1. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
Fundação Universidade do Tocantins
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Universidade do Tocantins - UNITINS
Teoria Geral
do Processo
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TEORIA GERAL DO PROCESSO
1ºPERÍODO
Angela Issa Haonat
Rosa Maria Leite
PALMAS-TO/ 2005
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LISTA DE ABREVIATURAS
Art. - Artigo
CC - Código Civil
CDC - Código de Defesa do Consumidor
CF - Constituição Federal
CLT - Consolidação das Leis do Trabalho
CP - Código Penal
CPC - Código de Processo Civil
CPP - Código de Processo Penal
Des. - Desembargador
JEC - Juizado Especial Cível
LICC - Lei de Introdução do Código Civil
MP - Ministério Público
OAB - Ordem dos Advogados do Brasil
STJ - superior Tribunal de Justiça
STF - Supremo Tribunal Federal
TRF - Tribunal Federal de Recursos
TJ - Tribunal de Justiça
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APRESENTAÇÃO
Pode se dizer que a Teoria Geral do Processo funciona como o
instrumento responsável pelo vínculo entre os valores vigentes na sociedade
e os valores dispostos na norma jurídica.
Então é desnecessário reafirmar sua importância para o estudo de
direito, seja em seu aspecto formal ou material. Por assim dizer, não basta
conhecer o direito material, mas é preciso conhecer e saber como usá-lo.
Assim, a Teoria Geral do Processo, da forma que será apresentada,
abrangerá o estudo das disciplinas de direito processual, no âmbito civil e
penal, que serão estudadas à luz da Constituição Federal.
Desse modo, a disciplina visa garantir um sustentáculo teórico a você,
que no caso específico do Curso, lida diariamente com os aspectos práticos
do processo, ampliando seu conhecimento e aparelhando-o para o melhor
desempenho de suas funções no seu dia a dia.
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PLANO DE ENSINO
CURSO: Fundamentos e Práticas Judiciárias
DISCIPLINA: Teoria Geral do Processo
PROFESSORES: Ângela Issa Haonat /Rosa Maria Leite
ANO/SEMESTRE: 2005/2
TEORIA GERAL DO PROCESSO -TGP
I – JUSTIFICATIVA
A disciplina Teoria Geral do Processo possibilita um vasto conhecimento em
torno de temas diversos e atuais e, no estudo da evolução do direito, visto
como forma de controle social, é possível delinear, de forma clara,
tendências jurídico-político-ideológicas refletidas na legislação, na doutrina e
na jurisprudência, propiciando assim um conhecimento profundo e real sobre
a disciplina estudada, conhecendo um pouco mais de perto as teorias que
deram origens a institutos como a ação e o processo dentre outros.
II - EMENTA
O Estado-Juiz. Categorias jurisdicionais. Da norma processual. Da jurisdição
e da competência. Do Poder Judiciário. Da organização judiciária do Estado
do Tocantins. Do Ministério Público. Do Advogado. Da ação. Do processo.
Do juiz. Das partes. Dos atos processuais. Do processo civil, do processo,
dos procedimentos e das fases processuais. Do processo penal, do
processo e dos procedimentos.
III - OBJETIVO
Desenvolver um estudo sistematizado em relação aos institutos e
instrumentos de direito processual, que envolvem o objeto da Teoria Geral
do Processo e ao mesmo tempo fomentar nos alunos a necessidade de
despertar para uma consciência crítica acerca dos pontos controvertidos na
disciplina.
IV – CONTEÚDO
- O homem e a solução dos conflitos em sociedade;
- Formas de resolução de conflitos. Direito processual ou adjetivo e direito
substancial ou material;
- Fundamentos constitucionais e os princípios norteadores do Direito
processual;
- Da norma processual;
-Da jurisdição;
-Espécies de jurisdição;
- Do Poder Judiciário;
- Do Ministério Público. Do Advogado. Dos Auxiliares da Justiça;
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-Da Organização Judiciária;
- Da competência.
V - METODOLOGIA
Na primeira aula será feita a apresentação da equipe de professores e da
disciplina. As aulas serão expositivas. Na medida do possível serão
utilizados recursos como entrevistas, vídeo - tapes etc.
VI - AVALIAÇÃO
Provas objetivas que serão sempre antecedidas de revisão.
VII - BIBLIOGRAFIA BÁSICA
CINTRA, Antonio Carlos Araújo. DINAMARCO, Cândido Rangel.
GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 21 ed. São Paulo:
Malheiros, 2005.
ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria Geral do Processo. 10 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2005.
SILVA, José Milton da. Teoria Geral do Processo. 2 ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2003.
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SUMÁRIO
TEMA 01 - O homem e a solução dos conflitos em sociedade ...................07
TEMA 02 - Formas de resolução de conflitos. Direito
processual ou adjetivo e direito substancial ou material............13
TEMA 03 - Fundamentos constitucionais e os princípios
norteadores do Direito processual..............................................19
TEMA 04 - Da norma processual..................................................................25
TEMA 05 - Da jurisdição................................................................................32
TEMA 06 - Espécies de jurisdição ................................................................37
TEMA 07 - Do Poder Judiciário......... ...........................................................44
TEMA 08 - O Ministério Público e o Advogado. dos Auxiliares da
Justiça..........................................................................................50
TEMA 09 - Da Organização Judiciária..........................................................62
TEMA 10 - Da Competência..........................................................................75
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ubi societas
ibi jus
(onde está a
sociedade,
está o
direito)
TEMA 01
O HOMEM E A SOLUÇÃO DOS CONFLITOS
EM SOCIEDADE
Objetivo: Apresentar um panorama sobre a evolução do homem e do
direito, analisando conceitos básicos ao Direito Processual, como
necessidade, bem, utilidade, interesse, conflito de interesse, pretensão,
resistência e lide.
A solução dos conflitos entre os homens nem sempre se deu da
forma que conhecemos hoje, seja na via judicial ou extrajudicial. Antes de o
Estado chamar para si a tarefa de dizer o Direito, o que assistíamos era a
solução dos conflitos via vingança privada, ou seja, sempre os mais fortes
vencendo os mais fracos.
Com o passar dos tempos, o Direito aparece como uma das
formas de controle social, com o fim de solucionar os conflitos de maneira
mais justa. Surge então a importância de se definir os valores protegidos
pelo Direito e também o que importa de forma específica para a nossa
disciplina que são os procedimentos que devem ser observados na
aplicação do Direito ao caso concreto.
1. O Homem e o Direito
Desde a antiguidade, o homem vê no Direito uma forma de
instrumento de controle social. Embora, naquele tempo, o homem já
sofresse igualmente a influência de outros instrumentos de controle social,
como a moral e a religião. Daí a razão do brocardo jurídico: ubi societas ibi
ius.
A relação entre a sociedade e o direito encontra-se fundada na
função de controle que o direito exerce na sociedade em função da sua força
coativa. Assim, o direito representa a via de compatibilização entre as
necessidades e os interesses que surgem em decorrência da vida em
sociedade.
Desta forma, para compreender necessidades e interesses na
forma que interessam ao direito, são envolvidos na análise alguns conceitos
básicos, a começar por necessidade, bem, utilidade, interesse, conflito de
interesses, pretensão, resistência e lide.
10. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
10
CARNELUTTI
Considerado
um dos
maiores
juristas
italiano do
século XX,
nascido em
1879 e
falecido em
1965.
Professor da
Universidade
de Milão.
A palavra necessidade, segundo o dicionário Houaiss, pode ser
entendida como:
As exigências mínimas para satisfazer condições materiais e
morais de vida. Ex.: as necessidades básicas de uma família de classe
média. Ou ainda, carências naturais do organismo humano, como beber,
comer, dormir etc.
José Eduardo Carreira Alvim (2005, p.2) explica que:
O homem experimenta necessidades as mais
diversas, sob variados aspectos, e tende a
proceder de forma a que sejam satisfeitas; que
desapareça a carência ou se restabeleça o
equilíbrio perdido. A necessidade decorre do fato
de que o homem depende de certos elementos,
não só para sobreviver, como para aperfeiçoar-se
social, política e culturalmente, pelo que não seria
errôneo dizer que o homem é um ser dependente.
O que nos remete a dedução, segundo Alvim (2005, p. 3) que as
necessidades são satisfeitas mediante determinados elementos. Carnelutti
apud Alvim (2005, p. 3) lecionava que bem é o ente capaz de satisfazer uma
necessidade. Assim, para o direito, bem deve ser entendido de forma ampla,
abrangendo tanto os bens materiais como os imateriais.
BENS
MATERIAIS IMATERIAIS
Água Paz
Alimento Liberdade
Vestuário Honra
Transporte Amor
Visto o que são necessidades e bens, passa-se ao estudo do que
é utilidade. Para Carnelutti, apud Alvim (2005, p. 3), utilidade é a
capacidade ou a aptidão de uma coisa (bem) para satisfazer uma
necessidade.
O autor, porém, faz uma ressalva no sentido de que nem sempre
que haja utilidade num bem, haverá também um interesse a ele
compreendido.
Para ilustrar usamos o exemplo de Carnelutti apud Alvim (2005,
p. 3) para quem o pão sempre será um bem e sempre terá uma utilidade,
mas não haverá interesse (no pão) para quem não tem fome ou não prevê
que possa vir a tê-la.
Do significado de necessidade, bens e utilidade chega-se à
interesse que interessa propriamente ao Direito, quer pela importância,
como pela discussão doutrinária sobre o tema.
11. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
Desta forma, a divergência doutrinária existente sobre o melhor
significado para interesse, pode ser apontada segundo o entendimento de
Carnelutti e de Ugo Rocco apud Alvim (2005, p. 4). Vamos conferir:
11
INTERESSE
CARNELUTTI UGO ROCCO
O interesse é a posição favorável do
homem em relação à satisfação de uma
necessidade.
Juízo formulado por um sujeito acerca de
uma necessidade, sobre a utilidade ou
sobre o valor de um bem, enquanto meio
para a satisfação dessa necessidade.
É a relação entre o ente (homem) que
experimenta a necessidade e o ente
(bem) apto a satisfazê-la.
Ato da inteligência, que é dado pela
representação de um objeto (bem), pela
representação de uma necessidade e
pela representação da aptidão do objeto
(bem) para satisfazer a própria
necessidade.
Alvim (2005, p. 4) tece suas considerações no sentido de que o
interesse consiste numa relação, o que pode ser deduzido da própria
palavra. Esclarece que interesse deriva de quod inter est (que está entre):
aquele que está entre uma necessidade e um bem apto a satisfazê-la, está
numa posição que se chama interesse.
Por outro lado, temos que considerar que nem sempre o homem
estará numa posição de interesse. Pode-se citar como exemplo o fato de
que se o homem está com fome e possui o alimento à sua disposição, estará
em uma posição de interesse, o que não ocorrerá na hipótese do homem
que tem fome e não possui o alimento à sua disposição.
O interesse, no que toca à sua relação com o Direito, pode ser
classificado num primeiro momento como:
a) Interesse imediato;
b) Interesse mediato.
INTERESSE
IMEDIATO MEDIATO
Quando a situação se presta diretamente
a satisfação de uma necessidade.
Quando a situação apenas indiretamente
presta-se à satisfação de uma
necessidade, enquanto dela possa
derivar uma outra situação
(intermediária), que consegue a
satisfação da necessidade
Ex. quem possui o alimento presta-se
diretamente à satisfação da necessidade
de alimentar-se.
