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TAXA DE CONGESTIONAMENTO: EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS E OS 
DESAFIOS PARA A REALIDADE DAS CIDADES BRASILEIRAS 
Diego Mateus da Silva 
LASTRAN – Laboratório de Sistemas de Transportes 
UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul 
Leonardo de Moura Nitzke 
LASTRAN – Laboratório de Sistemas de Transportes 
UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul 
Helena Beatriz Bettella Cybis 
LASTRAN – Laboratório de Sistemas de Transportes 
UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul 
RESUMO 
O tráfego de veículos nas áreas centrais de grandes cidades brasileiras tem atingido níveis preocupantes. 
Problemas como congestionamentos, acidentes, ruídos, emissão de poluentes e a crescente ocupação do solo 
urbano para o estacionamento de automóveis tem levado as autoridades públicas a buscar soluções que limitem o 
uso do automóvel e transfiram estes usuários aos modais coletivos de transporte. Uma dessas soluções aplicadas 
nas últimas décadas tem sido a taxa de congestionamento, popularmente conhecido como pedágio urbano, 
mecanismo que regula o acesso de automóveis às áreas centrais das cidades através do pagamento de uma taxa. 
Este artigo apresenta uma análise das experiências internacionais em Londres, Cingapura e Estocolmo e os 
desafios e perspectivas da implantação da taxa de congestionamento no contexto brasileiro. Conclui-se que a 
taxação tem se mostrado como eficiente medida de gerenciamento de tráfego urbano do ponto de vista da 
engenharia de transportes, pois é capaz de transferir usuários do automóvel para o transporte público. 
PALAVRAS CHAVE 
Taxa de congestionamento, gerenciamento de demanda, tráfego. 
ABSTRACT 
Traffic in central areas of medium and large Brazilian cities has reached worrying levels. Problems such as 
congestion, accidents, noise, emission of pollutants and increasing occupation of urban land for car parking has 
led public authorities to seek solutions to limit car use and transfer these users to transit systems. One of these 
solutions applied in the last decade has been the congestion pricing, mechanism that regulates the access to 
central areas of cities by paying a fee. This paper presents an analysis of the international experience at London, 
Singapore and Stockholm and the challenges and prospects for implementation of congestion pricing in context 
of Brazilian cities. Finally, we observe that congestion pricing has proven to be an efficient measure of urban 
traffic management from point of view of transport engineering because it is able to transfer users car to public 
transport. 
KEYWORDS 
Congestion pricing, travel demand management, traffic.
1. INTRODUÇÃO 
A situação das principais cidades brasileiras em relação aos seus níveis de tráfego, 
especialmente nos horários de pico, é alarmante. Grandes metrópoles como São Paulo e Rio 
de Janeiro apresentam problemas crônicos na mobilidade urbana, impactando diretamente no 
cotidiano de toda a população. Esta situação é compartilhada pelos grandes conglomerados 
urbanos e é reflexo de políticas públicas que ao longo dos anos objetivaram substancialmente 
o aumento da infraestrutura viária e o incentivo ao uso do automóvel. O aumento da 
capacidade viária muitas vezes não fornece, a longo prazo, soluções eficientes para o 
congestionamento do tráfego, mas acabam promovendo o uso cada vez maior de automóveis 
(Oberholzer-Gee e Weck-Hannemann, 2002). Desta forma, resta evidente que ações que 
objetivem o gerenciamento sobre a demanda são fundamentais para a formulação de uma 
política pública efetiva, que seja capaz de combater o problema da mobilidade nas grandes 
cidades. 
Dentre estas ações, a taxação do congestionamento tem recebido especial atenção dos 
economistas para resolver os problemas do tráfego urbano. A introdução de cobrança para 
gerenciar a demanda de automóveis no centro das cidades é reconhecida como um importante 
instrumento de controle. Para Lindsey (2012), caso se considere os argumentos propostos por 
economistas sobre a questão do congestionamento e a taxação como uma medida para 
combatê-lo, o objetivo da eficiência sempre vem à frente e em muitos casos, associados com 
preços baseados nos custos marginais sociais. Dentro deste conceito, assume-se que cada 
cidadão mude seu comportamento considerando sua adaptação à nova situação. Entretanto, 
políticos de muitas cidades têm considerado essa medida como inapropriada e politicamente 
não aceitável. Isso se deve ao fato de que os políticos visualizam dimensões que os 
economistas não estão considerando (Viegas, 2001). 
O objetivo deste artigo é verificar a adequabilidade da política de taxação do 
congestionamento para as cidades brasileiras, buscando inferir, através da análise de 
experiências internacionais já consolidadas, quais os usuais impactos no padrão de viagens 
decorrentes da sua implantação. Após esta breve introdução, apresenta-se na Seção 2 o 
arcabouço teórico que trata dos conceitos de gerenciamento da demanda por viagens. 
Posteriormente, a Seção 3 trata dos principais exemplos de cidades que implementaram a taxa 
de congestionamento como medida de sucesso no gerenciamento de tráfego: Londres 
(Inglaterra), Cingapura e Estocolmo (Suécia). Na Seção 4 são abordados os recentes avanços 
tecnológicos internacionais no processo de cobrança do usuário que permitem maior agilidade 
e menor evasão tarifária. A Seção 5 traz uma análise dos desafios prospectados para a 
implantação da taxação do congestionamento no contexto brasileiro, tomando por base os 
casos anteriormente analisados e as possibilidades abertas com a promulgação da Lei de 
Mobilidade Urbana em 2012. Por fim, a Seção 6 levanta as considerações finais dos autores a 
partir das análises elaboradas ao longo do estudo. 
2. GERENCIAMENTO DA DEMANDA POR VIAGENS 
O conceito de Travel Demand Management (TDM) compreende um conjunto 
diversificado de estratégias de transporte que promovem coletivamente o uso eficaz, eficiente
e equitativo dos recursos e facilidades existentes e renováveis. Segundo Rivasplata (2013), ao 
invés de aplicar a prática tradicional de prover e ampliar a oferta de espaço viário para atender 
automóveis, o TDM defende o uso de alternativas com base na hierarquização de prioridades 
para o pedestre, a bicicleta e o transporte público, respectivamente. 
Além do incentivo ao uso dos modais de transporte coletivos e os não motorizados, a 
estratégia do TDM também abarca uma série de medidas de gerenciamento da demanda que 
induzem os usuários a não concentrarem seus deslocamentos no espaço e no tempo (Linsey, 
2012). Dispersão do fator de pico, redução da demanda por transporte individual e restrições 
ao uso do automóvel são exemplos de objetivos a serem alcançados pelo uso do TDM. Uma 
das medidas que trabalha com estes três objetivos é a taxação do congestionamento, muitas 
vezes traduzidas para o português como pedágio urbano. 
