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UNIVERSIDADE	
  CATÓLICA	
  PORTUGUESA	
  
	
  
	
  
O	
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  COMUNICAÇÃO	
  INTERNA	
  NAS	
  ORGANIZAÇÕES	
  
CULTURAIS	
  	
  
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  FUNDAÇÃO	
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  COMUNICAÇÕES	
  
	
  
	
  
Dissertação	
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  mestre	
  	
  
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  Comunicação	
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Por	
  	
  
	
  
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Sob	
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  Professor	
  Doutor	
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  Hanenberg	
  
	
  
	
  
Setembro	
  2010	
  
2	
  
	
  
Resumo
Perante o impacto económico do sector cultural e o seu papel decisivo enquanto
motor de desenvolvimento, entende-se que as organizações culturais devem apresentar-se
cada vez mais competitivas e profissionais, reforçando junto das sociedades o seu papel e
potenciando a sua actividade. Para isso, e à semelhança das organizações empresariais, a
comunicação interna deve ser para as organizações culturais ferramenta estratégica,
aglutinadora e mobilizadora do público interno.
Considerando as especificidades deste tipo de organizações é feita uma reflexão
sobre o desafio que representa a comunicação interna em organizações que actuem no
sector cultural não lucrativo, apresentando o estudo de caso da Fundação Portuguesa das
Comunicações. São identificados desafios resultantes da especificidade do objecto cultural,
nomeadamente a tendência para canalizar os investimentos na comunicação externa ou nas
rubricas artísticas em detrimento do investimento na comunicação interna.
Palavras-chave
Comunicação Interna, Organizações Culturais, Fundação Portuguesa das Comunicações
Abstract
Given the economic impact of the cultural sector and its leading role as an engine
of development, it is understood that cultural organizations must present themselves ever
more competitive and professional reinforcing their role in societies and enhancing their
activity. To do this, and as business organizations do, internal communication must be for
cultural organizations a strategic tool, enabling them to unify and mobilize the workforce.
Given the specificities of such organizations this work proposes a reflection about
the challenge of internal communication in organizations working in the nonprofit cultural
sector, presenting a case study of Portuguese Communications Foundation (Fundação
Portuguesa das Comunicações). It identifies challenges that derive from the specificity of
cultural activities, namely the tendency to channel investment in external communication
or in the arts at the expense of investment in management items such as internal
communication.
Keywords
Internal Communication, Cultural Organisations, Portuguese Communications Foundation
(Fundação Portuguesa das Comunicações)
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Dedicatória
Aos meus pais, Maria José e João,
pelo testemunho e amor.
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Agradecimentos
Começo por agradecer a todos os que foram meus Professores e colegas na
licenciatura e no mestrado, por me terem acompanhado e desafiado.
Lembro especialmente o Professor Horácio Araújo, cuja partida também por mim
foi sentida, e que durante a licenciatura me orientou e me entusiasmou a participar no
programa Erasmus, programa este que viria a revelar-se uma experiência marcante e
enriquecedora do ponto de vista académico e pessoal. O Professor Horácio tinha a
capacidade incrível de fazer com que cada aluno (e éramos muitos!) se sentisse sempre
acompanhado e ouvido.
Ao entrar no mercado de trabalho verifiquei como é fácil cair no relativismo da
prática, a não ser que procuremos a teoria, enquanto reflexão que antecipa e orienta os
passos da acção. Nesse sentido, a Universidade mais do que abrir portas, abre horizontes e
abre a nossa consciência para o outro e para o mundo que nos rodeia. A sociedade precisa
do saber da Universidade, e a Universidade não pode fechar-se em si mesma.
Graças a tantos intervenientes, na Universidade Católica fui muito feliz e aprendi
imenso. Ficou ainda mais marcada em mim a ideia de que é na educação que está a base de
uma sociedade mais participativa, mais consciente e mais positiva.
A chegada deste trabalho a bom porto deve-se em muito ao meu orientador,
Professor Doutor Peter Hanenberg, a quem agradeço imenso pela amizade, pela
disponibilidade, pelo entusiasmo e pelo acompanhamento dedicado e incansável que me
deu ao longo desta aventura.
Agradeço também ao Professor Doutor José Seruya pelas pistas e pelos
esclarecimentos que me deu no início deste trabalho, quer em termos de bibliografia, quer
pela partilha da sua experiência na área da comunicação; e à Professora Verónica Policarpo
pela ajuda na parte metodológica do trabalho.
É devido também um agradecimento ao Professor Miguel Pina e Cunha da
Universidade Nova de Lisboa, por me ter falado no Joseph Lampel e por me ter
entusiasmado relativamente ao carácter actual e pertinente do tema.
5	
  
	
  
Não podia ter superado mais este desafio na minha vida sem contar com a minha
grande estrutura de apoio: os meus pais, a minha irmã e o meu irmão que tiveram sempre
paciência para os meus devaneios e orgulho nas minhas conquistas, bem como os meus
amigos e amigas, pela amizade, pelo entusiasmo e pelo interesse que demonstram em tudo
aquilo que faço.
Uma palavra de agradecimento à Fundação Portuguesa das Comunicações, onde
tenho crescido enquanto profissional de comunicação desde 2007, pela receptividade a este
trabalho, pela disponibilidade para entrevistas e pelo incentivo, mais concretamente:
- aos membros do Conselho de administração Dra. Fátima Botelho, Eng.º José Luís
Almeida Mota e Eng.º Luís Andrade;
- à Directora do departamento de Comunicação e Relações Públicas, minha chefe,
Dra. Isabel Santiago;
- à Conceição Ribeiro e à Marta Cavaco;
Finalmente, agradeço à Dra. Elisabete Caramelo da Fundação Calouste Gulbenkian
e ao Dr. Filipe Folhadela da Culturgest por se terem sentado comigo para falar sobre o seu
trabalho e sobre comunicação interna.
6	
  
	
  
Índice
	
  
Resumo/Abstract ................................................................................................................. 2
Dedicatória ........................................................................................................................... 3
Agradecimentos ................................................................................................................... 4
Índice..................................................................................................................................... 6
Introdução ............................................................................................................................ 7
Capítulo 1 – Comunicação Interna .................................................................................. 10
Comunicação e Organização............................................................................................ 10
Comunicação Interna ....................................................................................................... 19
Capítulo 2 – Organizações Culturais............................................................................... 30
O impacto da cultura........................................................................................................ 30
Especificidades e desafios das organizações culturais..................................................... 39
Capítulo 3 – A comunicação interna nas organizações culturais: o desafio................. 44
Capítulo 4 – O caso da Fundação Portuguesa das Comunicações................................ 54
Objectivos e metodologia................................................................................................. 54
Perfil da organização........................................................................................................ 62
Práticas de comunicação interna...................................................................................... 66
Discussão do caso ............................................................................................................ 71
Conclusão ........................................................................................................................... 84
Bibliografia......................................................................................................................... 86
Anexos................................................................................................................................. 91
7	
  
	
  
Introdução
	
  
Os novos desafios que enfrentam as organizações, como a competitividade à escala
global ou a incerteza dos mercados, exigem novas prioridades e soluções mais criativas.
Actualmente, é pedido às organizações que sejam responsáveis pelo seu impacto nas
sociedades, que está longe de ser inócuo, e que através do seu papel e do seu alcance
global contribuam cada vez mais para o desenvolvimento não só económico, mas
sobretudo social, cultural e ambiental. É-lhes hoje pedido que sejam sustentáveis para o
bem de todos.
A sustentabilidade dos recursos internos e externos às organizações surge como um
equilíbrio desejável em todos os sentidos e a todos os níveis: surge como uma preocupação
que exige gestores mais atentos e colaboradores mais conscientes.
Perante a estrutura falível dos mercados e a rápida evolução tecnológica, as
organizações requerem uma estrutura interna coesa, forte e preparada para os imprevistos,
para o improviso. A importância do factor humano, e concretamente de uma maior
participação que conduza a novos inputs traduzíveis em competitividade, ganha novas
dimensões.
É nesse sentido que a comunicação interna se tem vindo a afirmar enquanto
ferramenta indispensável para a mobilização, coesão e identificação internas. Mais do que
processos, a comunicação interna fundamenta-se e materializa-se em estratégias, tendo
crescido exponencialmente nos últimos anos como área de investimento nas organizações.
A comunicação, enquanto inter-acção, é inerente às próprias organizações, que por
sua vez precisam que a acção em conjunto dos seus colaboradores seja potenciada por
relações e processos comunicacionais positivos, tanto para o exterior como para o interior,
e que resulte no crescimento e sucesso da organização.
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Ainda que a produção teórica na área da comunicação, nomeadamente no que diz
respeito ao tema da comunicação interna, tenha vindo a multiplicar-se na última década,
constatou-se na revisão da literatura que esta se refere essencialmente às organizações
empresariais.
Assim, e dado que a autora constatou, na prática do dia-a-dia de uma organização
cultural, a importância da comunicação interna no acelerar de processos e na dinamização
da coesão e mobilização internas, entendeu-se ser pertinente questionar o desafio da
comunicação interna em organizações com um carácter tão específico como o das
organizações culturais.
Perante a lacuna teórica no que diz respeito às práticas de comunicação interna em
organizações culturais, esta dissertação reveste-se de novidade ao propor uma reflexão
sobre um sector em crescimento - o sector cultural - cujo impacto económico é hoje
amplamente estudado, e cujo impacto social é amplamente reconhecido, mas cujas práticas
de gestão são ainda pouco conhecidas.
Para este trabalho partiu-se de duas premissas. Foram elas:
- O papel cada vez mais preponderante da comunicação interna nas estratégias das
organizações;
- A afirmação do sector cultural enquanto gerador de riqueza, dinamizador dos
centros urbanos e motor de desenvolvimento.
É importante destacar que nesta dissertação não se pretende veicular a ideia de que
a comunicação é a cura para todos os males. Pretende-se antes realçar que um sistema de
comunicação oleado pode evitar problemas numa organização e criar novas oportunidades,
dando espaço à mudança e à inovação. Para além disso, entende-se que, à semelhança do
mundo empresarial, a comunicação interna pode ter um impacto igualmente positivo no
universo das organizações culturais, ainda que possa constituir um desafio maior pela
especificidade deste tipo de organizações.
A estrutura deste trabalho parte do geral, ou seja de um enquadramento teórico dos
principais conceitos - comunicação interna e organizações culturais – para o particular,
com a aplicação da teoria ao estudo de caso da Fundação Portuguesa das Comunicações.
9	
  
	
  
No capítulo 1 é contextualizada a relação da comunicação com as organizações a
um nível macro, ao abordar a evolução das perspectivas teóricas face à comunicação no
seio organizacional, e a um nível micro, através da introdução de perspectivas actuais da
comunicação interna fruto de estudos recentes, ao mesmo tempo que se apresentam
definições, ferramentas e desafios.
No capítulo 2 começa-se por analisar dados relativos ao impacto económico do
sector cultural com base nos mais recentes estudos sobre o impacto económico do sector,
ao mesmo tempo que se contextualiza esse impacto com dados qualitativos. Ao considerar
a vastidão e a complexidade do sector, é apresentada uma delimitação das actividades que
constituem os seus subsectores, bem como abordadas algumas das perspectivas actuais
sobre o mesmo.
Posteriormente é definido o que se entende por organizações culturais para efeitos
deste trabalho, com a apresentação das especificidades que caracterizam as organizações
culturais, bem como dos desafios implícitos neste sector de actividade.
O capítulo 3 prepara a discussão do estudo de caso através do cruzamento entre os
conceitos comunicação interna e organizações culturais. É feita a ponte entre a teoria e a
prática, recorrendo para isso ao enquadramento teórico e às entrevistas exploratórias
realizadas aos responsáveis pela comunicação da Fundação Calouste Gulbenkian e da
Culturgest.
Finalmente, no capítulo 4 é apresentado o estudo de caso da Fundação Portuguesa
das Comunicações, no qual se pretendeu, através de um Inquérito à Satisfação com a
Comunicação e de entrevistas a alguns colaboradores, traçar uma panorâmica das práticas
de comunicação interna numa organização cultural e conhecer os aspectos desafiantes
dessa mesma comunicação interna.
Ao longo de todo o trabalho a intenção foi a de promover uma reflexão sustentada
não só na teoria mais recente, mas também na aplicação prática dos conceitos a uma
organização cultural. São dados exemplos de boas práticas e apontados desafios não só
para a investigação no âmbito da comunicação, mas também para o crescimento e maior
profissionalização das organizações culturais.
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Capítulo 1
A Comunicação Interna
«A comunicação é uma condição sine qua non da vida social e, a fortiori, da vida
organizacional.»1
1.1 Comunicação e Organização
Na origem da palavra comunicar, do latim communicare, está a ideia de pôr em
comum, de partilhar algo com alguém. A comunicação, numa acepção geral, é elo de
ligação entre os seres humanos que permanentemente, e ainda que por vezes de uma forma
inconsciente, põem em comum algo com alguém, com significado, que pode ou não ser
único. A comunicação permite e consiste na principal forma de interacção com os outros e
com o mundo que nos rodeia.
Grande parte da nossa vida passamo-la a trabalhar, desempenhando um ou mais
papéis nas organizações que constituem a sociedade, garantindo a nossa subsistência, e
contribuindo para o desenvolvimento económico, social e cultural dos países em que
vivemos: «Often we find that our identity is tightly bound up with the organizations to
which we belong» (cf. Gordon, 1993: 3). As organizações, à semelhança da comunicação,
são intrínsecas à nossa vida, satisfazem a nossa necessidade de pertença e contribuem para
a construção da nossa identidade.
A palavra organização vem do grego organon, que significa instrumento, utensílio
(cf. Bilhim, 2006: 21). De uma forma simples e intuitiva, pode dizer-se que uma
organização é um conjunto de pessoas que unem esforços para atingir um ou mais
objectivos comuns: «Organizations – whether they are community hospitals, nonprofit
associations, or multinational oil companies – exist for one reason: we can accomplish
more when we work together as teams than we can as individuals» (cf. Whitworth, 2006:
205). Esta visão da organização, mais próxima da perspectiva instrumental, não significa,
no entanto, que todos os membros de uma organização partilhem dos mesmos objectivos, e
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
1
Cunha et al., 2007: 434
11	
  
	
  
que uma organização se esgote apenas nos objectivos que define. Na verdade, face ao
ambiente competitivo que marca a actualidade, as organizações são cada vez mais
pensadas enquanto espaços de crescimento pessoal e profissional, de aprendizagem, de
tentativa e erro, e de improvisação (cf. Cunha et. al, 2002: 37).
As organizações distinguem-se de outros grupos sociais por consistirem elas próprias
em processos que garantem a continuidade da sua existência, por terem uma definição mais
clara de limites e por serem reconhecidas pela sociedade como entidades sociais distintas
(cf. Bilhim, 2006: 23). Dado que são um fenómeno estruturante, as organizações despertam
o interesse de diversos ramos do saber como a sociologia, a psicologia, a economia, a
gestão e as ciências da comunicação, e tornaram-se objecto de disciplinas científicas como
a teoria das organizações (nível macro) e o comportamento organizacional (nível micro).
Conhecer e compreender o comportamento dos indivíduos revelou-se crucial para as
organizações, que investem no capital humano na certeza de que esse investimento tem um
retorno positivo e permite a obtenção de melhores resultados financeiros (Cunha et. al,
2007: 32). Esse investimento passa também pela definição de estratégias ao nível da
comunicação, considerada o aparelho circulatório da vida organizacional por permitir a
operacionalização e a decisão, contribuindo para que as organizações cresçam e evoluam e
assegurando os processos diários de gestão de informação e conhecimento (Cunha et al.,
2007).
Consolidou-se no âmbito organizacional que saber comunicar é a mais-valia do
século XXI, não só dentro das empresas, que perante as exigências do mercado e as
pressões económicas precisam de mobilizar os seus colaboradores para os objectivos, mas
também entre as empresas, as partes interessadas e as partes relacionadas: «Bottom line:
Communication is no longer a “soft” function. It drives business performance and is a key
contributor to organizational success» (cf. Watson Wyatt, 2004). Por esses motivos, a
comunicação é reconhecida como ferramenta de gestão empresarial e como ferramenta
estratégica (cf. Lite, 1997).
Um estudo empírico realizado em 1992 em 50 empresas espanholas pela consultora
de comunicação Burson-Marsteller e o IESE (Escola de Negócios da Universidade de
Navarra) concluiu que, para a maioria dos gestores entrevistados, ter conhecimentos
sólidos e capacidade de gestão no campo da comunicação é mais importante do que
dominar outras competências (cf. Lite, 1997: 127).
12	
  
	
  
Assim, o investimento na comunicação, quer interna quer externa, de uma
organização, resulta:
- Numa atmosfera interna positiva e construtiva;
- Em trabalhadores e clientes mais satisfeitos;
- Em níveis mais elevados de produtividade e de inovação;
- E em vantagem competitiva face à concorrência (cf. Hargie e Tourish, 2000).
Na revisão da literatura é notório que muitos autores, ao abordarem o conceito de
comunicação organizacional, referem-se exclusivamente à comunicação dentro de uma
organização, ou seja à comunicação interna. Na verdade, a comunicação organizacional
começou por estar concentrada no ambiente interno da organização dado o enfoque na
produção. Posteriormente, com a viragem e abertura das organizações para os mercados, o
investimento na comunicação externa tornou-se primordial.
Nesta dissertação, e para efeitos de enquadramento, entende-se o conceito de
comunicação organizacional no seu sentido mais lato e enquanto campo de estudos, ou
seja, tanto na sua relação com o interior quer com o exterior: «A comunicação
organizacional abrange todas as formas de comunicação utilizadas pela organização para
relacionar-se e interagir com seus públicos» (cf. Bilhim, 2006: 361).
A constituição da comunicação organizacional enquanto disciplina reconhecida e
autónoma é indissociável da evolução das teorias da organização. Na verdade, a
perspectiva teórica de cada momento da história da comunicação organizacional é
influenciada pela evolução da técnica e pela visão, à época, da organização em sentido
lato: «Organizational comunication theories mirror the flow of society» (cf. Eisenberg,
2009: 8).
O desenvolvimento das primeiras teorias da organização está relacionado com a
época da Revolução Industrial (final do século XIX), altura em que surgiram, com a
introdução da produção em massa, as primeiras grandes organizações. As teorias da época
versavam sobretudo as condições e a organização do trabalho, e as relações laborais. Nas
abordagens clássicas de gestão científica e burocracia, marcadas por Frederick Taylor,
considerado “pai” da gestão moderna por ter revolucionado a organização do trabalho com
The Principles of the Scientific Management (1911), o enfoque é posto nas falhas de gestão
13	
  
	
  
como explicação para os maus resultados, e não nas condições sociais dos trabalhadores
como o faziam as correntes anteriores (cf. Cunha et al., 2007: 57).
Em 1927, a investigação levada a cabo por Elton Mayo na fábrica da General
Electric no bairro de Hawthorne, em Chicago, dá origem à Escola das Relações Humanas.
Elton Mayo, formado em medicina e filosofia, conclui com estes estudos que as relações
entre os trabalhadores influenciavam consideravelmente os níveis de produtividade (cf.
Lite, 1997: 115). Passa-se assim de uma visão mecanicista e racionalista, para uma
perspectiva humanista da organização, a qual valoriza o factor humano e as relações entre
os trabalhadores. O enfoque nas relações humanas conduz inevitavelmente a uma maior
atenção relativamente aos processos de comunicação entre os trabalhadores, e por isso se
considera que a Teoria das Relações Humanas introduz na abordagem às organizações a
questão da comunicação organizacional.
A autonomização da comunicação organizacional enquanto disciplina científica dá-
se na década de 60 no seguimento da separação da investigação em comunicação
empresarial e industrial, da investigação em comunicação organizacional. W. Charles
Redding foi um dos teóricos que mais dinamizou a investigação sobre o tema, e que
acreditava que a investigação empírica e crítica da comunicação em vários contextos tinha
resultados positivos (cf. Buzzanell e Stohl, 1999: 327).
Outros dois momentos contribuíram também para o reconhecimento da comunicação
organizacional: a criação da divisão de comunicação organizacional da International
Communication Association em 1968, e da Academy of Management em 1973.
Em Portugal, destaca-se a formação, em 1990, da Associação Portuguesa de
Comunicação de Empresa (APCE), cuja missão é	
   representar e defender «os interesses
empresariais, profissionais e académicos na área da comunicação empresarial e das
relações públicas em Portugal, ao mesmo tempo que se constitui como um fórum de
discussão e reflexão aberto a todos os interessados nesta especialidade».2
Inicialmente, as teorias de comunicação organizacional concentravam-se na melhoria
da transmissão de informação e procuravam formas de resolver quebras na comunicação
que afectavam a produtividade (cf. Eisenberg, 2009). O importante era que a mensagem
fosse compreendida e resultasse no cumprimento efectivo das orientações superiores.
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
2
Retirado do site www.apce.pt	
  	
  	
  