Ex.: quem possui dinheiro para adquirir
alimento, apenas indiretamente
(mediatamente) se presta à satisfação da
necessidade de alimentar-se.
Outra classificação importa ainda quando se fala em interesses.
Alvim (2005, p. 5) menciona que o interesse se classifica em:
a) Interesse individual; e
b) Interesse coletivo.
12. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
que leciona esse autor.
Caracteriza-se quando existe uma
situação favorável à satisfação de uma
necessidade pode determinar-se em
relação a um só indivíduo, de forma
isolada.
interesse individual, a razão está entre o bem e o homem, conforme suas
necessidades; no interesse coletivo, a razão ainda está entre o bem e o
homem, mas apreciadas as suas necessidades em relação a necessidades
idênticas do grupo social.”
difusos, assim definidos no art. 81 do Código de Defesa do Consumidor:
12
Passemos, portanto, a análise desses interesses de acordo com o
INTERESSE
INDIVIDUAL COLETIVO
Caracteriza-se por uma situação
favorável à satisfação de uma
necessidade não pode determinar-se
senão em relação a vários indivíduos.
Moacir Amaral dos Santos apud Alvim (2005, p. 5) afirma que “no
Por outro lado, não se pode deixar de considerar os interesses
Art. 81 - A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das
vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único - A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os
transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas
indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
Assim, os interesses ou direitos difusos podem ser compreendidos
como os pertencentes a várias pessoas, que não podem ser
individualizadas, ou seja, seus titulares são indeterminados, ligados apenas
por circunstâncias de fato. Como exemplo de interesses difusos temos os
danos ambientais, a publicidade abusiva etc.
Conflito de Interesses, Pretensão, Resistência e Lide.
Visto o significado de necessidade, bem, utilidade e interesse são
necessários tratar dos conceitos de conflito de interesses, pretensão,
resistência e lide. Trataremos de cada um separadamente.
Alvim (2005, p. 6) ensina que existe conflito de interesses quando
”a situação favorável à satisfação de uma necessidade exclui, ou limita, a
situação favorável à satisfação de outra necessidade.”
Sabe-se, porém, que as necessidades do homem aumentam de
forma ilimitada, enquanto que os bens tornam-se escassos frente a tantas
necessidades a serem atendidas. Assim, é natural que surjam os conflitos de
interesses quando o homem não pode satisfazer suas necessidades.
O conflito de necessidade que envolve dois interesses e uma só
pessoa pode ser chamado de conflito subjetivo. Ocorre quando o indivíduo
13. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
tem mais de uma necessidade e tem que se decidir por uma delas em
específico.
Há também o que se pode chamar de conflito intersubjetivo, como
chamou Carnelutti apud Alvim (2005, p. 6) que é o conflito de interesse que
envolve duas ou mais pessoas.
13
CONFLITOS
CONFLITO SUBJETIVO CONFLITO INTERSUBJETIVO
• Conflito entre dois interesses de
um mesmo homem;
• Em geral não ultrapassa da
pessoa do próprio sujeito nele
envolvido.
• Conflito entre interesses de duas
ou mais pessoas;
• Tem importância para o Estado
pelo fato do perigo que representa
de uma solução violenta, quando
ambos interessados recorrem à
força para valer o seu direito.
Os conflitos de interesses ocorrem, por assim dizer, quando
estiver caracterizada a disputa pelos bens considerados limitados, ou ainda,
sobre o exercício de direitos sobre esses bens, exigindo-se assim, o controle
e a regulação por parte do Estado, através do Poder Judiciário.
Devemos lembrar que os conflitos ocorrem em sede de interesses:
• Individuais;
• Coletivos; e
• Difusos.
Instalado o conflito de interesses entre as partes, chega-se ao que
a doutrina tradicional denominou de lide. Passamos então, ao conceito de
lide. Carnelutti apud Alvim (2005, p. 10), ao tratar de lide, leciona que lide é
o conflito de interesses, qualificado pela pretensão de um dos interessados e
pela resistência do outro.
LIDE
conflito de interesses, qualificado por uma pretensão resistida
(discutida) ou insatisfeita.
Ainda sob o que ensina Alvim (2005, 10/11), a lide compõe-se de
um elemento material e um elemento formal. Como elemento material da lide
temos o próprio conflito de interesses e como elemento formal temos a
pretensão e a resistência, também chamada de oposição.
ELEMENTOS DA LIDE
ELEMENTO MATERIAL ELEMENTOS FORMAIS
• Conflito de Interesse
• Pretensão
• Resistência
14. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
14
Assim, a lide é o próprio conflito de interesses, que pode ser
representada, de um lado, por uma pessoa que formula uma pretensão
contra outra pessoa, que irá a esta opor uma resistência.
Contudo, não se pode deixar de ressaltar o conceito de lide, em
que Carnelutti construiu o seu sistema, como nos ensina Alvim (2005, p. 11)
é bastante controvertido. Desse modo, dentre as críticas que se faz ao
conceito de Carnelutti encontra-se a de que “todo processo pressupõe uma
lide, mas nem toda lide desemboca, necessariamente, num processo; o
conceito seria, assim, mais sociológico que jurídico.”
Atividades
Exercícios de fixação do conteúdo
1. Responda em breves linhas em que consiste os interesses mediatos e
imediatos.
2. No seu ponto de vista o que caracteriza os interesses individuais,
coletivos e difusos?
3. Quais os elementos formadores da lide? Como eles podem ser
classificados?
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria Geral do Processo. 10 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2005.
CINTRA, Antonio Carlos Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel;
GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 21 ed. São Paulo:
Malheiros, 2005.
SILVA, José Milton da. Teoria Geral do Processo. 2 ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2003.
Leitura Complementar
CARNELUTTI, Fancesco. A arte do Direito. 4 ed. São Paulo: Bookseller.
2005.
15. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
15
TEMA 02
FORMAS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS. DIREITO
PROCESSUAL OU ADJETIVO E DIREITO SUBSTANCIAL OU
MATERIAL
OBJETIVOS:
Analisar as formas de resolução dos conflitos como a autotutela, a
autocomposição e o processo.
Traçar um paralelo entre o Direito Processual e o Direito Material.
Na primeira aula estudamos o significado de necessidade, bem,
utilidade, interesse, conflito de interesses, pretensão e lide. A compreensão
destes conceitos é essencial para a analise das formas de resolução de
conflitos que será nosso objeto de estudo desta aula.
Das formas de solução dos conflitos
É importante ressaltar que num primeiro momento não existia a
figura do Estado a regular os conflitos existentes em sociedade. Pode-se
considerar que nesse tempo imperava a vingança privada.
A vingança privada era caracterizada principalmente pelo uso da
força, em que o grupo dos mais fracos acabava dizimado pelo grupo dos
mais fortes. Com o passar do tempo, o Estado chama para si a tarefa de
dizer o Direito, ou seja, o Estado passou a controlar os conflitos que
aconteciam em sociedade.
Assim, num primeiro momento, nós estivemos regulando os
conflitos do homem, o que se chamou de autotutela, também chamada de
autodefesa e caracterizada, conforme nos ensina Ada Pellegrini Grinover et
al (2005, p. 21), por dois aspectos: (i) a ausência de juiz distinto das partes;
e (ii) imposição da decisão por uma das partes à outra.
Alvim (2005, p.13) ao falar sobre a autodefesa leciona que
Esta forma de resolução dos conflitos é apontada como a
mais primitiva, quando ainda não existia, acima dos
indivíduos, uma autoridade capaz de decidir e impor sua
decisão aos contendores, pelo que o único meio de defesa
do indivíduo (ou do grupo) era o emprego da força material
ou força bruta contra o adversário para vencer sua
resistência.
16. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
16
AUTOTUTELA
• Ausência de juiz distinto das partes;
• Imposição da decisão por uma das partes à outra.
Em resumo, como narra Alvim (2005, p. 13), não existia na
época uma noção clara de individualidade da culpa. Assim, a ofensa a um
integrante de determinado grupo era o mesmo que agredir todos os
integrantes deste grupo.
Ressalta ainda o referido autor (2005, p. 14) que os Estados
modernos reconhecem que em determinados casos não há como evitar
lesões de Direito. Por isso, o próprio Estado criou mecanismos que permitem
que o próprio indivíduo defenda o seu interesse, mesmo que seja necessário
usar de força, desde que respeitados os limites impostos pelo próprio direito.
Como exemplo de autodefesa no Estado moderno, Alvim (2005,
p. 14) menciona: (a) Legítima defesa; (b) Desforço incontinenti;(c)
Penhor legal; e (d) Direito de greve. Ilustra-se cada um deles a título de
exemplo:
Legítima
defesa
Prevista no Código Penal Brasileiro.
Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando
moderadamente dos meios necessários, repele injusta
agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem
Desforço
incontinenti
Previsto no Código Civil Brasileiro
Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em
caso de turbação, restituído no caso de esbulho, e segurado de
violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.
§ 1o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou
restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os
atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do
indispensável à manutenção, ou restituição da posse.
Penhor
legal
Código Civil Brasileiro
Art.1.467. São credores pignoratícios, independentemente de
convenção:
I - os hospedeiros, ou fornecedores de pousada ou alimento,
sobre as bagagens, móveis, jóias ou dinheiro que os seus
consumidores ou fregueses tiverem consigo nas respectivas
casas ou estabelecimentos, pelas despesas ou consumo que aí
tiverem feito;
II - o dono do prédio rústico ou urbano, sobre os bens móveis
que o rendeiro ou inquilino tiver guarnecendo o mesmo prédio,
pelos aluguéis ou rendas.
Direito de
greve
Previsto na Constituição Federal, art. 9º e na Lei nº 7.783/89;
Direito assegurado ao trabalhador, a fim de exercitá-lo sobre os
interesses que devam por meio dele defender.
Com a evolução do homem, mas ainda em tempos remotos,
surgem outras formas de solução de conflitos, como a autocomposição,
que pode ser considerada como um passo adiante na solução dos conflitos
que se estabeleciam em sociedade.
17. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
O termo autocomposição, de acordo com Alvim (2005, p. 15),
deve ser creditado a Carnelutti , que ao tratar dos equivalentes jurisdicionais,
ali a incluiu. Assim, auto (próprio) e o substantivo composição, na
linguagem do renomado mestre equivalem a solução, resolução ou
decisão do litígio por obra dos próprios litigantes.
Portanto, diversamente da autodefesa, a autocomposição
demonstra vocação para a solução dos conflitos existentes, mesmo que o
indivíduo tenha que mitigar, ou seja, abrandar a sua pretensão em relação a
determinado direito que tenha sido lesado. Assim, pode se dizer com Alvim
(2005, p. 15) que a autocomposição se traduz em atitudes de renúncia ou
reconhecimento a favor do adversário.
A autocomposição continua a existir no ordenamento jurídico, nas
seguintes formas: a desistência, a submissão e a transação. Grinover et
al (2005, p, 21) traz a definição de cada uma delas.
17
Desistência Submissão Transação
Renúncia à pretensão Renuncia à resistência
oferecida à pretensão
Concessões recíprocas
Importante, porém, ressaltar que essas formas de
autocomposição só podem se dar em razão dos direitos disponíveis.
