapetroleira
Xavier Júnior (2012) sustenta que, ao contrário do que o senso comum leva a crer, a descoberta e a extração de
recursos naturais podem ser vistas como uma maldição e não como uma benção. Partindo destes eventos,
poderiam surgir dois males na economia nacional: um deles é conhecido como a Doença Holandesa, enquanto o
outro é chamado de Maldição dos Recursos. Embora ambos tenham origem no surgimento repentino de riquezas
advindas de recursos naturais e compartilhem traços gerais, elas envolvem diferentes mecanismos de ação.
O autor cita Larsen (2005), o qual define Doença Holandesa como o encolhimento do setor manufatureiro como
consequência do deslocamento de fatores para a extração de recursos naturais. Além deste movimento de
fatores, a Doença Holandesa também está relacionada ao efeito do aumento dos gastos governamentais
decorrente da conversão dos recursos naturais em moeda nacional e a perda dos ganhos na economia devido à
redução das externalidades (efeitos em cascata) como resultado do empobrecimento dos setores de maior valor
adicionado (Larsen, 2006). O termo foi cunhado pela revista The Economist em 1977 para descrever a desaceleração
industrial ocorrida na Holanda após a descoberta de enormes jazidas de gás natural em mar territorial na década
de 50. O termo Maldição dos Recursos refere-se à observação empírica de que muitos países abundantes em
recursos naturais tendem a crescer mais lentamente do que outros países similares não possuidores dos mesmos
recursos (Larsen, 2006). No Brasil, já se verificou a possível existência da Maldição em escala municipal, uma vez
que as cidades que recebem recursos financeiros advindos do setor petrolífero (royalties) tendem a crescer menos
do que aquelas que não recebem (Postali, 2009).
Citando Papyrakis e Gerlagh (2006), Xavier Júnior (2012) enumera quatro diferentes fenômenos sugeridos como
responsáveis pela Maldição dos Recursos, como segue:
1. A existência de recursos naturais abundantes, que reduz a qualidade institucional de um país, induzindo
comportamento de rentismo e corrupção.
2. A abundância de recursos naturais tende a deteriorar a dinâmica de comércio e tende a reduzir o grau de
abertura econômica. As causas disso seriam a perda da competitividade da indústria, como consequência
da supervalorização da moeda local e da imposição de quotas para, supostamente, proteger os
produtores nacionais.
3. Recursos naturais reduzem o investimento em educação de alta qualidade e trabalho qualificado uma vez
que o setor manufatureiro passa a encolher e a diminuir sua demanda por profissionais qualificados,
reduzindo o retorno da qualidade educacional.
4. O esvaziamento do investimento em capital físico na indústria nacional.
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potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional.
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Quanto ao esvaziamento do investimento em capital físico, diversos mecanismos parecem contribuir com isso. Um
deles é a incerteza, decorrente do risco de impacto na economia nacional da eventual volatilidade do preço da
commodity da qual o país depende. Outro contribuinte é a redução de produtividade e lucratividade dos
investimentos devido à perda dos efeitos em cascata do setor manufatureiro e seus retornos crescentes de escala,
como consequência do movimento dos fatores para uma condição concentrada na obtenção dos recursos naturais
(Papyrakis e Gerlagh, 2006). Uma vez que este movimento de fatores é o que caracteriza a Doença Holandesa,
alguns autores sustentam que a Doença Holandesa é claramente uma das causas da Maldição dos Recursos.
Apesar disto, é possível que um país possa sofrer de um desses males sem sofrer do outro. A existência ou não da
Doença Holandesa estaria ligada a uma baixa diversificação das exportações do país, enquanto a presença da
Maldição dos Recursos seria perceptível através do baixo crescimento da economia (Larsen, 2006). Há indícios,
entretanto, de que a redução do tamanho do setor manufatureiro, redução da aprendizagem e a estagnação
econômica não estejam necessariamente ligadas à produção de recursos naturais (Stijns, 2005). Portanto, uma
política ativa de conteúdo local pode ser empregada por um país como forma de que sua economia experimente
maior crescimento e diversificação para além do recurso natural explorado, mesmo sendo ele a origem do
desenvolvimento. Neste sentido, um caso de especial interesse é o da Noruega, conforme analisado por Xavier
Júnior (2012). O caso será explanado no capítulo seguir.
A omissão governamental em desenvolver atividades mais diversas pode ser um grande impedimento para o
aprimoramento da produção, o surgimento de mudanças estruturais e o desenvolvimento econômico, aumentando
a probabilidade da ocorrência da Doença Holandesa e da Maldição dos Recursos. Mas há evidências de que as
atividades de suprimento de equipamentos e serviços para a indústria de mineração, em geral, criam benefícios
econômicos (expansão dos negócios), sociais (geração de empregos e maior competitividade), técnicos (capital
intelectual aumentado, melhor desenvolvimento de produto/sistemas) e até mesmo ambientais (através do
desenvolvimento de atividades de mineração mais eficientes), conforme exporto por Lydall (2009). Este autor
fortalece o argumento de que, com políticas adequadas, a produção de recursos naturais pode ser algo mais
próximo de uma benção do que de uma maldição. Neste sentido, o que mais importa para o desenvolvimento
baseado em recursos naturais é a natureza do processo através do qual o potencial econômico destes recursos é
atingido e do processo de aprendizagem no qual o país se vê envolvido (Wright, 2001). Para que este
desenvolvimento seja atingido são necessários ainda capital humano de alto nível e desenvolvimento de capacidade
nacional de aprendizagem e inovação (De Ferranti et al., 2002). Nesta mesma linha, Wright (2001) conclui que o
mais importante para o desenvolvimento econômico baseado em recursos não é a quantidade de processamento
realizado em um país, mas sua participação no processo de aprendizagem de modo estruturado para que metas de
desenvolvimento sejam internalizadas. Sob esta perspectiva, o Estado pode influenciar no processo de
incorporação das riquezas naturais pela economia ao investir em recursos humanos apropriados e patrocinar
projetos e políticas especialmente selecionadas que favoreçam a aprendizagem das firmas da cadeia
parapetroleira.
Deve ser destacado ainda que, como são intensivas em capital e requerem ganhos de escala, as principais atividades
desenvolvidas por fornecedores na indústria petrolífera tendem a ser realizadas por grandes firmas já estabelecidas
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potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional.
Relatório de atividades e resultados.
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no exterior, que possuem tecnologia, recursos humanos e escala para produzir com eficiência (Klueh et al., 2007).
Para identificação das áreas a serem incentivadas estes autores acreditam que os tomadores de decisão das
políticas de conteúdo local devem favorecer atividades que venham a promover a diversificação da economia ao
gerar novas áreas de vantagem competitiva para o país, além de gerar desdobramentos suficientes para a economia
nacional.
Assim, visando fortalecer a economia do país e evitar a Doença Holandesa e a Maldição, deve-se usar uma política
de conteúdo local que atue em diversas frentes e que promova atividades na cadeia de suprimentos da indústria
petrolífera, buscando gerar aumento do nível educacional da população, fortalecer atividades de pesquisa e
desenvolvimento e incentivar setores manufatureiros com possibilidade de competir internacionalmente. Esta
estratégia poderia gerar vantagens competitivas para o país, desdobramentos na economia nacional e, finalmente,
crescimento econômico sustentável. Por outro lado, uma política de conteúdo local que não siga estes princípios
pode incentivar o surgimento de um setor manufatureiro não competitivo e sem maiores desdobramentos, a ser
sustentado com base na produção de recursos naturais e com perda de bem-estar econômico, o que pode
aprofundar os efeitos da Doença Holandesa e da Maldição dos Recursos, caso estas venham a se manifestar.
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potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional.
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3. Aspectos da teoria de inovação e competitividade orientados à construção naval
É comum que países emergentes que tenham uma economia robusta e uma crescente dinâmica comercial partam
para programas de desenvolvimento focados na criação de empresas industriais nacionais campeãs em setores
escolhidos. Um natural desafio decorrente disso é a composição de uma “estratégia de suprimento local” que possa
dar amparo ao programa e ao mesmo tempo disseminar os efeitos econômicos desse programa. Decorre então o
desafio de contrabalancear suprimento global versus suprimento local. Para desenvolver o suprimento local, fica
subentendida a necessidade de se investir em infraestrutura para este segmento, por exemplo, bens de capital e
capacitação profissional. Por sua vez, as estratégias de suprimento global, ainda que ofereçam vantagens
potenciais em termos de custo e qualidade, podem não oferecer o mesmo grau de agilidade e flexibilidade para
o programa de desenvolvimento nacional, se comparada com a estratégia de suprimento local, a qual reduz os
riscos logísticos e reduz o ciclo de pedidos.
Entretanto, as empresas locais muitas vezes não estão em conformidade com os padrões internacionais para
produtos, processos (qualidade e meio ambiente), e habilidades de trabalho. A incapacidade de atender a esses
padrões é uma indicação das limitações das capacidades tecnológicas das empresas locais. Quanto maior essa
indicação, mais intensa será a relação da “empresa campeã” com os fornecedores globais e/ou maior a
verticalização que a empresa campeã fará para integrar e operar seu suprimento de forma própria.
Figueiredo (2001, 2007) define a capacitação tecnológica como sendo o aprimoramento que uma organização faz
em termos de aumento de qualidade e diminuição de custo nos seus produtos, serviços, procedimentos, processos,
equipamentos, instalações e principalmente no conhecimento de sua força de trabalho. Logicamente, tais
aprimoramentos podem ser fruto da incorporação de tecnologias absolutamente novas, ou da aplicação de
tecnologias já existentes, mas que não eram aplicadas na organização. Lall (2000) argumenta que, diferente do que
ocorre em economias avançadas, tornar-se um fornecedor competitivo em uma economia emergente
normalmente não exige o mesmo nível de esforço para a inovação no desenvolvimento de tecnologias de ponta,
dado que os fornecedores endógenos da base da cadeia são normalmente meros receptores da transferência de
tecnologias, sejam as já existentes nas economias avançadas ou sejam as absolutamente novas para todas as
economias, mas que por isso mesmo serão de domínio das economias avançadas. Isto posto, o nível de sucesso
da estratégia de suprimento local é diretamente dependente e proporcional ao nível de sofisticação que os
fornecedores da base têm no referido processo de transferência tecnológica. O papel dos fornecedores da base
é, portanto, elemento crítico de sucesso da estratégia de suprimento local.
Schmitz (1995) propõe as questões chave que devem ser acompanhadas para a gestão efetiva do crítico papel dos
fornecedores da base, em prol da estratégia de suprimento local. São elas:
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1. Quais são os indutores de capacitação tecnológica que sejam críticos para influenciar a inserção de
fornecedores locais na cadeia de suprimento da empresa campeã, e quais os limites da extensão que
essas variáveis terão para exercer tal influência?
2. Após inseridos na cadeia, quais os processos que os fornecedores locais têm que seguir para elevar o
seu grau de capacitação tecnológica (e sofisticação) na cadeia de suprimentos da empresa campeã?
3. De que forma, e em que nível, a eficiência coletiva do sistema local de inovação e das firmas inseridas
num cluster industrial favorecerão a iniciativa da empresa campeã em prol do suprimento local?
As questões acima tiveram o seu preâmbulo e a sua análise muito bem explanados e adaptados por Marcos Primo
e Frank DuBois (2012) para o caso da indústria brasileira de construção naval, tendo na Petrobrás a figura da
empresa campeã e nos fornecedores dos estaleiros do Brasil a figura das empresas que ensejam a estratégia
nacional de suprimento local.
Os autores iniciam a análise reafirmando premissas importantes à análise:
1. as empresas locais normalmente têm capacitações tecnológicas aquém dos níveis de conformidade
requeridos pela empresa campeã (Primo e DuBois 2012);
2. as empresas locais não estão inseridas em um cluster organizado de tal forma que lhes permita
beneficiarem-se das externalidades positivas que decorreriam da capacitação tecnológica de algumas
outras firmas do cluster (Primo e Dubois, 2012).
3. a trajetória do desenvolvimento tecnológico de economias emergentes é inversa à que ocorre em
economias avançadas. Nos emergentes, a capacitação tecnológica começa no nível da produção e
operação, indo depois para o nível da engenharia, design e gestão, indo por último para o nível de
pesquisa e desenvolvimento (Figueiredo 2001, Bell 2007).
Primo e Dubois se apóiam em Koenig (2002), para afirmarem que, diferente do que ocorre na construção de navios
militares ou de cruzeiro, os estaleiros de navios comerciais concentram a sua ação em minimizar o custo da
embarcação e em manter a sofisticação tecnológica da embarcação num nível mediano. Mas devido às exigências
de certificação de processos produtivos como requisito das seguradoras dos navios de operações petrolíferas,
apesar das embarcações serem de mediana sofisticação, os estaleiros têm que manter postura agressiva no que
tange à sofisticação tecnológica de seus processos e à certificação de seus fornecedores. Os autores argumentam
que a principal barreira para a entrada de novos concorrentes neste setor é o desafio da obtenção de uma
coletividade de certificações de qualidade para a construção em si e para as operações conduzidas no estaleiro.
Como forma de minimizar os riscos advindos desse desafio, os armadores e estaleiros passam então a concentrar
sua atenção e esforços no design e montagem do casco, e na colocação de sistemas do navio que já chegam
integrados por terceiros (“outsourcing”), a exemplo de sistemas de potência e propulsão, sistemas de navegação,
etc.), em vez de produzirem internamente.
Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas
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Sobre as causas do outsourcing, os autores explicam-se utilizando do caso que ocorre nos sistemas de potência e
propulsão, dizendo que são poucos os seus fornecedores e todos são de abrangência global. Eles citam os seguintes
motivos para tal fenômeno ocorrer com esses sistemas:
1. tais sistemas não podem ser aplicados em vasta variedade de navios e, portanto, a sua demanda global
é reduzida, se comparada a outros componentes de aplicação mais vasta.
2. dada a baixa demanda local, investimento necessário para a construção de unidades fabris destes
equipamentos se torna, portanto, algo instransponível para empresas que não tenham atuação global.
3. as incertezas quanto aos futuros pedidos também gera barreira para novos entrantes, especialmente as
empresas locais (com especial desafio para a certificação de produtos que sejam desconhecidos pelos
certificadores, os quais também são globais).
4. não tendo uma escala global de produção, os fornecedores locais não têm como competir
igualitariamente no aspecto de custo, frente aos fornecedores globais.
O resultado desses fatores é que os fornecedores locais acabam sendo meros integradores de componentes
produzidos por fornecedores consagrados internacionalmente. Neste caso, o valor adicionado pelos integradores
é tão somente a gestão comercial da variedade de fornecedores (sejam eles poucos ou muitos, de acordo com o
item em questão), e a capacidade técnica de integrar os subsistemas, transformando num sistema que atenda o
requisito econômicos e operacional (visão do construtor / armador) e o requisito de qualidade e segurança (visão
das certificadoras). Os autores se apoiam em Quadros (2004) para afirmar que o nível de competência tecnológica
requerido pelas certificadoras, e o volume de recursos tomados pelos procedimentos de certificação (custos altos,
prazos longos, paralizações da linha de produção, custos de consultoria) são barreiras de entrada para novos
entrantes, especialmente os pequenos em mercados emergentes. Não obstante a afirmação de que a certificação
é crítica, os autores afirmam também que a obtenção de certificação (subentendido aqui seu teor de
padronização) não é elemento que necessariamente contribui para o fortalecimento das relações entre
fornecedores e estaleiros / armadores, podendo até enfraquecê-las. Os autores citam como causas disse
fenômeno os seguintes itens:
1. sendo uma indústria que trabalha para atender requisitos de encomendas específicas, os fornecedores
de componentes ficam à mercê das subjetividades das especificações de produtos, e tais subjetividades
não são suficientemente codificáveis (Quadros, 2004).
2. As certificações são para o comprador uma indicação da responsabilidade do fornecedor em assumir
responsabilidades adicionais e, como decorrência, elas substituem o monitoramento que o
comprador faria diretamente junto às ações de seu fornecedor, resultando que os estaleiros /
armadores tenham pouca inclinação para se engajar proativamente nas iniciativas de capacitação
tecnológica promovidas pelos fornecedores (Quadros, 2004, e Navdi, 2008).
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potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional.
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3. Como a certificação traz maior padronização, fica mais fácil para o estaleiro substituir um fornecedor
(que seja certificado) por outro (também certificado) e a cadeia de suprimentos fica mais flexível e fluida
(Gereffi, Humphrey, e Sturgeon, 2005). Associado ao interesse do estaleiro em terceirizar tarefas que
não lhe sejam críticas, o fornecedor ganha espaço para entregar sistemas integrados, fazendo surgir um
tipo de governança híbrida na cadeia chamada de “governança modular”. Os autores argumentam que,
para entregar módulos complexos e bem integrados pelo método turn-key, os fornecedores precisam
de competências em engenharia em nível alto e abrangência ampla, determinantes de uma capacitação
tecnológica menos provável de ser encontrada em fornecedores locais do que nos globais (Figueiredo,
2001).
Uma forma pela qual os fornecedores locais de países emergentes podem se utilizar para compensar a menor
cooperação vertical advinda dos estaleiros para a si, individualmente, é a cooperação horizontal e coletiva, ou
seja, junto a outros fornecedores dos estaleiros, que é uma das características que definem um cluster. Os autores
se apoiam em Humphrey (2003) para afirmar que a esfera do cluster é a mais apropriada para promover
cooperação, promover aprimoramento e alavancagem da produção e a eficácia na entrega de assistência técnica.
Na Coréia, os fornecedores locais se utilizaram de clusters para ganhar força perante fornecedores globais, e
receberam do governo o devido aporte em termos de investimento em infraestrutura, arcabouço institucional,
estabelecimentos de ensino altamente especializados e uma fortíssima cultura orientada à produtividade.
A cooperação por meio de clusters leva então ao aprimoramento da capacitação tecnológica, que pode elevar a
posição (upgrading) que um fornecedor local tenha na cadeia de suprimento da empresa campeã. Humphrey e
Schmitz (2002) identificam quatro formas de upgrading para os fornecedores locais:
1. upgrading de processo: transformar inputs em outputs de maneira mais eficiente, por meio da
reorganização do sistema de produção ou da introdução nele de uma tecnologia superior.
2. upgrading de produto: mover-se gradualmente para linhas mais sofisticadas de produtos
3. upgrading de função: exercer papéis mais importantes na cadeia de suprimento da empresa campeã,
por meio não apenas de produtos de maior valor agregado, mas também de atividades de maior valor
agregado (por atividades subentende-se inclusive, mas não somente, serviços). São os diferentes tipos
de capacitações centrais que uma firma tem que internalizar para usar, dominar e modificar uma
tecnologia nova, o que naturalmente exige níveis mais elevados de capacitação tecnológica.
4. upgrading intersetorial: uma empresa, ou cluster, de um setor alheio ao da empresa campeã, combinam
esforços que resultam em novas atividades produtivas (ou produto) de modo a criar valor para a
empresa campeã.
Primo e Dubois (2012) analisaram a relação (porquê e como) que a capacitação tecnológica tem com o upgrading
realizado por fornecedores locais inseridos nas cadeias de suprimento de construção naval em países emergentes.
Os autores indicam que a capacitação tecnológica pode ser debatida em duas dimensões: níveis tecnológicos e
funções tecnológicas. Em sua análise, eles trazem um debate primorosamente fundamentado que resulta em 7
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postulados, sendo 4 para a dimensão “nível tecnológico” (N) e 3 para a dimensão “função tecnológica” (F) tal como
descrito a seguir:
N1. em um mercado emergente, na cadeia de abastecimento de uma empresa campeã, será
significativamente maior no primeiro nível da cadeia a proporção de fornecedores locais que tenham
penetração internacional, se comparado com os níveis mais baixos, onde predominarão os fornecedores
locais sem penetração internacional.
N2. quanto melhores forem as ligações que um fornecedor local mantiver com empresas compradoras,
outras empresas fornecedoras e com organizações do sistema nacional de inovação (universidades,
centros de pesquisa, etc), maiores as chances deste fornecedor para aderir a cadeia de suprimentos da
empresa campeã, como membro direto ou indireto.
N3. sendo a capacitação tecnológica uma característica mais comum a empresas maduras, as empresas
industriais em fase inicial produzirão internamente partes de baixa tecnologia no maior número
possível.
N4. a inserção de um prestador de serviços local (como fornecedor direto ou indireto) é mais provável na
cadeia de suprimentos de produção da empresa (fase de produção industrial) do que a inserção de um
fornecedor de produto local.
F1. devido à predominância da empresa campeã na imposição do requisito dos equipamentos, os
fornecedores locais bem ligados à cadeia da empresa campeã serão mais propensos a desenvolver
upgrading de processo do que os demais tipos de upgrading.
