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Nas redes do gol e da exploração
           Estudo mostra como futebol é usado para cooptação
               de bolivianos que trabalham em confecções

MARIA ALICE DA
CRUZ

Histórias em comum se
multiplicam na Praça
da Kantuta, em São
Paulo, onde a presença
de      bolivianos        é
predominante. Muitos
com o sonho de atuar
em algum grande time
de futebol brasileiro,
outros com a proposta
de sobreviver com os
honorários     de     uma
confecção qualquer. O
perfil             desses
imigrantes foi traçado
durante        conversas
entre 72 pessoas do
grupo e o professor de
educação             física
Ubiratan Silva Alves. O
relacionamento,        que
teve       início        na
organização      de     um
torneio     de     futebol
entre             equipes
bolivianas, na Kantuta,
resultou na tese de
doutorado: “Os imigrantes bolivianos em São Paulo: a praça Kantuta e o
futebol”.

O vaivém de “boleiros” jovens vestindo uniformes de time de futebol
chamou a atenção do professor, que decidiu se oferecer para organizar um
torneio, a partir do qual passou a conhecer melhor os tecelões bolivianos.
As conclusões do pesquisador, depois das conversas, não são de um povo
feliz e realizado, mas de pessoas que têm uma perspectiva de vida
imediata, em que se ganha de manhã para comer à noite e que já chega ao
Brasil com um endividamento gigantesco. Como pagar? Difícil saber, de
acordo com Alves, pois o dono da confecção é o dono da casa e,
geralmente, o dono da equipe de futebol defendida pelos jogadores (ou
seriam trabalhadores?).

O que Alves recebeu como resultado da curiosidade que o levou ao dia a dia
dessas pessoas foi um grupo de gente sofrida, que se comporta geralmente
como um cidadão ilegal, devendo grande parte de seu salário ao próprio
patrão, que é quem coopta jovens conterrâneos com a promessa de
emprego em sua confecção em São Paulo e uma vaga em sua equipe de
futebol. Diante da realidade encontrada, o futebol passou a ser somente a
porta de chegada para a pesquisa.
O futebol em si não se inicia nem se termina dentro da quadra. Existe uma
rede de configurações que se formam a partir do esporte, explica o
professor. Como as equipes são formadas por funcionários e trabalhadores
do ramo da costura, os jogadores têm dupla obediência diante de seu
patrão, também conhecido como “delegado”. É ele quem banca a equipe
com uniforme, pagamento de inscrição e, às vezes, uma cervejinha ou um
refrigerante após o jogo. O “delegado” é um representante legal da equipe
nas reuniões, nas votações. Diante disso, o jogador não pode jogar onde
bem entender.


“Como o boliviano nem tem condições de vir, ele já chega com uma dívida
de transporte, alimentação e passa a ter uma dívida de moradia e de
emprego. Trabalha para pagar contas contraídas apenas para vir até o
Brasil. Ele fica praticamente algemado ao dono da confecção”, relata Alves.

R$ 0,15 por peça

O chão da fábrica é o mesmo do quarto em que se dorme para a maioria
das famílias, que se juntam num mesmo galpão. “A máquina está de um
lado e, atrás da cortina, estão o berço e a cama”, revela Alves. Já que
acordam no ambiente de trabalho, o dia começa cedo, com a expectativa de
finalizar o maior número de peças, pelas quais recebem, em média, R$ 0,15
a unidade. São quase 16 horas diárias na máquina de costura. “Nem dá
para dizer que tiram emprego de alguém. Que brasileiro dedicaria 16 horas
de seu dia numa máquina de costura para ganhar R$ 0,15 por peça de
roupa?”, pondera Alves.

O receio da deportação faz com que
sejam submissos ao patrão, segundo o
pesquisador, e por isso fazem tudo o que
lhes é imposto. “Jogam bola em seu time,
trabalham no fim de semana e pagam a
dívida. Eles preferem não trabalhar com
bolivianos, mas sim com os coreanos. Eles
acham o coreano mais sério no que diz
respeito ao pagamento. Sem documentos,
temem ser denunciados à Polícia Federal
e, em seguida, deportados, caso resolvam
reclamar seus direitos trabalhistas ao
empregador boliviano”, explica Alves.

A partir de suas conversas, Alves
descobriu que não há interesse dos
bolivianos em voltar para seu país. Poucos
guardam dinheiro para retornar à Bolívia
de forma definitiva. Praticamente, todos
querem juntar dinheiro para constituir
família no Brasil e mudar de casa. A discordância com algumas atitudes do
governo boliviano é um dos motivos. Nas eleições, são enviadas urnas para
que os bolivianos votem no país onde estão instalados, principalmente na
América do Sul. Além de não oferecerem gastos ao governo, os emigrantes
da Bolívia ainda mandam dinheiro para os parentes que usam esta renda
dentro do país.
De acordo com a Polícia Federal, há cerca de 500 mil bolivianos vivendo no
Brasil de forma ilegal. Atualmente, na capital de São Paulo, estão
espalhados por toda a cidade, principalmente pelo centro, zona norte e zona
leste, mas com muitas ramificações por cidades da Grande São Paulo, de
acordo com Alves.


Mesmo tendo uma quantidade crescente de adeptos das anistias concedidas
pelo governo brasileiro aos imigrantes, os números estão bem aquém da
realidade existente no Brasil. Nas quatro últimas anistias, foram
beneficiados 27 mil estrangeiros em 1981, 30 mil em 1988, em torno de 39
mil em 1998 e mais de 40 mil em 2009, sendo mais de 40% bolivianos
(16.881), seguidos de chineses (5.492), peruanos (4.642), paraguaios
(4.135) e coreanos (1.129).


Em 2009, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a chamada Lei
da Anistia Migratória, a qual autoriza a residência provisória de cidadãos
estrangeiros em situação irregular no Brasil. A nova lei permite que todos
os estrangeiros que estejam em situação irregular e tenham entrado no
Brasil até o dia 1º de fevereiro de 2009 regularizem sua situação e tenham
liberdade de circulação, direito de trabalhar, acesso à saúde e à educação
públicas e à Justiça. Porém, a adesão não foi unânime.

Cidadania
Para ter qualquer tipo de direito, um dos caminhos dos bolivianos era gerar
um cidadão brasileiro e assim ser tornarem legalizados. Já as crianças que
vinham ilegais, permaneciam ilegais e os pais, sem documentação
brasileira, não conseguiam matricular os filhos no ensino brasileiro. Diante
disso e por reconhecer que com todos os problemas, segundo eles, a Bolívia
ainda oferece um ensino de melhor qualidade que o brasileiro, muitos casais
deixam os filhos sob cuidado dos avós, na Bolívia, a fim de assegurar-lhes o
direito a uma boa educação.


Mas a escola no Brasil não é o melhor local de convivência para os filhos de
bolivianos, principalmente para os collas, descendentes de indígenas, pois
são vítimas de bulling. Muitas das crianças entrevistadas por Alves
reclamaram que são alvo de chacotas no espaço escolar. Segundo o
professor, há especialistas estudando o fenômeno. Recentemente, de
acordo com o pesquisador, a mídia veiculou um caso de bulling contra uma
criança descendente de bolivianos. A característica física dos filhos dos
collas (cabelos negros, lisos e grossos, pele escura e olhos levemente
puxados) acaba chamando a atenção de outras crianças, e elas acabam
sendo vítimas de gozação e exclusão, segundo Alves.