Conceitualmente, a taxação do congestionamento é uma política de cobrança aos 
usuários que busca cobrir os custos marginais do uso da rodovia. Tem por objetivo gerenciar a 
demanda em situações onde os recursos para investimento na oferta de espaço viário são 
limitados. Devido ao seu papel de gerenciamento de demanda, é também citado na literatura 
internacional como taxa de congestionamento, principalmente nos casos onde a cobrança é 
feita nos períodos de pico (Button, 2004; Rivasplata, 2013). 
A análise de Viegas (2001) mostra que as mudanças de comportamento causadas pela 
taxa de congestionamento devem ser graduais, de forma a não causar mudanças bruscas no 
comportamento das pessoas. O que deve ser perseguido, enquanto considerado o objetivo 
mais visível de eficácia, é o fato de se fazer progressos na questão do congestionamento. A 
perspectiva econômica de cobrança dos usuários pelas externalidades que estes geram pelo 
uso da via vem ganhando força nos últimos anos. Costa (2007) afirma que o uso da via por 
condutores de automóveis implica em custos que são internalizados pela sociedade, tais como 
os congestionamentos que impõem atrasos a todos os usuários em seus deslocamentos, a 
emissão de poluentes na atmosfera e os acidentes resultantes da interação entre veículos e 
usuários na corrente de tráfego. 
De acordo com Senna e Michel (2007) os custos de congestionamentos provem da 
redução de velocidade imposta aos veículos que trafegam na via pela entrada de veículos 
adicionais. A partir da geração deste custo, considera-se que os demais usuários estariam 
dispostos a cobrir os custos de oportunidade de tempo e combustível adicional para que um 
veículo adicional não utilize a via. Partindo de uma análise econômica, o fluxo de tráfego 
ótimo ocorreria quando os custos do tráfego adicional e a demanda fossem iguais. No entanto, 
o usuário que entra na via considera a curva de custo marginal privado ao invés da curva de 
custo marginal social para o novo usuário e os demais. Desta forma, o peso morto do excesso 
de congestionamento de tráfego é representado pela diferença entre estas duas curvas.
Figura 1. Curva de custo marginal 
Fonte: Adaptado de Button (2004). 
A taxa de congestionamento tem um enfoque central na regulação da oferta do espaço 
viário aos usuários de automóveis. Economicamente, este sistema objetiva a internalização 
dos custos externos resultantes do uso da via e, portanto, deve ser tratado de maneira 
integrada aos diversos mecanismos de gerenciamento de tráfego (Sabounchi et. al., 2014). 
Outra questão que merece atenção é a aceitabilidade da medida pela população, de forma que 
as pessoas acreditem que esta questão está sendo tratada corretamente e de forma justa, 
considerando a multiplicidade de interesses presentes na sociedade. Nesse aspecto, duas 
questões são fundamentais: a equidade e a prestação de contas à sociedade (Viegas, 2001). 
A questão da equidade envolve tanto uma equidade longitudinal quanto a uma 
equidade vertical. O conceito de equidade longitudinal está ligado ao fato da resistência das 
pessoas em pagar por algo anteriormente disponível de graça. Já a equidade vertical está 
associada à questão da proteção daqueles que possuem situação menos favorável. No tangente 
à responsabilidade deve-se prever uma prestação de contas completa, especialmente sobre o 
que está sendo feito com os recursos financeiros arrecadados. É necessário que a aplicação 
dos recursos esteja em sintonia com os anseios da sociedade voltados a questão da mobilidade 
urbana e não sirvam apenas como um subsídio cruzado a outros setores. 
3. EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS 
A implantação prática da taxa de congestionamento ainda se resume a poucas cidades 
do mundo. Apesar de soluções para a proteção de centros históricos já existirem a bastante 
tempo, o sistema de cobrança regulado e organizado com o objetivo de regulação do tráfego é 
recente. Cingapura em 1998, Londres em 2003 e Estocolmo em 2006 foram os sistemas 
primeiramente implantados de forma organizada e já apresentam resultados e análises 
consolidadas sobre sua operação. Recentemente, Milão (2008) e Gotemburgo(2013) também 
implantaram sistemas de taxação do congestionamento na área central com o objetivo de 
regular o uso do automóvel nesses espaços. Outras cidades como Copenhagen, Budapeste,
Jacarta e São Francisco também estão considerando e planejando a implantação de zonas de 
taxação do congestionamento. 
Embora algumas ainda sejam recentes e, portanto, de difícil análise quanto aos 
impactos advindos desta política, outras experiências já estão consolidadas e servem de 
parâmetro para estudos reais sobre o tema. Por terem sido implantados há mais tempo e por 
terem se adaptado ao longo dos anos, os casos de Londres, Cingapura e Estocolmo se 
destacam na literatura sobre o tema. No entanto, a política de taxação do congestionamento 
apresenta também diversos estudos teóricos relativos aos conceitos econômicos envolvidos 
nesta estratégia. 
3.1. O exemplo de Londres: Congestion Charge Zone 
Londres foi uma das primeiras capitais a implantar um esquema de taxação do 
congestionamento na região central da cidade. Constantes níveis de saturação do tráfego na 
principal zona de comércio fizeram com que os gestores começassem a buscar novas soluções 
que evitassem os congestionamentos nessa área. Aliada à cultura europeia de preservação do 
patrimônio arquitetônico, a indisponibilidade de espaço viário nessa região exigia dos 
planejadores novas formas de gerenciar o tráfego no centro da cidade. Surge então a proposta 
de criação de uma zona que delimitasse o centro, de modo que seria necessário o pagamento 
de uma taxa para o acesso a essa região através de veículos particulares (Santos, 2004). 
Figura 2. Área de Abrangência da Congestion Charge Zone (CCZ) em Londres. 
Fonte: Transport for London (TfL)
Um estudo elaborado pelo programa de pesquisa London Congestion concluiu em 
1995 que a introdução de uma zona de cobrança traria benefícios econômicos a médio e longo 
prazo para a cidade. Este estudo serviu de base para o plano de campanha do candidato Ken 
Livingstone à prefeitura de Londres no ano de 2000. Com sua eleição, a agência de 
planejamento de transportes, Transport for London (TfL) é chamada a elaborar uma série de 
estudos que definissem a localização e a política tarifária a ser implantada no programa. É 
então implantada em 2003 a Congestion Charge Zone (CCZ). Esta medida fez parte de uma 
série de políticas implantadas pela prefeitura na época com o objetivo de melhorar o 
transporte público, fiscalizar os estacionamentos e gerenciar a demanda de automóveis nas 
áreas centrais da cidade. 
O relatório da TfL de junho de 2007 aponta que o número de veículos tributáveis que 
entraram na zona havia reduzido em 30%, enquanto houve um aumento geral no número de 
táxis, ônibus e bicicletas. Também o perfil diário de tráfego de fluxos havia mudado, com 
menor tráfego após as 9h30. O nível global de tráfego na CCZ em 2006 foi 16% menor do 
que os níveis anteriores à cobrança. Em algumas das vias próximas a CCZ o tráfego aumentou 
um pouco, mas os congestionamentos e atrasos foram praticamente inalterados em relação aos 
níveis de 2002. Após a introdução da extensão leste em 2007, o volume de tráfego reduziu 
entre 10 e 15% na zona estendida. 