Direitos
Disponíveis Indisponíveis
Pode ser transacionado Não pode ser transacionado
Pode haver renúncia Não pode haver renúncia
Transigíveis Intransigíveis
Desta forma, com o passar dos tempos, com a evolução do
homem e do próprio Direito, passou-se a preferir, conforme leciona Grinover
et al (2005 p, 21/22), a figura do árbitro, que atribuía ao caso concreto uma
solução imparcial.
Surge assim, conforme Alvim (2005, p. 16), a arbitragem
facultativa, como forma bem mais evoluída de solução dos conflitos.
Normalmente, a figura do árbitro na antiguidade era representada
por um sacerdote, pois, acreditava-se que por estar intimamente ligado às
divindades, o que por si só garantiria uma solução mais acertada. Outra
figura que normalmente se utilizava como árbitro eram os anciões pois eram
estes, dotados de sabedoria e conheciam os costumes do grupo social da
época.
Árbitros
Sacerdote Ancião
Ligação com as divindades;
decisões acertadas.
Sabedoria e conhecimento dos costumes
locais
18. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
18
A arbitragem facultativa, por seu turno, deu azo ao aparecimento
do Processo, que pode ser considerado como a última etapa na evolução
dos métodos compositivos do litígio conforme (ALVIM 2005, p. 17).
De acordo com o que ensina Alvim (2005, p. 18), o processo se
apresenta como um instrumento pronto a viabilização de maior número de
soluções justas e pacíficas dos conflitos porque, quando se fala em
processo, a contenda é solucionada por um terceiro sujeito, alheio as
questões que estão sendo debatidas.
Esclarece ainda o mesmo Autor (2005, p. 18) que para que o
processo tenha efetividade é necessário que:
Para que o processo produza resultados é preciso que esse
terceiro imparcial que decide o conflito seja mais forte do
que as partes litigantes, para que possa impor sua vontade,
coativamente, frente a qualquer intuito de desobediência ou
descumprimento por parte dos contendores. Compreende-se,
pois, que este terceiro seja o Estado.
Vários doutrinadores preocuparam-se em definir o processo. Alvim
(2005, p. 18/19) nos traz alguns conceitos cunhados na doutrina. Vamos a
eles:
• Definição de Niceto Alcalá - Zamora y Castillo
Processo é o instrumento de que se serve o Estado para,no
exercício da função jurisdicional, resolver os conflitos de interesses,
solucionando-os. O instrumento previsto como normal pelo Estado para a
solução de toda classe de conflitos jurídicos
• Definição de Carnelutti
O conjunto de atos destinados à formação ou à atuação de
comandos jurídicos, cujo caráter consiste na colaboração, para tal fim, de
pessoas interessadas (partes), com uma ou mais pessoas desinteressadas
(juízes). O processo não se compõe de um único ato, mas de um conjunto
de atos coordenados e ligados pelo fim perseguido, que é o de obter a justa
composição da lide. Operação mediante a qual se obtém a composição da
lide.
• Definição de Couture
Meio idôneo para dirimir imparcialmente, por ato de juízo da
autoridade, um conflito de interesses com relevância jurídica.
O Direito Processual
Depois de estudar as formas de solução dos conflitos de
interesses em sociedade, a par de toda a evolução do homem e as
mudanças que ocorreram ao longo do tempo, passamos ao estudo do direito
Processo -
Latim
Processus.
Proceder:
Avançar,
seguir
caminhando.
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processual propriamente dito, traçando um paralelo entre este e o direito
material.
Acompanhando o raciocínio de José de Albuquerque Rocha
19
(2005, p. 31) segundo o qual:
Com o advento do Estado, principalmente do Estado
burguês, as normas de conduta passaram a ser criadas, em
sua quase totalidade, por órgãos específicos do Estado,
através das leis e outros atos semelhantes, e também
garantidas, em ultima instância, pelo próprio Estado, e não
mais criadas e garantidas diretamente pela sociedade, como
acontecia antes.
Como estudado no módulo anterior, no início o homem resolvia os
seus conflitos de interesses através da autotutela, que era marcada pela
falta de intervenção do Estado. Este, apenas passou a intervir nos conflitos
de interesses já bem mais adiante.
Na clássica subdivisão do Direito em Direito Público e Direito
Privado, o Direito Processual está colocado como ramo do Direito Público.
Visto esta classificação do Direito em público e privado, deve-se a
ela ater, de forma apenas doutrinária, passando a partir daqui, para a nossa
disciplina em especial, a fazer um análise do ponto de vista macro, ou seja,
nos ater a classificação do direito em direito substancial e processual.
Aqui, importa ressaltar a diferença entre direito substancial e
direito processual, ou ainda, direito material e direito formal, também
denominados de direito substantivo e direito adjetivo.
Passemos então a uma breve revisão sobre o direito substancial
e o direito processual, de acordo com o que leciona Rocha (2005, p. 32-34)
que assim ilustra a diferença entre ambos:
DIREITO
SUBSTANCIAL PROCESSUAL
Conjunto de normas de
valoração das condutas sociais,
visando à proteção dos
interesses considerados
essenciais à manutenção de
uma dada formação social cuja
aplicação é garantida, pelo
aparelho coativo do Estado.
Conjunto de normas jurídicas
que dispõem sobre a
constituição dos órgãos
jurisdicionais e sua
competência, disciplinando essa
realidade que chamamos
processo.
O direito substantivo disciplina
as condutas materiais, isto é,
condutas cuja realização não
cria novas normas jurídicas,
mas situações materiais.
O direito processual é um
conjunto de normas que tem por
objetivo disciplinar os atos de
vontade dos órgãos
jurisdicionais e partes, para a
criação da norma do caso
concreto (decisão do conflito) e
sua eventual execução.
20. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
20
Assim, podemos concluir que o direito material consiste no
conjunto de princípios e normas que regulam os fatos e relações sociais, ou
seja, são as normas que disciplinam as condutas humanas e pode ser
subdividido em: direito civil, administrativo, comercial, tributário, trabalhista,
constitucional, penal etc.
Por outro lado, o direito processual pode ser compreendido como
o complexo de normas e princípios que regem o exercício da jurisdição.
Podendo-se concluir que o direito processual é, assim, um instrumento
para a concretização do direito material.
Atividades
1. A partir dos estudos sobre a classificação do direito, procure traçar
um paralelo entre o direito substancial e o direito processual.
2. Dentre as várias definições de processo destaque a que você mais se
identifica.
3. Disserte em poucas linhas sobre as formas de resolução de conflitos
de interesses na fase anterior ao processo.
4. A autotutela é admitida no direito moderno? Se for admitida quais
exemplos você poderia citar?
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria Geral do Processo. 10 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2005.
CINTRA, Antonio Carlos Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel;
GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 21 ed. São Paulo:
Malheiros, 2005.
SILVA, José Milton da. Teoria Geral do Processo. 2 ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2003.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
ROCHA, José de Albuquerque. Teoria Geral do Processo. 8 ed. São
Paulo: Atlas, 2005.
LEITURA COMPLEMENTAR
DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 12
ed. São Paulo: Melhoramentos, 2005.
21. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
Tema 03
FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS E OS PRINCÍPIOS
NORTEADORES DO DIREITO PROCESSUAL.
Objetivo: Apresentar os princípios que dão forma ao Direito
Processual, a partir da Constituição Federal, a fim de delinear a
trajetória da disciplina estudada.
O estudo dos princípios no âmbito da ciência jurídica é fator de
grande relevância. Isto porque os princípios são como leitores de uma
realidade. Dado serem considerados como sobre-normas que informam os
fundamentos do Direito, sinalizam também uma varredura dos caminhos a
serem percorridos pelo intérprete do Direito, que faz uso dos mesmos ao
interpretar as normas em harmonia com os valores consagrados na
Constituição Federal.
1. Princípios gerais do Direito Processual
Ao tomar como ponto de partida o fato que nós vivemos em um
Estado Democrático de Direito, não poderíamos deixar de iniciar o estudo
sobre princípios relacionando estes à nossa ordem constitucional.
21
Cândido Rangel Dinamarco (2001, p. 191) leciona que:
A tutela constitucional do processo é feita mediante os
princípios e garantias que, vindos da Constituição, ditam
padrões políticos para a vida daquele. Trata-se de
imperativos cuja observância é penhor da fidelidade do
sistema processual à ordem político-constitucional do país.
Vale ressaltar que no presente capítulo será dado ênfase aos
princípios que se aplicam de forma geral à Teoria Geral do Processo e à
medida que aprofundarmos no estudo do Direito Processual Penal e do
Direito Processual Civil, realçaremos os princípios inerentes a cada uma
dessas disciplinas.
A esta altura você já estudou quais são as
fontes do Direito. Vamos recordar quais são
essas fontes?
22. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
22
FONTES DO DIREITO
MATERIAIS FORMAIS
• Valores sociais; ESTATAIS NÃO ESTATAIS
• Elementos culturais
• Vontade do povo etc
• Lei
• Jurisprudência
• Convenção
Internacional
• Costumes
• Doutrina
• Princípios
Gerais do Direito
Visto quais são as fontes do Direito, vimos que os princípios
encontram-se entre elas. Ademais, a própria Lei de Introdução ao Código
Civil - LICC, se reporta aos princípios como fonte de direito no seu art. 4º
que dispõe o seguinte: “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de
acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.”
Para ilustrar a importância do estudo dos princípios, é necessário
mencionar inicialmente as funções dos mesmos. Rocha (2005, p. 42 - 43)
enumera três funções dos princípios no direito processual. São elas:
Função
Fundamentadora
Função
Orientadora da Interpretação
Função de
Fonte Subsidiária
Os princípios constituem a
raiz de onde deriva a
validez intrínseca do
conteúdo das normas
jurídicas.
Quando o legislador se
dispõe a normatizar a
realidade social, o faz
sempre, a partir de algum
princípio.
Os princípios são idéias
básicas que servem de
fundamento ao Direito
Positivo.
A função orientadora
decorre da função
fundamentadora do direito.
Se as leis são informadas
ou fundamentadas nos
princípios, então devem ser
interpretadas de acordo
com os mesmos, porque
são eles que dão sentido às
normas.
Os princípios servem, pois,
de guia e orientação na
busca do sentido e alcance
das normas.
Nos casos de lacunas da lei
os princípios atuam como
elemento integrador do
direito.
Como a lei funda-se nos
princípios, estes servem
seja como guia para a
compreensão do seu
sentido (interpretação),
seja como guia para o juiz
suprir a lacuna da lei, isto
é, como critério para o juiz
formular a norma do caso
concreto.
Uma discussão que se coloca presente quando falamos de
princípios, já nos remetendo a matéria processual, é ao que a doutrina
tende a nomear de princípios formativos do processo. Esta discussão se faz
presente como leciona Dinamarco (2001, p. 195-196), porque
A técnica processual inclui também um número extenso de
regras de grande importância, desenvolvidas ao longo dos
séculos e da experiência acumulada, sendo responsáveis
pela boa ordem do processo e correto encaminhamento de
suas soluções. Rigorosamente, contudo, não se qualificam
como princípios porque tem lugar no interior do sistema e
não atuam como pilares sobre os quais este se apóia.
Dentre esses princípios técnicos destaca-se quase que de forma
unânime pela doutrina:
a) Princípio Econômico - voltado às questões de economia
processual;
23. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
b) Princípio Lógico - seleção de meios eficazes à descoberta da
verdade e das soluções corretas, evitando erros;
c) Princípio Jurídico - postula a igualdade no processo e a
fidelidade dos julgamentos ao direito substancial;
d) Princípio Político - direcionado ao binômio representado pelo
máximo possível de garantia social com o mínimo de sacrifício pessoal.
