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CAMPOS DE PRODUÇÃO DA CULTURA E SUAS ARENAS
PÚBLICAS: DISCUSSÕES A PARTIR DE UM ESTUDO NA AMAZÔNIA
BRASILEIRA1
Amarildo Ferreira Júnior2
Silvio Lima Figueiredo3
Resumo: Este artigo apresenta parte de uma discussão na qual tratávamos sobre o que
denominamos como a vida associativa no Campo de Relações no Artesanato de Miriti
de Abaetetuba (Pará), pertencente ao conjunto dos campos de produção da cultura.
Nele, apresentamos como a aplicação de uma abordagem teórica em que se direciona a
pesquisa para a análise das arenas públicas que se formam nos campos de produção da
cultura permitiu-nos constatar que agentes produtores de cultura também são atores que
se dão em espetáculo, e suas práticas não são necessariamente determinadas por um
dualismo entre uma abordagem tradicionalista e outra mercadológica, pois se
movimentam por redes de relações e apresentam fachadas necessárias diante das
situações vivenciadas nos campos de relações e em suas arenas públicas.
Palavras-chave: campos de produção da cultura, arena pública, artesãos de miriti.
1. INTRODUÇÃO
Diz-se que há, na Amazônia brasileira, um isolamento, e, portanto, a
necessidade, pelo menos nas palavras de Adeodato (2015), de se libertar suas
comunidades tradicionais e de se levar até elas maiores e melhores formas de
organização. Cremos estar claro nas palavras do jornalista paulista uma visão que,
apesar da existência de esforços para desfazê-la, ainda é predominante e na qual a
imagem que se faz da região é colorida com superlativos sintéticos e analíticos, quando
não com espelhismos.
Aplicada à totalidade da vida na região, sobretudo aos seus aspectos ambientais
e culturais, é uma visão prenhe de pré-conceitos que desconhecem as idiossincrasias e
vicissitudes do complexo conjunto de habitantes da região, acostumada que está em vê-
la de longe e do alto – o que não significa que necessariamente de fora da região –,
1
Este trabalho apresenta, em grande parte, discussões desenvolvidas na dissertação de mestrado
Entalhadores do efêmero: a vida associativa na criação dos Brinquedos de Miriti de Abaetetuba,
defendida e aprovada no dia 09 jan. 2015, de autoria de Amarildo Ferreira Júnior e orientação do prof. Dr.
Silvio Lima Figueiredo. Estes estudos foram realizados com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior (Capes), por meio de concessão de bolsa de estudo, e do Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que disponibilizou recursos para sua realização no
âmbito do projeto de pesquisa Turismo cultural e patrimonialização: campo de relações, referências
culturais e gestão para visitação.
2
Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da Universidade Federal do Pará (NAEA/UFPA). E-mail:
amarildofjunior@gmail.com.
3
NAEA/UFPA. E-mail: slima@ufpa.br.
como fronteira de recursos a ser apropriados tanto para “desenvolver” a região e junto
dela o restante do país, quanto para serem apreciados nos mais “elevados” círculos da
sociedade brasileira enquanto exemplares do exótico, cujo consumo ou apreciação atesta
um refinamento em seus gostos e preferências, tudo amalgamado em retóricas que mais
nos parecem cantos de sereias.
Quanto à cultura, olham-se os objetos, expressões e manifestações que produz,
alocando-os nos tipos de consumo próprios da contemporaneidade4
, mas pouco se olha
para seus produtores, e, nas vezes em que se dirige a atenção para estes, geralmente se
alterna entre o extremo de folclorizá-los, tornando-os uma sorte de museu vivo, e a
extremidade que lhes aconselha o seguimento quase cego das regras do mercado, seja na
padronização de seus bens culturais, seja no uso de técnicas de organização e gestão
consideradas mais modernas e sofisticadas. Poucos são os que se dispõem a procurar
uma solução entre esses dois extremos, e talvez a contemporaneidade não nos apresente
opções fora desse espaço dos possíveis.
Neste artigo, detemos-nos a apresentar parte de uma discussão desenvolvida em
trabalhos anteriores (FERREIRA JÚNIOR, 2015; FERREIRA JÚNIOR &
FIGUEIREDO, 2014a, FERREIRA JÚNIOR & FIGUEIREDO, 2014b), nos quais
tratávamos sobre o que denominamos como a vida associativa de agentes sociais
pertencentes ao campo de produção cultural de uma forma de expressão da cultura
amazônica5
, os Brinquedos de Miriti de Abaetetuba.
Buscando posicionar nossa discussão em uma abordagem que não esteja
alinhada ao extremo do chamado eixo tradicionalista e tampouco à extremidade
4
García Canclini (1983) afirma que são quatro esses tipos de consumo: o prático, que ocorre no interior
da vida cotidiana; o cerimonial, relacionado a atividades religiosas ou festivas; o suntuário, que serve de
distinção social para setores com alto poder aquisitivo; e o estético ou decorativo. Para esse autor, as lojas
urbanas dispõem os bens culturais de modo a reduzir esses quatro usos a uma combinação dos dois
últimos, e irão diferir entre si pela necessidade de selecionar e de apresentar os objetos para grupos
diversos de consumidores: o de gosto mais ou menos sofisticado, o dos que “adquirem” signos de
distinção ou o dos que apenas desejam levar souvenires.
5
Estabelecer um gentílico para a cultura é uma operação cognitiva que há tempos gera debates e
controvérsias, sobretudo quando nele se encontram indivíduos e grupos de indivíduos que se consideram
os únicos portadores da cultura. No entanto, e apesar de levarmos em conta as considerações daqueles que
veem nessa forma de operar uma forma de velar as contradições provenientes da estratificação social
existente no país (TRAGTENBERG, apud VEIGA, 1978), deixamos as tergiversações sobre a questão
para momentos propícios a sua realização e, ainda assim, optamos por utilizar o termo cultura amazônica,
pois, ao utilizá-lo, não estamos nos referindo a uma cultura amazônica monolítica, mas a um campo
intricado e cheio de contradições internas, inclusive no interior das mesmas camadas sociais. Sendo
assim, tal termo é um constructo (Gebilde) que, embora proveniente da realidade, não é em si uma
realidade imediata, afinal, os elementos que caracterizam manifestações “isoladas” como possuidoras de
traços que a ligam de forma íntima a determinada região não se encontram separados de seus elementos
mais particulares (SIMMEL, 2006). Para discussões que apresentam a complexidade dos elementos que
conformam o que seria uma cultura qualificada como amazônica e quais são suas imbricações, são
importantes os aportes de Figueiredo (1999) e Loureiro (1995).
representada pelo eixo mercadológico6
e seus respectivos discursos (LEITE, 2005),
ambas as perspectivas geradoras de fortes ressonâncias políticas para os agentes
produtores de cultura, pois colocam em jogo os sistemas sociais e simbólicos que
vinculam os bens culturais criados e seus produtores ao mesmo tempo em que gera
riscos para sua inserção econômica (LEITE, 2005; GARCÍA CANCLINI, 1983),
direcionamos a discussão para o estudo das arenas públicas no interior dos campos de
produção da cultura, utilizando como referência para a discussão o Campo de Relações
no Artesanato de Miriti de Abaetetuba.
Com isso, demonstramos que, a partir da abordagem que apresentamos, pode-se
constatar que agentes produtores de cultura, que também são atores que se dão em
espetáculo, não são necessariamente determinados por esse dualismo, pois se
movimentam por redes de relações, em que despontam algumas estruturas consolidadas
nas quais não hesitam em se apoiar quando necessário, e posicionam-se diante do
mercado e do Estado de forma a retraduzir e refratar pressões, apresentando as fachadas
necessárias diante da situação vivenciada no campo de relações e em suas arenas
públicas para a obtenção de apoios e parcerias que reduzam os riscos dos quais se
ressentem.
2. OS CAMPOS DE PRODUÇÃO E DE DIFUSÃO CULTURAL
A noção de campo social é definida negativamente como recusa à alternativa da
interpretação interna e da explicação externa, sendo espaço social de relações objetivas
que rompe, junto com o conceito de habitus, que lhe é anterior, com o paradigma
estruturalista sem, no entanto, dirigir-se à velha filosofia do sujeito ou da consciência ou
à economia clássica e sua ideia de homos economicus (BOURDIEU, 1989).
Desse modo, o campo é o espaço intermediário entre dois polos antagônicos no
qual ocorre um conjunto de relações sociais, estruturadas e estruturantes
simultaneamente, e para onde fluem e se reelaboram sentidos, com a estrutura da
sociedade sendo composta por uma infinidade desses espaços objetivos e que, embora
apresentem homologias estruturais e funcionais entre si e propriedades comuns,
possuem capitais específicos e obedecem a leis sociais mais ou menos específicas,
6
Pautado no discurso da tradição, mas ignorando sua invenção social e histórica (HOBSBAWM, 2006),
os discursos alinhados ao eixo tradicionalista são marcados pela retórica da preservação dos bens
culturais, defendendo a manutenção dos lastros sociais nos quais estes bens são produzidos, muitos deles
em graves situações de exclusão social; quando levado ao extremo, os defensores desse discurso
enxergam uma imutabilidade inexistente nas produções culturais, contribuem para a manutenção de
situações de pobreza e exclusão social, e geram discriminações sociais a parcelas de membros de grupos
que já são discriminados. O segundo eixo, por sua vez, defende a realização de inovações nos bens
culturais, nas técnicas para sua produção e nas formas de organização de seus produtores para inseri-los,
assim, no mercado e com isso assegurar sua reprodutibilidade (LEITE, 2005).
dispondo de uma autonomia parcial mais ou menos acentuada em relação ao
macrocosmo social (BOURDIEU, 2010; 2004).
