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Ana Esteves
“O investimento vai
ser um importante
driver no futuro”
Interface Banca & Seguros: Como caracteriza o
comportamento da economia brasileira nos últimos
anos?
R: Na minha visão, a economia brasileira é um
exemplo de rigor macroeconómico. Em 15 anos, o
Brasil conseguiu baixar a inflação de 250% ao ano para
4.3%, implementou um programa de privatizações de
cerca de 105 milhões de USD, reformulou o sistema
financeiro, deixou flutuar o câmbio e melhorou o perfil
de endividamento da economia.As vulnerabilidades
externas, em tempos um dos riscos mais relevantes
do país, são, hoje em dia, praticamente imateriais,
consequência da acumulação de reservas internacionais
e de uma política de diminuição da dívida externa e
melhoria do perfil de endividamento público global.
Para além disso, as políticas fiscal e monetária têm-se
baseado num sistema de objectivos, que disciplinou
a sua implementação e aumentou a transparência
da tomada de decisão. Iniciativas como a Lei da
Responsabilidade Fiscal, 10 anos de câmbios flutuantes e
inflation targeting são marcos relevantes.A redução das taxas
de juro de níveis superiores a 20% para os actuais 8.75%
reflecte um enquadramento bastante mais favorável para
quem toma decisões de poupança e investimento, com
consequências evidentes no crescimento económico.
Para capitalizar o potencial intrínseco do país, em 2007
foi anunciado o Programa de Aceleração do Crescimento,
que contemplou investimentos em infra-estruturas,
estímulo ao crédito e financiamento, melhoria do
ambiente de investimento, medidas de desoneração e
aperfeiçoamento fiscal e medidas fiscais de longo prazo.
IB&S: De que modo é que estas medidas contribuíram
para um maior desenvolvimento ao nível social?
R: Este enquadramento, a par da implementação de
programas específicos, como por exemplo, a Bolsa
Escola e Bolsa Família, traduziu-se na diminuição da
desigualdade, no aumento da escolaridade e no peso
da classe média na economia. Sabe-se que, nos últimos
4 anos, mais de 10% dos brasileiros entraram na classe
média.A S&P foi a primeira agência de rating a classificar
o Brasil de investment grade, em Abril de 2008, já em plena
crise internacional.
IB&S: Quais os sectores que mais têm acompanhado
esse crescimento?
R: A resposta mais óbvia reporta-se aos sectores
relacionados com commodities, nos quais o Brasil é
rico. Sectores exportadores, correlacionados com o
desenvolvimento económico, pro-cíclicos, beneficiaram
de um aumento da procura externa de outros mercados
emergentes, como a China e a Índia e da procura
interna. Isso é evidente na performance da indústria,
especialmente a transformadora e a construção civil. Nos
serviços, o comércio e a área financeira foram os sectores
com maior destaque.
IB&S: Neste momento, quais são os pontos fracos e
mais fortes da economia brasileira?
R: O Brasil é dotado de valiosos recursos naturais,
de uma população numerosa, relativamente jovem e
uma classe média com peso crescente, que o torna
um mercado com grande potencial. Os níveis de
investimento são bastante baixos, quando comparados
com outros países latino-americanos, o que significa
que ainda há muito para fazer em várias áreas. Por
outro lado, os baixos níveis de investimento são
resultado de algumas fraquezas do tecido económico:
o pesado e complexo sistema burocrático e fiscal e o
relevante peso do Estado na economia. Como se sabe, os
organismos estatais ainda têm um papel de destaque no
financiamento de vários sectores de actividade, apesar
do aumento da penetração do crédito geral na economia
nos últimos anos.Tudo isto traduz-se em níveis de taxas
de juro reais bastante elevadas quando comparadas com
outros países no mesmo estádio de desenvolvimento. Isso
chama a atenção para outro ponto forte da economia
brasileira: se as taxas de juro reais são mais altas, também
o retorno dos activos financeiros é mais elevado, o que
atrai investidores.
IB&S: O Brasil tem sido um dos países que mais
tem resistido à crise económica.A que se deve esse
comportamento?
R: A principal razão é que o Brasil, nos últimos anos,
tem mantido um enquadramento macroeconómico
estável e focado na minimização das vulnerabilidades
externas. Ou seja, oTesouro tem seguido uma política
de redução da dívida externa, acumulação de reservas
em moeda estrangeira e alongamento da maturidade da
dívida, com o objectivo de, progressivamente, diminuir
o risco de refinanciamento de curto prazo, a dependência
do exterior e, consequentemente, o risco cambial.Ao
contrário do que se possa pensar, a economia brasileira
é relativamente fechada.As exportações representam
apenas 14% do PIB, um valor muito semelhante ao das
importações. O perfil exportador do país é bastante
diversificado geograficamente, com um peso crescente
da China, que actualmente é um dos motores de
crescimento do mundo, em detrimento dos países
desenvolvidos, mais atingidos pela recessão.A penetração
do crédito na economia é bastante inferior a muitos
mercados emergentes, apesar dos progressos feitos, e
a dependência do financiamento internacional ainda
menor, pelo que o efeito das restrições de liquidez teve
menos impacto.