Estudado os princípios informativos do processo, passamos ao
estudo dos princípios de índole político - constitucional, ou ainda, dos
princípios sustentáculos da Teoria Geral do Processo. Embora exista uma
certa discussão doutrinária sobre quais são os princípios que integram a
Teoria Geral do Processo, elegemos para nosso estudo os elencados por
Rocha (2005, p. 45-49) que passamos a expor de forma sintetizada.
Art. 2º . São Poderes da União,
independentes e harmônicos
entre si, o Legislativo, o
Executivo e o Judiciário.
Art. 95. Os juízes gozam das
seguintes garantias:
I-Vitaliciedade (...);
II - Inamovibilidade (...);
III- Irredutibilidade de subsídio
(...)
b) Princípio da Imparcialidade. Significa em resumo, a
eqüidistância do juiz das partes e seus interesses nos processos em que
atua. A imparcialidade pode ser subjetiva (quando disser respeito das
partes) e objetiva (quando disser respeito aos interesses). Vale lembrar
porém que as idéias políticas do juiz não comprometem a sua
imparcialidade, que só pode ser exigida sob a égide do caso concreto.
23
a) Princípio da independência.
O Princípio da independência pode ser
visto sob duas óticas. Pode ser entendido
sob a ótica da instituição judiciária (art. 2º
da CF) ou do juiz, pessoa física (art. 95 da
CF). Desta forma, por independência pode-se
entender tanto a ausência de sujeição a
ordens de outros poderes, bem como as
garantias de imparcialidade que garantem
ao juiz certa estabilidade, especialmente
nas causas em que o Estado é parte.
Art. 5º, CF, incisos XXXVII e LIII
XXXVII- Não haverá juízo ou
tribunal de exceção.
LIII- ninguém será processado nem
sentenciado senão pela autoridade
competente.
c) Princípio do juiz natural.
Estabelece um tríplice entendimento.
Num primeiro momento, significa que a
instituição dos juízos e tribunais devem
ser anteriores ao fato ensejador de sua
atuação. Num segundo momento, que a competência dos órgãos deve ser
estabelecida por regra geral. E por último, requer que a designação dos
juízes seja feita com base em critérios gerais estabelecidos por lei ou
procedimentos fixados em lei.
d) Princípio da exclusividade da jurisdição pelo Judiciário.
Em síntese o princípio quer dizer que nenhum conflito pode ser excluído da
apreciação do judiciário. Art. 5º, XXXV: “a lei não excluirá da apreciação do
Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.” O princípio porém, comporta
temperamentos, uma vez que a própria Constituição estabelece a exceção
do art. 52, incisos I e II, que dita regra de competência privativa ao Senado
Federal para processar e julgar o Presidente e o Vice - Presidente da
24. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de
Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos
crimes da mesma natureza conexos com aqueles e, ainda, os Ministros do
Supremo Tribunal Federal, o Procurador Geral da República e o Advogado
Geral da União, nos crimes de responsabilidade. No âmbito
infraconstitucional, ressalta-se também, a título de exceção do princípio da
exclusividade da jurisdição pelo judiciário os conflitos dirimidos por árbitros à
luz da Lei n. 9.307/1996.
iniciativa do juiz. Pode-se dizer que deriva do princípio da independência
(visa resguardar a imparcialidade do juiz) e do acesso à justiça.
24
e) Princípio da inércia. O processo não pode principiar por
Art. 5º, XXXV. A lei não excluirá
da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a
direito.
.
f) Princípio do acesso à
justiça. É a possibilidade garantida pela
Constituição Federal, no seu art. 5º,
XXXV, para que todos possam pleitear a
proteção jurisdicional do Estado.
g) Princípio do devido processo legal. Princípio expresso
insculpido no art. 5º, LIV, da Constituição Federal que estabelece “ninguém
será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo
legal”. Assim, cabe ao Judiciário observar o processo estabelecido em lei a
fim de que este assegure o respeito às garantias e direitos fundamentais
aos que a ele se submetem.
h) Princípio da igualdade. Derivado do princípio do devido
processo legal. Expresso na Constituição Federal no art. 5º caput :
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos
termos seguintes:
Atualmente, temos que enxergar o princípio da igualdade não só
sob a ótica da igualdade formal, mas também do aspecto da igualdade
substancial. O nosso ordenamento jurídico prevê em muitos casos, a
observância da aplicação do princípio da igualdade material, conforme
aponta Fábio Alexandre Coelho (2004, p. 66):
DIPLOMA ART DISPOSIÇÃO
CLT 844 Solução distinta a falta de comparecimento do Reclamante
(arquivamento) e do Reclamado (Revelia)
CPP 386, VI O Réu deverá ser absolvido quando não existirem provas
suficientes para a condenação.
CPC 188 Computar-se-á em quádruplo o prazo para contestar e em
dobro para recorrer quando a parte for a Fazenda Pública ou
o Ministério Público
10.471/03 71 e ss Prioridade na tramitação de todos atos e diligencias em
qualquer instância que beneficia as partes com idade igual ou
superior a 60 anos
25. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
Art. 5º, LV . Aos litigantes, em
processo judicial ou
administrativo, e aos acusados
em geral são assegurados o
contraditório e ampla defesa,
com os meios e recursos a ela
inerentes;
j) Princípio da ampla defesa. Previsto no art. 5º, inciso LV da
Constituição Federal. Por este princípio entende-se que as partes podem
produzir provas de maneira ampla, quando observados os meios lícitos
conhecidos e permitidos pelo direito. A ampla defesa, em sentido amplo
significa a observância de dois ângulos, ou seja, de dois elementos: a defesa
técnica, que é a defesa através de advogado, e a defesa não técnica, que
consiste no direito de presença.
k) Princípio da liberdade da prova. Expresso na Constituição
Federal, no seu art. 5º, LVI “são inadmissíveis, no processo, as provas
obtidas por meio ilícito”. Assim, serão admitidos todos os meios de prova em
direito admitidas desde que não sejam obtidas por meio ilícito.
l) Princípio da publicidade. O princípio da publicidade destina-se:
(a) às partes; e (b) ao público em geral. Possui grande relevância e
25
i) Princípio do contraditório.
Decorre da própria estrutura dialética do
processo. Pressupõe que a verdade só pode
ser evidenciada pelas teses contrapostas das
partes. Por este princípio o órgão judicante
não pode decidir uma demanda sem ouvir a
parte contra qual ela foi proposta.
Art. 93, IX. Todos os julgamentos dos órgãos do
Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas
todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo
a lei, se o interesse público o exigir, limitar a
presença em determinados atos, às próprias
partes e as seus advogados, ou somente a estes;
também está expresso na
Constituição Federal no seu
art. 93, IX.
m) Princípio dos recursos. No Brasil, o recurso constitui-se
garantia fundamental inerente à ampla defesa. A própria estrutura dos
órgãos judicantes induz a aceitação do princípio dos recursos, facultando a
parte sucumbente a possibilidade de outro órgão jurisdicional reexaminar a
decisão que lhe foi desfavorável.
n) Princípio da motivação. A motivação das decisões encontra-se
expressa no art. 93, IX, portanto, o juiz como intérprete e aplicador da lei,
deverá motivar suas decisões, sob pena de cometer ato contrário ao direito.
o) Princípio da coisa julgada. Visa assegurar a efetividade das
decisões judiciais. Expresso na Constituição Federal no art. 5º, XXXVI “a lei
não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.
p) Princípio da justiça gratuita. Pode ser considerado como a
manifestação do princípio da igualdade material no processo. É princípio
expresso na Constituição Federal no art, 5º LXXIV “o Estado prestará
assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de
recursos.” , bem como no art. 134 também da Constituição Federal: “A
Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado,
incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos
necessitados na forma do art. 5º, LXXIV”
26. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
26
ATIVIDADES
1. Em que consiste o princípio do acesso à justiça?
2. Em que consiste o princípio do juiz natural?
3. Em que consiste o princípio do devido processo legal?
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria Geral do Processo. 10 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2005.
CINTRA, Antonio Carlos Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel;
GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 21 ed. São Paulo:
Malheiros, 2005.
SILVA, José Milton da. Teoria Geral do Processo. 2 ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2003
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
COELHO, Fábio Alexandre. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Juarez
de Oliveira. 2004.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil.
São Paulo: Malheiros, 2001. v.1
ROCHA, José de Albuquerque. Teoria Geral do Processo. 8 ed. São Paulo:
Atlas, 2005.
LEITURA COMPLEMENTAR
TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. 5 ed.
São Paulo: Saraiva, 1999.
NERY JR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal.
8 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.
27. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
27
Tema 04
DA NORMA PROCESSUAL
Objetivo:Conhecer a distinção entre as normas materiais e as normas
instrumentais, ressaltando a importância destas que podem ser
consideradas como instrumentos de proteção do direito material.
A norma jurídica em sentido amplo tem por objeto a regulação da
conduta humana criando direitos e estabelecendo obrigações. As normas
processuais ao contrário disciplinam os meios de defesa dos direitos
estabelecidos pela norma material. Desta forma, torna-se importante
destacarmos um capítulo no presente estudo para tratarmos da norma
processual e suas particularidades.
Normas materiais e normas processuais
Para realizar o estudo das normas processuais e sua finalidade
vamos construir um paralelo entre estas e as normas materiais,
estabelecendo assim suas diferenças e aplicações. Para tanto faremos uso
da classificação fornecida por Coelho (2004, p. 151-152)
Normas Materiais Normas Instrumentais
Disciplinam os relacionamentos entre as
pessoas, buscando dar uma prévia
solução a possíveis conflitos de interesse
que venham a surgir, estabelecendo qual
dos interesses pode prevalecer.
Visam assegurar o cumprimento das
normas materiais, estabelecendo a forma
de possíveis conflitos através da
aplicação das normas substanciais.
Objeto da norma processual.
Conforme leciona Coelho (2004, p, 151-152) o objeto maior das
normas processuais é “disciplinar a atividade do Estado e dos litigantes, bem
como o desenvolvimento do processo.” Pode assim concluir que a finalidade
da norma processual é estabelecer a forma de solução dos conflitos através
do processo.
E como pode a lei processual ser aplicada na
solução dos conflitos através do processo?
Quem a aplica?
Aqui nos reportamos à clássica tripartição de poderes de
Montesquieu, pela qual a atividade jurisdicional é reconhecida como uma
28. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
das funções do poder estatal, ao lado das funções administrativas e
legislativas.
sistema jurídico, faz-se necessário a verificação do disposto no princípio da
investidura, pelo qual o juiz necessita estar investido do Poder delegado pelo
Estado para exercer a atividade judicante e aplicar a norma material e a
norma processual ao caso concreto.
Divisão da norma processual na doutrina
normas processuais em sentido estrito; (b) normas de organização judiciária;
e (c) normas procedimentais. Vejamos cada uma delas.
Normas processuais
28
Assim, para exercer a atividade jurisdicional no âmbito do
A doutrina classifica a norma processual em três grandes grupos: (a)
Art. 22. Compete privativamente à União legislar
sobre:
I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral,
agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do
trabalho;
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito
Federal legislar concorrentemente sobre:
XI - procedimentos em matéria processual;
em sentido estrito
Normas de
organização judiciária
Normas
procedimentais
Cuidam do processo como
tal, atribuindo poderes e
deveres processuais.