Logo, e para fazer um paralelo com uma corrente teórica com a qual essa
abordagem dialoga, enquanto uma considerável variedade dos marxismos (AMADEO,
2006; FERNÁNDEZ BUEY, 2006) detém sua análise no que para Bourdieu (2005) é o
campo econômico, considerando-o como principal determinante dos demais campos que
conformam a estrutura da realidade, na famigerada divisão entre estrutura e
superestrutura, levada a graves consequências pelo chamado marxismo vulgar,
Bourdieu (1989) nos apresenta outra perspectiva:
[...] me achei no meio de propriedades gerais, válidas nos diferentes campos,
que a teoria económica tinha assinalado sem delas possuir adequado
fundamento teórico (p. 67).
Tudo leva a crer que a teoria económica, como se espera um dia demonstrar,
em vez de modelo fundador deve ser antes pensada como um caso particular
da teoria dos campos que se constrói pouco a pouco (p. 69).
Dentro desse elevado número de campos sociais que conformam a realidade,
encontram-se aqueles denominados por Bourdieu (2010) como campos de produção e
de difusão de bens culturais, categoria por meio da qual a análise científica das
condições sociais da produção e da recepção de bens simbólicos intensifica sua própria
experiência, e que, segundo este mesmo autor, são campos que, quanto mais autônomos,
mais se (de)marcam por uma lógica propriamente mágica da produção do produtor e do
produto como feitiços (BOURDIEU, 1989), com o ajustamento à demanda nunca sendo
completamente resultante de uma transação consciente entre produtores e consumidores
“[...] e, menos ainda, de uma busca intencional do ajustamento, salvo, talvez, no caso
dos empreendimentos de produção cultural mais heterônomos [...]” (BOURDIEU, 2010,
p. 282).
Esses campos se formam com a autonomização progressiva do sistema de
relações de produção, circulação e consumo de bens simbólicos, e a constituição de um
corpo de agentes correspondentes, colocando-se em oposição a todas as instâncias que
possuam pretensões de legislar no terreno do cultural em nome de poder ou autoridade
que não seja propriamente cultural (BOURDIEU, 2013), e se definindo em relações
objetivas entre diferentes instâncias determinadas pela função que exercem na divisão
do trabalho de produção, de reprodução e de difusão de bens simbólicos (BOURDIEU,
2013). Assim,
O campo de produção propriamente dito deriva sua estrutura específica da
oposição – mais ou menos marcada conforme as esferas da vida intelectual e
artística – que se estabelece entre, de um lado, o campo de produção erudita
enquanto sistema que produz bens culturais (e os instrumentos de apropriação
destes bens) objetivamente destinados (ao menos a curto prazo) a um público
de produtores de bens culturais que também produzem para produtores de
bens culturais e, de outro, o campo da indústria cultural especificamente
organizado com vistas à produção de bens culturais destinados a não-
produtores de bens culturais (“o grande público”) que podem ser recrutados
tanto nas frações não-intelectuais das classes dominantes (“o público
cultivado”) como nas demais classes sociais (BOURDIEU, 2013, p. 105,
cursivas no original).
Aos dois tipos de campos apresentados no excerto acima, acrescentam-se os
campos das culturas populares, “[...] existentes exclusivamente nas formações sociais
desprovidas de instâncias especializadas de produção, de transmissão e de conservação
culturais [...]” (BOURDIEU, 2013, p. 113, grifo nosso).
Esta é uma classificação que nos serve, desde que se tenha ciência de que toda
cultura é fragmentada e contestada internamente, e seus “limites” não são maciços,
sendo fronteiras porosas (KUPER, 2002) por onde são absorvidos e transpirados os
efeitos das relações culturais. Por isso, não se pode considerar os campos de produção
da cultura como isolados ou imutáveis, pois os movimentos que modificam posições e
situações de bens simbólicos lhe são característicos, e todas as formas culturais são
compostas de elementos antagônicos e instáveis próprios dessa luta cultural que assume
as mais diversas formas: incorporação, distorção, resistência, negociação, recuperação
(HALL, 2003).
Assim, o Campo de Relações no Artesanato de Miriti de Abaetetuba, sobre o
qual nos debruçamos em nossa pesquisa, encontra-se entre os campos do terceiro tipo
apresentado, e o analisamos partindo-se sempre das relações dos artesãos que criam,
dentre a ampla variedade de artesanatos elaborados com fibras da palmeira conhecida
popularmente como miriti (Mauritia flexuosa L.f), os denominados Brinquedos de
Miriti de Abaetetuba (Figura 1).
Figura 1 Barcos e canoa de miriti (peças do artesão Manoel Pantoja, conhecido como Soquete)
Fonte: Amarildo Ferreira Júnior (2014).
Tais brinquedos pertencem à categoria artesanato-artístico, tipo de atividade
que se situa entre a arte e a criação extra-artística, pois seu produtor atenta para sua
esteticidade, que se sobressai em suas formas, cores, mecanicidade e textura, mesmo
quando sua finalidade é lúdica ou utilitária (LOUREIRO, 2012). São uma distinta
modalidade de artesanato de miriti característica do município de Abaetetuba (Figura 2),
localizado na mesorregião nordeste do estado do Pará, e integrantes da estrutura do
Círio de Nazaré 7
, do qual são seu maior símbolo artístico-cultural.
Figura 2 Localização de Abaetetuba
FONTE: LAENA/NAEA (2014).
3. ARENAS PÚBLICAS NO INTERIOR DOS CAMPOS DE PRODUÇÃO DA
CULTURA
Este campo social que estamos considerando nesta discussão, para o qual
passaremos a nos referir somente como Campo de Relações, foi considerado
historicamente a partir do início dos anos 2000, quando começou a emergir a estrutura
que atualmente o caracteriza. Deter-se em observar as relações que ocorrem nesse
espaço evitou que a interpretação das práticas aí existentes fosse dada em si mesma e
por si mesma, destacando o universo de práticas intercambiáveis e que a
correspondência entre as posições sociais ocupadas pelos agentes e suas práticas não
constituem relação mecânica e direta (BOURDIEU, 2008).
7
O Círio de Nazaré é uma festa cultural-religiosa que ocorre no segundo domingo de outubro em Belém,
na capital do estado do Pará.
Pelas práticas sociais serem resultantes de uma dialética entre uma situação
objetivamente estruturada vivida no campo social e um habitus8
, as relações sociais nem
sempre permanecem as mesmas e nem sempre possuem a mesma qualidade. Ter
observado a construção social do Campo de Relações permitiu-nos dar ênfase nas
mudanças ocorridas em suas relações e, com isso, colocar a questão referente à
formação de arenas públicas no interior desse campo social e às vias de expansão de
processos políticos, econômicos e identitários dos artesãos de miriti que elas propiciam.
O conceito de arena pública tem a dupla conotação de um lugar de combates
(lieu de combats) e de uma cena de realizações (scène de performances) ante ao público
e no interior de uma ordem pública (GOFFMAN, 2010; CEFAÏ, 2002). Este conceito se
diferencia da noção de campo social, embora esta também destaque a dimensão do
conflito entre as partes na definição da realidade e na imposição da legitimidade, e
apresente a relação entre a temporalidade das interações estratégicas e a “construção” de
problemas sociais, mas numa análise, todavia, estrutural (CEFAÏ, 2002).
Direcionar a análise para as arenas públicas que surgem no interior dos campos
sociais focaliza, sobretudo, as atividades práticas em situações sociais (GOFFMAN,
2010; GLUCKMAN, 1987) que se desenrolam ao redor de um problema público, no
qual atores individuais, organizacionais e institucionais se expressam; discutem e
julgam opiniões; localizam problemas; entram em disputas, polêmicas e controvérsias;
resolvem crises; e assumem compromissos; com a chamada “coisa” pública não sendo
mais um monopólio do Estado (CEFAÏ, 2002).
Procede-se a análise das arenas públicas de forma situacional, demonstrando-se
as formas de experiência, de opinião e de ação pública que não cessam de instaurar-se
(CEFAÏ, 2002). Para Gluckman (1987), uma situação social é o comportamento em
certas ocasiões dos membros de uma comunidade ou grupo social enquanto tais, e nela
se revela o sistema de relações subjacente à estrutura social, às partes da estrutura
social, ao ambiente físico e à vida de seus membros.
Ao propormos a análise também das arenas públicas que se formam nos campos
de produção da cultura, estamos orientados a focalizar o fato público no momento de
sua gestação, um processo que ocorre de forma paralela a uma dinâmica de produção de
atores individuais e coletivos e de suas identidades, “encenadas” em suas intervenções e
8
Princípio gerador e estruturador de práticas e de representações definido como os sistemas de
disposições duráveis originários das estruturas constitutivas de um tipo específico de meio (BOURDIEU,
1983).
suas interações, relançando-se os movimentos que os criam social e culturalmente
(CEFAÏ, 2002).
