O documento descreve o sistema feudal na Idade Média na Europa Ocidental entre os séculos VIII e XII. O feudalismo estruturou-se a partir da desintegração do Império Romano e consolidou-se entre os séculos V e X, caracterizando-se por uma economia agrícola descentralizada, relações de dependência entre senhores e vassalos, e autonomia dos senhores feudais em seus domínios. A Igreja Católica exerceu importante papel social e político no período.
1. O Feudalismo
“Sabemos agora que a Idade das Trevas não foi de trevas. Ignorância, letargia,
desordem, existiram como hoje e longe estiveram de predominar numa época ansiosa de
conhecimento, vigorosa em seu poder de viver e de se expressar, e idealista nas suas
cosntruções. Talvez não seja demais dizer que a sociedade medieval tinha formas
funcionais com que a idade antiga nem sonhara, formas essas que levaram a fins jamais
imaginados em épocas anteriores (...) O fato de que as condições, acontecimentos e
povos se tivessem reunido de tal forma no princípio da Idade Média foi extremamente
feliz para os atuais herdeiros da tradição ocidental.”
Bark, Willian. As origens da Idade Média. Editora Zahar.
De outro lado, os po-
D
o século VIII ao XII, a Europa Oci vos germanos invasores que
dental viveu o apogeu da Ordem Feu deram o cheque-mate no de-
dal. A sociedade que se estruturou cadente Império Romano,
nessa época apresentou características peculiares e trouxeram para o mundo oci-
marcou a Idade Média como a época da fé cristã e dos dental características culturais
corajosos cavaleiros. Do outro lado, nos bastidores da que ajudaram na formação da
história, foi também o período da servidão enquanto Ordem Feudal. Com efeito,
forma de trabalho e a exploração da população cam- eram povos migrantes que
ponesa que vivia na dependência dos senhores feudais. desprezavam o uso de moe-
A Ordem Feudal se estruturou a partir da desa- das e valorizavam a posse de
gregação do Império Romano, quando então aconte- jóias. Dentro do possível eram
ceram diversas mudanças que alteraram o perfil do excelentes agricultores, culti-
Mundo Antigo. A consolidação da Ordem Feudal se vando os campos quando se
deu na Alta Idade Média, cronologicamente situada fixavam em algum local. Eram
entre os séculos V e X. Olhando para trás na história, também excepcionais guerrei-
se observa que a partir da queda do Império Romano, ros e produziam armas fantás-
a população foi gradativamente abandonando as cida- ticas, desconhecidas no mun-
des e migrando para as zonas rurais, fugindo das inva- do ocidental. O costume do
sões germânicas. Paradoxalmente, nos campos cresci- comitatus - relação de fideli-
am propriedades denominadas villas, com característi- dade guerreira entre o rei e
ca de auto-suficiência que se beneficiaram bastante do seus guerreiros - contribuiu para estruturar os laços de Uma lavra de
grande afluxo de mão-de-obra deslocado para os cam- suserania e vassalagem na Ordem Feudal. arado em
pos. setembro
aparece no
breviário
O Tempo da História flamengo. Para
os camponeses o
arado era o
emblema de
Séculos III - V Séculos V - IX Século IX todos os
trabalhos
Contribuições Romanas Contribuições germânicas
Apogeu da
Ordem Feudal
- Colonato - Comitatus
- Villas - Beneficium
- Latim - Direito Consuetudinário
- Cristianismo - Economia Agro-Pastoril
2. Por tudo isso, a época feudal teve como carac- Parte das terras - as glebas - eram arrendadas
terísticas principais a existência de uma economia na- aos camponeses que pagavam uma parte da produção
tural baseada na troca de mercadorias, raramente ocor- ao senhor feudal. Além do pagamento percentual por
rendo o uso de moedas. Normalmente as trocas se da- região cultivada os servos desempenhavam o trabalho
vam dentro dos próprios feudos, pois o comércio entre não remunerado nas melhores terras do feudo desig-
os feudos não era frequente. No aspecto político ca- nadas como domínio ou reserva senhorial. Essa obri-
racterizou-se como um período descentralizado e frag- gação chamada - corvéia - é considerada por muitos
mentado, onde cada feudo tinha grande autonomia e historiadores, como a grande fonte de lucro do senhor
os senhores feudais eram suprema autoridade nas suas feudal, por se tratar do plantio nas áreas de melhor
terras. No aspecto social foi uma época marcada pela qualidade, conseqüentemente, de melhor produtivida-
O Feudalismo
grande dependência, entre servos e senhores feudais e de.
vassalos e suseranos. Normalmente, em três dias da semana o servo
cultivava a área arrendada no contrato e nos outros
três, cultivava o domínio, sem nada ganhar por isso.