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Nas décadas de 60 e 70, a metáfora que melhor ilustra a visão da comunicação é a de
um canal. A comunicação é vista essencialmente como transmissão e as organizações
como canais através dos quais os seus membros enviam e recebem mensagens (cf. Putnam
e Poole, 2007: 1). As organizações da época caracterizam-se pelo forte controlo executivo
e por uma gestão do tipo top-down, o que explica o enfoque dado pela teoria à
comunicação descendente, ou seja, à relação chefia – trabalhador.
Outras duas metáforas relacionadas com a visão da comunicação enquanto canal são
a de ferramenta e a de processamento de informação. A metáfora da ferramenta perspectiva
a comunicação enquanto meio de transmissão de mensagens, para a qual a escolha dos
meios é indissociável do tipo de estrutura da organização e do grau de formalidade. Aos
teóricos dedicados a esta perspectiva interessa conhecer os meios através dos quais os
trabalhadores escolhem passar as suas mensagens: cara-a-cara, através de e-mail, em
reuniões, no corredor, através de documentos escritos, entre outros. Na metáfora do
processamento da informação é dado destaque aos destinatários, aos conteúdos das
mensagens e aos padrões de comunicação (cf. Putnam e Poole, 2007: 1).
A partir dos anos 80 várias áreas do mundo organizacional começaram a recorrer ao
trabalho em grupos e a teoria reflectiu essa tendência ao dar maior destaque às interacções
sociais, aos significados e ao exercício de poder (cf. Cunha et al., 2007). Associada a este
tema está a metáfora da ligação, que trata as organizações como redes, nas quais cabe à
comunicação o papel de ligação entre os indivíduos (cf. Putnam e Poole, 2007: 1).
Apesar do comportamento dos grupos ser bastante diverso do comportamento
individual, representando muitas vezes desafios maiores ao nível da gestão, actualmente os
grupos, ou as chamadas equipas, são uma parte vital e cada vez mais natural das
organizações (cf. Bilhim, 2006). Do trabalho em grupo resultam potenciais benefícios,
como:
- Soluções mais rápidas e criativas uma vez que, perante uma questão de resolução
exigente, ter pessoas com diferentes capacidades pode ser a chave;
- Menos resistência por parte das pessoas dado que há uma maior participação nos
processos de tomada de decisões;
- Mais ideias que surgem da discussão em grupo (brainstorming) e que de outra
forma podiam nunca materializar-se (cf. Cunha et al., 2007).
15	
  
	
  
No entanto, se da complexidade dos grupos podem advir muitos benefícios para as
organizações, para que os resultados não sejam inversos ao esperado (menor eficiência,
maior tempo dispendido, maior gasto de recursos), é fundamental que os gestores de uma
organização tenham a capacidade de fomentar nos grupos a coordenação, bem como o
progresso através de uma crítica construtiva. A comunicação representa um papel
importante na articulação e gestão de grupos. É por isso que um dos desafios da
comunicação organizacional no século XXI é precisamente examinar a diversidade de
identidades e a comunicação intergrupal (cf. Jones et al, 2004).
A metáfora da comunicação organizacional mais presente na literatura actual é a do
discurso, ou seja, relativa às funções e estruturas da linguagem. Nesta metáfora, a
conversação é vista enquanto texto que reflecte e constrói a organização (cf. Bilhim, 2006).
A ideia de que o tipo de discursos influencia as práticas comunicacionais de uma
organização (cf. Putnam e Poole, 2007: 3) explica a importância de analisar os discursos
organizacionais de forma a detectar tendências, ou ainda para perceber de que forma e com
que intenção os membros de uma organização utilizam a linguagem.
As metáforas acima referidas e que acompanham a evolução da teoria
organizacional, não se excluem mutuamente, no sentido em que na complexidade das
organizações, e consoante a perspectiva de análise, pode verificar-se a presença de uma ou
mais.
A comunicação organizacional, enquanto processo de utilização de mensagens e
interacções sociais que criam, mantêm e gerem significados num contexto particular (cf.
Putnam e Poole, 2007), tem como um dos seus objectivos providenciar os meios para a
transmissão de informação, essencial à concretização dos fins de uma organização (cf.
Dexter et al., 2006). A comunicação numa organização permite ainda o diagnóstico de
problemas organizacionais, a selecção de alternativas e a coordenação de eventos
organizacionais (cf. Putnam e Poole, 2007).
Nesta dissertação considera-se que a comunicação organizacional se subdivide em
três vertentes: comunicação institucional/corporativa, comunicação de marketing e
comunicação interna (cf. Caldeira, 2008:32). O enfoque desta dissertação, como se verá
mais à frente, é a comunicação interna das organizações.
No que diz respeito aos públicos a que uma organização se dirige, podem considerar-
se dois tipos de comunicação:
16	
  
	
  
- Comunicação externa, dirigida aos clientes, accionistas, partes interessadas e partes
relacionadas;
- Comunicação interna, dirigida a todas as pessoas que fazem parte dos processos de
gestão.
A comunicação põe em comum a organização, com tudo o que esta representa, a
nível interno e externo. Logo, a sintonia entre comunicação externa e interna é
fundamental para assegurar que a imagem que a organização transmite para os seus
públicos é una e coerente.
Nesse sentido terão que ser necessariamente consideradas as novas estruturas
organizacionais e tecnológicas que influenciam directamente a comunicação. Na última
década estas estruturas têm vindo a alterar-se, por um lado devido aos progressos
tecnológicos, e por outro, como consequência da globalização e do ritmo dos mercados:
A envolvente em que as organizações actuais operam não se compagina com a
estabilidade e a certeza. Tecnologias em rápida mutação, competitividade intensa,
clientelas flutuantes, mercados que se abrem e se encerram, turbulências financeiras,
económicas, sociais e políticas à escala planetária, inovação constante, produtos e
serviços com ciclos de vida progressivamente mais curtos, mudança acelerada (Cunha
et al., 2007: 223).
Os vínculos laborais são cada vez mais temporários e flexíveis: «mais do que um
emprego, a pessoa vai adquirindo um conjunto de competências e experiências que
incrementam o seu valor para o mercado de trabalho» (Cunha et al., 2007: 223), o que por
sua vez influencia o desenho e a cultura organizacionais, a relação entre os vários membros
de uma organização, bem como a relação com o exterior.
Ao longo das últimas décadas, os estudos no campo da comunicação organizacional
têm proliferado, acrescentando novas perspectivas a modelos anteriormente propostos e
abordando novas problemáticas suscitadas pela evolução da organização em sociedade e,
sobretudo, pelo rápido desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação
(TIC). De entre essas problemáticas, destacam-se:
- O impacto das novas tecnologias na ética e na comunicação;
- A comunicação inter-grupal;
17	
  
	
  
- A diversidade e complexidade das relações entre as partes interessadas de uma
organização;
- A relação entre os valores culturais e sociais e a ética organizacional (cf. Jones et
al., 2004).
Apesar disso, grande parte dos estudos ainda se concentra sobretudo em questões
micro como a eficácia da comunicação, o impacto das capacidades comunicacionais em
detrimento de outras, juntamente com uma ideia pré-concebida da comunicação ideal (cf.
Jones et al., 2004).
No que diz respeito à evolução da investigação, importa que haja um cruzamento
cada vez maior da área de comunicação organizacional com outras áreas como a do
comportamento organizacional, da psicologia ou da gestão, já que « […] communication in
organisations has been studied not only by communication scholars, but by scholars in
most of the social sciences» (cf. Jones et al., 2004: 723). Aliás, a comunicação é ainda
considerada sub-representada na literatura organizacional face a outros temas, como por
exemplo, negociação, stress ou estratégia, segundo nos diz o ensaio empírico de Chip
Heath e Sim B. Sitkin da Fuqua School of Business da Duke University, em Durham
(EUA), intitulado Big-B versus Big-O: What is organizational about organizational
behavior? (2001). Foi pedido a 70 membros do conselho editorial do Journal of
Organizational Behavior que identificassem os temas mais presentes na literatura do
comportamento organizacional e os menos presentes. O objectivo principal era o de
identificar as áreas que requerem novas contribuições teóricas para desse modo garantir a
vitalidade do campo de estudos.
Assim, outro dos desafios da comunicação organizacional é a inovação teórica e
metodológica, que permita acompanhar da melhor forma possível as rápidas mudanças às
quais as organizações e a comunicação estão sujeitas, bem como um maior enquadramento
da teoria até aqui produzida. É recorrente na literatura mais recente sobre o estado da arte
desta área científica a chamada de atenção de vários autores para a importância de
investigações que decorram no contexto de organizações reais, assistindo à comunicação in
loco, nomeadamente no âmbito da mudança organizacional, em vez de se optar pela
simulação de situações (Jones et al., 2004). Para este efeito são necessárias adaptações
metodológicas e logísticas requeridas pelo trabalho em campo, assim como a receptividade
das organizações em causa (Jones et al., 2004).
18	
  
	
  
No artigo de Jones et al. intitulado Organizational Communication: Challenges for
the New Century (2004), os autores concluem que é necessário combinar aproximações
quantitativas e qualitativas na investigação da comunicação organizacional, sendo que
«The trick will be to develop theory and method sufficiently broad to capture the diversity
of organizations, yet sufficiently specific to allow predictions» (Jones et al., 2004: 740).
Nesse sentido, esta dissertação pretende ser um contributo para o alargamento
teórico, através do cruzamento da teoria produzida com a actualidade dos estudos sobre
comunicação nas organizações.
Para além disso, o conhecimento das práticas de comunicação de uma organização
numa perspectiva in loco, como se verá no Capítulo 4 com o estudo de caso sobre a
Fundação Portuguesa das Comunicações, pretende ser demonstrativo da necessidade de
cada vez mais a investigação recolher da prática novos modelos teóricos, ao mesmo tempo
que as organizações beneficiam com essa produção de conhecimento.
19	
  
	
  
1.2 Comunicação interna
Assistiu-se nas últimas décadas a uma rápida expansão da actividade de comunicação
interna, fruto de uma evolução na forma como são consideradas as organizações (cf.
Almeida, 2003). Com o enfoque das organizações no factor humano enquanto grande
responsável pelo sucesso da organização, trata-se de «obter resultados através das pessoas,
isto é, tornar a comunicação o veículo privilegiado para potenciar a inteligência emocional
e o capital intelectual dos colaboradores» (cf. Caldeira, 2008: 33).
As organizações e os seus gestores reconhecem que, se uma estratégia de
comunicação externa eficaz permite que uma organização tenha visibilidade junto do seu
público externo e faça chegar até esse público os seus produtos e serviços, uma estratégia
de comunicação interna revela-se fundamental para alcançar os objectivos uma vez que
mobiliza o público interno, e contribui para a optimização dos processos organizacionais.
Testemunho da crescente importância da comunicação interna foi a criação, em
1955, da FEIEA - Federation of European Business Communicators Associations, cujo
lema é Connecting Europe’s communicators, e que pretende ser plataforma de contacto
entre as organizações europeias, através da promoção de boas práticas e do
aprofundamento da teoria existente. Actualmente, a FEIEA conta com membros em 11
países da Europa e desde 2001 é responsável por dinamizar estudos com base no método
Delphi, que procuram acompanhar a evolução da área e dar a conhecer práticas de
comunicação interna em várias organizações.
A expansão da actividade de comunicação interna reflectiu-se num investimento
maior nesta área das organizações e no recrutamento de profissionais vocacionados para
comunicar com o público interno. Hoje, mais do que uma revista interna e do que a
existência de uma intranet, a comunicação interna é uma função estabelecida na maior
parte das organizações, considerada «arte de dirigir» (cf. Almeida, 2000: 35), e que requer
profissionais qualificados.
No mais recente estudo (2009) da FEIEA sobre práticas de comunicação interna na
Europa, no qual são comparados resultados actuais com os resultados dos estudos
realizados em 2001 e 2005, constata-se que 97% dos inquiridos considera a comunicação
interna um factor decisivo para o sucesso.
20	
  
	
  
A comunicação interna torna-se hoje ainda mais pertinente devido à velocidade com
que se trabalha, consequência dos avanços tecnológicos e da competitividade global, e à
cada vez maior necessidade de ter os recursos humanos de uma organização motivados e
mobilizados no mesmo sentido.
Se a época de crise económica que as sociedades atravessam representa um desafio
mesmo para as grandes organizações, ela representa igualmente uma oportunidade para os
comunicadores internos, uma vez que existem evidências de que investir no público
interno de uma organização tem consequências positivas até mesmo nos resultados
financeiros das organizações (cf. Connecting Organizational Communication to Financial
Performance, 2004). Assim, perante a exigência e a competitividade actuais, bem como a
necessidade das organizações darem respostas mais rápidas e eficazes, cabe aos
responsáveis pela comunicação interna realçarem, através da definição de estratégias, o
papel importante da comunicação interna.
Tal como existe a preocupação em estruturar as organizações para que estas sejam
eficazes (cf. Rego, 1999: 22), passou a haver também a preocupação em estruturar a
comunicação interna para que esta seja eficaz e contribua para o crescimento da
organização: «As a linking mechanism among the different organizational subsystems,
communication is a central feature of the structure of groups and organizations. It builds
and reinforces interdependence between various parts of the organization» (cf. Gordon,
1993: 273).
A comunicação hierárquica é um dos elementos fundamentais de uma estratégia de
comunicação interna, sendo que um dos temas mais investigado na área da comunicação
nas organizações é o das relações interpessoais.
Ainda que não seja mandatário, nem função primordial da comunicação interna
promover as boas relações pessoais, a comunicação interna eficaz não pode ignorar as
relações entre as pessoas e deve promover o entendimento necessário de modo a que os
processos internos sejam profícuos.
Um dos objectivos da comunicação interna na sua direcção horizontal é agilizar os
processos de gestão (cf. Lite, 1997: 126). Quando há barreiras na comunicação horizontal,
como dificuldades de relacionamento, os processos transformam-se em burocracia
comunicacional e levam mais tempo e recursos para serem resolvidos.
21	
  
	
  
Os autores Wayne Hoy e Cecil G. Miskel (cf. Dexter, Berube e Young, 2006)
verificaram que o número de níveis hierárquicos através dos quais uma mensagem tem que
viajar dentro de uma organização, pode ser visto como a distância que a mensagem tem
que percorrer. Ou seja, à medida que a distância aumenta, a satisfação e a qualidade da
mensagem tendem a diminuir. Assim, ao longo dos anos a relação entre administração e
colaboradores de uma organização tornou-se mais próxima e aberta dado que se foram
eliminando camadas da hierarquia, tornando a comunicação menos vertical, e aproximando
os responsáveis das equipas.
A responsabilidade pela comunicação interna pode ser atribuída a diferentes áreas da
estrutura organizacional. As situações mais comuns são a atribuição à área de recursos
humanos, à área de comunicação institucional ou de marketing, ou à área que engloba as
várias vertentes da comunicação. De acordo com o estudo da consultora Watson Helsby
The Rise of the Internal Communicator (2002), que entrevistou 37 responsáveis pela
comunicação interna de empresas norte-americanas e inglesas, esta actividade está
predominantemente localizada nos departamentos de comunicação, em 67% dos casos,
sendo que apenas em 22% dos casos está no departamento de recursos humanos, 10% no
departamento de marketing e 1% noutras áreas.
Em Portugal, e de acordo com o estudo Diagnóstico de Comunicação Interna - a
opinião dos colaboradores3
, realizado em 2008 pela Spirituc em parceria com a
Associação Portuguesa dos Gestores e Técnicos dos Recursos Humanos, a Associação
Portuguesa Comunicação de Empresa e a Grace, em 14% dos casos a comunicação interna
está integrada na área de comunicação institucional/corporativa, em 12,3% dos casos existe
uma área intitulada comunicação interna, em 11,11% dos casos esta está a cargo de vários
colaboradores em vários departamentos e em 10,9% dos casos situa-se na área de
marketing. As restantes localizações são recursos humanos (6,6%), secretaria-geral (5,8%),
assessoria à administração/assuntos administrativos (4,4%), relações públicas (2,7%),
informática (2,1%), comercial (1,3%), e em regime de outsourcing/equipa externa (0,2%).
Em 9,1% dos casos a responsabilidade pela comunicação interna não está atribuída a
ninguém em particular, em 4,1% dos casos trata-se de outra situação, e 15,5% dos
inquiridos não sabe e/ou não responde.
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
3
	
   Este	
   estudo	
   foi	
   realizado	
   com	
   base	
   numa	
   amostra	
   de	
   1280	
   questionários	
   electrónicos	
   de	
   auto-­‐
preenchimento.	
  
22	
  
	
  
Tal como a estrutura organizacional deve ser definida em função dos objectivos e dos
fins de uma organização, também a integração da comunicação interna na estrutura
organizacional deve considerar esses objectivos. Entende-se assim que a integração da
comunicação interna na estrutura organizacional depende da perspectiva face a esta
actividade, ou seja, do que a organização pretende com a função. Da mesma forma que um
organograma mal estruturado pode ser responsável pelas dificuldades no alcance dos
objectivos, também a localização da comunicação interna na estrutura organizacional não
se trata de uma questão indiferente pois determina a sua actuação.
No que diz respeito à forma como a comunicação interna é concebida pela
organização, existe uma corrente que considera 3 concepções principais: a concepção
burocrática, a concepção relacional e a concepção estratégica (cf. Almeida, 2000).
Numa concepção burocrática da comunicação interna, ou seja em que a estrutura da
organização assenta fundamentalmente na burocracia, a comunicação é instrumentalizada,
sujeita a uma forte estrutura hierárquica. Nesta concepção a organização caracteriza-se pela
especialização e divisão do trabalho, pela impessoalidade nas relações e pela fraca
comunicação horizontal (cf. Putnam e Poole, 2007: 1).
Numa concepção relacional, que parte da premissa de que «relação é comunicação»
(cf. Almeida, 2000: 44), o destaque é dado às relações entre trabalhadores, e a
comunicação interna é considerada valiosa na identificação de áreas problemáticas.
Finalmente, numa concepção estratégica, em que a comunicação interna é entendida
enquanto ferramenta estratégica para a organização, existe uma forte participação dos
trabalhadores nos processos de tomada de decisão. Nesta concepção o destaque é dado ao
conjunto de comportamentos na comunicação.
Entende-se que uma estratégia de comunicação interna deve contemplar todas as 3
concepções acima referidas (burocrática, relacional e estratégica). Isto porque os aspectos
positivos de cada uma são factores que realmente potenciam uma estratégia de
comunicação interna, como por exemplo:
- Na concepção burocrática a definição de procedimentos ou práticas internas;
- Na concepção relacional o diagnóstico de comportamentos internos;
- E na concepção estratégica a preocupação com o feedback dos colaboradores.
23	
  
	
  
A inserção da comunicação interna no departamento de comunicação das
organizações considera-se ser o mais estratégico, uma vez que permite que a comunicação
externa e interna estejam alinhadas e que, mesmo através de meios e acções diferentes,
haja congruência com a missão da organização e seja veiculada uma identidade una.
Na verdade, ainda que os fins da comunicação externa e interna sejam distintos, estes
estão sujeitos aos mesmos princípios e objectivos definidos pela organização. No caso de
esta actividade estar atribuída a outra área como a do marketing ou a dos recursos
humanos, deverá existir igualmente, e de forma mais intensificada, um alinhamento entre
as áreas.
A comunicação interna é considerada ferramenta estratégica pelos benefícios que
pode trazer a uma organização. De uma forma directa, entende-se que a comunicação
interna:
- Promove a circulação da informação por toda a organização, de forma a manter os
colaboradores informados e envolvidos na estratégia e objectivos da mesma;
- Contribui para o agilizar de processos de gestão;
- Promove as relações interpessoais saudáveis e um bom ambiente de trabalho;
- Reforça o sentimento de pertença à organização;
- Facilita a comunicação horizontal e/ou vertical (cf. Caldeira, 2008: 33).
De uma forma indirecta, entende-se que o investimento na comunicação interna permite:
- Uma maior produtividade;
- Uma redução do absentismo;
- Uma maior qualidade de serviços e produtos;
- Um aumento nos níveis de inovação;
- Um menor número de greves;
- Um menor desperdício de recursos (cf. Hargie e Tourish, 2000: 6).
Nesse sentido, e segundo a Associação Francesa de Comunicação Interna4
, as
funções da comunicação interna (cf. Lite, 1997: 118) são:
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
4
	
   A	
   Association	
   Française	
   de	
   Communication	
   Interne	
   (Afci)	
   foi	
   criada	
   em	
   1989	
   e	
   reúne	
   mais	
   de	
   400	
  
membros,	
  profissionais	
  da	
  comunicação	
  de	
  empresas	
  públicas	
  e	
  privadas,	
  consultores	
  e	
  universidades.	
  