IB&S: Como é que a banca brasileira resistiu à
falência do Lehman Brothers?
R: A falência do Lehman teve um impacto brutal nos
mercados financeiros globais e o Brasil, apesar dos
factores que referi, também sofreu consequências,
mesmo que temporariamente.A turbulência
internacional afectou principalmente o investimento
em activos financeiros, e no segundo semestre de
2008, verificou-se a saída de capitais dos mercados
locais, causando uma depreciação do real, com um
impacto bastante expressivo, visto que a moeda
brasileira desvalorizou cerca de 60%. Na minha
opinião, o resultado da tomada de medidas a nível
internacional ter sido bastante rápida, e o facto do
Brasil ter os “buffers” que referi, contribuiu para que as
consequências não fossem tão graves quanto poderiam
ter sido.
IB&S: Qual o papel das autoridades brasileiras nesta
matéria?
R: As autoridades brasileiras também foram bastante
pró-activas e tomaram uma série de iniciativas de
estímulo à economia e ao sistema financeiro. O funding
interbancário no Brasil ficou bastante restrito, o que
afectou mais os bancos com uma base de depósitos
pequena em relação aos activos. No entanto, o nível
de depósitos no sistema é bastante confortável,
consequência de elevados níveis de reservas quando
comparados com os países desenvolvidos.Tal
como no caso do sector público, a dependência do
financiamento internacional é muito baixa e os bancos
brasileiros, em geral, estão bem capitalizados – o rácio
de Basileia mínimo exigido pelo Banco do Brasil é de
11% contra os tradicionais 8% - e a exposição a activos
tóxicos dos bancos brasileiros imaterial.
IB&S: Na sua opinião, quais são os sectores
estratégicos para investir no Brasil?
R: Acredito que os sectores mais relacionados com a
procura interna são os que mais ganharão no futuro.
A longo prazo, a convergência de taxas de juro reais,
o desenvolvimento económico, associado a factores
sociais e demográficos favoráveis, tornam o Brasil
um mercado com bastante potencial, pelo que o
investimento vai ser um importante driver no futuro.
IB&S: Paul Krugman disse recentemente que há
um risco de bolha no Brasil e que iria retirar os
investimentos do país.Acredita que isso poderá colocar
em causa alguns investimentos internacionais?
R: No actual enquadramento de taxas de juro e depois
de termos assistido à recuperação do mercado accionista
em 2009, é compreensível que se tente antecipar onde
aparecerá a nova bolha. Paul Krugman considera que
existe uma bolha nos mercados emergentes, outros
analistas argumentam que existe uma bolha especulativa
nos treasuries, outros ainda crêem que existe uma bolha
no imobiliário chinês, ou nos preços das commodities,
apenas para dar alguns exemplos. No entanto, em
qualquer dos casos também há um conjunto vasto de
argumentos que podem justificar o valor actual desses
activos. Para mim, se eu acredito que o Brasil vai crescer
6% em 2010 e a taxas perto de 5% nos próximos 10
anos, seria inconsistente defender a existência de uma
bolha.
IB&S: Como é que este momento da economia
brasileira pode reflectir-se na banca?
R: Em termos de sectores relacionados com a procura
interna, considero o investimento o mais importante
driver de crescimento, e penso que os bancos, que são a
principal fonte de financiamento da economia, deverão
ser positivamente influenciados. Em termos de produtos
de crédito ainda há bastante para fazer. Por exemplo
o crédito hipotecário representa menos de 1.5% do
crédito concedido a clientes de retalho. Numa escala
maior, os novos projectos relacionados com os eventos
desportivos – o campeonato do mundo de futebol e
os jogos olímpicos - e com a exploração de recursos
naturais, também deverão ser influências positivas no
sistema bancário.
IB&S: Quais são os principais desafios que a banca
brasileira terá de atravessar este ano?