O FEUDALISMO FOI UM SISTEMA Além dessas obrigações havia uma grande carga de
DE GOVERNOIMPROVISADO E TEMPO- impostos, tais como:
RÁRIO, QUE PROPORCIONOU UMA
CERTA ORDEM, JUSTIÇA E LEI DURAN- banalidades - taxas cobradas pelo uso do
TE UMA ÉPOCA DE COLAPSO, LOCA- forno, do moinho, carroças e instrumentos
LISMO E TRANSIÇÃO. In Marwin Perry de trabalho. A necessidade de moer o trigo
para o pão e prensar a uva para o fabrico
do vinho, colocava o servo nas mãos do
senhor feudal, obrigando-o ao pagamento
das banalidades.
mão-morta - imposto pago pelos herdei-
ros do servo que garantia a permanência na
terra.
capitação - imposto pago em proporção
do número de familiares do servo.
dízimo - imposto cobrado pela Igreja Ca-
tólica, apelidado de "Tostão de Pedro".
Essa intrincada rede de impostos ligava os ser-
vos ao senhor feudal, dificultando ao máximo o desli-
gamento e obtenção da autonomia servil. Entretanto a
servidão não era a escravidão. O senhor não podia ven-
der o servo. Em contrapartida, um servo nascia e nor-
malmente morria na terra, sendo raro o deslocamento
de servos para outros feudos. Mais tarde, a partir do
século XII, com o dinamismo do comércio e o cresci-
mento das cidades esse quadro tenderia a mudar para
uma sociedade mais dinâmica e de melhores oportuni-
dades.
Modelo de feudo, O FEUDO E OS SERVOS
unidade de
produção típica
da idade Média. Geralmente os feudos eram grandes extensões O FEUDALISMO NÃO CONSTITUÍA
Ao lado, de terra sem delimitações precisas, o que naturalmente UM SISTEMA DEDUZIDO LOGICAMEN-
esquema de provocava constantes conflitos entre os senhores feu-
rotação de TE DE PRINCÍPIOS ABSTRATOS, MAS
culturas em três dais. Ao contrário do que se pensa, nem todos os feudos UMA RESPOSTA IMPROVISADA AO DE-
campos. tinham suntuosos castelos, sendo mais comum a habi- SAFIO RESULTANTE DE UMA AUTORI-
Hitstória Geral. tação básica, onde viviam o nobre feudal e os familia- DADE CENTRAL INEFICIENTE.
Claudio res.
Vicentino. pág
108. Imensas florestas circundavam os feudos, sen-
do úteis na proteção do local e no fornecimento de ma-
deira e caça de animais selvagens. Calcula-se que no
auge do feudalismo, pelo menos metade das terras do
ocidente, eram gigantescas e imensas florestas.
3. A atividade agrícola era extensiva com Quanto maior o número de vassalos maior o
baixíssima produtividade. O arado era de madeira com poder do suserano. A escolha de um rei para manter a
formato inconveniente que pouco sulcava a terra. O ordem numa região, obrigatoriamente recaía sobre os
esterco só era utilizado na área do manso senhorial e suseranos mais poderosos. Muitos tinham dezenas de
até o século XI a rotação de terras era adotada em vassalos interligados pelo juramento de lealdade e obe-
raríssimos feudos. Em geral a produção agrícola era diência. No caso de conflito entre nobres feudais o
inferior à necessidade de consumo. Longos períodos suserano podia exercer o papel de mediador e juiz. Con-
de secas e pragas destruíam as plantações e a baixa tudo, apesar de todo o prestígio os reis tinham autori-
produtividade mesclava-se com a escassez de técnicas dade política restrita aos limites do feudo, não interfe-
que pudessem melhorar a agricultura. rindo nos feudos dos vassalos. A existência dos reis não
O Feudalismo
diminuía a característica de descentralização, marca re-
gistrada da Europa Ocidental desde o início da Idade
Média. Daí o slogan político referente ao período me-
“QUALQUER ECONOMIA BASEA- dieval: Os reis, reinam mas não governam.