24	
  
	
  
- Investigar, ou seja, conhecer e avaliar o clima organizacional através do contacto
com as perspectivas dos colaboradores;
- Orientar, quer seja as chefias na sua relação com os restantes colaboradores, quer
seja em processos de gestão e de decisão;
- Informar, sobre tudo o que é necessário e útil ao trabalho dos colaboradores e à sua
identificação com a organização;
- Dinamizar e coordenar, as redes de comunicação interna, o ambiente de trabalho e
as acções internas, de forma a potenciar os resultados;
- Organizar campanhas internas, ou seja, momentos de encontro, de esclarecimento,
de partilha, acções internas que entusiasmem os membros de uma organização;
- Formar, no sentido da aquisição de competências e da promoção de melhores
práticas comunicacionais e, consequentemente, profissionais.
Um dos principais desafios da comunicação interna é mobilizar o público interno
em prol dos objectivos da organização. Isto porque, quando os colaboradores partilham a
identidade da organização, mais facilmente se sentem compelidos a atingir os objectivos
propostos pela estratégia da organização (cf. Seruya, 2009).
Para além disso, o principal veículo da identidade de uma organização para o
exterior é o público interno, havendo mesmo a evidência de que quanto mais as pessoas
acreditam nos valores da organização de que fazem parte mais integradas e motivadas se
sentem (cf. Mitchell, 2002). Daí que seja fundamental gerir as relações entre as pessoas e a
organização, nomeadamente através da comunicação dos seus objectivos e da sua
estratégia, o que pode passar pela construção, mais ou menos formal, de uma marca
interna.
Assim, a comunicação interna enquanto ferramenta que contribui para o
desenvolvimento de uma cultura organizacional deve empenhar-se em fortalecer a
identidade das organizações, em primeiro lugar, junto do público interno.
Face à internacionalização e à expansão das organizações, a necessidade de ter todos
os colaboradores mobilizados no mesmo sentido, com base nos mesmos valores, torna-se
ainda mais premente. Para isso, é fundamental que a organização, através da sua área de
25	
  
	
  
comunicação interna, tome consciência de quem é o seu público interno ou públicos
internos, e quais suas as principais necessidades.
No estudo Diagnóstico de Comunicação Interna - a opinião dos colaboradores
(2008), numa questão de resposta múltipla, 60,9% dos inquiridos considera que uma das
maiores necessidades de comunicação interna diz respeito à informação de apoio à
melhoria das competências. É assim interessante que, numa época em que as tecnologias
de informação e comunicação estão tão disseminadas e veiculam informação de diferentes
maneiras, os colaboradores acusem falta de informação.
Entende-se que a comunicação interna desempenha um papel central na circulação de
informação numa organização, enquanto:
- Emissor: considerando por exemplo a divulgação de acções, comunicados ou
procedimentos internos;
- Receptor: recolhendo o feedback dos colaboradores de uma organização;
- Coordenador: formando e gerindo a transmissão de informação entre áreas, e ainda,
entre o interior e o exterior da organização.
A responsabilidade da comunicação interna informar o público interno é uma
questão complexa. Ou seja, se por um lado a ausência de informação pode ser perigosa e
desastrosa numa organização, uma vez que afecta o desenrolar dos processos internos, por
outro, informação em excesso pode ser prejudicial ao sobrecarregar as pessoas com
mensagens que podem não ser apreendidas (cf. Rego, 1999: 26).
A informação pode ainda representar uma barreira à comunicação, quando utilizada
como ferramenta de poder por quem a detém numa organização: «(...) face a incertezas
decorrentes de percepções e estratégias diferenciadas existe uma quase obrigatoriedade de
defesa por parte das pessoas» (cf. Almeida, 2003: 44). Ou seja, a retenção de informação
ou o fornecimento de informação manipulada são prejudiciais à organização. Desse modo,
torna-se ainda mais pertinente a atenção actualmente dada pela teoria à interpretação dos
discursos e das mensagens veiculadas dentro da organização.
Apesar destas considerações, importa ressalvar que cingir a actividade de comunicação
interna à transmissão de informação não só é redutor, como confunde dois conceitos
distintos: informação e comunicação. A informação actua de uma forma unidireccional e a
comunicação é bidireccional. Ou seja, mais do que fazer chegar mensagens através dos
vários canais, a comunicação interna preocupa-se com a compreensão dessas mensagens,
26	
  
	
  
colabora na coordenação dos processos de gestão, motivando os colaboradores a melhorar
os seus comportamentos (cf. Lite, 1997).
Exactamente porque a comunicação não é uma actividade de sentido único, é
fundamental desenvolver práticas que contribuam para a circulação fluida da informação,
nomeadamente para evitar interpretações erradas entre colaboradores de uma organização
(cf. Rego, 1999). Um ciclo vicioso de más interpretações danifica as relações laborais e em
última análise desgasta os indivíduos: mais do que falar, é importante comunicar.
Nos últimos anos, surgiu o conceito de gestão do conhecimento que assenta na
premissa de que mais do que obter dados e receber informações, importa compreendê-los
(cf. Kluge et al, 2002). A partir dessa compreensão e de uma gestão eficaz do
conhecimento, fazendo-o chegar a todos os colaboradores, é possível aumentar a
rentabilidade das organizações.
Grande parte dos estudos na área da comunicação organizacional tem-se concentrado
em questões micro como a eficácia da comunicação e o impacto das capacidades
comunicacionais. Na verdade, a eficácia comunicacional é um aspecto central para as
organizações, uma vez que consiste na optimização efectiva, ou seja com sucesso, dos
processos organizacionais (cf. Zanluchi et al, 2006). A comunicação é eficaz quando há
compreensão entre o emissor e o receptor. No entanto, o contexto em que os mesmos estão
inseridos, a forma como é transmitida a mensagem e o canal escolhido são determinantes
para haver eficácia: «A selecção dos canais representa um dos aspectos fulcrais na eficácia
comunicacional» (cf. Cunha et al, 2007: 438) As características dos canais escolhidos para
comunicar internamente determinam o tipo de mensagem que pode ser veiculada através
dos mesmos e vice-versa (cf. Cunha et al, 2007: 438). Assim, uma estratégia de
comunicação interna deve incluir a selecção e dinamização dos meios de comunicação
mais adequados à organização.
No estudo Diagnóstico de Comunicação Interna - a opinião dos colaboradores
(2008), 90,1% dos inquiridos considera que as acções de comunicação interna digitais mais
recordadas realizam-se através de e-mail. O estudo da FEIEA, já referido e que considera o
universo europeu, confirma a tendência de que, dos meios digitais, o e-mail é o mais
utilizado e considerado o mais eficaz (cf. Internal Communication across Europe III,
2009).
27	
  
	
  
Não há dúvida de que o desenvolvimento e cada vez maior aplicação das tecnologias
de informação e comunicação nas organizações, para além de ter permitido novas formas
de trabalho mais flexíveis, nomeadamente à distância, permitiu às organizações a
utilização de novos meios de comunicação interna, como por exemplo, e para além do e-
mail: a intranet, a newsletter ou a televisão interna (cf. Jones et al., 2004: 734). A Internet,
e em concreto a presença online das organizações através dos seus websites e das redes
sociais, transformou a relação das organizações com os seus públicos. Através destas
plataformas digitais as organizações conseguem um novo alcance para os seus bens e/ou
serviços, recebem feedback dos consumidores e comunicam a sua identidade, os seus
valores e a sua história a um universo alargado de pessoas.
Os meios digitais são considerados os mais adequados para a transmissão de
mensagens curtas e rápidas (cf. Larkin e Larkin, 2005). Relativamente ao e-mail, que
actualmente é ferramenta de trabalho essencial na maior parte das organizações, há o risco
de o processo de transmissão de uma mensagem ser todo feito por este meio, descurando a
comunicação cara-a-cara ou via telefone.
A perspectiva optimista das tecnologias de informação e comunicação vê-as como
possibilidade de superar as barreiras hierárquicas e chegar a todos os colaboradores, pondo
mesmo em causa a ideia de que a comunicação cara-a-cara seja a ideal. No entanto, a
perspectiva pessimista das tecnologias de informação e comunicação questiona o grau de
valor acrescentado e o potencial destas tecnologias para as organizações (cf. Jones et al.,
2004: 734).
Como na utilização de qualquer meio e para evitar que as mensagens e os diferentes
meios se transformem em poluição, as tecnologias de informação e comunicação devem
ser doseadas consoante as reais necessidades de comunicação interna, e tendo como base o
tipo de mensagens a transmitir. Como conclui a consultora Watson Helsby no estudo The
Rise of the Internal Communicator (2002) conduzido em 37 grandes empresas inglesas e
norte-americanas, há um grande investimento em ferramentas de comunicação interna que
nem sempre considera uma estratégia global. Numa organização com 50 colaboradores,
por exemplo, talvez não faça sentido a existência de uma intranet, mas sim um sistema de
correio interno eficaz.
Outro dos principais desafios para uma organização prende-se com a comunicação da
mudança organizacional, reconhecida como sendo «a central process in planning and
28	
  
	
  
implementing change» (Jones et al., 2004: 735). Num estudo realizado pela Deloitte &
Touche em parceria com a Associação Americana de Gestão (1995), 97,7% dos inquiridos
afirmaram que a comunicação é requisito chave para a gestão de processos de mudança (cf.
Cunha et al., 2007).
Em momentos de mudança, como situações de expansão da organização, entrada de
novos colaboradores, ou alteração de procedimentos, o grau de incerteza e desconfiança
aumenta, daí que seja fundamental haver uma comunicação eficiente que permita e facilite
essa mudança. Ou seja, deve ser fornecida aos colaboradores informação clara e em tempo
útil sobre em que consiste a mudança e de que forma se desenrolará o processo, para que
estes se sintam envolvidos e parte activa desse processo, mas acima de tudo para que estes
se sintam compelidos a fazer o que lhes exige essa mudança.
A mudança pode significar alterações na estrutura organizacional que conduzem
eventualmente a alterações nos canais e a novas ligações entre os colaboradores (cf. Jones
et al, 2004). A comunicação permite também que no decorrer de processos de mudança se
mantenha a coesão interna, tentando evitar que «[…] a inércia favoreça a continuação das
práticas instituídas» (Cunha et al., 2007: 855).
Um exemplo de uma acção de comunicação interna centrada num processo de
mudança foi o reposicionamento de imagem da Portugal Telecom que, em Maio de 2009,
deu a conhecer a sua nova imagem institucional, ao mesmo tempo que lançava a sua
estratégia para a implementação de uma rede de fibra óptica.
A apresentação da nova imagem foi feita em primeiro lugar ao público interno e
contou com a distribuição de informação e merchandising, com o objectivo de cativar e
chamar a atenção dos colaboradores da Portugal Telecom para esta nova imagem, apelando
a uma identificação e à transição para um novo posicionamento no mercado ligado à fibra
óptica.
Apesar de ser reconhecida enquanto ferramenta estratégica, a comunicação interna
não é ainda uma prioridade para todos os gestores nem para todas as organizações. Aliás,
ainda que seja inegável a importância da vontade de mais e melhor comunicação interna
partir das chefias e dos gestores, isso nem sempre se verifica. Por um lado, devido à
tendência para dar maior importância ao ambiente externo da organização, e por outro
devido à incapacidade de avaliar o retorno financeiro dos investimentos em comunicação
interna.
29	
  
	
  
Assim, importa que se produzam cada vez mais estudos que ilustrem e fundamentem
o impacto da comunicação interna não só em organizações empresariais, mas também
sociais, e sobretudo, como se verá mais à frente, culturais.
Só assim se terão novas perspectivas e novos modelos de comunicação interna que
verdadeiramente a promovam não como ferramenta pontual, mas como ferramenta
transversal e indissociável da actividade das organizações e do seu sucesso.
30	
  
	
  
Capítulo 2
As Organizações Culturais
«A arte e a cultura (...) servem para que, na vida de cada um de nós, o futuro esteja
presente e o tédio ausente, a ludicidade aconteça e a barbárie se afaste.»	
  
António Pinto Ribeiro
2.1 O impacto da cultura
Se o século XX assistiu à emergência das indústrias culturais e criativas enquanto
geradoras de riqueza e de emprego, no século XXI o sector cultural e criativo é
reconhecido enquanto motor de desenvolvimento e de aperfeiçoamento das sociedades,
capaz de potenciar investimento e consumo. Gradualmente, a cultura deixa de ser vista
numa perspectiva restrita e muitas vezes associada a subsídios públicos, e passa a ser
considerada na sua multiplicidade de relações com a economia, a criatividade e a
tecnologia (cf. O sector cultural e criativo em Portugal, 2010).
Este 2º capítulo concentra-se naquela que é a unidade de análise deste trabalho: as
organizações culturais. Num cenário em que o peso do sector cultural e criativo continua a
crescer ao nível económico e social, produzindo muitas vezes efeitos para além da sua área
de actuação, e difíceis de avaliar, importa cada vez mais considerar as organizações deste
sector do ponto de vista da sua gestão. Na verdade, e como se verá mais à frente, são ainda
poucos os estudos desenvolvidos que dizem respeito a práticas organizacionais e de gestão
na área cultural (cf. Lampel et al, 2000). No entanto, perante o crescimento do sector, a
incerteza da envolvente e a crescente concorrência, mas também um nível de exigência
maior da parte do mercado, é fundamental que as organizações culturais se apresentem tão
competitivas e profissionais como as restantes organizações da sociedade.
Numa primeira parte deste capítulo começa-se por contextualizar a evolução do sector
cultural e criativo, através da apresentação de dados sobre o impacto económico das
actividades culturais e criativas. Para além de se analisarem alguns dos mais recentes dados
31	
  
	
  
quantitativos, é feita uma apreciação qualitativa do sector e da sua importância para a
sociedade.
Posteriormente é explicado o que se entende por organizações culturais de acordo com
os objectivos desta dissertação e com base na literatura produzida sobre o tema. São
apresentadas as características das organizações culturais, mais concretamente as
especificidades que derivam da área de actuação em que estas se inserem, sobretudo pelo
tipo de bens e serviços que oferecem. Finalmente, são abordados alguns dos desafios
implicados neste sector de actividade.
Importa ter em conta uma série de factores sociais e económicos que contribuíram para
o salto qualitativo e quantitativo das actividades culturais e para que a cultura seja
considerada cada vez mais factor de desenvolvimento, nomeadamente:
- A terciarização da economia, da qual fazem parte as actividades culturais;
- A democratização da cultura;
- A influência das indústrias culturais nas sociedades, reforçada pelos media (cf.
Lampel et al., 2000)
- A evolução dos horários de trabalho, o que permitiu mais tempo de lazer, e
consequentemente uma crescente preocupação com a ocupação dos tempos livres;
- A alteração nos hábitos culturais e padrões de consumo, consequência de uma
melhoria do nível de rendimento médio das famílias;
- O desenvolvimento tecnológico, dinamizador das actividades culturais e criativas
pelas novas soluções e pelo alcance que permite;
- A qualificação das sociedades, o que permitiu que a cultura fosse cada vez mais vista
como um produto de consumo (cf. O Sector Cultural e Criativo em Portugal, 2010).
Na origem do interesse, cada vez maior, da sociedade pela cultura, destaca-se a
Internet que se tornou rapidamente plataforma de excelência para a distribuição e difusão,
tornando mais rápida e acessível a divulgação e disponibilização de produtos e serviços
culturais. Ao mesmo tempo, a presença online do sector cultural levantou novas questões,
como por exemplo as que se referem ao copyright.
O desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação permitiu também a
evolução das actividades criativas, nomeadamente as mais ligadas à comunicação
empresarial e ao marketing, como o design e a programação.
32	
  
	
  
Um conceito incontornável na abordagem deste tema e estruturante para o sector
cultural é o conceito de indústria cultural, avançado por Theodor Adorno e Max
Horkheimer em 1947 para criticar a nova relação da cultura com a economia, na qual os
novos sistemas de reprodução e distribuição desempenharam um importante papel.
Este conceito surgiu como forma de denominar a industrialização da cultura,
distinguindo-a das actividades culturais tradicionais, bem como para alertar para os perigos
da subjugação da arte à economia.
A definição de indústrias culturais, enquanto indústrias de produção e consumo
cultural com significado para além do objecto, ou seja capazes de produzir significado
cultural e social, não reúne consenso na literatura existente, não só pelas diferentes
concepções na delimitação deste subsector, mas também pelas múltiplas perspectivas face
às organizações que o constituem.
É possível distinguir duas perspectivas face às indústrias culturais:
- Uma delas, mais restrita no que diz respeito à sua delimitação e com uma postura
marcadamente diferenciada na relação com outras áreas do sector cultural e com outras
indústrias;
- E a outra mais abrangente e conciliadora, no sentido em que considera as indústrias
culturais em permanente actualização e numa relação cada vez mais permeável com as
outras áreas culturais, bem como com as outras indústrias.
Esta última considera as indústrias culturais num sentido mais alargado, quer seja por
incluir nesse âmbito os sectores não lucrativos das organizações culturais como propõe
Paul M. Hirsch (cf. Cultural Industries Revisited, 2000) ou por equacionar a possibilidade
de o teatro ser uma indústria cultural não lucrativa (cf. Lampel et. al, 2000: 266). Também
Emílio Rui Vilar no seu texto Sobre a Economia da Cultura (2007), e distanciando-se de
uma delimitação mais restrita, perspectiva que as indústrias culturais possam englobar
igualmente o restauro, a conservação do património, o turismo de motivação cultural ou a
distribuição em escala de produções artísticas.
Lampel et. al (2000) consideram que se torna cada vez mais difícil ignorar as
indústrias culturais, em latu sensu, cuja gestão tem que aliar conhecimento e criatividade
para acrescentar valor aos seus produtos, e com a qual as outras indústrias podem aprender.
33	
  
	
  
As indústrias culturais operam num mercado marcado pela ambiguidade, incerteza e
dinamismo, traços característicos e semelhantes aos mercados de outras indústrias (cf.
Lampel et. al, 2000).
Continuando nesta perspectiva, não só é possível traçar paralelismos entre as indústrias
culturais e outras indústrias, como é possível estabelecer vários paralelismos entre as
indústrias culturais e os outros sectores culturais, tal como refere Maria de Lourdes Lima
dos Santos no texto Indústrias Culturais: Especificidades e Precariedades (1999). No que
diz respeito à interdependência das indústrias culturais com os outros sectores culturais -
património, artes performativas e artes visuais - esta verifica-se nomeadamente na
dependência do mercado, na imprevisibilidade ao nível da recepção de bens e serviços, e
na procura pela inovação.
O interesse da economia pela cultura, não sendo recente, materializa-se na disciplina
científica de economia da cultura, em 1966 com a publicação do livro Performing Arts –
The Economic Dillema de Baumol e Bowen, beneficia actualmente de estudos mais
direccionados para a quantificação e sistematização de práticas. Esta quantificação e
sistematização permitem não só compreender o impacto da cultura na economia e vice-
versa, como equacionar novas estratégias a fim de tornar esta relação mais profícua.
No entanto, o sector nem sempre foi receptivo a essa sistematização e quantificação
por se considerar que a arte e a criatividade são valores independentes de uma qualquer
justificação económica (cf. The Economy of Culture, 2006). Para além disso, o rápido
crescimento do sector e a sua complexidade, bem como a ausência de recursos destinados à
quantificação e sistematização das práticas, explicam que a tradição de produção de
informação estatística fiável e criteriosa seja recente.
Na última década vários estudos nacionais e internacionais, promovidos na sua maioria
por organismos estatais com responsabilidades ao nível das políticas culturais, como os
Ministérios da Cultura, ou por entidades oficiais ligadas às actividades culturais, como a
UNESCO (United Nations Educational, Scientific, and Cultural Organization), têm
contribuído para o conhecimento de qual o impacto e alcance do sector cultural e criativo
na economia, bem como para a identificação de tendências no sector, nomeadamente ao
nível do emprego e da qualificação dos profissionais.
Na verdade, o tratamento estatístico e a avaliação das práticas do sector cultural e
criativo, tendo em conta as especificidades dos vários sectores que o constituem, não só
34	
  
	
  
proporcionam um conhecimento mais claro e detalhado desta área, como são úteis para o
crescimento das organizações culturais e criativas, garantindo-lhes credibilidade perante o
mercado.
A preocupação em saber mais sobre o sector, ainda que de uma perspectiva
quantitativa que, como se verá mais à frente, per se não é suficiente, demonstra o interesse
da economia pela cultura e ilustra o impacto económico das actividades culturais e
criativas nas sociedades actuais. Para além disso, surge também como base, e muitas vezes
como condição necessária, para a elaboração de políticas e definição de estratégias para a
cultura.
Dada a complexidade do sector, e considerando ainda que as actividades culturais e
criativas se encontram em permanente evolução, um passo fundamental dos estudos
recentemente publicados e do tratamento estatístico é a delimitação do sector cultural e
criativo. Os conceitos de actividades culturais e criativas, assim como o próprio conceito
de cultura, têm evoluído, e por não serem estanques, adaptam-se às circunstâncias e são
moldados pela sociedade, existindo em permanente construção. Assim, também a
delimitação de cada subsector varia e adapta-se à medida que vão surgindo novas áreas de
actividade, como por exemplo o software, no que diz respeito às indústrias criativas.
Nesta dissertação, adopta-se a delimitação feita no estudo publicado em Janeiro de
2010 sobre o sector cultural e criativo em Portugal, realizado por encomenda do Gabinete
de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais (GPEARI) do Ministério
da Cultura à sociedade de consultores Augusto Mateus & Associados.
Pela primeira vez é feito um retrato abrangente e fundamentado do panorama cultural
nacional e, à semelhança de outros estudos realizados a nível internacional, passa a ser
também equacionado o sector criativo. Esta inclusão das actividades criativas representa
uma mudança e surge por se considerar a cultura enquanto input de muitas das actividades
criativas, como por exemplo do design de produto e da produção de software. Ainda que
seja um desafio alargar o sector cultural às actividades criativas, dessa forma é possível
compreender também as implicações da cultura na sua multiplicidade de relações (cf. O
sector cultural e criativo em Portugal, 2010).
Entende-se assim que o sector cultural e criativo engloba:
- As actividades culturais nucleares, das quais fazem parte as artes performativas, as
artes visuais e a criação literária, e o património histórico e cultural;
35	
  
	
  