No caso particular que estamos tomando como referência, as arenas públicas
foram observadas em situações sociais que decorrem de ocasiões sociais compósitas9
,
nas quais os artesãos de miriti apresentam-se e representam-se através de um
emaranhado de estruturas de proximidade, dentre as quais destacaremos as suas
associações civis, em especial a Associação dos Artesãos de Brinquedos e Artesanatos
de Miriti de Abaetetuba (Asamab) e a Associação Arte Miriti de Abaetetuba (Miritong),
fundadas, respectivamente, nos anos de 2003 e 200510
.
Estas associações civis são arenas simbólicas que se inserem, dentro do Campo
de Relações, em arenas simbólicas englobantes ou interorganizacionais, as arenas
públicas. Nas arenas públicas, interagem com outros atores sociais, geralmente, entre os
artesãos de miriti, relacionados ao mercado ou ao planejamento estatal, e seus atores,
por mais que venham a se apresentar como indivíduos, sempre estão se posicionando e
apresentando fachadas que condizem com sua condição de membro de associações civis
(CEFAÏ; MOTA; VEIGA, 2011).
Inseridos em espaços nas arenas públicas, os agentes/atores determinam seu
percurso na ocupação de posições sociais e se engajam e desengajam conforme as
circunstâncias, nem sempre se preocupando com questões ideológicas, mas
permanentemente tratando de assuntos de seu cotidiano sobre os quais não possuem
incessantemente o conhecimento claro de qual regime de ação e de interação estão se
referindo na prática, dado o entrelaçamento de lógicas distintas (CEFAÏ; VEIGA;
MOTA, 2011). Apresentam, nesses espaços, propriedades relacionais, que lhe cabem
apenas a um dado momento, “[...] a partir de sua posição em um espaço social
determinado e em uma dada situação de oferta de bens e práticas possíveis”
9
Termo originário da noção de ocasião social adotada por Goffman (2010). Em nossos estudos, foram
considerados como ocasiões sociais compósitas os eventos-ocasiões mais importantes na demarcação do
ciclo de produção e comercialização dos Brinquedos de Miriti, o MiritiFestival, tipo de festival cultural
que ocorre anualmente em Abaetetuba, e o Círio de Nazaré.
10
Apesar de apresentarem diferenças em suas formas de organização e atuação, uma vez que a Asamab
estrutura-se como uma espécie de entidade de classe, enquanto a Miritong apresenta-se como uma
Organização Não Governamental (ONG), os movimentos que levaram ao surgimento dessas duas
associações civis ocorreram de forma homóloga e numa mesma época, com alguns membros da segunda
tendo sido fundadores também da primeira – para maiores detalhes sobre esse processo, confira Ferreira
Júnior (2015). Ao nascerem para o público, propiciaram o surgimento de arenas públicas em torno do
artesanato de miriti de Abaetetuba, nas quais tais associações civis passaram a estabelecer relações com
diversos atores sociais institucionais, gerando, dessa maneira, um conjunto de relações que ora se
fortalecem, ora são desfeitas. Ademais, esse fator também contribuiu para a ampliação do ciclo de
comercialização dos Brinquedos de Miriti, restrito até então à época do Círio de Nazaré, com a
participação dos artesãos de miriti em feiras e exposições locais, regionais, nacionais e internacionais.
(BOURDIEU, 2008, p. 18, cursivas no original), mas que existem em relação a outras
propriedades.
Nesse aspecto, o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
(Sebrae) é explicitamente importante em ser considerado, por sua importante atuação no
processo de fundação das associações civis dos artesãos de miriti (cf. FERREIRA
JÚNIOR; FIGUEIREDO, 2014b), e em outras questões por elas demandadas, como a
educação e formação por meio de oficinas e de cursos para maior promoção do
artesanato de miriti, e o início do processo que almeja uma certificação do Brinquedo de
Miriti, em busca da implantação de registro de indicação geográfica.
Em sua atuação, o Sebrae possibilitou que os artesãos d miriti melhorassem o
uso que fazem do material e aperfeiçoassem algumas técnicas. Por essa via, e com o
complemento de cursos voltados para a gestão de negócios e para o atendimento do
público, por exemplo, o Sebrae se estabeleceu como uma ligação entre os artesãos e
alguns padrões de mercado, o que foi importante para que o ciclo de produção e
comercialização dos Brinquedos de Miriti se ampliasse, com a criação do MiritiFestival,
realizado anualmente desde 2004, e a participação em feiras e exposições diversas.
Foi uma intervenção que, longe de trazer somente benefícios para os artesãos,
foi, em certa medida, por eles acionada, de modo que pudessem cumprir alguns de seus
anseios, notadamente os relacionados à comercialização das peças. E apesar das
possibilidades que gera de modificação dos significantes que caracterizam os
Brinquedos de Miriti enquanto tais, a atuação dos artesãos de miriti, pela intermediação
de seu espaço de disposições, retraduz o espaço de posições sociais em um espaço de
tomadas de posição (BOURDIEU, 2008), fazendo com que tais possibilidades fiquem
restritas, no período tomado como referência, a um estado latente11
.
No entanto, em 2014, a Asamab, maior associação civil dos artesãos de miriti,
rompe com o Sebrae depois da realização de mudanças na diretoria do escritório local
desta entidade e de modificações de suas diretrizes de trabalho. Alguns artesãos
destacam que, apesar da importância do Sebrae em muitas das conquistas que
obtiveram, sobretudo relacionadas ao aumento da qualidade das peças e da
11
Latente porque, embora se fale em habitus de classe, ou de grupo, essas disposições não são nem
imutáveis nem são exatamente iguais, mesmo entre agentes sociais que ocupam a mesma posição no
Campo de Relações, pois a proximidade no espaço social, afirma Bourdieu (2008), não engendra
automaticamente unidade, definindo somente potencialidade objetiva de unidade, dada as propriedades
situacionais particulares a cada agente. Assim, os habitus são diferenciados ao mesmo tempo em que são
diferenciadores. “Distintos, distinguidos, eles são também operadores de distinções: põem em prática
princípios de diferenciação diferentes ou utilizam diferenciadamente os princípios de diferenciação
comuns” (BOURDIEU, 2008, p. 22).
comercialização, esse agente possuía muita ingerência nas ações da associação civil,
principalmente nos eventos mais diretamente ligados a ela, como o MiritiFestival e a
Feira do Artesanato de Miriti12
, realizada em Belém durante a festa do Círio de Nazaré,
e suas diretrizes não lhes possibilitava avançar em outros tipos de discussões que
extrapolem os mercadológicos.
Depois que nós fechamos com o Sebrae foi que teve a possibilidade de criar
outras coisas. Teve muitas mudanças, como você tá vendo, todas essas
mudanças veio depois que a gente criou com o Sebrae essa parceria. O
Sebrae começou a colocar cursos pra nós, teve mudanças de tinta, design,
criação de brinquedos e feiras, grandes feiras. Eu te digo assim, que depois
que a gente se segurou com o Sebrae, a gente só teve o que ganhar. De grupo
a gente começou a montar a nossa associação (artesão Amadeu Sarges,
entrevista concedida em 21 ago. 2014).
Eu não sou a favor do rompimento com o Sebrae, mas eles têm que perceber
que o importante são as pessoas. É muito diferente a conversa de um técnico
do Sebrae da conversa de um antropólogo. Já chega o mercado pra pressionar
o cara (artesão Valdeli Costa, entrevista concedida em 22 ago. 2014).
Ao distanciarem-se do Sebrae, os artesãos de miriti passam a fortalecer outros
vínculos que já possuíam e estabelecer novas relações para suprir tanto o suporte dado
pelo Sebrae como para receber novos tipos de apoio que este não lhes oferecia. Dentre
os novos parceiros, destacam-se a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural
(Emater), cujo principal apoio volta-se para as questões ambientais, de modo que o
miriti utilizado tenha origem certificada; para o auxílio técnico na elaboração de
projetos e na corealização de eventos; e para a exportação de Brinquedos de Miriti; e o
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), através da área de
patrimônio imaterial de sua superintendência estadual.
Requerida há bastante tempo pelos artesãos de miriti, a aproximação com o
Iphan se deu através da necessidade deste instituto executar ações de salvaguarda para o
Círio de Nazaré, registrado como Patrimônio Cultural Imaterial brasileiro na categoria
celebrações13
, com os Brinquedos de Miriti sendo um dos seus bens associados.
Com isso, o Iphan, ao lado da Emater, pode vir a se constituir como o principal
parceiro dos artesãos de miriti, principalmente ao permitir a articulação para acessar
políticas públicas voltadas para o patrimônio cultural e para constituir um comitê gestor
12
A realização da Feira do Artesanato de Miriti no ano de 2014 é o fator que marcará esse rompimento de
relações, devido mudanças promovidas pelo Sebrae no conceito da feira, que passa a ter um espaço maior
para outros tipos de artesanato do estado do Pará e é renomeada como Feira de Artesanato do Círio.