DA NA AGRICULTURA É SEMPRE PRE-
CÁRIA, MESMO EM TEMPOS PROPÍCI-
OS; NO INÍCIO DA IDADE MÉDIA ELA
ERA UMA RISCO PERMANENTE”. In.
Anne Fremantle
A alta taxa de mortalidade ajustava a oferta de
mão-de-obra impedindo um excedente incômodo para
os nobres feudais. Em relação a área cultivada, havia
um certo equilíbrio entre mão-de-obra e trabalho ofe-
recido. Embora a servidão fosse predominante, em al- Feudos como
este, nos
guns feudos ainda se usava trabalho escravo no servi- montes
ço mais pesado. A opção pelo escravo era contida pelo Costwold da
alto valor de aquisição e a escassez de fornecimento. Inglaterra eram
O final das conquistas romanas cortou a fonte de ob- quase auto-
suficientes. Do
tenção da mão-de-obra escrava, que foi desaparecen- relativo conforto
do gradativamente ao longo da Idade Média. de sua mansão
de pedra o
A fragmentação política do período influenciou senhor mandava
SUSERANIA E VASSALAGEM em quase tudo.
o desmembramento das leis que existiam em caráter
Entre os nobres havia a relação de suserania e local. Como não existiam nações no aspecto formal,
vassalagem. Consistia no contrato entre dois indivídu- não existiam também leis nacionais. Nos feudos eram
os, em que o nobre suserano concedia ao seu vassalo adotadas leis particulares transmitidas de pai para filho
o direito de uso de um feudo ou terras de menor porte, - Direito Consuetudinário. A justiça era implacável com
garantindo em troca a lealdade do vassalo em qual- os mais humildes e todo castelo tinha masmorra e pri-
quer circunstância. A cerimônia de nomeação e sões subterrâneas. Os castigos eram severos, podendo-
vassalagem contava com a presença de todos os no- se arrancar os olhos do infrator, decepar-lhe as mãos
bres e cavaleiros do feudo. Normalmente o juramento ou imersão do corpo em água quente. Os critérios de
acontecia num feriado santificado, o que garantia a justiça dependiam do bom humor do senhor feudal e
participação de figuras ilustres do clero. O ritual de normalmente castigava os mais pobres de forma radi-
vassalagem exigia do vassalo o juramento de lealdade, cal.
ajoelhado aos pés do seu senhor suserano.
4. A Igreja Católica
Boa parte da riqueza foi obtida com doações
de nobres que acreditavam (ou fin-
S
O Feudalismo
e a Idade Média foi a época dos cavalei giam acreditar) receber um lugar ga-
ros e dos servos foi também a Idade da rantido no céu.
Fé, quando então a Igreja Católica teve "O cargo de papa, como o
nas mãos um poder de caráter supranacional, acima de cargo de bispo e abade, tornou-se
todos os homens na terra. Com efeito, após o início objeto de disputas políticas. Por
das invasões germânicas e a consequente fragmenta- quê? Por causa do volume de bens,
ção de toda a Europa Ocidental, a Igreja exerceu o pa- direitos e propriedades que perten-
pel de convergência na fé em Deus, unindo os homens ciam à instituição e, além disso, pelo
em torno de uma só religião que prometia o paraíso prestígio que tais cargos conferiam a seu detentor.
aos cristãos. No longo período de guerras e tormentos Na Idade Média os bispos eram freqüentemente
do início da Idade senhores temporais de territórios que administravam
Média a Igreja ad- com o auxílio de um conjunto de prelados. Os aba-
ministrou o caos, des, líderes dos mosteiros, eram também administra-
prestando assis- dores de feudos, desempenhando a um só tempo fun-
tência aos pobres e ção religiosa, administrativa e até mesmo militar.
indigentes, ofere- Isso explica uma série de práticas correntes
cendo hospeda- entre os componentes da Igreja, como a venda de car-
gem aos viajantes gos eclesiásticos ou a indicação de parentes para
além de preservar ocupá-los. Assim, em 926, Hébet, conde de
as obras escritas da Vermandois, fez eleger seu filho Hugo como arcebis-
antiga cultura po de Reims. Nessa ocasião, o "arcebispo" tinha cin-
greco-romana. co anos de idade!