F2. o upgrading funcional será o tipo menos provável a ocorrer em fornecedores ligados à cadeia de
suprimentos da empresa campeã.
F3. quanto mais limitadas forem as capacitações tecnológicas dos fornecedores locais em um segmento novo
no qual a empresa campeã esteja se lançando, será maior a tendência a ocorrer fenômenos de upgrading
intersetorial nesta cadeia, ou seja, a entrada de fornecedores locais que acumulem reputação de
destaque em outros setores.
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4. O caso norueguês do desenvolvimento da indústria parapetroleira
As atividades de exploração e produção de petróleo no país se iniciaram no começo da década de 1960 e em 1965
foi estabelecida a Lei do Petróleo no país, determinando que o governo concederia licenças para empresas
petrolíferas internacionais que trabalhassem para a maximização dos benefícios locais. Entre o final das décadas de
60 e 70 foi estabelecido que o governo norueguês teria participação em todos os campos em desenvolvimento
através da Statoil ou da Norsk Hydro, o que era visto como instrumental para fornecedores locais. Ainda na década
de 70 foi estabelecido o Escritório de Bens e Serviços (EBS), com os objetivos de:
i) monitorar e cooperar com as empresas petrolíferas para desenvolver fornecedores locais;
ii) estimular a indústria de fornecedores locais através de joint-ventures;
iii) encorajar atividades de P&D e a transferência de tecnologia;
iv) rever procedimentos de tomada de cotações e garantir que empresas locais tivessem oportunidade de
realizar ofertas;
v) estabelecer metas para a participação de fornecedores locais na indústria.
O artigo 54 do Decreto Real de 1972 referia-se ao conteúdo local da indústria petrolífera e direcionou o governo a
garantir que os fornecedores noruegueses tivessem a preferência de fornecimento à indústria, dado que fossem
competitivos em preço, prazo, qualidade e serviço. Com a entrada da Noruega no Espaço Econômico Europeu (EEE)
no início da década de 90, o Artigo 54 foi considerado inválido e o governo passou a incentivar a expansão da
indústria parapetroleira local para o exterior, tendo em conta a melhoria da eficiência. As políticas de conteúdo
local norueguesas passaram ainda por ações visando evitar a perda dos efeitos sistêmicos, por meio da acumulação
de expertise local, construção de conhecimento em centros tecnológicos, educação de especialistas em petróleo,
investimento em pesquisa de petróleo e manutenção de uma base de exportação diversificada (Larsen, 2006). Estas
ações sistêmicas do governo foram ainda combinadas com suas políticas industrial, de incentivo à educação, de
P&D e a política macroeconômica, de modo a escapar da Doença Holandesa e da Maldição dos Recursos, havendo
estudos indicando o sucesso destas políticas (Bjørnland, 1998; Larsen, 2006).
De forma geral, a Noruega é o caso clássico de país que conseguiu fugir da Maldição, mantendo uma economia
forte mesmo depois de produzir petróleo (Larsen, 2005), tendo ainda se beneficiado das descobertas de recursos
e dos altos preços do petróleo (Bjørnland, 1998). A perda de transbordamentos que poderia gerar a Doença
Holandesa e a Maldição dos Recursos foi substituída por ganhos no setor de extração de petróleo offshore, mais
intensivo em capital e tecnologia que o onshore. Além disto, a política industrial norueguesa estimulou a
manutenção de atividades diversificadas, além do efeito “learning by doing” (Larsen, 2006) que as políticas de
conteúdo local estimularam.
É possível que a abolição das regras de conteúdo local no início da década tenha resultado em uma perda de
produção do setor. Segundo a British Petroleum (2010), a Noruega já atingiu o seu pico de produção de petróleo
Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas
potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional.
Relatório de atividades e resultados.
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em 2001 e, em termos de projeções sobre a Doença Holandesa (Bjørnland, 1998), isso eleva a probabilidade de que
ela se manifeste no país, por causa da redução da demanda por bens e serviços para a manutenção e ativação de
novos campos, o que seria condizente com o declínio da produção de petróleo no país (em 2008, 7 anos após o
início da forte queda - 7% aa - na produção, 25% do PIB do país ainda era proveniente da produção de petróleo,
significando 55% das exportações).
Em paralelo às ações de promoção do conteúdo local, outros fatores contribuíram para que a Noruega não sofresse
de males como consequência do seu sucesso energético. De forma geral, os fatores que contribuíram para o sucesso
da Noruega até agora são sua política macroeconômica, o arranjo de suas instituições políticas e econômicas, a
existência de um sistema judicial forte e até mesmo as normas sociais vigentes (LARSEN, 2006).
No início da exploração de petróleo na plataforma continental norueguesa, o governo passou a negociar com as
empresas operadoras dos campos para que elas atuassem em parceria com empresas locais que pudessem fornecer
equipamentos e serviços. No primeiro período de exploração, curto, de 1969 a 1972, não havia tal intervenção do
Estado, sendo livre a contratação de fornecedores. Oficialmente, o Decreto Real de 1972 sobre a exploração de
petróleo estabelecera a obrigatoriedade de compra de bens noruegueses, quando competitivos em qualidade,
preço e prazo. Além disso, as operadoras eram obrigadas a submeter suas listas de compras de bens e serviços
previstas para suas operações ao Ministério de Petróleo e Energia (MPE).
A Estatal Norueguesa do Petróleo (Statoil) participava de todos os campos autorizados nesse período, isoladamente
ou em parceria com outras empresas, garantida participação mínima de 50% nos direitos do empreendimento. As
parcerias eram incentivadas, como forma de proporcionar a troca internacional de experiências. Na prática, o MPE
negociava diretamente com as operadoras para que comprassem bens e serviços de empresas norueguesas, além
de auxiliar no desenvolvimento dos fornecedores locais. Dessa forma, criaram-se condições para que os preços dos
equipamentos utilizados na produção de petróleo fossem superiores aos preços internacionais em alguns casos.
Com o passar do tempo, entretanto, os fornecedores locais se desenvolveram e passaram a competir de igual para
igual com os fornecedores estrangeiros tradicionais. Para persuadir as operadoras a desenvolver os fornecedores
locais, o MPE considerava o histórico da operadora como quesito para conceder novos campos de exploração.
Outra ferramenta de promoção da indústria local era calcada nos incentivos tributários às atividades de pesquisa e
desenvolvimento (P&D). As operadoras eram fortemente taxadas sobre o lucro, e os gastos em P&D podiam ser
abatidos do lucro, desde que realizados em solo norueguês (as alíquotas de impostos sobre o lucro de companhias
de petróleo superavam 70%). Ações horizontais, como formação de mão de obra e criação de universidades e
centros de pesquisa nas regiões onde as operadoras se instalavam, também foram implementadas, potencializando
as atividades de P&D.
A capacitação e a motivação da indústria local em se aventurar nesse novo segmento (de equipamentos e serviços
para a indústria do petróleo) não parecem ter sido empecilho para as políticas adotadas na Noruega. A principal
indústria norueguesa até os anos 1970, formada por armadores e estaleiros, já era internacionalizada. A Associação
de Armadores e Estaleiros ainda enfatizou que se tratava de uma indústria com vários anos de experiência, quase
100 anos no transporte marítimo e 400 na pesca, o que a habilitava a facilmente partir para um novo negócio
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marítimo. Além disso, esta indústria estava procurando novos mercados, devido à queda do comércio internacional
e à nacionalização do petróleo no Oriente Médio, o que reduzira profundamente a demanda por transporte
marítimo e novas embarcações.
Uma das preocupações das autoridades norueguesas, também mencionada por empresas e associações, é a de
que os incentivos ao fornecedor local não deveriam ser excessivos e, principalmente, deveriam cessar após certo
tempo, como forma de pressionar os fornecedores a se tornarem competitivos. Em 1996, com a implementação
da Diretiva no 94/22/EC da Comunidade Europeia, que demandou uma série de harmonizações com o arcabouço
regulatório de outros países do continente, houve maior abertura para as atividades de exploração e produção
(E&P) na Noruega e consequente eliminação dos incentivos específicos aos fornecedores locais. O fato é que a
abertura confirmou o sucesso da indústria para-petrolífera norueguesa, que se internacionalizou, chegando a obter
quase a metade de suas receitas no mercado externo.
Apesar da abertura, diversas ações e diretrizes de caráter mais geral e transversal ainda são desenvolvidas na
Noruega, algumas de fomento específico à indústria e outras relacionadas aos efeitos nocivos da exploração de
petróleo sobre a economia. Algumas das boas práticas identificadas serão apresentadas a seguir.
O fomento à P&D pelas operadoras de petróleo via incentivos tributários continua, com a alta tributação sobre o
lucro das empresas e a possibilidade de abater os gastos com P&D no cálculo deste lucro. Há também uma boa
cooperação entre empresas e institutos de pesquisa. Um dos institutos consultados relatou que apenas cerca de
5% de seu orçamento vêm do poder público; o restante é oriundo de projetos com as empresas. A indústria acaba
sendo a principal usuária das pesquisas. Outro instituto até desenvolveu uma estrutura de testes de perfuração,
fornecendo este serviço para as operadoras testarem suas novas tecnologias.
Há associações e agências de fomento que promovem a capacitação tecnológica e a internacionalização das
empresas. O foco em tecnologia e internacionalização parece justificável, dado o reduzido tamanho do mercado
interno e a competição externa. O nível educacional é elevado, mas se trata de um país com menos de 5 milhões
de habitantes. A região de Stavanger, principal cluster de apoio às operações offshore, apresenta nível de
desemprego de 2%, importando mão de obra estrangeira. A indústria norueguesa encontra-se no limite de
capacidade, repassando atividades para o sudeste asiático. Por exemplo, em embarcações, o casco é produzido no
exterior, mas a tecnologia e os equipamentos provêm da Noruega. Também há agências de fomento local, visando
diversificar a indústria e, consequentemente, reduzir a dependência do petróleo. Na região de Stavanger, fomenta-
se a indústria mecânica, que é base para diversos produtos, assim como biogás e culinária profissional (LERØEN,
2005).
Outro ponto interessante do modelo norueguês que tem impacto indireto sobre a indústria diz respeito à
arrecadação e à aplicação das rendas governamentais do petróleo. A Noruega instituiu um órgão que fiscaliza os
custos das operadoras, o que impacta a arrecadação de tributos sobre o petróleo, fortemente incidentes sobre o
lucro das operadoras. O foco de atuação deste órgão recai muito mais sobre as decisões de investimento, em que
seria possível evitar mais facilmente gastos desnecessários, do que na execução contábil dos investimentos
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previstos. Sobre a aplicação das rendas do petróleo, foi instituído o fundo soberano norueguês, na década de 1990,
cujos objetivos são:
i) manter as rendas governamentais do petróleo fora do país, evitando sobrevalorização da moeda
norueguesa; e
ii) transformar a renda provisória obtida com o petróleo em renda permanente.
Além do efeito cambial deste fundo, que protege a indústria local, suas práticas servem de exemplo para a
instituição do fundo social brasileiro. Um ponto a destacar acerca das diferenças entre os fundos brasileiro e
norueguês é que todas as receitas governamentais do petróleo norueguês vão para seu fundo, inclusive os impostos
sobre o lucro das operadoras e os dividendos da Statoil a que o governo tem direito. Por sua vez, para o fundo
brasileiro, serão destinados apenas os ganhos com a partilha de produção dos campos do pré-sal.
Pelo lado empresarial, as firmas norueguesas ressaltam que a política pública de desenvolvimento de fornecedores
foi fundamental para a economia do país, mas reforçam que a política precisa ser temporária – a fim de evitar uma
acomodação das empresas – e a velocidade de expansão da participação local no fornecimento à indústria do
petróleo deve ser calibrada com os demais objetivos governamentais de ampliar o volume produzido e manter os
custos reduzidos. A Statoil sublinhou o fato de ser uma grande organização em seu país, o que permite sinergias e
escala. Também destacou que mantém uma relação próxima com seus fornecedores, especialmente na Noruega.
Entretanto, nas operações internacionais, ela atua de forma mais competitiva, sem beneficiar empresas
norueguesas.
Entre as empresas fornecedoras da cadeia do petróleo, observa-se um elevado grau de especialização e capacitação
tecnológica. O Brasil é considerado um grande mercado para elas, ainda em fase de crescimento para suas
operações. Como fatores de sucesso destas empresas, pode-se ressaltar a capacitação em gestão de projetos,
incluindo-se coordenação e planejamento, treinamento contínuo de seus funcionários, experiência operacional e
conhecimento do negócio. São, ainda, eficientes em identificar oportunidades para expansão das operações, além
de serem tomadores de risco.
Obviamente, avaliar agora os resultados da política norueguesa de fomento à cadeia fornecedora da indústria do
petróleo não permite identificar os problemas e as falhas enfrentadas por tal política durante sua implementação.
É difícil avaliar, por exemplo, se a renda governamental obtida em ambiente de maior abertura não seria suficiente
para compensar o não desenvolvimento da indústria. É muito provável, também, que as escolhas feitas pelo MPE
no desenvolvimento de fornecedores locais tenham sido contestadas pela sociedade quanto à competência dos
escolhidos na efetivação do desenvolvimento local. Também não seria surpresa que acusações de corrupção
tenham ocorrido, por mais transparente que seja o sistema de informação de renda e patrimônio dos cidadãos
noruegueses. O fisco norueguês disponibiliza todas as declarações de renda e patrimônio dos residentes em seu
território, permitindo um alto controle social sobre discrepâncias entre renda e patrimônio, declarados e não
declarados. Como exemplo, no site Skattelister (http://skattelister.no/), pode-se fazer uma busca da declaração de
renda de qualquer cidadão norueguês.
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Alguns pontos de comparação dentre as políticas Norueguesa e Brasileira:
O primeiro ponto que merece destaque é que a Noruega é um país pouco populoso. Com isso, o desenvolvimento
de uma indústria para-petrolífera mobilizou uma parcela considerável da população, o que acabou alavancando
bastante a indústria e a economia norueguesa. No Brasil, em comparação inicial, os impactos tendem a ser
menores, dado que o tamanho da indústria nacional é bem maior que a norueguesa e que o volume de petróleo a
ser explorado, apesar de maior que o previsto para a Noruega no início de sua exploração, não teria o mesmo
impacto econômico no país. Com isso, mesmo que se consiga desenvolver uma pujante cadeia de fornecedores
para a indústria do petróleo, ela não deverá ter a mesma participação no total da indústria e da economia que o
equivalente na Noruega.
O segundo ponto é sobre as características da indústria norueguesa antes do início das explorações no Mar do
Norte. A principal indústria era a de navegação marítima e construção de embarcações. Além de já ser uma base
para a construção de plataformas, tratava-se de uma indústria com bastante experiência e conhecimento técnico
desenvolvido, além de, principalmente, já ser internacionalizada e competitiva. Adicionalmente, esta indústria
passava por um momento de baixa demanda, devido à nacionalização do petróleo no Oriente Médio, ao aumento
dos preços de combustíveis e à queda substancial do comércio internacional. Nesta situação, eles precisavam
encontrar novos negócios para substituir seus tradicionais. Ou seja, a indústria norueguesa reunia duas condições
(uma estrutural e outra conjuntural) não tão comuns no Brasil no momento atual: capacitação técnica e empresarial
e necessidade de diversificação dos negócios. Boa parte, das empresas nacionais, pelo menos as industriais, não
opera internacionalmente e está, inclusive, sofrendo com a concorrência estrangeira no mercado doméstico.
Conjunturalmente, a demanda doméstica está alta, com boa parte das indústrias operando próximo da capacidade
e, muitas vezes, com dificuldades de expandir suas operações.
O terceiro ponto a salientar é sobre o modelo de governança usado pelos noruegueses na promoção da cadeia de
fornecedores. O ministério encarregado das licenças para exploração negociava ativamente com as operadoras a
aquisição de serviços e equipamentos das empresas norueguesas, tendo como principal moeda de troca a
preferência – ou não – nas próximas licitações de licenças de exploração. Trata-se de um sistema muito pouco
transparente para o Ministério de Minas e Energia (MME), ou qualquer órgão público ligado às licitações de blocos
de petróleo, aplicar, pois estaria sistematicamente sujeito à suspeição de corrupção.
Na Noruega, é provável que tal preocupação tenha ocorrido, mas em menor grau, devido ao alto nível de controle
social sobre a renda e o patrimônio de cada cidadão, inclusive dos funcionários públicos. Entretanto, a Petróleo
Brasileiro S/A (Petrobras), como principal operadora, pode exercer este papel, desenvolvendo fornecedores locais.
Deve-se destacar que isto deve ir além da prática empresarial comum de desenvolvimento de novos fornecedores,
que só é feita quando a oferta é oligopolizada e concentrada e/ou quando o produto é muito estratégico para a
peração. Além disso, este desenvolvimento de fornecedores não apenas deve trazer os fornecedores internacionais
para produzirem no Brasil – o que já atenderia em parte às questões de insumo estratégico da Petrobras –, mas
também promover o desenvolvimento de expertise nacional, de preferência com empresas nacionais. Sendo estas
empresas brasileiras, quando a exploração do pré-sal terminar, elas podem continuar gerando renda para o país ao
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exportar o conhecimento aqui desenvolvido. Se forem empresas estrangeiras, o conhecimento adquirido na
exploração do pré-sal irá gerar renda nos seus países de origem.
O quarto ponto está relacionado ao fundo social projetado pelo modelo de exploração do pré-sal brasileiro. O
fundo soberano norueguês se apropria de parcela muito maior dos lucros do petróleo que o previsto para o fundo
do Brasil, o que pode facilitar uma sobrevalorização da moeda brasileira. A renda governamental do petróleo
oriunda de royalties e impostos sobre os lucros das companhias de petróleo será internalizada e, em boa parte,
distribuída aos estados e aos municípios, o que pode provocar aumento do consumo do governo. Com o real
valorizado, a competitividade da indústria nacional, como um todo, seria reduzida, podendo eliminar qualquer
vantagem das firmas brasileiras desenvolvidas para atender à indústria do petróleo.
O quinto ponto a salientar e ao qual foi dada muita ênfase, tanto pelos órgãos de governo como pela Statoil, é que,
no início da exploração, foi fundamental a atração de operadores estrangeiros para permitir a troca de experiência
e conhecimento no desenvolvimento dos campos. Isto pode ser uma reclamação implícita ao modelo do pré-sal
brasileiro, em que a Petrobras deverá ser a operadora de todos os campos. Entretanto, serve de alerta quanto a
uma possível limitação do desenvolvimento tecnológico na exploração, na medida em que se reduz a possibilidade
de troca de experiências.
Sexto ponto, deve-se enfatizar que as políticas de fomento aos fornecedores locais devem ser temporárias e com
foco em internacionalização destas empresas, a fim de que venham a ser competitivas e sobrevivam quando a
proteção terminar. Isto também tem o objetivo de evitar que os custos da exploração de petróleo no país fiquem
elevados, reduzindo as rendas petrolíferas governamentais, que beneficiam toda a população, em detrimento de
poucas firmas e seus empregados. Tal preocupação está em consonância com as proposições de exigência de
contrapartidas das empresas que recebem incentivos governamentais – como a adoção de metas de exportação, a
fim de evitar que estas se acomodem aos incentivos e à proteção recebidos (SOUSA, 2011). De acordo com Amsden
(1989), o modelo coreano de desenvolvimento é um exemplo de tais políticas de incentivo e controle.
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5. Desafios jurídicos à política brasileira de conteúdo local para o setor parapetrolífero
No Brasil, em julho de 1999, estavam sendo perfurados 3 poços exploratórios e 16 poços de desenvolvimento,
números os quais sinalizam que havia uma grande carência de infraestruturas exploratórias no país (Zamith, 2001).
Os grandes empreendimentos de exploração em águas profundas marcaram a prioridade de investimentos da
Petrobras a partir dos anos 1990. Nesse período, quando não houve uma orientação de política explícita quanto ao
suprimento nacional, o conteúdo local na aquisição das unidades flutuantes de produção variou de 35% a 52%
quando construídas no país, e de 1% a 19% quando feitas no exterior.
Em 1999, um estudo da ANP apontou para um índice de 60% de capacidade da indústria para atender à demanda
de bens e serviços na construção de um sistema de produção petrolífera no mar. Não foi avaliada, entretanto, a
capacidade instalada da indústria para atendimento a um número elevado de encomendas. O reflexo da carência
exploratória resultou na falta de novos fornecedores no Brasil ou na melhora da qualidade dos já existentes. A
maior prova da inexistência ou da deficiência de fornecimento local foi a instituição do REPETRO – regime
aduaneiro especial de exportação e de importação de bens destinados às atividades de pesquisa e de lavra das
jazidas de petróleo e de gás natural, pelo Decreto n. 3.161/99, alterado pelos Decretos n. 3.787/01 e 4.543/02,
na tentativa de ter no país a presença de bens aqui não fabricados e ao mesmo tempo desonerar,
tributariamente, a indústria petrolífera, na importação de determinados bens de uso temporal.