Descontentes com tais modificações e sentindo-se ameaçados naquilo do qual são orgulhosos, que é a
relação dos Brinquedos de Miriti de Abaetetuba e, consequentemente, deste município com o Círio de
Nazaré, a maior parte dos artesãos de miriti, seguindo orientações da Asamab, retira-se desse evento e
decide organizar a Feira do Artesanato de Miriti por conta própria em outro local da cidade de Belém,
apesar das dificuldades e dos demais problemas que isto suscita (FERREIRA JÚNIOR; FIGUEIREDO,
2014a).
13
Rituais e festas que marcam a vivência coletiva do trabalho, da religiosidade, do entretenimento e de
outras práticas da vida social.
autônomo dos artesanatos de miriti, além de, como alguns artesãos destacaram, poder
suprir a lacuna deixada pelo rompimento da Asamab com o Sebrae, com o diferencial
de que suas ações não sejam orientadas pelos padrões de mercado, considerando, antes
disso, os aspectos socioculturais desse bem.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar de o campo social ser bem situado no espaço e no tempo, as relações que
lhe são próprias se reproduzem em diversos outros espaços, lugares e arenas públicas.
Neste trabalho, não pudemos apresentar com maiores detalhes e nuances todas as
relações que observamos durante nossas pesquisas, uma vez que estamos sob a restrição
do espaço de que dispomos, e optamos por priorizar a apresentação de como podemos
lançar mão da abordagem apresentada para a realização de estudos culturais, buscando,
por meio de discussões, refiná-la.
Propondo-nos demonstrar como se pode pensar a existência de alternativas aos
extremos dos eixos tradicionalista e mercadológico, decidimos apresentar um norte de
discussão que fuja desse forte anseio generalizado de buscar soluções fora das próprias
práticas de quem produz e reproduz o que se pretende “salvar”, realçando o fato de que
os agentes sociais adotam estratégias ao movimentarem capacidades “criadoras”, ativas
e inventivas, e operarem de forma prática construções de objetos e formas de
representação (BOURDIEU, 1989).
As culturas em geral, e o artesanato, neste nosso caso particular, não devem ser
debatidas meramente enquanto conjunto de produtos, mas em uma visão de processos
que se inserem de forma reflexiva no contexto de sua produção e nos modos de vida de
quem os produz. No caso dos Brinquedos de Miriti, vê-se que se encontram
definitivamente em meio às relações de mercado e às políticas públicas, mas não de
forma que por elas sejam determinados, pois surgem da confluência das relações sociais
de seus produtores.
Note-se que falamos ora em agente, ora em ator social quando nos referimos aos
artesãos de miriti, mas isso está ligado à própria forma como esta nossa abordagem foi
formulada: enquanto o ator social encontra-se nas arenas simbólicas, dentre elas as
públicas, os agentes estão presentes no campo social. Essa distinção permitiu
estabelecer que os artesãos de miriti colocam-se em ação em um campo de relações,
mas as realizam em ocasiões sociais específicas e em situações e ajuntamentos em
contextos ambíguos e híbridos, com suas associações civis não sendo homogêneas, pois
são atravessadas por ambiguidades e, às vezes, por contradições que não lhes permite
ter “[...] um objetivo, uma estratégia e uma ideologia” (CEFAÏ; VEIGA; MOTA, 2011,
p. 35, cursivas no original), diferenciando-se entre si pela diferenciada colocação em
prática dos princípios de diferenciação comuns, o que as permite adotar distintamente as
soluções colocadas pelo mercado e pelo Estado para fazer a intermediação de interesses,
buscar seus objetivos comuns e conquistar espaços de atuação, divulgação e
comercialização dos artesanatos de miriti.
Esse caráter ambíguo, complexo e híbrido surge do entrelaçamento de diferentes
ordens sociais e de diferentes lógicas (CEFAÏ; VEIGA; MOTA, 2011), para as quais
as mudanças de participação nos grupos em situações diferentes revela o
funcionamento da estrutura, pois a participação de um indivíduo em um
grupo particular em uma situação particular é determinada pelos motivos e
valores que o influenciam nesta situação. Os indivíduos podem, assim,
assumir, vidas coerentes através da seleção situacional de uma miscelânea
de valores contraditórios, crenças desencontradas, interesses e técnicas
variadas (Gluckman, 1987, p. 261, grifo nosso).
Assentar as arenas públicas no interior de um campo social evita vê-las como
conceito a-histórico, passando a vê-las como estruturas históricas localizadas em um
mundo social situado e datado. Adentrando nas arenas públicas para alcançar seus
objetivos por meio de um emaranhado de estruturas de proximidade do mundo vivido,
os artesãos de miriti exercem “escolhas racionais” que estão de acordo com o habitus
que compartilham, permitindo-lhes a inserção nas relações econômicas para que
mantenham e melhorem a base material de suas vidas ao mesmo tempo em que mantêm
lastros sócio-simbólicos de sua atividade.
Os artesãos de miriti, influenciados por propriedades de posição e propriedades
de situação, “[...] também são atores que se dão em espetáculo e que, por um esforço
mais ou menos sustentado de encenação, aspiram a porem-se em valor, [...], em resumo,
a fazerem-se ver e valer” (BOURDIEU, 1982, tradução nossa). Não estando isolados,
movimentam-se por redes de relações em que despontam algumas estruturas
consolidadas, públicas ou privadas, nas quais não hesitam em se apoiar, posicionando-
se diante do mercado e do Estado de forma a retraduzir e refratar pressões, apresentando
as fachadas necessárias diante da situação vivenciada no Campo de Relações para a
obtenção de apoios e parcerias que reduzam os riscos dos quais se ressentem.
Não sendo sujeitados passivamente às imposições do imperativo econômico e
tampouco as suas necessidades sócio-simbólicas, a maneira se inserem nas arenas
públicas das quais participam lhes permite que a partir delas possam negociar,
representar-se politicamente, e estabelecer, encerrar ou reestabelecer parcerias, que se
modificam – rompem-se, aproximam-se, reaproximam-se, agenciam-se, etc. – no
decorrer da mudança de suas situações, e, mais estruturalmente, de suas posições
ocupadas no campo social.
Assim, veem o Sebrae como o agente que mais lhes permite a aproximação que
desejam com o mercado, enquanto a Emater pode lhes proporcionar as garantias
ambientais para manutenção de sua atividade, e o Iphan os insere na arena pública de
discussão de suas questões culturais e simbólicas e também lhe proporcionará o acesso a
algumas das prerrogativas que o reconhecimento do Círio de Nazaré como patrimônio
cultural imaterial pode oferecer.
Na arena pública, as associações civis dos artesãos de miriti se inserem em
articulações para garantir seus anseios de classe, estando às voltas, portanto, tanto com a
reprodução e permanência do tipo de processo criativo que lhes é próprio, quanto com
um engajamento político pela modernização das condições de exercício de sua
profissão, buscando a ocupação e a criação de cada vez mais espaços pensados e vividos
para a sua atividade sem reduzi-la a vitrines, respeitando sua sociabilidade e garantido a
reprodução desse ofício.
Vê-se que, aplicando-se nossa proposta de movimentar teórica e empiricamente
os campos de produção da cultura e as arenas públicas que nele se formam,
conseguimos localizar a cultura em meio a sua própria realidade e situá-la no tempo em
que é produzida, dando-nos subsídios suficientes para partir para discussões sobre qual
é o papel que joga no desenvolvimento de localidades.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Campos de produção da cultura e suas arenas públicas: discussões a partir de um estudo na amazônia brasileira

  • 1. CAMPOS DE PRODUÇÃO DA CULTURA E SUAS ARENAS PÚBLICAS: DISCUSSÕES A PARTIR DE UM ESTUDO NA AMAZÔNIA BRASILEIRA1 Amarildo Ferreira Júnior2 Silvio Lima Figueiredo3 Resumo: Este artigo apresenta parte de uma discussão na qual tratávamos sobre o que denominamos como a vida associativa no Campo de Relações no Artesanato de Miriti de Abaetetuba (Pará), pertencente ao conjunto dos campos de produção da cultura. Nele, apresentamos como a aplicação de uma abordagem teórica em que se direciona a pesquisa para a análise das arenas públicas que se formam nos campos de produção da cultura permitiu-nos constatar que agentes produtores de cultura também são atores que se dão em espetáculo, e suas práticas não são necessariamente determinadas por um dualismo entre uma abordagem tradicionalista e outra mercadológica, pois se movimentam por redes de relações e apresentam fachadas necessárias diante das situações vivenciadas nos campos de relações e em suas arenas públicas. Palavras-chave: campos de produção da cultura, arena pública, artesãos de miriti. 1. INTRODUÇÃO Diz-se que há, na Amazônia brasileira, um isolamento, e, portanto, a necessidade, pelo menos nas palavras de Adeodato (2015), de se libertar suas comunidades tradicionais e de se levar até elas maiores e melhores formas de organização. Cremos estar claro nas palavras do jornalista paulista uma visão que, apesar da existência de esforços para desfazê-la, ainda é predominante e na qual a imagem que se faz da região é colorida com superlativos sintéticos e analíticos, quando não com espelhismos. Aplicada à totalidade da vida na região, sobretudo aos seus aspectos ambientais e culturais, é uma visão prenhe de pré-conceitos que desconhecem as idiossincrasias e vicissitudes do complexo conjunto de habitantes da região, acostumada que está em vê- la de longe e do alto – o que não significa que necessariamente de fora da região –, 1 Este trabalho apresenta, em grande parte, discussões desenvolvidas na dissertação de mestrado Entalhadores do efêmero: a vida associativa na criação dos Brinquedos de Miriti de Abaetetuba, defendida e aprovada no dia 09 jan. 2015, de autoria de Amarildo Ferreira Júnior e orientação do prof. Dr. Silvio Lima Figueiredo. Estes estudos foram realizados com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), por meio de concessão de bolsa de estudo, e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que disponibilizou recursos para sua realização no âmbito do projeto de pesquisa Turismo cultural e patrimonialização: campo de relações, referências culturais e gestão para visitação. 2 Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da Universidade Federal do Pará (NAEA/UFPA). E-mail: amarildofjunior@gmail.com. 3 NAEA/UFPA. E-mail: slima@ufpa.br.