Roma se
tornou o centro do
império da fé e “VOSSA VIDA AQUI É APE-
para lá convergiam NAS UMA PEREGRINAÇÃO” DE-
centenas de fiéis peregrinos. Com grande poder e pres- CLARAVA NO SÉCULO XIV O PO-
Durante a Idade
tígio os papas foram aclamados autoridade máxima da ETA GUILAUME DIGULLEVILLE
Média exerceu
grande influência cristandade, exercendo absoluto controle sobre a cris-
na transmissão tandade no mundo ocidental. Além do papa a comple-
do xa hierarquia cristã se completava com o "exército" re-
conhecimento.
Muito tempo depois, em meados do século XIV,
ligioso de bispos, sacerdotes, padres e clérigos. um jovem de dezessete anos chamado Pedro Rogério
Na gravura
acima, observa- Estruturada e rigidamente hierarquizada, a Igreja foi feito cardeal pelo tio, o papa Clemente VI. Em
se o trabalho de Católica passou ao largo da confusão que se seguiu à 1370, o jovem Pedro Rogério se tornaria papa, com o
um monge queda do Império Romano. A
“copista”.
nome de Gregório XI.
consolidação do fé cristã entre Que diferença em relação aos cristãos dos pri-
A lei é imposta os germanos foi facilitada pela
pelo medo, cujo
meiros tempos! Quanto mais a Igreja adquiriu orga-
conversão dos francos, na épo- nização interna, mais os "pastores" distanciaram-se
nome verdadeiro
é Deus ca do rei Clóvis, em 510. Na das "ovelhas".
medida em que os francos con- Um grande historiador da Idade Média, Pierre
quistavam regiões na Europa Riché, resumiu essa situação numa bela frase: "A
Ocidental, impunham também a crença Igreja, para salvar o corpo, arriscou-se a perder a
no cristianismo. Mais tarde, retribuindo o apoio dos alma". Ou seja, no esforço para criar e manter uma
francos, a Igreja Católica coroou no ano 800, o rei fran- estrutura religiosa, a instituição perdeu muito do es-
co Carlos Magno como rei dos cristãos. pírito original do Cristianismo". (In. Rivair José
Os frutos da hegemonia religiosa no mundo oci- Macedo. Religiosidade e Messianismo. Editora
dental foram colhidos com maior intensidade a partir Moderna. pág 19/20)
do século VIII, quando a Igreja consolidou-se como
instituição de caráter supranacional.
5. A TEOLOGIA MEDIEVAL a vida material, Sto Agostinho exaltava a vida espiritu-
al ao lado de Deus. A felicidade perfeita seria encontra-
A inexistência de um da após a breve passagem pela Terra e o posterior in-
poder político centralizado dei- gresso no Paraíso.
xou a Igreja sem concorrentes. O teólogo foi o pai da idéia da predestinação do
Como instituição mais podero- cristão que seria mais tarde retomada por Lutero. San-
sa do mundo ocidental sua auto- to Agostinho também foi importante na transição do
ridade eclesiástica se estendia ao racionalismo clássico. Desenvolvendo o alicerce da
plano político, ideológico e mo- espiritualidade medieval afirmava que a razão não era
O Feudalismo
ral. A cristandade seguia a orientação da Igreja, que única fonte de sabedoria. Com isso consolidava o prin-
teve como base ideológica a obra de Santo Agostinho, cípio da fé acima de todas as coisas. Na opinião do teó-
escrita no fim da Idade Antiga, quando Roma havia logo, era impossível admitir a existência de Deus, cria-
sido invadida e praticamente destruída pelos bárbaros. dor da humanidade, sem a crença na infalibilidade no
Em 410, com o saque a Roma, houve um pâni- poder divino. Com Santo Agostinho os padrões éticos
co generalizado. Nesse contexto Sto Agostinho escre- foram condicionados à aprovação de Deus. Ao contrá-
veu "A Cidade de Deus", perfeita resposta espiritual à rio dos humanistas, que supervalorizavam a razão, a
crise que ameaçava a religião católica. obra de Santo Agostinho legou para a Idade Média, o
Afirma o autor em sua obra, que todo cristão slogan de Idade da Fé, marcada no seu apogeu por um
tinha como objetivo a busca do Paraíso. Minimizando obsessivo teocentrismo.