Mesmo que a exigência de Conteúdo Local tenha sido instituída para pequenas e grandes empresas, pela avaliação
do anexo único da Instrução Normativa RFB nº 844, de 9 de maio de 2008 (alterada pela IN RFB n. 941, 25/05/09)
pode-se verificar que as operações e terra, enfim, as operações dos pequenos operadores foram praticamente
deixadas de lado, e porque não dizer ignoradas. Na redação da lista de itens agraciados, pode-se comprovar que
ela é muito mais específica do que nas redações das Instruções Normativas anteriores:
• Embarcações destinadas às atividades de pesquisa e produção das jazidas de petróleo ou gás natural e as
destinadas ao apoio e estocagem nas referidas atividades.
• Máquinas, aparelhos, instrumentos, ferramentas e equipamentos destinados às atividades de pesquisa e
produção das jazidas de petróleo ou gás natural.
• Plataformas de perfuração e produção de petróleo ou gás natural, bem como as destinadas ao apoio nas
referidas atividades.
• Veículos automóveis montados com máquinas, aparelhos, instrumentos, ferramentas e equipamentos
destinados às atividades de pesquisa e produção das jazidas de petróleo ou gás natural.
• Estruturas especialmente concebidas para suportar plataformas.
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As resoluções ANP que tratam de Conteúdo Local, assim como a sua instituição, não têm arcabouço legal que lhes
deem suporte, especialmente, com respeito a obrigações a serem cumpridas por terceiros que nada têm a ver com
os editais e com as licitações promovidas pela Agência; e sendo os regulamentos atos inferiores a lei, não podem
restringir ou ampliar suas disposições. Conteúdo local não se trata de uma lei, mas tão somente uma cláusula
contratual constante nos contratos da ANP para concessão da exploração e desenvolvimento de blocos
hidrocarboníferos. A crítica se baseia no fato de que é apenas um regulamento, e não sendo lei, ele não pode
restringir direitos que aos quais sejam intrínsecas as “reservas de lei”, ou seja, direitos que só podem ser definidos
por lei, como só podem ser regidos por lei, como as garantias, os direitos e as liberdades individuais, universo do
qual a livre concorrência faz parte. Regulamentos do executivo se fazem jus apenas nas lacunas que a lei não tiver
cumprido, não atinentes os fenômenos a que se subentendam “reservas de lei”. O essencial é que o Executivo, ao
expedir regulamento – autônomo ou de execução de lei –, não invada as chamadas “reservas da lei”, ou seja,
aquelas matérias só disciplináveis por lei, e tais são, em princípio, as que afetam as garantias e os direitos individuais
assegurados pela Constituição (art. 5º).
Sendo mero regulamento, e não lei, o conteúdo local fere o art. 5º da Constituição, o qual preconiza que:
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos
termos seguintes:
[...] II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
Outro elemento de inconsistência apontado pelos críticos, é o fato de que a própria Lei do Petróleo (art. 40) solicita
métodos de ação que se tornam impraticáveis. Segue o texto do artigo:
“O julgamento da licitação identificará a proposta mais vantajosa, segundo critérios objetivos,
estabelecidos no instrumento convocatório, com fiel observância dos princípios da legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e igualdade entre os concorrentes.”
A Lei do Petróleo em seu art. 40 exige que os critérios de julgamento sejam objetivos. Ou seja, práticos, positivos e
válidos para todos. Como se vê, Conteúdo Local no Brasil não é prático, há itens, subitens e planilhas ou programas
enormes a serem preenchidas, dependendo de condições econômicas, preço do petróleo no mercado internacional
e outras variáveis para ser possível, no futuro acertar seus percentuais. Não dá para chamar isso de critério objetivo
(Quintans, 2009).
Sobre este aspecto, Quintans (2012) tece ainda os seguintes comentários:
“E se, por exemplo, no Brasil, não for possível encontrar fornecedores de bens e serviços, ao tempo e no prazo dos
períodos de exploração e produção nos contratos, pela falta de capacidade instalada ou falta de infraestrutura local,
pelo fornecedor não oferecer preços, prazos e qualidade compatíveis? E se nem existirem fornecedores locais para
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determinados bens ou serviços? E se o fornecimento de conteúdo local for apenas parcial? E se o fornecedor não
cumprir como prometido ou declarado em contrato? O que irá alegar o concessionário junto à ANP? Poderá alegar
que a cláusula contratual é de onerosidade excessiva se provados os fatos que ensejam sua ocorrência? Se fosse um
contrato privado, com certeza sim. O que irá alegar a ANP, se questionada em juízo, sobre o seu “poder de polícia”
em instituir regras sobre matéria que não está descrita em nenhum inciso, do art. 1º, da Lei do Petróleo, mesmo
quando está a Agência ciente de que determinados bens não são ou tão cedo não serão produzidos no Brasil? Até
onde a lei do petróleo é considerada uma Lei standardizada, que autoriza a ANP a decidir por si o que pode ou não
fazer? Onde está o limite? Quem poderá impor esse limite?”
Espera-se o bom senso da ANP para, em relação a Conteúdo Local, na falta de fornecedores locais ou na
impossibilidade (ainda que parcial) dos mesmos, ao tempo de auditar ou de julgar o Conteúdo Local, considerar as
circunstâncias como “extraordinárias” admitindo o caso da obrigação ter se tornado um encargo excessivo,
possibilitando a sua revisão contratual, para evitar a resolução dos contratos oferecendo a oportunidade de
modificar equitativamente as condições do contrato; ou conceder a possibilidade de alteração do modo de executar
o contrato, justamente para evitar a onerosidade excessiva ou, simplesmente, incumbir ao concessionário a
obrigação de provar que é caso de força maior, sem falar na hipótese do concessionário entender que – ao tempo
da execução dos serviços e aquisição de bens o mesmo não poderia prever a inexistência ou a deficiência de
fornecedores locais, caracterizando força maior em razão de que o cumprimento de uma determinada obrigação
contratual torna-se impossível por um fator alheio a vontade das partes se estiver fora do controle, de forma que
a tendência é desobrigar a parte prejudicada de forma permanente ou temporária do cumprimento de suas
obrigações contratuais.
Deve ser cuidadosa a decisão de pleitear a inexecução de parte do contrato, pois, na forma do art. 10, da Portaria
ANP 234/2003, poderá ocasionar a penalidade de rescisão do contrato de concessão, no caso de descumprimento
de qualquer das obrigações que não seja corrigido pelo concessionário dentro do prazo determinado pela ANP por
meio de notificação. Se aplicada a pena de rescisão, além da perda da atividade econômica imediata, os
responsáveis pela concessionária ficarão impedidos, por cinco anos, de exercer atividade de E&P.
O principal mecanismo de defesa do conteúdo local é o acórdão 1157/97 do Tribunal de Contas da União, o qual
invoca que o conteúdo local é procedente por agir conforme o artigo primeiro Lei 9.478 / 97 (Lei do Petróleo), que
define os objetivos da política nacional, nos quais se incluem “preservar o interesse nacional” e “promover o
desenvolvimento”, dentre outros itens. Mas os que criticam a natureza jurídica do conteúdo local invocam que a
hierarquia das leis faz prevalecer um artigo constitucional, se houver embate com uma lei ordinária.
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6. Aspectos da demanda dos barcos de apoio a plataformas (PSV’s)
A indústria de construção naval costuma ser classificada como uma “indústria global”, pois a posição competitiva
de uma empresa de construção naval em um determinado país é estreitamente relacionada à sua posição
competitiva em outros países. Assim, as maiores empresas de construção naval competem entre si em vários países
diferentes. Em grandes projetos de construção naval, os potenciais compradores chegam a convidar de 20 a 30
construtores navais para submeterem suas propostas de construção (Cho & Porter, 1986).
Por outro lado, grande parte da atividade de fabricação de navios envolve a aquisição de máquinas e equipamentos
marítimos de fornecedores especializados que também operam em escala global. Dicken (1998: 230) estabelece a
distinção entre três tipos clássicos de relações de subcontratação industrial: por especialidade, por economia de
custos e por complementaridade.
A subcontratação por especialidade envolve o desempenho de funções para as quais o fornecedor detém
infraestrutura de produção e competências técnicas especializadas. A subcontratação por economia de custos é
fundamentada nos diferenciais de custos de produção entre a empresa contratante e a empresa contratada.
Finalmente a subcontratação por complementaridade objetiva absorver aumentos ocasionais na demanda sem que
a empresa contratante tenha que expandir sua capacidade de produção.
As relações de fornecimento de máquinas e equipamentos para a indústria de construção naval são condicionadas
à experiência do fornecedor, conteúdo tecnológico e reputação das máquinas e equipamentos adquiridos. Trata-
se, pois de uma relação de subcontratação industrial por especialidade.
Com a grande expansão da globalização econômica, observada no final do século XX, as relações de subcontratação
industrial evoluíram para novas formas organizacionais, caracterizadas pela desagregação vertical e pela formação
de redes de organizações independentes. No caso extremo, nas organizações em rede verticalmente desagregadas,
todas as funções da cadeia produtiva, que não sejam a coordenação e o controle da produção, são subcontratadas
de empresas independentes e comercializadas sob a marca da empresa líder (Dicken, 1998: 234).
O consórcio modular para a produção de caminhões, implantado pela Volkswagen no Brasil, constitui um caso
exemplar de organização em rede verticalmente desagregada. Neste caso, todos os componentes dos veículos são
fabricados e montados por empresas independentes sob a coordenação da empresa proprietária da marca.
A construção de barcos de apoio marítimo por intermédio de “pacotes” de projeto, máquinas e equipamentos
marítimos constitui um exemplo de formação de rede organizacional verticalmente desagregada. Nesse arranjo
organizacional, a empresa líder desenvolve o projeto do navio e coordena a cadeia de fornecedores globais das
máquinas, equipamentos e sistemas de controle utilizados no projeto. A capacidade técnica, gerencial e financeira
para projetar o navio, organizar a cadeia de fornecedores e comercializar as máquinas e equipamentos do navio
constitui principal fator de sucesso na preparação e comercialização dos “pacotes” de projeto, máquinas e
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equipamentos para produção desses barcos.
A empresa ofertante do “pacote” define os papéis, os campos de ação e as estratégias de relacionamento que serão
estabelecidas com cada fornecedor de máquinas e equipamentos. Isso significa definir as tecnologias que serão
utilizadas no projeto, qual o escopo dos serviços de manutenção pós-venda e qual nível de troca de conhecimentos
entre as empresas participantes da rede. A integração vertical da empresa líder, por aquisições de empresas
fornecedoras, é também frequente neste segmento de mercado.
Por outro lado, a experiência acumulada, a reputação técnica e o domínio tecnológico constituem os principais
fatores de sucesso empresarial para um fornecedor individual de máquinas ou de equipamentos marítimos.
A crise mundial que atingiu o setor de construção naval no início da década de 1980 desencadeou mudanças
profundas na organização da produção de embarcações e na composição das cadeias de suprimento setoriais. As
relações entre construtores (estaleiros) e fornecedores de máquinas e equipamentos navais evoluíram para níveis
cada vez maiores de terceirização e subcontratação de etapas da produção.
Figura 1- Estrutura de custos de produção para três tipos de navios em estaleiro europeu (2004)
Até 1980, os grandes estaleiros mundiais fabricavam internamente grande parte das máquinas e equipamentos
que instalavam nos navios. Desse modo, a produção interna de um estaleiro representava de 70 a 80% do valor
final de um navio. Atualmente, os estaleiros mais competitivos do cenário mundial estão focados em nichos
específicos de mercado (especialização por tipo de navio e conteúdo tecnológico) e produzem internamente entre
25 e 35% do valor total de um navio (Kanerva, 2004).
A figura 1 apresenta exemplos de estruturas de custos de produção de três tipos de navios obtidos de um estaleiro
europeu em 2004. Observa-se que quanto mais complexa for a construção, maior a incidência dos componentes
produzidos fora do estaleiro na composição dos custos totais de fabricação.
Para os navios de cruzeiro, o valor total das subcontratações e das aquisições de sistemas turnkey e de sistemas
marítimos pode chegar a 63,75% dos custos totais de construção. Para um barco de apoio offshore típico, o valor
dos componentes adquiridos de fornecedores (maquinário, sistemas marítimos e acessórios) representa cerca de
60% dos custos totais de construção. Entretanto, para navios relativamente mais simples, tais como os navios
porta-containers, os custos de componentes, máquinas e equipamentos, envolvem valores da ordem de 50% dos
custos totais de produção.
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A ampla difusão dos pacotes tecnológicos de projeto, maquinário e demais componentes de embarcações de apoio
offshore constitui, pois, um desdobramento da tendência geral de terceirização e subcontratação na indústria de
construção naval. Neste tipo de arranjo institucional, o projetista do navio detém o controle tecnológico do produto
final, pois firma acordos de comercialização com fabricantes de máquinas e equipamentos e vende ao estaleiro,
não o projeto em si, mas o conjunto de todas as máquinas e equipamentos que irão equipar o navio.
No Brasil, em função dos custos locais de produção e da incidência de impostos de importação, a estrutura de
custos de produção de barcos de apoio offshore pode ser bastante diferente da apresentada na figura 1. A tabela
1 apresenta a estrutura de custos de produção de uma embarcação de apoio offshore, equipada com propulsão
diesel-elétrica, fabricada em um estaleiro nacional (dados de 2012). Esta embarcação foi construída a partir de
um pacote importado de projeto e maquinário, adaptado pelo projetista para incluir geradores, motores painéis
elétricos de fabricação nacional.
A primeira coluna da tabela divide os principais componentes do custo de produção deste navio: aço processado,
propulsão, equipamentos elétricos, equipamentos eletrônicos e de comunicação, sistemas auxiliares (tubulação,
válvulas, etc.) e mão-de-obra. O item propulsão inclui os propulsores azimutais, os propulsores laterais (bow
thrusters) e os respectivos motores elétricos e seus inversores de frequência. O item equipamentos elétricos inclui
os grupos geradores, os painéis elétricos, os transformadores, a automação da planta elétrica, e os inversores de
frequência auxiliares.
Tabela 1 – Estrutura de custos de produção e índice de nacionalização de embarcações de apoio no Brasil
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7. Tipologia, figuras e dados do setor de embarcações de apoio marítimo no Brasil
A navegação de apoio marítimo se constitui em importante elo na cadeia de óleo e gás, pois oferece apoio logístico
e operacional às plataformas, com as mais diversas atividades, como será visto a seguir.
A tipologia que segue foi obtida principalmente em apresentações feitas pela associação brasileira de
embarcações de apoio marítimo (ABEAM) em 2012 e 2013 e as imagens são de divulgação dos diversos armadores,
disponíveis na internet. Para tipificar as embarcações de apoio marítimo, a Antaq e a legislação brasileira
subordinam a este conceito um rol maior de embarcações (se comparado à ABEAM), o qual inclui lanchas,
barcaças, taineiras, e todas aquelas que se relacionem diretamente com plataformas. Preconizaremos neste
estudo a tipologia tal como conceituada e agrupada pelo método dos armadores (ABEAM).
AHTS – Anchor Handling and Tug Supply: Pode ter entre 60 e 80 m de comprimento e potência de 6.000 a 20.000
BHP. Atua com rebocador e instalação de unidades estacionárias de produção (UEP’s), manuseio de âncoras e
transportes de suprimentos (tubos, água doce, óleo, lama, salmoura, cimento, peças, etc.) e também combate a
incêndios. Robustez e autonomia para trabalhos pesados ou de emergência são seus principais atributos.
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PSV – Platform Supply Vessel: utilizado no apoio às plataformas de petróleo, transportando material de
suprimento: cimento, tubos, lama, salmoura, água doce, óleo, granéis. Mede de 60 a 100 metros de comprimento
e cerca de 5.000 HP, com impelidores laterais inclusos, para melhor manobrabilidade. A alta relação entre DWT/DL
gera baixo custo de transporte, que é seu principal atributo. DWT é “deadweight tonnage”, ou arqueação líquida,
o volume dos espaços fechados destinados ao transporte de carga e DL é o peso total do navio sem carga,
combustíveis, lastro e tripulação).
RSV / ROV - Research Support Vessel / Remote Operate Vehicle: Embarcação de apoio especializada em pesquisas
sísmicas e em operações com pequeno veículo remoto, operado do navio e que atua no fundo do mar através de
braços mecânicos, luzes e lentes no manuseio e montagem de equipamentos submarinos offshore.
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SV – Supply Vessel: design e atributo análogo aos do PSV, com menor porte. Serve também à prontidão e SOS.
LH – Line Handling : Embarcação utilizada no manuseio de espias (cabos de amarração) e serve à prontidão e SOS,
com cerca de 35 m e potência em torno de 1.800 HP. Leveza e manobrabilidade são seus principais atributos.
FSV ou UT – Fast Supply Vessel ou Utility Boat: supridores de cargas rápidas. Utilizado no transporte rápido de
cargas emergenciais, ou da tripulação e de outras equipes que atuam nas plataformas. Rapidez é seu atributo.
Crewboat: preconiza o transporte de tripulantes das plataformas (o espaço para carga é menor que no FSV). Como
o pré-sal subentende viagens de mais de 300 km, este tipo tende a ser substituído pelos helicópteros.
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OSRV – Oil Spill Response Vessel: combate ao derramamento de óleo e incêndios. É dotado de equipamentos
específicos que permitem trabalhar na mancha de óleo, em atmosfera onde a evaporação do petróleo produz gás
natural. Tais equipamentos, somados sistemas elétricos blindados contra os gases, são os principais atributos.
WSV –Well Stimulation Vessel: bombeamento de gases e fluidos e equipamentos para estimulação de poços.
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PLSV – Pipe Laying Support Vessel: Construção e lançamento de linhas e dutos.
DSV – Diving Support Vessel: embarcações de suporte a operações de mergulho
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MPSV - Multipurpose Supply Vessel: podem ser usados para realizar apoio em contruções ou operações
submarinas com ou sem ROV, intervenção em poços, lançamento de cabos e dutos e as funções normais de apoio
offshore sob normalidade e sob emergência. Portanto, equacionam vários dos atributos das demais embarcações.
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A associação brasileira das empresas de apoio marítimo (ABEAM) representa institucionalmente as empresas
associadas perante os diversos órgãos públicos direta ou indiretamente, dentre eles, ANTAQ, Marinha do Brasil,
Receita Federal, Ministério do Trabalho, Conselho Nacional de Imigração, e também junto às petroleiras (em
especial a Petrobrás), além de participar de organizações e comissões nacionais e internacionais ligadas ao setor.
Ela também orienta suas associadas, procurando harmonizar entendimentos no trato de questões operacionais, de
segurança, meio ambiente e novas tecnologias. Segundo apresentação divulgada pela ABEAM, em agosto de 2013,
o Brasil possuía 127 empresas autorizadas pela ANTAQ para fazer operações de apoio offshore, mas apenas cerca
de cerca de 50 empresas operando efetivamente no apoio marítimo. Nesta apresentação, a ABEAM informa ser
constituída por 36 empresas associadas, citadas a seguir:
Tabela 2 – As 36 empresas associadas à ABEAM, tal como em agosto de 2013
Acamin Fugro Brasil Saveiros
Asgaard Geonavegação Seacor Offshore
Astromarítima Gulf Marine Sealion
Bourbon Hornbeck Siem
BRAM Internav Solstad
Bravante Locar Starnav
BSCO Maersk Subsea7
CBO Megasea Technip
Deep Sea Norskan Tranship
Farol OceanPact Transmar
Farstad Olympic UP Offshore
Finarge OSM do Brasil Wilson Sons
A mesma apresentação informa que a estimava de gastos anuais do setor marítimo com afretamentos seja da
ordem de US$ 4,5 bilhões em 2013. Estas 36 associadas reúnem uma frota de 450 embarcações, sendo 211 de
bandeira brasileira e 239 de bandeira estrangeira. A tabela 3 mostra a categorização desta frota por classe de
embarcação e bandeira, e a figura 2 traz a proporção de cada bandeira e classe para a coluna “total” da tabela 3.