- As indústrias culturais, das quais fazem parte o cinema e o vídeo, a edição, a música,
a rádio e a televisão, e ainda, os bens de equipamento, a distribuição/comércio e o turismo
cultural, consideradas actividades transversais de suporte ao sector;
- As indústrias criativas, que incluem a arquitectura, o design, a publicidade, os
serviços de software e as componentes criativas em outras actividades.
Em 2003, as actividades culturais e criativas contribuíram em 2,6% para o PIB
europeu, revelando um crescimento 12,3% superior à média da economia em geral,
segundo o estudo The Economy of Culture (2006) preparado para a Comissão Europeia
pela consultora KEA – European Affairs.
Em Portugal, o estudo recentemente publicado pelo GPEARI, confirma a tendência
europeia e revela que o sector criativo e cultural em 2006 contribuiu em 2,8% para o PIB
nacional, mais do que as indústrias têxteis e alimentares, sendo responsável por um valor
acrescentado bruto (VAB) de 3.691 milhões de euros (cf. O Sector Cultural e Criativo em
Portugal, 2010).
Em termos de criação de emprego, o contraste entre o crescimento do sector cultural e
criativo e o total da economia ainda é maior: ao nível europeu e perante o decréscimo de
emprego, o emprego no sector cresceu 1,85% entre 2002 e 2004 (cf. The Economy of
Culture, 2006) e, em Portugal, no período de 2000 a 2006, o sector cresceu 4,5%, criando
6500 novos postos de trabalho, face a uma média de crescimento de 0,4% no total da
economia nacional (cf. O Sector Cultural e Criativo em Portugal, 2010).
De notar ainda que, quer a nível europeu quer a nível nacional, a tendência em termos
de qualificação académica no sector cultural e criativo aponta para uma maior percentagem
de trabalhadores com habilitações de nível elevado em comparação com o total da
economia (cf. O Sector Cultural e Criativo em Portugal, 2010). Estes dados relativos à
qualificação académica dos profissionais do sector são sem dúvida um sinal positivo e de
que a tendência é para uma profissionalização cada vez maior.
Sem desvalorizar os dados apresentados, o incremento do impacto económico do
sector cultural e criativo e a sua capacidade de criar valor acrescentado, deve também ser
lido à luz da recente fragilização dos mercados financeiros, o que explica que, tanto a nível
europeu como a nível nacional, estes sectores tenham superado indústrias tradicionais e
sectores habitualmente reconhecidos como geradores de riqueza, como é o caso do sector
36	
  
	
  
imobiliário que, a nível europeu e no mesmo período acima considerado, foi responsável
por 2,1% do PIB (cf. The Economy of Culture, 2006). A época de crise que marca a
actualidade pode igualmente ser vista como uma oportunidade para o sector cultural que
tem a vantagem de estar habituado a operar em mercados voláteis e com níveis de
incerteza elevados, como de resto já se referiu anteriormente.
Na análise detalhada dos dados relativos ao impacto económico do sector, verifica-se
que tanto a nível nacional como europeu, é preponderante o papel das indústrias culturais
na contribuição do sector para a economia. Em Portugal, as indústrias culturais foram
responsáveis, em 2006, por contribuírem em aproximadamente 2,2% para o PIB, face às
contribuições das indústrias criativas e das actividades nucleares que contribuíram em
0,4% e 0,2%, respectivamente.
Fonte: O Sector Cultural e Criativo em Portugal, 2010
A desigualdade na contribuição das actividades culturais nucleares, das indústrias
culturais e das actividades criativas para a criação de riqueza, revela a complexidade das
actividades que constituem os respectivos subsectores, e não pode ser analisada apenas do
37	
  
	
  
ponto de vista quantitativo. Se apenas for considerado o ponto de vista quantitativo e
tomarmos como exemplo a contribuição das actividades culturais nucleares para o PIB
(0,2%), verifica-se que essa contribuição é baixa face às dos outros subsectores.
No entanto, se considerarmos que grande parte das organizações deste subsector não
tem fins lucrativos, e opera numa lógica muito diferente das indústrias culturais e criativas,
esse valor já não se revela tão esclarecedor a não ser que seja complementado com uma
análise que cruze estes dados com dados qualitativos sobre o impacto real e nas várias
dimensões.
Da mesma forma, restringir a actividade e o impacto da cultura ao contributo das
indústrias culturais é redutor e pode conduzir a interpretações viciadas e
descontextualizadas.
Com o avançar das reflexões, conclui-se que os dados quantitativos não reflectem nem
toda a complexidade da evolução do sector nem o alcance do seu impacto na sociedade. Na
verdade, a crítica aos estudos que avaliam o impacto das actividades culturais vai no
sentido de se considerarem maioritariamente e exclusivamente factores económicos,
perdendo assim a noção abrangente do impacto da cultura, já que a análise dos efeitos das
actividades culturais carece de dados qualitativos.
Para autores como Paul M. Hirsch incluir nos estudos sobre o sector a análise
qualitativa dos bens e produtos culturais, numa perspectiva da qualidade dos mesmos, é um
luxo a que os estudos se deviam dar (cf. Cultural Industries Revisited, 2000), apesar da
subjectividade do conceito de qualidade no que se refere às actividades culturais, bem
como da imprevisibilidade na recepção dos bens e serviços culturais pelo público e pelo
mercado. Ainda que o impacto económico da cultura permita a justificação de políticas
culturais este só por si não é suficiente. Uma vez mais, no caso das actividades culturais
com fins não lucrativos, o investimento não é feito prioritariamente a pensar nos resultados
económicos.
O impacto económico do sector cultural e criativo tem ainda um efeito multiplicador
na medida em que produz efeitos indirectos aos investimentos iniciais, como por exemplo
ao relacionar-se com outras áreas como o turismo e até a restauração. O património
cultural atrai turistas, que por sua vez dinamizam o turismo e serviços como a restauração.
38	
  
	
  
O sector actua igualmente como input de outras indústrias e potencia outras
actividades, como por exemplo através do fornecimento de conteúdos para tecnologias de
informação e comunicação, ou pondo a publicidade e o design ao serviço das indústrias
tradicionais como a indústria têxtil (cf. Cantiga Esteves, 2009).
Para além dos efeitos económicos do sector cultural, nomeadamente ao nível do
emprego, da produção de riqueza e da contribuição para o PIB, as actividades culturais, a
cultura, promovem o bem-estar e o entretenimento, estimulam o conhecimento, contribuem
para a integração social e para o reforço da identidade cultural (cf. Vilar, 2007). Ainda que
seja fundamental conhecer com mais detalhe o sector cultural, com todos os desafios
metodológicos que isso implica, os aspectos intangíveis do impacto cultural devem
reforçar a ideia de que há mais para além dos números, como se verá nas páginas a seguir.
	
   	
  
39	
  
	
  
2.2 Especificidades e desafios das organizações culturais
Num primeiro nível podem definir-se as organizações culturais como sendo todas as
organizações cuja área de actividade é a cultura, nas suas mais variadas formas. O facto de
o sector cultural ser complexo e vasto explica que não exista uma só definição deste tipo de
organizações, mas antes diferentes perspectivas consoante os subsectores em questão.
Ao analisar as especificidades das organizações culturais, pelo tipo de bens e serviços
que oferecem, diferentes de subsector para subsector, não se pretende separá-las das
restantes organizações da sociedade. Aliás, como já foi referido anteriormente, são vários
os pontos de encontro (cf. Lampel et. al, 2000). No entanto, parte-se da premissa que as
organizações que operam no âmbito cultural têm características distintas das restantes
organizações da sociedade, nomeadamente pelos fins para os quais trabalham, pelo tipo de
mercado em que se inserem, e pelo tipo de bens e serviços que oferecem, o que por sua vez
requer uma gestão e abordagem específicas.
Por uma questão de objectividade, nesta dissertação são apenas consideradas as
organizações culturais que fazem parte do sector cultural não-industrial (cf. The Economy
of Culture in Europe, 2006), também consideradas actividades culturais nucleares (cf. O
Sector Cultural e Criativo em Portugal, 2009), tais como Fundações, Museus, Associações
Culturais, Companhias de Dança, Teatros, Arquivos, Centros de Documentação,
Bibliotecas, entre outras. Este subsector reúne características que não só diferem de outras
indústrias como também das indústrias culturais, nomeadamente no que diz respeito à
questão da reprodutibilidade e da lucratividade.
Entende-se que o principal input das organizações culturais, para além dos factores de
produção terra, trabalho e capital, é a criatividade. Este valor intangível, que pode ser
denominado de génio humano, distingue as organizações culturais das restantes. Ainda que
a criatividade seja utilizada noutros sectores, em nenhuma área senão a cultural ela é
considerada essencial. O génio humano é matéria-prima da criação artística.
A segunda particularidade das organizações culturais tem que ver com os seus fins. Ao
contrário das organizações cuja lógica é a de acumulação e de lucro (ordem do ter),
habitualmente denominadas de empresas, as organizações do sector cultural procuram
essencialmente a promoção da criação e o desenvolvimento artístico e os seus ganhos são
40	
  
	
  
sobretudo sociais (ordem do ser). Para além disso, sobretudo considerando as actividades
culturais sem fins lucrativos, ao contrário das empresas nas organizações culturais não há
distribuição de lucros.
Os valores a atingir pelas organizações culturais junto dos públicos - a felicidade, o
entendimento, o conhecimento, são razões em si mesmas. Isto não significa, no entanto,
que as actividades culturais não possam gerar lucro: «Apesar de o trabalho artístico
fundamentar-se em princípios muitas vezes antagónicos aos do mercado e esteja mais
associado à produção de cultura e ao interesse público, ele pode ser igualmente concebido
como um serviço capaz de gerar lucro» (cf. Valente et. al, 2007: 119). Este lucro pode não
ser o lucro na acepção mais comum da palavra, mas se o entendermos enquanto conjunto
de benefícios que resultam dos investimentos nas actividades culturais, a terminologia é
adequada. Nesse sentido, o lucro para um Museu pode ser encontrado no indicador relativo
ao número de visitantes, ou numa peça de teatro o lucro pode consistir em críticas
positivas.
Os bens culturais existem essencialmente de três formas:
- bens que estão no mercado, como por exemplo os livros de determinada editora;
- bens que estão no mercado mas sujeitos a subsídios, como seja uma peça de teatro
que é apoiada por uma empresa;
- bens que estão fora do mercado por serem totalmente financiados pelo Estado, como
uma exposição de um dos Museus tutelados pelo IMC.
O mercado em que as organizações culturais operam distancia-se da noção clássica de
mercado, segundo a qual «o mercado é o lugar onde se trocam bens e serviços homogéneos
e onde os agentes possuem tendencialmente a mesma informação» (cf. Vilar, 2007: 134). É
certo que actualmente a incerteza e ambiguidade são características transversais aos
mercados, como aliás já se referiu, no entanto, os mercados dos bens culturais
caracterizam-se pela diversidade e ao mesmo tempo pelo carácter único dos bens
transaccionados, bem como pela intermitência de informação (cf. Vilar, 2007: 134). No
que diz respeito às actividades culturais nucleares – artes performativas, artes visuais e
criação literária e património histórico e cultural, acrescenta-se ainda a incerteza e a
imprevisibilidade ao nível da recepção.
Os bens culturais reúnem as características de materialidade e imaterialidade. Pela sua
dimensão imaterial os bens culturais assumem características de bens públicos como a não-
41	
  
	
  
rivalidade e não-exclusão. A não-rivalidade significa que o consumo de uma pessoa não
impede outra pessoa de consumir esse bem, e a não-exclusão significa que ninguém pode
excluir outra pessoa de consumir esse mesmo bem.
À sua dimensão imaterial associa-se a sua natureza não-utilitária, ou seja, o valor ou a
função que lhes é atribuída geralmente é de ordem estética ou simbólica, e pode não ser
traduzível em valor monetário, como no caso de bens que estejam fora do mercado: «(...)
goods directed at a public of consumers for whom they generally serve as an aesthetic or
expressive, rather than clearly utilitarian function» (cf. Hirsch apud Lampel, 2000: 263). O
facto de o valor que é atribuído aos bens culturais depender da experiência individual faz
também deles bens de experiência: «They derive their value from subjective experiences
that rely heavily on using symbols in order to manipulate perception and emotion» (cf.
Lampel et. al, 2000). O consumo de bens culturais tem a si associada a produção de
externalidades positivas, ou seja, gera efeitos que não são necessariamente contemplados
na definição do seu valor/preço, como por exemplo, «em matéria de coesão económica,
social e territorial, seja em matéria de construção e preservação de formas de identidade e
singularidade comunitárias» (cf. O sector cultural e criativo em Portugal, 2010: 14).
Os bens culturais são ainda considerados bens de mérito uma vez que a sociedade
reconhece a sua existência e a importância do seu consumo na construção de uma
sociedade melhor.
Apesar dos estudos quantitativos recentes e de estudos de caso qualitativos, na revisão
de literatura é visível a lacuna teórica no que diz respeito à gestão deste tipo de
organizações. Lampel et al (2000) consideram que isto se deve ao facto das práticas de
gestão e padrões organizacionais serem diferentes das indústrias tradicionais. Para além
disso, e dado que a gestão cultural é uma disciplina recente, os autores avançam com a
hipótese de que é mais difícil encontrar especialistas culturais, do que por exemplo
encontrar engenheiros ou analistas.
A tendência nacional ao nível do emprego no sector cultural é de crescimento,
conforme se viu anteriormente. No entanto, esse crescimento deverá fazer-se acompanhar
da qualificação, tanto dos profissionais como das actividades culturais, promovendo
formação que vá ao encontro das necessidades reais do mercado cultural (cf. Trabalho e
qualificação nas actividades culturais, 2009).
42	
  
	
  
É de notar que o sector em Portugal é caracterizado por vínculos de trabalho
intermitentes e mais flexíveis do que noutras organizações, o que se deve à sazonalidade e
incerteza que acompanham o trabalho criativo quer ao nível de criação, como ao nível da
recepção (cf. Entidades Culturais e Artísticas em Portugal, 2006). Não obstante a
flexibilidade que requer o trabalho nesta área, é igualmente importante que se inclua nas
prioridades para o sector a regularização e salvaguarda dos estatutos profissionais de quem
nele trabalha.
A gestão deste tipo de organizações requer uma abordagem multidisciplinar e deve
estar ciente das especificidades acima descritas. Ainda assim, muitas das noções e
estratégias da gestão de outras organizações são adaptadas à área cultural, havendo autores,
como Emílio Rui Vilar, que defendem que as organizações culturais podem e devem ser
geridas como empresas.
Na gestão deste tipo de organizações existe principalmente uma tensão na combinação
de valores artísticos e de valores económicos (cf. Lampel et al, 2000).
Face às circunstâncias económicas, à competitividade e à dificuldade de o Estado
atribuir subsídios a todas as organizações culturais, o tema do financiamento deste tipo de
organizações está muito presente nas reflexões actuais: «When it comes to the practical
business of creating and selling cultural goods, firms must proceed with both polarities in
mind» (cf. Lampel et. al, 2000). É cada vez mais imperativo combater a subsídio-
dependência da qual padecem, voluntariamente e involuntariamente, muitas organizações.
Assim, e sobretudo as organizações culturais que operam no âmbito não-lucrativo e
que mais se ressentem das condições atrás descritas, não podem ignorar a necessidade de
procurar financiamentos, de considerar o mercado e o que o público procura.
Tendo em conta as especificidades acima apresentadas, é possível concluir que um
dos principais desafios deste tipo de organizações é o equilíbrio entre valores artísticos e
valores de mercado. Por um lado, pode haver a tentação de definir como critério principal
aquilo que é monetariamente mais lucrativo ou aquilo que vai ao encontro exclusivo
daquilo que o público pretende, desconsiderando assim a missão e objectivos da
organização em questão, e submetendo valores artísticos à lógica de mercado (cf. Valente,
2007) Por outro lado, as organizações culturais correm o risco de não garantir a sua
rentabilidade e sustentabilidade se ignorarem o mercado e o público. Assim, é importante
conciliar valores artísticos com a procura e com o mercado.
43	
  
	
  
Outro dos desafios resulta da instabilidade derivada das alternâncias de governos
que muitas vezes por razões políticas não equacionam o bem comum, eliminam políticas
anteriores de sucesso, ou alteram modelos já implementados.
Em Portugal, ainda que nos últimos anos se tenha vindo a assistir a um apoio maior
das empresas a organizações de carácter cultural, quer através de apoios, parcerias como
também através do mecenato, ainda falta às organizações culturais credibilidade no
mercado português, nomeadamente ao nível do fundraising, ainda muito embrionário em
Portugal e que implica que as empresas e várias organizações da sociedade civil invistam
mais na cultura como parte da sua responsabilidade social.
No futuro as organizações culturais devem continuar a apostar num tipo de gestão
mais profissional e numa perspectiva sustentável. Para isso é necessário atingir um
equilíbrio desejável, mas difícil, entre a abertura ao mercado e os princípios e objectivos
artísticos da organização. É igualmente importante dinamizar uma “cultura” de avaliação
de custos, de benefícios e de resultados, o que implica a «adopção de critérios baseados em
indicadores de desempenho e análises custo-benefício» (cf. O sector cultural e criativo em
Portugal, 2010:127).
44	
  
	
  
Capítulo 3
A comunicação interna nas organizações culturais: o desafio
Como se pretendeu demonstrar no capítulo 1, a comunicação é uma área cada vez
mais central para as organizações, quer a nível externo, como se constata pelos grandes
investimentos em marketing e campanhas publicitárias, quer a nível interno, considerando
que em organizações empresariais, sobretudo de grande dimensão, a comunicação interna é
uma actividade em crescimento (cf. Internal Communication Across Europe, 2009).
Entende-se que o objectivo dos investimentos em comunicação, sejam eles
financeiros, técnicos e/ou humanos é, num primeiro plano, contribuir para que as
organizações se tornem mais eficazes. Essa eficácia significa, entre várias possibilidades,
produzir mais, reduzir custos, chegar a mais gente ou perder menos tempo. Mas num
segundo plano, é reconhecido que o investimento na comunicação, concretamente na
comunicação interna, e com tudo o que isso representa, contribui para que os trabalhadores
se sintam mais motivados e mais satisfeitos com aquilo que fazem e com a organização a
que pertencem.
Assim, em contexto organizacional, não se trata apenas de fazer mais mas trata-se
também de fazer melhor. E para fazer melhor, as organizações reconhecem que as pessoas
com todo o seu capital intelectual, emocional e espiritual, têm uma influência enorme.
Nesse sentido, entende-se que a comunicação interna intervém com a intenção última de,
através dos seus meios e acções, potenciar o talento de cada pessoa ao serviço da
organização.
Como se viu no capítulo 2, o desenvolvimento das tecnologias de informação e
comunicação permitiu à cultura, nas suas variadas formas, uma projecção e um alcance que
muito contribuíram para o seu reconhecimento enquanto motor de desenvolvimento, e que
potenciaram o seu consumo. Graças às tecnologias de informação e comunicação, a
divulgação de actividades junto dos públicos externos, fundamental para as organizações
culturais, beneficiou de novos meios de comunicação, levando as organizações a transpor a
sua presença também para o mundo digital, quer através da criação de websites, quer
através da presença nas redes sociais.
45	
  
	
  
Interessa questionar se esse investimento na comunicação externa das organizações
culturais foi acompanhado de um desenvolvimento e respectivo investimento na
comunicação interna.
Pelo que se verifica na literatura actual são vários os estudos que abordam a evolução
da actividade de comunicação interna em organizações empresariais ou que destacam boas
práticas, alguns já citados como os estudos da FEIEA, ou The Rise of the Internal
Communicator (cf. Watson Helsby, 2002), Diagnóstico de Comunicação Interna - a
opinião dos colaboradores (cf. Comunicação Empresarial, 2008), Internal
Communications - more to deliver (cf. Watson Helsby, 2009), ou outros como
Comunicação Interna nas Empresas – boas práticas de comunicação interna em matéria
de desenvolvimento sustentável (cf. BCSD Portugal, 2007); no entanto, são praticamente
inexistentes os estudos que abordam a comunicação interna no contexto de organizações
culturais.
Nesse sentido, e partindo da premissa de que a comunicação interna é ferramenta
estratégica para as organizações, pretendeu-se nesta dissertação:
- Reflectir sobre o desafio que representa esta actividade em organizações de carácter
cultural, à luz das novas formas de comunicar, bem como das especificidades deste tipo de
organizações;
- E aprofundar o conhecimento das práticas de comunicação interna no contexto de
organizações culturais.
Uma vez que as organizações culturais são criadas e mantidas para atingir objectivos
que, e como se viu anteriormente, diferem de outras organizações, nomeadamente das
organizações empresariais, considerou-se ainda no início desta investigação que seria
maior o desafio da comunicação interna nas organizações culturais devido ao conjunto de
características e especificidades que estas reúnem.
À palavra desafio, concretamente ao acto de desafiar, estão associadas as ideias de
provocação, de luta e estímulo. O desafio, que consta do título desta dissertação, é
encarado numa perspectiva dupla, ou seja:
- por um lado, um desafio pela importância da comunicação interna no contexto
organizacional;
- por outro, um desafio pelas especificidades das organizações culturais.
46	
  
	
  