3.2. O pioneirismo de Cingapura: restrição da propriedade associada à restrição de uso 
Em Cingapura a introdução da taxa de congestionamento foi um mecanismo de uma 
série de políticas de gerenciamento de tráfego implantadas desde 1970, em função das 
restrições do país de disponibilidade de espaço e a necessidade de competitividade 
econômica. Um aspecto chave da gestão da demanda em Cingapura é a restrição de 
propriedade do veículo, seja por meio da imposição de altos custos de propriedade ou 
restrição do crescimento real da população de automóveis. Além de impedimentos fiscais, o 
fornecimento de automóveis foi regulamentado desde 1990, quando um sistema de cotas de 
veículos foi introduzido no país. Em seguida, os encargos relacionados com o uso, tais como 
impostos sobre os combustíveis (50% do preço de venda final) e altas taxas de 
estacionamento são utilizadas pelas autoridades públicas para restringir o uso do automóvel. 
Em paralelo com este espectro de medidas de custos rodoviários, o governo tem 
investido pesadamente em transporte público e implementou um sistema de park-and-ride, 
proporcionando aos usuários de automóveis uma alternativa real para alternar entre os modos 
de viagem. Raux et al (2012) colocam que, em resumo, a estratégia urbana de transporte de 
Cingapura permitiu que os usuários tenham opções de modais coletivos e, como resultado, 
apesar de ter uma das maiores rendas per capita na Ásia, somente 32% das famílias de 
Cingapura tinha a propriedade de algum veículo em 2010 
A taxa de congestionamento de Cingapura foi formulada pela primeira vez e projetada 
em 1973, sob a liderança de um elevado nível comitê interministerial, que recomendou 
políticas e medidas para melhorar a situação do transporte urbano na época. No entanto, o 
esquema de cobrança foi implementado somente após um diálogo de um ano com o público e 
algumas modificações terem sido feitas com base no comportamento de resposta dos
usuários. A taxa de congestionamento foi divulgada ao público como parte de um pacote 
global de medidas de tarifação rodoviária e melhorias de transporte público, o que ajudou a 
ganhar o apoio da população. 
Figura 3. Pontos de controle na área central de Cingapura. 
Fonte: Land Transport Authority (LTA). 
3.3. A visão sustentável de Estocolmo: ganhos ambientais com taxa de congestionamento 
Em Estocolmo os níveis de congestionamento antes da implantação da taxação 
geravam um debate amplo na população, principalmente nas áreas periféricas da cidade de 
Estocolmo, onde os moradores que viviam fora dos pontos de controle, mas trabalhavam no 
centro da cidade, argumentavam que eles seriam mais afetados pela medida que os 
demais. Para Jansson (2010), o debate seguia razões políticas que haviam de fundo na 
proposta, onde alguns grupos argumentavam que a implantação da taxa de congestionamento 
seria simplesmente uma forma de punir os moradores de Estocolmo dentro do sistema político 
sueco centralizado. 
Nesse contexto, um período experimental de seis meses foi implantado entre janeiro 
de 2006 e julho de 2006. Além do reconhecimento óptico de placas, transponders foram 
utilizados para identificar os veículos, e optou-se por utilizar uma identificação prévia que 
permitisse o débito direto para o pagamento do imposto. 
Börjesson et al (2012) indicam que o custo de passagem no cordão em dias úteis é de 
€ 2 no período de pico (7:30 - 8:30 e 16:00 - 17:30), € 1,5 durante os 30 minutos antes e após 
os período de pico e € 1 nas demais horas do dia entre 6:30 e 18:30. A cobrança é feita 
quando o usuário cruza o cordão em ambos os sentidos, o que significa um custo diário de € 4 
para ida e volta nos horários de pico. Apesar de a cobrança ser feita por passagem, o custo 
máximo diário por veículo é de € 6.
Figura 4. Pontos de controle na área central de Estocolmo 
Fonte: Swedish Road Administration (SRA) 
3.4. Ganhos e características de cada sistema 
Os resultados apresentados na Tabela 1 mostram que a política de taxação do 
congestionamento tem resultados expressivos na redução do uso do automóvel e, quando 
associado a medidas de qualificação do transporte coletivo, acabam transferindo usuários 
daquele para este. 
Tabela 1: Resumo das características dos sistemas de Londres, Cingapura e Estocolmo. 
Elaboração própria. 
Fonte: Santos (2004), Raux et al (2012) e Börjesson et al (2012).
Outra análise possível trata do aumento do número de automóveis com tecnologia 
ambientalmente mais sustentável, como no caso de Estocolmo. A partir de uma maior taxação 
sobre proprietários de automóveis mais antigos e com maior número de emissão de poluentes, 
os usuários migraram para veículos mais “limpos”. Esta medida mostra que a política de 
taxação do congestionamento pode também associar-se a objetivos ambientais. No entanto, a 
simples migração de veículos antigos para veículos com menores índices de emissão não 
corresponde diretamente a uma redução do uso do automóvel nas áreas centrais. Pode-se notar 
isto no dado que mostra que houve uma redução de apenas 9% no volume de tráfego em 
Estocolmo após a implantação, enquanto nas outras duas cidades esta redução foi maior. 
4. AVANÇOS NA TECNOLOGIA DE COBRANÇA 
O desenvolvimento de novos métodos que permitem uma fiscalização mais ampla e 
automatizada tem permitido a implantação de sistemas mais robustos, com baixos índices de 
evasão e que não interfiram consideravelmente no fluxo do tráfego. Senna e Michel (2007) 
mostram que somente um sistema de cobrança eletrônica é capaz de superar os elevados 
custos de transação entre os usuários. 
Os sistemas Closed-Circuit Television (CCTV) com reconhecimento de placas tem 
sido largamente implantados na última década ao redor do mundo. Geralmente, sua aplicação 
tem servido para controle de veículos com pendências fiscais ou infrações de trânsito junto 
aos órgãos de trânsito. Nos esquemas de taxação do congestionamento, esta tecnologia 
permite que, ao passar no ponto de controle da zona pré-estabelecido, o veículo seja 
identificado pela placa e, através de um cadastro dos condutores ou proprietário ou, em alguns 
casos mais avançados, debitados diretamente da sua conta de crédito. 
Em Estocolmo a tecnologia aplicada foi a de câmeras de infravermelho que detectam 
os emissores instalados no veículo. A taxa de erro desta tecnologia, assim como os CCTV, é 
baixa. No entanto, os emissores instalados podem ser danificados pelos proprietários, gerando 
possibilidades de burlar os sistemas. Segundo Jansson (2010), este não tem sido um problema 
em Estocolmo, uma vez que o sistema de taxa de congestionamento tem tido maior aceitação 
na população com o passar dos anos. 
5. DESAFIOS NO CONTEXTO DAS CIDADES BRASILEIRAS 
Embora nenhum esquema tradicional de taxação do congestionamento tenha sido 
implantado na América Latina, várias cidades têm discutido a gestão do congestionamento. 