Tabela 3 – Frota associada à ABEAM por classe de embarcação e bandeira, tal como agosto de 2013
Figura 2- Proporções da frota associada à ABEAM, segundo a bandeira e segundo a classe da embarcação
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Em 1968, a Petrobrás começou a pesquisa e exploração de jazidas no mar e a empresa importou 13 embarcações
de apoio entre 1968 e 1975, as quais então tinham bandeira brasileira. Em 1982, quando a Petrobrás iniciou
efetivamente a produção de petróleo no mar, o Brasil já dispunha de 91 embarcações, sendo 44 de bandeira
brasileira, mas a maioria estrangeira. Neste ano, a Petrobrás passou a terceirizar a propriedade e gestão da frota
de apoio e isso promoveu um salto na frota. Em 1985, havia um total de 205 embarcações e a maioria era de
bandeira brasileira (110). Em 1990, o governo desregulamentou o setor, abrindo para empresas internacionais
explorarem o setor. Numa incapacidade de concorrer com corporações globais, várias empresa brasileiras fecharam
e a frota de bandeira brasileira despencou de tal forma que, em 1997, era de 43 embarcações, ou seja, menor do
que fora 15 anos antes (1982). Em 1997, foi promulgada a lei 9.432, a Lei do Transporte Aquaviário, a qual trouxe
reserva de mercado para os armadores e seus funcionários locais, e isso fez a frota de bandeira brasileira voltar
a crescer. Mas as empresas estrangeiras se adequaram à lei e também cresceram dentro dos limites impostos
pela lei. Os principais itens da lei, que reimpulsionaram o setor brasileiro de operação marítima foram os seguintes:
Art. 2º Para os efeitos desta Lei, são estabelecidas as seguintes definições:
I - afretamento a casco nu: contrato em virtude do qual o afretador tem a posse, o uso e o
controle da embarcação, por tempo determinado, incluindo o direito de designar o comandante
e a tripulação;
II - afretamento por tempo: contrato em virtude do qual o afretador recebe a embarcação
armada e tripulada, ou parte dela, para operá-la por tempo determinado;
IV - armador brasileiro: pessoa física residente e domiciliada no Brasil que, em seu nome ou sob
sua responsabilidade, apresta a embarcação para sua exploração comercial;
V - empresa brasileira de navegação: pessoa jurídica constituída segundo as leis brasileiras, com
sede no País, que tenha por objeto o transporte aquaviário, autorizada a operar pelo órgão
competente;
VI - embarcação brasileira: a que tem o direito de arvorar a bandeira brasileira;
Art. 4º Nas embarcações de bandeira brasileira serão necessariamente brasileiros o
comandante, o chefe de máquinas e dois terços da tripulação.
Art. 9º: O afretamento de embarcação estrangeira por viagem ou por tempo, para operar na
navegação interior de percurso nacional ou no transporte de mercadorias na navegação de
cabotagem ou nas navegações de apoio portuário e marítimo, bem como a casco nu na
navegação de apoio portuário, depende de autorização do órgão competente e só poderá
ocorrer nos seguintes casos:
I - quando verificada inexistência ou indisponibilidade de embarcação de bandeira brasileira do
tipo e porte adequados para o transporte ou apoio pretendido;
III - quando em substituição a embarcações em construção no País, em estaleiro brasileiro, com
contrato em eficácia, enquanto durar a construção, por período máximo de 36 meses, até o
limite:
b) da arqueação bruta contratada, para embarcações destinadas ao apoio.
Art. 10. Independe de autorização o afretamento de embarcação:
I - de bandeira brasileira para a navegação de longo curso, interior, interior de percurso
internacional, cabotagem, de apoio portuário e de apoio marítimo;
III - estrangeira a casco nu, com suspensão de bandeira, para a navegação de cabotagem,
navegação interior de percurso nacional e navegação de apoio marítimo, limitado ao dobro da
tonelagem de porte bruto das embarcações, de tipo semelhante, por ela encomendadas a
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estaleiro brasileiro instalado no País, com contrato de construção em eficácia, adicionado de
metade da tonelagem de porte bruto das embarcações brasileiras de sua propriedade,
ressalvado o direito ao afretamento de pelo menos uma embarcação de porte equivalente.
Art. 11. É instituído o Registro Especial Brasileiro - REB, no qual poderão ser registradas
embarcações brasileiras, operadas por empresas brasileiras de navegação.
§ 1º O financiamento oficial à empresa brasileira de navegação, para construção, conversão,
modernização e reparação de embarcação pré-registrada no REB, contará com taxa de juros
semelhante à da embarcação para exportação, a ser equalizada pelo Fundo da Marinha
Mercante.
§ 6º Nas embarcações registradas no REB serão necessariamente brasileiros apenas o
comandante e o chefe de máquinas.
§ 9º A construção, a conservação, a modernização e o reparo de embarcações pré-registradas
ou registradas no REB serão, para todos os efeitos legais e fiscais, equiparadas à operação de
exportação.
Art. 12. São extensivos às embarcações que operam na navegação de cabotagem e nas
navegações de apoio portuário e marítimo os preços de combustível cobrados às embarcações
de longo curso.
Um primeiro aspecto importante dessa lei é o fato de que ela foi concebida para atender mais aos interesses dos
prestadores de serviço de transporte, os armadores, do que os estaleiros nacionais. Entretanto, a intenção de
incentivar os estaleiros nacionais foi expressa no artigo 9º, inciso I e no inciso III, do qual a alínea b se refere
especificamente ao caso das embarcações de apoio.
Art. 9º: O afretamento de embarcação estrangeira por viagem ou por tempo, para operar na
navegação interior de percurso nacional ou no transporte de mercadorias na navegação de
cabotagem ou nas navegações de apoio portuário e marítimo, bem como a casco nu na
navegação de apoio portuário, depende de autorização do órgão competente e só poderá
ocorrer nos seguintes casos:
I - quando verificada inexistência ou indisponibilidade de embarcação de bandeira brasileira do
tipo e porte adequados para o transporte ou apoio pretendido;
III - quando em substituição a embarcações em construção no País, em estaleiro brasileiro, com
contrato em eficácia, enquanto durar a construção, por período máximo de 36 meses, até o
limite:
b) da arqueação bruta contratada, para embarcações destinadas ao apoio.
A leitura simples do artigo faz entender que ele regulamenta o afretamento de embarcação estrangeira de apoio,
na sua modalidade “por tempo”, restringindo esta faculdade para dois casos apenas: (inciso I) indisponibilidade de
embarcação brasileira congênere, OU (inciso III) em substituição a embarcação em construção no país (congênere).
O inciso I sugere incentivar o armador brasileiro, e o inciso III sugere incentivar o estaleiro brasileiro.
Restringindo o raciocínio apenas ao inciso III, deduz-se que as embarcações de apoio que forem construídas no
Brasil e venham a ter bandeira brasileira, sempre terão a preferência para o afretamento perante as embarcações
de bandeira estrangeira (as quais mormente são construídas fora do país). Com afretamento praticamente
garantido por lei, seria de se esperar que a armação nacional decolasse a demanda dos estaleiros nacionais, pelo
menos no limite da grande demanda gerada pela Petrobras, mas tal decolagem não ocorreu. Para entender como
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foi possível que a realidade atual tenha transcorrido diversamente ao que fora sugerido pelo inciso III, revisamos a
leitura do inciso I. Ele proíbe o afretamento de embarcação estrangeira se houver disponibilidade de embarcação
de bandeira nacional, que lhe seja congênere. Portanto, o inciso I gera a ineficácia do inciso III na medida em que,
se os armadores nacionalizam a bandeira de navios construídos fora do país, eles se enquadram à lei e isso tende
a reduzir a demanda de navios construídos no Brasil. Até então, nacionalizar a bandeira de um navio estrangeiro
era tarefa razoavelmente difícil, mas com a constituição do REB, Registro Especial Brasileiro, nacionalizar a bandeira
de um navio ficou bem mais fácil. A figura 3 abaixo mostra a evolução da frota de apoio no Brasil. Pode-se ver que,
entre 1995 e 2009 (a instituição da lei do transporte aquaviário e do REB foram em 1997), o número de embarcações
com bandeira estrangeira cresceu 18%, enquanto o número de embarcações com bandeira nacional cresceu 150%
(a maioria destas, provavelmente construídas fora do país, nacionalizadas sob o REB). Não que se desejasse que a
totalidade destas embarcações tivessem sido construídas no Brasil. É sabida a carência de fornecedores qualificados
e também a desarticulação dos elos da cadeia de navipeças em 1997. Mas é visível a perda de oportunidade para
a indústria naval brasileira (estaleiros e sua cadeia de fornecedores), fruto da facilidade criada pelo REB aos
armadores, vendedores de serviços à Petrobras, para naturalização de navios estrangeiros.
Figura 3 - Evolução da Frota Nacional de Embarcações de Apoio Offshore (fonte: ABEAM)
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8. Aspectos do debate empresarial sobre conteúdo local
Buscou-se, sem sucesso, literatura específica que estudasse as eventuais dificuldades enfrentadas pelo setor de
navipeças brasileiro para elevar o fornecimento para a construção de navios para operações offshore. No intuito
de se conhecer a conjuntura do setor brasileiro de navipeças para embarcações para o pré-sal, o nível de
participação de empresas nacionais neste subsetor, e as eventuais dificuldades inerentes, o pesquisador realizou
então uma longa atividade de levantamento de notícias sobre o setor em dois jornais de grande circulação. Foram
escolhidos O Estado de São Paulo e o Valor Econômico.
A realização deste levantamento, bem como os critérios de seleção das notícias a serem analisadas, se baseavam
principalmente no assunto “Conteúdo Local”. As tabelas 4 e 5, vistas a seguir, resumem as principais notícias
encontradas, com destaque em vermelho para os fragmentos que realçam interesse ao assunto.
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Tabela 4 – 17 notícias sobre conteúdo local no Jornal Valor Econômico durante o 1º semestre de 2012
Dia Manchete Fragmento de interesse
22-dez-11 Demanda vai somar
US$ 224 bi
A expectativa da petrolífera é que o Progredir atinja a marca de R$ 1 bilhão em
financiamentos liberados ainda em 2011. As ações pretendem ampliar a participação
do conteúdo local nos projetos. Hoje a Petrobras tem uma média de nacionalização de
projetos de E&P variando entre 65% e 85%. Alberto Machado, diretor de Óleo e Gás
da Abimaq, cobra, porém das petrolíferas, um detalhamento maior de sua demanda
futura e também a garantia de contratação de demanda anunciada no prazo
estabelecido. "Se você se prepara para uma coisa que vai acontecer em cinco anos e
isso acontece em dez anos, você quebra", diz.
23-jan-12 Rolls-Royce investe
para atender
Petrobras
O presidente da Rolls-Royce para a América do Sul, Francisco Itzaina, afirmou que o
Rio é um dos focos da companhia no país, devido a importância do setor de óleo e gás.
Mas o Valor apurou que a vontade da Rolls-Royce Brasil é de instalar um centro de
treinamento também em Santa Cruz, próximo da fábrica. Caso aprovado, a construção
poderá ser anunciada e iniciada nos próximos meses. A expectativa é o treinamento
de cerca de 4 mil pessoas por ano, entre funcionários e clientes. A iniciativa faz parte
dos planos de driblar a falta de mão de obra especializada. O presidente afirmou que
outro objetivo é aumentar o índice de conteúdo local. O compromisso é um dos
fatores decisivos para fechar contratos com a Petrobras.
9-fev-12 Petrobras confirma
contratação de
sondas com Sete
Brasil e Ocean Rig
A entrega de todas as unidades, com requisitos de conteúdo local variando entre 55%
e 65%, deverá ocorrer entre 48 e 90 meses, de acordo com os contratos. A
implementação do projeto considera a construção de novos estaleiros no país, além
da utilização da infraestrutura já existente.
13-fev-12 Graça diz que não
há previsão de
construir
plataformas fora do
Brasil
"Não há previsão de não exercer a política Petrobras de conteúdo local", frisou Graça,
acrescentando que não aceita "que a indústria de petróleo no Brasil perca a
competitividade". Questionada sobre as sondas de perfuração, a executiva garantiu
que as unidades que serão construídas fora do Brasil já foram todas contratadas, com
previsão de chegada de mais três este ano e uma no ano que vem. A partir daí,
segundo ela, todas serão feitas no país, inclusive as 28 já contratadas junto à Sete
Brasil e cinco junto à Ocean Rig.
6-mar-12 Falta de
experiência afeta
Atlântico Sul
Também se reforçou a ideia de fazer as sondas no país com altos índices de conteúdo
local. Na edição de ontem, o Valor informou que Graça Foster está negociando a troca
do controle acionário do estaleiro com o aval da presidente da República, Dilma
Rousseff. Uma dificuldade estaria no fato de Camargo Corrêa e Queiroz Galvão não
estarem dispostas a saír do negócio amargando prejuízo.
13-mar-12 BNDES prevê R$ 15
bi para financiar
sondas
O presidente da Sete Brasil, João Carlos Ferraz, disse que a empresa tem carta do
BNDES que garante financiamento de 80% do conteúdo local das sete primeiras
sondas. Essas unidades terão índice de nacionalização de 62%, o que, considerando o
conteúdo local de 80%, garantem financiamento de 50% do valor das sondas, segundo
o executivo. As sete unidades vão custar US$ 5,2 bilhões, o que resultaria em
financiamento do banco de US$ 2,6 bilhões, afirmou Ferraz. Ele projeta essa mesma
estrutura financeira para chegar aos US$ 13,5 bilhões para as 28 unidades.
17-abr-12 Setor naval quer
discutir conteúdo
local
O mapeamento feito pelo Sinaval, com o apoio da Organização Nacional da Indústria
do Petróleo (Onip), indicou que a indústria naval do país é capaz de atender 70% do
conteúdo total dos navios petroleiros, 63% das plataformas flutuantes de produção e
armazenamento de petróleo (FPSOs) e 61% de conteúdo para navios de apoio.
"Vamos buscar agora os 40% que faltam ou tentar buscar um número aproximado.
Existem produtos que não têm escala suficiente para que se fomente a vinda de
indústrias estrangeiras", disse.
16-abr-12 Brasil pode
produzir até 70%
de um navio
petroleiro, diz
entidade
A ação do Sinaval, intitulada “Estabelecimento de estratégia de contratação que
viabilize investimento de empresa internacional no Brasil para itens sem fabricação
nacional para a indústria naval” também inclui apresentação deste mapeamento para
estaleiros e para o governo federal, com o intuito de criar incentivos fiscais para a
indústria.
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Relatório de atividades e resultados.
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30-abr-12 Indústria naval está
na agenda positiva
de Dilma
"No que depender de mim, podem ter certeza de uma coisa: eu assumo e reitero,
mais uma vez, o meu compromisso com a indústria naval brasileira. Eu assumo o
compromisso de sempre querer melhorar o conteúdo nacional", discursou a
presidente Dilma em jun/2011, durante cerimônia de batismo da P-56, em Angra dos
Reis, Rio de Janeiro. "Nós, agora, temos de querer estabelecer no Brasil uma indústria
de "navipeças". Assim como tem a indústria de autopeças para os automóveis, nós
queremos que aqui dentro do Brasil se produza cada peça dessa plataforma."
17-mai-12 Plano de negócios
da Petrobras será
divulgado até
agosto, diz
Barbassa
O diretor de exploração e produção, José Formigli, destacou que a companhia está
estudando todos os ativos para que as metas de produção da estatal possam ser
divulgadas. De acordo com ele, até o fim deste ano, a Petrobras vai estar operando
com 40 sondas de perfuração. Os dois diretores destacaram a importância do
conteúdo local para estimular a competitividade dos fornecedores e subfornecedores
no mercado interno. “Estamos conseguindo trabalhar o conteúdo [local] sem que ele
seja o motivo de atraso de projetos”, disse Formigli.
1-jun-12 União pode
atenuar regra de
conteúdo local da
Petrobras
Ciente de que os investimentos no país não crescem e de que, ao contrário, neste ano
estão encolhendo, avalia-se a possibilidade de flexibilizar a exigência de índices de
nacionalização nas encomendas da Petrobras, que chegam a 55%, para que a empresa
possa acelerar seu programa de investimentos. A estatal conta com de R$ 224 bilhões
em investimentos previstos até 2015. As regras de conteúdo local para a contratação
de sondas estariam entre os problemas da companhia para deslanchar esse programa.
O governo não pretende mudar a regra geral, mas pensa em criar exceções, relaxando
a exigência de nacionalização de uma forma seletiva, a começar pelas sondas.
5-jun-12 Foster descarta
redução de
conteúdo local nas
encomendas da PB
Segundo a executiva, tem sido feito um monitoramento sistemático da capacidade de
produção da indústria de componentes nacionais, mas até agora não foi identificada a
necessidade de reduzir esse porcentual. Ela participou hoje, em são Paulo, de evento
para celebração de um ano do Programa Progredir.
8-jun-12 Wärtsilä e
Nuclebrás
negociam
associação
Para a finlandesa, a parceria é importante para atender as exigências de conteúdo
local previstas em contratos da Petrobras. A companhia persegue uma meta de
nacionalidade de pelo menos 60%. "Estamos trabalhando para atender o índice de
conteúdo local", contou Rosengren.
25-jun-12 Parceiro
tecnológico do EAS
chega em julho, diz
Petrobras
Segundo Formigli, são 33 sondas previstas para entrega a partir de 2016, com
conteúdo local entre 55% e 65%. Sete sondas já estão contratadas com a Sete Brasil e
outras 21 deverão ser contratadas, também com a Sete Brasil, entre julho e setembro.
Outras cinco sondas, que serão construídas pela Ocean Rig, ainda está em negociação
com o estaleiro. Formigli explicou ainda que estão previstas 14 sondas para este ano.
Em 2011, foram entregues dez sondas, que somaram um 542 dias de atraso. “Todas
que atrasaram têm 0% de conteúdo local”, destacou o diretor.
25-jun-12 Graça nega que
conteúdo local
cause atraso em
projetos
“O uso de conteúdo local não é um dogma nacionalista, é algo que nos interessa do
ponto de vista econômico”, disse a executiva. Graça afirmou que a estatal está gerindo
a proporção de fornecedores locais nos projetos até para não ter que pagar multa,
como já ocorreu anteriormente. O diretor de exploração e produção, José Miranda
Formigli, acrescentou que, na maioria dos projetos, o suprimento local faz sentido em
termos de logística e prestação de assistência técnica mais rápida, especialmente no
caso de equipamentos.
26-jun-12 Graça faz
diagnóstico severo
da Petrobras
A presidente da Petrobras fez questão de ressaltar que os atrasos que a companhia
enfrenta não são causados só pela política de conteúdo local. Ela mostrou que 14
sondas de perfuração construídas no exterior, com conteúdo local zero, foram
entregues com atrasos variando de 83 dias a 864 dias.
5-jul-12 Estudo da FGV
propõe 'cláusula de
saída' para regra de
conteúdo local no
pré-sal
Apostar na verticalização pode funcionar. Difícil é [ter] escala para fazer tudo,
argumenta Schymura. Os técnicos da FGV sugerem que, além de eleger objetivos
claros, o governo estabeleça portas de saída, com metas a serem checadas ao longo
do tempo, de modo a assegurar que ao final do período estabelecido a indústria tenha
alcançado competitividade internacional e elevado grau de desenvolvimento
tecnológico, espalhando sua influência benéfica para outros setores da indústria. Sem
isso, o Brasil corre o risco de ter uma indústria onde tudo será, naturalmente, 25% ou
30% mais caro, sem promover ganhos de eficiência que permitam a essa indústria
competir globalmente.
Supply boats
Supply boats
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  • 1. 1 Pacote nacional de projeto e maquinário de embarcações de apoio marítimo à produção de petróleo no mar Pesquisa Apoiada pela FINEP Coordenação COPPE IPT USP Subprojeto Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional Pesquisador: Jean Carlo Viterbo, MSc. Relatório Final PNV, USP, Setembro 2013
  • 2. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 2 In: Visão Estratégica Espírito Santo 2025, Reunião Técnica Macroplan - Benchmarking Petróleo, 31/12/05; fonte desconhecida.
