O Juicy Salif de Philippe Starck é um espremedor de limões cuja forma inusitada prioriza a função simbólica sobre a prática. Embora seja funcional para espremer limões, sua aparência futurista atrai mais atenção do que sua utilidade, servindo como símbolo do status e estilo de Starck.
Análise do espremedor de limões Juicy Salif, de Philippe Starck
1. INSTITUTO FEDERAL DE SANTA CATARINA
CURSO SUPERIOR DE TECNOLOGIA EM
DESIGN DE PRODUTO - III MÓDULO
Semiótica – Profª. Lurdete Cadorin Biava
Aluna: Nathanye Godinho
Análise do espremedor de limões Juicy Salif, de Philippe Starck; com
base nas bibliografias: LÖBACH, Bernd. Design Industrial: bases para a
configuração dos produtos; e ONO, Maristela Mitsuko. Design e cultura:
sintonia essencial.
A função do Juicy Salif
Quando observamos uma fotografia do espremedor de limões de
Philippe Starck (Figura 1), imaginamos que o artefato é imponente e misterioso
– imponência devido à vista que se tem de baixo para cima e, mistério pela
primeira imagem, que não nos revela com clareza a função prática do produto
–, devido às suas formas encaixadas na composição da imagem, que “deseja”
passar para o observador uma aparência capaz de valorizar ainda mais o
produto, para que o mesmo seja admirado e, possivelmente vendido. É
relativamente pequeno, sua altura é de 12cm, sua largura é de 4,5cm, é feito
de alumínio polido e, seu exterior remete ao futurismo ou ao zoomorfismo.
Podemos afirmar que a natureza de sua forma é aditiva, haja vista que há
elementos de morfologias diferentes compondo a forma; no caso, a “gota” do
espremedor unida aos três “pés”. O objeto possui formas agrupadas com
combinação (elementos arranjados e unidos, os quais não interferem entre si) e
integração, possuindo integridade das formas isoladas. Há uma transição entre
o tripé e o corpo principal (parte que é capaz de promover a espremedura do
limão). Seu estilo visual é composto também de simetria, simplicidade,
economia, ousadia, ênfase e pregnância da forma.
2. FIGURA 1 – Juicy Salif
Fonte: Apliancist (2007)
Ono (2006) e Löbach (2001) analisam as funções de produtos
juntamente com o contexto histórico, pois o mesmo é capaz de influenciar a
sociedade sobre o uso e a ideia que se tem do objeto, bem como o resultado
de sua configuração. No caso, o Juicy Salif, foi lançado no ano de 1990, cuja
época marcou as características dos produtos de Philippe, pois foi nesse
momento, nas décadas de 80 e 90, que estes ficaram conhecidos como a
“imagem” de Starck, muito mais do que peças de Design. A partir do momento
em que muitos observadores notam o espremedor, estes já podem associar a
imagem do objeto com a de Philippe Starck, como um símbolo que indica o
significado de que esta peça é ícone de Design. Os que não associam desta
forma, não possuem um repertório o qual é capaz de levar a essa
interpretação, e sim, a qualquer outra. O próprio designer em questão, admite
que, neste produto, predominam muito mais os signos que o objeto passa a ser
e ter, com uma imagem simbólica, do que a função prática propriamente dita.
Starck afirma que:
Certa vez, em um restaurante, eu tive essa visão de um
espremedor de limão em forma de lula e comecei a projetá-lo... e
quatro anos depois ele ficou famosíssimo. Mas para mim, é mais
uma micro-escultura simbólica que um objeto funcional. Seu
3. objetivo real não é espremer milhares de limões, mas permitir a um
recém-casado entabular conversa com a sogra... (CARMEL –
ARTHUR, 2000, p. 13).
Segundo Ono (2006, p.30), existem três funções interligadas em um
produto: as simbólicas, as de uso e as técnicas. As funções simbólicas são
ligadas a comportamentos e motivações psicológicas individuais ou partilhadas
pela coletividade, em que cada consumidor reage em função de um sistema de
valor próprio e de um sistema de referências sociais e culturais. As funções de
uso seriam as funções práticas, das quais formam a relação e a experiência
que o usuário tem com o desempenho do produto. Já as funções técnicas, que
dependem também do contexto sócio-cultural, compreendem os princípios e
elementos de construção de um objeto, respeitando certas normas, qualidade
de materiais, recursos tecnológicos, entre outros requisitos, que podem variar
conforme necessidades e exigências.
Quando Starck afirma que o produto é como uma “micro-escultura”
capaz de promover a tal conversa entre os observadores, ele quer dizer que a
aparência do objeto tem sua função estético/simbólica predominante. Esta
função evidente no produto é capaz de atrair o julgamento do observador ou
usuário, perante a aparência do objeto e pela classificação de status que o
mesmo pode promover, interferindo não só no uso e na percepção visual em si,
mas também em aspectos sociais e culturais dos indivíduos. Cardoso (2000, p.