  • 2. como fronteira de recursos a ser apropriados tanto para “desenvolver” a região e junto dela o restante do país, quanto para serem apreciados nos mais “elevados” círculos da sociedade brasileira enquanto exemplares do exótico, cujo consumo ou apreciação atesta um refinamento em seus gostos e preferências, tudo amalgamado em retóricas que mais nos parecem cantos de sereias. Quanto à cultura, olham-se os objetos, expressões e manifestações que produz, alocando-os nos tipos de consumo próprios da contemporaneidade4 , mas pouco se olha para seus produtores, e, nas vezes em que se dirige a atenção para estes, geralmente se alterna entre o extremo de folclorizá-los, tornando-os uma sorte de museu vivo, e a extremidade que lhes aconselha o seguimento quase cego das regras do mercado, seja na padronização de seus bens culturais, seja no uso de técnicas de organização e gestão consideradas mais modernas e sofisticadas. Poucos são os que se dispõem a procurar uma solução entre esses dois extremos, e talvez a contemporaneidade não nos apresente opções fora desse espaço dos possíveis. Neste artigo, detemos-nos a apresentar parte de uma discussão desenvolvida em trabalhos anteriores (FERREIRA JÚNIOR, 2015; FERREIRA JÚNIOR & FIGUEIREDO, 2014a, FERREIRA JÚNIOR & FIGUEIREDO, 2014b), nos quais tratávamos sobre o que denominamos como a vida associativa de agentes sociais pertencentes ao campo de produção cultural de uma forma de expressão da cultura amazônica5 , os Brinquedos de Miriti de Abaetetuba. Buscando posicionar nossa discussão em uma abordagem que não esteja alinhada ao extremo do chamado eixo tradicionalista e tampouco à extremidade 4 García Canclini (1983) afirma que são quatro esses tipos de consumo: o prático, que ocorre no interior da vida cotidiana; o cerimonial, relacionado a atividades religiosas ou festivas; o suntuário, que serve de distinção social para setores com alto poder aquisitivo; e o estético ou decorativo. Para esse autor, as lojas urbanas dispõem os bens culturais de modo a reduzir esses quatro usos a uma combinação dos dois últimos, e irão diferir entre si pela necessidade de selecionar e de apresentar os objetos para grupos diversos de consumidores: o de gosto mais ou menos sofisticado, o dos que “adquirem” signos de distinção ou o dos que apenas desejam levar souvenires. 5 Estabelecer um gentílico para a cultura é uma operação cognitiva que há tempos gera debates e controvérsias, sobretudo quando nele se encontram indivíduos e grupos de indivíduos que se consideram os únicos portadores da cultura. No entanto, e apesar de levarmos em conta as considerações daqueles que veem nessa forma de operar uma forma de velar as contradições provenientes da estratificação social existente no país (TRAGTENBERG, apud VEIGA, 1978), deixamos as tergiversações sobre a questão para momentos propícios a sua realização e, ainda assim, optamos por utilizar o termo cultura amazônica, pois, ao utilizá-lo, não estamos nos referindo a uma cultura amazônica monolítica, mas a um campo intricado e cheio de contradições internas, inclusive no interior das mesmas camadas sociais. Sendo assim, tal termo é um constructo (Gebilde) que, embora proveniente da realidade, não é em si uma realidade imediata, afinal, os elementos que caracterizam manifestações “isoladas” como possuidoras de traços que a ligam de forma íntima a determinada região não se encontram separados de seus elementos mais particulares (SIMMEL, 2006). Para discussões que apresentam a complexidade dos elementos que conformam o que seria uma cultura qualificada como amazônica e quais são suas imbricações, são importantes os aportes de Figueiredo (1999) e Loureiro (1995).
  • 3. representada pelo eixo mercadológico6 e seus respectivos discursos (LEITE, 2005), ambas as perspectivas geradoras de fortes ressonâncias políticas para os agentes produtores de cultura, pois colocam em jogo os sistemas sociais e simbólicos que vinculam os bens culturais criados e seus produtores ao mesmo tempo em que gera riscos para sua inserção econômica (LEITE, 2005; GARCÍA CANCLINI, 1983), direcionamos a discussão para o estudo das arenas públicas no interior dos campos de produção da cultura, utilizando como referência para a discussão o Campo de Relações no Artesanato de Miriti de Abaetetuba. Com isso, demonstramos que, a partir da abordagem que apresentamos, pode-se constatar que agentes produtores de cultura, que também são atores que se dão em espetáculo, não são necessariamente determinados por esse dualismo, pois se movimentam por redes de relações, em que despontam algumas estruturas consolidadas nas quais não hesitam em se apoiar quando necessário, e posicionam-se diante do mercado e do Estado de forma a retraduzir e refratar pressões, apresentando as fachadas necessárias diante da situação vivenciada no campo de relações e em suas arenas públicas para a obtenção de apoios e parcerias que reduzam os riscos dos quais se ressentem. 2. OS CAMPOS DE PRODUÇÃO E DE DIFUSÃO CULTURAL A noção de campo social é definida negativamente como recusa à alternativa da interpretação interna e da explicação externa, sendo espaço social de relações objetivas que rompe, junto com o conceito de habitus, que lhe é anterior, com o paradigma estruturalista sem, no entanto, dirigir-se à velha filosofia do sujeito ou da consciência ou à economia clássica e sua ideia de homos economicus (BOURDIEU, 1989). Desse modo, o campo é o espaço intermediário entre dois polos antagônicos no qual ocorre um conjunto de relações sociais, estruturadas e estruturantes simultaneamente, e para onde fluem e se reelaboram sentidos, com a estrutura da sociedade sendo composta por uma infinidade desses espaços objetivos e que, embora apresentem homologias estruturais e funcionais entre si e propriedades comuns, possuem capitais específicos e obedecem a leis sociais mais ou menos específicas, 6 Pautado no discurso da tradição, mas ignorando sua invenção social e histórica (HOBSBAWM, 2006), os discursos alinhados ao eixo tradicionalista são marcados pela retórica da preservação dos bens culturais, defendendo a manutenção dos lastros sociais nos quais estes bens são produzidos, muitos deles em graves situações de exclusão social; quando levado ao extremo, os defensores desse discurso enxergam uma imutabilidade inexistente nas produções culturais, contribuem para a manutenção de situações de pobreza e exclusão social, e geram discriminações sociais a parcelas de membros de grupos que já são discriminados. O segundo eixo, por sua vez, defende a realização de inovações nos bens culturais, nas técnicas para sua produção e nas formas de organização de seus produtores para inseri-los, assim, no mercado e com isso assegurar sua reprodutibilidade (LEITE, 2005).