  • 3. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 3 Sumário 1. Preâmbulo ............................................................................................................................................................5 2. Aspectos de economia industrial sobre o desenvolvimento da indústria parapetroleira ...................................6 3. Aspectos da teoria de inovação e competitividade orientados à construção naval............................................9 4. O caso norueguês do desenvolvimento da indústria parapetroleira.................................................................14 5. Desafios jurídicos à política brasileira de conteúdo local para o setor parapetrolífero ....................................20 6. Aspectos da demanda dos barcos de apoio a plataformas (PSV’s)....................................................................23 7. Tipologia, figuras e dados do setor de embarcações de apoio marítimo no Brasil............................................26 8. Aspectos do debate empresarial sobre conteúdo local.....................................................................................36 9. Conclusões e sugestões de passos em prol da cadeia nacional de fornecimento de navipeças .......................49 10. Referências .....................................................................................................................................................52 11. Anexo 1 - Frota de embarcações de apoio registrada na ABEAM..................................................................55 12. Anexo 2 - Frota de embarcações de apoio registrada na ANTAQ, com dados técnicos ................................63
  • 4. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 4 Lista de Tabelas Tabela 1 – Estrutura de custos de produção e índice de nacionalização de embarcações de apoio no Brasil 25 Tabela 2 – As 36 empresas associadas à ABEAM, tal como em agosto de 2013 32 Tabela 3 – Frota associada à ABEAM por classe de embarcação e bandeira, tal como agosto de 2013 32 Tabela 4 – 17 notícias sobre conteúdo local no Jornal Valor Econômico durante o 1º semestre de 2012 37 Tabela 5 – 16 notícias sobre conteúdo local no Jornal O Estado de São Paulo durante o 1º semestre de 2012 39 Lista de Figuras Figura 1- Estrutura de custos de produção para três tipos de navios em estaleiro europeu (2004) 24 Figura 2- Proporções da frota associada à ABEAM, segundo a bandeira e segundo a classe da embarcação 32 Figura 3 - Evolução da Frota Nacional de Embarcações de Apoio Offshore (fonte: ABEAM) 35
  • 5. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 5 1. Preâmbulo Os projetos internacionais de embarcações de apoio marítimo têm evoluído à medida que a exploração de petróleo e gás avança para águas cada vez mais profundas e distantes da costa. Para atender aos requisitos operacionais das regiões produtoras de petróleo e gás localizadas no Pré-Sal, uma nova geração de embarcações de apoio marítimo deverá ser desenvolvida. Isso porque a região, distante cerca de 300 quilômetros da costa, apresenta prevalência de condições ambientais mais adversas ou bastante distintas daquelas encontradas em outras localidades do mundo. Por exemplo, as fortes correntezas (que frequentemente atingem 4 nós) combinadas com intenso swell têm representado um desafio para as operações de suprimento na Bacia de Campos. Para as operações na região do Pré-sal, na bacia de Santos, são esperadas condições ambientais ainda mais críticas. Surge então a oportunidade para o desenvolvimento nacional de um projeto conceitual de embarcação destinada a atender às necessidades operacionais e às funcionalidades exigidas para as operações marítimas na região do Pré-sal. Diante da perspectiva de significativo aumento da demanda por embarcações de apoio a plataformas (PSV) no Brasil e da mudança tecnológica para sistemas de propulsão diesel-elétricos, esta pesquisa aponta, no seu nível macro e também no subprojeto aqui relatado, algumas oportunidades de desenvolvimento de máquinas e equipamentos nacionais que poderão ser introduzidas nessas embarcações, bem como as suas dificuldades para o fornecimento para os estaleiros. Em vista destas peculiaridades a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Universidade de São Paulo (USP) e o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), estão desenvolvendo dois projetos conceituais de embarcações de apoio, preocupando-se com o conteúdo local dos componentes a bordo. O objetivo final da pesquisa em seu nível macro é selecionar concepções de projeto, maquinário e equipamentos a serem introduzidos no pacote de projeto e maquinário de uma embarcação de apoio de 4500 DWT. O projeto conta com o apoio financeiro da FINEP.
  • 6. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 6 2. Aspectos de economia industrial sobre o desenvolvimento da indústria parapetroleira Xavier Júnior (2012) sustenta que, ao contrário do que o senso comum leva a crer, a descoberta e a extração de recursos naturais podem ser vistas como uma maldição e não como uma benção. Partindo destes eventos, poderiam surgir dois males na economia nacional: um deles é conhecido como a Doença Holandesa, enquanto o outro é chamado de Maldição dos Recursos. Embora ambos tenham origem no surgimento repentino de riquezas advindas de recursos naturais e compartilhem traços gerais, elas envolvem diferentes mecanismos de ação. O autor cita Larsen (2005), o qual define Doença Holandesa como o encolhimento do setor manufatureiro como consequência do deslocamento de fatores para a extração de recursos naturais. Além deste movimento de fatores, a Doença Holandesa também está relacionada ao efeito do aumento dos gastos governamentais decorrente da conversão dos recursos naturais em moeda nacional e a perda dos ganhos na economia devido à redução das externalidades (efeitos em cascata) como resultado do empobrecimento dos setores de maior valor adicionado (Larsen, 2006). O termo foi cunhado pela revista The Economist em 1977 para descrever a desaceleração industrial ocorrida na Holanda após a descoberta de enormes jazidas de gás natural em mar territorial na década de 50. O termo Maldição dos Recursos refere-se à observação empírica de que muitos países abundantes em recursos naturais tendem a crescer mais lentamente do que outros países similares não possuidores dos mesmos recursos (Larsen, 2006). No Brasil, já se verificou a possível existência da Maldição em escala municipal, uma vez que as cidades que recebem recursos financeiros advindos do setor petrolífero (royalties) tendem a crescer menos do que aquelas que não recebem (Postali, 2009). Citando Papyrakis e Gerlagh (2006), Xavier Júnior (2012) enumera quatro diferentes fenômenos sugeridos como responsáveis pela Maldição dos Recursos, como segue: 1. A existência de recursos naturais abundantes, que reduz a qualidade institucional de um país, induzindo comportamento de rentismo e corrupção. 2. A abundância de recursos naturais tende a deteriorar a dinâmica de comércio e tende a reduzir o grau de abertura econômica. As causas disso seriam a perda da competitividade da indústria, como consequência da supervalorização da moeda local e da imposição de quotas para, supostamente, proteger os produtores nacionais. 3. Recursos naturais reduzem o investimento em educação de alta qualidade e trabalho qualificado uma vez que o setor manufatureiro passa a encolher e a diminuir sua demanda por profissionais qualificados, reduzindo o retorno da qualidade educacional. 4. O esvaziamento do investimento em capital físico na indústria nacional.
  • 7. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 7 Quanto ao esvaziamento do investimento em capital físico, diversos mecanismos parecem contribuir com isso. Um deles é a incerteza, decorrente do risco de impacto na economia nacional da eventual volatilidade do preço da commodity da qual o país depende. Outro contribuinte é a redução de produtividade e lucratividade dos investimentos devido à perda dos efeitos em cascata do setor manufatureiro e seus retornos crescentes de escala, como consequência do movimento dos fatores para uma condição concentrada na obtenção dos recursos naturais (Papyrakis e Gerlagh, 2006). Uma vez que este movimento de fatores é o que caracteriza a Doença Holandesa, alguns autores sustentam que a Doença Holandesa é claramente uma das causas da Maldição dos Recursos. Apesar disto, é possível que um país possa sofrer de um desses males sem sofrer do outro. A existência ou não da Doença Holandesa estaria ligada a uma baixa diversificação das exportações do país, enquanto a presença da Maldição dos Recursos seria perceptível através do baixo crescimento da economia (Larsen, 2006). Há indícios, entretanto, de que a redução do tamanho do setor manufatureiro, redução da aprendizagem e a estagnação econômica não estejam necessariamente ligadas à produção de recursos naturais (Stijns, 2005). Portanto, uma política ativa de conteúdo local pode ser empregada por um país como forma de que sua economia experimente maior crescimento e diversificação para além do recurso natural explorado, mesmo sendo ele a origem do desenvolvimento. Neste sentido, um caso de especial interesse é o da Noruega, conforme analisado por Xavier Júnior (2012). O caso será explanado no capítulo seguir. A omissão governamental em desenvolver atividades mais diversas pode ser um grande impedimento para o aprimoramento da produção, o surgimento de mudanças estruturais e o desenvolvimento econômico, aumentando a probabilidade da ocorrência da Doença Holandesa e da Maldição dos Recursos. Mas há evidências de que as atividades de suprimento de equipamentos e serviços para a indústria de mineração, em geral, criam benefícios econômicos (expansão dos negócios), sociais (geração de empregos e maior competitividade), técnicos (capital intelectual aumentado, melhor desenvolvimento de produto/sistemas) e até mesmo ambientais (através do desenvolvimento de atividades de mineração mais eficientes), conforme exporto por Lydall (2009). Este autor fortalece o argumento de que, com políticas adequadas, a produção de recursos naturais pode ser algo mais próximo de uma benção do que de uma maldição. Neste sentido, o que mais importa para o desenvolvimento baseado em recursos naturais é a natureza do processo através do qual o potencial econômico destes recursos é atingido e do processo de aprendizagem no qual o país se vê envolvido (Wright, 2001). Para que este desenvolvimento seja atingido são necessários ainda capital humano de alto nível e desenvolvimento de capacidade nacional de aprendizagem e inovação (De Ferranti et al., 2002). Nesta mesma linha, Wright (2001) conclui que o mais importante para o desenvolvimento econômico baseado em recursos não é a quantidade de processamento realizado em um país, mas sua participação no processo de aprendizagem de modo estruturado para que metas de desenvolvimento sejam internalizadas. Sob esta perspectiva, o Estado pode influenciar no processo de incorporação das riquezas naturais pela economia ao investir em recursos humanos apropriados e patrocinar projetos e políticas especialmente selecionadas que favoreçam a aprendizagem das firmas da cadeia parapetroleira. Deve ser destacado ainda que, como são intensivas em capital e requerem ganhos de escala, as principais atividades desenvolvidas por fornecedores na indústria petrolífera tendem a ser realizadas por grandes firmas já estabelecidas
  • 8. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 8 no exterior, que possuem tecnologia, recursos humanos e escala para produzir com eficiência (Klueh et al., 2007). Para identificação das áreas a serem incentivadas estes autores acreditam que os tomadores de decisão das políticas de conteúdo local devem favorecer atividades que venham a promover a diversificação da economia ao gerar novas áreas de vantagem competitiva para o país, além de gerar desdobramentos suficientes para a economia nacional. Assim, visando fortalecer a economia do país e evitar a Doença Holandesa e a Maldição, deve-se usar uma política de conteúdo local que atue em diversas frentes e que promova atividades na cadeia de suprimentos da indústria petrolífera, buscando gerar aumento do nível educacional da população, fortalecer atividades de pesquisa e desenvolvimento e incentivar setores manufatureiros com possibilidade de competir internacionalmente. Esta estratégia poderia gerar vantagens competitivas para o país, desdobramentos na economia nacional e, finalmente, crescimento econômico sustentável. Por outro lado, uma política de conteúdo local que não siga estes princípios pode incentivar o surgimento de um setor manufatureiro não competitivo e sem maiores desdobramentos, a ser sustentado com base na produção de recursos naturais e com perda de bem-estar econômico, o que pode aprofundar os efeitos da Doença Holandesa e da Maldição dos Recursos, caso estas venham a se manifestar.
  • 9. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 9 3. Aspectos da teoria de inovação e competitividade orientados à construção naval É comum que países emergentes que tenham uma economia robusta e uma crescente dinâmica comercial partam para programas de desenvolvimento focados na criação de empresas industriais nacionais campeãs em setores escolhidos. Um natural desafio decorrente disso é a composição de uma “estratégia de suprimento local” que possa dar amparo ao programa e ao mesmo tempo disseminar os efeitos econômicos desse programa. Decorre então o desafio de contrabalancear suprimento global versus suprimento local. Para desenvolver o suprimento local, fica subentendida a necessidade de se investir em infraestrutura para este segmento, por exemplo, bens de capital e capacitação profissional. Por sua vez, as estratégias de suprimento global, ainda que ofereçam vantagens potenciais em termos de custo e qualidade, podem não oferecer o mesmo grau de agilidade e flexibilidade para o programa de desenvolvimento nacional, se comparada com a estratégia de suprimento local, a qual reduz os riscos logísticos e reduz o ciclo de pedidos. Entretanto, as empresas locais muitas vezes não estão em conformidade com os padrões internacionais para produtos, processos (qualidade e meio ambiente), e habilidades de trabalho. A incapacidade de atender a esses padrões é uma indicação das limitações das capacidades tecnológicas das empresas locais. Quanto maior essa indicação, mais intensa será a relação da “empresa campeã” com os fornecedores globais e/ou maior a verticalização que a empresa campeã fará para integrar e operar seu suprimento de forma própria. Figueiredo (2001, 2007) define a capacitação tecnológica como sendo o aprimoramento que uma organização faz em termos de aumento de qualidade e diminuição de custo nos seus produtos, serviços, procedimentos, processos, equipamentos, instalações e principalmente no conhecimento de sua força de trabalho. Logicamente, tais aprimoramentos podem ser fruto da incorporação de tecnologias absolutamente novas, ou da aplicação de tecnologias já existentes, mas que não eram aplicadas na organização. Lall (2000) argumenta que, diferente do que ocorre em economias avançadas, tornar-se um fornecedor competitivo em uma economia emergente normalmente não exige o mesmo nível de esforço para a inovação no desenvolvimento de tecnologias de ponta, dado que os fornecedores endógenos da base da cadeia são normalmente meros receptores da transferência de tecnologias, sejam as já existentes nas economias avançadas ou sejam as absolutamente novas para todas as economias, mas que por isso mesmo serão de domínio das economias avançadas. Isto posto, o nível de sucesso da estratégia de suprimento local é diretamente dependente e proporcional ao nível de sofisticação que os fornecedores da base têm no referido processo de transferência tecnológica. O papel dos fornecedores da base é, portanto, elemento crítico de sucesso da estratégia de suprimento local. Schmitz (1995) propõe as questões chave que devem ser acompanhadas para a gestão efetiva do crítico papel dos fornecedores da base, em prol da estratégia de suprimento local. São elas:
  • 10. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 10 1. Quais são os indutores de capacitação tecnológica que sejam críticos para influenciar a inserção de fornecedores locais na cadeia de suprimento da empresa campeã, e quais os limites da extensão que essas variáveis terão para exercer tal influência? 2. Após inseridos na cadeia, quais os processos que os fornecedores locais têm que seguir para elevar o seu grau de capacitação tecnológica (e sofisticação) na cadeia de suprimentos da empresa campeã? 3. De que forma, e em que nível, a eficiência coletiva do sistema local de inovação e das firmas inseridas num cluster industrial favorecerão a iniciativa da empresa campeã em prol do suprimento local? As questões acima tiveram o seu preâmbulo e a sua análise muito bem explanados e adaptados por Marcos Primo e Frank DuBois (2012) para o caso da indústria brasileira de construção naval, tendo na Petrobrás a figura da empresa campeã e nos fornecedores dos estaleiros do Brasil a figura das empresas que ensejam a estratégia nacional de suprimento local. Os autores iniciam a análise reafirmando premissas importantes à análise: 1. as empresas locais normalmente têm capacitações tecnológicas aquém dos níveis de conformidade requeridos pela empresa campeã (Primo e DuBois 2012); 2. as empresas locais não estão inseridas em um cluster organizado de tal forma que lhes permita beneficiarem-se das externalidades positivas que decorreriam da capacitação tecnológica de algumas outras firmas do cluster (Primo e Dubois, 2012). 3. a trajetória do desenvolvimento tecnológico de economias emergentes é inversa à que ocorre em economias avançadas. Nos emergentes, a capacitação tecnológica começa no nível da produção e operação, indo depois para o nível da engenharia, design e gestão, indo por último para o nível de pesquisa e desenvolvimento (Figueiredo 2001, Bell 2007). Primo e Dubois se apóiam em Koenig (2002), para afirmarem que, diferente do que ocorre na construção de navios militares ou de cruzeiro, os estaleiros de navios comerciais concentram a sua ação em minimizar o custo da embarcação e em manter a sofisticação tecnológica da embarcação num nível mediano. Mas devido às exigências de certificação de processos produtivos como requisito das seguradoras dos navios de operações petrolíferas, apesar das embarcações serem de mediana sofisticação, os estaleiros têm que manter postura agressiva no que tange à sofisticação tecnológica de seus processos e à certificação de seus fornecedores. Os autores argumentam que a principal barreira para a entrada de novos concorrentes neste setor é o desafio da obtenção de uma coletividade de certificações de qualidade para a construção em si e para as operações conduzidas no estaleiro. Como forma de minimizar os riscos advindos desse desafio, os armadores e estaleiros passam então a concentrar sua atenção e esforços no design e montagem do casco, e na colocação de sistemas do navio que já chegam integrados por terceiros (“outsourcing”), a exemplo de sistemas de potência e propulsão, sistemas de navegação, etc.), em vez de produzirem internamente.
  • 11. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 11 Sobre as causas do outsourcing, os autores explicam-se utilizando do caso que ocorre nos sistemas de potência e propulsão, dizendo que são poucos os seus fornecedores e todos são de abrangência global. Eles citam os seguintes motivos para tal fenômeno ocorrer com esses sistemas: 1. tais sistemas não podem ser aplicados em vasta variedade de navios e, portanto, a sua demanda global é reduzida, se comparada a outros componentes de aplicação mais vasta. 2. dada a baixa demanda local, investimento necessário para a construção de unidades fabris destes equipamentos se torna, portanto, algo instransponível para empresas que não tenham atuação global. 3. as incertezas quanto aos futuros pedidos também gera barreira para novos entrantes, especialmente as empresas locais (com especial desafio para a certificação de produtos que sejam desconhecidos pelos certificadores, os quais também são globais). 4. não tendo uma escala global de produção, os fornecedores locais não têm como competir igualitariamente no aspecto de custo, frente aos fornecedores globais. O resultado desses fatores é que os fornecedores locais acabam sendo meros integradores de componentes produzidos por fornecedores consagrados internacionalmente. Neste caso, o valor adicionado pelos integradores é tão somente a gestão comercial da variedade de fornecedores (sejam eles poucos ou muitos, de acordo com o item em questão), e a capacidade técnica de integrar os subsistemas, transformando num sistema que atenda o requisito econômicos e operacional (visão do construtor / armador) e o requisito de qualidade e segurança (visão das certificadoras). Os autores se apoiam em Quadros (2004) para afirmar que o nível de competência tecnológica requerido pelas certificadoras, e o volume de recursos tomados pelos procedimentos de certificação (custos altos, prazos longos, paralizações da linha de produção, custos de consultoria) são barreiras de entrada para novos entrantes, especialmente os pequenos em mercados emergentes. Não obstante a afirmação de que a certificação é crítica, os autores afirmam também que a obtenção de certificação (subentendido aqui seu teor de padronização) não é elemento que necessariamente contribui para o fortalecimento das relações entre fornecedores e estaleiros / armadores, podendo até enfraquecê-las. Os autores citam como causas disse fenômeno os seguintes itens: 1. sendo uma indústria que trabalha para atender requisitos de encomendas específicas, os fornecedores de componentes ficam à mercê das subjetividades das especificações de produtos, e tais subjetividades não são suficientemente codificáveis (Quadros, 2004). 2. As certificações são para o comprador uma indicação da responsabilidade do fornecedor em assumir responsabilidades adicionais e, como decorrência, elas substituem o monitoramento que o comprador faria diretamente junto às ações de seu fornecedor, resultando que os estaleiros / armadores tenham pouca inclinação para se engajar proativamente nas iniciativas de capacitação tecnológica promovidas pelos fornecedores (Quadros, 2004, e Navdi, 2008).