Tratam primordialmente da
criação e da estrutura dos
órgãos judiciários e seus
auxiliares.
Dizem respeito apenas ao
modus procedendi,
inclusive a estrutura e
coordenação dos atos
processuais que compõem
o processo.
Grinover et al (2001, p. 89-90) explica, porém, que existe uma certa
crítica em razão desta divisão, uma vez que a mesma esbarra no conceito
moderno de processo, o que levaria as normas procedimentais serem
consideradas também normas processuais. Lembram ainda que de acordo
com a doutrina mais
moderna existe a
tendência de se envolver
a organização judiciária
na teoria geral do
processo, o que também
acarretaria serem as
mesmas integrantes do
direito processual.
Advertem, porém, que esta divisão é a que é acatada pela própria
Constituição Federal. Vide arts. 22, I e 24 XI da CF.
Natureza da norma processual
A norma processual é parte integrante do direito público, uma vez
que é através da mesma que se desenvolve a atividade jurisdicional. Assim,
quando falamos em norma processual não propriamente uma relação de
coordenação, mas como nos ensinam Grinover et al. (2001, p.90) uma
relação de “poder e sujeição, predominando sobre o interesse público na
resolução (processual e, pois, pacífica) dos conflitos e controvérsias.”
29. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
29
Lex fori - lei do
foro onde se
resolve o litígio,
proferindo
decisão, sendo
competente,
portanto, para
reger a forma do
processo. (Maria
Helena Diniz,
Dicionário
Jurídico. São
Paulo: Saraiva,
1998. V.03, p.
113)
Apesar da norma processual possuir natureza de direito público,
ela nem sempre é uma norma cogente. Mesmo sem a ocorrência de
processo, em algumas situações a norma processual fica na dependência da
vontade de uma das partes, o que se denomina normas dispositivas. Como
exemplo de normas dispositivas temos a eleição de foro.
Para melhor ilustrar a classificação das normas jurídicas
processuais quanto à sua natureza, traçamos o quadro abaixo, distinguindo
as normas processuais cogentes das normas processuais dispositivas.
NORMAS PROCESSUAIS
COGENTES DISPOSITIVAS
• Devem ser cumpridas
independentemente da vontade de quem é
obrigado a cumpri-la.
• Regras inderrogáveis pela vontade das
partes.
• Também devem ser
obedecidas, mas podem ser
afastadas, nos limites fixados pela
própria lei e pela vontade das partes.
• Ex: regime de casamento do
Código Civil.
A título de conclusão pode-se dizer que as normas processuais
possuem caráter eminentemente técnico. Como forma de fixação trazemos
um quadro sinótico com as principais características das normas
processuais.
Características das normas processuais
NORMAS DE DIREITO PROCESSUAL as regras processuais
diferem das materiais, pois se referem à atividade jurisdicional.
NORMAS DE DIREITO PÚBLICO decorrem da soberania estatal
e estabelecem critérios para a atividade jurisdicional.
NORMAS OBRIGATÓRIAS como regra são de ordem pública,
cogentes e obrigatórias. (embora comportem temperamento)
Eficácia da lei processual no tempo e no espaço
Eficácia da lei processual no espaço
A norma jurídica seja ela material ou processual, tem eficácia no
tempo e no espaço, ou seja, aplica-se dentro de determinado período e
território.
Grinover et al. (2001, p. 96) explicam que o princípio que regula a
eficácia espacial da norma processual é o da territorialidade. Assim, a estas
se impõe sempre à aplicação da lex fori.
30. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
30
A territorialidade da aplicação da lei processual encontra-se
expressa no art. 1º do Código de Processo Civil:
Art. 1º A jurisdição civil, contenciosa e voluntária, é exercida
pelos juízes em todo território nacional, conforme as disposições que este
código estabelece.
Contudo, devemos observar que o princípio da territorialidade
não significa como lecionam Grinover et al (2001, p. 97) que o juiz deva
ignorar a regra processual estrangeira, pois, no caso do art. 231 do CPC
esta constitui pressuposto para a aplicação da lei nacional. Os autores,
contudo, alertam para o fato que não se pode confundir a aplicação da
norma processual estrangeira com a aplicação da norma material
estrangeira, referida pelo direito processual nacional, especialmente no art.
7º do CPC.
Aplicação da lei processual no tempo
Como as demais normas jurídicas, a norma processual também é
limitada no tempo, considerado o disposto no direito intertemporal. Dois
aspectos devem ser levados em consideração. Vamos a eles:
1. As leis processuais brasileiras submetem-se ao disposto na Lei
de Introdução do Código Civil - LICC, no tocante a observância da a eficácia
temporal das leis. Em regra, quando não se dispuser de forma contrária, ou
no silencio da lei, a mesma entra em vigor, em todo o país, quarenta e cinco
dias após sua publicação.
2. Problema maior ocorre quando a lei incidir sobre situações
idênticas, para se estabelecer qual das leis - se a anterior ou a posterior -
deve ser aplicada ao caso concreto. Como nos ensina Grinover et. al.
(2001, p. 98) o processo se constitui por uma série de atos que se
desenvolvem e se praticam sucessivamente no tempo (atos processuais,
integrantes de uma cadeia unitária, que é o procedimento), torna-se
particularmente difícil e delicada a solução do conflito temporal de leis
processuais.
Ocorrendo o conflito de normas processuais no tempo devemos
analisar os sistemas propostos por Grinover et. al. (2001, p.98) que
poderiam ser em tese levados em consideração, realçando o sistema do
isolamento dos atos processuais que é o sistema consagrado na doutrina
brasileira, além de estar expresso no CPP e no CPC. São eles:
a) Sistema da unidade processual: apesar de se desdobrar em
vários atos, o processo apresenta uma unidade que somente poderia ser
regulado por uma única norma, seja nova ou velha, devendo a velha se
impor para não ocorrer a retroação da nova, com prejuízo dos atos
praticados até a sua vigência.
b) Sistema das fases processuais: sistema no qual distinguir-se-
iam fases processuais autônomas (postulatória, ordinatória, instrutória,
decisória e recursal), cada uma delas, capaz de ser disciplinada por uma lei
diferente.
31. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
c) Sistema do isolamento dos atos processuais: pelo qual a
lei nova não atinge os atos processuais já praticados, nem seus efeitos, mas
se aplica aos atos processuais a praticar, sem limitações relativas às
chamadas fases processuais.
Convém mais uma vez lembrar que o sistema do isolamento dos
atos processuais é o que mais está representado na doutrina brasileira,
encontrando-se ainda expresso no art. 2º do Código de Processo Penal -
CPP nos seguintes termos: “a lei processual penal aplicar-se-á, desde logo,
sem prejuízo da validade dos atos já realizados sob a vigência da lei
anterior”. O sistema encontra, também, abrigo a luz do art. 1.211 do Código
de Processo Civil - CPC, que dispõe: “ao entrar em vigor, suas disposições
aplicar-se-ão desde logo aos processos pendentes.”
Interpretação da lei processual
Não podemos deixar de levar em consideração que a interpretação
e a aplicação das normas processuais estão subordinadas às mesmas
regras das normas materiais. Grinover et. al. (2001, p. 102) lecionam que as
normas processuais seguem as disposições contidas nos arts. 4º e 5º da Lei
de Introdução do Código Civil Brasileiro.
31
Art. 4o Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de
acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais
de direito.
Art. 5o Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais
a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
Esclarecem ainda os autores acima mencionados que para não
deixar dúvidas quanto a aplicação daquelas regras, o Código de Processo
Penal dispõe de forma expressa no seu art. 3º “a lei processual penal admitirá
interpretação extensiva e a aplicação analógica, bem como o suplemento dos
princípios gerais de direito”.
Assim, a título apenas de fixação lembramos en passant as formas
de interpretação que vocês estudaram na disciplina de Introdução ao Estudo
do Direito.
• Interpretação gramatical: análise literal do texto;
• Interpretação lógica - sistemática: interpretação à luz das
demais normas que compõem o ordenamento jurídico, juntamente com os
princípios gerais que as norteiam;
• Interpretação histórica: analisa a lei em sua perspectiva
histórica;
Vamos ver o que dizem estes
artigos?
Vamos lembrar:
32. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
32
• Interpretação teleológica: por esse método leva-se em conta
a identificação da causa da edição da norma e o resultado que ela pretendia
alcançar.
Importante ainda mencionar que as normas processuais, tais como
as normas materiais necessitam por vezes que se preencha as lacunas da lei.
Isto porque, por mais criativo que seja o legislador, este jamais poderia prever
todas as situações evidenciadas pelo homem, dada a sua própria evolução
social. Desta forma, para se preencher as lacunas verificadas na lei, poderão
se fazer uso da integração, conforme Grinover et. al. (2001, p. 101). E
também é o que se extrai da leitura do art. 126 do CPC “O juiz não se exime
de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei.”
O preenchimento das lacunas da lei de acordo com Grinover
(2001, p. 102) será feito através da analogia e dos princípios gerais do
direito.
Vamos lembrar, ainda que
superficialmente, cada um deles:
• Analogia: resolução de casos não previstos na lei,
mediante a utilização de regra jurídica relativa a hipótese semelhante;
• Princípios gerais do direito: que compreendem não
apenas os princípios decorrentes do próprio ordenamento jurídico, como
ainda os que o informam e lhe são anteriores e transcendentes.
ATIVIDADES
1. Trace um paralelo entre normas cogentes e normas dispositivas.
2. De quem é a competência para legislar sobre o direito processual?
3. Disserte sobre a eficácia da lei processual no tempo e no espaço.
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria Geral do Processo. 10 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2005.
CINTRA, Antonio Carlos Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel;
GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 21 ed. São Paulo:
Malheiros, 2005.
33. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
SILVA, José Milton da. Teoria Geral do Processo. 2 ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2003
33
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
COELHO, Fábio Alexandre. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Juarez
de Oliveira. 2004.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil.
São Paulo: Malheiros, 2001. v.1
ROCHA, José de Albuquerque. Teoria Geral do Processo. 8 ed. São Paulo:
Atlas, 2005.
.
34. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
34
DA JURISDIÇÃO
Tema 05
Objetivos:
Conhecer o que é jurisdição.
Demonstrar que a jurisdição possui como fim maior assegurar a
aplicação do direito positivo ao caso concreto.
Sabemos que o Estado para desempenhar sua função jurídica
necessita de se ater a duas ordens de atividades, que num primeiro
momento podem parecer distintas, mas ao se fazer uma análise
aprofundada verificamos estarem estas ordens de atividades intimamente
ligadas, são elas, respectivamente, a legislação e a jurisdição.
Sob este prisma, a primeira ordem que é a legislação, estabelece
as normas que regulam a vida em sociedade, ditando o que é licito e o que é
ilícito, atribuindo direitos e obrigações. Porém, são normas de caráter
genérico sem destinação a uma situação em concreto. Já a segunda ordem,
que é a jurisdição, que se caracteriza pela atuação do Estado com o intuito
de solucionar os conflitos de interesses, declara qual é o preceito que se
aplica ao caso concreto.
Vamos então à definição de jurisdição.
Definição de jurisdição
Juris + dictio = dizer o direito.
Muitos autores, para definir o que é jurisdição, levam em conta
apenas o significado literal da palavra, assim, para tentar defini-la,
apoiamos-nos em Coelho (2004, p. 180).