Tal como foi referido no capítulo 1, a comunicação interna numa organização é
influenciada por uma série de factores como a sua localização na estrutura organizacional,
a estratégia da organização ou os recursos existentes. Nesse sentido, o facto de ser uma
actividade que depende da organização em si e dos vários departamentos, determina que a
comunicação interna tenha que lutar por chegar ao público interno. O termo lutar é
empregue na perspectiva do desafio. Actualmente, mesmo nas organizações que mais
dinamizam e investem na área de comunicação interna, é reconhecido o desafio de
comunicar com o público interno. Isto porque, a comunicação interna, mesmo nas
organizações que mais nela investem, é desafiada:
- Pela dificuldade em medir e avaliar o retorno do investimento na mesma;
- E pela tendência nalgumas organizações em perspectivá-la apenas enquanto
disseminadora de informação (cf. Watson Helsby, 2009).
Para além disso, a relação da comunicação com o público interno deve ser
equilibrada, através de uma provocação positiva, no sentido de cativar as pessoas, evitando
criar anticorpos à sua actividade pelo excesso de acções ou pela falta delas.
A comunicação interna representa ainda um desafio na medida do estímulo, como
por exemplo, ao ser estimulada pelas hierarquias, ou ao estimular ela própria a
comunicação inter-departamental numa organização.
As organizações culturais comportam, como se abordou no capítulo 2, um carácter
desafiante, nomeadamente por:
- Terem uma história recente no que diz respeito a práticas de gestão;
- E por operarem num contexto de incertezas orçamentais.
Tendo em conta as especificidades das organizações culturais, avançou-se no inicio
desta investigação com a ideia de que serão ainda poucas as pessoas em organizações
culturais dedicadas exclusivamente à comunicação interna, apesar da cada vez maior
qualificação dos profissionais do sector. Duas explicações para este facto podem ser a
pouca sensibilidade das organizações culturais para a importância da comunicação interna,
e o facto de os constrangimentos financeiros determinarem que muitas vezes se escolha
canalizar recursos para rubricas artísticas e não de gestão.
Certamente se poderá dizer que a comunicação em todas as organizações tem um
carácter desafiante. No entanto, para esta dissertação, o enfoque no desafio pretende
destacar:
Dissertação_Rita Sacramento Monteiro
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  • 1. UNIVERSIDADE  CATÓLICA  PORTUGUESA       O  DESAFIO  DA  COMUNICAÇÃO  INTERNA  NAS  ORGANIZAÇÕES   CULTURAIS     -­‐  O  CASO  DA  FUNDAÇÃO  PORTUGUESA  DAS  COMUNICAÇÕES       Dissertação  apresentada  para  obtenção  do  grau  de  mestre     em  Ciências  da  Comunicação,  variante  de  Comunicação  e  Gestão  Cultural     Por       Rita  Matoso  Coimbra  Sacramento  Monteiro     Faculdade  de  Ciências  Humanas   Sob  orientação  do  Professor  Doutor  Peter  Hanenberg       Setembro  2010  
  • 2. 2     Resumo Perante o impacto económico do sector cultural e o seu papel decisivo enquanto motor de desenvolvimento, entende-se que as organizações culturais devem apresentar-se cada vez mais competitivas e profissionais, reforçando junto das sociedades o seu papel e potenciando a sua actividade. Para isso, e à semelhança das organizações empresariais, a comunicação interna deve ser para as organizações culturais ferramenta estratégica, aglutinadora e mobilizadora do público interno. Considerando as especificidades deste tipo de organizações é feita uma reflexão sobre o desafio que representa a comunicação interna em organizações que actuem no sector cultural não lucrativo, apresentando o estudo de caso da Fundação Portuguesa das Comunicações. São identificados desafios resultantes da especificidade do objecto cultural, nomeadamente a tendência para canalizar os investimentos na comunicação externa ou nas rubricas artísticas em detrimento do investimento na comunicação interna. Palavras-chave Comunicação Interna, Organizações Culturais, Fundação Portuguesa das Comunicações Abstract Given the economic impact of the cultural sector and its leading role as an engine of development, it is understood that cultural organizations must present themselves ever more competitive and professional reinforcing their role in societies and enhancing their activity. To do this, and as business organizations do, internal communication must be for cultural organizations a strategic tool, enabling them to unify and mobilize the workforce. Given the specificities of such organizations this work proposes a reflection about the challenge of internal communication in organizations working in the nonprofit cultural sector, presenting a case study of Portuguese Communications Foundation (Fundação Portuguesa das Comunicações). It identifies challenges that derive from the specificity of cultural activities, namely the tendency to channel investment in external communication or in the arts at the expense of investment in management items such as internal communication. Keywords Internal Communication, Cultural Organisations, Portuguese Communications Foundation (Fundação Portuguesa das Comunicações)
  • 3. 3     Dedicatória Aos meus pais, Maria José e João, pelo testemunho e amor.
  • 4. 4     Agradecimentos Começo por agradecer a todos os que foram meus Professores e colegas na licenciatura e no mestrado, por me terem acompanhado e desafiado. Lembro especialmente o Professor Horácio Araújo, cuja partida também por mim foi sentida, e que durante a licenciatura me orientou e me entusiasmou a participar no programa Erasmus, programa este que viria a revelar-se uma experiência marcante e enriquecedora do ponto de vista académico e pessoal. O Professor Horácio tinha a capacidade incrível de fazer com que cada aluno (e éramos muitos!) se sentisse sempre acompanhado e ouvido. Ao entrar no mercado de trabalho verifiquei como é fácil cair no relativismo da prática, a não ser que procuremos a teoria, enquanto reflexão que antecipa e orienta os passos da acção. Nesse sentido, a Universidade mais do que abrir portas, abre horizontes e abre a nossa consciência para o outro e para o mundo que nos rodeia. A sociedade precisa do saber da Universidade, e a Universidade não pode fechar-se em si mesma. Graças a tantos intervenientes, na Universidade Católica fui muito feliz e aprendi imenso. Ficou ainda mais marcada em mim a ideia de que é na educação que está a base de uma sociedade mais participativa, mais consciente e mais positiva. A chegada deste trabalho a bom porto deve-se em muito ao meu orientador, Professor Doutor Peter Hanenberg, a quem agradeço imenso pela amizade, pela disponibilidade, pelo entusiasmo e pelo acompanhamento dedicado e incansável que me deu ao longo desta aventura. Agradeço também ao Professor Doutor José Seruya pelas pistas e pelos esclarecimentos que me deu no início deste trabalho, quer em termos de bibliografia, quer pela partilha da sua experiência na área da comunicação; e à Professora Verónica Policarpo pela ajuda na parte metodológica do trabalho. É devido também um agradecimento ao Professor Miguel Pina e Cunha da Universidade Nova de Lisboa, por me ter falado no Joseph Lampel e por me ter entusiasmado relativamente ao carácter actual e pertinente do tema.
  • 5. 5     Não podia ter superado mais este desafio na minha vida sem contar com a minha grande estrutura de apoio: os meus pais, a minha irmã e o meu irmão que tiveram sempre paciência para os meus devaneios e orgulho nas minhas conquistas, bem como os meus amigos e amigas, pela amizade, pelo entusiasmo e pelo interesse que demonstram em tudo aquilo que faço. Uma palavra de agradecimento à Fundação Portuguesa das Comunicações, onde tenho crescido enquanto profissional de comunicação desde 2007, pela receptividade a este trabalho, pela disponibilidade para entrevistas e pelo incentivo, mais concretamente: - aos membros do Conselho de administração Dra. Fátima Botelho, Eng.º José Luís Almeida Mota e Eng.º Luís Andrade; - à Directora do departamento de Comunicação e Relações Públicas, minha chefe, Dra. Isabel Santiago; - à Conceição Ribeiro e à Marta Cavaco; Finalmente, agradeço à Dra. Elisabete Caramelo da Fundação Calouste Gulbenkian e ao Dr. Filipe Folhadela da Culturgest por se terem sentado comigo para falar sobre o seu trabalho e sobre comunicação interna.
  • 6. 6     Índice   Resumo/Abstract ................................................................................................................. 2 Dedicatória ........................................................................................................................... 3 Agradecimentos ................................................................................................................... 4 Índice..................................................................................................................................... 6 Introdução ............................................................................................................................ 7 Capítulo 1 – Comunicação Interna .................................................................................. 10 Comunicação e Organização............................................................................................ 10 Comunicação Interna ....................................................................................................... 19 Capítulo 2 – Organizações Culturais............................................................................... 30 O impacto da cultura........................................................................................................ 30 Especificidades e desafios das organizações culturais..................................................... 39 Capítulo 3 – A comunicação interna nas organizações culturais: o desafio................. 44 Capítulo 4 – O caso da Fundação Portuguesa das Comunicações................................ 54 Objectivos e metodologia................................................................................................. 54 Perfil da organização........................................................................................................ 62 Práticas de comunicação interna...................................................................................... 66 Discussão do caso ............................................................................................................ 71 Conclusão ........................................................................................................................... 84 Bibliografia......................................................................................................................... 86 Anexos................................................................................................................................. 91
  • 7. 7     Introdução   Os novos desafios que enfrentam as organizações, como a competitividade à escala global ou a incerteza dos mercados, exigem novas prioridades e soluções mais criativas. Actualmente, é pedido às organizações que sejam responsáveis pelo seu impacto nas sociedades, que está longe de ser inócuo, e que através do seu papel e do seu alcance global contribuam cada vez mais para o desenvolvimento não só económico, mas sobretudo social, cultural e ambiental. É-lhes hoje pedido que sejam sustentáveis para o bem de todos. A sustentabilidade dos recursos internos e externos às organizações surge como um equilíbrio desejável em todos os sentidos e a todos os níveis: surge como uma preocupação que exige gestores mais atentos e colaboradores mais conscientes. Perante a estrutura falível dos mercados e a rápida evolução tecnológica, as organizações requerem uma estrutura interna coesa, forte e preparada para os imprevistos, para o improviso. A importância do factor humano, e concretamente de uma maior participação que conduza a novos inputs traduzíveis em competitividade, ganha novas dimensões. É nesse sentido que a comunicação interna se tem vindo a afirmar enquanto ferramenta indispensável para a mobilização, coesão e identificação internas. Mais do que processos, a comunicação interna fundamenta-se e materializa-se em estratégias, tendo crescido exponencialmente nos últimos anos como área de investimento nas organizações. A comunicação, enquanto inter-acção, é inerente às próprias organizações, que por sua vez precisam que a acção em conjunto dos seus colaboradores seja potenciada por relações e processos comunicacionais positivos, tanto para o exterior como para o interior, e que resulte no crescimento e sucesso da organização.
  • 8. 8     Ainda que a produção teórica na área da comunicação, nomeadamente no que diz respeito ao tema da comunicação interna, tenha vindo a multiplicar-se na última década, constatou-se na revisão da literatura que esta se refere essencialmente às organizações empresariais. Assim, e dado que a autora constatou, na prática do dia-a-dia de uma organização cultural, a importância da comunicação interna no acelerar de processos e na dinamização da coesão e mobilização internas, entendeu-se ser pertinente questionar o desafio da comunicação interna em organizações com um carácter tão específico como o das organizações culturais. Perante a lacuna teórica no que diz respeito às práticas de comunicação interna em organizações culturais, esta dissertação reveste-se de novidade ao propor uma reflexão sobre um sector em crescimento - o sector cultural - cujo impacto económico é hoje amplamente estudado, e cujo impacto social é amplamente reconhecido, mas cujas práticas de gestão são ainda pouco conhecidas. Para este trabalho partiu-se de duas premissas. Foram elas: - O papel cada vez mais preponderante da comunicação interna nas estratégias das organizações; - A afirmação do sector cultural enquanto gerador de riqueza, dinamizador dos centros urbanos e motor de desenvolvimento. É importante destacar que nesta dissertação não se pretende veicular a ideia de que a comunicação é a cura para todos os males. Pretende-se antes realçar que um sistema de comunicação oleado pode evitar problemas numa organização e criar novas oportunidades, dando espaço à mudança e à inovação. Para além disso, entende-se que, à semelhança do mundo empresarial, a comunicação interna pode ter um impacto igualmente positivo no universo das organizações culturais, ainda que possa constituir um desafio maior pela especificidade deste tipo de organizações. A estrutura deste trabalho parte do geral, ou seja de um enquadramento teórico dos principais conceitos - comunicação interna e organizações culturais – para o particular, com a aplicação da teoria ao estudo de caso da Fundação Portuguesa das Comunicações.
  • 9. 9     No capítulo 1 é contextualizada a relação da comunicação com as organizações a um nível macro, ao abordar a evolução das perspectivas teóricas face à comunicação no seio organizacional, e a um nível micro, através da introdução de perspectivas actuais da comunicação interna fruto de estudos recentes, ao mesmo tempo que se apresentam definições, ferramentas e desafios. No capítulo 2 começa-se por analisar dados relativos ao impacto económico do sector cultural com base nos mais recentes estudos sobre o impacto económico do sector, ao mesmo tempo que se contextualiza esse impacto com dados qualitativos. Ao considerar a vastidão e a complexidade do sector, é apresentada uma delimitação das actividades que constituem os seus subsectores, bem como abordadas algumas das perspectivas actuais sobre o mesmo. Posteriormente é definido o que se entende por organizações culturais para efeitos deste trabalho, com a apresentação das especificidades que caracterizam as organizações culturais, bem como dos desafios implícitos neste sector de actividade. O capítulo 3 prepara a discussão do estudo de caso através do cruzamento entre os conceitos comunicação interna e organizações culturais. É feita a ponte entre a teoria e a prática, recorrendo para isso ao enquadramento teórico e às entrevistas exploratórias realizadas aos responsáveis pela comunicação da Fundação Calouste Gulbenkian e da Culturgest. Finalmente, no capítulo 4 é apresentado o estudo de caso da Fundação Portuguesa das Comunicações, no qual se pretendeu, através de um Inquérito à Satisfação com a Comunicação e de entrevistas a alguns colaboradores, traçar uma panorâmica das práticas de comunicação interna numa organização cultural e conhecer os aspectos desafiantes dessa mesma comunicação interna. Ao longo de todo o trabalho a intenção foi a de promover uma reflexão sustentada não só na teoria mais recente, mas também na aplicação prática dos conceitos a uma organização cultural. São dados exemplos de boas práticas e apontados desafios não só para a investigação no âmbito da comunicação, mas também para o crescimento e maior profissionalização das organizações culturais.
  • 10. 10     Capítulo 1 A Comunicação Interna «A comunicação é uma condição sine qua non da vida social e, a fortiori, da vida organizacional.»1 1.1 Comunicação e Organização Na origem da palavra comunicar, do latim communicare, está a ideia de pôr em comum, de partilhar algo com alguém. A comunicação, numa acepção geral, é elo de ligação entre os seres humanos que permanentemente, e ainda que por vezes de uma forma inconsciente, põem em comum algo com alguém, com significado, que pode ou não ser único. A comunicação permite e consiste na principal forma de interacção com os outros e com o mundo que nos rodeia. Grande parte da nossa vida passamo-la a trabalhar, desempenhando um ou mais papéis nas organizações que constituem a sociedade, garantindo a nossa subsistência, e contribuindo para o desenvolvimento económico, social e cultural dos países em que vivemos: «Often we find that our identity is tightly bound up with the organizations to which we belong» (cf. Gordon, 1993: 3). As organizações, à semelhança da comunicação, são intrínsecas à nossa vida, satisfazem a nossa necessidade de pertença e contribuem para a construção da nossa identidade. A palavra organização vem do grego organon, que significa instrumento, utensílio (cf. Bilhim, 2006: 21). De uma forma simples e intuitiva, pode dizer-se que uma organização é um conjunto de pessoas que unem esforços para atingir um ou mais objectivos comuns: «Organizations – whether they are community hospitals, nonprofit associations, or multinational oil companies – exist for one reason: we can accomplish more when we work together as teams than we can as individuals» (cf. Whitworth, 2006: 205). Esta visão da organização, mais próxima da perspectiva instrumental, não significa, no entanto, que todos os membros de uma organização partilhem dos mesmos objectivos, e                                                                                                                           1 Cunha et al., 2007: 434
  • 11. 11     que uma organização se esgote apenas nos objectivos que define. Na verdade, face ao ambiente competitivo que marca a actualidade, as organizações são cada vez mais pensadas enquanto espaços de crescimento pessoal e profissional, de aprendizagem, de tentativa e erro, e de improvisação (cf. Cunha et. al, 2002: 37). As organizações distinguem-se de outros grupos sociais por consistirem elas próprias em processos que garantem a continuidade da sua existência, por terem uma definição mais clara de limites e por serem reconhecidas pela sociedade como entidades sociais distintas (cf. Bilhim, 2006: 23). Dado que são um fenómeno estruturante, as organizações despertam o interesse de diversos ramos do saber como a sociologia, a psicologia, a economia, a gestão e as ciências da comunicação, e tornaram-se objecto de disciplinas científicas como a teoria das organizações (nível macro) e o comportamento organizacional (nível micro). Conhecer e compreender o comportamento dos indivíduos revelou-se crucial para as organizações, que investem no capital humano na certeza de que esse investimento tem um retorno positivo e permite a obtenção de melhores resultados financeiros (Cunha et. al, 2007: 32). Esse investimento passa também pela definição de estratégias ao nível da comunicação, considerada o aparelho circulatório da vida organizacional por permitir a operacionalização e a decisão, contribuindo para que as organizações cresçam e evoluam e assegurando os processos diários de gestão de informação e conhecimento (Cunha et al., 2007). Consolidou-se no âmbito organizacional que saber comunicar é a mais-valia do século XXI, não só dentro das empresas, que perante as exigências do mercado e as pressões económicas precisam de mobilizar os seus colaboradores para os objectivos, mas também entre as empresas, as partes interessadas e as partes relacionadas: «Bottom line: Communication is no longer a “soft” function. It drives business performance and is a key contributor to organizational success» (cf. Watson Wyatt, 2004). Por esses motivos, a comunicação é reconhecida como ferramenta de gestão empresarial e como ferramenta estratégica (cf. Lite, 1997). Um estudo empírico realizado em 1992 em 50 empresas espanholas pela consultora de comunicação Burson-Marsteller e o IESE (Escola de Negócios da Universidade de Navarra) concluiu que, para a maioria dos gestores entrevistados, ter conhecimentos sólidos e capacidade de gestão no campo da comunicação é mais importante do que dominar outras competências (cf. Lite, 1997: 127).
  • 12. 12     Assim, o investimento na comunicação, quer interna quer externa, de uma organização, resulta: - Numa atmosfera interna positiva e construtiva; - Em trabalhadores e clientes mais satisfeitos; - Em níveis mais elevados de produtividade e de inovação; - E em vantagem competitiva face à concorrência (cf. Hargie e Tourish, 2000). Na revisão da literatura é notório que muitos autores, ao abordarem o conceito de comunicação organizacional, referem-se exclusivamente à comunicação dentro de uma organização, ou seja à comunicação interna. Na verdade, a comunicação organizacional começou por estar concentrada no ambiente interno da organização dado o enfoque na produção. Posteriormente, com a viragem e abertura das organizações para os mercados, o investimento na comunicação externa tornou-se primordial. Nesta dissertação, e para efeitos de enquadramento, entende-se o conceito de comunicação organizacional no seu sentido mais lato e enquanto campo de estudos, ou seja, tanto na sua relação com o interior quer com o exterior: «A comunicação organizacional abrange todas as formas de comunicação utilizadas pela organização para relacionar-se e interagir com seus públicos» (cf. Bilhim, 2006: 361). A constituição da comunicação organizacional enquanto disciplina reconhecida e autónoma é indissociável da evolução das teorias da organização. Na verdade, a perspectiva teórica de cada momento da história da comunicação organizacional é influenciada pela evolução da técnica e pela visão, à época, da organização em sentido lato: «Organizational comunication theories mirror the flow of society» (cf. Eisenberg, 2009: 8). O desenvolvimento das primeiras teorias da organização está relacionado com a época da Revolução Industrial (final do século XIX), altura em que surgiram, com a introdução da produção em massa, as primeiras grandes organizações. As teorias da época versavam sobretudo as condições e a organização do trabalho, e as relações laborais. Nas abordagens clássicas de gestão científica e burocracia, marcadas por Frederick Taylor, considerado “pai” da gestão moderna por ter revolucionado a organização do trabalho com The Principles of the Scientific Management (1911), o enfoque é posto nas falhas de gestão