  • 12. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 12 3. Como a certificação traz maior padronização, fica mais fácil para o estaleiro substituir um fornecedor (que seja certificado) por outro (também certificado) e a cadeia de suprimentos fica mais flexível e fluida (Gereffi, Humphrey, e Sturgeon, 2005). Associado ao interesse do estaleiro em terceirizar tarefas que não lhe sejam críticas, o fornecedor ganha espaço para entregar sistemas integrados, fazendo surgir um tipo de governança híbrida na cadeia chamada de “governança modular”. Os autores argumentam que, para entregar módulos complexos e bem integrados pelo método turn-key, os fornecedores precisam de competências em engenharia em nível alto e abrangência ampla, determinantes de uma capacitação tecnológica menos provável de ser encontrada em fornecedores locais do que nos globais (Figueiredo, 2001). Uma forma pela qual os fornecedores locais de países emergentes podem se utilizar para compensar a menor cooperação vertical advinda dos estaleiros para a si, individualmente, é a cooperação horizontal e coletiva, ou seja, junto a outros fornecedores dos estaleiros, que é uma das características que definem um cluster. Os autores se apoiam em Humphrey (2003) para afirmar que a esfera do cluster é a mais apropriada para promover cooperação, promover aprimoramento e alavancagem da produção e a eficácia na entrega de assistência técnica. Na Coréia, os fornecedores locais se utilizaram de clusters para ganhar força perante fornecedores globais, e receberam do governo o devido aporte em termos de investimento em infraestrutura, arcabouço institucional, estabelecimentos de ensino altamente especializados e uma fortíssima cultura orientada à produtividade. A cooperação por meio de clusters leva então ao aprimoramento da capacitação tecnológica, que pode elevar a posição (upgrading) que um fornecedor local tenha na cadeia de suprimento da empresa campeã. Humphrey e Schmitz (2002) identificam quatro formas de upgrading para os fornecedores locais: 1. upgrading de processo: transformar inputs em outputs de maneira mais eficiente, por meio da reorganização do sistema de produção ou da introdução nele de uma tecnologia superior. 2. upgrading de produto: mover-se gradualmente para linhas mais sofisticadas de produtos 3. upgrading de função: exercer papéis mais importantes na cadeia de suprimento da empresa campeã, por meio não apenas de produtos de maior valor agregado, mas também de atividades de maior valor agregado (por atividades subentende-se inclusive, mas não somente, serviços). São os diferentes tipos de capacitações centrais que uma firma tem que internalizar para usar, dominar e modificar uma tecnologia nova, o que naturalmente exige níveis mais elevados de capacitação tecnológica. 4. upgrading intersetorial: uma empresa, ou cluster, de um setor alheio ao da empresa campeã, combinam esforços que resultam em novas atividades produtivas (ou produto) de modo a criar valor para a empresa campeã. Primo e Dubois (2012) analisaram a relação (porquê e como) que a capacitação tecnológica tem com o upgrading realizado por fornecedores locais inseridos nas cadeias de suprimento de construção naval em países emergentes. Os autores indicam que a capacitação tecnológica pode ser debatida em duas dimensões: níveis tecnológicos e funções tecnológicas. Em sua análise, eles trazem um debate primorosamente fundamentado que resulta em 7
  • 13. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 13 postulados, sendo 4 para a dimensão “nível tecnológico” (N) e 3 para a dimensão “função tecnológica” (F) tal como descrito a seguir: N1. em um mercado emergente, na cadeia de abastecimento de uma empresa campeã, será significativamente maior no primeiro nível da cadeia a proporção de fornecedores locais que tenham penetração internacional, se comparado com os níveis mais baixos, onde predominarão os fornecedores locais sem penetração internacional. N2. quanto melhores forem as ligações que um fornecedor local mantiver com empresas compradoras, outras empresas fornecedoras e com organizações do sistema nacional de inovação (universidades, centros de pesquisa, etc), maiores as chances deste fornecedor para aderir a cadeia de suprimentos da empresa campeã, como membro direto ou indireto. N3. sendo a capacitação tecnológica uma característica mais comum a empresas maduras, as empresas industriais em fase inicial produzirão internamente partes de baixa tecnologia no maior número possível. N4. a inserção de um prestador de serviços local (como fornecedor direto ou indireto) é mais provável na cadeia de suprimentos de produção da empresa (fase de produção industrial) do que a inserção de um fornecedor de produto local. F1. devido à predominância da empresa campeã na imposição do requisito dos equipamentos, os fornecedores locais bem ligados à cadeia da empresa campeã serão mais propensos a desenvolver upgrading de processo do que os demais tipos de upgrading. F2. o upgrading funcional será o tipo menos provável a ocorrer em fornecedores ligados à cadeia de suprimentos da empresa campeã. F3. quanto mais limitadas forem as capacitações tecnológicas dos fornecedores locais em um segmento novo no qual a empresa campeã esteja se lançando, será maior a tendência a ocorrer fenômenos de upgrading intersetorial nesta cadeia, ou seja, a entrada de fornecedores locais que acumulem reputação de destaque em outros setores.
  • 14. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 14 4. O caso norueguês do desenvolvimento da indústria parapetroleira As atividades de exploração e produção de petróleo no país se iniciaram no começo da década de 1960 e em 1965 foi estabelecida a Lei do Petróleo no país, determinando que o governo concederia licenças para empresas petrolíferas internacionais que trabalhassem para a maximização dos benefícios locais. Entre o final das décadas de 60 e 70 foi estabelecido que o governo norueguês teria participação em todos os campos em desenvolvimento através da Statoil ou da Norsk Hydro, o que era visto como instrumental para fornecedores locais. Ainda na década de 70 foi estabelecido o Escritório de Bens e Serviços (EBS), com os objetivos de: i) monitorar e cooperar com as empresas petrolíferas para desenvolver fornecedores locais; ii) estimular a indústria de fornecedores locais através de joint-ventures; iii) encorajar atividades de P&D e a transferência de tecnologia; iv) rever procedimentos de tomada de cotações e garantir que empresas locais tivessem oportunidade de realizar ofertas; v) estabelecer metas para a participação de fornecedores locais na indústria. O artigo 54 do Decreto Real de 1972 referia-se ao conteúdo local da indústria petrolífera e direcionou o governo a garantir que os fornecedores noruegueses tivessem a preferência de fornecimento à indústria, dado que fossem competitivos em preço, prazo, qualidade e serviço. Com a entrada da Noruega no Espaço Econômico Europeu (EEE) no início da década de 90, o Artigo 54 foi considerado inválido e o governo passou a incentivar a expansão da indústria parapetroleira local para o exterior, tendo em conta a melhoria da eficiência. As políticas de conteúdo local norueguesas passaram ainda por ações visando evitar a perda dos efeitos sistêmicos, por meio da acumulação de expertise local, construção de conhecimento em centros tecnológicos, educação de especialistas em petróleo, investimento em pesquisa de petróleo e manutenção de uma base de exportação diversificada (Larsen, 2006). Estas ações sistêmicas do governo foram ainda combinadas com suas políticas industrial, de incentivo à educação, de P&D e a política macroeconômica, de modo a escapar da Doença Holandesa e da Maldição dos Recursos, havendo estudos indicando o sucesso destas políticas (Bjørnland, 1998; Larsen, 2006). De forma geral, a Noruega é o caso clássico de país que conseguiu fugir da Maldição, mantendo uma economia forte mesmo depois de produzir petróleo (Larsen, 2005), tendo ainda se beneficiado das descobertas de recursos e dos altos preços do petróleo (Bjørnland, 1998). A perda de transbordamentos que poderia gerar a Doença Holandesa e a Maldição dos Recursos foi substituída por ganhos no setor de extração de petróleo offshore, mais intensivo em capital e tecnologia que o onshore. Além disto, a política industrial norueguesa estimulou a manutenção de atividades diversificadas, além do efeito “learning by doing” (Larsen, 2006) que as políticas de conteúdo local estimularam. É possível que a abolição das regras de conteúdo local no início da década tenha resultado em uma perda de produção do setor. Segundo a British Petroleum (2010), a Noruega já atingiu o seu pico de produção de petróleo
  • 15. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 15 em 2001 e, em termos de projeções sobre a Doença Holandesa (Bjørnland, 1998), isso eleva a probabilidade de que ela se manifeste no país, por causa da redução da demanda por bens e serviços para a manutenção e ativação de novos campos, o que seria condizente com o declínio da produção de petróleo no país (em 2008, 7 anos após o início da forte queda - 7% aa - na produção, 25% do PIB do país ainda era proveniente da produção de petróleo, significando 55% das exportações). Em paralelo às ações de promoção do conteúdo local, outros fatores contribuíram para que a Noruega não sofresse de males como consequência do seu sucesso energético. De forma geral, os fatores que contribuíram para o sucesso da Noruega até agora são sua política macroeconômica, o arranjo de suas instituições políticas e econômicas, a existência de um sistema judicial forte e até mesmo as normas sociais vigentes (LARSEN, 2006). No início da exploração de petróleo na plataforma continental norueguesa, o governo passou a negociar com as empresas operadoras dos campos para que elas atuassem em parceria com empresas locais que pudessem fornecer equipamentos e serviços. No primeiro período de exploração, curto, de 1969 a 1972, não havia tal intervenção do Estado, sendo livre a contratação de fornecedores. Oficialmente, o Decreto Real de 1972 sobre a exploração de petróleo estabelecera a obrigatoriedade de compra de bens noruegueses, quando competitivos em qualidade, preço e prazo. Além disso, as operadoras eram obrigadas a submeter suas listas de compras de bens e serviços previstas para suas operações ao Ministério de Petróleo e Energia (MPE). A Estatal Norueguesa do Petróleo (Statoil) participava de todos os campos autorizados nesse período, isoladamente ou em parceria com outras empresas, garantida participação mínima de 50% nos direitos do empreendimento. As parcerias eram incentivadas, como forma de proporcionar a troca internacional de experiências. Na prática, o MPE negociava diretamente com as operadoras para que comprassem bens e serviços de empresas norueguesas, além de auxiliar no desenvolvimento dos fornecedores locais. Dessa forma, criaram-se condições para que os preços dos equipamentos utilizados na produção de petróleo fossem superiores aos preços internacionais em alguns casos. Com o passar do tempo, entretanto, os fornecedores locais se desenvolveram e passaram a competir de igual para igual com os fornecedores estrangeiros tradicionais. Para persuadir as operadoras a desenvolver os fornecedores locais, o MPE considerava o histórico da operadora como quesito para conceder novos campos de exploração. Outra ferramenta de promoção da indústria local era calcada nos incentivos tributários às atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D). As operadoras eram fortemente taxadas sobre o lucro, e os gastos em P&D podiam ser abatidos do lucro, desde que realizados em solo norueguês (as alíquotas de impostos sobre o lucro de companhias de petróleo superavam 70%). Ações horizontais, como formação de mão de obra e criação de universidades e centros de pesquisa nas regiões onde as operadoras se instalavam, também foram implementadas, potencializando as atividades de P&D. A capacitação e a motivação da indústria local em se aventurar nesse novo segmento (de equipamentos e serviços para a indústria do petróleo) não parecem ter sido empecilho para as políticas adotadas na Noruega. A principal indústria norueguesa até os anos 1970, formada por armadores e estaleiros, já era internacionalizada. A Associação de Armadores e Estaleiros ainda enfatizou que se tratava de uma indústria com vários anos de experiência, quase 100 anos no transporte marítimo e 400 na pesca, o que a habilitava a facilmente partir para um novo negócio
  • 16. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 16 marítimo. Além disso, esta indústria estava procurando novos mercados, devido à queda do comércio internacional e à nacionalização do petróleo no Oriente Médio, o que reduzira profundamente a demanda por transporte marítimo e novas embarcações. Uma das preocupações das autoridades norueguesas, também mencionada por empresas e associações, é a de que os incentivos ao fornecedor local não deveriam ser excessivos e, principalmente, deveriam cessar após certo tempo, como forma de pressionar os fornecedores a se tornarem competitivos. Em 1996, com a implementação da Diretiva no 94/22/EC da Comunidade Europeia, que demandou uma série de harmonizações com o arcabouço regulatório de outros países do continente, houve maior abertura para as atividades de exploração e produção (E&P) na Noruega e consequente eliminação dos incentivos específicos aos fornecedores locais. O fato é que a abertura confirmou o sucesso da indústria para-petrolífera norueguesa, que se internacionalizou, chegando a obter quase a metade de suas receitas no mercado externo. Apesar da abertura, diversas ações e diretrizes de caráter mais geral e transversal ainda são desenvolvidas na Noruega, algumas de fomento específico à indústria e outras relacionadas aos efeitos nocivos da exploração de petróleo sobre a economia. Algumas das boas práticas identificadas serão apresentadas a seguir. O fomento à P&D pelas operadoras de petróleo via incentivos tributários continua, com a alta tributação sobre o lucro das empresas e a possibilidade de abater os gastos com P&D no cálculo deste lucro. Há também uma boa cooperação entre empresas e institutos de pesquisa. Um dos institutos consultados relatou que apenas cerca de 5% de seu orçamento vêm do poder público; o restante é oriundo de projetos com as empresas. A indústria acaba sendo a principal usuária das pesquisas. Outro instituto até desenvolveu uma estrutura de testes de perfuração, fornecendo este serviço para as operadoras testarem suas novas tecnologias. Há associações e agências de fomento que promovem a capacitação tecnológica e a internacionalização das empresas. O foco em tecnologia e internacionalização parece justificável, dado o reduzido tamanho do mercado interno e a competição externa. O nível educacional é elevado, mas se trata de um país com menos de 5 milhões de habitantes. A região de Stavanger, principal cluster de apoio às operações offshore, apresenta nível de desemprego de 2%, importando mão de obra estrangeira. A indústria norueguesa encontra-se no limite de capacidade, repassando atividades para o sudeste asiático. Por exemplo, em embarcações, o casco é produzido no exterior, mas a tecnologia e os equipamentos provêm da Noruega. Também há agências de fomento local, visando diversificar a indústria e, consequentemente, reduzir a dependência do petróleo. Na região de Stavanger, fomenta- se a indústria mecânica, que é base para diversos produtos, assim como biogás e culinária profissional (LERØEN, 2005). Outro ponto interessante do modelo norueguês que tem impacto indireto sobre a indústria diz respeito à arrecadação e à aplicação das rendas governamentais do petróleo. A Noruega instituiu um órgão que fiscaliza os custos das operadoras, o que impacta a arrecadação de tributos sobre o petróleo, fortemente incidentes sobre o lucro das operadoras. O foco de atuação deste órgão recai muito mais sobre as decisões de investimento, em que seria possível evitar mais facilmente gastos desnecessários, do que na execução contábil dos investimentos
  • 17. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 17 previstos. Sobre a aplicação das rendas do petróleo, foi instituído o fundo soberano norueguês, na década de 1990, cujos objetivos são: i) manter as rendas governamentais do petróleo fora do país, evitando sobrevalorização da moeda norueguesa; e ii) transformar a renda provisória obtida com o petróleo em renda permanente. Além do efeito cambial deste fundo, que protege a indústria local, suas práticas servem de exemplo para a instituição do fundo social brasileiro. Um ponto a destacar acerca das diferenças entre os fundos brasileiro e norueguês é que todas as receitas governamentais do petróleo norueguês vão para seu fundo, inclusive os impostos sobre o lucro das operadoras e os dividendos da Statoil a que o governo tem direito. Por sua vez, para o fundo brasileiro, serão destinados apenas os ganhos com a partilha de produção dos campos do pré-sal. Pelo lado empresarial, as firmas norueguesas ressaltam que a política pública de desenvolvimento de fornecedores foi fundamental para a economia do país, mas reforçam que a política precisa ser temporária – a fim de evitar uma acomodação das empresas – e a velocidade de expansão da participação local no fornecimento à indústria do petróleo deve ser calibrada com os demais objetivos governamentais de ampliar o volume produzido e manter os custos reduzidos. A Statoil sublinhou o fato de ser uma grande organização em seu país, o que permite sinergias e escala. Também destacou que mantém uma relação próxima com seus fornecedores, especialmente na Noruega. Entretanto, nas operações internacionais, ela atua de forma mais competitiva, sem beneficiar empresas norueguesas. Entre as empresas fornecedoras da cadeia do petróleo, observa-se um elevado grau de especialização e capacitação tecnológica. O Brasil é considerado um grande mercado para elas, ainda em fase de crescimento para suas operações. Como fatores de sucesso destas empresas, pode-se ressaltar a capacitação em gestão de projetos, incluindo-se coordenação e planejamento, treinamento contínuo de seus funcionários, experiência operacional e conhecimento do negócio. São, ainda, eficientes em identificar oportunidades para expansão das operações, além de serem tomadores de risco. Obviamente, avaliar agora os resultados da política norueguesa de fomento à cadeia fornecedora da indústria do petróleo não permite identificar os problemas e as falhas enfrentadas por tal política durante sua implementação. É difícil avaliar, por exemplo, se a renda governamental obtida em ambiente de maior abertura não seria suficiente para compensar o não desenvolvimento da indústria. É muito provável, também, que as escolhas feitas pelo MPE no desenvolvimento de fornecedores locais tenham sido contestadas pela sociedade quanto à competência dos escolhidos na efetivação do desenvolvimento local. Também não seria surpresa que acusações de corrupção tenham ocorrido, por mais transparente que seja o sistema de informação de renda e patrimônio dos cidadãos noruegueses. O fisco norueguês disponibiliza todas as declarações de renda e patrimônio dos residentes em seu território, permitindo um alto controle social sobre discrepâncias entre renda e patrimônio, declarados e não declarados. Como exemplo, no site Skattelister (http://skattelister.no/), pode-se fazer uma busca da declaração de renda de qualquer cidadão norueguês.
  • 18. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 18 Alguns pontos de comparação dentre as políticas Norueguesa e Brasileira: O primeiro ponto que merece destaque é que a Noruega é um país pouco populoso. Com isso, o desenvolvimento de uma indústria para-petrolífera mobilizou uma parcela considerável da população, o que acabou alavancando bastante a indústria e a economia norueguesa. No Brasil, em comparação inicial, os impactos tendem a ser menores, dado que o tamanho da indústria nacional é bem maior que a norueguesa e que o volume de petróleo a ser explorado, apesar de maior que o previsto para a Noruega no início de sua exploração, não teria o mesmo impacto econômico no país. Com isso, mesmo que se consiga desenvolver uma pujante cadeia de fornecedores para a indústria do petróleo, ela não deverá ter a mesma participação no total da indústria e da economia que o equivalente na Noruega. O segundo ponto é sobre as características da indústria norueguesa antes do início das explorações no Mar do Norte. A principal indústria era a de navegação marítima e construção de embarcações. Além de já ser uma base para a construção de plataformas, tratava-se de uma indústria com bastante experiência e conhecimento técnico desenvolvido, além de, principalmente, já ser internacionalizada e competitiva. Adicionalmente, esta indústria passava por um momento de baixa demanda, devido à nacionalização do petróleo no Oriente Médio, ao aumento dos preços de combustíveis e à queda substancial do comércio internacional. Nesta situação, eles precisavam encontrar novos negócios para substituir seus tradicionais. Ou seja, a indústria norueguesa reunia duas condições (uma estrutural e outra conjuntural) não tão comuns no Brasil no momento atual: capacitação técnica e empresarial e necessidade de diversificação dos negócios. Boa parte, das empresas nacionais, pelo menos as industriais, não opera internacionalmente e está, inclusive, sofrendo com a concorrência estrangeira no mercado doméstico. Conjunturalmente, a demanda doméstica está alta, com boa parte das indústrias operando próximo da capacidade e, muitas vezes, com dificuldades de expandir suas operações. O terceiro ponto a salientar é sobre o modelo de governança usado pelos noruegueses na promoção da cadeia de fornecedores. O ministério encarregado das licenças para exploração negociava ativamente com as operadoras a aquisição de serviços e equipamentos das empresas norueguesas, tendo como principal moeda de troca a preferência – ou não – nas próximas licitações de licenças de exploração. Trata-se de um sistema muito pouco transparente para o Ministério de Minas e Energia (MME), ou qualquer órgão público ligado às licitações de blocos de petróleo, aplicar, pois estaria sistematicamente sujeito à suspeição de corrupção. Na Noruega, é provável que tal preocupação tenha ocorrido, mas em menor grau, devido ao alto nível de controle social sobre a renda e o patrimônio de cada cidadão, inclusive dos funcionários públicos. Entretanto, a Petróleo Brasileiro S/A (Petrobras), como principal operadora, pode exercer este papel, desenvolvendo fornecedores locais. Deve-se destacar que isto deve ir além da prática empresarial comum de desenvolvimento de novos fornecedores, que só é feita quando a oferta é oligopolizada e concentrada e/ou quando o produto é muito estratégico para a peração. Além disso, este desenvolvimento de fornecedores não apenas deve trazer os fornecedores internacionais para produzirem no Brasil – o que já atenderia em parte às questões de insumo estratégico da Petrobras –, mas também promover o desenvolvimento de expertise nacional, de preferência com empresas nacionais. Sendo estas empresas brasileiras, quando a exploração do pré-sal terminar, elas podem continuar gerando renda para o país ao
  • 19. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 19 exportar o conhecimento aqui desenvolvido. Se forem empresas estrangeiras, o conhecimento adquirido na exploração do pré-sal irá gerar renda nos seus países de origem. O quarto ponto está relacionado ao fundo social projetado pelo modelo de exploração do pré-sal brasileiro. O fundo soberano norueguês se apropria de parcela muito maior dos lucros do petróleo que o previsto para o fundo do Brasil, o que pode facilitar uma sobrevalorização da moeda brasileira. A renda governamental do petróleo oriunda de royalties e impostos sobre os lucros das companhias de petróleo será internalizada e, em boa parte, distribuída aos estados e aos municípios, o que pode provocar aumento do consumo do governo. Com o real valorizado, a competitividade da indústria nacional, como um todo, seria reduzida, podendo eliminar qualquer vantagem das firmas brasileiras desenvolvidas para atender à indústria do petróleo. O quinto ponto a salientar e ao qual foi dada muita ênfase, tanto pelos órgãos de governo como pela Statoil, é que, no início da exploração, foi fundamental a atração de operadores estrangeiros para permitir a troca de experiência e conhecimento no desenvolvimento dos campos. Isto pode ser uma reclamação implícita ao modelo do pré-sal brasileiro, em que a Petrobras deverá ser a operadora de todos os campos. Entretanto, serve de alerta quanto a uma possível limitação do desenvolvimento tecnológico na exploração, na medida em que se reduz a possibilidade de troca de experiências. Sexto ponto, deve-se enfatizar que as políticas de fomento aos fornecedores locais devem ser temporárias e com foco em internacionalização destas empresas, a fim de que venham a ser competitivas e sobrevivam quando a proteção terminar. Isto também tem o objetivo de evitar que os custos da exploração de petróleo no país fiquem elevados, reduzindo as rendas petrolíferas governamentais, que beneficiam toda a população, em detrimento de poucas firmas e seus empregados. Tal preocupação está em consonância com as proposições de exigência de contrapartidas das empresas que recebem incentivos governamentais – como a adoção de metas de exportação, a fim de evitar que estas se acomodem aos incentivos e à proteção recebidos (SOUSA, 2011). De acordo com Amsden (1989), o modelo coreano de desenvolvimento é um exemplo de tais políticas de incentivo e controle.