Algumas cidades da região, incluindo Bogotá, Medellín, Cidade do México, La Paz, Quito, 
Santiago e São Paulo, tentam aliviar o congestionamento por meio de restrições sobre 
veículos (Rivasplata, 2013). Em todas essas cidades, muitos cidadãos de alta renda optam por 
comprar um segundo veículo, dobrando o seu nível de acesso à cidade. Na Cidade do México 
e em Bogotá esse padrão tem sido particularmente evidente e é uma razão chave pela qual 
alguns especialistas nestas cidades se voltaram para outros esquemas para reduzir o 
congestionamento de tráfego.
Mussone et al (2014) argumentam que a taxa de congestionamento é uma das formas 
mais eficazes de restringir o acesso às áreas urbanas fortemente congestionadas. Ele pode 
efetivamente introduzir um mecanismo de preços para limitar a entrada de veículos e gerar 
receitas para cobrir os custos administrativos e investimentos em transportes alternativos. Para 
Rivasplata (2013), isso não quer dizer que não existem sérias barreiras para a adoção um 
esquema de taxa de congestionamento, particularmente na América Latina, onde rendimentos 
são mais baixos e os recursos são mais escassos do que na Europa. 
Pelo que se pode observar dos exemplos analisados, a taxa de congestionamento pode 
ser utilizada como uma medida adequada nas grandes cidades brasileiras. A sanção da Lei 
Federal nº. 12.587 de 2003, também conhecida como a Lei da Mobilidade Urbana, autoriza a 
cobrança de tributos pelo uso da infraestrutura urbana. A Lei da Mobilidade traz que os entes 
federativos brasileiros poderão utilizar como instrumentos de gestão do sistema de transporte 
e da mobilidade urbana aplicação de tributos sobre modos e serviços de transporte urbano 
pela utilização da infraestrutura urbana. Tal medida, conforme a Lei, visa desestimular o uso 
de determinados modais e serviços e vincula a receita à aplicação exclusiva em infraestrutura 
urbana e no financiamento do subsídio público da tarifa de transporte público (BRASIL, 
2012). Os maiores desafios para a implantação nas grandes cidades brasileiras provavelmente 
se assemelham com aqueles enfrentados pelas demais cidades onde a taxa de 
congestionamento foi implementada. A questão da aceitabilidade é o desafio fundamental 
para que a medida não tenha grande resistência da população. 
Como principais impactos esperados na mudança do padrão das viagens estão a 
redução das viagens, a troca de modal e a alteração dos trajetos utilizados pelos veículos, além 
da alteração dos horários em que as pessoas utilizam a infraestrutura urbana. A redução das 
viagens se dá por conta da própria substituição do modal utilizado, uma vez que a imposição 
de tributo por conta da utilização do espaço viário tende a levar as pessoas a optar por modais 
como o ônibus ao invés do automóvel. Além disso, Need (2005) afirma que as pessoas 
tenderão escolher trajetos em que não há imposição de tributo por sua utilização, desta forma 
tornando mais distribuída a utilização do espaço urbano. 
Caso a taxação se dê nos horários de pico, isto terá impacto direto na rotina das 
pessoas. As pessoas que tenham a opção de trabalhar ou estudar, mais cedo ou mais tarde, 
provavelmente o façam se forem usuários cativos de automóveis. Como benefícios esperados 
pela medida, pode-se esperar a redução dos níveis de congestionamento, por conta das 
mudanças já citadas sobre a mudança no padrão de viagens, e um aumento nas receitas para o 
investimento em infraestrutura e subsídios para o transporte coletivo. 
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS 
O conceito de fundo da taxa de congestionamento é derivado da teoria econômica da 
eficiência e das externalidades, que afirma que as pessoas tomam decisões socialmente 
eficientes, considerando plenamente os custos e benefícios sociais. 
Os estudos de casos como os de Londres, Cingapura e Estocolmo demonstraram que a 
taxa de congestionamento se porta como um eficiente instrumento de gerenciamento de
demanda. Além disso, demonstraram que os rendimentos da taxação podem servir como uma 
importante fonte de receita para outros programas de transportes. 
Foi exposto que para que a medida seja aceita pela população, torna-se importante que 
haja preocupação tanto pela equidade da medida, quanto por uma prestação de contas 
adequada a população. Além disso, ficou caracterizado que apesar das preocupações com a 
equidade, há evidências de que, em alguns casos, a população está pronta para aceitar a taxa 
de congestionamento. 
Analisou-se uma possível implantação da taxa de congestionamento no Brasil. 
Demonstrou-se que a medida está contemplada desde 2012 pela legislação federal, através da 
sanção da Lei da Mobilidade Urbana. Foi citado que tal medida vincula a receita à aplicação 
em infraestrutura urbana destinada ao transporte público coletivo e ao transporte não 
motorizado e ao financiamento do subsídio público da tarifa de transporte público. 
Por fim, apontou-se os principais impactos esperados na mudança do padrão das 
viagens. Entre eles estão a redução das viagens, a troca de modal e a alteração dos trajetos 
utilizados pelos veículos, além da alteração dos horários em que as pessoas utilizam a 
infraestrutura urbana. Como principais benefícios, citou-se uma redução dos níveis de 
congestionamento e um aumento nas receitas para o investimento em infraestrutura, e 
subsídios para o transporte coletivo. 
Como sugestões para trabalhos futuros, pode-se sugerir pesquisas voltadas a questão 
da aceitabilidade da medida, especialmente destinada aos proprietários e usuários de 
automóveis, bem como a tecnologia disponível a ser utilizada nas cidades brasileiras na 
implantação da taxa de congestionamento. 
AGRADECIMENTOS 
Os autores agradecem o apoio financeiro do CNPq, da CAPES e do Lastran/UFRGS. 
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Transportation Economics, 9, 3-25. 
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sistema de transportes. In Anais do XVI Congresso Brasileiro de Transporte e Trânsito. Associação 
Nacional dos Transportes Públicos. Maceió, AL. 
Börjesson, M.; J. Eliasson; M. B. Hugosson e K. Brundell-Freij (2012) The Stockholm congestion charges- 
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<http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2213624X1400011X#>. Acesso em 30 de abril de 
2014. 
Need, Y. (2005). Public acceptance of pricing schemes for the netherlands. In International Perspectives on 
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Research Board. Key Biscane, Florida. 
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Raux, C.; S. Souche e D. Pons (2012) The efficiency of congestion charging: some lessons from cost-benefit 
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Sabounchi, N. S.; K. P. Triantis; S. Sarangi e S. Liu (2014) Dinamic simulation modeling and policy analysis of 
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Research Part A: Policy and Practice, 59, 357-383. 
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Paulo, SP. 
Viegas, J. M. (2001). Making urban road pricing acceptable and effective: searching for quality and equity in 
urban mobility. Transport Policy, 8 (4), 289-294.