Pode-se considerar, num primeiro momento, que é a função do
Estado, concretizada pelo Poder Judiciário, de dizer o direito. A preocupação
do autor acima mencionado se dá por conta de ser tomado apenas o sentido
literal e nesse sentido a jurisdição abrangeria em tese apenas o processo de
conhecimento, o que não lhe daria total efetividade. Explica assim o Autor:
Isto ocorre em razão do processo de conhecimento estar
organizado para que o Poder Judiciário diga quem possui o
direito, enquanto que o processo de execução serve para a
satisfação do direito e o cautelar para assegurar,
resguardar os processos de execução e de conhecimento.
De qualquer modo a palavra jurisdição é utilizada para
35. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
representar a atividade do Poder Judiciário como um todo –
conhecimento, execução e cautelar. (2004, p. 180)
Boa parte da doutrina prefere conceituar a jurisdição da seguinte
forma: função do Estado, mediante a qual este se substitui aos titulares dos
interesses em conflito para, imparcialmente, buscar a pacificação do conflito
que os envolve com justiça. (GRINOVER et al. 2001, p. 131).
Jurisdição enquanto poder
A jurisdição, enquanto manifestação do poder estatal pode ser
conceituada como “a capacidade de decidir imperativamente e impor
decisões” (GRINOVER et. al. 2001, p. 131). Assim, a jurisdição gera um
poder de império, no qual as decisões, quando não acolhidas
espontaneamente, são impostas a fim de gerar eficácia atingindo sua
finalidade.
Jurisdição enquanto função
A jurisdição, como função do Estado representa de acordo com
a) poder – manifestação do imperium (autoridade, domínio) do
Estado, por qual do qual impõe e determina o cumprimento coativo (através
da força se necessário) de suas decisões;
b) função – atribuição própria dos órgãos jurisdicionais de
c) atividade – complexo de atos praticados no processo pelos
Várias são as características da jurisdição. Dentre essas Coelho
a) imparcialidade do juiz: o juiz como agente ou representante
b) inércia: como decorrência da adoção do principio da ação ou
da demanda é preciso acionar, movimentar o Poder Judiciário, pois seus
órgãos são inertes de acordo com os brocardos jurídicos que ilustramos
abaixo:
35
Coelho (2004, p. 181):
prestarem a tutela jurisdicional para que ocorra a pacificação social;
juízes e auxiliares como representantes do Estado.
Características da jurisdição.
(2004, p 181 e182) destaca as seguintes:
do Estado age de forma imparcial no processo;
Nemo judex sine actore = não há juiz sem autor
Ne procedat judex ex officio = o juiz não deve proceder de ofício
c) observância do contraditório: no exercício da atividade
jurisdicional do Estado está presente a possibilidade de contrariar,
contradizer, contestar o que foi alegado pela parte contrária. O contraditório
aqui se perfaz por dois elementos: (i) informação e (ii) reação.
36. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
36
d) coisa julgada e irrevogabilidade dos atos jurisdicionais
pelos outros poderes: a coisa julgada é definida em nosso direito como
sendo a eficácia que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais
sujeita a recurso;
e) atividade substitutiva: conforme Chiovenda apud (Coelho,
2004, p. 182), a jurisdição é:
a função do Estado que tem por escopo a atuação da
vontade concreta da lei por meio da substituição, pela
atividade dos órgãos públicos, da atividade de particulares
ou de outros órgãos públicos, já no afirmar a existência da
vontade da lei [processo de conhecimento], já no torná-la,
praticamente efetiva, [processo de execução]
f) atividade voltada para a solução de uma lide: a existência de
uma lide ou litígio corresponde ao conflito de interesses caracterizado por
uma pretensão resistida, é o fator que para Carnelutti identifica a jurisdição e
serve para diferenciá-la das demais funções estatais;
g) caráter público: essa característica decorre do fato da
jurisdição estar relacionada ao Estado e ser voltada para a satisfação dos
interesses públicos;
h) instrumental: a jurisdição é o instrumento para a realização do
direito material. Sua existência liga-se à suposta existência de uma relação
jurídica material, servindo para tornar efetivo os comandos normativos que
regulam os relacionamentos disciplinados pelo direito.
i) inafastabilidade ou indeclinabilidade: (art. 5º, XXXV da CF) a
lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de
direito. Assim, não há como afastar o controle jurisdicional e os juízes, por
outro lado, não podem declinar de suas atribuições, já que atuam em nome
do Estado e não para a satisfação de interesses pessoais.
j) presença do juiz natural: o juiz natural é aquele que se liga ao
litígio antes mesmo de sua ocorrência. Sua competência para solucionar
determinados tipos de conflitos é previamente estabelecida em lei.
l) territorialidade: a atividade de dizer o direito adere a
determinado território, consoante a idéias de soberania.
Estas são, portanto, as características da jurisdição apontadas por
Coelho (2004, p. 182), sem prejuízo de outras que podem ser apontadas por
outros doutrinadores. Visto suas características passamos ao estudo dos
seus fins.
Fins da Jurisdição
Fredie Didier Junior (2003, p. 39) nos apresenta os fins da
jurisdição. Segundo o autor a jurisdição encontra-se arrimada em três fins:
37. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
a) O escopo jurídico – atuação da vontade concreta da lei. A
jurisdição tem por fim primeiro, portanto, fazer com que se atinjam, em cada
caso concreto, os objetivos das normas de direito objetivo substancial. A
aplicação ou a realização do Direito objetivo não é uma atividade privativa ou
específica da jurisdição. Os particulares, quando cumprem a lei, realizam o
direito objetivo.
b) O escopo social – Promover o bem comum, com a pacificação
com justiça, pela eliminação dos conflitos além da consciência dos direitos
próprios e respeito aos alheios. Como forma de expressão de poder do
estado, deve canalizar fins do estado. Perceba que, aqui, o fim, é jurisdição
em si mesma, não das partes, pois ninguém seria ingênuo de afirmar que
alguém entra com uma ação condenatória contra outrem por interesses
altruístas.
c) O escopo político – Pelo qual o estado busca a afirmação de
seu poder, além da participação democrática (ação popular, ações coletivas,
presença de leigos nos juizados etc.) e a preservação do valor liberdade,
com a tutela das liberdades políticas por meio dos remédios constitucionais
(tutela constitucional da liberdade).
Princípios da Jurisdição
a) Princípio da Investidura: o Estado atua através de seus
órgãos. E assim sendo, somente os agentes políticos investidos do poder
estatal de aplicar o direito ao caso concreto é que podem exercer a
jurisdição.
A investidura se dá, em regra, por aprovação em concursos
públicos de títulos e conhecimento jurídico e, além desta via, a investidura
poderá ocorrer também, pela nomeação direta, por ato do chefe do Poder
Executivo, nos casos previstos em lei, de pessoas com prévia experiência e
notável saber jurídico.
Ex.: ingresso na magistratura pelo quinto constitucional ou
37
nomeação dos ministros dos tribunais superiores.
b) Princípio da aderência ao território: o exercício da jurisdição,
por força do princípio da territorialidade da Lei processual, esta atrelado a
uma prévia delimitação territorial. Grinover (2001, p. 138) leciona que por
existirem muitos juízes no mesmo país, distribuídos em comarcas, pode-se
daí inferir que “cada juiz só exerce a sua autoridade nos limites do território
sujeito por lei à sua jurisdição.”
c) Princípio da Indelegabilidade: Como a jurisdição é investida
após preenchimento de rigorosos critérios técnicos, como nos concursos
públicos, por exemplo, não podem os investidos na função delegar o ônus
que a própria Constituição lhe atribuiu com exclusividade.
d) Princípio da Inevitabilidade: a situação das partes (autor e
réu) será a de sujeição quanto ao decidido pelo órgão jurisdicional,
independentemente da vontade das partes ser contrária à decisão proferida
pelo Estado-juiz.
e) Princípio do juiz natural: apregoa que todos têm direito de
serem julgados por um juizo independente e imparcial, previsto como órgão
38. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
legalmente criado e instalado anteriormente ao surgimento da lide. Ë
diametralmente oposto aos Tribunais de Exceção. Ex. Tribunal de
Nuremberg, criado após a Segunda Guerra para julgamento dos delitos
praticados pelos nazistas.
38
ATIVIDADES
1. Como podemos definir o que é jurisdição?
2. Quais são as características da jurisdição?
3. O que representa o princípio da investidura para a jurisdição?
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria Geral do Processo. 10 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2005.
CINTRA, Antonio Carlos Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel;
GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 21 ed. São Paulo:
Malheiros, 2005.
SILVA, José Milton da. Teoria Geral do Processo. 2 ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2003
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
DIDIER JUNIOR, Fredie. Direito Processual Civil. 3 ed. São Paulo:
Salvador, 2003.
COELHO, Fábio Alexandre. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Juarez
de Oliveira. 2004.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil.
São Paulo: Malheiros, 2001. v.1
ROCHA, José de Albuquerque. Teoria Geral do Processo. 8 ed. São Paulo:
Atlas, 2005.
39. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
39
Tema 06
ESPÉCIES DE JURISDIÇÃO
Objetivo: Demonstrar que a jurisdição é una, mas sem prejuízo de sua
unidade, necessita ser classificada pelo critério de competência,
delimitando-se, assim, o que compete a cada órgão do judiciário no
tocante a aplicação do direito ao caso concreto.
Visto o que é jurisdição e após o estudo de suas características,
dos seus fins e dos seus princípios, passamos a estudar as espécies de
jurisdição. Não se pretende aqui discutir a unidade da jurisdição, mas
apenas classificá-la didaticamente para se compreender como um
determinado juiz torna-se competente para julgar um caso concreto.
Unidade da jurisdição
Frisando mais uma vez que a jurisdição é una Rocha (2005, p. 92)
nos lembra que
(...) quando falamos em espécies de jurisdição, temos em
vista não uma pluralidade de funções jurisdicionais, mas a
diversidade das matérias sobre as quais se exerce a
jurisdição, ou outras particularidades, que impõem a
repartição das atribuições jurisdicionais entre diferentes
órgãos, o que, contudo, não informa a tese de sua unidade,
vez que em todas essas situações a jurisdição é, sempre, a
mesma função soberana do Estado de dizer ou executar
coativamente o direito no caso concreto, em ultima
instância, e de modo definitivo e irrevogável.
Reforçando a unidade da jurisdição, que é resultado do fato de ser
esta uma atribuição fundamental do Estado exercida por ele em regime de
exclusividade significa, segundo Rocha (2005, p. 91), “que só o Estado a
exerce, através dos órgãos por ele instituídos, e que só esses órgãos podem
prestar o serviço público da justiça, com aquelas características de
criatividade, definitividade e irrevogabilidade.
No nosso sistema jurídico, o princípio da unidade da jurisdição
encontra-se expresso nos arts. 5º, incisos XXXV e XXXVII, art. 93 todos da
Constituição Federal. No ordenamento infraconstitucional este princípio está
insculpido no art. 345 do Código Penal. Vamos contextualizar o conteúdo
dos artigos mencionados:
40. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
40
ART. 5º XXXV e XXXVII CF
XXXV - a lei não excluirá
da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a
direito;
XXXVII - não haverá juízo
ou tribunal de exceção;
ART. 345 C P. Fazer
justiça pelas próprias
mãos, para satisfazer
pretensão, embora
legítima, salvo quando a
lei o permite:
Pena - detenção, de
quinze dias a um mês, ou
multa, além da pena
correspondente à
violência.