186) afirma que, para Starck, o objeto deve ser encarado pelos designers não
simplesmente como um produto, mas como uma instância de tomada de
consciência de uma experiência de uso. Ainda, segundo Cardoso (2000), para
os críticos de Starck, os objetos projetados por ele são pouco funcionais, mas
ele certamente rebateria que todo objeto exerce bem mais do que uma única
função.
Para quem desconhece o Juicy Salif, à primeira vista, o mesmo pode
emitir um significado qualquer, que não seja o de ser um espremedor. Pois o
objeto não segue os padrões formais e usuais dos espremedores conhecidos
pela sociedade (arquétipos). Com uma vista mais aguçada, podemos associar
com o espremedor, a sua parte em forma de “gota”, pois a mesma possui um
4. arredondamento com uma textura que pode remeter aos espremedores
comuns. Porém, a função prática do Juicy Salif se limita a espremer com bom
desempenho, apenas limões; pois seu tamanho possibilita o encaixe da fruta.
Logo, se o usuário tentar espremer laranjas, por exemplo, haverá certa
dificuldade e causará muita sujeira.
Com base em Ono (2006), que analisa funções simbólicas de alguns
produtos, ponderando contextos culturais, podemos afirmar que, o fato de
haver a alteração “drástica” na forma do espremedor não é tão surpreendente
para a sociedade – mesmo tendo sua aparência inusitada –, pois o Juicy Salif
foi lançado em uma época que já sofrera por grandes transições e eram
evidentes e constantes os avanços tecnológicos. Porém, dependendo do local
em que seria inserido o lançamento deste objeto, poderia haver extrema
estranheza, rejeição ou descaso. Por exemplo, se o “colocássemos” na
sociedade na época da Antiguidade Clássica ou, hoje mesmo, em uma
sociedade com padrões estéticos incomuns e/ou com o desconhecimento de
que existe algum espremedor de frutas, um indivíduo poderia interpretar –
dependendo das suas experiências – o espremedor de qualquer outra maneira,
atribuindo uma outra utilidade.
Há certas polêmicas as quais dizem que Starck preocupa-se muito
mais com suas próprias preferências estéticas do que a dos usuários do
produto. Segundo Löbach (2001, p. 57), é preciso levar em conta as
necessidades do usuário na determinação das funções estéticas e simbólicas
dos produtos, para que haja maior probabilidade de o produto agradar ao seu
público-alvo. Mas a fama de Starck já era tão grande que os consumidores
associam a peça como um ícone de design, mas com valor simbólico, pois
remete o status (“posicionamento” perante a sociedade), pois normalmente
uma parcela pequena da sociedade tem acesso a esses objetos, devido –
principalmente ao custo normalmente elevado. A respeito da função simbólica,
Löbach afirma que um objeto tem função simbólica quando a espiritualidade do
homem é estimulada pela percepção deste objeto, ao estabelecer ligações com
suas experiências e sensações anteriores (LÖBACH, 2001, p. 64).
Podemos avaliar também a função prática com base em Löbach – que
separa as três funções (prática, estética e simbólica) –, do Juicy Salif, que pode
satisfazer a necessidade de espremer limões: sua parte superior possui uma
5. forma arredondada, a qual possibilita o encaixe de um limão cortado ao meio;
seu afunilamento permite que o líquido da fruta se direcione a um foco para
baixo; sua textura e tamanho são capazes de facilitar o atrito na fricção (com as
mãos) do limão no instrumento. O tamanho do limão encaixa-se quase que
perfeitamente na parte espremedora, facilitando também o encaixe da mão; a
qualidade e a leveza do material permitem praticidade e boa durabilidade; a
textura polida e lisa facilita a limpeza e remete à modernidade. Ainda, a altura
do objeto como um todo possibilita a inserção de um copo (ou recipiente
semelhante), no centro, entre os “pés” e em baixo do afunilamento; os três
“pés” do espremedor permitem a estabilidade em uma superfície plana, os
“pés” são os principais elementos que formam a altura do objeto e, são bem
distribuídos separadamente para que seja fácil a colocação e a remoção do
copo. Mas mesmo com estas funções práticas, com base em Ono (2006) e
Löbach (2001), podemos considerar que a função simbólica se sobressai no
produto em questão, juntamente com a função estética pela configuração
formal, de cor e textura. A função simbólica predomina no Juicy Salif, devido a
toda a influência psicológica, que provém e interfere no contexto social e
cultural.
Referências
APPLIANCIST. Acessories. http://www.appliancist.com/accessories/juicy-salif-
alessi-citrus-squeezer.html. Acesso em: 10 mai. 2011.
BENETIXT. Produto. Disponível em:
http://www.benedixt.com.br/produto.asp?UID=13964. Acesso em: 10 mai. 2011.
CARDOSO, Rafael D. Uma introdução à história do design. São Paulo:
Edgard Blücher. 2000.
CARMEL-ARTHUR, Judith. Philippe Starck. São Paulo: Cosac Naify, 2000.
LÖBACH, Bernd. Design Industrial: bases para a configuração dos
produtos. São Paulo: Edgard Blücher, 2001.
ONO, Maristela Mitsuko. Design e cultura: sintonia essencial. 1. ed. Curitiba:
Maristela Mitsuko Ono, 2006.