  • 13. 13     como explicação para os maus resultados, e não nas condições sociais dos trabalhadores como o faziam as correntes anteriores (cf. Cunha et al., 2007: 57). Em 1927, a investigação levada a cabo por Elton Mayo na fábrica da General Electric no bairro de Hawthorne, em Chicago, dá origem à Escola das Relações Humanas. Elton Mayo, formado em medicina e filosofia, conclui com estes estudos que as relações entre os trabalhadores influenciavam consideravelmente os níveis de produtividade (cf. Lite, 1997: 115). Passa-se assim de uma visão mecanicista e racionalista, para uma perspectiva humanista da organização, a qual valoriza o factor humano e as relações entre os trabalhadores. O enfoque nas relações humanas conduz inevitavelmente a uma maior atenção relativamente aos processos de comunicação entre os trabalhadores, e por isso se considera que a Teoria das Relações Humanas introduz na abordagem às organizações a questão da comunicação organizacional. A autonomização da comunicação organizacional enquanto disciplina científica dá- se na década de 60 no seguimento da separação da investigação em comunicação empresarial e industrial, da investigação em comunicação organizacional. W. Charles Redding foi um dos teóricos que mais dinamizou a investigação sobre o tema, e que acreditava que a investigação empírica e crítica da comunicação em vários contextos tinha resultados positivos (cf. Buzzanell e Stohl, 1999: 327). Outros dois momentos contribuíram também para o reconhecimento da comunicação organizacional: a criação da divisão de comunicação organizacional da International Communication Association em 1968, e da Academy of Management em 1973. Em Portugal, destaca-se a formação, em 1990, da Associação Portuguesa de Comunicação de Empresa (APCE), cuja missão é   representar e defender «os interesses empresariais, profissionais e académicos na área da comunicação empresarial e das relações públicas em Portugal, ao mesmo tempo que se constitui como um fórum de discussão e reflexão aberto a todos os interessados nesta especialidade».2 Inicialmente, as teorias de comunicação organizacional concentravam-se na melhoria da transmissão de informação e procuravam formas de resolver quebras na comunicação que afectavam a produtividade (cf. Eisenberg, 2009). O importante era que a mensagem fosse compreendida e resultasse no cumprimento efectivo das orientações superiores.                                                                                                                           2 Retirado do site www.apce.pt      
  • 14. 14     Nas décadas de 60 e 70, a metáfora que melhor ilustra a visão da comunicação é a de um canal. A comunicação é vista essencialmente como transmissão e as organizações como canais através dos quais os seus membros enviam e recebem mensagens (cf. Putnam e Poole, 2007: 1). As organizações da época caracterizam-se pelo forte controlo executivo e por uma gestão do tipo top-down, o que explica o enfoque dado pela teoria à comunicação descendente, ou seja, à relação chefia – trabalhador. Outras duas metáforas relacionadas com a visão da comunicação enquanto canal são a de ferramenta e a de processamento de informação. A metáfora da ferramenta perspectiva a comunicação enquanto meio de transmissão de mensagens, para a qual a escolha dos meios é indissociável do tipo de estrutura da organização e do grau de formalidade. Aos teóricos dedicados a esta perspectiva interessa conhecer os meios através dos quais os trabalhadores escolhem passar as suas mensagens: cara-a-cara, através de e-mail, em reuniões, no corredor, através de documentos escritos, entre outros. Na metáfora do processamento da informação é dado destaque aos destinatários, aos conteúdos das mensagens e aos padrões de comunicação (cf. Putnam e Poole, 2007: 1). A partir dos anos 80 várias áreas do mundo organizacional começaram a recorrer ao trabalho em grupos e a teoria reflectiu essa tendência ao dar maior destaque às interacções sociais, aos significados e ao exercício de poder (cf. Cunha et al., 2007). Associada a este tema está a metáfora da ligação, que trata as organizações como redes, nas quais cabe à comunicação o papel de ligação entre os indivíduos (cf. Putnam e Poole, 2007: 1). Apesar do comportamento dos grupos ser bastante diverso do comportamento individual, representando muitas vezes desafios maiores ao nível da gestão, actualmente os grupos, ou as chamadas equipas, são uma parte vital e cada vez mais natural das organizações (cf. Bilhim, 2006). Do trabalho em grupo resultam potenciais benefícios, como: - Soluções mais rápidas e criativas uma vez que, perante uma questão de resolução exigente, ter pessoas com diferentes capacidades pode ser a chave; - Menos resistência por parte das pessoas dado que há uma maior participação nos processos de tomada de decisões; - Mais ideias que surgem da discussão em grupo (brainstorming) e que de outra forma podiam nunca materializar-se (cf. Cunha et al., 2007).
  • 15. 15     No entanto, se da complexidade dos grupos podem advir muitos benefícios para as organizações, para que os resultados não sejam inversos ao esperado (menor eficiência, maior tempo dispendido, maior gasto de recursos), é fundamental que os gestores de uma organização tenham a capacidade de fomentar nos grupos a coordenação, bem como o progresso através de uma crítica construtiva. A comunicação representa um papel importante na articulação e gestão de grupos. É por isso que um dos desafios da comunicação organizacional no século XXI é precisamente examinar a diversidade de identidades e a comunicação intergrupal (cf. Jones et al, 2004). A metáfora da comunicação organizacional mais presente na literatura actual é a do discurso, ou seja, relativa às funções e estruturas da linguagem. Nesta metáfora, a conversação é vista enquanto texto que reflecte e constrói a organização (cf. Bilhim, 2006). A ideia de que o tipo de discursos influencia as práticas comunicacionais de uma organização (cf. Putnam e Poole, 2007: 3) explica a importância de analisar os discursos organizacionais de forma a detectar tendências, ou ainda para perceber de que forma e com que intenção os membros de uma organização utilizam a linguagem. As metáforas acima referidas e que acompanham a evolução da teoria organizacional, não se excluem mutuamente, no sentido em que na complexidade das organizações, e consoante a perspectiva de análise, pode verificar-se a presença de uma ou mais. A comunicação organizacional, enquanto processo de utilização de mensagens e interacções sociais que criam, mantêm e gerem significados num contexto particular (cf. Putnam e Poole, 2007), tem como um dos seus objectivos providenciar os meios para a transmissão de informação, essencial à concretização dos fins de uma organização (cf. Dexter et al., 2006). A comunicação numa organização permite ainda o diagnóstico de problemas organizacionais, a selecção de alternativas e a coordenação de eventos organizacionais (cf. Putnam e Poole, 2007). Nesta dissertação considera-se que a comunicação organizacional se subdivide em três vertentes: comunicação institucional/corporativa, comunicação de marketing e comunicação interna (cf. Caldeira, 2008:32). O enfoque desta dissertação, como se verá mais à frente, é a comunicação interna das organizações. No que diz respeito aos públicos a que uma organização se dirige, podem considerar- se dois tipos de comunicação:
  • 16. 16     - Comunicação externa, dirigida aos clientes, accionistas, partes interessadas e partes relacionadas; - Comunicação interna, dirigida a todas as pessoas que fazem parte dos processos de gestão. A comunicação põe em comum a organização, com tudo o que esta representa, a nível interno e externo. Logo, a sintonia entre comunicação externa e interna é fundamental para assegurar que a imagem que a organização transmite para os seus públicos é una e coerente. Nesse sentido terão que ser necessariamente consideradas as novas estruturas organizacionais e tecnológicas que influenciam directamente a comunicação. Na última década estas estruturas têm vindo a alterar-se, por um lado devido aos progressos tecnológicos, e por outro, como consequência da globalização e do ritmo dos mercados: A envolvente em que as organizações actuais operam não se compagina com a estabilidade e a certeza. Tecnologias em rápida mutação, competitividade intensa, clientelas flutuantes, mercados que se abrem e se encerram, turbulências financeiras, económicas, sociais e políticas à escala planetária, inovação constante, produtos e serviços com ciclos de vida progressivamente mais curtos, mudança acelerada (Cunha et al., 2007: 223). Os vínculos laborais são cada vez mais temporários e flexíveis: «mais do que um emprego, a pessoa vai adquirindo um conjunto de competências e experiências que incrementam o seu valor para o mercado de trabalho» (Cunha et al., 2007: 223), o que por sua vez influencia o desenho e a cultura organizacionais, a relação entre os vários membros de uma organização, bem como a relação com o exterior. Ao longo das últimas décadas, os estudos no campo da comunicação organizacional têm proliferado, acrescentando novas perspectivas a modelos anteriormente propostos e abordando novas problemáticas suscitadas pela evolução da organização em sociedade e, sobretudo, pelo rápido desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação (TIC). De entre essas problemáticas, destacam-se: - O impacto das novas tecnologias na ética e na comunicação; - A comunicação inter-grupal;
  • 17. 17     - A diversidade e complexidade das relações entre as partes interessadas de uma organização; - A relação entre os valores culturais e sociais e a ética organizacional (cf. Jones et al., 2004). Apesar disso, grande parte dos estudos ainda se concentra sobretudo em questões micro como a eficácia da comunicação, o impacto das capacidades comunicacionais em detrimento de outras, juntamente com uma ideia pré-concebida da comunicação ideal (cf. Jones et al., 2004). No que diz respeito à evolução da investigação, importa que haja um cruzamento cada vez maior da área de comunicação organizacional com outras áreas como a do comportamento organizacional, da psicologia ou da gestão, já que « […] communication in organisations has been studied not only by communication scholars, but by scholars in most of the social sciences» (cf. Jones et al., 2004: 723). Aliás, a comunicação é ainda considerada sub-representada na literatura organizacional face a outros temas, como por exemplo, negociação, stress ou estratégia, segundo nos diz o ensaio empírico de Chip Heath e Sim B. Sitkin da Fuqua School of Business da Duke University, em Durham (EUA), intitulado Big-B versus Big-O: What is organizational about organizational behavior? (2001). Foi pedido a 70 membros do conselho editorial do Journal of Organizational Behavior que identificassem os temas mais presentes na literatura do comportamento organizacional e os menos presentes. O objectivo principal era o de identificar as áreas que requerem novas contribuições teóricas para desse modo garantir a vitalidade do campo de estudos. Assim, outro dos desafios da comunicação organizacional é a inovação teórica e metodológica, que permita acompanhar da melhor forma possível as rápidas mudanças às quais as organizações e a comunicação estão sujeitas, bem como um maior enquadramento da teoria até aqui produzida. É recorrente na literatura mais recente sobre o estado da arte desta área científica a chamada de atenção de vários autores para a importância de investigações que decorram no contexto de organizações reais, assistindo à comunicação in loco, nomeadamente no âmbito da mudança organizacional, em vez de se optar pela simulação de situações (Jones et al., 2004). Para este efeito são necessárias adaptações metodológicas e logísticas requeridas pelo trabalho em campo, assim como a receptividade das organizações em causa (Jones et al., 2004).
  • 18. 18     No artigo de Jones et al. intitulado Organizational Communication: Challenges for the New Century (2004), os autores concluem que é necessário combinar aproximações quantitativas e qualitativas na investigação da comunicação organizacional, sendo que «The trick will be to develop theory and method sufficiently broad to capture the diversity of organizations, yet sufficiently specific to allow predictions» (Jones et al., 2004: 740). Nesse sentido, esta dissertação pretende ser um contributo para o alargamento teórico, através do cruzamento da teoria produzida com a actualidade dos estudos sobre comunicação nas organizações. Para além disso, o conhecimento das práticas de comunicação de uma organização numa perspectiva in loco, como se verá no Capítulo 4 com o estudo de caso sobre a Fundação Portuguesa das Comunicações, pretende ser demonstrativo da necessidade de cada vez mais a investigação recolher da prática novos modelos teóricos, ao mesmo tempo que as organizações beneficiam com essa produção de conhecimento.
  • 19. 19     1.2 Comunicação interna Assistiu-se nas últimas décadas a uma rápida expansão da actividade de comunicação interna, fruto de uma evolução na forma como são consideradas as organizações (cf. Almeida, 2003). Com o enfoque das organizações no factor humano enquanto grande responsável pelo sucesso da organização, trata-se de «obter resultados através das pessoas, isto é, tornar a comunicação o veículo privilegiado para potenciar a inteligência emocional e o capital intelectual dos colaboradores» (cf. Caldeira, 2008: 33). As organizações e os seus gestores reconhecem que, se uma estratégia de comunicação externa eficaz permite que uma organização tenha visibilidade junto do seu público externo e faça chegar até esse público os seus produtos e serviços, uma estratégia de comunicação interna revela-se fundamental para alcançar os objectivos uma vez que mobiliza o público interno, e contribui para a optimização dos processos organizacionais. Testemunho da crescente importância da comunicação interna foi a criação, em 1955, da FEIEA - Federation of European Business Communicators Associations, cujo lema é Connecting Europe’s communicators, e que pretende ser plataforma de contacto entre as organizações europeias, através da promoção de boas práticas e do aprofundamento da teoria existente. Actualmente, a FEIEA conta com membros em 11 países da Europa e desde 2001 é responsável por dinamizar estudos com base no método Delphi, que procuram acompanhar a evolução da área e dar a conhecer práticas de comunicação interna em várias organizações. A expansão da actividade de comunicação interna reflectiu-se num investimento maior nesta área das organizações e no recrutamento de profissionais vocacionados para comunicar com o público interno. Hoje, mais do que uma revista interna e do que a existência de uma intranet, a comunicação interna é uma função estabelecida na maior parte das organizações, considerada «arte de dirigir» (cf. Almeida, 2000: 35), e que requer profissionais qualificados. No mais recente estudo (2009) da FEIEA sobre práticas de comunicação interna na Europa, no qual são comparados resultados actuais com os resultados dos estudos realizados em 2001 e 2005, constata-se que 97% dos inquiridos considera a comunicação interna um factor decisivo para o sucesso.
  • 20. 20     A comunicação interna torna-se hoje ainda mais pertinente devido à velocidade com que se trabalha, consequência dos avanços tecnológicos e da competitividade global, e à cada vez maior necessidade de ter os recursos humanos de uma organização motivados e mobilizados no mesmo sentido. Se a época de crise económica que as sociedades atravessam representa um desafio mesmo para as grandes organizações, ela representa igualmente uma oportunidade para os comunicadores internos, uma vez que existem evidências de que investir no público interno de uma organização tem consequências positivas até mesmo nos resultados financeiros das organizações (cf. Connecting Organizational Communication to Financial Performance, 2004). Assim, perante a exigência e a competitividade actuais, bem como a necessidade das organizações darem respostas mais rápidas e eficazes, cabe aos responsáveis pela comunicação interna realçarem, através da definição de estratégias, o papel importante da comunicação interna. Tal como existe a preocupação em estruturar as organizações para que estas sejam eficazes (cf. Rego, 1999: 22), passou a haver também a preocupação em estruturar a comunicação interna para que esta seja eficaz e contribua para o crescimento da organização: «As a linking mechanism among the different organizational subsystems, communication is a central feature of the structure of groups and organizations. It builds and reinforces interdependence between various parts of the organization» (cf. Gordon, 1993: 273). A comunicação hierárquica é um dos elementos fundamentais de uma estratégia de comunicação interna, sendo que um dos temas mais investigado na área da comunicação nas organizações é o das relações interpessoais. Ainda que não seja mandatário, nem função primordial da comunicação interna promover as boas relações pessoais, a comunicação interna eficaz não pode ignorar as relações entre as pessoas e deve promover o entendimento necessário de modo a que os processos internos sejam profícuos. Um dos objectivos da comunicação interna na sua direcção horizontal é agilizar os processos de gestão (cf. Lite, 1997: 126). Quando há barreiras na comunicação horizontal, como dificuldades de relacionamento, os processos transformam-se em burocracia comunicacional e levam mais tempo e recursos para serem resolvidos.
  • 21. 21     Os autores Wayne Hoy e Cecil G. Miskel (cf. Dexter, Berube e Young, 2006) verificaram que o número de níveis hierárquicos através dos quais uma mensagem tem que viajar dentro de uma organização, pode ser visto como a distância que a mensagem tem que percorrer. Ou seja, à medida que a distância aumenta, a satisfação e a qualidade da mensagem tendem a diminuir. Assim, ao longo dos anos a relação entre administração e colaboradores de uma organização tornou-se mais próxima e aberta dado que se foram eliminando camadas da hierarquia, tornando a comunicação menos vertical, e aproximando os responsáveis das equipas. A responsabilidade pela comunicação interna pode ser atribuída a diferentes áreas da estrutura organizacional. As situações mais comuns são a atribuição à área de recursos humanos, à área de comunicação institucional ou de marketing, ou à área que engloba as várias vertentes da comunicação. De acordo com o estudo da consultora Watson Helsby The Rise of the Internal Communicator (2002), que entrevistou 37 responsáveis pela comunicação interna de empresas norte-americanas e inglesas, esta actividade está predominantemente localizada nos departamentos de comunicação, em 67% dos casos, sendo que apenas em 22% dos casos está no departamento de recursos humanos, 10% no departamento de marketing e 1% noutras áreas. Em Portugal, e de acordo com o estudo Diagnóstico de Comunicação Interna - a opinião dos colaboradores3 , realizado em 2008 pela Spirituc em parceria com a Associação Portuguesa dos Gestores e Técnicos dos Recursos Humanos, a Associação Portuguesa Comunicação de Empresa e a Grace, em 14% dos casos a comunicação interna está integrada na área de comunicação institucional/corporativa, em 12,3% dos casos existe uma área intitulada comunicação interna, em 11,11% dos casos esta está a cargo de vários colaboradores em vários departamentos e em 10,9% dos casos situa-se na área de marketing. As restantes localizações são recursos humanos (6,6%), secretaria-geral (5,8%), assessoria à administração/assuntos administrativos (4,4%), relações públicas (2,7%), informática (2,1%), comercial (1,3%), e em regime de outsourcing/equipa externa (0,2%). Em 9,1% dos casos a responsabilidade pela comunicação interna não está atribuída a ninguém em particular, em 4,1% dos casos trata-se de outra situação, e 15,5% dos inquiridos não sabe e/ou não responde.                                                                                                                           3   Este   estudo   foi   realizado   com   base   numa   amostra   de   1280   questionários   electrónicos   de   auto-­‐ preenchimento.  
  • 22. 22     Tal como a estrutura organizacional deve ser definida em função dos objectivos e dos fins de uma organização, também a integração da comunicação interna na estrutura organizacional deve considerar esses objectivos. Entende-se assim que a integração da comunicação interna na estrutura organizacional depende da perspectiva face a esta actividade, ou seja, do que a organização pretende com a função. Da mesma forma que um organograma mal estruturado pode ser responsável pelas dificuldades no alcance dos objectivos, também a localização da comunicação interna na estrutura organizacional não se trata de uma questão indiferente pois determina a sua actuação. No que diz respeito à forma como a comunicação interna é concebida pela organização, existe uma corrente que considera 3 concepções principais: a concepção burocrática, a concepção relacional e a concepção estratégica (cf. Almeida, 2000). Numa concepção burocrática da comunicação interna, ou seja em que a estrutura da organização assenta fundamentalmente na burocracia, a comunicação é instrumentalizada, sujeita a uma forte estrutura hierárquica. Nesta concepção a organização caracteriza-se pela especialização e divisão do trabalho, pela impessoalidade nas relações e pela fraca comunicação horizontal (cf. Putnam e Poole, 2007: 1). Numa concepção relacional, que parte da premissa de que «relação é comunicação» (cf. Almeida, 2000: 44), o destaque é dado às relações entre trabalhadores, e a comunicação interna é considerada valiosa na identificação de áreas problemáticas. Finalmente, numa concepção estratégica, em que a comunicação interna é entendida enquanto ferramenta estratégica para a organização, existe uma forte participação dos trabalhadores nos processos de tomada de decisão. Nesta concepção o destaque é dado ao conjunto de comportamentos na comunicação. Entende-se que uma estratégia de comunicação interna deve contemplar todas as 3 concepções acima referidas (burocrática, relacional e estratégica). Isto porque os aspectos positivos de cada uma são factores que realmente potenciam uma estratégia de comunicação interna, como por exemplo: - Na concepção burocrática a definição de procedimentos ou práticas internas; - Na concepção relacional o diagnóstico de comportamentos internos; - E na concepção estratégica a preocupação com o feedback dos colaboradores.
  • 23. 23     A inserção da comunicação interna no departamento de comunicação das organizações considera-se ser o mais estratégico, uma vez que permite que a comunicação externa e interna estejam alinhadas e que, mesmo através de meios e acções diferentes, haja congruência com a missão da organização e seja veiculada uma identidade una. Na verdade, ainda que os fins da comunicação externa e interna sejam distintos, estes estão sujeitos aos mesmos princípios e objectivos definidos pela organização. No caso de esta actividade estar atribuída a outra área como a do marketing ou a dos recursos humanos, deverá existir igualmente, e de forma mais intensificada, um alinhamento entre as áreas. A comunicação interna é considerada ferramenta estratégica pelos benefícios que pode trazer a uma organização. De uma forma directa, entende-se que a comunicação interna: - Promove a circulação da informação por toda a organização, de forma a manter os colaboradores informados e envolvidos na estratégia e objectivos da mesma; - Contribui para o agilizar de processos de gestão; - Promove as relações interpessoais saudáveis e um bom ambiente de trabalho; - Reforça o sentimento de pertença à organização; - Facilita a comunicação horizontal e/ou vertical (cf. Caldeira, 2008: 33). De uma forma indirecta, entende-se que o investimento na comunicação interna permite: - Uma maior produtividade; - Uma redução do absentismo; - Uma maior qualidade de serviços e produtos; - Um aumento nos níveis de inovação; - Um menor número de greves; - Um menor desperdício de recursos (cf. Hargie e Tourish, 2000: 6). Nesse sentido, e segundo a Associação Francesa de Comunicação Interna4 , as funções da comunicação interna (cf. Lite, 1997: 118) são:                                                                                                                           4   A   Association   Française   de   Communication   Interne   (Afci)   foi   criada   em   1989   e   reúne   mais   de   400   membros,  profissionais  da  comunicação  de  empresas  públicas  e  privadas,  consultores  e  universidades.  