Desta forma, conforme nos explica Rocha (2005, p. 92) a
jurisdição embora seja unitária é realizada por meios dos diversos órgãos
jurisdicionais e de diversas formas. Por esta razão, ela pode ser classificada
por diferentes critérios. Vamos a cada um deles.
Jurisdição comum e jurisdição especial
A jurisdição comum, como leciona Rocha (2005, p. 92) é aquela
que tem caráter geral, portanto diz respeito à generalidade dos interesses
por tutelar. Ensina o autor que
À jurisdição comum cabe conhecer de todas as
controvérsias, excluídas apenas aquelas que a lei, reserva
às jurisdições especiais. A jurisdição comum só está
limitada no sentido negativo, pois conhece todas as causas,
menos as que são cometidas a outras jurisdições.
A jurisdição especial, ao contrário, é aquela que só conhece as
matérias que a lei expressamente assim reconhece. Ou seja, de acordo com
Rocha (2005, p.92), só opera em relação a certos interesses, tendo em vista
sua natureza, a qualidade de seus titulares etc.
A própria Constituição Federal dispõe sobre as justiças que
exercem a jurisdição especial e as justiças que exercem a jurisdição comum.
Entre as que exercem jurisdição especial estão:
• A Justiça Militar (artigos 122 a 124);
• A Justiça Eleitoral (artigos 118 a 121);
• A Justiça do Trabalho (artigos 111 a 117); e
• A Justiça Militar Estadual (artigo 125, § 3.º).
No âmbito da jurisdição comum estão:
• A Justiça Federal (artigos 106 a 110); e
• A Justiça Estadual Ordinária (artigos 125 e 126).
41. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
O princípio do duplo grau de
jurisdição indica a possibilidade de
revisão, por via de recurso, das
causas já julgadas pelo juiz de
primeira instância. (GRINOVER,
2005, p. 75)
41
Jurisdição penal e jurisdição civil
A classificação da atividade jurisdicional em civil e penal é de
cunho material. Apesar do direito material possuir vários ramos - Direito
Administrativo, Direito de Empresa, Direito Tributário, Direito Previdenciário
dentre outros - a tutela pode ser civil ou penal.
Rocha (2005, p. 93) esclarece que a jurisdição penal “cuida dos
conflitos disciplinados pelo direito penal comum e especial. É, pois, preposta
à atuação das normas penais, que se caracterizam por definirem os fatos
puníveis (crimes e contravenções) e lhes cominarem penas, que são as mais
graves das sanções.“
A jurisdição civil, por seu turno, define-se como diz o mesmo autor,
por exclusão da jurisdição penal. Para ele “tudo quanto não cabe na
jurisdição penal, por exclusão, é jurisdição civil. Tem, pois, por objeto, todas
as matérias que a lei não confia à jurisdição penal.” (ROCHA, 2005, p. 93)
Jurisdição superior e inferior
Grinover et al (2005, p. 155) mencionam que é próprio da natureza
humana o inconformismo perante as decisões desfavoráveis do judiciário.
Na maioria das vezes, a parte vencida quer nova oportunidade para
demonstrar suas razões e reivindicar novamente os seus direitos.
A classificação da jurisdição em superior e inferior se dá por conta
da posição verticalizada dos órgãos judiciários na estrutura organizacional
do Poder Judiciário. (ROCHA, 2005, p. 93)
Grinover et al (2005, p. 155) resumem em breves linhas essa
estrutura organizacional do Poder Judiciário. Ensinam eles que
Chama-se jurisdição inferior àquela exercida pelos juizes
que ordinariamente conhecem do processo desde o seu
início (competência originaria): trata-se na Justiça Estadual,
dos juizes de direito das comarcas distribuídas por todo o
Estado, inclusive comarca da Capital. E chama-se jurisdição
superior a exercida pelos órgãos a que cabem os recursos
contra as decisões proferidas pelos juizes inferiores. O
órgão máximo, na organização judiciária brasileira, e que
exerce a jurisdição em nível superior ao de todos os outros
juízes e tribunais é o Supremo Tribunal Federal.
Rocha (2005, p. 93) recorre a uma pirâmide para ilustrar o Poder
Judiciário, contendo na sua base os múltiplos órgãos do 1º grau e, no
vértice, os órgãos do 2º e às vezes, do 3º grau. Exemplificando:
1º Grau
← 2º e ou 3º
Grau
42. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
42
Esta divisão não possui conotação hierárquica, mas apenas
distribuição de trabalho conforme a competência de cada um desses órgãos.
E se dá por conta da observação do princípio do duplo grau de jurisdição.
Atenção, não podemos confundir instância com entrância. Vamos
traçar um paralelo e ver qual é a diferença entre ambas.
INSTÂNCIA ENTRÂNCIA
• GRAU DE JURISDIÇÃO • GRAU ADMINISTRATIVO DAS
COMARCAS E DA CARREIRA
DOS JUIZES ESTADUAIS E
MEMBROS DO MINISTÉRIO
PÚBLICO.
Jurisdição voluntária e jurisdição contenciosa
Vamos lembrar o
que é jurisdição?
Jurisdição é o poder exercido pelos órgãos
do Poder Judiciário com o intuito de
solucionar os conflitos de interesse.
Porém, como nos adverte Rocha (2005, p. 94), a jurisdição pode
exercer-se em face de um conflito ou não. Isto, porque muitas vezes aciona-se
o judiciário apenas para o reconhecimento de novas situações jurídicas.
Assim, necessário estabelecer o que jurisdição voluntária e o que
é jurisdição contenciosa. Comecemos pela jurisdição voluntária ou também
chamada de jurisdição graciosa.
Jurisdição Voluntária
Didier (2003, p. 50) conceitua a jurisdição voluntária como “a
atividade jurisdicional que integra a vontade das partes; sem a participação
do Estado-juiz, tal interesse não poderia ser tutelado. Aqui, o órgão judicial
atua como fiscalizador da produção de vontade.”
Assim, a jurisdição voluntária se dá, no dizer do autor, como uma
atividade integrativa e fiscalizadora, uma vez que, segundo o mesmo, há
determinados atos jurídicos dos particulares que se revestem de tal
importância, que os mesmos não poderiam se dar sem a participação do
Estado juiz.
A discussão que se coloca é que a doutrina costuma por não
considerar tais atos como jurisdicionais, considerando mais uma atividade
administrativa, ou seja, “uma espécie de administração pública de interesses
43. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
privados.” (DIDIER, 2003, p. 50). Contudo, o Código de Processo Civil –
CPC, fala em jurisdição voluntária no seu art. 1º:
Art. 1º. A jurisdição civil, contenciosa e voluntária, é exercida
pelos juízes, em todo território nacional, conforme as
disposições que este Código estabelece.
Didier (2003, p. 50-52) fornece argumentos para os que entendem
a jurisdição voluntária como administração publica de interesses privados e
para os que entendem a jurisdição voluntária como atividade jurisdicional.
Abaixo apresentamos os argumentos presentes na defesa da
43
jurisdição voluntária como administração pública dos interesses privados:
JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA COMO ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE INTERESSES
PRIVADOS
1) insuficiência de critério orgânico: não é por se tratar de atividades desenvolvidas pelo
juiz que poderiam ser consideradas jurisdicionais.
2) não atuação do direito: não se visa a atuação do direito ao caso concreto, mas sim a
constituição de situações jurídicas novas.
3) não haveria substitutividade: o magistrado se insere entre os participantes do negócio
jurídico, não os substituindo.
4) não existência de lide: não há lide e sim concurso de vontades.
5) interessados: como não há conflito, não haveria partes e sim interessados.
6) não haveria ação: pois esta consiste no poder de exercitar o judiciário
7) não há processo: não havendo ação, também não haveria processo e sim
procedimento.
8) não haveria produção de coisa julgada material: os atos em jurisdição voluntária só
produzem coisa julgada formal. O juiz nada declara com eficácia para fazer coisa julgada
material.
Na defesa da jurisdição voluntária como atividade jurisdicional
pesam os seguintes argumentos:
JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA COMO ATIVIDADE JURISDICIONAL
1) redação legal: o art. 1º do CPC fala em jurisdição voluntária.
2) outros escopos: a jurisdição possui outros escopos que não a simples atuação do
direito (que não lhe é característica exclusiva)
3) preventividade: a lide jamais poderia ser da essência da jurisdição, pois se assim o
fosse apenas as hipóteses de tutelas repressivas teriam esta qualidade. A jurisdição
voluntária possui certa natureza preventiva.
4) processo: a jurisdição voluntária se exerce por meio das formas processuais (petição
inicial; sentença etc), além do que não seria razoável defender-se a inexistência de relação
jurídica entre os interessados e o juiz.
5) coisa julgada: não se trata de critério diferenciador do ato jurisdicional, pois há
hipóteses de jurisdição contenciosa que não fazem coisa julgada material.
6) conceito processual de parte: não há parte em sentido substancial, porquanto não haja
conflito de interesse material. Mas parte é aquele que postula, daí ser inadmissível não ser
parte nesta situação.
7) substitutividade: o juiz intervém para assegurar a tutela de um interesse a que ele se
mantém estranho, como terceiro imparcial mantendo sua independência.
Antonio Carlos Marcato (2004, p. 22) leciona que não só o
judiciário exerce a administração pública de interesses privados, mas
44. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
também o tabelião ao lavrar uma escritura e a Junta Comercial quando
arquiva um contrato social estão realizando atos de jurisdição voluntária.
44
No que tange ao judiciário, a importância de certos institutos,
como o casamento, são por demais importantes e mesmo para a dissolução
amigável é necessário a participação do juiz como está previsto nos arts.
1.120 a 1.124 do CPC.
Jurisdição contenciosa
A jurisdição contenciosa, na lição de Coelho (2004, p. 191) “é a
exercida em função de um conflito, litígio, ou nas palavras de FRANCESCO
CARNELUTTI, de um conflito de interesses qualificado por uma pretensão
resistida.”. A doutrina costuma traçar um paralelo realçando as diferenças
entre a jurisdição voluntária e a jurisdição contenciosa, que transcrevemos
abaixo:
JURISDIÇÃO CONTENCIOSA JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA
Atividade jurisdicional Atividade administrativa
Composição de litigios Administração pública do direito privado
Bilateralidade da causa Unilateralidade da causa
Questionam-se os direitos ou obrigações
de outrem
Não se questionam obrigações ou
direitos de outrem
Envolve partes Envolve apenas interessados
Há contraditório ou possibilidade de
Não há contraditório
contraditório
Há jurisdição Não há jurisdição
Há ação Não há ação
Há processo Não há processo, mas apenas uma
medida administrativa
Legalidade estrita Não há obrigatoriedade de legalidade
estrita
Inter nolentes Inter volentes
Há coisa julgada Não há coisa julgada
Há revelia Não há revelia
Em regra, não há provas determinadas
de ofício
Qualquer prova pode ser determinada de
ofício
Fonte: Maximilianus Cláudio Américo Fuhrer (2002, p. 48)
Jurisdição de direito ou de equidade
Coelho (2004, p. 192) leciona que a jurisdição por equidade
encontra arrimo no disposto no art. 127 do CPC, que ora transcrevemos: “o
juiz só decidirá por equidade nos casos previstos em lei.” Explica o Autor
que decidir por equidade significa “decidir sem as limitações impostas pela
precisa regulamentação legal; é que as vezes o legislador renuncia a traçar
desde logo na lei a exata disciplina de determinados institutos”, fato, que
deixa uma grande margem para a individualização da norma pelos órgãos
jurisdicionais. Como exemplo o próprio autor trabalha três possibilidades: (i)
a fixação de alimentos – art. 1.694 do CC; (ii) a decisão na arbitragem – art.