  • 4. dispondo de uma autonomia parcial mais ou menos acentuada em relação ao macrocosmo social (BOURDIEU, 2010; 2004). Logo, e para fazer um paralelo com uma corrente teórica com a qual essa abordagem dialoga, enquanto uma considerável variedade dos marxismos (AMADEO, 2006; FERNÁNDEZ BUEY, 2006) detém sua análise no que para Bourdieu (2005) é o campo econômico, considerando-o como principal determinante dos demais campos que conformam a estrutura da realidade, na famigerada divisão entre estrutura e superestrutura, levada a graves consequências pelo chamado marxismo vulgar, Bourdieu (1989) nos apresenta outra perspectiva: [...] me achei no meio de propriedades gerais, válidas nos diferentes campos, que a teoria económica tinha assinalado sem delas possuir adequado fundamento teórico (p. 67). Tudo leva a crer que a teoria económica, como se espera um dia demonstrar, em vez de modelo fundador deve ser antes pensada como um caso particular da teoria dos campos que se constrói pouco a pouco (p. 69). Dentro desse elevado número de campos sociais que conformam a realidade, encontram-se aqueles denominados por Bourdieu (2010) como campos de produção e de difusão de bens culturais, categoria por meio da qual a análise científica das condições sociais da produção e da recepção de bens simbólicos intensifica sua própria experiência, e que, segundo este mesmo autor, são campos que, quanto mais autônomos, mais se (de)marcam por uma lógica propriamente mágica da produção do produtor e do produto como feitiços (BOURDIEU, 1989), com o ajustamento à demanda nunca sendo completamente resultante de uma transação consciente entre produtores e consumidores “[...] e, menos ainda, de uma busca intencional do ajustamento, salvo, talvez, no caso dos empreendimentos de produção cultural mais heterônomos [...]” (BOURDIEU, 2010, p. 282). Esses campos se formam com a autonomização progressiva do sistema de relações de produção, circulação e consumo de bens simbólicos, e a constituição de um corpo de agentes correspondentes, colocando-se em oposição a todas as instâncias que possuam pretensões de legislar no terreno do cultural em nome de poder ou autoridade que não seja propriamente cultural (BOURDIEU, 2013), e se definindo em relações objetivas entre diferentes instâncias determinadas pela função que exercem na divisão do trabalho de produção, de reprodução e de difusão de bens simbólicos (BOURDIEU, 2013). Assim, O campo de produção propriamente dito deriva sua estrutura específica da oposição – mais ou menos marcada conforme as esferas da vida intelectual e artística – que se estabelece entre, de um lado, o campo de produção erudita enquanto sistema que produz bens culturais (e os instrumentos de apropriação destes bens) objetivamente destinados (ao menos a curto prazo) a um público
  • 5. de produtores de bens culturais que também produzem para produtores de bens culturais e, de outro, o campo da indústria cultural especificamente organizado com vistas à produção de bens culturais destinados a não- produtores de bens culturais (“o grande público”) que podem ser recrutados tanto nas frações não-intelectuais das classes dominantes (“o público cultivado”) como nas demais classes sociais (BOURDIEU, 2013, p. 105, cursivas no original). Aos dois tipos de campos apresentados no excerto acima, acrescentam-se os campos das culturas populares, “[...] existentes exclusivamente nas formações sociais desprovidas de instâncias especializadas de produção, de transmissão e de conservação culturais [...]” (BOURDIEU, 2013, p. 113, grifo nosso). Esta é uma classificação que nos serve, desde que se tenha ciência de que toda cultura é fragmentada e contestada internamente, e seus “limites” não são maciços, sendo fronteiras porosas (KUPER, 2002) por onde são absorvidos e transpirados os efeitos das relações culturais. Por isso, não se pode considerar os campos de produção da cultura como isolados ou imutáveis, pois os movimentos que modificam posições e situações de bens simbólicos lhe são característicos, e todas as formas culturais são compostas de elementos antagônicos e instáveis próprios dessa luta cultural que assume as mais diversas formas: incorporação, distorção, resistência, negociação, recuperação (HALL, 2003). Assim, o Campo de Relações no Artesanato de Miriti de Abaetetuba, sobre o qual nos debruçamos em nossa pesquisa, encontra-se entre os campos do terceiro tipo apresentado, e o analisamos partindo-se sempre das relações dos artesãos que criam, dentre a ampla variedade de artesanatos elaborados com fibras da palmeira conhecida popularmente como miriti (Mauritia flexuosa L.f), os denominados Brinquedos de Miriti de Abaetetuba (Figura 1). Figura 1 Barcos e canoa de miriti (peças do artesão Manoel Pantoja, conhecido como Soquete) Fonte: Amarildo Ferreira Júnior (2014).
  • 6. Tais brinquedos pertencem à categoria artesanato-artístico, tipo de atividade que se situa entre a arte e a criação extra-artística, pois seu produtor atenta para sua esteticidade, que se sobressai em suas formas, cores, mecanicidade e textura, mesmo quando sua finalidade é lúdica ou utilitária (LOUREIRO, 2012). São uma distinta modalidade de artesanato de miriti característica do município de Abaetetuba (Figura 2), localizado na mesorregião nordeste do estado do Pará, e integrantes da estrutura do Círio de Nazaré 7 , do qual são seu maior símbolo artístico-cultural. Figura 2 Localização de Abaetetuba FONTE: LAENA/NAEA (2014). 3. ARENAS PÚBLICAS NO INTERIOR DOS CAMPOS DE PRODUÇÃO DA CULTURA Este campo social que estamos considerando nesta discussão, para o qual passaremos a nos referir somente como Campo de Relações, foi considerado historicamente a partir do início dos anos 2000, quando começou a emergir a estrutura que atualmente o caracteriza. Deter-se em observar as relações que ocorrem nesse espaço evitou que a interpretação das práticas aí existentes fosse dada em si mesma e por si mesma, destacando o universo de práticas intercambiáveis e que a correspondência entre as posições sociais ocupadas pelos agentes e suas práticas não constituem relação mecânica e direta (BOURDIEU, 2008). 7 O Círio de Nazaré é uma festa cultural-religiosa que ocorre no segundo domingo de outubro em Belém, na capital do estado do Pará.
  • 7. Pelas práticas sociais serem resultantes de uma dialética entre uma situação objetivamente estruturada vivida no campo social e um habitus8 , as relações sociais nem sempre permanecem as mesmas e nem sempre possuem a mesma qualidade. Ter observado a construção social do Campo de Relações permitiu-nos dar ênfase nas mudanças ocorridas em suas relações e, com isso, colocar a questão referente à formação de arenas públicas no interior desse campo social e às vias de expansão de processos políticos, econômicos e identitários dos artesãos de miriti que elas propiciam. O conceito de arena pública tem a dupla conotação de um lugar de combates (lieu de combats) e de uma cena de realizações (scène de performances) ante ao público e no interior de uma ordem pública (GOFFMAN, 2010; CEFAÏ, 2002). Este conceito se diferencia da noção de campo social, embora esta também destaque a dimensão do conflito entre as partes na definição da realidade e na imposição da legitimidade, e apresente a relação entre a temporalidade das interações estratégicas e a “construção” de problemas sociais, mas numa análise, todavia, estrutural (CEFAÏ, 2002). Direcionar a análise para as arenas públicas que surgem no interior dos campos sociais focaliza, sobretudo, as atividades práticas em situações sociais (GOFFMAN, 2010; GLUCKMAN, 1987) que se desenrolam ao redor de um problema público, no qual atores individuais, organizacionais e institucionais se expressam; discutem e julgam opiniões; localizam problemas; entram em disputas, polêmicas e controvérsias; resolvem crises; e assumem compromissos; com a chamada “coisa” pública não sendo mais um monopólio do Estado (CEFAÏ, 2002). Procede-se a análise das arenas públicas de forma situacional, demonstrando-se as formas de experiência, de opinião e de ação pública que não cessam de instaurar-se (CEFAÏ, 2002). Para Gluckman (1987), uma situação social é o comportamento em certas ocasiões dos membros de uma comunidade ou grupo social enquanto tais, e nela se revela o sistema de relações subjacente à estrutura social, às partes da estrutura social, ao ambiente físico e à vida de seus membros. Ao propormos a análise também das arenas públicas que se formam nos campos de produção da cultura, estamos orientados a focalizar o fato público no momento de sua gestação, um processo que ocorre de forma paralela a uma dinâmica de produção de atores individuais e coletivos e de suas identidades, “encenadas” em suas intervenções e 8 Princípio gerador e estruturador de práticas e de representações definido como os sistemas de disposições duráveis originários das estruturas constitutivas de um tipo específico de meio (BOURDIEU, 1983).
  • 8. suas interações, relançando-se os movimentos que os criam social e culturalmente (CEFAÏ, 2002). No caso particular que estamos tomando como referência, as arenas públicas foram observadas em situações sociais que decorrem de ocasiões sociais compósitas9 , nas quais os artesãos de miriti apresentam-se e representam-se através de um emaranhado de estruturas de proximidade, dentre as quais destacaremos as suas associações civis, em especial a Associação dos Artesãos de Brinquedos e Artesanatos de Miriti de Abaetetuba (Asamab) e a Associação Arte Miriti de Abaetetuba (Miritong), fundadas, respectivamente, nos anos de 2003 e 200510 . Estas associações civis são arenas simbólicas que se inserem, dentro do Campo de Relações, em arenas simbólicas englobantes ou interorganizacionais, as arenas públicas. Nas arenas públicas, interagem com outros atores sociais, geralmente, entre os artesãos de miriti, relacionados ao mercado ou ao planejamento estatal, e seus atores, por mais que venham a se apresentar como indivíduos, sempre estão se posicionando e apresentando fachadas que condizem com sua condição de membro de associações civis (CEFAÏ; MOTA; VEIGA, 2011). Inseridos em espaços nas arenas públicas, os agentes/atores determinam seu percurso na ocupação de posições sociais e se engajam e desengajam conforme as circunstâncias, nem sempre se preocupando com questões ideológicas, mas permanentemente tratando de assuntos de seu cotidiano sobre os quais não possuem incessantemente o conhecimento claro de qual regime de ação e de interação estão se referindo na prática, dado o entrelaçamento de lógicas distintas (CEFAÏ; VEIGA; MOTA, 2011). Apresentam, nesses espaços, propriedades relacionais, que lhe cabem apenas a um dado momento, “[...] a partir de sua posição em um espaço social determinado e em uma dada situação de oferta de bens e práticas possíveis” 9 Termo originário da noção de ocasião social adotada por Goffman (2010). Em nossos estudos, foram considerados como ocasiões sociais compósitas os eventos-ocasiões mais importantes na demarcação do ciclo de produção e comercialização dos Brinquedos de Miriti, o MiritiFestival, tipo de festival cultural que ocorre anualmente em Abaetetuba, e o Círio de Nazaré. 10 Apesar de apresentarem diferenças em suas formas de organização e atuação, uma vez que a Asamab estrutura-se como uma espécie de entidade de classe, enquanto a Miritong apresenta-se como uma Organização Não Governamental (ONG), os movimentos que levaram ao surgimento dessas duas associações civis ocorreram de forma homóloga e numa mesma época, com alguns membros da segunda tendo sido fundadores também da primeira – para maiores detalhes sobre esse processo, confira Ferreira Júnior (2015). Ao nascerem para o público, propiciaram o surgimento de arenas públicas em torno do artesanato de miriti de Abaetetuba, nas quais tais associações civis passaram a estabelecer relações com diversos atores sociais institucionais, gerando, dessa maneira, um conjunto de relações que ora se fortalecem, ora são desfeitas. Ademais, esse fator também contribuiu para a ampliação do ciclo de comercialização dos Brinquedos de Miriti, restrito até então à época do Círio de Nazaré, com a participação dos artesãos de miriti em feiras e exposições locais, regionais, nacionais e internacionais.