R: O aumento da concorrência deverá continuar a
ser o maior desafio que os bancos brasileiros deverão
enfrentar. O sistema financeiro é bastante concentrado
em termos de activos, nas maiores instituições, e a
situação económica favorável que o país atravessa resulta
no aumento da atractividade do mercado a bancos
estrangeiros.Assim, manter a margem de intermediação
financeira pode ser bastante difícil porque apesar do
Banco Central se preparar para subir taxas, para além de
se esperar um crescimento forte do crédito (cerca de
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  • 1. Ana Esteves “O investimento vai ser um importante driver no futuro” Interface Banca & Seguros: Como caracteriza o comportamento da economia brasileira nos últimos anos? R: Na minha visão, a economia brasileira é um exemplo de rigor macroeconómico. Em 15 anos, o Brasil conseguiu baixar a inflação de 250% ao ano para 4.3%, implementou um programa de privatizações de cerca de 105 milhões de USD, reformulou o sistema financeiro, deixou flutuar o câmbio e melhorou o perfil de endividamento da economia.As vulnerabilidades externas, em tempos um dos riscos mais relevantes do país, são, hoje em dia, praticamente imateriais, consequência da acumulação de reservas internacionais e de uma política de diminuição da dívida externa e melhoria do perfil de endividamento público global. Para além disso, as políticas fiscal e monetária têm-se baseado num sistema de objectivos, que disciplinou a sua implementação e aumentou a transparência da tomada de decisão. Iniciativas como a Lei da Responsabilidade Fiscal, 10 anos de câmbios flutuantes e inflation targeting são marcos relevantes.A redução das taxas de juro de níveis superiores a 20% para os actuais 8.75% reflecte um enquadramento bastante mais favorável para quem toma decisões de poupança e investimento, com consequências evidentes no crescimento económico. Para capitalizar o potencial intrínseco do país, em 2007 foi anunciado o Programa de Aceleração do Crescimento,
  • 2. que contemplou investimentos em infra-estruturas, estímulo ao crédito e financiamento, melhoria do ambiente de investimento, medidas de desoneração e aperfeiçoamento fiscal e medidas fiscais de longo prazo. IB&S: De que modo é que estas medidas contribuíram para um maior desenvolvimento ao nível social? R: Este enquadramento, a par da implementação de programas específicos, como por exemplo, a Bolsa Escola e Bolsa Família, traduziu-se na diminuição da desigualdade, no aumento da escolaridade e no peso da classe média na economia. Sabe-se que, nos últimos 4 anos, mais de 10% dos brasileiros entraram na classe média.A S&P foi a primeira agência de rating a classificar o Brasil de investment grade, em Abril de 2008, já em plena crise internacional. IB&S: Quais os sectores que mais têm acompanhado esse crescimento? R: A resposta mais óbvia reporta-se aos sectores relacionados com commodities, nos quais o Brasil é rico. Sectores exportadores, correlacionados com o desenvolvimento económico, pro-cíclicos, beneficiaram de um aumento da procura externa de outros mercados emergentes, como a China e a Índia e da procura interna. Isso é evidente na performance da indústria, especialmente a transformadora e a construção civil. Nos serviços, o comércio e a área financeira foram os sectores com maior destaque. IB&S: Neste momento, quais são os pontos fracos e mais fortes da economia brasileira? R: O Brasil é dotado de valiosos recursos naturais, de uma população numerosa, relativamente jovem e uma classe média com peso crescente, que o torna um mercado com grande potencial. Os níveis de investimento são bastante baixos, quando comparados com outros países latino-americanos, o que significa que ainda há muito para fazer em várias áreas. Por outro lado, os baixos níveis de investimento são resultado de algumas fraquezas do tecido económico: o pesado e complexo sistema burocrático e fiscal e o relevante peso do Estado na economia. Como se sabe, os organismos estatais ainda têm um papel de destaque no financiamento de vários sectores de actividade, apesar do aumento da penetração do crédito geral na economia nos últimos anos.Tudo isto traduz-se em níveis de taxas de juro reais bastante elevadas quando comparadas com outros países no mesmo estádio de desenvolvimento. Isso chama a atenção para outro ponto forte da economia brasileira: se as taxas de juro reais são mais altas, também o retorno dos activos financeiros é mais elevado, o que atrai investidores. IB&S: O Brasil tem sido um dos países que mais tem resistido à crise económica.A que se deve esse comportamento? R: A principal razão é que o Brasil, nos últimos anos, tem mantido um enquadramento macroeconómico estável e focado na minimização das vulnerabilidades externas. Ou seja, oTesouro tem seguido uma política de redução da dívida externa, acumulação de reservas em moeda estrangeira e alongamento da maturidade da dívida, com o objectivo de, progressivamente, diminuir o risco de refinanciamento de curto prazo, a dependência do exterior e, consequentemente, o risco cambial.Ao contrário do que se possa pensar, a economia brasileira é relativamente fechada.As exportações representam apenas 14% do PIB, um valor muito semelhante ao das importações. O perfil exportador do país é bastante diversificado geograficamente, com um peso crescente da China, que actualmente é um dos motores de crescimento do mundo, em detrimento dos países desenvolvidos, mais atingidos pela recessão.A penetração do crédito na economia é bastante inferior a muitos mercados emergentes, apesar dos progressos feitos, e a dependência do financiamento internacional ainda menor, pelo que o efeito das restrições de liquidez teve menos impacto.