A Perigosa Viagem da Alma
A grande maioria da população medieval era analfabeta e, assim,
nada deixou escrito sobre suas crenças. Mas pode-se perceber cla-
ramente a piedade popular daquela era pelas várias influências que lhe
deram forma e que ainda hoje sobrevivem: os ensinamentos cristãos, as
esculturas alegóricas, os versos, o “teatro de moralidades” ou
“mistérios”; e as experiências místicas, tais como a visão simbólica e
complicada descrita pela monja Hildegarda de Bingen num manuscrito do
século XIII. Tais elementos de convicção persuadiam o homem medieval
de que o mundo espiritual era tão completamente real quanto o mundo
físico; e a importância principal da sua vida, neste mundo, consistia em
preparar o destino de sua alma, no outro. Diariamente se travava uma
verdadeira luta. (In. Anne Fremantle. A Idade da Fé. História Universal.
Time-Life. Pág 61).
Visão mística da natureza do
homem e do seu lugar no
cosmos, tal como a recebeu uma monja
Punição Eterna para Legiões de Pecadores
O Dia de Juízo estava sempre iminente para a gente medieval e o seu
programa era-lhe assustadoramente familiar. À meia-noite desse dia terrível,
todas as almas deveriam aparecer em forma corporal perante o Criador. E
todos seriam pesados segundo escreveu Dante - “para, segundo seus
méritos ou suas faltas, receber o prêmio ou a punição de justiça”. Os
pecadores seriam mandados ao inferno, representado às vezes pela boca de
um monstro. Na visão do inferno, recebida pela freira Hildegarda de Bingen,
“algumas almas eram queimadas, outras recebiam uma cinta de serpentes...
E vi demônios, com medonhos açoites, vergastando uns e outros...” E no
inferno, em tormentos, os pecadores passariam a eternidade. (In. Anne
Fremantle. A Idade da Fé. História Universal. Time-Life. Pág 66).
As entranhas do inferno engolem os danados com os seus incansáveis
carrascos e são fechados para sempre.
6. PARA VOCÊ
SABER
MAIS.
O papel social da
O Feudalismo
Igreja diversos locais de caridade: às vezes
uma hospedaria, para alojar os
viajantes, os peregrinos, os men-
digos; às vezes hospitais para os
doentes, especialmente os leprosos.
Nessa época foram construídas as "casas de
pobres", os primeiros asilos e albergues de que
Não pensemos, todavia, que a Igreja se tem notícia.
deixava de ter profunda importância na Idade Desde os primeiros séculos da Idade
Média. Ela desempenhou importantes papéis Média, os bispos auxiliavam os carentes e
naquele momento, assumindo responsabilidades desafortunados, alimentando-os e protegendo-
bastante significativas. Numa época cheia de os. A Igreja fez da caridade uma condição da
calamidades, dominada pelas guerras, pela fome salvação; daí o ditado ainda atual: "Quem dá aos
e pela insegurança, a organização da Igreja serviu pobres, empresta a Deus". De modo geral, os
como importante ponto de apoio para os ne- bispos eram chamados de "pais dos pobres",
cessitados. alguns chegando a manter centenas de indi-
Em primeiro lugar, gentes. Além disso, os representantes da Igreja
coube aos religiosos criar meios estimulavam os poderosos a ajudar os
para a transmissão da educação. necessitados.
O ensino era praticamente todo Nem sempre, entretanto, esse espírito
desenvolvido por homens de caridade era desinteressado. Na maior parte
ligados à Igreja, no campo e nas das vezes, a ajuda aos pobres era vista como um
cidades. As universidades meio de purificação espiritual. Não se ajudava o
surgidas a partir do séc XII, pobre por ele ser pobre, por ter necessidades ou
contaram sempre com o incen- por ter direitos. A ajuda era um modo de o rico
tivo dos papas, e os professores, garantir um lugar no reino dos céus. Um livro
de um modo geral, eram homens escrito no século VII, chamado Vida de Santo
com formação religiosa. Elói, demonstra bem isso. Eis um trecho:
Por outro lado, numa "Deus teria podido fazer todos os
época em que as desigualdades homens ricos, mas quis que houvesse pobres
sociais eram profundas, os neste mundo para que os ricos tenham uma
integrantes da Igreja sempre oportunidade de redimir seus pecados". In.
prestaram assistência aos Macedo, José Rivair. Religiosidade e
necessitados, praticando e estimulando a prática Messianismo na Idade Média. Editora Moderna.