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Taxa de congestionamento: experiências internacionais e os desafios para a realidade das cidades brasileiras

  • 1. TAXA DE CONGESTIONAMENTO: EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS E OS DESAFIOS PARA A REALIDADE DAS CIDADES BRASILEIRAS Diego Mateus da Silva LASTRAN – Laboratório de Sistemas de Transportes UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul Leonardo de Moura Nitzke LASTRAN – Laboratório de Sistemas de Transportes UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul Helena Beatriz Bettella Cybis LASTRAN – Laboratório de Sistemas de Transportes UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul RESUMO O tráfego de veículos nas áreas centrais de grandes cidades brasileiras tem atingido níveis preocupantes. Problemas como congestionamentos, acidentes, ruídos, emissão de poluentes e a crescente ocupação do solo urbano para o estacionamento de automóveis tem levado as autoridades públicas a buscar soluções que limitem o uso do automóvel e transfiram estes usuários aos modais coletivos de transporte. Uma dessas soluções aplicadas nas últimas décadas tem sido a taxa de congestionamento, popularmente conhecido como pedágio urbano, mecanismo que regula o acesso de automóveis às áreas centrais das cidades através do pagamento de uma taxa. Este artigo apresenta uma análise das experiências internacionais em Londres, Cingapura e Estocolmo e os desafios e perspectivas da implantação da taxa de congestionamento no contexto brasileiro. Conclui-se que a taxação tem se mostrado como eficiente medida de gerenciamento de tráfego urbano do ponto de vista da engenharia de transportes, pois é capaz de transferir usuários do automóvel para o transporte público. PALAVRAS CHAVE Taxa de congestionamento, gerenciamento de demanda, tráfego. ABSTRACT Traffic in central areas of medium and large Brazilian cities has reached worrying levels. Problems such as congestion, accidents, noise, emission of pollutants and increasing occupation of urban land for car parking has led public authorities to seek solutions to limit car use and transfer these users to transit systems. One of these solutions applied in the last decade has been the congestion pricing, mechanism that regulates the access to central areas of cities by paying a fee. This paper presents an analysis of the international experience at London, Singapore and Stockholm and the challenges and prospects for implementation of congestion pricing in context of Brazilian cities. Finally, we observe that congestion pricing has proven to be an efficient measure of urban traffic management from point of view of transport engineering because it is able to transfer users car to public transport. KEYWORDS Congestion pricing, travel demand management, traffic.
  • 2. 1. INTRODUÇÃO A situação das principais cidades brasileiras em relação aos seus níveis de tráfego, especialmente nos horários de pico, é alarmante. Grandes metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro apresentam problemas crônicos na mobilidade urbana, impactando diretamente no cotidiano de toda a população. Esta situação é compartilhada pelos grandes conglomerados urbanos e é reflexo de políticas públicas que ao longo dos anos objetivaram substancialmente o aumento da infraestrutura viária e o incentivo ao uso do automóvel. O aumento da capacidade viária muitas vezes não fornece, a longo prazo, soluções eficientes para o congestionamento do tráfego, mas acabam promovendo o uso cada vez maior de automóveis (Oberholzer-Gee e Weck-Hannemann, 2002). Desta forma, resta evidente que ações que objetivem o gerenciamento sobre a demanda são fundamentais para a formulação de uma política pública efetiva, que seja capaz de combater o problema da mobilidade nas grandes cidades. Dentre estas ações, a taxação do congestionamento tem recebido especial atenção dos economistas para resolver os problemas do tráfego urbano. A introdução de cobrança para gerenciar a demanda de automóveis no centro das cidades é reconhecida como um importante instrumento de controle. Para Lindsey (2012), caso se considere os argumentos propostos por economistas sobre a questão do congestionamento e a taxação como uma medida para combatê-lo, o objetivo da eficiência sempre vem à frente e em muitos casos, associados com preços baseados nos custos marginais sociais. Dentro deste conceito, assume-se que cada cidadão mude seu comportamento considerando sua adaptação à nova situação. Entretanto, políticos de muitas cidades têm considerado essa medida como inapropriada e politicamente não aceitável. Isso se deve ao fato de que os políticos visualizam dimensões que os economistas não estão considerando (Viegas, 2001). O objetivo deste artigo é verificar a adequabilidade da política de taxação do congestionamento para as cidades brasileiras, buscando inferir, através da análise de experiências internacionais já consolidadas, quais os usuais impactos no padrão de viagens decorrentes da sua implantação. Após esta breve introdução, apresenta-se na Seção 2 o arcabouço teórico que trata dos conceitos de gerenciamento da demanda por viagens. Posteriormente, a Seção 3 trata dos principais exemplos de cidades que implementaram a taxa de congestionamento como medida de sucesso no gerenciamento de tráfego: Londres (Inglaterra), Cingapura e Estocolmo (Suécia). Na Seção 4 são abordados os recentes avanços tecnológicos internacionais no processo de cobrança do usuário que permitem maior agilidade e menor evasão tarifária. A Seção 5 traz uma análise dos desafios prospectados para a implantação da taxação do congestionamento no contexto brasileiro, tomando por base os casos anteriormente analisados e as possibilidades abertas com a promulgação da Lei de Mobilidade Urbana em 2012. Por fim, a Seção 6 levanta as considerações finais dos autores a partir das análises elaboradas ao longo do estudo. 2. GERENCIAMENTO DA DEMANDA POR VIAGENS O conceito de Travel Demand Management (TDM) compreende um conjunto diversificado de estratégias de transporte que promovem coletivamente o uso eficaz, eficiente
  • 3. e equitativo dos recursos e facilidades existentes e renováveis. Segundo Rivasplata (2013), ao invés de aplicar a prática tradicional de prover e ampliar a oferta de espaço viário para atender automóveis, o TDM defende o uso de alternativas com base na hierarquização de prioridades para o pedestre, a bicicleta e o transporte público, respectivamente. Além do incentivo ao uso dos modais de transporte coletivos e os não motorizados, a estratégia do TDM também abarca uma série de medidas de gerenciamento da demanda que induzem os usuários a não concentrarem seus deslocamentos no espaço e no tempo (Linsey, 2012). Dispersão do fator de pico, redução da demanda por transporte individual e restrições ao uso do automóvel são exemplos de objetivos a serem alcançados pelo uso do TDM. Uma das medidas que trabalha com estes três objetivos é a taxação do congestionamento, muitas vezes traduzidas para o português como pedágio urbano. Conceitualmente, a taxação do congestionamento é uma política de cobrança aos usuários que busca cobrir os custos marginais do uso da rodovia. Tem por objetivo gerenciar a demanda em situações onde os recursos para investimento na oferta de espaço viário são limitados. Devido ao seu papel de gerenciamento de demanda, é também citado na literatura internacional como taxa de congestionamento, principalmente nos casos onde a cobrança é feita nos períodos de pico (Button, 2004; Rivasplata, 2013). A análise de Viegas (2001) mostra que as mudanças de comportamento causadas pela taxa de congestionamento devem ser graduais, de forma a não causar mudanças bruscas no comportamento das pessoas. O que deve ser perseguido, enquanto considerado o objetivo mais visível de eficácia, é o fato de se fazer progressos na questão do congestionamento. A perspectiva econômica de cobrança dos usuários pelas externalidades que estes geram pelo uso da via vem ganhando força nos últimos anos. Costa (2007) afirma que o uso da via por condutores de automóveis implica em custos que são internalizados pela sociedade, tais como os congestionamentos que impõem atrasos a todos os usuários em seus deslocamentos, a emissão de poluentes na atmosfera e os acidentes resultantes da interação entre veículos e usuários na corrente de tráfego. De acordo com Senna e Michel (2007) os custos de congestionamentos provem da redução de velocidade imposta aos veículos que trafegam na via pela entrada de veículos adicionais. A partir da geração deste custo, considera-se que os demais usuários estariam dispostos a cobrir os custos de oportunidade de tempo e combustível adicional para que um veículo adicional não utilize a via. Partindo de uma análise econômica, o fluxo de tráfego ótimo ocorreria quando os custos do tráfego adicional e a demanda fossem iguais. No entanto, o usuário que entra na via considera a curva de custo marginal privado ao invés da curva de custo marginal social para o novo usuário e os demais. Desta forma, o peso morto do excesso de congestionamento de tráfego é representado pela diferença entre estas duas curvas.
  • 4. Figura 1. Curva de custo marginal Fonte: Adaptado de Button (2004). A taxa de congestionamento tem um enfoque central na regulação da oferta do espaço viário aos usuários de automóveis. Economicamente, este sistema objetiva a internalização dos custos externos resultantes do uso da via e, portanto, deve ser tratado de maneira integrada aos diversos mecanismos de gerenciamento de tráfego (Sabounchi et. al., 2014). Outra questão que merece atenção é a aceitabilidade da medida pela população, de forma que as pessoas acreditem que esta questão está sendo tratada corretamente e de forma justa, considerando a multiplicidade de interesses presentes na sociedade. Nesse aspecto, duas questões são fundamentais: a equidade e a prestação de contas à sociedade (Viegas, 2001). A questão da equidade envolve tanto uma equidade longitudinal quanto a uma equidade vertical. O conceito de equidade longitudinal está ligado ao fato da resistência das pessoas em pagar por algo anteriormente disponível de graça. Já a equidade vertical está associada à questão da proteção daqueles que possuem situação menos favorável. No tangente à responsabilidade deve-se prever uma prestação de contas completa, especialmente sobre o que está sendo feito com os recursos financeiros arrecadados. É necessário que a aplicação dos recursos esteja em sintonia com os anseios da sociedade voltados a questão da mobilidade urbana e não sirvam apenas como um subsídio cruzado a outros setores. 3. EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS A implantação prática da taxa de congestionamento ainda se resume a poucas cidades do mundo. Apesar de soluções para a proteção de centros históricos já existirem a bastante tempo, o sistema de cobrança regulado e organizado com o objetivo de regulação do tráfego é recente. Cingapura em 1998, Londres em 2003 e Estocolmo em 2006 foram os sistemas primeiramente implantados de forma organizada e já apresentam resultados e análises consolidadas sobre sua operação. Recentemente, Milão (2008) e Gotemburgo(2013) também implantaram sistemas de taxação do congestionamento na área central com o objetivo de regular o uso do automóvel nesses espaços. Outras cidades como Copenhagen, Budapeste,
  • 5. Jacarta e São Francisco também estão considerando e planejando a implantação de zonas de taxação do congestionamento. Embora algumas ainda sejam recentes e, portanto, de difícil análise quanto aos impactos advindos desta política, outras experiências já estão consolidadas e servem de parâmetro para estudos reais sobre o tema. Por terem sido implantados há mais tempo e por terem se adaptado ao longo dos anos, os casos de Londres, Cingapura e Estocolmo se destacam na literatura sobre o tema. No entanto, a política de taxação do congestionamento apresenta também diversos estudos teóricos relativos aos conceitos econômicos envolvidos nesta estratégia. 3.1. O exemplo de Londres: Congestion Charge Zone Londres foi uma das primeiras capitais a implantar um esquema de taxação do congestionamento na região central da cidade. Constantes níveis de saturação do tráfego na principal zona de comércio fizeram com que os gestores começassem a buscar novas soluções que evitassem os congestionamentos nessa área. Aliada à cultura europeia de preservação do patrimônio arquitetônico, a indisponibilidade de espaço viário nessa região exigia dos planejadores novas formas de gerenciar o tráfego no centro da cidade. Surge então a proposta de criação de uma zona que delimitasse o centro, de modo que seria necessário o pagamento de uma taxa para o acesso a essa região através de veículos particulares (Santos, 2004). Figura 2. Área de Abrangência da Congestion Charge Zone (CCZ) em Londres. Fonte: Transport for London (TfL)
  • 6. Um estudo elaborado pelo programa de pesquisa London Congestion concluiu em 1995 que a introdução de uma zona de cobrança traria benefícios econômicos a médio e longo prazo para a cidade. Este estudo serviu de base para o plano de campanha do candidato Ken Livingstone à prefeitura de Londres no ano de 2000. Com sua eleição, a agência de planejamento de transportes, Transport for London (TfL) é chamada a elaborar uma série de estudos que definissem a localização e a política tarifária a ser implantada no programa. É então implantada em 2003 a Congestion Charge Zone (CCZ). Esta medida fez parte de uma série de políticas implantadas pela prefeitura na época com o objetivo de melhorar o transporte público, fiscalizar os estacionamentos e gerenciar a demanda de automóveis nas áreas centrais da cidade. O relatório da TfL de junho de 2007 aponta que o número de veículos tributáveis que entraram na zona havia reduzido em 30%, enquanto houve um aumento geral no número de táxis, ônibus e bicicletas. Também o perfil diário de tráfego de fluxos havia mudado, com menor tráfego após as 9h30. O nível global de tráfego na CCZ em 2006 foi 16% menor do que os níveis anteriores à cobrança. Em algumas das vias próximas a CCZ o tráfego aumentou um pouco, mas os congestionamentos e atrasos foram praticamente inalterados em relação aos níveis de 2002. Após a introdução da extensão leste em 2007, o volume de tráfego reduziu entre 10 e 15% na zona estendida. 3.2. O pioneirismo de Cingapura: restrição da propriedade associada à restrição de uso Em Cingapura a introdução da taxa de congestionamento foi um mecanismo de uma série de políticas de gerenciamento de tráfego implantadas desde 1970, em função das restrições do país de disponibilidade de espaço e a necessidade de competitividade econômica. Um aspecto chave da gestão da demanda em Cingapura é a restrição de propriedade do veículo, seja por meio da imposição de altos custos de propriedade ou restrição do crescimento real da população de automóveis. Além de impedimentos fiscais, o fornecimento de automóveis foi regulamentado desde 1990, quando um sistema de cotas de veículos foi introduzido no país. Em seguida, os encargos relacionados com o uso, tais como impostos sobre os combustíveis (50% do preço de venda final) e altas taxas de estacionamento são utilizadas pelas autoridades públicas para restringir o uso do automóvel. Em paralelo com este espectro de medidas de custos rodoviários, o governo tem investido pesadamente em transporte público e implementou um sistema de park-and-ride, proporcionando aos usuários de automóveis uma alternativa real para alternar entre os modos de viagem. Raux et al (2012) colocam que, em resumo, a estratégia urbana de transporte de Cingapura permitiu que os usuários tenham opções de modais coletivos e, como resultado, apesar de ter uma das maiores rendas per capita na Ásia, somente 32% das famílias de Cingapura tinha a propriedade de algum veículo em 2010 A taxa de congestionamento de Cingapura foi formulada pela primeira vez e projetada em 1973, sob a liderança de um elevado nível comitê interministerial, que recomendou políticas e medidas para melhorar a situação do transporte urbano na época. No entanto, o esquema de cobrança foi implementado somente após um diálogo de um ano com o público e algumas modificações terem sido feitas com base no comportamento de resposta dos
  • 7. usuários. A taxa de congestionamento foi divulgada ao público como parte de um pacote global de medidas de tarifação rodoviária e melhorias de transporte público, o que ajudou a ganhar o apoio da população. Figura 3. Pontos de controle na área central de Cingapura. Fonte: Land Transport Authority (LTA). 3.3. A visão sustentável de Estocolmo: ganhos ambientais com taxa de congestionamento Em Estocolmo os níveis de congestionamento antes da implantação da taxação geravam um debate amplo na população, principalmente nas áreas periféricas da cidade de Estocolmo, onde os moradores que viviam fora dos pontos de controle, mas trabalhavam no centro da cidade, argumentavam que eles seriam mais afetados pela medida que os demais. Para Jansson (2010), o debate seguia razões políticas que haviam de fundo na proposta, onde alguns grupos argumentavam que a implantação da taxa de congestionamento seria simplesmente uma forma de punir os moradores de Estocolmo dentro do sistema político sueco centralizado. Nesse contexto, um período experimental de seis meses foi implantado entre janeiro de 2006 e julho de 2006. Além do reconhecimento óptico de placas, transponders foram utilizados para identificar os veículos, e optou-se por utilizar uma identificação prévia que permitisse o débito direto para o pagamento do imposto. Börjesson et al (2012) indicam que o custo de passagem no cordão em dias úteis é de € 2 no período de pico (7:30 - 8:30 e 16:00 - 17:30), € 1,5 durante os 30 minutos antes e após os período de pico e € 1 nas demais horas do dia entre 6:30 e 18:30. A cobrança é feita quando o usuário cruza o cordão em ambos os sentidos, o que significa um custo diário de € 4 para ida e volta nos horários de pico. Apesar de a cobrança ser feita por passagem, o custo máximo diário por veículo é de € 6.
  • 8. Figura 4. Pontos de controle na área central de Estocolmo Fonte: Swedish Road Administration (SRA) 3.4. Ganhos e características de cada sistema Os resultados apresentados na Tabela 1 mostram que a política de taxação do congestionamento tem resultados expressivos na redução do uso do automóvel e, quando associado a medidas de qualificação do transporte coletivo, acabam transferindo usuários daquele para este. Tabela 1: Resumo das características dos sistemas de Londres, Cingapura e Estocolmo. Elaboração própria. Fonte: Santos (2004), Raux et al (2012) e Börjesson et al (2012).
  • 9. Outra análise possível trata do aumento do número de automóveis com tecnologia ambientalmente mais sustentável, como no caso de Estocolmo. A partir de uma maior taxação sobre proprietários de automóveis mais antigos e com maior número de emissão de poluentes, os usuários migraram para veículos mais “limpos”. Esta medida mostra que a política de taxação do congestionamento pode também associar-se a objetivos ambientais. No entanto, a simples migração de veículos antigos para veículos com menores índices de emissão não corresponde diretamente a uma redução do uso do automóvel nas áreas centrais. Pode-se notar isto no dado que mostra que houve uma redução de apenas 9% no volume de tráfego em Estocolmo após a implantação, enquanto nas outras duas cidades esta redução foi maior. 4. AVANÇOS NA TECNOLOGIA DE COBRANÇA O desenvolvimento de novos métodos que permitem uma fiscalização mais ampla e automatizada tem permitido a implantação de sistemas mais robustos, com baixos índices de evasão e que não interfiram consideravelmente no fluxo do tráfego. Senna e Michel (2007) mostram que somente um sistema de cobrança eletrônica é capaz de superar os elevados custos de transação entre os usuários. Os sistemas Closed-Circuit Television (CCTV) com reconhecimento de placas tem sido largamente implantados na última década ao redor do mundo. Geralmente, sua aplicação tem servido para controle de veículos com pendências fiscais ou infrações de trânsito junto aos órgãos de trânsito. Nos esquemas de taxação do congestionamento, esta tecnologia permite que, ao passar no ponto de controle da zona pré-estabelecido, o veículo seja identificado pela placa e, através de um cadastro dos condutores ou proprietário ou, em alguns casos mais avançados, debitados diretamente da sua conta de crédito. Em Estocolmo a tecnologia aplicada foi a de câmeras de infravermelho que detectam os emissores instalados no veículo. A taxa de erro desta tecnologia, assim como os CCTV, é baixa. No entanto, os emissores instalados podem ser danificados pelos proprietários, gerando possibilidades de burlar os sistemas. Segundo Jansson (2010), este não tem sido um problema em Estocolmo, uma vez que o sistema de taxa de congestionamento tem tido maior aceitação na população com o passar dos anos. 5. DESAFIOS NO CONTEXTO DAS CIDADES BRASILEIRAS Embora nenhum esquema tradicional de taxação do congestionamento tenha sido implantado na América Latina, várias cidades têm discutido a gestão do congestionamento. Algumas cidades da região, incluindo Bogotá, Medellín, Cidade do México, La Paz, Quito, Santiago e São Paulo, tentam aliviar o congestionamento por meio de restrições sobre veículos (Rivasplata, 2013). Em todas essas cidades, muitos cidadãos de alta renda optam por comprar um segundo veículo, dobrando o seu nível de acesso à cidade. Na Cidade do México e em Bogotá esse padrão tem sido particularmente evidente e é uma razão chave pela qual alguns especialistas nestas cidades se voltaram para outros esquemas para reduzir o congestionamento de tráfego.
  • 10. Mussone et al (2014) argumentam que a taxa de congestionamento é uma das formas mais eficazes de restringir o acesso às áreas urbanas fortemente congestionadas. Ele pode efetivamente introduzir um mecanismo de preços para limitar a entrada de veículos e gerar receitas para cobrir os custos administrativos e investimentos em transportes alternativos. Para Rivasplata (2013), isso não quer dizer que não existem sérias barreiras para a adoção um esquema de taxa de congestionamento, particularmente na América Latina, onde rendimentos são mais baixos e os recursos são mais escassos do que na Europa. Pelo que se pode observar dos exemplos analisados, a taxa de congestionamento pode ser utilizada como uma medida adequada nas grandes cidades brasileiras. A sanção da Lei Federal nº. 12.587 de 2003, também conhecida como a Lei da Mobilidade Urbana, autoriza a cobrança de tributos pelo uso da infraestrutura urbana. A Lei da Mobilidade traz que os entes federativos brasileiros poderão utilizar como instrumentos de gestão do sistema de transporte e da mobilidade urbana aplicação de tributos sobre modos e serviços de transporte urbano pela utilização da infraestrutura urbana. Tal medida, conforme a Lei, visa desestimular o uso de determinados modais e serviços e vincula a receita à aplicação exclusiva em infraestrutura urbana e no financiamento do subsídio público da tarifa de transporte público (BRASIL, 2012). Os maiores desafios para a implantação nas grandes cidades brasileiras provavelmente se assemelham com aqueles enfrentados pelas demais cidades onde a taxa de congestionamento foi implementada. A questão da aceitabilidade é o desafio fundamental para que a medida não tenha grande resistência da população. Como principais impactos esperados na mudança do padrão das viagens estão a redução das viagens, a troca de modal e a alteração dos trajetos utilizados pelos veículos, além da alteração dos horários em que as pessoas utilizam a infraestrutura urbana. A redução das viagens se dá por conta da própria substituição do modal utilizado, uma vez que a imposição de tributo por conta da utilização do espaço viário tende a levar as pessoas a optar por modais como o ônibus ao invés do automóvel. Além disso, Need (2005) afirma que as pessoas tenderão escolher trajetos em que não há imposição de tributo por sua utilização, desta forma tornando mais distribuída a utilização do espaço urbano. Caso a taxação se dê nos horários de pico, isto terá impacto direto na rotina das pessoas. As pessoas que tenham a opção de trabalhar ou estudar, mais cedo ou mais tarde, provavelmente o façam se forem usuários cativos de automóveis. Como benefícios esperados pela medida, pode-se esperar a redução dos níveis de congestionamento, por conta das mudanças já citadas sobre a mudança no padrão de viagens, e um aumento nas receitas para o investimento em infraestrutura e subsídios para o transporte coletivo. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS O conceito de fundo da taxa de congestionamento é derivado da teoria econômica da eficiência e das externalidades, que afirma que as pessoas tomam decisões socialmente eficientes, considerando plenamente os custos e benefícios sociais. Os estudos de casos como os de Londres, Cingapura e Estocolmo demonstraram que a taxa de congestionamento se porta como um eficiente instrumento de gerenciamento de
  • 11. demanda. Além disso, demonstraram que os rendimentos da taxação podem servir como uma importante fonte de receita para outros programas de transportes. Foi exposto que para que a medida seja aceita pela população, torna-se importante que haja preocupação tanto pela equidade da medida, quanto por uma prestação de contas adequada a população. Além disso, ficou caracterizado que apesar das preocupações com a equidade, há evidências de que, em alguns casos, a população está pronta para aceitar a taxa de congestionamento. Analisou-se uma possível implantação da taxa de congestionamento no Brasil. Demonstrou-se que a medida está contemplada desde 2012 pela legislação federal, através da sanção da Lei da Mobilidade Urbana. Foi citado que tal medida vincula a receita à aplicação em infraestrutura urbana destinada ao transporte público coletivo e ao transporte não motorizado e ao financiamento do subsídio público da tarifa de transporte público. Por fim, apontou-se os principais impactos esperados na mudança do padrão das viagens. Entre eles estão a redução das viagens, a troca de modal e a alteração dos trajetos utilizados pelos veículos, além da alteração dos horários em que as pessoas utilizam a infraestrutura urbana. Como principais benefícios, citou-se uma redução dos níveis de congestionamento e um aumento nas receitas para o investimento em infraestrutura, e subsídios para o transporte coletivo. Como sugestões para trabalhos futuros, pode-se sugerir pesquisas voltadas a questão da aceitabilidade da medida, especialmente destinada aos proprietários e usuários de automóveis, bem como a tecnologia disponível a ser utilizada nas cidades brasileiras na implantação da taxa de congestionamento. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem o apoio financeiro do CNPq, da CAPES e do Lastran/UFRGS. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Basso, L. J. e S. R. Jara-Díaz (2012) Integrating congestion pricing, transit subsidies and mode choice. Transportations Research Part A: Policy and Practice, 46 (6), 357-383. BRASIL (2012). Lei Federal nº. 12.587. República Federativa do Brasil, Brasília, DF. Button, K. (2004). The rationale for road pricing: standard theory and latest advances. Research in Transportation Economics, 9, 3-25. Costa, F. F. (2007). O pedágio urbano como instrumento de regulação do espaço viário e financiamento do sistema de transportes. In Anais do XVI Congresso Brasileiro de Transporte e Trânsito. Associação Nacional dos Transportes Públicos. Maceió, AL. Börjesson, M.; J. Eliasson; M. B. Hugosson e K. Brundell-Freij (2012) The Stockholm congestion charges- 5years on: effects, acceptability and lessons learnt. Transport Policy, 20 (7), 1-12. Jansson, J. O. (2010) Road pricing and parking policy. Research in Transportation Economics, 29 (1), 346-353.
  • 12. Lindsey, R. (2012). Road pricing and investment. Economics of Transportation, 1, 49-63. Mussone, L.; S. Grant-Muller e J. Laird (2014) Sensitivity analysis of traffic congestion costs in a network under a charging policy. Case Studies on Transport Policy. Disponível em: <http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2213624X1400011X#>. Acesso em 30 de abril de 2014. Need, Y. (2005). Public acceptance of pricing schemes for the netherlands. In International Perspectives on Road Pricing. Report of the Committee for the International Symposium on Road Pricing. Transportation Research Board. Key Biscane, Florida. Oberholzer-Gee, F. e H. Weck-Hannemann (2002) Pricing road use: politic-economics and fairness considerations. Transportation Research Part D: Transport and Enviroment, 7 (5), 357-371. Raux, C.; S. Souche e D. Pons (2012) The efficiency of congestion charging: some lessons from cost-benefit analysis. Research in Transportation Economics, 36 (1), 85-92. Rivasplata, C. R. (2013). Congestion pricing for latin america: prospects and constraints. Research in Transport Economics, v. 40, p. 56-65. Sabounchi, N. S.; K. P. Triantis; S. Sarangi e S. Liu (2014) Dinamic simulation modeling and policy analysis of an area-based congestion pricing scheme for a transportation socioeconomic system. Transportations Research Part A: Policy and Practice, 59, 357-383. Santos, G. (2004). Urban road pricing in the U.K. Research in Transportation Economics, v. 9, p. 251-282. Senna, L. A. S. e F. D. Michel (2007) Rodovias auto-sustentadas: o desafio do século XXI. Editora CLA, São Paulo, SP. Viegas, J. M. (2001). Making urban road pricing acceptable and effective: searching for quality and equity in urban mobility. Transport Policy, 8 (4), 289-294.