  • 3. IB&S: Como é que a banca brasileira resistiu à falência do Lehman Brothers? R: A falência do Lehman teve um impacto brutal nos mercados financeiros globais e o Brasil, apesar dos factores que referi, também sofreu consequências, mesmo que temporariamente.A turbulência internacional afectou principalmente o investimento em activos financeiros, e no segundo semestre de 2008, verificou-se a saída de capitais dos mercados locais, causando uma depreciação do real, com um impacto bastante expressivo, visto que a moeda brasileira desvalorizou cerca de 60%. Na minha opinião, o resultado da tomada de medidas a nível internacional ter sido bastante rápida, e o facto do Brasil ter os “buffers” que referi, contribuiu para que as consequências não fossem tão graves quanto poderiam ter sido. IB&S: Qual o papel das autoridades brasileiras nesta matéria? R: As autoridades brasileiras também foram bastante pró-activas e tomaram uma série de iniciativas de estímulo à economia e ao sistema financeiro. O funding interbancário no Brasil ficou bastante restrito, o que afectou mais os bancos com uma base de depósitos pequena em relação aos activos. No entanto, o nível de depósitos no sistema é bastante confortável, consequência de elevados níveis de reservas quando comparados com os países desenvolvidos.Tal como no caso do sector público, a dependência do financiamento internacional é muito baixa e os bancos brasileiros, em geral, estão bem capitalizados – o rácio de Basileia mínimo exigido pelo Banco do Brasil é de 11% contra os tradicionais 8% - e a exposição a activos tóxicos dos bancos brasileiros imaterial. IB&S: Na sua opinião, quais são os sectores estratégicos para investir no Brasil? R: Acredito que os sectores mais relacionados com a procura interna são os que mais ganharão no futuro. A longo prazo, a convergência de taxas de juro reais, o desenvolvimento económico, associado a factores sociais e demográficos favoráveis, tornam o Brasil um mercado com bastante potencial, pelo que o investimento vai ser um importante driver no futuro. IB&S: Paul Krugman disse recentemente que há um risco de bolha no Brasil e que iria retirar os investimentos do país.Acredita que isso poderá colocar em causa alguns investimentos internacionais? R: No actual enquadramento de taxas de juro e depois de termos assistido à recuperação do mercado accionista em 2009, é compreensível que se tente antecipar onde aparecerá a nova bolha. Paul Krugman considera que existe uma bolha nos mercados emergentes, outros analistas argumentam que existe uma bolha especulativa nos treasuries, outros ainda crêem que existe uma bolha no imobiliário chinês, ou nos preços das commodities, apenas para dar alguns exemplos. No entanto, em qualquer dos casos também há um conjunto vasto de argumentos que podem justificar o valor actual desses activos. Para mim, se eu acredito que o Brasil vai crescer 6% em 2010 e a taxas perto de 5% nos próximos 10 anos, seria inconsistente defender a existência de uma bolha. IB&S: Como é que este momento da economia brasileira pode reflectir-se na banca? R: Em termos de sectores relacionados com a procura interna, considero o investimento o mais importante driver de crescimento, e penso que os bancos, que são a principal fonte de financiamento da economia, deverão ser positivamente influenciados. Em termos de produtos de crédito ainda há bastante para fazer. Por exemplo o crédito hipotecário representa menos de 1.5% do crédito concedido a clientes de retalho. Numa escala maior, os novos projectos relacionados com os eventos desportivos – o campeonato do mundo de futebol e os jogos olímpicos - e com a exploração de recursos naturais, também deverão ser influências positivas no sistema bancário. IB&S: Quais são os principais desafios que a banca brasileira terá de atravessar este ano? R: O aumento da concorrência deverá continuar a ser o maior desafio que os bancos brasileiros deverão enfrentar. O sistema financeiro é bastante concentrado em termos de activos, nas maiores instituições, e a situação económica favorável que o país atravessa resulta no aumento da atractividade do mercado a bancos estrangeiros.Assim, manter a margem de intermediação financeira pode ser bastante difícil porque apesar do Banco Central se preparar para subir taxas, para além de se esperar um crescimento forte do crédito (cerca de 25%), este deve vir acompanhado de uma compressão nos spreads por efeito da concorrência. x