Cristo em sua
majestade, tema
da caridade cristã. Pág. 21-22.
principal dos Em volta das igrejas e mosteiros, era
artistas comum bispos e abades mandarem construir
A piedade infantil do homem medieval revelava-se dramati-
camente através de recursos por ele adotados a fim de fortificar a alma
durante a perigosa travessia. Imaginativo, mas de espírito literal, o
homem da Idade Média representava como pessoas as virtudes, ou as
concebia como degraus de uma escada a ligar a terra ao céu. Os
números lhe davam um sentimento de segurança. Por exemplo o 3
representava o espírito, 4 o corpo; a soma de ambos, 7, a perfeição
mística. (In. Anne Fremantale. op. cit. pág 65.
A vida luxuosa dos representantes da Igreja, representada
por artistas do século XV
medievais
7. O Cotidiano da História
Peregrinações
O Feudalismo
A peregrinação era uma viagem a um importante
local religioso. Geralmente era um santuário onde esta-
va enterrado algum santo, mas às vezes era a própria
Terra Santa. Todos os anos milhares de pessoas visi-
tavam os conhecidos lugares de peregrinação, como a
Basílica de São Pedro, em Roma, ou os santuários de
Santo Tomás à Becket, em Canterbury, ou St.James, em
Compostela.
As viagens eram longas e perigosas. Bandidos
armavam tocaias nas estradas percorridas pelos pere-
grinos, e os piratas sabiam que os navios com
peregrinos eram presas fáceis. Mesmo assim,
muitas pessoas faziam peregrinações porque
acreditavam que a visita ao túmulo de um santo
podia ajuda-las em muitas coisas. Em casos de
doenças graves, alguns prometiam fazer uma pe-
regrinação se ficassem bons, ou iam aos lugares
santos para mostrar que estavam arrependidos
dos seus pecados. Com sorte e uma companhia
agradável, a peregrinação podia ser como umas
férias - uma mudança bem-vinda na vida coti-
diana. Durante a viagem, os peregrinos contavam
histórias - nem todas sobre assuntos religiosos -
para distrair os outros e jogavam. Viajavam a ca-
valo ou a pé, passando as noites em estalagens
lotadas.
Quando chegavam à cidade onde estava o
santuário, eram recebidos por uma enorme quan-
tidade de vendedores que viviam das visitas dos
peregrinos. Vendiam imagens de santos e peque-
nos enfeites como lembrança. Relíquias falsas -
como pedaços de osso de porco (supostamente do crâ-
nio de Santo Tomás) ou lascas de madeira (comerciadas “Quatro caminhos levam
como fragmentos da verdadeira cruz) - vendiam muito a Santiago de Compostela, mas
bem. O povo acreditava que as relíquias tinham poderes todos se juntam em Puente de la
miraculosos para afastar os demônios ou curar doenças. Reina”.
Vendedores desonestos vendiam falsos perdões e indu-
lgências - documentos que, segundo eles, garantiam o
perdão dos pecadores ou a permissão para desobede-
cer alguma lei da Igreja.
Os peregrinos, cansados e confusos depois da
longa jornada, eram presas fáceis para esses farsantes.
A atmosfera estranha e altamente emotiva da cidade do
santuário, com suas procissões, multidões de visitantes
e de mendigos, certamente aumentava sua confusão.
(In. Fiona Macdonald. O Cotidiano Europeu na Idade
Média. Editora Melhoramentos. Pág 40.
8. O Cotidiano da História
O Feudalismo
As casas residenciais
Quem viajava pela Europa na Idade Média via casas de diferentes for-
mas e tamanhos. Nos países do sul, nas margens do Mediterrâneo e nas
montanhas, a maioria das casas era feita de pedra do local com telhados
em ponta ou de telhas. No norte mais frio, onde as imensas florestas pro-
duziam grande quantidade de madeira, as casas eram construídas com
estrutura de madeira, paredes de adobe (argila com lama) e telhado de
palha. No século XV, começaram a usar tijolos de argila cozida, especial-
mente nas cidades de Flandres (que hoje pertence à Bélgica).
Grande parte das pessoas construía a própria casa com ajuda dos arte-
sãos locais. As casas de madeira mais simples precisavam ser comple-
tamente reconstruídas depois de setenta e cinco anos, mas as de tijolos e
de pedra duravam muito mais.