Saúde
Por conta do pó gerado pelos tecidos, os bolivianos têm doenças
respiratórias. Queixas sobre problemas posturais também estão entre as
ouvidas por Alves durante as conversas. “Eles só levantam para ir ao
banheiro, pois trabalham na própria máquina”, relata.
A anemia também atinge boa parte da população boliviana em São Paulo,
principalmente os que atuam nas oficinas. Segundo Alves, além de não se
alimentarem em horários regulares, o tipo, a qualidade e a quantidade de
alimentos por eles ingeridos nem sempre são adequados para suprir as
necessidades diárias do organismo. A falta de recursos para consumir carne
vermelha e feijão é uma das causas do alto índice de anemia entre eles. O
pesquisador acrescenta que, como a doença causa fadiga generalizada e
indisposição, os bolivianos anêmicos ficam privados de trabalhar e de gerar
renda.


O atendimento médico, porém, esbarra na falta de documentação brasileira.
E os bolivianos irregulares acabam contando com a boa vontade de alguns
profissionais da área de saúde e da Pastoral do Imigrante, na Igreja Nossa
Senhora da Paz, no bairro do Glicério, em São Paulo.


A situação só é melhor para uma minoria que conseguiu juntar algum
dinheiro e pode se dar o direito ao lazer. Mas a maioria se contenta com o
um “pedacinho da Bolívia” em São Paulo, que é a praça Kantuta, localizada
no bairro do Canindé, próxima à estação Armênia do metrô, onde, nas
feiras dominicais, podem se fartar da culinária de seu país, como a
saltenha, comprar artesanato típico da Bolívia, assistir a apresentações
musicais e culturais, procurar emprego e até namorar. A quadra de futsal,
principal palco da pesquisa de doutorado, em que Alves traçou toda a
logística do campeonato de futebol para a comunidade, já não faz mais
parte do cenário da Kantuta. Os mais favorecidos economicamente,
segundo o pesquisador, conseguem viajar, matar a vontade de conhecer o
mar e visitar famosos estádios de futebol, principal atividade de lazer de um
povo que buscou o Brasil com intenção de melhorar sua qualidade de vida

................................................

Publicação
Tese: “Imigrantes bolivianos em São Paulo: a Praça Kantuta e o Futebol”
Autor: Ubiratan Silva Alves
Orientadora: Maria Beatriz Rocha Ferreira
Unidade: Faculdade de Educação Física (FCM)
Semana Daniel Hogan traz homenagem
              e seminários sobre projetos do demógrafo
         Eventos no Nepo marcam o 1º ano da morte do pioneiro
              nos estudos associando população e ambiente

LUIZ SUGIMOTTO

O professor Daniel Hogan
orientou     67    trabalhos    de
iniciação       científica,     20
dissertações de mestrado e 21
teses de doutorado; escreveu
14 livros, 54 capítulos de livros
e 38 artigos em periódicos
científicos. Uma produção que
impressiona pela intensidade e
principalmente pela qualidade,
muito dela concentrada nas
dimensões        humanas       das
mudanças                climáticas.
Entretanto, um ano após sua
morte, a característica mais
enaltecida por velhos e jovens parceiros, quase sempre com vozes
embargadas, é justamente a dimensão humana do próprio professor, a
generosidade para com todos que o cercavam.

A Semana Daniel Hogan, que vai de 26 a 29 de abril, será de homenagem e
também de apresentação e discussão de resultados das pesquisas que o
demógrafo vinha coordenando. Para isso, o Núcleo de Estudos de População
(Nepo) e o Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp
promovem dois seminários internacionais: “Mobilidade espacial e
vulnerabilidade social: desafios teórico-metodológicos e resultados de
pesquisa”, nos dias 26 e 27; e “População e espaço na mudança ambiental:
cidades, escalas e mudanças climáticas”, de 27 a 29. O primeiro evento
acontece no auditório do Nepo e o segundo no auditório do Instituto de
Economia (IE).

A professora Regina Maria Barbosa, coordenadora do Nepo, informa que a
cerimônia em homenagem a Daniel Hogan está marcada para as 18 horas
do dia 27, exatamente no aniversário da sua morte, no Centro de
Convenções. “Se em vida já tínhamos clara a grandeza da sua contribuição,
como figura central da área de população e ambiente, neste ano de
ausência e de saudade também percebemos todo o seu legado: tanto nas
pesquisas que ele deixou em curso, como nos recursos humanos que
formou e que estão fazendo avançar o seu trabalho”.

Na mesma noite serão apresentados vídeos com entrevistas do professor
sobre as pesquisas que vinha desenvolvendo e, em paralelo, uma mostra
organizada pelo Siarq (Arquivo Central da Unicamp) com alguns itens do
acervo pessoal doado pela família à Unicamp e que recuperam sua
trajetória profissional e científica. Haverá ainda o lançamento dos livros
“População e mudança climática” e “População e ambiente: desafios à
sustentabilidade”, além do último número dos cadernos Nepo. “É uma
cerimônia singela, mas esperamos fazer jus à memória do professor Daniel
e a tudo que deixou para nós pesquisadores, do Nepo em especial e da
Unicamp de forma mais ampla”.
O norte-americano Daniel Hogan já era
um pesquisador conceituado quando
chegou à Unicamp em meados da década
de 1970, depois de uma passagem pela
Cornell University, onde defendeu tese de
doutorado sobre migração interna com
foco na cidade de São Paulo. Ajudou a
consolidar o IFCH, formando várias
gerações de demógrafos, sociólogos e
geógrafos. Ele foi um dos primeiros
convidados a integrar o Nepo, onde
aceitou o desafio de criar a área de
população e ambiente quando ninguém
pensava em fazer esta associação no país.

População e ambiente

O professor Plínio Dentzien, um dos
velhos parceiros que marcarão presença na noite do dia 27, vinha da
Universidade de Michigan e ingressou no Departamento de Sociologia quase
ao mesmo tempo do que Hogan. “Como não sou da área, por várias vezes
me referia a ambiente deixando a população de fora. E ele pedia atenção:
„Não é bem assim‟. No seu ponto de vista, ambos se misturam e não há
como pensar o crescimento populacional sem levar em conta o território.
Hoje, nenhum pesquisador exclui a população do ambiente”.

Plínio Dentzien lembra que suas famílias se frequentavam muito,
juntamente com as de outros docentes da Unicamp, por conta também da
convivência entre os filhos de idades próximas. “Havia um grupo que se
encontrava sempre nos finais de semana. Foi Michel Debrun quem nos
avisou que, para frequentar o conjunto poliesportivo da Ponte Preta, não
era preciso se associar, só pagar uma mensalidade. O que nos interessava
era a piscina. Muitas vezes almoçávamos por lá, depois de uma caipirinha”.

A pouca paciência de Hogan para traduzir os textos que produzia em inglês,
levou Dentzien a acompanhar mais de perto e com interesse o trabalho do
amigo. “Traduzi muito material dele para o português. Diria que dentro da
área de ciências sociais na Unicamp, poucos terão feito pesquisa tão
relevante, de boa qualidade. Eram questões da ordem do dia na sociedade
brasileira. Como figura humana, o que me chamava atenção era a
serenidade. Nunca criava conflitos, ao contrário, era o mediador que os
resolvia. Esta característica tornava fácil o convívio com ele”.