  • 20. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 20 5. Desafios jurídicos à política brasileira de conteúdo local para o setor parapetrolífero No Brasil, em julho de 1999, estavam sendo perfurados 3 poços exploratórios e 16 poços de desenvolvimento, números os quais sinalizam que havia uma grande carência de infraestruturas exploratórias no país (Zamith, 2001). Os grandes empreendimentos de exploração em águas profundas marcaram a prioridade de investimentos da Petrobras a partir dos anos 1990. Nesse período, quando não houve uma orientação de política explícita quanto ao suprimento nacional, o conteúdo local na aquisição das unidades flutuantes de produção variou de 35% a 52% quando construídas no país, e de 1% a 19% quando feitas no exterior. Em 1999, um estudo da ANP apontou para um índice de 60% de capacidade da indústria para atender à demanda de bens e serviços na construção de um sistema de produção petrolífera no mar. Não foi avaliada, entretanto, a capacidade instalada da indústria para atendimento a um número elevado de encomendas. O reflexo da carência exploratória resultou na falta de novos fornecedores no Brasil ou na melhora da qualidade dos já existentes. A maior prova da inexistência ou da deficiência de fornecimento local foi a instituição do REPETRO – regime aduaneiro especial de exportação e de importação de bens destinados às atividades de pesquisa e de lavra das jazidas de petróleo e de gás natural, pelo Decreto n. 3.161/99, alterado pelos Decretos n. 3.787/01 e 4.543/02, na tentativa de ter no país a presença de bens aqui não fabricados e ao mesmo tempo desonerar, tributariamente, a indústria petrolífera, na importação de determinados bens de uso temporal. Mesmo que a exigência de Conteúdo Local tenha sido instituída para pequenas e grandes empresas, pela avaliação do anexo único da Instrução Normativa RFB nº 844, de 9 de maio de 2008 (alterada pela IN RFB n. 941, 25/05/09) pode-se verificar que as operações e terra, enfim, as operações dos pequenos operadores foram praticamente deixadas de lado, e porque não dizer ignoradas. Na redação da lista de itens agraciados, pode-se comprovar que ela é muito mais específica do que nas redações das Instruções Normativas anteriores: • Embarcações destinadas às atividades de pesquisa e produção das jazidas de petróleo ou gás natural e as destinadas ao apoio e estocagem nas referidas atividades. • Máquinas, aparelhos, instrumentos, ferramentas e equipamentos destinados às atividades de pesquisa e produção das jazidas de petróleo ou gás natural. • Plataformas de perfuração e produção de petróleo ou gás natural, bem como as destinadas ao apoio nas referidas atividades. • Veículos automóveis montados com máquinas, aparelhos, instrumentos, ferramentas e equipamentos destinados às atividades de pesquisa e produção das jazidas de petróleo ou gás natural. • Estruturas especialmente concebidas para suportar plataformas.
  • 21. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 21 As resoluções ANP que tratam de Conteúdo Local, assim como a sua instituição, não têm arcabouço legal que lhes deem suporte, especialmente, com respeito a obrigações a serem cumpridas por terceiros que nada têm a ver com os editais e com as licitações promovidas pela Agência; e sendo os regulamentos atos inferiores a lei, não podem restringir ou ampliar suas disposições. Conteúdo local não se trata de uma lei, mas tão somente uma cláusula contratual constante nos contratos da ANP para concessão da exploração e desenvolvimento de blocos hidrocarboníferos. A crítica se baseia no fato de que é apenas um regulamento, e não sendo lei, ele não pode restringir direitos que aos quais sejam intrínsecas as “reservas de lei”, ou seja, direitos que só podem ser definidos por lei, como só podem ser regidos por lei, como as garantias, os direitos e as liberdades individuais, universo do qual a livre concorrência faz parte. Regulamentos do executivo se fazem jus apenas nas lacunas que a lei não tiver cumprido, não atinentes os fenômenos a que se subentendam “reservas de lei”. O essencial é que o Executivo, ao expedir regulamento – autônomo ou de execução de lei –, não invada as chamadas “reservas da lei”, ou seja, aquelas matérias só disciplináveis por lei, e tais são, em princípio, as que afetam as garantias e os direitos individuais assegurados pela Constituição (art. 5º). Sendo mero regulamento, e não lei, o conteúdo local fere o art. 5º da Constituição, o qual preconiza que: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Outro elemento de inconsistência apontado pelos críticos, é o fato de que a própria Lei do Petróleo (art. 40) solicita métodos de ação que se tornam impraticáveis. Segue o texto do artigo: “O julgamento da licitação identificará a proposta mais vantajosa, segundo critérios objetivos, estabelecidos no instrumento convocatório, com fiel observância dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e igualdade entre os concorrentes.” A Lei do Petróleo em seu art. 40 exige que os critérios de julgamento sejam objetivos. Ou seja, práticos, positivos e válidos para todos. Como se vê, Conteúdo Local no Brasil não é prático, há itens, subitens e planilhas ou programas enormes a serem preenchidas, dependendo de condições econômicas, preço do petróleo no mercado internacional e outras variáveis para ser possível, no futuro acertar seus percentuais. Não dá para chamar isso de critério objetivo (Quintans, 2009). Sobre este aspecto, Quintans (2012) tece ainda os seguintes comentários: “E se, por exemplo, no Brasil, não for possível encontrar fornecedores de bens e serviços, ao tempo e no prazo dos períodos de exploração e produção nos contratos, pela falta de capacidade instalada ou falta de infraestrutura local, pelo fornecedor não oferecer preços, prazos e qualidade compatíveis? E se nem existirem fornecedores locais para
  • 22. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 22 determinados bens ou serviços? E se o fornecimento de conteúdo local for apenas parcial? E se o fornecedor não cumprir como prometido ou declarado em contrato? O que irá alegar o concessionário junto à ANP? Poderá alegar que a cláusula contratual é de onerosidade excessiva se provados os fatos que ensejam sua ocorrência? Se fosse um contrato privado, com certeza sim. O que irá alegar a ANP, se questionada em juízo, sobre o seu “poder de polícia” em instituir regras sobre matéria que não está descrita em nenhum inciso, do art. 1º, da Lei do Petróleo, mesmo quando está a Agência ciente de que determinados bens não são ou tão cedo não serão produzidos no Brasil? Até onde a lei do petróleo é considerada uma Lei standardizada, que autoriza a ANP a decidir por si o que pode ou não fazer? Onde está o limite? Quem poderá impor esse limite?” Espera-se o bom senso da ANP para, em relação a Conteúdo Local, na falta de fornecedores locais ou na impossibilidade (ainda que parcial) dos mesmos, ao tempo de auditar ou de julgar o Conteúdo Local, considerar as circunstâncias como “extraordinárias” admitindo o caso da obrigação ter se tornado um encargo excessivo, possibilitando a sua revisão contratual, para evitar a resolução dos contratos oferecendo a oportunidade de modificar equitativamente as condições do contrato; ou conceder a possibilidade de alteração do modo de executar o contrato, justamente para evitar a onerosidade excessiva ou, simplesmente, incumbir ao concessionário a obrigação de provar que é caso de força maior, sem falar na hipótese do concessionário entender que – ao tempo da execução dos serviços e aquisição de bens o mesmo não poderia prever a inexistência ou a deficiência de fornecedores locais, caracterizando força maior em razão de que o cumprimento de uma determinada obrigação contratual torna-se impossível por um fator alheio a vontade das partes se estiver fora do controle, de forma que a tendência é desobrigar a parte prejudicada de forma permanente ou temporária do cumprimento de suas obrigações contratuais. Deve ser cuidadosa a decisão de pleitear a inexecução de parte do contrato, pois, na forma do art. 10, da Portaria ANP 234/2003, poderá ocasionar a penalidade de rescisão do contrato de concessão, no caso de descumprimento de qualquer das obrigações que não seja corrigido pelo concessionário dentro do prazo determinado pela ANP por meio de notificação. Se aplicada a pena de rescisão, além da perda da atividade econômica imediata, os responsáveis pela concessionária ficarão impedidos, por cinco anos, de exercer atividade de E&P. O principal mecanismo de defesa do conteúdo local é o acórdão 1157/97 do Tribunal de Contas da União, o qual invoca que o conteúdo local é procedente por agir conforme o artigo primeiro Lei 9.478 / 97 (Lei do Petróleo), que define os objetivos da política nacional, nos quais se incluem “preservar o interesse nacional” e “promover o desenvolvimento”, dentre outros itens. Mas os que criticam a natureza jurídica do conteúdo local invocam que a hierarquia das leis faz prevalecer um artigo constitucional, se houver embate com uma lei ordinária.
  • 23. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 23 6. Aspectos da demanda dos barcos de apoio a plataformas (PSV’s) A indústria de construção naval costuma ser classificada como uma “indústria global”, pois a posição competitiva de uma empresa de construção naval em um determinado país é estreitamente relacionada à sua posição competitiva em outros países. Assim, as maiores empresas de construção naval competem entre si em vários países diferentes. Em grandes projetos de construção naval, os potenciais compradores chegam a convidar de 20 a 30 construtores navais para submeterem suas propostas de construção (Cho & Porter, 1986). Por outro lado, grande parte da atividade de fabricação de navios envolve a aquisição de máquinas e equipamentos marítimos de fornecedores especializados que também operam em escala global. Dicken (1998: 230) estabelece a distinção entre três tipos clássicos de relações de subcontratação industrial: por especialidade, por economia de custos e por complementaridade. A subcontratação por especialidade envolve o desempenho de funções para as quais o fornecedor detém infraestrutura de produção e competências técnicas especializadas. A subcontratação por economia de custos é fundamentada nos diferenciais de custos de produção entre a empresa contratante e a empresa contratada. Finalmente a subcontratação por complementaridade objetiva absorver aumentos ocasionais na demanda sem que a empresa contratante tenha que expandir sua capacidade de produção. As relações de fornecimento de máquinas e equipamentos para a indústria de construção naval são condicionadas à experiência do fornecedor, conteúdo tecnológico e reputação das máquinas e equipamentos adquiridos. Trata- se, pois de uma relação de subcontratação industrial por especialidade. Com a grande expansão da globalização econômica, observada no final do século XX, as relações de subcontratação industrial evoluíram para novas formas organizacionais, caracterizadas pela desagregação vertical e pela formação de redes de organizações independentes. No caso extremo, nas organizações em rede verticalmente desagregadas, todas as funções da cadeia produtiva, que não sejam a coordenação e o controle da produção, são subcontratadas de empresas independentes e comercializadas sob a marca da empresa líder (Dicken, 1998: 234). O consórcio modular para a produção de caminhões, implantado pela Volkswagen no Brasil, constitui um caso exemplar de organização em rede verticalmente desagregada. Neste caso, todos os componentes dos veículos são fabricados e montados por empresas independentes sob a coordenação da empresa proprietária da marca. A construção de barcos de apoio marítimo por intermédio de “pacotes” de projeto, máquinas e equipamentos marítimos constitui um exemplo de formação de rede organizacional verticalmente desagregada. Nesse arranjo organizacional, a empresa líder desenvolve o projeto do navio e coordena a cadeia de fornecedores globais das máquinas, equipamentos e sistemas de controle utilizados no projeto. A capacidade técnica, gerencial e financeira para projetar o navio, organizar a cadeia de fornecedores e comercializar as máquinas e equipamentos do navio constitui principal fator de sucesso na preparação e comercialização dos “pacotes” de projeto, máquinas e
  • 24. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 24 equipamentos para produção desses barcos. A empresa ofertante do “pacote” define os papéis, os campos de ação e as estratégias de relacionamento que serão estabelecidas com cada fornecedor de máquinas e equipamentos. Isso significa definir as tecnologias que serão utilizadas no projeto, qual o escopo dos serviços de manutenção pós-venda e qual nível de troca de conhecimentos entre as empresas participantes da rede. A integração vertical da empresa líder, por aquisições de empresas fornecedoras, é também frequente neste segmento de mercado. Por outro lado, a experiência acumulada, a reputação técnica e o domínio tecnológico constituem os principais fatores de sucesso empresarial para um fornecedor individual de máquinas ou de equipamentos marítimos. A crise mundial que atingiu o setor de construção naval no início da década de 1980 desencadeou mudanças profundas na organização da produção de embarcações e na composição das cadeias de suprimento setoriais. As relações entre construtores (estaleiros) e fornecedores de máquinas e equipamentos navais evoluíram para níveis cada vez maiores de terceirização e subcontratação de etapas da produção. Figura 1- Estrutura de custos de produção para três tipos de navios em estaleiro europeu (2004) Até 1980, os grandes estaleiros mundiais fabricavam internamente grande parte das máquinas e equipamentos que instalavam nos navios. Desse modo, a produção interna de um estaleiro representava de 70 a 80% do valor final de um navio. Atualmente, os estaleiros mais competitivos do cenário mundial estão focados em nichos específicos de mercado (especialização por tipo de navio e conteúdo tecnológico) e produzem internamente entre 25 e 35% do valor total de um navio (Kanerva, 2004). A figura 1 apresenta exemplos de estruturas de custos de produção de três tipos de navios obtidos de um estaleiro europeu em 2004. Observa-se que quanto mais complexa for a construção, maior a incidência dos componentes produzidos fora do estaleiro na composição dos custos totais de fabricação. Para os navios de cruzeiro, o valor total das subcontratações e das aquisições de sistemas turnkey e de sistemas marítimos pode chegar a 63,75% dos custos totais de construção. Para um barco de apoio offshore típico, o valor dos componentes adquiridos de fornecedores (maquinário, sistemas marítimos e acessórios) representa cerca de 60% dos custos totais de construção. Entretanto, para navios relativamente mais simples, tais como os navios porta-containers, os custos de componentes, máquinas e equipamentos, envolvem valores da ordem de 50% dos custos totais de produção.
  • 25. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 25 A ampla difusão dos pacotes tecnológicos de projeto, maquinário e demais componentes de embarcações de apoio offshore constitui, pois, um desdobramento da tendência geral de terceirização e subcontratação na indústria de construção naval. Neste tipo de arranjo institucional, o projetista do navio detém o controle tecnológico do produto final, pois firma acordos de comercialização com fabricantes de máquinas e equipamentos e vende ao estaleiro, não o projeto em si, mas o conjunto de todas as máquinas e equipamentos que irão equipar o navio. No Brasil, em função dos custos locais de produção e da incidência de impostos de importação, a estrutura de custos de produção de barcos de apoio offshore pode ser bastante diferente da apresentada na figura 1. A tabela 1 apresenta a estrutura de custos de produção de uma embarcação de apoio offshore, equipada com propulsão diesel-elétrica, fabricada em um estaleiro nacional (dados de 2012). Esta embarcação foi construída a partir de um pacote importado de projeto e maquinário, adaptado pelo projetista para incluir geradores, motores painéis elétricos de fabricação nacional. A primeira coluna da tabela divide os principais componentes do custo de produção deste navio: aço processado, propulsão, equipamentos elétricos, equipamentos eletrônicos e de comunicação, sistemas auxiliares (tubulação, válvulas, etc.) e mão-de-obra. O item propulsão inclui os propulsores azimutais, os propulsores laterais (bow thrusters) e os respectivos motores elétricos e seus inversores de frequência. O item equipamentos elétricos inclui os grupos geradores, os painéis elétricos, os transformadores, a automação da planta elétrica, e os inversores de frequência auxiliares. Tabela 1 – Estrutura de custos de produção e índice de nacionalização de embarcações de apoio no Brasil
  • 26. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 26 7. Tipologia, figuras e dados do setor de embarcações de apoio marítimo no Brasil A navegação de apoio marítimo se constitui em importante elo na cadeia de óleo e gás, pois oferece apoio logístico e operacional às plataformas, com as mais diversas atividades, como será visto a seguir. A tipologia que segue foi obtida principalmente em apresentações feitas pela associação brasileira de embarcações de apoio marítimo (ABEAM) em 2012 e 2013 e as imagens são de divulgação dos diversos armadores, disponíveis na internet. Para tipificar as embarcações de apoio marítimo, a Antaq e a legislação brasileira subordinam a este conceito um rol maior de embarcações (se comparado à ABEAM), o qual inclui lanchas, barcaças, taineiras, e todas aquelas que se relacionem diretamente com plataformas. Preconizaremos neste estudo a tipologia tal como conceituada e agrupada pelo método dos armadores (ABEAM). AHTS – Anchor Handling and Tug Supply: Pode ter entre 60 e 80 m de comprimento e potência de 6.000 a 20.000 BHP. Atua com rebocador e instalação de unidades estacionárias de produção (UEP’s), manuseio de âncoras e transportes de suprimentos (tubos, água doce, óleo, lama, salmoura, cimento, peças, etc.) e também combate a incêndios. Robustez e autonomia para trabalhos pesados ou de emergência são seus principais atributos.
  • 27. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 27 PSV – Platform Supply Vessel: utilizado no apoio às plataformas de petróleo, transportando material de suprimento: cimento, tubos, lama, salmoura, água doce, óleo, granéis. Mede de 60 a 100 metros de comprimento e cerca de 5.000 HP, com impelidores laterais inclusos, para melhor manobrabilidade. A alta relação entre DWT/DL gera baixo custo de transporte, que é seu principal atributo. DWT é “deadweight tonnage”, ou arqueação líquida, o volume dos espaços fechados destinados ao transporte de carga e DL é o peso total do navio sem carga, combustíveis, lastro e tripulação). RSV / ROV - Research Support Vessel / Remote Operate Vehicle: Embarcação de apoio especializada em pesquisas sísmicas e em operações com pequeno veículo remoto, operado do navio e que atua no fundo do mar através de braços mecânicos, luzes e lentes no manuseio e montagem de equipamentos submarinos offshore.
  • 28. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 28 SV – Supply Vessel: design e atributo análogo aos do PSV, com menor porte. Serve também à prontidão e SOS. LH – Line Handling : Embarcação utilizada no manuseio de espias (cabos de amarração) e serve à prontidão e SOS, com cerca de 35 m e potência em torno de 1.800 HP. Leveza e manobrabilidade são seus principais atributos. FSV ou UT – Fast Supply Vessel ou Utility Boat: supridores de cargas rápidas. Utilizado no transporte rápido de cargas emergenciais, ou da tripulação e de outras equipes que atuam nas plataformas. Rapidez é seu atributo. Crewboat: preconiza o transporte de tripulantes das plataformas (o espaço para carga é menor que no FSV). Como o pré-sal subentende viagens de mais de 300 km, este tipo tende a ser substituído pelos helicópteros.
  • 29. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 29 OSRV – Oil Spill Response Vessel: combate ao derramamento de óleo e incêndios. É dotado de equipamentos específicos que permitem trabalhar na mancha de óleo, em atmosfera onde a evaporação do petróleo produz gás natural. Tais equipamentos, somados sistemas elétricos blindados contra os gases, são os principais atributos. WSV –Well Stimulation Vessel: bombeamento de gases e fluidos e equipamentos para estimulação de poços.
  • 30. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 30 PLSV – Pipe Laying Support Vessel: Construção e lançamento de linhas e dutos. DSV – Diving Support Vessel: embarcações de suporte a operações de mergulho
  • 31. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 31 MPSV - Multipurpose Supply Vessel: podem ser usados para realizar apoio em contruções ou operações submarinas com ou sem ROV, intervenção em poços, lançamento de cabos e dutos e as funções normais de apoio offshore sob normalidade e sob emergência. Portanto, equacionam vários dos atributos das demais embarcações.