  • 24. 24     - Investigar, ou seja, conhecer e avaliar o clima organizacional através do contacto com as perspectivas dos colaboradores; - Orientar, quer seja as chefias na sua relação com os restantes colaboradores, quer seja em processos de gestão e de decisão; - Informar, sobre tudo o que é necessário e útil ao trabalho dos colaboradores e à sua identificação com a organização; - Dinamizar e coordenar, as redes de comunicação interna, o ambiente de trabalho e as acções internas, de forma a potenciar os resultados; - Organizar campanhas internas, ou seja, momentos de encontro, de esclarecimento, de partilha, acções internas que entusiasmem os membros de uma organização; - Formar, no sentido da aquisição de competências e da promoção de melhores práticas comunicacionais e, consequentemente, profissionais. Um dos principais desafios da comunicação interna é mobilizar o público interno em prol dos objectivos da organização. Isto porque, quando os colaboradores partilham a identidade da organização, mais facilmente se sentem compelidos a atingir os objectivos propostos pela estratégia da organização (cf. Seruya, 2009). Para além disso, o principal veículo da identidade de uma organização para o exterior é o público interno, havendo mesmo a evidência de que quanto mais as pessoas acreditam nos valores da organização de que fazem parte mais integradas e motivadas se sentem (cf. Mitchell, 2002). Daí que seja fundamental gerir as relações entre as pessoas e a organização, nomeadamente através da comunicação dos seus objectivos e da sua estratégia, o que pode passar pela construção, mais ou menos formal, de uma marca interna. Assim, a comunicação interna enquanto ferramenta que contribui para o desenvolvimento de uma cultura organizacional deve empenhar-se em fortalecer a identidade das organizações, em primeiro lugar, junto do público interno. Face à internacionalização e à expansão das organizações, a necessidade de ter todos os colaboradores mobilizados no mesmo sentido, com base nos mesmos valores, torna-se ainda mais premente. Para isso, é fundamental que a organização, através da sua área de
  • 25. 25     comunicação interna, tome consciência de quem é o seu público interno ou públicos internos, e quais suas as principais necessidades. No estudo Diagnóstico de Comunicação Interna - a opinião dos colaboradores (2008), numa questão de resposta múltipla, 60,9% dos inquiridos considera que uma das maiores necessidades de comunicação interna diz respeito à informação de apoio à melhoria das competências. É assim interessante que, numa época em que as tecnologias de informação e comunicação estão tão disseminadas e veiculam informação de diferentes maneiras, os colaboradores acusem falta de informação. Entende-se que a comunicação interna desempenha um papel central na circulação de informação numa organização, enquanto: - Emissor: considerando por exemplo a divulgação de acções, comunicados ou procedimentos internos; - Receptor: recolhendo o feedback dos colaboradores de uma organização; - Coordenador: formando e gerindo a transmissão de informação entre áreas, e ainda, entre o interior e o exterior da organização. A responsabilidade da comunicação interna informar o público interno é uma questão complexa. Ou seja, se por um lado a ausência de informação pode ser perigosa e desastrosa numa organização, uma vez que afecta o desenrolar dos processos internos, por outro, informação em excesso pode ser prejudicial ao sobrecarregar as pessoas com mensagens que podem não ser apreendidas (cf. Rego, 1999: 26). A informação pode ainda representar uma barreira à comunicação, quando utilizada como ferramenta de poder por quem a detém numa organização: «(...) face a incertezas decorrentes de percepções e estratégias diferenciadas existe uma quase obrigatoriedade de defesa por parte das pessoas» (cf. Almeida, 2003: 44). Ou seja, a retenção de informação ou o fornecimento de informação manipulada são prejudiciais à organização. Desse modo, torna-se ainda mais pertinente a atenção actualmente dada pela teoria à interpretação dos discursos e das mensagens veiculadas dentro da organização. Apesar destas considerações, importa ressalvar que cingir a actividade de comunicação interna à transmissão de informação não só é redutor, como confunde dois conceitos distintos: informação e comunicação. A informação actua de uma forma unidireccional e a comunicação é bidireccional. Ou seja, mais do que fazer chegar mensagens através dos vários canais, a comunicação interna preocupa-se com a compreensão dessas mensagens,
  • 26. 26     colabora na coordenação dos processos de gestão, motivando os colaboradores a melhorar os seus comportamentos (cf. Lite, 1997). Exactamente porque a comunicação não é uma actividade de sentido único, é fundamental desenvolver práticas que contribuam para a circulação fluida da informação, nomeadamente para evitar interpretações erradas entre colaboradores de uma organização (cf. Rego, 1999). Um ciclo vicioso de más interpretações danifica as relações laborais e em última análise desgasta os indivíduos: mais do que falar, é importante comunicar. Nos últimos anos, surgiu o conceito de gestão do conhecimento que assenta na premissa de que mais do que obter dados e receber informações, importa compreendê-los (cf. Kluge et al, 2002). A partir dessa compreensão e de uma gestão eficaz do conhecimento, fazendo-o chegar a todos os colaboradores, é possível aumentar a rentabilidade das organizações. Grande parte dos estudos na área da comunicação organizacional tem-se concentrado em questões micro como a eficácia da comunicação e o impacto das capacidades comunicacionais. Na verdade, a eficácia comunicacional é um aspecto central para as organizações, uma vez que consiste na optimização efectiva, ou seja com sucesso, dos processos organizacionais (cf. Zanluchi et al, 2006). A comunicação é eficaz quando há compreensão entre o emissor e o receptor. No entanto, o contexto em que os mesmos estão inseridos, a forma como é transmitida a mensagem e o canal escolhido são determinantes para haver eficácia: «A selecção dos canais representa um dos aspectos fulcrais na eficácia comunicacional» (cf. Cunha et al, 2007: 438) As características dos canais escolhidos para comunicar internamente determinam o tipo de mensagem que pode ser veiculada através dos mesmos e vice-versa (cf. Cunha et al, 2007: 438). Assim, uma estratégia de comunicação interna deve incluir a selecção e dinamização dos meios de comunicação mais adequados à organização. No estudo Diagnóstico de Comunicação Interna - a opinião dos colaboradores (2008), 90,1% dos inquiridos considera que as acções de comunicação interna digitais mais recordadas realizam-se através de e-mail. O estudo da FEIEA, já referido e que considera o universo europeu, confirma a tendência de que, dos meios digitais, o e-mail é o mais utilizado e considerado o mais eficaz (cf. Internal Communication across Europe III, 2009).
  • 27. 27     Não há dúvida de que o desenvolvimento e cada vez maior aplicação das tecnologias de informação e comunicação nas organizações, para além de ter permitido novas formas de trabalho mais flexíveis, nomeadamente à distância, permitiu às organizações a utilização de novos meios de comunicação interna, como por exemplo, e para além do e- mail: a intranet, a newsletter ou a televisão interna (cf. Jones et al., 2004: 734). A Internet, e em concreto a presença online das organizações através dos seus websites e das redes sociais, transformou a relação das organizações com os seus públicos. Através destas plataformas digitais as organizações conseguem um novo alcance para os seus bens e/ou serviços, recebem feedback dos consumidores e comunicam a sua identidade, os seus valores e a sua história a um universo alargado de pessoas. Os meios digitais são considerados os mais adequados para a transmissão de mensagens curtas e rápidas (cf. Larkin e Larkin, 2005). Relativamente ao e-mail, que actualmente é ferramenta de trabalho essencial na maior parte das organizações, há o risco de o processo de transmissão de uma mensagem ser todo feito por este meio, descurando a comunicação cara-a-cara ou via telefone. A perspectiva optimista das tecnologias de informação e comunicação vê-as como possibilidade de superar as barreiras hierárquicas e chegar a todos os colaboradores, pondo mesmo em causa a ideia de que a comunicação cara-a-cara seja a ideal. No entanto, a perspectiva pessimista das tecnologias de informação e comunicação questiona o grau de valor acrescentado e o potencial destas tecnologias para as organizações (cf. Jones et al., 2004: 734). Como na utilização de qualquer meio e para evitar que as mensagens e os diferentes meios se transformem em poluição, as tecnologias de informação e comunicação devem ser doseadas consoante as reais necessidades de comunicação interna, e tendo como base o tipo de mensagens a transmitir. Como conclui a consultora Watson Helsby no estudo The Rise of the Internal Communicator (2002) conduzido em 37 grandes empresas inglesas e norte-americanas, há um grande investimento em ferramentas de comunicação interna que nem sempre considera uma estratégia global. Numa organização com 50 colaboradores, por exemplo, talvez não faça sentido a existência de uma intranet, mas sim um sistema de correio interno eficaz. Outro dos principais desafios para uma organização prende-se com a comunicação da mudança organizacional, reconhecida como sendo «a central process in planning and
  • 28. 28     implementing change» (Jones et al., 2004: 735). Num estudo realizado pela Deloitte & Touche em parceria com a Associação Americana de Gestão (1995), 97,7% dos inquiridos afirmaram que a comunicação é requisito chave para a gestão de processos de mudança (cf. Cunha et al., 2007). Em momentos de mudança, como situações de expansão da organização, entrada de novos colaboradores, ou alteração de procedimentos, o grau de incerteza e desconfiança aumenta, daí que seja fundamental haver uma comunicação eficiente que permita e facilite essa mudança. Ou seja, deve ser fornecida aos colaboradores informação clara e em tempo útil sobre em que consiste a mudança e de que forma se desenrolará o processo, para que estes se sintam envolvidos e parte activa desse processo, mas acima de tudo para que estes se sintam compelidos a fazer o que lhes exige essa mudança. A mudança pode significar alterações na estrutura organizacional que conduzem eventualmente a alterações nos canais e a novas ligações entre os colaboradores (cf. Jones et al, 2004). A comunicação permite também que no decorrer de processos de mudança se mantenha a coesão interna, tentando evitar que «[…] a inércia favoreça a continuação das práticas instituídas» (Cunha et al., 2007: 855). Um exemplo de uma acção de comunicação interna centrada num processo de mudança foi o reposicionamento de imagem da Portugal Telecom que, em Maio de 2009, deu a conhecer a sua nova imagem institucional, ao mesmo tempo que lançava a sua estratégia para a implementação de uma rede de fibra óptica. A apresentação da nova imagem foi feita em primeiro lugar ao público interno e contou com a distribuição de informação e merchandising, com o objectivo de cativar e chamar a atenção dos colaboradores da Portugal Telecom para esta nova imagem, apelando a uma identificação e à transição para um novo posicionamento no mercado ligado à fibra óptica. Apesar de ser reconhecida enquanto ferramenta estratégica, a comunicação interna não é ainda uma prioridade para todos os gestores nem para todas as organizações. Aliás, ainda que seja inegável a importância da vontade de mais e melhor comunicação interna partir das chefias e dos gestores, isso nem sempre se verifica. Por um lado, devido à tendência para dar maior importância ao ambiente externo da organização, e por outro devido à incapacidade de avaliar o retorno financeiro dos investimentos em comunicação interna.
  • 29. 29     Assim, importa que se produzam cada vez mais estudos que ilustrem e fundamentem o impacto da comunicação interna não só em organizações empresariais, mas também sociais, e sobretudo, como se verá mais à frente, culturais. Só assim se terão novas perspectivas e novos modelos de comunicação interna que verdadeiramente a promovam não como ferramenta pontual, mas como ferramenta transversal e indissociável da actividade das organizações e do seu sucesso.
  • 30. 30     Capítulo 2 As Organizações Culturais «A arte e a cultura (...) servem para que, na vida de cada um de nós, o futuro esteja presente e o tédio ausente, a ludicidade aconteça e a barbárie se afaste.»   António Pinto Ribeiro 2.1 O impacto da cultura Se o século XX assistiu à emergência das indústrias culturais e criativas enquanto geradoras de riqueza e de emprego, no século XXI o sector cultural e criativo é reconhecido enquanto motor de desenvolvimento e de aperfeiçoamento das sociedades, capaz de potenciar investimento e consumo. Gradualmente, a cultura deixa de ser vista numa perspectiva restrita e muitas vezes associada a subsídios públicos, e passa a ser considerada na sua multiplicidade de relações com a economia, a criatividade e a tecnologia (cf. O sector cultural e criativo em Portugal, 2010). Este 2º capítulo concentra-se naquela que é a unidade de análise deste trabalho: as organizações culturais. Num cenário em que o peso do sector cultural e criativo continua a crescer ao nível económico e social, produzindo muitas vezes efeitos para além da sua área de actuação, e difíceis de avaliar, importa cada vez mais considerar as organizações deste sector do ponto de vista da sua gestão. Na verdade, e como se verá mais à frente, são ainda poucos os estudos desenvolvidos que dizem respeito a práticas organizacionais e de gestão na área cultural (cf. Lampel et al, 2000). No entanto, perante o crescimento do sector, a incerteza da envolvente e a crescente concorrência, mas também um nível de exigência maior da parte do mercado, é fundamental que as organizações culturais se apresentem tão competitivas e profissionais como as restantes organizações da sociedade. Numa primeira parte deste capítulo começa-se por contextualizar a evolução do sector cultural e criativo, através da apresentação de dados sobre o impacto económico das actividades culturais e criativas. Para além de se analisarem alguns dos mais recentes dados
  • 31. 31     quantitativos, é feita uma apreciação qualitativa do sector e da sua importância para a sociedade. Posteriormente é explicado o que se entende por organizações culturais de acordo com os objectivos desta dissertação e com base na literatura produzida sobre o tema. São apresentadas as características das organizações culturais, mais concretamente as especificidades que derivam da área de actuação em que estas se inserem, sobretudo pelo tipo de bens e serviços que oferecem. Finalmente, são abordados alguns dos desafios implicados neste sector de actividade. Importa ter em conta uma série de factores sociais e económicos que contribuíram para o salto qualitativo e quantitativo das actividades culturais e para que a cultura seja considerada cada vez mais factor de desenvolvimento, nomeadamente: - A terciarização da economia, da qual fazem parte as actividades culturais; - A democratização da cultura; - A influência das indústrias culturais nas sociedades, reforçada pelos media (cf. Lampel et al., 2000) - A evolução dos horários de trabalho, o que permitiu mais tempo de lazer, e consequentemente uma crescente preocupação com a ocupação dos tempos livres; - A alteração nos hábitos culturais e padrões de consumo, consequência de uma melhoria do nível de rendimento médio das famílias; - O desenvolvimento tecnológico, dinamizador das actividades culturais e criativas pelas novas soluções e pelo alcance que permite; - A qualificação das sociedades, o que permitiu que a cultura fosse cada vez mais vista como um produto de consumo (cf. O Sector Cultural e Criativo em Portugal, 2010). Na origem do interesse, cada vez maior, da sociedade pela cultura, destaca-se a Internet que se tornou rapidamente plataforma de excelência para a distribuição e difusão, tornando mais rápida e acessível a divulgação e disponibilização de produtos e serviços culturais. Ao mesmo tempo, a presença online do sector cultural levantou novas questões, como por exemplo as que se referem ao copyright. O desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação permitiu também a evolução das actividades criativas, nomeadamente as mais ligadas à comunicação empresarial e ao marketing, como o design e a programação.
  • 32. 32     Um conceito incontornável na abordagem deste tema e estruturante para o sector cultural é o conceito de indústria cultural, avançado por Theodor Adorno e Max Horkheimer em 1947 para criticar a nova relação da cultura com a economia, na qual os novos sistemas de reprodução e distribuição desempenharam um importante papel. Este conceito surgiu como forma de denominar a industrialização da cultura, distinguindo-a das actividades culturais tradicionais, bem como para alertar para os perigos da subjugação da arte à economia. A definição de indústrias culturais, enquanto indústrias de produção e consumo cultural com significado para além do objecto, ou seja capazes de produzir significado cultural e social, não reúne consenso na literatura existente, não só pelas diferentes concepções na delimitação deste subsector, mas também pelas múltiplas perspectivas face às organizações que o constituem. É possível distinguir duas perspectivas face às indústrias culturais: - Uma delas, mais restrita no que diz respeito à sua delimitação e com uma postura marcadamente diferenciada na relação com outras áreas do sector cultural e com outras indústrias; - E a outra mais abrangente e conciliadora, no sentido em que considera as indústrias culturais em permanente actualização e numa relação cada vez mais permeável com as outras áreas culturais, bem como com as outras indústrias. Esta última considera as indústrias culturais num sentido mais alargado, quer seja por incluir nesse âmbito os sectores não lucrativos das organizações culturais como propõe Paul M. Hirsch (cf. Cultural Industries Revisited, 2000) ou por equacionar a possibilidade de o teatro ser uma indústria cultural não lucrativa (cf. Lampel et. al, 2000: 266). Também Emílio Rui Vilar no seu texto Sobre a Economia da Cultura (2007), e distanciando-se de uma delimitação mais restrita, perspectiva que as indústrias culturais possam englobar igualmente o restauro, a conservação do património, o turismo de motivação cultural ou a distribuição em escala de produções artísticas. Lampel et. al (2000) consideram que se torna cada vez mais difícil ignorar as indústrias culturais, em latu sensu, cuja gestão tem que aliar conhecimento e criatividade para acrescentar valor aos seus produtos, e com a qual as outras indústrias podem aprender.
  • 33. 33     As indústrias culturais operam num mercado marcado pela ambiguidade, incerteza e dinamismo, traços característicos e semelhantes aos mercados de outras indústrias (cf. Lampel et. al, 2000). Continuando nesta perspectiva, não só é possível traçar paralelismos entre as indústrias culturais e outras indústrias, como é possível estabelecer vários paralelismos entre as indústrias culturais e os outros sectores culturais, tal como refere Maria de Lourdes Lima dos Santos no texto Indústrias Culturais: Especificidades e Precariedades (1999). No que diz respeito à interdependência das indústrias culturais com os outros sectores culturais - património, artes performativas e artes visuais - esta verifica-se nomeadamente na dependência do mercado, na imprevisibilidade ao nível da recepção de bens e serviços, e na procura pela inovação. O interesse da economia pela cultura, não sendo recente, materializa-se na disciplina científica de economia da cultura, em 1966 com a publicação do livro Performing Arts – The Economic Dillema de Baumol e Bowen, beneficia actualmente de estudos mais direccionados para a quantificação e sistematização de práticas. Esta quantificação e sistematização permitem não só compreender o impacto da cultura na economia e vice- versa, como equacionar novas estratégias a fim de tornar esta relação mais profícua. No entanto, o sector nem sempre foi receptivo a essa sistematização e quantificação por se considerar que a arte e a criatividade são valores independentes de uma qualquer justificação económica (cf. The Economy of Culture, 2006). Para além disso, o rápido crescimento do sector e a sua complexidade, bem como a ausência de recursos destinados à quantificação e sistematização das práticas, explicam que a tradição de produção de informação estatística fiável e criteriosa seja recente. Na última década vários estudos nacionais e internacionais, promovidos na sua maioria por organismos estatais com responsabilidades ao nível das políticas culturais, como os Ministérios da Cultura, ou por entidades oficiais ligadas às actividades culturais, como a UNESCO (United Nations Educational, Scientific, and Cultural Organization), têm contribuído para o conhecimento de qual o impacto e alcance do sector cultural e criativo na economia, bem como para a identificação de tendências no sector, nomeadamente ao nível do emprego e da qualificação dos profissionais. Na verdade, o tratamento estatístico e a avaliação das práticas do sector cultural e criativo, tendo em conta as especificidades dos vários sectores que o constituem, não só
  • 34. 34     proporcionam um conhecimento mais claro e detalhado desta área, como são úteis para o crescimento das organizações culturais e criativas, garantindo-lhes credibilidade perante o mercado. A preocupação em saber mais sobre o sector, ainda que de uma perspectiva quantitativa que, como se verá mais à frente, per se não é suficiente, demonstra o interesse da economia pela cultura e ilustra o impacto económico das actividades culturais e criativas nas sociedades actuais. Para além disso, surge também como base, e muitas vezes como condição necessária, para a elaboração de políticas e definição de estratégias para a cultura. Dada a complexidade do sector, e considerando ainda que as actividades culturais e criativas se encontram em permanente evolução, um passo fundamental dos estudos recentemente publicados e do tratamento estatístico é a delimitação do sector cultural e criativo. Os conceitos de actividades culturais e criativas, assim como o próprio conceito de cultura, têm evoluído, e por não serem estanques, adaptam-se às circunstâncias e são moldados pela sociedade, existindo em permanente construção. Assim, também a delimitação de cada subsector varia e adapta-se à medida que vão surgindo novas áreas de actividade, como por exemplo o software, no que diz respeito às indústrias criativas. Nesta dissertação, adopta-se a delimitação feita no estudo publicado em Janeiro de 2010 sobre o sector cultural e criativo em Portugal, realizado por encomenda do Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais (GPEARI) do Ministério da Cultura à sociedade de consultores Augusto Mateus & Associados. Pela primeira vez é feito um retrato abrangente e fundamentado do panorama cultural nacional e, à semelhança de outros estudos realizados a nível internacional, passa a ser também equacionado o sector criativo. Esta inclusão das actividades criativas representa uma mudança e surge por se considerar a cultura enquanto input de muitas das actividades criativas, como por exemplo do design de produto e da produção de software. Ainda que seja um desafio alargar o sector cultural às actividades criativas, dessa forma é possível compreender também as implicações da cultura na sua multiplicidade de relações (cf. O sector cultural e criativo em Portugal, 2010). Entende-se assim que o sector cultural e criativo engloba: - As actividades culturais nucleares, das quais fazem parte as artes performativas, as artes visuais e a criação literária, e o património histórico e cultural;