O professor Roberto Luiz do Carmo, parceiro mais recente de Hogan no
Nepo, lamenta não estar presente na semana de homenagens ao mestre,
que o convidou a se juntar ao grupo quando soube de seu interesse por
meio ambiente. Hoje docente do Departamento de Demografia, Carmo faz
pós-doutorado na Brown University, nos EUA – e de lá vem uma das vozes
embargadas. “Devo passar o ano por aqui, cuidando da minha carreira
acadêmica para poder dar continuidade aos estudos que o professor Daniel
iniciou”.
Na opinião de Roberto do Carmo, a maior
qualidade de Hogan era a generosidade
com as pessoas, aceitando-as como são.
“Ele tinha grande capacidade de reunir
pesquisadores de gênios completamente
diferentes e promover a convivência,
dando a mesma atenção tanto a um
iniciante como a um pós-doc. Lembro-me
que quando incentivou minha ida a um
congresso na Alemanha, em 2000, a
preocupação com as mudanças climáticas
era vista como folclórica na academia.
Antever o que vinha pela frente era outra
grande qualidade do professor e, dez anos
depois, temos uma área de estudos
bastante consolidada”.

A mostra e o último livro

A mostra preparada pelo Siarq, segundo o pesquisador Eduardo Marandola
Jr., traz algumas peças do acervo pessoal de Daniel Hogan que ainda vai
ser processado ao longo do próximo ano, antes de ser disponibilizado para a
comunidade científica. “São livros, periódicos, relatórios, teses e
dissertações, com destaque para o material bibliográfico da área de
população em ambiente que é único. Há ainda uma coleção significativa dos
clássicos da sociologia urbana e ambiental, além dos cadernos de anotações
em reuniões e eventos – como o professor ocupou inúmeros cargos, trata-
se de uma rica memória institucional da Universidade”.

“População e ambiente: desafios à sustentabilidade” é o último livro escrito
por Daniel Hogan, em co-autoria com os pesquisadores Marandola Jr. e
Ricardo Ojima. A obra é a primeira de uma série de dez volumes sobre
sustentabilidade, coordenada pelo professor José Goldemberg e lançada em
dezembro de 2010 pela Blucher Editora. “Estamos fazendo um
relançamento na Unicamp. Trata-se de uma revisão da questão
populacional e sua relação com o meio ambiente e um panorama deste
campo de estudos: mudança climática, urbanização, análise do espaço e
constituição desta área de pesquisa. Como o livro foi finalizado depois do
falecimento do professor Daniel, fazemos uma introdução uma deferência à
sua trajetória”, explica Ricardo Ojima.

Seminários internacionais

O seminário “Mobilidade espacial e vulnerabilidade social: desafios teórico-
metodológicos e resultados de pesquisa” é organizado pelo professor José
Marcos Pinto da Cunha e vai apresentar resultados de um projeto temático
Fapesp coordenado pelo próprio e que tinha Daniel Hogan entre os
pesquisadores principais.

No segundo seminário, “População e espaço na mudança ambiental:
cidades, escalas e mudanças climáticas”, organizado por Ricardo Ojima,
serão abordados dois subprojetos sobre mudanças climáticas lideradas pelo
professor Carlos Nobre, do INPE, e no qual Hogan era responsável pelas
dimensões humanas, especialmente sobre urbanização e cidades. A partir
deste encontro, será organizado um livro como pesquisadores de várias
instituições do país.
Em relação ao evento sob sua responsabilidade, Ojima informa que os
palestrantes são vinculados aos subprojetos em pauta e ao grupo de
trabalho em População e Meio Ambiente da Associação Brasileira de Estudos
Populacionais (Abep). “Temos convidados de outras universidades do país e
também especialistas internacionais: Sébastien Oliveau, da Universidade de
Provence, e Alex De Sherbinin, da Columbia University, que é nosso
parceiro de longa data. As duas sessões temáticas também terão trabalhos
enviados do exterior, em resposta à divulgação internacional que fizemos
do evento. Quanto ao público, já temos mais de 300 inscrições, que são
gratuitas”.

No seminário dos dias 26 e 27, haverá sessões sobre “Mobilidade Espacial
da População: desafios teóricos e metodológicos”, “O estudo dos
movimentos migratórios no Brasil: avanços teóricos”, “Dados e técnicas de
análise da mobilidade espacial da população”, “Mobilidade, segregação
espacial e vulnerabilidade social: resultados de pesquisa” e “Família,
ambiente, mobilidade urbana e vulnerabilidade social: resultados de
pesquisa”.

Os trabalhos do segundo seminário começam efetivamente no dia seguinte
à homenagem a Daniel Hogan, 28, com a mesa-redonda matinal intitulada
“População e espaço: o desafio das escalas na compreensão da mudança
ambiental”, e a sessão temática da tarde, “Abordagens teóricas e
metodológicas em população, espaço e ambiente”; no dia 29, a sessão
“Mudanças climáticas e cidades: temas emergentes” e a mesa-redonda
“Urbanização e mudanças climáticas: entre mitigação e adaptação nas
políticas urbanas”.

              Quais são os impactos sociais da migração?
                 Tese detalha componentes da mobilidade
               espacial na Região Metropolitana de Campinas

CARMO DO GALLO NETTO

Temor,      desconfiança      ou
antipatia pelos que vêm de fora
constituem o que se denomina
de xenofobia. Paradoxalmente
às     manifestações      desses
sentimentos, estudos mostram
que a mobilidade espacial das
populações representa um dos
mais importantes componentes
do crescimento demográfico e
desenvolvimento       econômico
das metrópoles, antigas ou
recentes,    caso   da    Região
Metropolitana    de    Campinas
(RMC). Mestrado desenvolvido
no Núcleo de Estudos de
População (Nepo) por Ednelson
Mariano    Dota     analisa   as
motivações da migração e sua
implicação para os migrantes
no âmbito da RM de Campinas.
O estudo busca compreender a atuação das variáveis que interferem nas
modalidades migratórias e nos seus principais fluxos, de forma a explicar a
manutenção da região como o principal pólo atrativo de população do
Estado de São Paulo. O autor acredita, embora não seja objetivo explicitado
em sua proposta de estudo, que a dissertação – apresentada no Instituto de
Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp e orientada pelo professor
José Marcos Pinto da Cunha – possa contribuir para o entendimento de que
os migrantes não constituem problema, mas semelhantemente aos
“naturais”, buscam situações melhores.

O estudo considerou os vários tipos de migrações e principalmente se
deteve em caracterizar o migrante: quem é ele, motivações que
possibilitaram sua mobilidade, as razões que o levavam à escolha do novo
local. Estabelece também uma comparação inédita entre eles e os
moradores locais com perfil semelhante, mas que não se decidiram pela
migração. Procura explicar ainda as razões da escolha de determinados
centros pelos migrantes e porque certas cidades os atraíram apenas em
uma época.