11 da Lei n. 9.307/96; e a jurisdição voluntária – art. 1.109 do CPC.
45. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
45
ATIVIDADES
1. O que é jurisdição contenciosa?
2. O que é jurisdição voluntária?
3. O que é também conhecida a jurisdição voluntária?
4. Trace um paralelo realçando as diferenças entre jurisdição contenciosa e
jurisdição voluntária.
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria Geral do Processo. 10 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2005.
CINTRA, Antonio Carlos Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel;
GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 21 ed. São Paulo:
Malheiros, 2005.
SILVA, José Milton da. Teoria Geral do Processo. 2 ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2003.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
COELHO, Fábio Alexandre. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Juarez
de Oliveira. 2004.
DIDIER JUNIOR, Fredie. Direito Processual Civil. 3 ed. São Paulo:
Salvador, 2003.
FUHRER, Maximilianus, Cláudio Américo. Resumo de Processo Civil. 24
ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
MARCATO, Antonio Carlos. Procedimentos especiais. 10 ed. São Paulo:
Atlas, 2004.
ROCHA, José de Albuquerque. Teoria Geral do Processo. 8 ed. São Paulo:
Atlas, 2005.
46. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
46
Sistema de
freios e
contrapesos –
posicionamen
to adotado
pelos norte-americanos
para ressaltara
necessidade
de harmonia
e equilíbrio
entre os
poderes.
Tema 07
DO PODER JUDICIÁRIO
Objetivo: Apresentar o Poder Judiciário como um dos poderes
integrantes da clássica tripartição de Montesquieu, indicando os seus
órgãos e sua principal função.
Porque estudar o Poder
Judiciário na Teoria Geral do
Processo?
Um dos pressupostos para o reconhecimento do Estado
Democrático de Direito é a existência dos três poderes independentes e
harmônicos entre si: o Poder Executivo, o Poder Legislativo e o Poder
Judiciário.
Ou seja, o Poder Judiciário compõe juntamente com o Poder
Executivo e o Poder Legislativo os Poderes da União, de forma harmônica e
independente, conforme o disposto no texto constitucional (art. 2º, CF)
A importância de termos um Poder Judiciário independente e daí a
necessidade de um capítulo para estudá-lo em separado, reside no fato que
sua independência nos avaliza, principalmente, respeito aos direitos e
garantias fundamentais abrigados na Constituição Federal, uma vez que a
função típica do judiciário é a jurisdicional, garantindo-nos proteção até
mesmo contra atos dos demais poderes.
Do Poder Judiciário – uma breve visão.
Como já falamos a título de introdução, o Brasil, que se constitui
um Estado Democrático de Direito, adota a tripartição de poderes (Poder
Legislativo, Poder Executivo e Poder Judiciário).
Coelho (2004, p. 329) afirma que esta classificação é a adotada por
Montesquieu, segundo a qual “o poder do Estado é exercido pelo legislativo,
pelo Executivo e pelo Judiciário, a fim de afastar o arbítrio que decorreria de
sua concentração”. Este é o sistema de freios e contrapesos.
O art. 2º da Constituição Federal de 1988 dispõe:
“Art. 2º São Poderes da União, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o
Judiciário.”
47. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
47
Princípio da
inafastabilida
de da
jurisdição. Art.
5º, XXXV “a
lei não
excluirá da
apreciação do
Poder
Judiciário
lesão ou
ameaça de
Direito”.
De acordo com a forma esposada, o Judiciário tem como função
precípua a solução dos conflitos de interesses, além de assegurar os direitos
e garantias individuais e coletivos afirmados pela Constituição Federal. O
que não quer dizer que não possua outras funções, como veremos mais
adiante.
O Poder Judiciário e o princípio da inafastabilidade da
jurisdição.
A importância do Poder Judiciário encontra-se expressa na
disposição do art 5º, inc. XXXV, da Constituição, podendo-se daí extrair-se o
princípio da inafastabilidade da apreciação judiciária, como um direito e
garantia individual. É através do Poder Judiciário que se afirmam os direitos
fundamentais, importando a solução dos conflitos de interesses.
Coelho (2004, p.329) também adota a tese da importância do
Poder Judiciário ser ressaltada pela adoção do princípio da inafastabilidade
da jurisdição. Sobre o princípio da inafastabilidade da jurisdição o Autor
ensina que devemos nos atentar para dois aspectos. São eles:
1. No primeiro aspecto temos que a jurisdição é monopólio
do Estado.
Ao fazer tal afirmativa Coelho (2004, p. 329) faz um escorço
histórico sobre o período que a jurisdição não dependia do Estado. Narra ele
que:
Os senhores feudais tinham jurisdição dentro de seu feudo:
encontravam-se jurisdições feudais [senhores feudais] e
jurisdições baronais [barões].
Lembre-se que os donatários das Capitanias Hereditárias no
Brasil colonial dispunham da jurisdição civil e criminal nos
territórios de seu domínio.
No período monárquico brasileiro, tínhamos jurisdição
eclesiástica, especialmente em matéria de família, a qual
desapareceu com a separação entre Igreja e Estado.
Agora só existe jurisdição estatal, confiada a certos
funcionários, rodeados de certas garantias: os
magistrados. (grifo nosso).
2. No segundo aspecto temos que a jurisdição encontra-se
vinculada ao Poder Judiciário.
Quanto ao segundo aspecto o Autor relaciona-o à Revolução
Francesa, que segundo ele foi a responsável por se atribuir ao povo a
soberania, que é exercida pelo Estado, a quem incumbe, através do
judiciário, monopolizar a administração da justiça.
A possibilidade do Poder Judiciário exercer a missão de ser o
guardião das liberdades e direitos individuais ocorre através da
independência e imparcialidade, conforme esclarecem Grinover et. al.
48. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
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FUNÇÃO TÍPICA DO PODER
JUDICIÁRIO: SOLUÇÃO DOS
CONFLITOS DE INTERESSE
FUNÇÃO ATÍPICA DO PODER
JUDICIÁRIO – LEGISLAR SOBRE OS
SEUS REGIMENTOS INTERNOS
Art. 22.
Compete
privativamente à
União legislar
sobre:
I - direito civil,
comercial, penal,
processual,
eleitoral, agrário,
marítimo,
aeronáutico,
espacial e do
trabalho;
(2005, p. 171), daí a necessidade de se saber sobre as garantias e
prerrogativas inerentes a esse Poder.
Assim, além de estabelecer no seu art. 2º que “são Poderes da
União , independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o
Judiciário”, a Constituição Federal reservou ainda um capítulo próprio sobre
o Poder Judiciário (arts. 92 a 126).
Da unidade do Poder Judiciário
Conforme nos ensina Coelho (2004, 330) ao indicar quais são os
órgãos do judiciário, a Constituição menciona também os Tribunais e Juizes
do Estado, dando assim, uma idéia de unidade do Poder Judiciário. Desta
maneira, mesmo possuindo a justiça federal e a justiça estadual, nos não
podemos perder de vista que o Poder Judiciário é uno.
A própria Constituição Federal confirma o raciocínio da unidade do Poder
Judiciário ao dispor sobre a competência privativa da União para legislar
sobre matéria de direito seja material ou direito processual consoante o
disposto no seu art. 22, I.
Das funções do Poder Judiciário
Grinover et. al. (2005, p. 166)
consideram que o Poder Judiciário é uno,
bem como sua função precípua que é a
jurisdição. Contudo, ressalta que há de se
observar que nem toda atividade do Poder Judiciário é jurisdicional, porque
mesmo com a tripartição dos poderes não corresponde tamanha rigidez de
funções, pois o Executivo e o Judiciário também legislam, o Legislativo e o
Judiciário também administram, e o Executivo e o Legislativo também
julgam.
As outras funções que o judiciário
exerce são: a legislativa ao
elaborar a seus regimentos
internos, ligadas ao poder de
autogoverno, e a função
administrativa, também inerentes ao autogoverno.
Ressalta-se que essa autonomia e independência não são
absolutas, pois há que se respeitar às regras de equilíbrio expressa na teoria
dos freios e contrapesos, checks and balances, pela qual alguma
participação haverá de ter de um Poder no outro, por exemplo, a nomeação
do Ministro do Supremo Tribunal Federal é da competência do Chefe do
Poder Executivo, ou seja, exclusividade do Presidente da República, como
esclarece Dinamarco (2001, p. 359)
49. EAD UNITINS - TEORIA GERAL DO PROCESSO - FUNDAMENTOS E TÉCNICAS JUDICIÁRIAS
49
A independência do Poder Judiciário e suas garantias
Como já conversamos sobre a unidade do Poder Judiciário,
precisamos também falar sobre a sua independência.
Já falamos anteriormente que por possuir como função típica a
atividade jurisdicional, ao Poder Judiciário é devido a proteção dos direitos e
garantias fundamentais dispostos em nossa Constituição, bem como a
solução dos conflitos entre particulares.
Ocorre, que muitas vezes a solução desses conflitos envolve,
além do interesses entre particulares, os demais poderes, ou seja, os
Poderes Executivo e Legislativo. Assim, não fosse a independência do
Poder Judiciário, não haveria para nós, jurisdicionados nenhuma garantia
contra o arbítrio do Estado.
Desta forma, Coelho (2004, p. 331) leciona que para garantir essa
independência ao Poder Judiciário a ordem constitucional prevê duas ordens
de garantia (i) as primeiras que visam a proteger o Poder Judiciário dos
demais poderes; e (ii) as segundas que visam proteger os exercentes das
funções jurisdicionais.
As garantias do Poder Judiciário
A Constituição Federal cuidou de assegurar ao Poder Judiciário a
prerrogativa do autogoverno, assim o exercício das atividades
administrativas e normativas, voltadas para a auto-organização e auto-regulamentação
de suas atividades além de função do Poder Judiciário, vão
funcionar também como garantia de independência do mesmo.
Entre as hipóteses de auto-organização e auto-regulamentação
Coelho (2004, p. 332) destaca a autonomia administrativa e a autonomia
financeira, que ilustramos no quadro abaixo.
AUTONOMIA ADMNISTRATIVA AUTONOMIA FINANCEIRA
• Eleição dos órgãos de direção
dos tribunais;
• Elaboração dos regimentos
internos;
• Organização das secretarias,
serviços auxiliares e dos juízos
vinculados;
• Propor a criação de novas varas;
• Preencher os cargos necessários
à administração da justiça.
• Conceder licenças, férias e
afastamentos a seus membros.
• Elaboração de sua proposta
orçamentária e administração dos
seus recursos financeiros.
• A proposta orçamentária deverá
observar os limites impostos pela
Lei Complementar 101/2000 (LEI
DE RESPONSABILIDADE FISCAL)
– 6% da receita líquida da União
ou do Estado – arts. 19 e 20 da Lei
Complementar 101/2000
Além destas hipóteses, a Constituição Federal prevê, no
caso específico dos Tribunais Superiores (Supremo Tribunal Federal –