  • 9. (BOURDIEU, 2008, p. 18, cursivas no original), mas que existem em relação a outras propriedades. Nesse aspecto, o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) é explicitamente importante em ser considerado, por sua importante atuação no processo de fundação das associações civis dos artesãos de miriti (cf. FERREIRA JÚNIOR; FIGUEIREDO, 2014b), e em outras questões por elas demandadas, como a educação e formação por meio de oficinas e de cursos para maior promoção do artesanato de miriti, e o início do processo que almeja uma certificação do Brinquedo de Miriti, em busca da implantação de registro de indicação geográfica. Em sua atuação, o Sebrae possibilitou que os artesãos d miriti melhorassem o uso que fazem do material e aperfeiçoassem algumas técnicas. Por essa via, e com o complemento de cursos voltados para a gestão de negócios e para o atendimento do público, por exemplo, o Sebrae se estabeleceu como uma ligação entre os artesãos e alguns padrões de mercado, o que foi importante para que o ciclo de produção e comercialização dos Brinquedos de Miriti se ampliasse, com a criação do MiritiFestival, realizado anualmente desde 2004, e a participação em feiras e exposições diversas. Foi uma intervenção que, longe de trazer somente benefícios para os artesãos, foi, em certa medida, por eles acionada, de modo que pudessem cumprir alguns de seus anseios, notadamente os relacionados à comercialização das peças. E apesar das possibilidades que gera de modificação dos significantes que caracterizam os Brinquedos de Miriti enquanto tais, a atuação dos artesãos de miriti, pela intermediação de seu espaço de disposições, retraduz o espaço de posições sociais em um espaço de tomadas de posição (BOURDIEU, 2008), fazendo com que tais possibilidades fiquem restritas, no período tomado como referência, a um estado latente11 . No entanto, em 2014, a Asamab, maior associação civil dos artesãos de miriti, rompe com o Sebrae depois da realização de mudanças na diretoria do escritório local desta entidade e de modificações de suas diretrizes de trabalho. Alguns artesãos destacam que, apesar da importância do Sebrae em muitas das conquistas que obtiveram, sobretudo relacionadas ao aumento da qualidade das peças e da 11 Latente porque, embora se fale em habitus de classe, ou de grupo, essas disposições não são nem imutáveis nem são exatamente iguais, mesmo entre agentes sociais que ocupam a mesma posição no Campo de Relações, pois a proximidade no espaço social, afirma Bourdieu (2008), não engendra automaticamente unidade, definindo somente potencialidade objetiva de unidade, dada as propriedades situacionais particulares a cada agente. Assim, os habitus são diferenciados ao mesmo tempo em que são diferenciadores. “Distintos, distinguidos, eles são também operadores de distinções: põem em prática princípios de diferenciação diferentes ou utilizam diferenciadamente os princípios de diferenciação comuns” (BOURDIEU, 2008, p. 22).
  • 10. comercialização, esse agente possuía muita ingerência nas ações da associação civil, principalmente nos eventos mais diretamente ligados a ela, como o MiritiFestival e a Feira do Artesanato de Miriti12 , realizada em Belém durante a festa do Círio de Nazaré, e suas diretrizes não lhes possibilitava avançar em outros tipos de discussões que extrapolem os mercadológicos. Depois que nós fechamos com o Sebrae foi que teve a possibilidade de criar outras coisas. Teve muitas mudanças, como você tá vendo, todas essas mudanças veio depois que a gente criou com o Sebrae essa parceria. O Sebrae começou a colocar cursos pra nós, teve mudanças de tinta, design, criação de brinquedos e feiras, grandes feiras. Eu te digo assim, que depois que a gente se segurou com o Sebrae, a gente só teve o que ganhar. De grupo a gente começou a montar a nossa associação (artesão Amadeu Sarges, entrevista concedida em 21 ago. 2014). Eu não sou a favor do rompimento com o Sebrae, mas eles têm que perceber que o importante são as pessoas. É muito diferente a conversa de um técnico do Sebrae da conversa de um antropólogo. Já chega o mercado pra pressionar o cara (artesão Valdeli Costa, entrevista concedida em 22 ago. 2014). Ao distanciarem-se do Sebrae, os artesãos de miriti passam a fortalecer outros vínculos que já possuíam e estabelecer novas relações para suprir tanto o suporte dado pelo Sebrae como para receber novos tipos de apoio que este não lhes oferecia. Dentre os novos parceiros, destacam-se a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), cujo principal apoio volta-se para as questões ambientais, de modo que o miriti utilizado tenha origem certificada; para o auxílio técnico na elaboração de projetos e na corealização de eventos; e para a exportação de Brinquedos de Miriti; e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), através da área de patrimônio imaterial de sua superintendência estadual. Requerida há bastante tempo pelos artesãos de miriti, a aproximação com o Iphan se deu através da necessidade deste instituto executar ações de salvaguarda para o Círio de Nazaré, registrado como Patrimônio Cultural Imaterial brasileiro na categoria celebrações13 , com os Brinquedos de Miriti sendo um dos seus bens associados. Com isso, o Iphan, ao lado da Emater, pode vir a se constituir como o principal parceiro dos artesãos de miriti, principalmente ao permitir a articulação para acessar políticas públicas voltadas para o patrimônio cultural e para constituir um comitê gestor 12 A realização da Feira do Artesanato de Miriti no ano de 2014 é o fator que marcará esse rompimento de relações, devido mudanças promovidas pelo Sebrae no conceito da feira, que passa a ter um espaço maior para outros tipos de artesanato do estado do Pará e é renomeada como Feira de Artesanato do Círio. Descontentes com tais modificações e sentindo-se ameaçados naquilo do qual são orgulhosos, que é a relação dos Brinquedos de Miriti de Abaetetuba e, consequentemente, deste município com o Círio de Nazaré, a maior parte dos artesãos de miriti, seguindo orientações da Asamab, retira-se desse evento e decide organizar a Feira do Artesanato de Miriti por conta própria em outro local da cidade de Belém, apesar das dificuldades e dos demais problemas que isto suscita (FERREIRA JÚNIOR; FIGUEIREDO, 2014a). 13 Rituais e festas que marcam a vivência coletiva do trabalho, da religiosidade, do entretenimento e de outras práticas da vida social.