Para Dota, a migração é um fenômeno que mantém estreita relações com a
conjuntura demográfica e econômica de determinado momento histórico e,
por isso, não pode ser entendida isoladamente sem que se considerem
essas conjunturas em nível local, regional e nacional – e até global no caso
da migração internacional. Lembra que na RMC os fluxos migratórios
alcançaram volumes relevantes desde a década de 70, embora
apresentassem importantes modificações ao longo destes quarenta anos,
adquirindo atualmente novas características devido aos empreendimentos
que se têm instalado na região. A propósito, ele afirma que a redução do
crescimento demográfico observado nos últimos anos, paralela à queda das
migrações de longa distância, coloca em evidência as modalidades
migratórias de curta distância, circunscritas aos municípios da RM e
diretamente associadas ao crescimento demográfico e expansão urbana.

Ele constata ainda que essa migração entre municípios não é aleatória, mas
direcionada pelo processo de produção do espaço urbano, entendido como a
forma em que a área urbana cresce e se estrutura. A delimitação e o
desenvolvimento do espaço urbano é que determina para onde as pessoas
se dirigem em função de anseios e possibilidades econômicas. Ao menos na
população pobre, esclarece ele, sua produção é determinada por amplos
fatores, que fogem do escopo social e da decisão em nível individual.

O desenvolvimento desse espaço e sua modelação estão atrelados
principalmente a três fatores: ações do Estado, atuação do mercado
imobiliário e participação dos agentes e movimentos sociais. A dissertação
analisa    motivações    e   implicações  das  modalidades     migratórias
intrametropolitanas – assim entendidas as que se dão entre os municípios
da própria RMC – e as externas, provenientes de outras regiões do estado
ou do país, ou até do exterior.

Para analisar o processo de crescimento e consolidação da RMC decorrente
da migração e à luz da produção do espaço urbano, o autor vale-se de
subsídios colhidos na geografia, no urbanismo, na demografia, na
economia, dos dados do Censo Demográfico de 2001 e da Pesquisa
Domiciliar do Projeto Vulnerabilidade, realizado pela equipe do Nepo em
2007, coordenada pelo professor José Marcos Pinto da Cunha e que contou
com apoio da Fapesp e do CNPq.
Em vista disso, ele considera que o trabalho utilizou dados de certa forma
diferenciados em relação aos encontrados nas pesquisas tradicionais, como
o censo demográfico. “Neste contexto, poderia dizer que o estudo apresenta
inovação quando se aprofunda na busca da compreensão das motivações da
migração no âmbito de RM e, principalmente, porque enfoca diferentes
modalidades migratórias ao considerar os diferenciais que caracterizam as
migrações intrametropolitanas e externas e, ainda, o que é mais inovador,
ao explicitar as diferenças destes migrantes em relação aos que não
migram”. Em razão disto, o pesquisador analisou os fatores que
determinam a mobilidade e a imobilidade, pois considera que, como a
migração, a “não-migração” também é seletiva.

Conclusões
Geógrafo de formação, Dota enfatiza algumas contribuições decorrentes da
pesquisa. Constata que os migrantes intrametropolitanos apresentam
melhores condições em relação aos externos como, por exemplo, maior
acesso à aquisição da casa própria e menor dependência do aluguel.
Observa também a melhoria de condições entre os fluxos que partem de
Campinas em relação àqueles com origem nos municípios do entorno.

Outra conclusão é a de que a distribuição da população e dos vínculos
empregatícios na região é muito desigual, explicado pela forma como o
espaço urbano se configura, reproduzindo desigualdades ao direcionar
parcelas da população para os diversos subespaços. O pesquisador
considera particularmente interessante o acesso à infraestrutura. O menor
acesso a ela por parte dos migrantes intrametropolitanos decorre da
aquisição da habitação própria em regiões precárias, mas mais acessíveis
economicamente. Porém, com a consolidação dessas áreas, esse migrante
tende a atingir melhor situação em relação aos que continuam pagando
aluguel.


O que move os migrantes é a melhoria das condições de vida, ao passo que
os não-migrantes visam mantê-la, diz Dota. “Apresentando ao menos parte
das motivações que levam os migrantes a se colocarem em movimento, os
“não-migrantes” revelam razões que os impedem ao deslocamento”. O
autor do estudo esclarece que há os que não migram por estarem bem
situados na cidade (ricos) e os que apresentam condições propícias para
fazê-lo – habitação e trabalho satisfatórios –, mas são impedidos pela
organização familiar, principalmente pela alta proporção de dependentes,
na maioria jovem. Acrescenta que a mobilidade e a imobilidade territorial
estão atreladas fundamentalmente à necessidade de sobrevivência.

Estratégias
Lembrando que o trabalho nasceu do anseio de verificar se a migração na
RM de Campinas levaria à mobilidade social e procurando entendê-la à luz
dos processos de produção e reprodução do espaço urbano, afirma que o
processo altera as condições de vida para melhor ou no mínimo contribuem
para não deteriorá-la. Esclarece, entretanto, que “a migração constitui
estratégia de melhoria social, mas não representa mais mobilidade social”.


De outra forma, o desenvolvimento do espaço urbano, calcado em múltiplos
interesses desprovidos de preocupações sociais, faz com que parcelas da
população recorram a soluções emergenciais para sobreviver e as levam a
ocupações de áreas precárias. De outra forma, os mecanismos de
valorização e desvalorização devido a mudanças de usos dos pontos
urbanos determinam a expulsão de uns e atração de outros. Em decorrência
desses mecanismos, restam, à população pobre, espaços “pré-
determinados”, com condições muitas vezes precárias em infraestrutura e
acesso, mas variáveis dependendo dos rendimentos disponíveis.

Essas constatações levam o autor a concluir que a migração na região, e
talvez de maneira geral no Brasil, não está associada à mobilidade social e
tem uma função muito mais de “adaptação” às condições vigentes em cada
momento, a partir das conjunturas econômicas ou sócio-demográficas que
influenciam o cotidiano dos indivíduos.

Segundo Dota, os fluxos relacionados ao mercado de trabalho evidenciam
que os migrantes buscam estabilidade econômica. Os que não apresentam
esta problemática, caso principalmente das migrações intrametropolitanas,
a exemplo de outros fluxos, buscam melhores condições de vida. Ele
destaca, entretanto, que a diferença entre esses migrantes e os externos
reside no conhecimento que os primeiros acumulam da região, o que os
possibilita mudarem de município sem deixarem o emprego.

Portanto, diz ele, a migração intrametropolitana apresenta forte ligação com
as questões habitacionais, com grande relevância na aquisição da casa
própria. Mas essa decisão muitas vezes os leva para situações ainda mais
precárias, visto que se direcionam para espaços não consolidados,
periféricos e com pouca infraestrutura.

Entre os migrantes externos é significativa a parcela dos que pagam aluguel
ou moram com outras famílias, o que os direciona geralmente para áreas
mais consolidadas e com melhores condições de acesso aos serviços.
Apesar    dessas   facilidades,   Dota    constatou    que   os   migrantes
intrametropolitanos ostentam melhores condições econômicas que os
externos, o que se evidencia pela aquisição de habitação.

Para o pesquisador, os dados analisados, embora de forma ainda não
conclusiva, “indicam que a imobilidade, ao menos em parte da população,
pode estar condicionada pela organização familiar e não pela existência de
vida digna”.

Segundo Dota, os estudos permitem indicar que o crescimento horizontal da
mancha urbana metropolitana tende a continuar apresentando condições
precárias de habitação e acesso, principalmente nos locais de maior
acessibilidade econômica. E serão as leis de mercado que definirão a
ocupação desses espaços pelas populações mais pobres ou mais bem
aquinhoadas. Para ele, as estimativas indicam que os municípios que se
destacaram durante a década de 90 em relação à atratividade de migrantes
devem continuar nessa posição salvo pequenas modificações, previsão que
o Censo Demográfico de 2010 poderá confirmar.

................................................
Publicação
Dissertação: Migração na RM de Campinas: produção de espaço urbano e
impactos sociais
Autor: Ednelson Mariano Dota
Orientador: José Marcos Pinto da Cunha
Unidade: Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH/Nepo)
Financiamento: Capes

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  • 1.
  • 2. Nas redes do gol e da exploração Estudo mostra como futebol é usado para cooptação de bolivianos que trabalham em confecções MARIA ALICE DA CRUZ Histórias em comum se multiplicam na Praça da Kantuta, em São Paulo, onde a presença de bolivianos é predominante. Muitos com o sonho de atuar em algum grande time de futebol brasileiro, outros com a proposta de sobreviver com os honorários de uma confecção qualquer. O perfil desses imigrantes foi traçado durante conversas entre 72 pessoas do grupo e o professor de educação física Ubiratan Silva Alves. O relacionamento, que teve início na organização de um torneio de futebol entre equipes bolivianas, na Kantuta, resultou na tese de doutorado: “Os imigrantes bolivianos em São Paulo: a praça Kantuta e o futebol”. O vaivém de “boleiros” jovens vestindo uniformes de time de futebol chamou a atenção do professor, que decidiu se oferecer para organizar um torneio, a partir do qual passou a conhecer melhor os tecelões bolivianos. As conclusões do pesquisador, depois das conversas, não são de um povo feliz e realizado, mas de pessoas que têm uma perspectiva de vida imediata, em que se ganha de manhã para comer à noite e que já chega ao Brasil com um endividamento gigantesco. Como pagar? Difícil saber, de acordo com Alves, pois o dono da confecção é o dono da casa e, geralmente, o dono da equipe de futebol defendida pelos jogadores (ou seriam trabalhadores?). O que Alves recebeu como resultado da curiosidade que o levou ao dia a dia dessas pessoas foi um grupo de gente sofrida, que se comporta geralmente como um cidadão ilegal, devendo grande parte de seu salário ao próprio patrão, que é quem coopta jovens conterrâneos com a promessa de emprego em sua confecção em São Paulo e uma vaga em sua equipe de futebol. Diante da realidade encontrada, o futebol passou a ser somente a porta de chegada para a pesquisa.
  • 3. O futebol em si não se inicia nem se termina dentro da quadra. Existe uma rede de configurações que se formam a partir do esporte, explica o professor. Como as equipes são formadas por funcionários e trabalhadores do ramo da costura, os jogadores têm dupla obediência diante de seu patrão, também conhecido como “delegado”. É ele quem banca a equipe com uniforme, pagamento de inscrição e, às vezes, uma cervejinha ou um refrigerante após o jogo. O “delegado” é um representante legal da equipe nas reuniões, nas votações. Diante disso, o jogador não pode jogar onde bem entender. “Como o boliviano nem tem condições de vir, ele já chega com uma dívida de transporte, alimentação e passa a ter uma dívida de moradia e de emprego. Trabalha para pagar contas contraídas apenas para vir até o Brasil. Ele fica praticamente algemado ao dono da confecção”, relata Alves. R$ 0,15 por peça O chão da fábrica é o mesmo do quarto em que se dorme para a maioria das famílias, que se juntam num mesmo galpão. “A máquina está de um lado e, atrás da cortina, estão o berço e a cama”, revela Alves. Já que acordam no ambiente de trabalho, o dia começa cedo, com a expectativa de finalizar o maior número de peças, pelas quais recebem, em média, R$ 0,15 a unidade. São quase 16 horas diárias na máquina de costura. “Nem dá para dizer que tiram emprego de alguém. Que brasileiro dedicaria 16 horas de seu dia numa máquina de costura para ganhar R$ 0,15 por peça de roupa?”, pondera Alves. O receio da deportação faz com que sejam submissos ao patrão, segundo o pesquisador, e por isso fazem tudo o que lhes é imposto. “Jogam bola em seu time, trabalham no fim de semana e pagam a dívida. Eles preferem não trabalhar com bolivianos, mas sim com os coreanos. Eles acham o coreano mais sério no que diz respeito ao pagamento. Sem documentos, temem ser denunciados à Polícia Federal e, em seguida, deportados, caso resolvam reclamar seus direitos trabalhistas ao empregador boliviano”, explica Alves. A partir de suas conversas, Alves descobriu que não há interesse dos bolivianos em voltar para seu país. Poucos guardam dinheiro para retornar à Bolívia de forma definitiva. Praticamente, todos querem juntar dinheiro para constituir família no Brasil e mudar de casa. A discordância com algumas atitudes do governo boliviano é um dos motivos. Nas eleições, são enviadas urnas para que os bolivianos votem no país onde estão instalados, principalmente na América do Sul. Além de não oferecerem gastos ao governo, os emigrantes da Bolívia ainda mandam dinheiro para os parentes que usam esta renda dentro do país.
  • 4. De acordo com a Polícia Federal, há cerca de 500 mil bolivianos vivendo no Brasil de forma ilegal. Atualmente, na capital de São Paulo, estão espalhados por toda a cidade, principalmente pelo centro, zona norte e zona leste, mas com muitas ramificações por cidades da Grande São Paulo, de acordo com Alves. Mesmo tendo uma quantidade crescente de adeptos das anistias concedidas pelo governo brasileiro aos imigrantes, os números estão bem aquém da realidade existente no Brasil. Nas quatro últimas anistias, foram beneficiados 27 mil estrangeiros em 1981, 30 mil em 1988, em torno de 39 mil em 1998 e mais de 40 mil em 2009, sendo mais de 40% bolivianos (16.881), seguidos de chineses (5.492), peruanos (4.642), paraguaios (4.135) e coreanos (1.129). Em 2009, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a chamada Lei da Anistia Migratória, a qual autoriza a residência provisória de cidadãos estrangeiros em situação irregular no Brasil. A nova lei permite que todos os estrangeiros que estejam em situação irregular e tenham entrado no Brasil até o dia 1º de fevereiro de 2009 regularizem sua situação e tenham liberdade de circulação, direito de trabalhar, acesso à saúde e à educação públicas e à Justiça. Porém, a adesão não foi unânime. Cidadania Para ter qualquer tipo de direito, um dos caminhos dos bolivianos era gerar um cidadão brasileiro e assim ser tornarem legalizados. Já as crianças que vinham ilegais, permaneciam ilegais e os pais, sem documentação brasileira, não conseguiam matricular os filhos no ensino brasileiro. Diante disso e por reconhecer que com todos os problemas, segundo eles, a Bolívia ainda oferece um ensino de melhor qualidade que o brasileiro, muitos casais deixam os filhos sob cuidado dos avós, na Bolívia, a fim de assegurar-lhes o direito a uma boa educação. Mas a escola no Brasil não é o melhor local de convivência para os filhos de bolivianos, principalmente para os collas, descendentes de indígenas, pois são vítimas de bulling. Muitas das crianças entrevistadas por Alves reclamaram que são alvo de chacotas no espaço escolar. Segundo o professor, há especialistas estudando o fenômeno. Recentemente, de acordo com o pesquisador, a mídia veiculou um caso de bulling contra uma criança descendente de bolivianos. A característica física dos filhos dos collas (cabelos negros, lisos e grossos, pele escura e olhos levemente puxados) acaba chamando a atenção de outras crianças, e elas acabam sendo vítimas de gozação e exclusão, segundo Alves. Saúde Por conta do pó gerado pelos tecidos, os bolivianos têm doenças respiratórias. Queixas sobre problemas posturais também estão entre as ouvidas por Alves durante as conversas. “Eles só levantam para ir ao banheiro, pois trabalham na própria máquina”, relata.
  • 5. A anemia também atinge boa parte da população boliviana em São Paulo, principalmente os que atuam nas oficinas. Segundo Alves, além de não se alimentarem em horários regulares, o tipo, a qualidade e a quantidade de alimentos por eles ingeridos nem sempre são adequados para suprir as necessidades diárias do organismo. A falta de recursos para consumir carne vermelha e feijão é uma das causas do alto índice de anemia entre eles. O pesquisador acrescenta que, como a doença causa fadiga generalizada e indisposição, os bolivianos anêmicos ficam privados de trabalhar e de gerar renda. O atendimento médico, porém, esbarra na falta de documentação brasileira. E os bolivianos irregulares acabam contando com a boa vontade de alguns profissionais da área de saúde e da Pastoral do Imigrante, na Igreja Nossa Senhora da Paz, no bairro do Glicério, em São Paulo. A situação só é melhor para uma minoria que conseguiu juntar algum dinheiro e pode se dar o direito ao lazer. Mas a maioria se contenta com o um “pedacinho da Bolívia” em São Paulo, que é a praça Kantuta, localizada no bairro do Canindé, próxima à estação Armênia do metrô, onde, nas feiras dominicais, podem se fartar da culinária de seu país, como a saltenha, comprar artesanato típico da Bolívia, assistir a apresentações musicais e culturais, procurar emprego e até namorar. A quadra de futsal, principal palco da pesquisa de doutorado, em que Alves traçou toda a logística do campeonato de futebol para a comunidade, já não faz mais parte do cenário da Kantuta. Os mais favorecidos economicamente, segundo o pesquisador, conseguem viajar, matar a vontade de conhecer o mar e visitar famosos estádios de futebol, principal atividade de lazer de um povo que buscou o Brasil com intenção de melhorar sua qualidade de vida ................................................ Publicação Tese: “Imigrantes bolivianos em São Paulo: a Praça Kantuta e o Futebol” Autor: Ubiratan Silva Alves Orientadora: Maria Beatriz Rocha Ferreira Unidade: Faculdade de Educação Física (FCM)
  • 6. Semana Daniel Hogan traz homenagem e seminários sobre projetos do demógrafo Eventos no Nepo marcam o 1º ano da morte do pioneiro nos estudos associando população e ambiente LUIZ SUGIMOTTO O professor Daniel Hogan orientou 67 trabalhos de iniciação científica, 20 dissertações de mestrado e 21 teses de doutorado; escreveu 14 livros, 54 capítulos de livros e 38 artigos em periódicos científicos. Uma produção que impressiona pela intensidade e principalmente pela qualidade, muito dela concentrada nas dimensões humanas das mudanças climáticas. Entretanto, um ano após sua morte, a característica mais enaltecida por velhos e jovens parceiros, quase sempre com vozes embargadas, é justamente a dimensão humana do próprio professor, a generosidade para com todos que o cercavam. A Semana Daniel Hogan, que vai de 26 a 29 de abril, será de homenagem e também de apresentação e discussão de resultados das pesquisas que o demógrafo vinha coordenando. Para isso, o Núcleo de Estudos de População (Nepo) e o Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp promovem dois seminários internacionais: “Mobilidade espacial e vulnerabilidade social: desafios teórico-metodológicos e resultados de pesquisa”, nos dias 26 e 27; e “População e espaço na mudança ambiental: cidades, escalas e mudanças climáticas”, de 27 a 29. O primeiro evento acontece no auditório do Nepo e o segundo no auditório do Instituto de Economia (IE). A professora Regina Maria Barbosa, coordenadora do Nepo, informa que a cerimônia em homenagem a Daniel Hogan está marcada para as 18 horas do dia 27, exatamente no aniversário da sua morte, no Centro de Convenções. “Se em vida já tínhamos clara a grandeza da sua contribuição, como figura central da área de população e ambiente, neste ano de ausência e de saudade também percebemos todo o seu legado: tanto nas pesquisas que ele deixou em curso, como nos recursos humanos que formou e que estão fazendo avançar o seu trabalho”. Na mesma noite serão apresentados vídeos com entrevistas do professor sobre as pesquisas que vinha desenvolvendo e, em paralelo, uma mostra organizada pelo Siarq (Arquivo Central da Unicamp) com alguns itens do acervo pessoal doado pela família à Unicamp e que recuperam sua trajetória profissional e científica. Haverá ainda o lançamento dos livros “População e mudança climática” e “População e ambiente: desafios à sustentabilidade”, além do último número dos cadernos Nepo. “É uma cerimônia singela, mas esperamos fazer jus à memória do professor Daniel e a tudo que deixou para nós pesquisadores, do Nepo em especial e da Unicamp de forma mais ampla”.
  • 7. O norte-americano Daniel Hogan já era um pesquisador conceituado quando chegou à Unicamp em meados da década de 1970, depois de uma passagem pela Cornell University, onde defendeu tese de doutorado sobre migração interna com foco na cidade de São Paulo. Ajudou a consolidar o IFCH, formando várias gerações de demógrafos, sociólogos e geógrafos. Ele foi um dos primeiros convidados a integrar o Nepo, onde aceitou o desafio de criar a área de população e ambiente quando ninguém pensava em fazer esta associação no país. População e ambiente O professor Plínio Dentzien, um dos velhos parceiros que marcarão presença na noite do dia 27, vinha da Universidade de Michigan e ingressou no Departamento de Sociologia quase ao mesmo tempo do que Hogan. “Como não sou da área, por várias vezes me referia a ambiente deixando a população de fora. E ele pedia atenção: „Não é bem assim‟. No seu ponto de vista, ambos se misturam e não há como pensar o crescimento populacional sem levar em conta o território. Hoje, nenhum pesquisador exclui a população do ambiente”. Plínio Dentzien lembra que suas famílias se frequentavam muito, juntamente com as de outros docentes da Unicamp, por conta também da convivência entre os filhos de idades próximas. “Havia um grupo que se encontrava sempre nos finais de semana. Foi Michel Debrun quem nos avisou que, para frequentar o conjunto poliesportivo da Ponte Preta, não era preciso se associar, só pagar uma mensalidade. O que nos interessava era a piscina. Muitas vezes almoçávamos por lá, depois de uma caipirinha”. A pouca paciência de Hogan para traduzir os textos que produzia em inglês, levou Dentzien a acompanhar mais de perto e com interesse o trabalho do amigo. “Traduzi muito material dele para o português. Diria que dentro da área de ciências sociais na Unicamp, poucos terão feito pesquisa tão relevante, de boa qualidade. Eram questões da ordem do dia na sociedade brasileira. Como figura humana, o que me chamava atenção era a serenidade. Nunca criava conflitos, ao contrário, era o mediador que os resolvia. Esta característica tornava fácil o convívio com ele”. O professor Roberto Luiz do Carmo, parceiro mais recente de Hogan no Nepo, lamenta não estar presente na semana de homenagens ao mestre, que o convidou a se juntar ao grupo quando soube de seu interesse por meio ambiente. Hoje docente do Departamento de Demografia, Carmo faz pós-doutorado na Brown University, nos EUA – e de lá vem uma das vozes embargadas. “Devo passar o ano por aqui, cuidando da minha carreira acadêmica para poder dar continuidade aos estudos que o professor Daniel iniciou”.
  • 8. Na opinião de Roberto do Carmo, a maior qualidade de Hogan era a generosidade com as pessoas, aceitando-as como são. “Ele tinha grande capacidade de reunir pesquisadores de gênios completamente diferentes e promover a convivência, dando a mesma atenção tanto a um iniciante como a um pós-doc. Lembro-me que quando incentivou minha ida a um congresso na Alemanha, em 2000, a preocupação com as mudanças climáticas era vista como folclórica na academia. Antever o que vinha pela frente era outra grande qualidade do professor e, dez anos depois, temos uma área de estudos bastante consolidada”. A mostra e o último livro A mostra preparada pelo Siarq, segundo o pesquisador Eduardo Marandola Jr., traz algumas peças do acervo pessoal de Daniel Hogan que ainda vai ser processado ao longo do próximo ano, antes de ser disponibilizado para a comunidade científica. “São livros, periódicos, relatórios, teses e dissertações, com destaque para o material bibliográfico da área de população em ambiente que é único. Há ainda uma coleção significativa dos clássicos da sociologia urbana e ambiental, além dos cadernos de anotações em reuniões e eventos – como o professor ocupou inúmeros cargos, trata- se de uma rica memória institucional da Universidade”. “População e ambiente: desafios à sustentabilidade” é o último livro escrito por Daniel Hogan, em co-autoria com os pesquisadores Marandola Jr. e Ricardo Ojima. A obra é a primeira de uma série de dez volumes sobre sustentabilidade, coordenada pelo professor José Goldemberg e lançada em dezembro de 2010 pela Blucher Editora. “Estamos fazendo um relançamento na Unicamp. Trata-se de uma revisão da questão populacional e sua relação com o meio ambiente e um panorama deste campo de estudos: mudança climática, urbanização, análise do espaço e constituição desta área de pesquisa. Como o livro foi finalizado depois do falecimento do professor Daniel, fazemos uma introdução uma deferência à sua trajetória”, explica Ricardo Ojima. Seminários internacionais O seminário “Mobilidade espacial e vulnerabilidade social: desafios teórico- metodológicos e resultados de pesquisa” é organizado pelo professor José Marcos Pinto da Cunha e vai apresentar resultados de um projeto temático Fapesp coordenado pelo próprio e que tinha Daniel Hogan entre os pesquisadores principais. No segundo seminário, “População e espaço na mudança ambiental: cidades, escalas e mudanças climáticas”, organizado por Ricardo Ojima, serão abordados dois subprojetos sobre mudanças climáticas lideradas pelo professor Carlos Nobre, do INPE, e no qual Hogan era responsável pelas dimensões humanas, especialmente sobre urbanização e cidades. A partir deste encontro, será organizado um livro como pesquisadores de várias instituições do país.
  • 9. Em relação ao evento sob sua responsabilidade, Ojima informa que os palestrantes são vinculados aos subprojetos em pauta e ao grupo de trabalho em População e Meio Ambiente da Associação Brasileira de Estudos Populacionais (Abep). “Temos convidados de outras universidades do país e também especialistas internacionais: Sébastien Oliveau, da Universidade de Provence, e Alex De Sherbinin, da Columbia University, que é nosso parceiro de longa data. As duas sessões temáticas também terão trabalhos enviados do exterior, em resposta à divulgação internacional que fizemos do evento. Quanto ao público, já temos mais de 300 inscrições, que são gratuitas”. No seminário dos dias 26 e 27, haverá sessões sobre “Mobilidade Espacial da População: desafios teóricos e metodológicos”, “O estudo dos movimentos migratórios no Brasil: avanços teóricos”, “Dados e técnicas de análise da mobilidade espacial da população”, “Mobilidade, segregação espacial e vulnerabilidade social: resultados de pesquisa” e “Família, ambiente, mobilidade urbana e vulnerabilidade social: resultados de pesquisa”. Os trabalhos do segundo seminário começam efetivamente no dia seguinte à homenagem a Daniel Hogan, 28, com a mesa-redonda matinal intitulada “População e espaço: o desafio das escalas na compreensão da mudança ambiental”, e a sessão temática da tarde, “Abordagens teóricas e metodológicas em população, espaço e ambiente”; no dia 29, a sessão “Mudanças climáticas e cidades: temas emergentes” e a mesa-redonda “Urbanização e mudanças climáticas: entre mitigação e adaptação nas políticas urbanas”. Quais são os impactos sociais da migração? Tese detalha componentes da mobilidade espacial na Região Metropolitana de Campinas CARMO DO GALLO NETTO Temor, desconfiança ou antipatia pelos que vêm de fora constituem o que se denomina de xenofobia. Paradoxalmente às manifestações desses sentimentos, estudos mostram que a mobilidade espacial das populações representa um dos mais importantes componentes do crescimento demográfico e desenvolvimento econômico das metrópoles, antigas ou recentes, caso da Região Metropolitana de Campinas (RMC). Mestrado desenvolvido no Núcleo de Estudos de População (Nepo) por Ednelson Mariano Dota analisa as motivações da migração e sua implicação para os migrantes no âmbito da RM de Campinas.
  • 10. O estudo busca compreender a atuação das variáveis que interferem nas modalidades migratórias e nos seus principais fluxos, de forma a explicar a manutenção da região como o principal pólo atrativo de população do Estado de São Paulo. O autor acredita, embora não seja objetivo explicitado em sua proposta de estudo, que a dissertação – apresentada no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp e orientada pelo professor José Marcos Pinto da Cunha – possa contribuir para o entendimento de que os migrantes não constituem problema, mas semelhantemente aos “naturais”, buscam situações melhores. O estudo considerou os vários tipos de migrações e principalmente se deteve em caracterizar o migrante: quem é ele, motivações que possibilitaram sua mobilidade, as razões que o levavam à escolha do novo local. Estabelece também uma comparação inédita entre eles e os moradores locais com perfil semelhante, mas que não se decidiram pela migração. Procura explicar ainda as razões da escolha de determinados centros pelos migrantes e porque certas cidades os atraíram apenas em uma época. Para Dota, a migração é um fenômeno que mantém estreita relações com a conjuntura demográfica e econômica de determinado momento histórico e, por isso, não pode ser entendida isoladamente sem que se considerem essas conjunturas em nível local, regional e nacional – e até global no caso da migração internacional. Lembra que na RMC os fluxos migratórios alcançaram volumes relevantes desde a década de 70, embora apresentassem importantes modificações ao longo destes quarenta anos, adquirindo atualmente novas características devido aos empreendimentos que se têm instalado na região. A propósito, ele afirma que a redução do crescimento demográfico observado nos últimos anos, paralela à queda das migrações de longa distância, coloca em evidência as modalidades migratórias de curta distância, circunscritas aos municípios da RM e diretamente associadas ao crescimento demográfico e expansão urbana. Ele constata ainda que essa migração entre municípios não é aleatória, mas direcionada pelo