Em qualquer parte da Europa, as casas geralmente possuíam apenas
um ou dois aposentos, além de depósito e estrebaria. O povo do campo
passava a maior parte do tempo fora de casa, voltando apenas para comer
e dormir e para se abrigar do frio rigoroso do inverno. Nas cidades, a idéia
de cômodos diferentes para comer e para dormir começava a ser colocada
A forja do em prática. Em muitas casas da cidade a janela que dava para a rua pos-
povoado onde o
ferreiro suía venezianas que podiam ser abaixadas para formar um balcão de loja,
consertava todo uma vez que os artesãos e comerciantes quase sempre trabalhavam em
tipo de utensílio casa.
de ferro e o O chão normalmente era de terra batida e no centro da casa ficava o
equipamento
para trabalhar lugar para acender o fogo, onde era feita a comida. No fim da Idade Média,
na terra. começaram a aparecer as chaminés, que proporcionavam maior conforto
no interior das residências.
A única iluminação era dada por pequenas janelas sem
vidro e fechadas com pesadas portas de madeira para evitar
a entrada da luz. Como as velas eram muito caras para a
maioria das pessoas, o tempo que tinham para trabalhar
dependia da estação do ano e da luz natural. Nas noites de
inverno, as pessoas se reuniam ao redor do fogo para con-
versar, mas a luz não era suficiente para trabalhar.
Os móveis eram simples. Muitas vezes toda a família
dormia na mesma cama, tendo um colchão de palha e co-
bertores de lã ou mantas de pele como cobertas. A mesa de
refeição era uma tábua sobre dois cavaletes, e sentavam-se
em bancos de madeira. Cadeiras eram luxo. Podiam ter um
ou dois baús de madeira trancados para guardar coisas pre-
ciosas, como o sal. Poucas panelas, algumas tigelas e
canecas de madeira e às vezes um caldeirão de bronze de-
pendurado sobre o fogo eram quase sempre todos os uten-
sílios domésticos de uma família.
(In. Fiona Macdonald. O Cotidiano Europeu na Idade
Média. Editora Melhoramentos. Pág 22).
9. O lado curioso
da História
O Feudalismo
Aprendiz de cavaleiro
No século XII, a elite militar da Europa ocidental estava se tor-
nando uma aristocracia social e política, mas os cavaleiros continuavam
a ser guerreiros e sua educação enfatizava sobretudo as qualidades
marciais. Seus ideais, tais como os de seus antepassados guerreiros da
Alta Idade Média, eram força física, habilidade nas armas, coragem e
lealdade aos líderes.
Durante o século XII, a essas virtudes militares acrescentaram-se
as idéias cristãs de serviço, humildade e misericórdia para formar um
código cavalheiresco que se disseminou pela Europa. Do treino como
escudeiro até a elevação a cavaleiro, o jovem aprendia
não apenas as artes do combate, mas também a ética de
conduta cavalheiresca. Os torneiros davam ao cavaleiro a
oportunidade de impressionar tanto por suas artes mar-
ciais como por seu comportamento cortês. Muitos cava-
lheiros já eram alfabetizados e, além de exaltarem a glória
da batalha em verso, esses trovadores aristocráticos
deleitavam-se em cantar a dor e os prazeres platônicos do
amor cortês. (In. Given-Wilson, Cristopher. A Ordem
feudal na Europa. História em Revista. Time-Life. Pág.
24).
Os jovens eram
treinados para
lutar e manobrar
A coleção de contos a unidade
tendo como personagem o Rei montada básica
Artur e os Cavaleiro da Távola de guerra
Rwdonda representou a medieval da
suprema expressão da cava- Europa ocidental.
laria romântica. Acredita-se Esses corpos
que o verdadeiro Artur era um cerrados e
disciplinados
campeão galês, do século VI; foram essenciais
suas façanhas, contudo, foram nas cargas
embelezadas pela lenda e a sua devastadoras
corte transformou-se no empregadas
símbolo perfeito da cavalaria posteriormente
medieval. (I. Anne Fremantle. nas Cruzadas.
op. cit. pág. 114)
A gravura da direita mostra Sir Galaad ajoelhado diante
do altar, enquanto à esquerda o rei Artur portando a sua
coroa, contempla a cena.