  • 11. autônomo dos artesanatos de miriti, além de, como alguns artesãos destacaram, poder suprir a lacuna deixada pelo rompimento da Asamab com o Sebrae, com o diferencial de que suas ações não sejam orientadas pelos padrões de mercado, considerando, antes disso, os aspectos socioculturais desse bem. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Apesar de o campo social ser bem situado no espaço e no tempo, as relações que lhe são próprias se reproduzem em diversos outros espaços, lugares e arenas públicas. Neste trabalho, não pudemos apresentar com maiores detalhes e nuances todas as relações que observamos durante nossas pesquisas, uma vez que estamos sob a restrição do espaço de que dispomos, e optamos por priorizar a apresentação de como podemos lançar mão da abordagem apresentada para a realização de estudos culturais, buscando, por meio de discussões, refiná-la. Propondo-nos demonstrar como se pode pensar a existência de alternativas aos extremos dos eixos tradicionalista e mercadológico, decidimos apresentar um norte de discussão que fuja desse forte anseio generalizado de buscar soluções fora das próprias práticas de quem produz e reproduz o que se pretende “salvar”, realçando o fato de que os agentes sociais adotam estratégias ao movimentarem capacidades “criadoras”, ativas e inventivas, e operarem de forma prática construções de objetos e formas de representação (BOURDIEU, 1989). As culturas em geral, e o artesanato, neste nosso caso particular, não devem ser debatidas meramente enquanto conjunto de produtos, mas em uma visão de processos que se inserem de forma reflexiva no contexto de sua produção e nos modos de vida de quem os produz. No caso dos Brinquedos de Miriti, vê-se que se encontram definitivamente em meio às relações de mercado e às políticas públicas, mas não de forma que por elas sejam determinados, pois surgem da confluência das relações sociais de seus produtores. Note-se que falamos ora em agente, ora em ator social quando nos referimos aos artesãos de miriti, mas isso está ligado à própria forma como esta nossa abordagem foi formulada: enquanto o ator social encontra-se nas arenas simbólicas, dentre elas as públicas, os agentes estão presentes no campo social. Essa distinção permitiu estabelecer que os artesãos de miriti colocam-se em ação em um campo de relações, mas as realizam em ocasiões sociais específicas e em situações e ajuntamentos em contextos ambíguos e híbridos, com suas associações civis não sendo homogêneas, pois são atravessadas por ambiguidades e, às vezes, por contradições que não lhes permite
  • 12. ter “[...] um objetivo, uma estratégia e uma ideologia” (CEFAÏ; VEIGA; MOTA, 2011, p. 35, cursivas no original), diferenciando-se entre si pela diferenciada colocação em prática dos princípios de diferenciação comuns, o que as permite adotar distintamente as soluções colocadas pelo mercado e pelo Estado para fazer a intermediação de interesses, buscar seus objetivos comuns e conquistar espaços de atuação, divulgação e comercialização dos artesanatos de miriti. Esse caráter ambíguo, complexo e híbrido surge do entrelaçamento de diferentes ordens sociais e de diferentes lógicas (CEFAÏ; VEIGA; MOTA, 2011), para as quais as mudanças de participação nos grupos em situações diferentes revela o funcionamento da estrutura, pois a participação de um indivíduo em um grupo particular em uma situação particular é determinada pelos motivos e valores que o influenciam nesta situação. Os indivíduos podem, assim, assumir, vidas coerentes através da seleção situacional de uma miscelânea de valores contraditórios, crenças desencontradas, interesses e técnicas variadas (Gluckman, 1987, p. 261, grifo nosso). Assentar as arenas públicas no interior de um campo social evita vê-las como conceito a-histórico, passando a vê-las como estruturas históricas localizadas em um mundo social situado e datado. Adentrando nas arenas públicas para alcançar seus objetivos por meio de um emaranhado de estruturas de proximidade do mundo vivido, os artesãos de miriti exercem “escolhas racionais” que estão de acordo com o habitus que compartilham, permitindo-lhes a inserção nas relações econômicas para que mantenham e melhorem a base material de suas vidas ao mesmo tempo em que mantêm lastros sócio-simbólicos de sua atividade. Os artesãos de miriti, influenciados por propriedades de posição e propriedades de situação, “[...] também são atores que se dão em espetáculo e que, por um esforço mais ou menos sustentado de encenação, aspiram a porem-se em valor, [...], em resumo, a fazerem-se ver e valer” (BOURDIEU, 1982, tradução nossa). Não estando isolados, movimentam-se por redes de relações em que despontam algumas estruturas consolidadas, públicas ou privadas, nas quais não hesitam em se apoiar, posicionando- se diante do mercado e do Estado de forma a retraduzir e refratar pressões, apresentando as fachadas necessárias diante da situação vivenciada no Campo de Relações para a obtenção de apoios e parcerias que reduzam os riscos dos quais se ressentem. Não sendo sujeitados passivamente às imposições do imperativo econômico e tampouco as suas necessidades sócio-simbólicas, a maneira se inserem nas arenas públicas das quais participam lhes permite que a partir delas possam negociar, representar-se politicamente, e estabelecer, encerrar ou reestabelecer parcerias, que se modificam – rompem-se, aproximam-se, reaproximam-se, agenciam-se, etc. – no
  • 13. decorrer da mudança de suas situações, e, mais estruturalmente, de suas posições ocupadas no campo social. Assim, veem o Sebrae como o agente que mais lhes permite a aproximação que desejam com o mercado, enquanto a Emater pode lhes proporcionar as garantias ambientais para manutenção de sua atividade, e o Iphan os insere na arena pública de discussão de suas questões culturais e simbólicas e também lhe proporcionará o acesso a algumas das prerrogativas que o reconhecimento do Círio de Nazaré como patrimônio cultural imaterial pode oferecer. Na arena pública, as associações civis dos artesãos de miriti se inserem em articulações para garantir seus anseios de classe, estando às voltas, portanto, tanto com a reprodução e permanência do tipo de processo criativo que lhes é próprio, quanto com um engajamento político pela modernização das condições de exercício de sua profissão, buscando a ocupação e a criação de cada vez mais espaços pensados e vividos para a sua atividade sem reduzi-la a vitrines, respeitando sua sociabilidade e garantido a reprodução desse ofício. Vê-se que, aplicando-se nossa proposta de movimentar teórica e empiricamente os campos de produção da cultura e as arenas públicas que nele se formam, conseguimos localizar a cultura em meio a sua própria realidade e situá-la no tempo em que é produzida, dando-nos subsídios suficientes para partir para discussões sobre qual é o papel que joga no desenvolvimento de localidades. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADEODATO, S. Barganha na floresta. Página 22, São Paulo, n. 94, abr. 2015. p. 10-11. AMADEO, J. Mapeando o marxismo. In: BORON, A.; AMADEO, J.; GONZÁLEZ, S. (Org.). A teoria marxista hoje: problemas e perspectivas. 1. ed. 1. reimp. Buenos Aires: Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales – CLACSO, 2006. p. 51-97. BOURDIEU, P. A economia das trocas simbólicas. 7. ed. 1. reimpr. Introdução, organização e seleção Sergio Miceli; vários tradutores. São Paulo: Perspectiva, 2013. ______. As regras da arte: gênese e estrutura do campo literário. 2. ed. 1. reimpr. Tradução de Maria Lucia Machado. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. ______. Razões práticas: sobre a teoria da ação. 9. ed. Tradução Mariza Corrêa. Campinas, SP: Papirus, 2008. ______. O campo econômico. Política & Sociedade, Florianópolis, v. 4, n. 6, p. 15-57, abr. 2005. Tradução de Suzana Cardoso e Cécile Raud-Mattedi. Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/politica/article/view/1930>. Acesso em: 09 jan. 2014.
  • 14. ______. Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clínica do campo científico. Tradução Denice Barbara Catani. São Paulo: Editora UNESP, 2004. ______. A génese dos conceitos de habitus e de campo. In: ______. O poder simbólico. Tradução de Fernando Tomaz. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989. p. 59-73. ______. Esboço de uma teoria da prática. In: ORTIZ, R. (Org.). Pierre Bourdieu: sociologia. Tradução Paula Montero e Alícia Auzmendi. São Paulo: Ática, 1983. ______. Le découvreur de l’infiniment petit. Le Monde, Paris, 04 dez. 1982. Disponível em: <http://www.lemonde.fr/archives/article/1982/12/04/le-decouvreur-de-l-infiniment- petit_2906217_1819218.html?xtmc=&xtcr=35>. Acesso em: 08 dez. 2014. CEFAÏ, D. Como uma associação nasce para o público: vínculos locais e arena pública em torno da Associação La Bellevilleuse, em Paris. In: CEFAÏ, D. et al. (Org.). Arenas públicas: por uma etnografia da vida associativa. Niterói: Editora da Universidade Federal Fluminense, 2011. p. 67-102. ______. Como nos mobilizamos? A contribuição de uma abordagem pragmatista para a sociologia da ação coletiva. Tradução de Bruno Cardoso. Dilemas, Rio de Janeiro, v. 2, n. 4, p. 11-48, abr.-mai.-jun. 2009. Disponível em: <http://revistadil.dominiotemporario.com/doc/Dilemas4Art1.pdf>. Acesso em: 02 out. 2014. ______. Qu’est-ce qu’une arène publique? Quelques pistes pour une approche pragmatiste. In: CEFAÏ, D.; JOSEPH, I. (Dir.). L’heritage du pragmatisme. Conflits d’urbanité et épreuves de civisme. La Tour d’Aigues: Éditions de l’Aube, 2002. p. 51- 81. CEFAÏ, D.; VEIGA, F. B.; MOTA, F. R. Introdução. Arenas públicas: por uma etnografia da vida associativa. In: CEFAÏ, D. et al. (Org.). Arenas públicas: por uma etnografia da vida associativa. Niterói: Editora da Universidade Federal Fluminense, 2011. p. 9-63. FERNÁNDEZ BUEY, F. Marx e os marxismos. Uma reflexão para o século XXI. In: BORON, A.; AMADEO, J.; GONZÁLEZ, S. (Org.). A teoria marxista hoje: problemas e perspectivas. 1. ed. 1. reimp. Buenos Aires: Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales – CLACSO, 2006. p. 51-97. FERREIRA JÚNIOR, A. Entalhadores do efêmero: a vida associativa na criação dos Brinquedos de Miriti de Abaetetuba. 2015. 198 f. Dissertação (Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento) – Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Universidade Federal do Pará, Belém, 2015. FERREIRA JÚNIOR, A.; FIGUEIREDO, S. L. Notas introdutórias para o estudo da vida associativa dos artesãos de miriti: relatório de campo. Papers do NAEA, Belém, n. 334, p. 1-33, dez. 2014a. Disponível em: <http://www.naea.ufpa.br/naea/novosite/paper/408>. Acesso em: 17 fev. 2015. ______. Turismo Cultural na Amazônia: ressonância de processos afetivos, sensíveis e morais em um festival cultural em Abaetetuba, Pará. In: EICS - Encontro Internacional
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