  • 32. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 32 A associação brasileira das empresas de apoio marítimo (ABEAM) representa institucionalmente as empresas associadas perante os diversos órgãos públicos direta ou indiretamente, dentre eles, ANTAQ, Marinha do Brasil, Receita Federal, Ministério do Trabalho, Conselho Nacional de Imigração, e também junto às petroleiras (em especial a Petrobrás), além de participar de organizações e comissões nacionais e internacionais ligadas ao setor. Ela também orienta suas associadas, procurando harmonizar entendimentos no trato de questões operacionais, de segurança, meio ambiente e novas tecnologias. Segundo apresentação divulgada pela ABEAM, em agosto de 2013, o Brasil possuía 127 empresas autorizadas pela ANTAQ para fazer operações de apoio offshore, mas apenas cerca de cerca de 50 empresas operando efetivamente no apoio marítimo. Nesta apresentação, a ABEAM informa ser constituída por 36 empresas associadas, citadas a seguir: Tabela 2 – As 36 empresas associadas à ABEAM, tal como em agosto de 2013 Acamin Fugro Brasil Saveiros Asgaard Geonavegação Seacor Offshore Astromarítima Gulf Marine Sealion Bourbon Hornbeck Siem BRAM Internav Solstad Bravante Locar Starnav BSCO Maersk Subsea7 CBO Megasea Technip Deep Sea Norskan Tranship Farol OceanPact Transmar Farstad Olympic UP Offshore Finarge OSM do Brasil Wilson Sons A mesma apresentação informa que a estimava de gastos anuais do setor marítimo com afretamentos seja da ordem de US$ 4,5 bilhões em 2013. Estas 36 associadas reúnem uma frota de 450 embarcações, sendo 211 de bandeira brasileira e 239 de bandeira estrangeira. A tabela 3 mostra a categorização desta frota por classe de embarcação e bandeira, e a figura 2 traz a proporção de cada bandeira e classe para a coluna “total” da tabela 3. Tabela 3 – Frota associada à ABEAM por classe de embarcação e bandeira, tal como agosto de 2013 Figura 2- Proporções da frota associada à ABEAM, segundo a bandeira e segundo a classe da embarcação
  • 33. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 33 Em 1968, a Petrobrás começou a pesquisa e exploração de jazidas no mar e a empresa importou 13 embarcações de apoio entre 1968 e 1975, as quais então tinham bandeira brasileira. Em 1982, quando a Petrobrás iniciou efetivamente a produção de petróleo no mar, o Brasil já dispunha de 91 embarcações, sendo 44 de bandeira brasileira, mas a maioria estrangeira. Neste ano, a Petrobrás passou a terceirizar a propriedade e gestão da frota de apoio e isso promoveu um salto na frota. Em 1985, havia um total de 205 embarcações e a maioria era de bandeira brasileira (110). Em 1990, o governo desregulamentou o setor, abrindo para empresas internacionais explorarem o setor. Numa incapacidade de concorrer com corporações globais, várias empresa brasileiras fecharam e a frota de bandeira brasileira despencou de tal forma que, em 1997, era de 43 embarcações, ou seja, menor do que fora 15 anos antes (1982). Em 1997, foi promulgada a lei 9.432, a Lei do Transporte Aquaviário, a qual trouxe reserva de mercado para os armadores e seus funcionários locais, e isso fez a frota de bandeira brasileira voltar a crescer. Mas as empresas estrangeiras se adequaram à lei e também cresceram dentro dos limites impostos pela lei. Os principais itens da lei, que reimpulsionaram o setor brasileiro de operação marítima foram os seguintes: Art. 2º Para os efeitos desta Lei, são estabelecidas as seguintes definições: I - afretamento a casco nu: contrato em virtude do qual o afretador tem a posse, o uso e o controle da embarcação, por tempo determinado, incluindo o direito de designar o comandante e a tripulação; II - afretamento por tempo: contrato em virtude do qual o afretador recebe a embarcação armada e tripulada, ou parte dela, para operá-la por tempo determinado; IV - armador brasileiro: pessoa física residente e domiciliada no Brasil que, em seu nome ou sob sua responsabilidade, apresta a embarcação para sua exploração comercial; V - empresa brasileira de navegação: pessoa jurídica constituída segundo as leis brasileiras, com sede no País, que tenha por objeto o transporte aquaviário, autorizada a operar pelo órgão competente; VI - embarcação brasileira: a que tem o direito de arvorar a bandeira brasileira; Art. 4º Nas embarcações de bandeira brasileira serão necessariamente brasileiros o comandante, o chefe de máquinas e dois terços da tripulação. Art. 9º: O afretamento de embarcação estrangeira por viagem ou por tempo, para operar na navegação interior de percurso nacional ou no transporte de mercadorias na navegação de cabotagem ou nas navegações de apoio portuário e marítimo, bem como a casco nu na navegação de apoio portuário, depende de autorização do órgão competente e só poderá ocorrer nos seguintes casos: I - quando verificada inexistência ou indisponibilidade de embarcação de bandeira brasileira do tipo e porte adequados para o transporte ou apoio pretendido; III - quando em substituição a embarcações em construção no País, em estaleiro brasileiro, com contrato em eficácia, enquanto durar a construção, por período máximo de 36 meses, até o limite: b) da arqueação bruta contratada, para embarcações destinadas ao apoio. Art. 10. Independe de autorização o afretamento de embarcação: I - de bandeira brasileira para a navegação de longo curso, interior, interior de percurso internacional, cabotagem, de apoio portuário e de apoio marítimo; III - estrangeira a casco nu, com suspensão de bandeira, para a navegação de cabotagem, navegação interior de percurso nacional e navegação de apoio marítimo, limitado ao dobro da tonelagem de porte bruto das embarcações, de tipo semelhante, por ela encomendadas a
  • 34. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 34 estaleiro brasileiro instalado no País, com contrato de construção em eficácia, adicionado de metade da tonelagem de porte bruto das embarcações brasileiras de sua propriedade, ressalvado o direito ao afretamento de pelo menos uma embarcação de porte equivalente. Art. 11. É instituído o Registro Especial Brasileiro - REB, no qual poderão ser registradas embarcações brasileiras, operadas por empresas brasileiras de navegação. § 1º O financiamento oficial à empresa brasileira de navegação, para construção, conversão, modernização e reparação de embarcação pré-registrada no REB, contará com taxa de juros semelhante à da embarcação para exportação, a ser equalizada pelo Fundo da Marinha Mercante. § 6º Nas embarcações registradas no REB serão necessariamente brasileiros apenas o comandante e o chefe de máquinas. § 9º A construção, a conservação, a modernização e o reparo de embarcações pré-registradas ou registradas no REB serão, para todos os efeitos legais e fiscais, equiparadas à operação de exportação. Art. 12. São extensivos às embarcações que operam na navegação de cabotagem e nas navegações de apoio portuário e marítimo os preços de combustível cobrados às embarcações de longo curso. Um primeiro aspecto importante dessa lei é o fato de que ela foi concebida para atender mais aos interesses dos prestadores de serviço de transporte, os armadores, do que os estaleiros nacionais. Entretanto, a intenção de incentivar os estaleiros nacionais foi expressa no artigo 9º, inciso I e no inciso III, do qual a alínea b se refere especificamente ao caso das embarcações de apoio. Art. 9º: O afretamento de embarcação estrangeira por viagem ou por tempo, para operar na navegação interior de percurso nacional ou no transporte de mercadorias na navegação de cabotagem ou nas navegações de apoio portuário e marítimo, bem como a casco nu na navegação de apoio portuário, depende de autorização do órgão competente e só poderá ocorrer nos seguintes casos: I - quando verificada inexistência ou indisponibilidade de embarcação de bandeira brasileira do tipo e porte adequados para o transporte ou apoio pretendido; III - quando em substituição a embarcações em construção no País, em estaleiro brasileiro, com contrato em eficácia, enquanto durar a construção, por período máximo de 36 meses, até o limite: b) da arqueação bruta contratada, para embarcações destinadas ao apoio. A leitura simples do artigo faz entender que ele regulamenta o afretamento de embarcação estrangeira de apoio, na sua modalidade “por tempo”, restringindo esta faculdade para dois casos apenas: (inciso I) indisponibilidade de embarcação brasileira congênere, OU (inciso III) em substituição a embarcação em construção no país (congênere). O inciso I sugere incentivar o armador brasileiro, e o inciso III sugere incentivar o estaleiro brasileiro. Restringindo o raciocínio apenas ao inciso III, deduz-se que as embarcações de apoio que forem construídas no Brasil e venham a ter bandeira brasileira, sempre terão a preferência para o afretamento perante as embarcações de bandeira estrangeira (as quais mormente são construídas fora do país). Com afretamento praticamente garantido por lei, seria de se esperar que a armação nacional decolasse a demanda dos estaleiros nacionais, pelo menos no limite da grande demanda gerada pela Petrobras, mas tal decolagem não ocorreu. Para entender como
  • 35. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 35 foi possível que a realidade atual tenha transcorrido diversamente ao que fora sugerido pelo inciso III, revisamos a leitura do inciso I. Ele proíbe o afretamento de embarcação estrangeira se houver disponibilidade de embarcação de bandeira nacional, que lhe seja congênere. Portanto, o inciso I gera a ineficácia do inciso III na medida em que, se os armadores nacionalizam a bandeira de navios construídos fora do país, eles se enquadram à lei e isso tende a reduzir a demanda de navios construídos no Brasil. Até então, nacionalizar a bandeira de um navio estrangeiro era tarefa razoavelmente difícil, mas com a constituição do REB, Registro Especial Brasileiro, nacionalizar a bandeira de um navio ficou bem mais fácil. A figura 3 abaixo mostra a evolução da frota de apoio no Brasil. Pode-se ver que, entre 1995 e 2009 (a instituição da lei do transporte aquaviário e do REB foram em 1997), o número de embarcações com bandeira estrangeira cresceu 18%, enquanto o número de embarcações com bandeira nacional cresceu 150% (a maioria destas, provavelmente construídas fora do país, nacionalizadas sob o REB). Não que se desejasse que a totalidade destas embarcações tivessem sido construídas no Brasil. É sabida a carência de fornecedores qualificados e também a desarticulação dos elos da cadeia de navipeças em 1997. Mas é visível a perda de oportunidade para a indústria naval brasileira (estaleiros e sua cadeia de fornecedores), fruto da facilidade criada pelo REB aos armadores, vendedores de serviços à Petrobras, para naturalização de navios estrangeiros. Figura 3 - Evolução da Frota Nacional de Embarcações de Apoio Offshore (fonte: ABEAM)
  • 36. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 36 8. Aspectos do debate empresarial sobre conteúdo local Buscou-se, sem sucesso, literatura específica que estudasse as eventuais dificuldades enfrentadas pelo setor de navipeças brasileiro para elevar o fornecimento para a construção de navios para operações offshore. No intuito de se conhecer a conjuntura do setor brasileiro de navipeças para embarcações para o pré-sal, o nível de participação de empresas nacionais neste subsetor, e as eventuais dificuldades inerentes, o pesquisador realizou então uma longa atividade de levantamento de notícias sobre o setor em dois jornais de grande circulação. Foram escolhidos O Estado de São Paulo e o Valor Econômico. A realização deste levantamento, bem como os critérios de seleção das notícias a serem analisadas, se baseavam principalmente no assunto “Conteúdo Local”. As tabelas 4 e 5, vistas a seguir, resumem as principais notícias encontradas, com destaque em vermelho para os fragmentos que realçam interesse ao assunto.
  • 37. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 37 Tabela 4 – 17 notícias sobre conteúdo local no Jornal Valor Econômico durante o 1º semestre de 2012 Dia Manchete Fragmento de interesse 22-dez-11 Demanda vai somar US$ 224 bi A expectativa da petrolífera é que o Progredir atinja a marca de R$ 1 bilhão em financiamentos liberados ainda em 2011. As ações pretendem ampliar a participação do conteúdo local nos projetos. Hoje a Petrobras tem uma média de nacionalização de projetos de E&P variando entre 65% e 85%. Alberto Machado, diretor de Óleo e Gás da Abimaq, cobra, porém das petrolíferas, um detalhamento maior de sua demanda futura e também a garantia de contratação de demanda anunciada no prazo estabelecido. "Se você se prepara para uma coisa que vai acontecer em cinco anos e isso acontece em dez anos, você quebra", diz. 23-jan-12 Rolls-Royce investe para atender Petrobras O presidente da Rolls-Royce para a América do Sul, Francisco Itzaina, afirmou que o Rio é um dos focos da companhia no país, devido a importância do setor de óleo e gás. Mas o Valor apurou que a vontade da Rolls-Royce Brasil é de instalar um centro de treinamento também em Santa Cruz, próximo da fábrica. Caso aprovado, a construção poderá ser anunciada e iniciada nos próximos meses. A expectativa é o treinamento de cerca de 4 mil pessoas por ano, entre funcionários e clientes. A iniciativa faz parte dos planos de driblar a falta de mão de obra especializada. O presidente afirmou que outro objetivo é aumentar o índice de conteúdo local. O compromisso é um dos fatores decisivos para fechar contratos com a Petrobras. 9-fev-12 Petrobras confirma contratação de sondas com Sete Brasil e Ocean Rig A entrega de todas as unidades, com requisitos de conteúdo local variando entre 55% e 65%, deverá ocorrer entre 48 e 90 meses, de acordo com os contratos. A implementação do projeto considera a construção de novos estaleiros no país, além da utilização da infraestrutura já existente. 13-fev-12 Graça diz que não há previsão de construir plataformas fora do Brasil "Não há previsão de não exercer a política Petrobras de conteúdo local", frisou Graça, acrescentando que não aceita "que a indústria de petróleo no Brasil perca a competitividade". Questionada sobre as sondas de perfuração, a executiva garantiu que as unidades que serão construídas fora do Brasil já foram todas contratadas, com previsão de chegada de mais três este ano e uma no ano que vem. A partir daí, segundo ela, todas serão feitas no país, inclusive as 28 já contratadas junto à Sete Brasil e cinco junto à Ocean Rig. 6-mar-12 Falta de experiência afeta Atlântico Sul Também se reforçou a ideia de fazer as sondas no país com altos índices de conteúdo local. Na edição de ontem, o Valor informou que Graça Foster está negociando a troca do controle acionário do estaleiro com o aval da presidente da República, Dilma Rousseff. Uma dificuldade estaria no fato de Camargo Corrêa e Queiroz Galvão não estarem dispostas a saír do negócio amargando prejuízo. 13-mar-12 BNDES prevê R$ 15 bi para financiar sondas O presidente da Sete Brasil, João Carlos Ferraz, disse que a empresa tem carta do BNDES que garante financiamento de 80% do conteúdo local das sete primeiras sondas. Essas unidades terão índice de nacionalização de 62%, o que, considerando o conteúdo local de 80%, garantem financiamento de 50% do valor das sondas, segundo o executivo. As sete unidades vão custar US$ 5,2 bilhões, o que resultaria em financiamento do banco de US$ 2,6 bilhões, afirmou Ferraz. Ele projeta essa mesma estrutura financeira para chegar aos US$ 13,5 bilhões para as 28 unidades. 17-abr-12 Setor naval quer discutir conteúdo local O mapeamento feito pelo Sinaval, com o apoio da Organização Nacional da Indústria do Petróleo (Onip), indicou que a indústria naval do país é capaz de atender 70% do conteúdo total dos navios petroleiros, 63% das plataformas flutuantes de produção e armazenamento de petróleo (FPSOs) e 61% de conteúdo para navios de apoio. "Vamos buscar agora os 40% que faltam ou tentar buscar um número aproximado. Existem produtos que não têm escala suficiente para que se fomente a vinda de indústrias estrangeiras", disse. 16-abr-12 Brasil pode produzir até 70% de um navio petroleiro, diz entidade A ação do Sinaval, intitulada “Estabelecimento de estratégia de contratação que viabilize investimento de empresa internacional no Brasil para itens sem fabricação nacional para a indústria naval” também inclui apresentação deste mapeamento para estaleiros e para o governo federal, com o intuito de criar incentivos fiscais para a indústria.
  • 38. Avaliação de desafios institucionais e capacitações industriais de empresas potencialmente fornecedoras de componentes no projeto de um PSV nacional. Relatório de atividades e resultados. Jean Carlo Viterbo, MSc. 38 30-abr-12 Indústria naval está na agenda positiva de Dilma "No que depender de mim, podem ter certeza de uma coisa: eu assumo e reitero, mais uma vez, o meu compromisso com a indústria naval brasileira. Eu assumo o compromisso de sempre querer melhorar o conteúdo nacional", discursou a presidente Dilma em jun/2011, durante cerimônia de batismo da P-56, em Angra dos Reis, Rio de Janeiro. "Nós, agora, temos de querer estabelecer no Brasil uma indústria de "navipeças". Assim como tem a indústria de autopeças para os automóveis, nós queremos que aqui dentro do Brasil se produza cada peça dessa plataforma." 17-mai-12 Plano de negócios da Petrobras será divulgado até agosto, diz Barbassa O diretor de exploração e produção, José Formigli, destacou que a companhia está estudando todos os ativos para que as metas de produção da estatal possam ser divulgadas. De acordo com ele, até o fim deste ano, a Petrobras vai estar operando com 40 sondas de perfuração. Os dois diretores destacaram a importância do conteúdo local para estimular a competitividade dos fornecedores e subfornecedores no mercado interno. “Estamos conseguindo trabalhar o conteúdo [local] sem que ele seja o motivo de atraso de projetos”, disse Formigli. 1-jun-12 União pode atenuar regra de conteúdo local da Petrobras Ciente de que os investimentos no país não crescem e de que, ao contrário, neste ano estão encolhendo, avalia-se a possibilidade de flexibilizar a exigência de índices de nacionalização nas encomendas da Petrobras, que chegam a 55%, para que a empresa possa acelerar seu programa de investimentos. A estatal conta com de R$ 224 bilhões em investimentos previstos até 2015. As regras de conteúdo local para a contratação de sondas estariam entre os problemas da companhia para deslanchar esse programa. O governo não pretende mudar a regra geral, mas pensa em criar exceções, relaxando a exigência de nacionalização de uma forma seletiva, a começar pelas sondas. 5-jun-12 Foster descarta redução de conteúdo local nas encomendas da PB Segundo a executiva, tem sido feito um monitoramento sistemático da capacidade de produção da indústria de componentes nacionais, mas até agora não foi identificada a necessidade de reduzir esse porcentual. Ela participou hoje, em são Paulo, de evento para celebração de um ano do Programa Progredir. 8-jun-12 Wärtsilä e Nuclebrás negociam associação Para a finlandesa, a parceria é importante para atender as exigências de conteúdo local previstas em contratos da Petrobras. A companhia persegue uma meta de nacionalidade de pelo menos 60%. "Estamos trabalhando para atender o índice de conteúdo local", contou Rosengren. 25-jun-12 Parceiro tecnológico do EAS chega em julho, diz Petrobras Segundo Formigli, são 33 sondas previstas para entrega a partir de 2016, com conteúdo local entre 55% e 65%. Sete sondas já estão contratadas com a Sete Brasil e outras 21 deverão ser contratadas, também com a Sete Brasil, entre julho e setembro. Outras cinco sondas, que serão construídas pela Ocean Rig, ainda está em negociação com o estaleiro. Formigli explicou ainda que estão previstas 14 sondas para este ano. Em 2011, foram entregues dez sondas, que somaram um 542 dias de atraso. “Todas que atrasaram têm 0% de conteúdo local”, destacou o diretor. 25-jun-12 Graça nega que conteúdo local cause atraso em projetos “O uso de conteúdo local não é um dogma nacionalista, é algo que nos interessa do ponto de vista econômico”, disse a executiva. Graça afirmou que a estatal está gerindo a proporção de fornecedores locais nos projetos até para não ter que pagar multa, como já ocorreu anteriormente. O diretor de exploração e produção, José Miranda Formigli, acrescentou que, na maioria dos projetos, o suprimento local faz sentido em termos de logística e prestação de assistência técnica mais rápida, especialmente no caso de equipamentos. 26-jun-12 Graça faz diagnóstico severo da Petrobras A presidente da Petrobras fez questão de ressaltar que os atrasos que a companhia enfrenta não são causados só pela política de conteúdo local. Ela mostrou que 14 sondas de perfuração construídas no exterior, com conteúdo local zero, foram entregues com atrasos variando de 83 dias a 864 dias. 5-jul-12 Estudo da FGV propõe 'cláusula de saída' para regra de conteúdo local no pré-sal Apostar na verticalização pode funcionar. Difícil é [ter] escala para fazer tudo, argumenta Schymura. Os técnicos da FGV sugerem que, além de eleger objetivos claros, o governo estabeleça portas de saída, com metas a serem checadas ao longo do tempo, de modo a assegurar que ao final do período estabelecido a indústria tenha alcançado competitividade internacional e elevado grau de desenvolvimento tecnológico, espalhando sua influência benéfica para outros setores da indústria. Sem isso, o Brasil corre o risco de ter uma indústria onde tudo será, naturalmente, 25% ou 30% mais caro, sem promover ganhos de eficiência que permitam a essa indústria competir globalmente.