processo de produção do espaço urbano, entendido como a forma em que a área urbana cresce e se estrutura. A delimitação e o desenvolvimento do espaço urbano é que determina para onde as pessoas se dirigem em função de anseios e possibilidades econômicas. Ao menos na população pobre, esclarece ele, sua produção é determinada por amplos fatores, que fogem do escopo social e da decisão em nível individual. O desenvolvimento desse espaço e sua modelação estão atrelados principalmente a três fatores: ações do Estado, atuação do mercado imobiliário e participação dos agentes e movimentos sociais. A dissertação analisa motivações e implicações das modalidades migratórias intrametropolitanas – assim entendidas as que se dão entre os municípios da própria RMC – e as externas, provenientes de outras regiões do estado ou do país, ou até do exterior. Para analisar o processo de crescimento e consolidação da RMC decorrente da migração e à luz da produção do espaço urbano, o autor vale-se de subsídios colhidos na geografia, no urbanismo, na demografia, na economia, dos dados do Censo Demográfico de 2001 e da Pesquisa Domiciliar do Projeto Vulnerabilidade, realizado pela equipe do Nepo em 2007, coordenada pelo professor José Marcos Pinto da Cunha e que contou com apoio da Fapesp e do CNPq.
  • 11. Em vista disso, ele considera que o trabalho utilizou dados de certa forma diferenciados em relação aos encontrados nas pesquisas tradicionais, como o censo demográfico. “Neste contexto, poderia dizer que o estudo apresenta inovação quando se aprofunda na busca da compreensão das motivações da migração no âmbito de RM e, principalmente, porque enfoca diferentes modalidades migratórias ao considerar os diferenciais que caracterizam as migrações intrametropolitanas e externas e, ainda, o que é mais inovador, ao explicitar as diferenças destes migrantes em relação aos que não migram”. Em razão disto, o pesquisador analisou os fatores que determinam a mobilidade e a imobilidade, pois considera que, como a migração, a “não-migração” também é seletiva. Conclusões Geógrafo de formação, Dota enfatiza algumas contribuições decorrentes da pesquisa. Constata que os migrantes intrametropolitanos apresentam melhores condições em relação aos externos como, por exemplo, maior acesso à aquisição da casa própria e menor dependência do aluguel. Observa também a melhoria de condições entre os fluxos que partem de Campinas em relação àqueles com origem nos municípios do entorno. Outra conclusão é a de que a distribuição da população e dos vínculos empregatícios na região é muito desigual, explicado pela forma como o espaço urbano se configura, reproduzindo desigualdades ao direcionar parcelas da população para os diversos subespaços. O pesquisador considera particularmente interessante o acesso à infraestrutura. O menor acesso a ela por parte dos migrantes intrametropolitanos decorre da aquisição da habitação própria em regiões precárias, mas mais acessíveis economicamente. Porém, com a consolidação dessas áreas, esse migrante tende a atingir melhor situação em relação aos que continuam pagando aluguel. O que move os migrantes é a melhoria das condições de vida, ao passo que os não-migrantes visam mantê-la, diz Dota. “Apresentando ao menos parte das motivações que levam os migrantes a se colocarem em movimento, os “não-migrantes” revelam razões que os impedem ao deslocamento”. O autor do estudo esclarece que há os que não migram por estarem bem situados na cidade (ricos) e os que apresentam condições propícias para fazê-lo – habitação e trabalho satisfatórios –, mas são impedidos pela organização familiar, principalmente pela alta proporção de dependentes, na maioria jovem. Acrescenta que a mobilidade e a imobilidade territorial estão atreladas fundamentalmente à necessidade de sobrevivência. Estratégias Lembrando que o trabalho nasceu do anseio de verificar se a migração na RM de Campinas levaria à mobilidade social e procurando entendê-la à luz dos processos de produção e reprodução do espaço urbano, afirma que o processo altera as condições de vida para melhor ou no mínimo contribuem para não deteriorá-la. Esclarece, entretanto, que “a migração constitui estratégia de melhoria social, mas não representa mais mobilidade social”. De outra forma, o desenvolvimento do espaço urbano, calcado em múltiplos interesses desprovidos de preocupações sociais, faz com que parcelas da população recorram a soluções emergenciais para sobreviver e as levam a ocupações de áreas precárias. De outra forma, os mecanismos de
  • 12. valorização e desvalorização devido a mudanças de usos dos pontos urbanos determinam a expulsão de uns e atração de outros. Em decorrência desses mecanismos, restam, à população pobre, espaços “pré- determinados”, com condições muitas vezes precárias em infraestrutura e acesso, mas variáveis dependendo dos rendimentos disponíveis. Essas constatações levam o autor a concluir que a migração na região, e talvez de maneira geral no Brasil, não está associada à mobilidade social e tem uma função muito mais de “adaptação” às condições vigentes em cada momento, a partir das conjunturas econômicas ou sócio-demográficas que influenciam o cotidiano dos indivíduos. Segundo Dota, os fluxos relacionados ao mercado de trabalho evidenciam que os migrantes buscam estabilidade econômica. Os que não apresentam esta problemática, caso principalmente das migrações intrametropolitanas, a exemplo de outros fluxos, buscam melhores condições de vida. Ele destaca, entretanto, que a diferença entre esses migrantes e os externos reside no conhecimento que os primeiros acumulam da região, o que os possibilita mudarem de município sem deixarem o emprego. Portanto, diz ele, a migração intrametropolitana apresenta forte ligação com as questões habitacionais, com grande relevância na aquisição da casa própria. Mas essa decisão muitas vezes os leva para situações ainda mais precárias, visto que se direcionam para espaços não consolidados, periféricos e com pouca infraestrutura. Entre os migrantes externos é significativa a parcela dos que pagam aluguel ou moram com outras famílias, o que os direciona geralmente para áreas mais consolidadas e com melhores condições de acesso aos serviços. Apesar dessas facilidades, Dota constatou que os migrantes intrametropolitanos ostentam melhores condições econômicas que os externos, o que se evidencia pela aquisição de habitação. Para o pesquisador, os dados analisados, embora de forma ainda não conclusiva, “indicam que a imobilidade, ao menos em parte da população, pode estar condicionada pela organização familiar e não pela existência de vida digna”. Segundo Dota, os estudos permitem indicar que o crescimento horizontal da mancha urbana metropolitana tende a continuar apresentando condições precárias de habitação e acesso, principalmente nos locais de maior acessibilidade econômica. E serão as leis de mercado que definirão a ocupação desses espaços pelas populações mais pobres ou mais bem aquinhoadas. Para ele, as estimativas indicam que os municípios que se destacaram durante a década de 90 em relação à atratividade de migrantes devem continuar nessa posição salvo pequenas modificações, previsão que o Censo Demográfico de 2010 poderá confirmar. ................................................ Publicação Dissertação: Migração na RM de Campinas: produção de espaço urbano e impactos sociais Autor: Ednelson Mariano Dota Orientador: José Marcos Pinto da Cunha Unidade: Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH/Nepo) Financiamento: Capes