  • 35. 35     - As indústrias culturais, das quais fazem parte o cinema e o vídeo, a edição, a música, a rádio e a televisão, e ainda, os bens de equipamento, a distribuição/comércio e o turismo cultural, consideradas actividades transversais de suporte ao sector; - As indústrias criativas, que incluem a arquitectura, o design, a publicidade, os serviços de software e as componentes criativas em outras actividades. Em 2003, as actividades culturais e criativas contribuíram em 2,6% para o PIB europeu, revelando um crescimento 12,3% superior à média da economia em geral, segundo o estudo The Economy of Culture (2006) preparado para a Comissão Europeia pela consultora KEA – European Affairs. Em Portugal, o estudo recentemente publicado pelo GPEARI, confirma a tendência europeia e revela que o sector criativo e cultural em 2006 contribuiu em 2,8% para o PIB nacional, mais do que as indústrias têxteis e alimentares, sendo responsável por um valor acrescentado bruto (VAB) de 3.691 milhões de euros (cf. O Sector Cultural e Criativo em Portugal, 2010). Em termos de criação de emprego, o contraste entre o crescimento do sector cultural e criativo e o total da economia ainda é maior: ao nível europeu e perante o decréscimo de emprego, o emprego no sector cresceu 1,85% entre 2002 e 2004 (cf. The Economy of Culture, 2006) e, em Portugal, no período de 2000 a 2006, o sector cresceu 4,5%, criando 6500 novos postos de trabalho, face a uma média de crescimento de 0,4% no total da economia nacional (cf. O Sector Cultural e Criativo em Portugal, 2010). De notar ainda que, quer a nível europeu quer a nível nacional, a tendência em termos de qualificação académica no sector cultural e criativo aponta para uma maior percentagem de trabalhadores com habilitações de nível elevado em comparação com o total da economia (cf. O Sector Cultural e Criativo em Portugal, 2010). Estes dados relativos à qualificação académica dos profissionais do sector são sem dúvida um sinal positivo e de que a tendência é para uma profissionalização cada vez maior. Sem desvalorizar os dados apresentados, o incremento do impacto económico do sector cultural e criativo e a sua capacidade de criar valor acrescentado, deve também ser lido à luz da recente fragilização dos mercados financeiros, o que explica que, tanto a nível europeu como a nível nacional, estes sectores tenham superado indústrias tradicionais e sectores habitualmente reconhecidos como geradores de riqueza, como é o caso do sector
  • 36. 36     imobiliário que, a nível europeu e no mesmo período acima considerado, foi responsável por 2,1% do PIB (cf. The Economy of Culture, 2006). A época de crise que marca a actualidade pode igualmente ser vista como uma oportunidade para o sector cultural que tem a vantagem de estar habituado a operar em mercados voláteis e com níveis de incerteza elevados, como de resto já se referiu anteriormente. Na análise detalhada dos dados relativos ao impacto económico do sector, verifica-se que tanto a nível nacional como europeu, é preponderante o papel das indústrias culturais na contribuição do sector para a economia. Em Portugal, as indústrias culturais foram responsáveis, em 2006, por contribuírem em aproximadamente 2,2% para o PIB, face às contribuições das indústrias criativas e das actividades nucleares que contribuíram em 0,4% e 0,2%, respectivamente. Fonte: O Sector Cultural e Criativo em Portugal, 2010 A desigualdade na contribuição das actividades culturais nucleares, das indústrias culturais e das actividades criativas para a criação de riqueza, revela a complexidade das actividades que constituem os respectivos subsectores, e não pode ser analisada apenas do
  • 37. 37     ponto de vista quantitativo. Se apenas for considerado o ponto de vista quantitativo e tomarmos como exemplo a contribuição das actividades culturais nucleares para o PIB (0,2%), verifica-se que essa contribuição é baixa face às dos outros subsectores. No entanto, se considerarmos que grande parte das organizações deste subsector não tem fins lucrativos, e opera numa lógica muito diferente das indústrias culturais e criativas, esse valor já não se revela tão esclarecedor a não ser que seja complementado com uma análise que cruze estes dados com dados qualitativos sobre o impacto real e nas várias dimensões. Da mesma forma, restringir a actividade e o impacto da cultura ao contributo das indústrias culturais é redutor e pode conduzir a interpretações viciadas e descontextualizadas. Com o avançar das reflexões, conclui-se que os dados quantitativos não reflectem nem toda a complexidade da evolução do sector nem o alcance do seu impacto na sociedade. Na verdade, a crítica aos estudos que avaliam o impacto das actividades culturais vai no sentido de se considerarem maioritariamente e exclusivamente factores económicos, perdendo assim a noção abrangente do impacto da cultura, já que a análise dos efeitos das actividades culturais carece de dados qualitativos. Para autores como Paul M. Hirsch incluir nos estudos sobre o sector a análise qualitativa dos bens e produtos culturais, numa perspectiva da qualidade dos mesmos, é um luxo a que os estudos se deviam dar (cf. Cultural Industries Revisited, 2000), apesar da subjectividade do conceito de qualidade no que se refere às actividades culturais, bem como da imprevisibilidade na recepção dos bens e serviços culturais pelo público e pelo mercado. Ainda que o impacto económico da cultura permita a justificação de políticas culturais este só por si não é suficiente. Uma vez mais, no caso das actividades culturais com fins não lucrativos, o investimento não é feito prioritariamente a pensar nos resultados económicos. O impacto económico do sector cultural e criativo tem ainda um efeito multiplicador na medida em que produz efeitos indirectos aos investimentos iniciais, como por exemplo ao relacionar-se com outras áreas como o turismo e até a restauração. O património cultural atrai turistas, que por sua vez dinamizam o turismo e serviços como a restauração.
  • 38. 38     O sector actua igualmente como input de outras indústrias e potencia outras actividades, como por exemplo através do fornecimento de conteúdos para tecnologias de informação e comunicação, ou pondo a publicidade e o design ao serviço das indústrias tradicionais como a indústria têxtil (cf. Cantiga Esteves, 2009). Para além dos efeitos económicos do sector cultural, nomeadamente ao nível do emprego, da produção de riqueza e da contribuição para o PIB, as actividades culturais, a cultura, promovem o bem-estar e o entretenimento, estimulam o conhecimento, contribuem para a integração social e para o reforço da identidade cultural (cf. Vilar, 2007). Ainda que seja fundamental conhecer com mais detalhe o sector cultural, com todos os desafios metodológicos que isso implica, os aspectos intangíveis do impacto cultural devem reforçar a ideia de que há mais para além dos números, como se verá nas páginas a seguir.    
  • 39. 39     2.2 Especificidades e desafios das organizações culturais Num primeiro nível podem definir-se as organizações culturais como sendo todas as organizações cuja área de actividade é a cultura, nas suas mais variadas formas. O facto de o sector cultural ser complexo e vasto explica que não exista uma só definição deste tipo de organizações, mas antes diferentes perspectivas consoante os subsectores em questão. Ao analisar as especificidades das organizações culturais, pelo tipo de bens e serviços que oferecem, diferentes de subsector para subsector, não se pretende separá-las das restantes organizações da sociedade. Aliás, como já foi referido anteriormente, são vários os pontos de encontro (cf. Lampel et. al, 2000). No entanto, parte-se da premissa que as organizações que operam no âmbito cultural têm características distintas das restantes organizações da sociedade, nomeadamente pelos fins para os quais trabalham, pelo tipo de mercado em que se inserem, e pelo tipo de bens e serviços que oferecem, o que por sua vez requer uma gestão e abordagem específicas. Por uma questão de objectividade, nesta dissertação são apenas consideradas as organizações culturais que fazem parte do sector cultural não-industrial (cf. The Economy of Culture in Europe, 2006), também consideradas actividades culturais nucleares (cf. O Sector Cultural e Criativo em Portugal, 2009), tais como Fundações, Museus, Associações Culturais, Companhias de Dança, Teatros, Arquivos, Centros de Documentação, Bibliotecas, entre outras. Este subsector reúne características que não só diferem de outras indústrias como também das indústrias culturais, nomeadamente no que diz respeito à questão da reprodutibilidade e da lucratividade. Entende-se que o principal input das organizações culturais, para além dos factores de produção terra, trabalho e capital, é a criatividade. Este valor intangível, que pode ser denominado de génio humano, distingue as organizações culturais das restantes. Ainda que a criatividade seja utilizada noutros sectores, em nenhuma área senão a cultural ela é considerada essencial. O génio humano é matéria-prima da criação artística. A segunda particularidade das organizações culturais tem que ver com os seus fins. Ao contrário das organizações cuja lógica é a de acumulação e de lucro (ordem do ter), habitualmente denominadas de empresas, as organizações do sector cultural procuram essencialmente a promoção da criação e o desenvolvimento artístico e os seus ganhos são
  • 40. 40     sobretudo sociais (ordem do ser). Para além disso, sobretudo considerando as actividades culturais sem fins lucrativos, ao contrário das empresas nas organizações culturais não há distribuição de lucros. Os valores a atingir pelas organizações culturais junto dos públicos - a felicidade, o entendimento, o conhecimento, são razões em si mesmas. Isto não significa, no entanto, que as actividades culturais não possam gerar lucro: «Apesar de o trabalho artístico fundamentar-se em princípios muitas vezes antagónicos aos do mercado e esteja mais associado à produção de cultura e ao interesse público, ele pode ser igualmente concebido como um serviço capaz de gerar lucro» (cf. Valente et. al, 2007: 119). Este lucro pode não ser o lucro na acepção mais comum da palavra, mas se o entendermos enquanto conjunto de benefícios que resultam dos investimentos nas actividades culturais, a terminologia é adequada. Nesse sentido, o lucro para um Museu pode ser encontrado no indicador relativo ao número de visitantes, ou numa peça de teatro o lucro pode consistir em críticas positivas. Os bens culturais existem essencialmente de três formas: - bens que estão no mercado, como por exemplo os livros de determinada editora; - bens que estão no mercado mas sujeitos a subsídios, como seja uma peça de teatro que é apoiada por uma empresa; - bens que estão fora do mercado por serem totalmente financiados pelo Estado, como uma exposição de um dos Museus tutelados pelo IMC. O mercado em que as organizações culturais operam distancia-se da noção clássica de mercado, segundo a qual «o mercado é o lugar onde se trocam bens e serviços homogéneos e onde os agentes possuem tendencialmente a mesma informação» (cf. Vilar, 2007: 134). É certo que actualmente a incerteza e ambiguidade são características transversais aos mercados, como aliás já se referiu, no entanto, os mercados dos bens culturais caracterizam-se pela diversidade e ao mesmo tempo pelo carácter único dos bens transaccionados, bem como pela intermitência de informação (cf. Vilar, 2007: 134). No que diz respeito às actividades culturais nucleares – artes performativas, artes visuais e criação literária e património histórico e cultural, acrescenta-se ainda a incerteza e a imprevisibilidade ao nível da recepção. Os bens culturais reúnem as características de materialidade e imaterialidade. Pela sua dimensão imaterial os bens culturais assumem características de bens públicos como a não-
  • 41. 41     rivalidade e não-exclusão. A não-rivalidade significa que o consumo de uma pessoa não impede outra pessoa de consumir esse bem, e a não-exclusão significa que ninguém pode excluir outra pessoa de consumir esse mesmo bem. À sua dimensão imaterial associa-se a sua natureza não-utilitária, ou seja, o valor ou a função que lhes é atribuída geralmente é de ordem estética ou simbólica, e pode não ser traduzível em valor monetário, como no caso de bens que estejam fora do mercado: «(...) goods directed at a public of consumers for whom they generally serve as an aesthetic or expressive, rather than clearly utilitarian function» (cf. Hirsch apud Lampel, 2000: 263). O facto de o valor que é atribuído aos bens culturais depender da experiência individual faz também deles bens de experiência: «They derive their value from subjective experiences that rely heavily on using symbols in order to manipulate perception and emotion» (cf. Lampel et. al, 2000). O consumo de bens culturais tem a si associada a produção de externalidades positivas, ou seja, gera efeitos que não são necessariamente contemplados na definição do seu valor/preço, como por exemplo, «em matéria de coesão económica, social e territorial, seja em matéria de construção e preservação de formas de identidade e singularidade comunitárias» (cf. O sector cultural e criativo em Portugal, 2010: 14). Os bens culturais são ainda considerados bens de mérito uma vez que a sociedade reconhece a sua existência e a importância do seu consumo na construção de uma sociedade melhor. Apesar dos estudos quantitativos recentes e de estudos de caso qualitativos, na revisão de literatura é visível a lacuna teórica no que diz respeito à gestão deste tipo de organizações. Lampel et al (2000) consideram que isto se deve ao facto das práticas de gestão e padrões organizacionais serem diferentes das indústrias tradicionais. Para além disso, e dado que a gestão cultural é uma disciplina recente, os autores avançam com a hipótese de que é mais difícil encontrar especialistas culturais, do que por exemplo encontrar engenheiros ou analistas. A tendência nacional ao nível do emprego no sector cultural é de crescimento, conforme se viu anteriormente. No entanto, esse crescimento deverá fazer-se acompanhar da qualificação, tanto dos profissionais como das actividades culturais, promovendo formação que vá ao encontro das necessidades reais do mercado cultural (cf. Trabalho e qualificação nas actividades culturais, 2009).
  • 42. 42     É de notar que o sector em Portugal é caracterizado por vínculos de trabalho intermitentes e mais flexíveis do que noutras organizações, o que se deve à sazonalidade e incerteza que acompanham o trabalho criativo quer ao nível de criação, como ao nível da recepção (cf. Entidades Culturais e Artísticas em Portugal, 2006). Não obstante a flexibilidade que requer o trabalho nesta área, é igualmente importante que se inclua nas prioridades para o sector a regularização e salvaguarda dos estatutos profissionais de quem nele trabalha. A gestão deste tipo de organizações requer uma abordagem multidisciplinar e deve estar ciente das especificidades acima descritas. Ainda assim, muitas das noções e estratégias da gestão de outras organizações são adaptadas à área cultural, havendo autores, como Emílio Rui Vilar, que defendem que as organizações culturais podem e devem ser geridas como empresas. Na gestão deste tipo de organizações existe principalmente uma tensão na combinação de valores artísticos e de valores económicos (cf. Lampel et al, 2000). Face às circunstâncias económicas, à competitividade e à dificuldade de o Estado atribuir subsídios a todas as organizações culturais, o tema do financiamento deste tipo de organizações está muito presente nas reflexões actuais: «When it comes to the practical business of creating and selling cultural goods, firms must proceed with both polarities in mind» (cf. Lampel et. al, 2000). É cada vez mais imperativo combater a subsídio- dependência da qual padecem, voluntariamente e involuntariamente, muitas organizações. Assim, e sobretudo as organizações culturais que operam no âmbito não-lucrativo e que mais se ressentem das condições atrás descritas, não podem ignorar a necessidade de procurar financiamentos, de considerar o mercado e o que o público procura. Tendo em conta as especificidades acima apresentadas, é possível concluir que um dos principais desafios deste tipo de organizações é o equilíbrio entre valores artísticos e valores de mercado. Por um lado, pode haver a tentação de definir como critério principal aquilo que é monetariamente mais lucrativo ou aquilo que vai ao encontro exclusivo daquilo que o público pretende, desconsiderando assim a missão e objectivos da organização em questão, e submetendo valores artísticos à lógica de mercado (cf. Valente, 2007) Por outro lado, as organizações culturais correm o risco de não garantir a sua rentabilidade e sustentabilidade se ignorarem o mercado e o público. Assim, é importante conciliar valores artísticos com a procura e com o mercado.
  • 43. 43     Outro dos desafios resulta da instabilidade derivada das alternâncias de governos que muitas vezes por razões políticas não equacionam o bem comum, eliminam políticas anteriores de sucesso, ou alteram modelos já implementados. Em Portugal, ainda que nos últimos anos se tenha vindo a assistir a um apoio maior das empresas a organizações de carácter cultural, quer através de apoios, parcerias como também através do mecenato, ainda falta às organizações culturais credibilidade no mercado português, nomeadamente ao nível do fundraising, ainda muito embrionário em Portugal e que implica que as empresas e várias organizações da sociedade civil invistam mais na cultura como parte da sua responsabilidade social. No futuro as organizações culturais devem continuar a apostar num tipo de gestão mais profissional e numa perspectiva sustentável. Para isso é necessário atingir um equilíbrio desejável, mas difícil, entre a abertura ao mercado e os princípios e objectivos artísticos da organização. É igualmente importante dinamizar uma “cultura” de avaliação de custos, de benefícios e de resultados, o que implica a «adopção de critérios baseados em indicadores de desempenho e análises custo-benefício» (cf. O sector cultural e criativo em Portugal, 2010:127).
  • 44. 44     Capítulo 3 A comunicação interna nas organizações culturais: o desafio Como se pretendeu demonstrar no capítulo 1, a comunicação é uma área cada vez mais central para as organizações, quer a nível externo, como se constata pelos grandes investimentos em marketing e campanhas publicitárias, quer a nível interno, considerando que em organizações empresariais, sobretudo de grande dimensão, a comunicação interna é uma actividade em crescimento (cf. Internal Communication Across Europe, 2009). Entende-se que o objectivo dos investimentos em comunicação, sejam eles financeiros, técnicos e/ou humanos é, num primeiro plano, contribuir para que as organizações se tornem mais eficazes. Essa eficácia significa, entre várias possibilidades, produzir mais, reduzir custos, chegar a mais gente ou perder menos tempo. Mas num segundo plano, é reconhecido que o investimento na comunicação, concretamente na comunicação interna, e com tudo o que isso representa, contribui para que os trabalhadores se sintam mais motivados e mais satisfeitos com aquilo que fazem e com a organização a que pertencem. Assim, em contexto organizacional, não se trata apenas de fazer mais mas trata-se também de fazer melhor. E para fazer melhor, as organizações reconhecem que as pessoas com todo o seu capital intelectual, emocional e espiritual, têm uma influência enorme. Nesse sentido, entende-se que a comunicação interna intervém com a intenção última de, através dos seus meios e acções, potenciar o talento de cada pessoa ao serviço da organização. Como se viu no capítulo 2, o desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação permitiu à cultura, nas suas variadas formas, uma projecção e um alcance que muito contribuíram para o seu reconhecimento enquanto motor de desenvolvimento, e que potenciaram o seu consumo. Graças às tecnologias de informação e comunicação, a divulgação de actividades junto dos públicos externos, fundamental para as organizações culturais, beneficiou de novos meios de comunicação, levando as organizações a transpor a sua presença também para o mundo digital, quer através da criação de websites, quer através da presença nas redes sociais.
  • 45. 45     Interessa questionar se esse investimento na comunicação externa das organizações culturais foi acompanhado de um desenvolvimento e respectivo investimento na comunicação interna. Pelo que se verifica na literatura actual são vários os estudos que abordam a evolução da actividade de comunicação interna em organizações empresariais ou que destacam boas práticas, alguns já citados como os estudos da FEIEA, ou The Rise of the Internal Communicator (cf. Watson Helsby, 2002), Diagnóstico de Comunicação Interna - a opinião dos colaboradores (cf. Comunicação Empresarial, 2008), Internal Communications - more to deliver (cf. Watson Helsby, 2009), ou outros como Comunicação Interna nas Empresas – boas práticas de comunicação interna em matéria de desenvolvimento sustentável (cf. BCSD Portugal, 2007); no entanto, são praticamente inexistentes os estudos que abordam a comunicação interna no contexto de organizações culturais. Nesse sentido, e partindo da premissa de que a comunicação interna é ferramenta estratégica para as organizações, pretendeu-se nesta dissertação: - Reflectir sobre o desafio que representa esta actividade em organizações de carácter cultural, à luz das novas formas de comunicar, bem como das especificidades deste tipo de organizações; - E aprofundar o conhecimento das práticas de comunicação interna no contexto de organizações culturais. Uma vez que as organizações culturais são criadas e mantidas para atingir objectivos que, e como se viu anteriormente, diferem de outras organizações, nomeadamente das organizações empresariais, considerou-se ainda no início desta investigação que seria maior o desafio da comunicação interna nas organizações culturais devido ao conjunto de características e especificidades que estas reúnem. À palavra desafio, concretamente ao acto de desafiar, estão associadas as ideias de provocação, de luta e estímulo. O desafio, que consta do título desta dissertação, é encarado numa perspectiva dupla, ou seja: - por um lado, um desafio pela importância da comunicação interna no contexto organizacional; - por outro, um desafio pelas especificidades das organizações culturais.
  • 46. 46     Tal como foi referido no capítulo 1, a comunicação interna numa organização é influenciada por uma série de factores como a sua localização na estrutura organizacional, a estratégia da organização ou os recursos existentes. Nesse sentido, o facto de ser uma actividade que depende da organização em si e dos vários departamentos, determina que a comunicação interna tenha que lutar por chegar ao público interno. O termo lutar é empregue na perspectiva do desafio. Actualmente, mesmo nas organizações que mais dinamizam e investem na área de comunicação interna, é reconhecido o desafio de comunicar com o público interno. Isto porque, a comunicação interna, mesmo nas organizações que mais nela investem, é desafiada: - Pela dificuldade em medir e avaliar o retorno do investimento na mesma; - E pela tendência nalgumas organizações em perspectivá-la apenas enquanto disseminadora de informação (cf. Watson Helsby, 2009). Para além disso, a relação da comunicação com o público interno deve ser equilibrada, através de uma provocação positiva, no sentido de cativar as pessoas, evitando criar anticorpos à sua actividade pelo excesso de acções ou pela falta delas. A comunicação interna representa ainda um desafio na medida do estímulo, como por exemplo, ao ser estimulada pelas hierarquias, ou ao estimular ela própria a comunicação inter-departamental numa organização. As organizações culturais comportam, como se abordou no capítulo 2, um carácter desafiante, nomeadamente por: - Terem uma história recente no que diz respeito a práticas de gestão; - E por operarem num contexto de incertezas orçamentais. Tendo em conta as especificidades das organizações culturais, avançou-se no inicio desta investigação com a ideia de que serão ainda poucas as pessoas em organizações culturais dedicadas exclusivamente à comunicação interna, apesar da cada vez maior qualificação dos profissionais do sector. Duas explicações para este facto podem ser a pouca sensibilidade das organizações culturais para a importância da comunicação interna, e o facto de os constrangimentos financeiros determinarem que muitas vezes se escolha canalizar recursos para rubricas artísticas e não de gestão. Certamente se poderá dizer que a comunicação em todas as organizações tem um carácter desafiante. No entanto, para esta dissertação, o enfoque no desafio pretende destacar: