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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE SÃO
PAULO
LICENCIATURA EM GEOGRAFIA
HENRIQUE MACEDO JUSTINIANO
O CENTRO EDUCACIONAL UNIFICADO COMO UM FATOR DE
CENTRALIDADE DA PERIFERIA
SÃO PAULO – SP
2014
HENRIQUE MACEDO JUSTINIANO
O CENTRO EDUCACIONAL UNIFICADO COMO UM FATOR DE
CENTRALIDADE DA PERIFERIA
Monografia apresentada para a conclusão do curso de
Licenciatura em Geografia do Instituto Federal de Educação
Ciência e Tecnologia de São Paulo.
Colaboração: Professor Me. Marco Antonio Teixeira.
SÃO PAULO
2014
Para meus pais Seu Tião e Dona Léia.
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos familiares pelo suporte dado em diversos momentos para a conclusão do
curso. Alexandre e Adriana sempre juntos nas adversidades. Meus sobrinhos Gabriella e
Thiago por cederem o computador quando eu preciso.
Agradeço principalmente ao meu pai Sebastião Rodrigues Justiniano e minha mãe
Leacira Maria Macedo que fizeram e fazem ainda muitos esforços em suas vidas para darem o
máximo possível de bem estar para mim.
Agradeço ao Professor Rodrigo que em conversas no ano de 2009 me indicou o curso
de Geografia do Instituto Federal de São Paulo.
Agradeço ao CEU Pêra Marmelo e CEU Perus pelo acolhimento à pesquisa.
Agradeço a Leda, José Soró e Marcio que me cederam entrevistas significativas para a
pesquisa.
Agradeço aos professores do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia por
fazerem um curso de Geografia muito rico na visão crítica da sociedade em que vivemos,
sendo fundamental uma aula do Professor Fausto no ano de 2010 para a definição do tema de
pesquisa.
Por fim, agradeço a todos(as) amigos e amigas que tive o prazer de conversar durante
esse período do curso sobre os mais diversos assuntos. Galera do CA Estrabão- Gestão Bertha
Becker pela experiência interessante de articulação política. E claro agradecimento especial
pelas conversas filosóficas divertidas que ocorrem invariavelmente com a companheira Deise
Serra e com os camaradas Douglas Faria, Edson Silva da Rocha, Marcio Romeiro e
Regimarcio Pereira.
Os que moram
Do outro lado do muro
Nunca vão saber
O que se passa no subúrbio
Eles te consideram
Um plebeu repugnante
Eles te chamam
De garoto podre
Garotos Podres - Garoto Podre
Aqui não vejo nenhum clube poliesportivo
Pra molecada frequentar, nenhum incentivo
O investimento no lazer é muito escasso
O centro comunitário é um fracasso
Racionais MC’s - Fim de Semana no Parque
RESUMO
No ano de 2003, durante a gestão da prefeita Marta Suplicy (PT – 2001-2004), a
periferia da cidade de São Paulo obteve um novo equipamento público: o Centro Educacional
Unificado (CEU). Tal equipamento continha num mesmo espaço teatro, piscina, biblioteca,
quadra poliesportiva e sala de informática abertos não só aos alunos ali matriculados, como
também a toda a comunidade sendo alvo de uma grande disputa política na eleição do ano
seguinte, o presente trabalho pretende investigar o significado mais profundo que está contido
neste objeto técnico, que resistiu as gestões conservadoras de José Serra (PSDB – 2005-2006)
e Gilberto Kassab (DEM – 2006 - 2012); foi taxado de concreto pedagógico por um grande
jornal de São Paulo e nos faz questionar quanto à possível resolução da nossa Questão
Periférica e a emergência de uma Centralidade da Periferia.
Palavras- Chave : CEU; Questão periférica; centralidade da periferia; Marta Suplicy;
José Serra.
ABSTRACT
In 2003 during the administration of Mayor Marta Suplicy (PT - 2001-2004) to the
outskirts of São Paulo got a new public facility: Unified Education Center (CEU). Such
equipment contained in the same space theater, swimming pool, library, sports court,
computer room open not only to students enrolled there as well as the entire community.
Target of a major political dispute in the election the following year, this study aims to
investigate the deeper meaning that is contained in this technico object, which withstood the
conservative administrations of José Serra (PSDB - 2005-2006) and Gilberto Kassab (DEM -
2006 - 2012), was labeled a pedagogical concrete for a major newspaper in São Paulo and
makes us wonder about the possible resolution of our Issue Peripheral and the emergence of a
Centrality of the Periphery.
Key-words: CEU, peripheral issue, the centrality of the periphery, Marta Suplicy, José Serra.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................07
1 - O CEU - EM BUSCA DA TOTALIDADE.........................................................09
1.1 Reestruturação Urbana..................................................................................16
1.2 Verticalidades e horizontalidades..................................................................20
1.3 Amplificação Pública......................................................................................22
1.4 Cidade Educadora..........................................................................................24
1.5 Conselho Gestor..............................................................................................27
2 – A QUESTÃO PERIFÉRICA............................................................................30
2.1 Queixadas e o CEU Perus..............................................................................34
CONCLUSÃO – CENTRALIDADE DA PERIFERIA........................................36
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................38
APÊNDICE..............................................................................................................40
ANEXOS...................................................................................................................41
7
1 - Introdução
Quando seu objeto de investigação está indelevelmente ligado a sua formação e
construção de sua vida o pesquisador fica instado a vangloriar tal objeto. Porém a insatisfação
leva ao questionamento e assim questões diversas são levantadas para que se tenha uma
compreensão satisfatória do processo social, da luta política, das relações sociais, da
construção e identificação para com o território, palco no qual está colocado o objeto, e no
qual atuam os diversos atores sociais.
Instigado a investigar o porquê de um grande jornal de São Paulo taxar o Centro
Educacional Unificado (CEU) de “Concreto pedagógico”, passamos a investigar o debate
político por detrás de tal equipamento público, localizado em áreas marginalizadas da Cidade
de São Paulo, verdadeiros espaços esquecidos pelo Estado na área social.
Esta questão territorial dos CEUs também causa uma curiosidade epistemológica, no
sentindo de compreender o porquê de tal investimento em uma obra de grande porte,
verdadeiro monumento arquitetônico a contrastar com o entorno autoconstruído, em
localidades periféricas com baixo índice de desenvolvimento humano.
Fazer falar o território1
é uma questão central no trabalho do geógrafo. As disputas
sociais, econômicas, políticas e culturais possuem uma expressão e correlação fortemente
ligada ao território, à produção do espaço, sendo a Cidade de São Paulo dialeticamente
desenvolvida nas contradições que emergem de uma verdadeira disputa entre classes.
Postulamos que existe uma luta de classes, em todos os âmbitos acima citados, que
marca o território de forma ímpar. E o papel dos intelectuais exercido na construção de uma
hegemonia através da disputa política para a classe na qual exercem sua função também é um
ponto de interesse para o entendimento do que é o Projeto CEU.
Assim, a pesquisa é feita através da paixão no sentido gramsciano da palavra2
, na
busca de entender a formação periférica de São Paulo e as possíveis saídas para que tal
1
“Quando a gente faz falar o território – que é um trabalho que creio que é o nosso, fazer falar o território, como
os psicólogos fazem falar a alma, como Darcy Ribeiro quis fazer fala o povo, como Celso Furtado quis falar a
economia, o território também pode aparecer como uma voz... O território brasileiro é esquizofrênico, [...]
porque de um lado, recebendo esses insumos de modernização globalitária, ele se fragmenta, se fragiliza; de
outro lado, descobre que esse processo não lhe convém. E talvez lhe falte descobrir qual é a lógica mais geral
que permita a produção de um discurso novo. Primeiro acadêmico, quando possível também de mídia, e depois o
discurso político”(SANTOS in : Entrevista em Caros Amigos,1998).
2
“Paixão no sentido de Gramsci: o de colocar-se em uma posição e, mediante essa colocação e por causa dela,
tentar entender uma tragédia” (OLIVEIRA, 1987,p.9)
“Porque somente a paixão aguça o intelecto e ajuda a tornar mais clara a intuição” (GRAMSCI, 2005, in
SADER. p.35.).
8
periferia construa uma nova centralidade na qual o ser o humano seja o cerne da questão em
detrimento do lucro capitalista.
A busca pela totalidade do fenômeno se faz presente no primeiro capitulo, no qual é
debatido o processo político de execução do Projeto CEU, aas escolhas feitas, mudanças
ocorridas, etc. Uma análise dos conceitos ligados ao nosso objeto técnico também é necessária
para o entendimento das suas características de localização periférica e possível pólo de
desenvolvimento das comunidades na construção de uma Cidade Educadora.
Indo além, postulamos uma por nós chamada Questão Periférica. Por que a periferia
pobre e marginalizada tende a formar um bloco histórico3
com setores conservadores da
cidade de São Paulo? O Projeto CEU poderia ajudar a resolucionar a nossa chamada Questão
Periférica, ou é mesmo um mero concreto pedagógico sem utilidade alguma? Com ajuda do
depoimento de alguns atores sociais possíveis respostas emergem das contradições
apresentadas.
Caminhe conosco nessa investigação. Boa leitura!
3
Uma análise apurada do conceito de Bloco Histórico na obra de Antonio Gramsci pode ser encontrada em
PORTELLI, Hugues. Gramsci e o bloco histórico; tradução de Angelina Peralva. Rio de Janiero, Editora Paz e
Terra,1977
9
1 – O CEU – Em busca da totalidade.
Analisamos nosso objeto técnico, o Centro Educacional Unificado (CEU), através do
olhar do geógrafo Milton Santos e sua análise da forma, função, estrutura e processo, com
vistas a alcançar a totalidade. : “A forma nos apresenta a coisa, o objeto geográfico; sua
função atual nos leva ao processo que lhe deu origem; e este, o processo, nos conduz à
totalidade social, a estrutura social que desencadeou e dá ao objeto uma vida social”
(SANTOS,1988,p.7)
Entendemos que a forma se constitui no objeto técnico intitulado Centro Educacional
Unificado, que com sua arquitetura arrojada, causa um contraste impactante com as casas
autoconstruídas ao redor. Porém, o objeto em si não se explica, é preciso compreender o seu
fundamento dado através das relações sociais.
O objeto apresenta-se com a função de desenvolver o local, o lugar, assim sua forma
(arquitetura arrojada) possui uma função (desenvolvimento local). Devemos então
compreender a estrutura social no qual o equipamento está inserido, investigando o processo
social e suas mudanças produzidas no decorrer do tempo.
Assim, discorremos sobre este fenômeno social buscando abarcar sua totalidade:
Forma, função,estrutura e processo são quatro termos disjuntivos
associados, a empregar segundo um contexto do mundo de todo dia.
Tomados individualmente, representam apenas realidades parciais, limitadas,
do mundo.Considerados em conjunto, porém, e relacionados entre si, eles
constroem uma base teórica e metodológica a partir da qual podemos discutir
os fenômeno espaciais em totalidade. (SANTOS,1985,p. 52.).
E para buscar tal totalidade, percorremos os processos políticos envolvidos na
execução inicial do Projeto CEU, a historicidade da formação periférica da Cidade de São
Paulo, os conceitos por de trás da confecção do objeto técnico e por fim entrevistas com
aqueles que dão vida ao equipamento, os atores locais que possuem o território como abrigo:
Os atores locais tem o território como um abrigo, buscando
constantemente se adaptar ao meio geográfico local, ao mesmo tempo que
recriam estratégias que garantam sua sobrevivência nos lugares. É neste jogo
dialético que podemos recuperar a totalidade.(SANTOS,2004,p.261)
10
Os CEU’s se baseiam em experiências anteriores, tais como as “Escolas Parques” do
educador Anísio Teixeira na Bahia nos anos 1950, os CIEP’s (Centros Integrado de Educação
Pública) escolas de tempo integral construídas no Rio de Janeiro durante o governo de Leonel
Brizola (1983-1987), com apoio do educador Darcy Ribeiro, entre outras tentativas de
integrar educação, cultura e lazer num mesmo equipamento (PADILHA, 2004, p.29-30).
Um dos nossos entrevistados4
comenta sobre essa influência do CIEPs já nas
discussões sobre uma Cidade Educadora e a construção de equipamentos públicos com esta
concepção na época da Prefeita Luiza Erundina (1989-1992) e de Paulo Freire como
Secretário Municipal de Educação:
Tinha o aspecto de dar um choque na educação, e isso tem a ver
com a Fábrica e com o CEU também, porque essa ideia do CEU nasce lá
atrás via Paulo Freire, de uns encontros com o movimento de moradia da
zona leste. Eles eram metidos a pensar o lugar da educação como um lugar
educativo, e foram atrás do Paulo Freire pra discutir isso. E desenharam a
implantação do conjunto habitacional todo pensado como um lugar
educador, do jardim a casa, a praça, todo desenhando com o Paulo Freire. Ai
começa a nascer essa ideia do CEU acho assim, de um lugar que seja
integrador da comunidade, nascem dessas ideias ai. Mas eles não chegaram a
fazer o CEU, e todos eram fãs assim, apesar de estar em partidos diferentes ,
do Darcy Ribeiro e os CIEP's no Rio, mas não chegaram a fazer o CEU. José
Soró.
Assim, em 2002 na Gestão da Prefeita Marta Suplicy (2001-2004) o Projeto CEU se
apresenta como um pólo de desenvolvimento da comunidade, pela sua arquitetura arrojada e
fundamentalmente, por propor a integração de seus diversos setores. Seus espaços e
equipamentos abertos ao uso, não só dos alunos matriculados, mas também da comunidade
potencializam os princípios da Cidade Educadora, caracterizando-se como uma rede de
proteção social.
Isto demonstra o equívoco do jornal Estado de São Paulo, que em sua edição de
03/08/2003 ataca os CEUs, através de uma critica ao discurso5
do Presidente Luiz Inácio Lula
da Silva (PT), pronunciado na inauguração do CEU Jambeiro em Guaianazes no extremo leste
da capital paulista no dia 01/08/2003.
4
A íntegra das três entrevistas realizadas com Leda (Moradora da Vila Aurora e frequentadora do CEU Pêra
Marmelo, sendo também Presidente do Conselho Gestor), José Soró (morador de Perus e agente cultural do
bairro) e Marcio Bezerra ( morador de Perus e gestor do CEU Perus) encontram-se no anexo 1.
5
Confira a íntegra do discurso em http://www.biblioteca.presidencia.gov.br/ex-presidentes/luiz-inacio-lula-da-
silva/discursos/1o-mandato/pdfs-2003/2o-semestre/01-08-2003-discurso-do-presidente-da-republica-luiz-inacio-
lula-da-silva-na-cerimonia-da-inauguracao-do-centro-educacional-unificado-jambeiro/view. Acesso em
13/10/2014 , 23:15.
11
O Jornal no editorial “O CEU das elites”6
trabalha apenas sobre uma ótica
economicista, entendendo o Projeto CEU como um “Concreto pedagógico” , tratando os
alunos ali matriculados como os “eleitos” em detrimento dos demais alunos das escolas da
comunidade. Por falta de conhecimento, ou como coloca a Prefeita Marta Suplicy (PT)7
, no
mesmo Estado de S. Paulo do dia 06/08/2003, por um preconceito ideológico contra o CEU, o
Editorial do jornal deixa de citar as possibilidades criadas com o Projeto. Assim obtém uma
resposta da Prefeita Marta Suplicy, deixando claro os objetivos que os CEU’s possuem :
Os CEU’s são uma nova proposta pedagógica de educação inclusiva
e consistem em organizar toda a rede municipal nesse conceito. Assegurando
a todas as crianças do ensino fundamental uniforme e material escolar
gratuito : transporte para as que moram a mais de dois quilômetros da escola;
merenda de qualidade e acesso a computação, música e instrumentos
musicais, teatro, cinema e esportes, começando pelas regiões mais pobres da
cidade. Em algumas regiões, isso estará concentrado numa única construção,
como os CEUs que estão sendo inaugurados agora, assegurando como
rotatividade o acesso a esses espaços. Em outros bairros, criando espaços
semelhantes interligados com a rede escolar já existente. A comunidade
passa a ser co-gestora e participe do sistema. Juntos construiremos um outro
futuro se a reprodução recorrente da pobreza. Não fomos escolhidos para
perpetuar o sistema e a desigualdade social. Estamos fazendo uma revolução
na educação, rompendo com a lógica de 500 anos de exclusão.
(SUPLICY,2003,p.2).
A execução da obra possibilita que, de certa forma, um direito começa a efetivamente
se fazer presente aos excluídos da periferia, caracterizado por José de Souza Martins (2008)
como:
O direito justo dos pobres de terem acesso às promessas sociais e
revolucionárias do centro, do monumento e do monumental, do teatro, da
música erudita, da arte, dos museus, do propriamente urbano e do bem-estar
que ele anuncia e possibilita, aquilo que é propriamente emancipador do
homem. A falta desse acesso corrói o referencial crítico que possibilitaria a
um periférico fazer a crítica social e política do seu periferismo (MARTINS,
2008, p.55.)
Um dos nossos entrevistados também comenta esta visão do jornal que acaba por
contaminar até mesmo funcionários do equipamento:
E a gente pensa justamente o inverso, todo este complexo cultural,
esportivo é pra todas as escolas do entorno. É isto que a gente faz hoje, a
gente abre pra todas. Uma diretora daqui chegou a usar o seguinte termo
6
Confira o Editorial “O CEU das Elites” no acervo online do Jornal o Estado de S. Paulo no link :
http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/20030803-40101-nac-3-edi-a3-not acessado em 13/10/2014, 23:25.
7
Confira a resposta da Prefeita ao Editorial “O Ceu das Elites” no acervo online do Jornal o Estado de S. Paulo
no link : http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/20030806-40104-nac-2-opi-a2-not acessado em 13/10/2014,
23:30.
12
numa reunião, por isso que eu falo porque foi numa reunia aberta, “ - Pô
vocês tão abrindo o CEU desse jeito daqui a pouco o morro vai descer pra
cá” . Pô eu falei pra ela se o morro descer pra cá é isso que eu quero né!
(risos). Este complexo não é de vocês. O Gestor do CEU era um zelador de
condomínio das três unidades. E eles não perceberam até hoje a dimensão do
que é a concepção do CEU. Marcio
É interessante notar que construídos com êxito durante o governo da Prefeita Marta
Suplicy (2001-2004), do Partido dos Trabalhadores (PT), os 21 CEUs de sua gestão não se
fizeram como um “espetáculo da educação, em prol de um clientelismo político”, como
preconiza Reinaldo Tadeu Boscolo Pacheco (PACHECO, 2009), afinal a candidata petista a
reeleição foi derrotada nas urnas por José Serra (PSDB), que inicialmente, sendo coerente
com seu discurso eleitoral de que o projeto era caro, barrou a construção de outros 24 CEU's
já licitados, retornando-os ao final de seu primeiro ano de mandato (2005)8
, com algumas
mudanças no projeto (como por exemplo, a capacidade do teatro que foi reduzida de 450 para
180 pessoas.).
Em 2006 mais um fato político ocorreu na prefeitura de São Paulo, a saída de José
Serra (PSDB) para se candidatar ao governo do estado de São Paulo, tomando posse seu então
desconhecido vice-prefeito Gilberto Kassab (DEMOCRATAS- DEM)9
. Comparando através
da Tabela abaixo10
a votação da Prefeita Marta Suplicy nas eleições de 2000 (campanha
vitoriosa) e 2004 (campanha derrotada) com os locais de construção dos 21 CEUs entendemos
que a tese de clientelismo político não é válida.
Mas claro a derrota dela causa uma grande surpresa:
O CEU foi uma coisa tal impactante pra periferia que eu achava que a
Marta não perderia jamais a eleição. Na época tinha 21 CEUS construídos, a
Marta fez 21 teatros na periferia, 21 cinemas. E não é qualquer teatro, é uma
coisa de qualidade uma coisa boa, 11 anos depois você desce lá, ele ta lá
bonitinho. Não tinha como perder essa eleição, mas eleição se perde nos
detalhes (risos). Marcio.
Olha voltar à fase da Marta é difícil. Igual à Marta não tem, fiquei até
triste que ela não ganhou, pelo tanto que ela fez, mas voltar do jeito que era
ela é difícil. Leda
8
Serra decide retomar os CEUs veja : http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u115664.shtml
acessado em 14/10/2014 00:10.
9
Marta foi duramente criticada pelos valores dos 21 CEU’s, porém a dupla Serra/Kassab fez 24 mini-CEU’s,
mais simples, sem preocupação com a estética, com menores equipamentos, porém mais caros no seu custo final
como demonstra o link : http://blogdofavre.ig.com.br/2008/09/o-ceu-e-a-verdade/ acessado em 14/10/2014
00:30.
10
Tabela extraída do interessante trabalho “A derrota não explicada – Uma reflexão sobre a eleição municipal de
2004 em São Paulo” que busca explicações para a derrota nas urnas de uma Prefeita com 48% de ótimo e bom
na avaliação de sua gestão. Acessado no dia 11/10/2014 23:00 no link : http://www.bocc.ubi.pt/pag/paula-luiz-
eleicao-municipal.pdf . Sobre o papel da mídia e a administração municipal leia na época da Marta leia :
http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos/iq260220032.htm acesso em 14/10/2014 02:45.
13
Tabela11
com os votos de Marta Suplicy nas eleições de 2000 e 2004 :
11
Vide nota 10.
14
Analisando a tabela percebemos que Marta aumentou sua votação nos bairros do
Grajaú (CEU Navegantes e CEU Três Lagos), Guaianazes (CEU Jambeiro) São Mateus (CEU
São Mateus e CEU São Rafael) e Capela do Socorro ( CEU Cidade Dutra).
Nas demais localidades diminuiu sua votação: Cidade Ademar (CEU Alvarenga),
Capão Redondo (CEU Capão Redondo), Pirituba (CEU Pêra Marmelo e CEU Anhanguera),
Itaim Paulista (CEU Vila Curuça e CEU Parque Veredas), Brasilândia (CEU Paz),
Sapopemba (CEU Rosa Da China), São Miguel Paulista (CEU Parque São Carlos), Itaquera
(CEU Inácio Monteiro e CEU Aricanduva),Ipiranga (CEU Meninos), Butantã (CEU Butantã),
Campo Limpo (CEU Casa Blanca).
Apesar da derrota de uma força progressista, entendemos o Centro Educacional
Unificado como uma política de luta por hegemonia através da cultura, esporte e lazer
associados à educação em áreas até então esquecidas nestes itens pelo Estado, estabelecendo-
se assim uma luta pela democracia. E a guerra de posição neste contexto é travada nas áreas
periféricas, quase sempre cooptadas pelo conservadorismo.
Afinal, Aldo Tortorella12
diz sobre a Hegemonia que :
Para Gramsci, o grande mérito de Lênin é precisamente o de ter
compreendido, contra as degenerescências e simplificações economicistas e
deterministas, o extraordinário e decisivo valor da luta cultural e ideológica
para a afirmação das classes subalternas e de um novo sistema
econômico-social. Contudo, a ideia da hegemonia em Lênin — segundo a
interpretação de Gramsci — não deve ser entendida como afirmação de uma
dominação, mas como afirmação de uma capacidade superior de
interpretação da história e de solução dos problemas que ela coloca (grifo
nosso)
Quanto a guerra de posição Gramsci coloca no caderno 13 “Breves notas sobre a
política de Maquiavel” parágrafo 1713
que :
Se as crises históricas fundamentais são determinadas
imediatamente pelas crises econômicas; pode-se excluir que, por si mesmas,
as crises econômicas imediatas produzam eventos fundamentais; podem
apenas criar um terreno mais favorável à difusão de determinados modos de
pensar, de pôr e de resolver as questões que envolvem todo o curso
subsequente da vida estatal.
A história da formação das periferias de São Paulo denota o quão perverso é o regime
de acumulação do capital no Brasil. Deixados à margem das políticas do Estado, milhões de
pessoas foram excluídas do centro da cidade e de suas promessas culturais, sociais, ou seja, de
12
http://www.acessa.com/gramsci/texto_visualizar.php?mostrar_vocabulario=mostra&id=644 acesso em
14/10/2014 00:40.
13
Extraído de http://www.acessa.com/gramsci/texto_visualizar.php?mostrar_vocabulario=mostra&id=643
acessado em 17/10/2014 14:30
15
cidadania, sendo “exilados” nas longínquas periferias da cidade, sem mínima infraestrutura
adequada, se reproduzindo com o básico (em alguns casos abaixo do básico), aumentado
dessa forma a acumulação de capital.
Assim, em 2003, no processo de implementação dos CEUs esse contexto histórico foi
entendido de forma superior, sendo necessária a construção de alguma ferramenta para a
possível superação desse problema de segregação sócio espacial constituindo pela formação
das periferias. Essa ferramenta se materializa nos CEUs, espaços destinados a uma política de
integração da sociedade civil. Aqui, instala-se a necessidade da democracia política para que
coincida governantes e governados no mesmo processo dialógico.
A construção dessa democracia política se dá pelo poder através de uma ação de
classe, construindo-se uma contra hegemonia na sociedade. Exercido em conjunto através da
cultura, desmontando o intelectual orgânico da burguesia, criando o intelectual orgânico da
classe trabalhadora. Ocorre aqui uma apropriação da cultura de massa e uma resignificação
da mesma perpetrada pelos novos intelectuais orgânicos formados nessa nova agenda social
realizada através das possibilidades colocadas pelo instrumental contido nos CEUs.
Deve-se dessa forma aproveitar as condições materiais do nosso tempo, para produzir
outra forma política, utilizando por exemplo a internet como forma de disseminação da
informação e consequentemente da contradição presente no mundo, mote fundamental do
desenvolvimento histórico. E o território é a base dessa luta. Entendido como matriz da vida
social, econômica e política para a superação da contradição maior da sociedade brasileira
contida no desequilíbrio entre direitos e deveres na construção da cidadania. Isso se faz
possível porque no nosso tempo está contida a possibilidade de se conviver com o futuro
possível.
Apenas a visão da violência como forma de entendimento do mundo não capta o real
processo do movimento perpetrado de baixo para cima, pelas classes populares em suas mais
diferentes organizações e instrumentos de luta. O presente trabalho analisa a capacidade e o
potencial do Centro Educacional Unificado de funcionar como um forte instrumento pela
construção da democracia verdadeiramente participativa, na qual as decisões e processos
partam da base14
.
Assim a apropriação dessa ferramenta, transformando-a numa “esquina” da
comunidade, na qual os problemas sejam debatidos, e soluções sejam apresentadas significam
14
Os CEUs possuem o Conselho Gestor, local de debate das questões relativas ao uso dos equipamentos,
envolvendo representantes da comunidade (vide apêndice), dos professores, alunos e direção. Analisaremos
melhor esta questão no subcapítulo 1.5.
16
uma construção pela sociedade civil, no entendimento Grasmiciano do termo, de uma
necessária participação política.
Nas palavras dos nossos entrevistados fica claro que é essa “Esquina da Comunidade”:
Eu uso um termo que eu ouvi num curso que eu fiz, lá atrás o
arquiteto que planejou ele dizia que o CEU tem que ser a esquina do bairro,
o que é a esquina do bairro? Onde os movimentos sociais, a população, se
encontram pra debater. Ao invés de debater no boteco, vem aqui no CEU.
Por exemplo, hoje a noite vai ter a reunião do movimento da fábrica. De
manha teve na biblioteca o curso caminhos da UBS, na sala da UAB uma
reunião do conselho gestor de saúde Pirituba/ Perus e no teatro um evento
DST/AIDS, é isso a Esquina do Bairro todos os movimentos convergindo
pra cá e ele sendo ponto de efervescência de todos os movimentos populares.
Marcio.
A gente começou a fazer o baile, era um bailinho pequeno pouca
gente, a gente colocava mesinhas, mas cresceu tanto que hoje não cabe mais
mesinha, ai começou a vir gente de fora, do CEU Vila Atlântica e nos vamos
ao baile lá. Isso, e é bom que a gente conhece muita gente, é muito bom lhe
dar com o pessoal da melhor idade e tem também o artesanato, conseguimos
ai uma parceria com uma pessoa que estudou gerontologia, e visa o bem
estar dos idosos, ai com a gente ela vai ver essas questões de leis, estatuto do
idoso, estas coisas assim porque a gente tem muita dúvida, das leis, dos
direitos dos idosos. Eu já conhecia ela do tempo da Marta, mas ai no tempo
Serra/ Kassab ela foi posta de lado e ai ela voltou agora. Leda.
Por tanto no CEU, essa “esquina da comunidade”, a democracia deve ser debatida e
fortalecida para a evolução social do lugar perante o mundo. Como um projeto de larga
escala, o CEU possui uma gama enorme de conceitos por de trás da sua confecção. Vamos
analisar algum deles.
1.1- Reestruturação Urbana
O Projeto CEU, pela sua particularidade de localização periférica15
visa torna-se um
pólo de desenvolvimento das comunidades periféricas de São Paulo16
, baseado na
intersetorialidade, de forma que a cultura, educação, esporte e lazer se integrem constituindo-
se numa forte ferramenta para o desenvolvimento local e a participação popular.
Assim, pretende-se chegar a uma melhoria da qualidade de vida e um aumento da
justiça social através do desenvolvimento sócio espacial. Com sua arquitetura arrojada os
15
Vide mapa da localização dos CEUS por Diretoria de Ensino e uma tabela com os endereços de cada unidade
no anexo 2.
16
Sobre as condições sociais da Cidade de São Paulo acesse:
http://www9.prefeitura.sp.gov.br/sempla/mm/index.php?texto=corpo&tema_cod=5. Acesso em 17/10/2014
17:30.
17
CEUs se apresentam como projetores de uma possível mudança social positiva, não apenas
nas relações sociais, mas igualmente na espacialidade.
O lugar constitui-se como um espaço vivido17
, no qual as relações sociais estão
contidas de emoções, significados diversos, etc. Os CEUs pretendem-se como um espaço de
encontro para o fortalecimento dessas relações, necessárias para a construção da democracia
participativa, representada de forma maior pelo conselho gestor nos CEUs. Com a Operação
Urbana CEU o Governo Municipal agiu de forma a propiciar um ferramental para a
construção de tal democracia, minimizando a segregação espacial em relação à cultura,
educação etc.
A concepção dos CEUs está orientada para o futuro do desenvolvimento das regiões
no qual foi construído. A alternativa escolhida foi pela periferia. A derrota na eleição de 2004
promoveu mudanças na concepção do Projeto CEU pelo candidato vencedor José Serra
(PSDB)18
, baseado no Estado mínimo Neoliberal19
, o projeto inicial dos CEUs de participação
popular foi abandonado. A chegada ao poder em 2013 de Fernando Haddad (PT) retoma as
características originais baseadas na concepção de uma Cidade Educadora, de intervenção
urbana com vistas ao desenvolvimento igualitário da Cidade de São Paulo20
.
17
“O espaço vivido é o conjunto dos lugares de vida de um indivíduo. A casa, o lugar de trabalho, o itinerário de
um a outro local formam os componentes principais do espaço vivido.” (PONTUSCHKA,2007 p.314)
18
http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/20051210-40961-nac-53-cid-c1-not/ Acesso em 18/10/2014 04:50.
19
O Neoliberalismo privilegia o mercado em detrimento da intervenção Estatal nas áreas sociais.
20
Até 2016 a gestão de Fernando Haddad prometeu a construção de 20 novos CEUs, reutilizando equipamentos
já existentes como os Centros Esportivos subutilizados, com a construção das torres que compõem as
características originais do Projeto CEU, constituindo assim o Território CEU.
http://planejasampa.prefeitura.sp.gov.br/wpcontent/uploads/2014/10/EQP_141015_Audi%C3%AAncia_CPOP.p
df Acesso em 17/10/2014. 16:00.
18
Mapa da exclusão/inclusao – Distritos do Munícipio de São Paulo-200221
.
Para execução da Operação Urbana CEU, foram delimitados os locais com maior
vulnerabilidade social, baseados nos índices sintetizados no Mapa acima, no qual os locais em
vermelho possuem piores condições de qualidade de vida, desenvolvimento humano e
consequentemente menor autonomia dos indivíduos. Repare no mapa abaixo a localização dos
45 CEUs coincidindo com esses locais de maior vulnerabilidade.
21
Extraído de http://www9.prefeitura.sp.gov.br/sempla/mm/mapas/indice4_1.pdf Acessado em 18/10/2014
04:10.
19
45 CEUs - Centro Educacionais Unificados22
.
22
http://planejasampa.prefeitura.sp.gov.br/wp-content/uploads/2014/10/SME_CEU_CPOP15.10.pdf Acessado
em 18/10/2014 04:20.
20
1.2 - Verticalidades e Horizontalidades
O sistema econômico atual se impõe de forma vertical, delimitando lugares que
mandam e lugares de exclusão. Na cidade de São Paulo, em relação à cultura, educação, etc.,
os bairros centrais perpetram uma verticalidade de produção e acumulação de equipamentos
sócio-culturais que segregam espacialmente boa parte da população, “exilada” nas periferias
longínquas, tanto perante a distância, quanto à questão econômica. Afinal:
O processo de implantação de infra estrutura ocorre
descontinuamente, aos saltos, sendo que, quando acontece, cobre uma
grande área de uma só vez. E isto ocorre porque os investimentos feitos pelo
poder público em bairros de população de baixa renda dependem muito
mais de conjunturas políticas do que de um processo de
planejamento.”(BONDUKI, 1978, p.124)
Assim, para a construção de uma horizontalidade diversificada, pois contra
hegemônica a produção homogeneizadora dos lugares, os CEUs se apresentam como uma
importante ferramenta popular:
As horizontalidades, pois, além das racionalidades típicas das
verticalidades que as atravessam, admitem a presença de outras
racionalidades (chamadas de irracionalidades pelos que desejariam ver como
única a racionalidade hegemônica). Na verdade, são contra racionalidades,
isto é, formas de convivência e de regulação criadas a partir do próprio
território e que se mantêm nesse território a despeito da vontade de
unificação e homogeneização, características da racionalidade hegemônica
típica das verticalidades. A presença dessas verticalidades produz tendências
à fragmentação, com a constituição de alvéolos representativos de formas
específicas de ser horizontal a partir das particularidades. (SANTOS, 2000,
p.110.)
Comentando sobre o processo de participação na construção do CEU Perus um dos
nossos entrevistados coloca luz neste encontro das verticalidades e horizontalidades, ou seja,
da produção que vem de “cima” e as questões horizontais que circulam em “baixo” :
Como a gente já reivindicava um centro cultural há muitos anos, rolou
então essa coisa do CEU em Perus e começou o processo de participação das
pessoas a dizer como queria, que tipo de CEU queria... Eu acompanhava de
longe e pensava o seguinte, era a favor que você tem que montar algo que
quebre a lógica mórbida periférica, até brincava a gente lutou durante quase
quinze, vinte anos pelo centro cultural e de repente a gente ganha esse mega
monstro (risos). Pra alguns lugares isso foi tão espantoso, que a falta de
habilidade de quem estava na gestão com o entorno, transformou em elefante
branco, ou escola privilegiada, o CEU é sempre tido como uma puta escola
pelos seus recursos Mas enfim, eu achava o CEU muito correto como
política publica, muito mais talvez pelo aspecto cultural do que o
educacional, porque numa ideia de mudança da sociedade a gente tem que
reparar os direitos das pessoas, chegar com as condições, mas eu já tinha
uma concepção que era muito mais além disso, as pessoas não tinham boa
escola, não iam no teatro, não era só por que não tinham acesso ou custava
caro, nessa época trabalhando com pessoas de rua já tinha descoberto que o
21
repertório de universo imaginário das pessoas é fundamental, então uma
pessoa que nunca foi no teatro, ou qualquer outras manifestações artísticas,
não tem isso no seu cotidiano. Não faz parte. Ele não vai por que aquilo não
diz muito respeito a ele. Não faz parte do cotidiano dele, ele também não
estimula os filhos porque não tem esse repertório. Então pra mim é
necessário investir em cultura, porque ela potencializa o universo
imaginário das pessoas, enriquece. Jose Soró. (Grifo nosso)
Vista aérea do CEU Perus23
.
Vista aérea do CEU Pêra Marmelo24
.
23
https://www.google.com.br/search?q=Ceu+Perus&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ei=6mxZVNndPOX9sASJ
hoKgCA&ved=0CAcQ_AUoAg Acesso em 04/11/2014 22:20
24
https://www.google.com.br/search?q=Ceu+Pera+Marmelo&es_sm=93&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ei=P
25ZVPBq-JOxBLSdgrAB&ved=0CAkQ_AUoAg&biw=1280&bih=699 Acesso em 04/11/2014 22:25
22
É dessa forma, graças à esquizofrenia do espaço, no qual os lugares é que são o
mundo, pois o reproduzem de “... modos específicos, individuais, diversos. Eles são
singulares, mas são também globais, manifestações da totalidade-mundo, do qual são formas
particulares” (SANTOS,2000 p.112), que o cidadão, até então excluído das promessas do
centro, pode e deve apropriar-se dos CEUs para a constituição dessa horizontalidade
diversificada, instalando-se como um cidadão de sua Cidade, de seu Estado, do seu País:
Nas condições atuais, o cidadão do lugar pretende instalar-se também
como cidadão do mundo. A verdade, porém, é que o “mundo” não tem como
regular os lugares. Em conseqüência, a expressão cidadão do mundo torna-se
um voto, uma promessa, uma possibilidade distante. Como os atores globais
eficazes são em última análise, anti-homem e anticidadão, a possibilidade de
existência de um cidadão do mundo é condicionada pelas realidades
nacionais. Na verdade, o cidadão só o é (ou não o é) como cidadão de um
país. (SANTOS, 2000, p.113)
A cultura popular, pelas suas características específicas dos lugares em que é criada,
enraizada no território, produz uma contraordem. Os CEUs possuem possibilidades,
potencialidades de se constituírem como os enclaves de formação dessas “irracionalidades”,
pois contrárias a racionalidade dominante, produzindo-se assim uma nova hegemonia, na qual
a questão sociocultural como integradora e possibilitadora da destruição das desigualdades se
construa, pois “... a conformidade com a Razão Hegemônica é limitada, enquanto a produção
plural de “irracionalidades” é ilimitada. É somente a partir de tais irracionalidades que é
possível a ampliação da consciência” (SANTOS, 2000, p.115).
1.3 - Amplificação Pública
A mídia é conhecida como o quarto poder da república, pela sua característica de
contar os fatos e de certa forma transformá-los em verdade. Assim, as periferias de São Paulo
ficaram estigmatizadas como locais de violência, moradia de ladrões, traficantes, homicidas,
etc. A miséria tratada como espetáculo por programas como “Aqui Agora”, “Cidade Alerta”,
“Brasil Urgente”, “Polícia 24 horas”, entre outros, perpetuam as mais tristes e podres
caricaturas dos moradores dos bairros periféricos das grandes cidades.
A televisão não é como um livro, ou sequer como um jornal
impresso, cuja leitura podemos interromper, refazer, submeter a reflexões
demoradas. A dinâmica da imagem solicita respostas imediatas de quem a
ela está submetido. As reações são reflexas, rápidas. Esse mecanismo é
muito eficaz quando se trata de manter oculta a estrutura do texto ou a
concepção que está na base da disposição segundo a qual as imagens são
representadas. (ARBEX, 2008, p.13)
23
Será mesmo que a periferia é apenas violenta e desprovida de algum bem cultural de
valor universal ? 25
Faz-se, então, necessária a superação das imagens televisivas estereotipadas. Até
mesmo pelas universidades que costumam vir até a periferia com uma visão salvadora,
ignorando os conhecimentos que circulam por ali. Nosso entrevistado José Soró nos alerta
sobre isso ao comentar sobre as parcerias frustradas com a universidade:
Umas da primeiras conversas foi com a USP leste. Mas eles não
aguentaram, porque tem uma coisa complicada nessa relação com a
universidade, uma coisa vetorizada superior, tanto é que eles separavam
conhecimento popular e conhecimento acadêmico, eu falo não tem essa,
conhecimento é conhecimento, o que eles são ? São diferentes. A academia
é um vetor de conhecimento, um vetor com um jeito de organizar e
estabelecer conhecimento. Mas ao longo dos anos isso acabou gerando um
vetor de valor, deixando os outros conhecimentos desvalorizados. E isso não
é verdade. As pessoas aqui tem um grande conhecimento. E o desafio era
impor isso, mas a universidade não soube como lidar com isso, não saber
que papel assumir quando você não tem mais isso de chegou a salvação
(risos). Quando a gente começou a questionar queremos uma relação que
esses conhecimentos e capacidades daqui estejam integrados. Se não, não
rola. Uma relação de domino não rola. Eles não deram conta de achar um
lugar que não fosse esse de salvador. Foram embora, chegamos a
desenvolver um curso de capacitação cultural juntos, mas foram embora.
José Soró.
25
https://www.google.com.br/search?q=Sorria+voce+esta+sendo+manipulado&es_sm=93&source=lnms&tbm=i
sch&sa=X&ei=W29ZVOjnL-vjsATjzoJo&ved=0CAgQ_AUoAQ&biw=1280&bih=699 Acesso em 04/11/2014
22:35.
24
Porém as tentativas de parceria não cessaram. Está em curso atualmente o projeto da
Universidade Livre e Colaborativa com o Professor Euller Sandeville26
, tendo o CEU um
papel auxiliar no projeto:
Depois que o Marcio assumiu a gestão o CEU Perus virou uma
espécie de lugar que a gente tem todas as condições e tal, mas ela continua
circulando, tem aula em igrejas, casas, escolas, na Quilombaque, na praça,
enfim. Ela mantém esse espírito pra não permitir o predomínio de uma
lógica funcional. E entendendo que o conhecimento, ele não é só um pedaço
do discurso, da retórica, ele é toda uma experiência. Porque isso vindo aqui
as pessoas participando de almoço comunitário, quebrando barro, aula na
casa de não sei o quem. Então a ideia da Universidade é um aprendizado
integral. Enriquecendo seu repertório afetivo vivencial. Ai cada aula é
diferente, não existe uma igual a outra. José Soró.
Dessa forma, os CEUs se apresentam como holofotes a apontar novos
caminhos,abrindo espaços para as diversas experiências do seu entorno, desmitificando-se a
estigmatização das periferias, propiciando assim a “Amplificação Pública” (SOUZA, 2010,
p.111), ou seja, outra visão desses lugares até então estigmatizados pela violência e carência
material, pois pelas características do Projeto CEU, as questões político-sociais que afetam
tais áreas estão associadas às matérias produzidas sobre os CEUs, e consequentemente as
resoluções apontadas pela cultura popular imbricada e produzidas dentro do equipamento
social. Além disso, com a emergência das redes sociais essa amplificação pública se faz maior
e melhor, pois é executada sem a visão, algumas vezes distorcida, dos intermediários
midiáticos comprometidos com a ideologia mercadológica dominante.
1.4 Cidade Educadora
A construção de uma Cidade Educadora está atrelada a ação estatal. O Projeto CEU
está imbricado à constituição de uma Cidade Educadora, na qual a escola torna-se um espaço
comunitário e a cidade um grande espaço educador para que se possa aprender na cidade, com
a cidade e com as pessoas, valorizando o aprendizado vivencial. Um dos princípios
norteadores do Projeto CEU é a constituição de uma Cidade Educadora27
·: “A Cidade
Educadora é um complexo em constante evolução e pode ter expressões diversas, mas sempre
considerará como uma de suas prioridades o investimento cultural e a formação permanente
de sua população” (GADOTTI, 2004 p. 12).
26
http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?metodo=apresentar&id=K4792295T9 Curriculum
Lattes do Professor Euller Sandeville. Acesso em 02/11/2014 19:40.
27
Veja alguns elementos que você pode encontrar em uma Cidade Educadora:
http://educacaointegral.org.br/noticias/19-elementos-que-voce-pode-encontrar-em-uma-cidade-educadora/.
Acessado em 16/10/2014. 02:05.
25
Vivemos uma tensão global-local, no qual existe uma racionalidade dominante
vinculada ao capital que produz o espaço de forma a atender seus interesses. A periferia
pobre, excluída, acaba por se constituir como um produto dessa produção do espaço, não
sendo uma exclusividade brasileira:
Em geral, é na periferia que também se encontram os bolsões de
extrema pobreza (favelas brasileiras, villas miséria na Argentina,
callampas chilenas, precaritas mexicanas etc.), que foram se construindo a
partir das migrações rurais- urbanas da década de 1950, dando lugar à
conformação dos assentamentos irregulares que cresceram enormemente
entre os anos 1960-1970, e que desde os anos 1980, são a expressão de uma
sociedade informal fortemente definida, cuja característica é o
congestionamento domiciliar e a carência de serviços urbanos e péssima
qualidade de vida (GADOTTI, 2004 p. 18-19.) Grifo nosso.
Com uma diminuição da intervenção social do Estado, a produção do espaço ocorre
desregradamente, porém compreendemos que no caso da acumulação capitalista que se deu
no Brasil pós década de 1950, esse desregramento foi planejado, ou seja, ficou a cargo única e
exclusivamente da classe trabalhadora buscar meios para se reproduzir, sendo a
autoconstrução a principal saída para a resolução do problema da moradia.
Assim, pelas particularidades do local (baixa renda, consequentemente menor
mobilidade urbana) seus moradores perdem um contato maior com a Cidade, porém caso
ocorra um reconhecimento histórico28
do seu entorno, cria-se uma sensação de pertencimento
interessante:
A possibilidade de poder nos reconhecer historicamente em nosso
próprio entorno físico e social cria um caráter ativo de identidade cultural.
Devemos pensar, então, a cidade como totalidade complexa, que é
necessário recuperar como espaço público de discussão e realização,
fortalecendo assim o desenvolvimento de experiências culturais através do
exercício da Cidadania.(GADOTTI, 2004, p.24-25).
Realizado em Barcelona, em novembro de 1990, o primeiro Congresso Internacional
de Cidades Educadoras fez uma carta que continha os princípios básicos para definir um
modelo progressista de cidade.
Assim, a “força do lugar” se faz presente, encampadas por políticas publicas
executadas pelos municípios, tornando-se o motor da construção das Cidades Educadoras:
No lugar- um cotidiano compartido entre as mais diversas pessoas,
firmas e instituições – cooperação e conflito são a base da vida em comum.
28
“Cada grupo de pessoas percorre apenas pequenos setores das cidades quando realiza suas tarefas habituais.
Talvez por isso, se perca a experiência do urbano, enfraquecendo os laços de solidariedade e a ideia de
pertencimento” (GADDOTTI, 2004 p.21).
26
Porque cada um exerce uma ação própria, a vida social se individualiza; e
porque a contiguidade é criadora de comunhão, a política se territorializa,
com o confronto entre organização e espontaneidade. O lugar é o quadro de
uma referência pragmática ao mundo, do qual lhe vem solicitações e ordens
precisas de ações condicionadas, mas é também o teatro insubstituível das
paixões humanas, responsáveis, por meio da ação comunicativa, pelas mais
diversas manifestações da espontaneidade e da criatividade.” (SANTOS,
2012, p.322.).
Portanto cabe:
Aos Municípios desenvolver com eficiência as competências que
lhes correspondem em matéria de educação pelo qual devem organizar uma
política educativa ampla e de alcance global, de maneira a incluir nela todas
as modalidades de educação formal e não formal assim como as diversas
manifestações culturais (GADOTTI, 2004, p. 29).
As cidades são reconhecidas como verdadeiros espaços de aprendizagem e a educação
possui um papel de assumir e compreender a diversidade:
A educação tem que assumir a difícil tarefa de compreender e aceitar
a diversidade, já que esta potencializa o enriquecimento entre os indivíduos e
os grupos humanos, e evitar que esta se converta em fator de exclusão social.
Para isso é necessário gerar os espaços de encontros e de
integração”(GADOTTI, 2004, p.31).Grifo nosso
Entendemos os CEUs como um desses espaços de encontros e de integração, numa
“Esquina da Comunidade”. No escopo da cultura popular urbana, as esquinas são pontos de
encontro de fundamental importância, possuindo quase sempre um bar, no qual se discute os
mais variados assuntos (futebol, trabalho, política29
, religião, etc.), ou seja, a “Esquina da
Comunidade” está intrinsecamente vinculada à produção de cultura popular, sendo, portanto
interessante esta visão do equipamento CEU, pois durante a Gestão Kassab o mesmo foi
esvaziado30
, afinal era visto apenas como um local de entretenimento, visão da qual não
compartilhamos, pois a cidade já possui diversos espaços privados que funcionam sobre esta
ótica, como os Shooping’s. Portanto o CEU, “Esquina da Comunidade”, objeto técnico
capaz de alavancar a revanche da cultura popular, desde que devidamente apropriado, deve
ser entendido como produtor de uma pedagogia urbana:
29
Veja que interessante a fala de Frei Chico irmão do ex presidente Luís Inácio Lula da Silva (2003-2009) sobre
a importância do Bar da Rosa nas articulações políticas em
http://docverdade.blogspot.com.br/2011/03/presidentes-da-america-latina-brasil.html. Acessado no dia
16/10/2014 04:20.
30
http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,publico-de-eventos-dos-ceus-cai-42-na-gestao-kassab,365064
Acessado em 16/10/2014 03:42.
27
“As contribuições da pedagogia urbana mais significativas são as
seguintes:
1 – Ampliação do campo de ação pedagógica.
2 – Construção de valores democrático-participativos.
3 – Ressignificação da cidadania: de objetos urbanos a sujeitos.
4 – Multiplicação de redes educativas e culturais.” (GADOTTI, 2004, p.
35)”
Sobre o esvaziamento do CEU nas gestões Serra/ Kassab leia o diálogo com Leda :
Henrique- Mas ai mudou o governo, você notou diferença? Você reparou
diferença de Marta pra Serra /Kassab?
Leda – Deu muita diferença, foi o Kassab que venho depois?
Henrique - Venho o Serra ele ficou um ano e pouco ai entrou o Kassab,
porque o Serra foi ser candidato ao governo.
Leda - Isso ele abandonou né. Então, mas ai piorou muito. Deu uma caída
boa o CEU, porque no tempo dela era muito bom. Eu lembro que tinha
muito teatro, tinha teatro pra adulto, e teatro infantil eu ia aos dois porque eu
gosto de teatro, participava dos dois, tinha peças boas, depois do Serra caiu
muito o CEU.
E com Marcio :
Marcio - E a população se apropriou porque ela sabia na gestão
Marta, eu acompanhava, frequentava o CEU direto, que toda sexta e sábado
a noite tinha um filme, que todo mês um sábado tinha uma peça de teatro.
Criou um hábito. Tem um rapaz aqui do lado o Mario que ele falava “ –Eu
sabia que toda sexta ou sábado eu podia ir lá que tinha um filme, mas
quando o Serra/ Kassab entrou acabou com isso”. Isso daqui virou um
condomínio fechado. Eu conto umas historias aqui e passo por mentiroso
cara, mas é verdade. No primeiro mês que entrei aqui, eu recebi uma
denúncia de uma pessoa do Recanto dos Humildes que tava lendo e foi
expulso da biblioteca. Eu falei vem cá me conta esta historia direito. Ele
falou eu sou casado e tenho filho pequeno, eu gosto de ler, e o único lugar
que eu consigo ler tranquilo é aqui na biblioteca, e nesse dia me tiraram da
biblioteca eu tava lendo, não sei por que falaram que ia ter um evento. Ai
chamei à bibliotecária e perguntei por que tiraram o rapaz da biblioteca? Ela
falou que toda última sexta feira do mês a Natura faz uma exposição na
biblioteca pra vender produtos!
Henrique- Apropriação privada do bem público!
Marcio - Isso. Era isso que acontecia. Isso daqui foi
desmantelado.Grifos nosso.
1.5 - Conselho Gestor
Nosso país possui uma democracia nova. E seu passado autoritário ecoa forte nos
atuais tempos, pois apesar da pressão popular, a transição foi arquitetada por cima com a
eleição indireta de Tancredo Neves na década de 1980 pelo colégio eleitoral. Porém, José
28
Sarney, advindo das fileiras da ditadura assume a presidência após a morte de Tancredo,
promovendo uma distribuição nada democrática de transmissoras de rádio e televisão a
políticos em troca de apoio. Manteve-se assim uma tradição autoritária na execução das
políticas públicas. Algumas instituições, como a Polícia Militar não se democratizaram,
atuando ainda sobre a ótica ditatorial do inimigo interno, tratando a sociedade civil, e
principalmente aqueles que reivindicam melhores condições de vida, com forte truculência.
Por isso, enquanto instituição nova, a proposta intersetorial dos CEUs é importante
para a construção e fortalecimento da democracia, pois abrangem diversas áreas tais como
meio ambiente, educação, emprego e renda, participação popular, desenvolvimento local,
saúde, cultura, esporte e lazer, afirmando-se dessa forma como um espaço de afirmação de
direitos e de promoção da cidadania, como coloca o Decreto de Regulamentação dos
Conselhos Gestores:
1° O Conselho constituir-se-á em instância permanente de debate e de
articulação entre os vários equipamentos que integram o CEU, tendo em
vista o atendimento das necessidades comuns e a solução dos conflitos que
possam interferir em seu funcionamento (DECRETO Nº 50.738, de 15 de
Julho de 2009)
Assim, a participação no Conselho Gestor da população torna possível uma melhor
construção dessa proposta intersetorial, pois as demandas são colocadas, debatidas,
construindo-se soluções conjuntas para os problemas específicos de cada CEU. A construção
desse espaço comunitário atua como princípio da Cidade Educadora. E para a constituição de
uma tradição democrática de participação é necessário que :
Os governos locais possuam mecanismos institucionais adequados
que deem a um número representativo de cidadãos a possibilidade de intervir
no planejamento urbano e na construção de políticas públicas necessárias
para o planejamento da cidade presente e futura. E nós cidadãos devemos
aprender a participar ativamente na conquista e construção das nossas
cidades.(GADOTTI, 2004 p.33)
Identificamos na fala dos nossos entrevistados alguns problemas com o Conselho
Gestor :
Acho que falta participação da comunidade, é fácil chegar e
reclamar, mas a comunidade não ta participando, só tá indo eu e a Maria, eu
sozinha é difícil, agora o conselho tá mais formado por professores, lógico
que eles vem o lado deles, mas acho que a comunidade ta perdendo com
isso, ninguém quer se envolver ninguém quer dar a cara a tapa pra mim
sozinho é difícil.Leda
Conseguimos eleger um conselho gestor só no meio do ano, mas
mesmo assim ele não é um conselho gestor participativo pleno, mas isso daí
29
é outra coisa que a gente vai retomar aos poucos a participação no conselho.
As pessoas tão retornando a participar agora do CEU, é uma coisa lenta, a
gente quer que se apresse, mas é lento, mas tá voltando a participação.É uma
coisa legal isso. Marcio
A política adotada durante oito anos pelas gestões Serra/Kassab (2005-2012)
promoveu um esvaziamento intencional do debate político dentro do CEU, tornando o
Conselho Gestor um órgão esvaziado, apesar da sua grande importância. Porém, acreditamos
assim como nosso entrevistado José Soró, que a questão da autonomia do CEU como um todo
acaba por influenciar na participação, pois o Conselho Gestor fica preso a esta dependência de
decisões externas, sendo, portanto, em nossa visão mais um instrumento consultivo do que
deliberativo:
Olha, eu tava pensando nisso hoje, você me cutucou. Fiquei pensando
em como pode ser um desenho viável pro CEU, por que ele fica preso na
própria lógica dele, forma dele, e não se potencializa no que foi pensando
nele como política pública, não materializa aquilo que se esperava dele
enquanto força dinâmica. Há que se pensar, acho que os CEUs deveriam ser
organismos autônomos, inclusive do ponto de vista orçamentário. Ai a
gestão integrada teria o papel de construir projetos próprios de características
locais, de cada região. Mas não tendo isso não cumpre esse papel. Mesmo a
gestão Haddad, que eu respeito, neste aspecto não oferece nenhuma
esperança que vai mudar esse enquadramento. José Soró.
Após esta breve análise desses instrumentais vinculados ao Projeto CEU ficamos
instados a propor que tal equipamento pode contribuir para a resolução daquilo que
chamamos de Questão Periférica, possibilitando a construção de uma Centralidade da
Periferia. Desenvolveremos esta tese no próximo capítulo.
30
2 - A Questão Periférica
“Todos os homens são intelectuais, poder-se-ia dizer então:
mas nem todos os homens desempenham na sociedade a função de
intelectuais”
Antonio Gramsci, Os intelectuais e a organização da cultura.
Após a análise da concepção do Projeto CEU, fica a questão: será que tal equipamento
é capaz de resolver nossa Questão Periférica, permitindo a construção de uma Centralidade
da Periferia. Devemos entender primeiramente o que seria esta Questão Periférica.
O Comunista italiano Antonio Gramsci (1891-1937) se questionava quanto a Questão
Meridional verificada em sua terra natal:
Afirmamos que o camponês meridional esta ligado ao grande
proprietário rural por meio do intelectual. Este tipo de organização é o mais
difundido em todo o Mezzogiorno e na Sicília. Forma um monstruoso bloco
agrário que no seu conjunto funciona como intermediário e guardião do
capitalismo setentrional e dos grandes bancos. Seu único objetivo é
conservar o status quo.(GRAMSCI in : SINGER,2002 p.9)
Intrigava o comunista italiano o fato dos camponeses pobres do Sul formarem um
grande bloco histórico ligado aos grandes proprietários, protegendo o capitalismo dos grandes
bancos do norte da Itália, mantendo um status quo que era prejudicial a tais camponeses.
Como citado acima o papel dos intelectuais nessa composição era fundamental.
No Brasil, André Singer, em sua análise quanto aos Sentidos do Lulismo,31
investiga a
possível resolução daquilo que ele chama de Questão Setentrional, na qual dessa vez ocorre
um deslocamento das massas rurais exploradas, principalmente no Nordeste brasileiro, que até
2006 estavam ligadas aos grandes proprietários rurais, representados em nossa democracia no
antigo PFL (Partido da Frente Liberal) - atual DEMOCRATAS - para o Lulismo. Tais massas
beneficiadas pelas políticas públicas do primeiro mandato de Luis Inácio Lula da Silva (2003-
2006), tais como o Bolsa Família, Crédito Rural, Luz para todos, fortalecimento do salário
mínimo, entre outras fazem tal deslocamento de apoio, consagrando Lula com um segundo
mandato em 2006.
31
SINGER, André Vitor. Os Sentidos do Lulismo: reforma gradual e pacto conservador. 1ed. São Paulo. Cia das
Letras,2002.
31
Entendemos então, que o CEU como ferramenta construtora de intelectuais orgânicos
pode promover a resolução da Questão Periférica colocada da seguinte forma: Por que as
massas periféricas da Cidade de São Paulo tendem a se alinhar a um conservadorismo
direitista que invariavelmente tende a prejudicar tais classes? Pois tal visão de mundo não
está preocupada em buscar resoluções para as desigualdades sociais, além de atuar de forma a
barrar atitudes que tem esse objetivo, como é o caso da descaracterização promovida nos
CEUs construídos nas Gestões Serra/Kassab32
.
O nosso entrevistado Marcio conta uma história interessante da visão de Serra sobre os
CEUs:
Tem uma piada, não sei se é piada ou se é verídico33
. Dizem que o
Serra quando assumiu, reuniu seus secretários e falou:
“-Vou fechar os CEUS”.
Ai o pessoal saiu foi pros bairros que tinha CEU :
“-Serra é bom não fechar”.
Ai ele falou:
“- Então não vou construir mais nenhum”.
Ai o pessoal saiu pros bairros voltou.
“ - Olha Serra é bom fazer (risos)”.
“-Vou fazer. Mas vou fazer mal feito.” Marcio
Aqui o papel de intelectuais orgânicos ligados aos setores conservadores, tais como
José Luiz Datena34
e Marcelo Rezende35
ajudam a explicar essa aderência. Porém,
entendemos que as políticas públicas executadas nos CEUs podem agir como uma contra
hegemonia no sentindo de criar intelectuais orgânicos vinculados a classe trabalhadora,
tendendo a se aliar a setores progressistas da Cidade, pois como coloca Singer (2012, p.23) :
“As classes podem transformar-se em classes para si, isto é, conscientes de seus interesses e
dispostas a lutar por eles no plano da política.”
A ação política no caso do Projeto CEU encampada no mandato de Marta Suplicy
(2000-2004) baseou-se fortemente no terreno da realidade efetiva, pois:
O político em ação é um criador, instigador, mas não cria nada
nem se move no vazio turvo de seus próprios desejos e sonhos. Ele se
baseia na realidade efetiva. O que é, porém, essa realidade efetiva ? Será
por acaso algo estático ou imóvel, ou, antes, uma relação de forças em
constante movimento, alternando continuamente o equilíbrio ? Aplicar a
vontade na criação de um novo equilíbrio de forças realmente existente e
32
Arquitetos criticam os CEUS de Serra. http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/20051210-40961-nac-53-cid-
c1-not Acesso em 20/10/2014 acesso em 20/10/2014 08:10.
33
História verídica ou não o fato é que José Serra possui um grande desprezo pelo Projeto CEU. Veja:
http://poderonline.ig.com.br/index.php/2012/04/21/serra-diz-que-os-ceus-sao-iguais-a-qualquer-outra-escola/
02/11/2014 21:20.
34
Apresenta o programa policial Brasil Urgente na Bandeirantes.
35
Apresenta o programa policial Cidade Alerta na Rede Record.
32
operantes, baseando-se em determinada força que se considera progressista e
reforçando-a para levá-la ao triunfo, é se mover sempre no terreno da
realidade efetiva, mas para dominá-la e superá-la ou contribuir para
isso.(GRAMSCI, previsões e perspectivas In SADER, 2012 p. 36-37 )
Grifo nosso.
Entendemos o Projeto CEU como um fortalecimento das forças progressistas. De todo
um movimento que existe na periferia, convergindo para o CEU, desde que ele esteja aberto á
participação. Veja este caso interessante no CEU Perus:
Quando a gente chegou aqui no ano passado a pista de skate
tava detonada e a gente não tinha dinheiro pra consertar. Até recebi
denúncia que tinha ferro solto, tava perigosa. Falei quer saber de
alguma coisa, chama essa molecada. Esta pista é muito usada, num
mês fizemos uma medição passam por dia em torno de cem a duzentas
crianças, jovens e adultos. Chama essa molecada pra conversar.
Temos que fazer a reforma. Que reforma eles querem que faça ? E tem
um menino ai campeão brasileiro de skate, o Feijão, que já foi pra
Barcelona, já foi pra Dinamarca. Falei pra ele coordena a molecada ai
e vamos conversar. Ai nos vimos que o problema era maior, além da
pista de skate tinha uma molecada que usava bicicleta. Eles falaram
“- Porque a gente não faz uma pista de bicicleta do lado?” Eu
falei:
“- Beleza vamos fazer juntos porque sozinho eu não consigo”.
Fomos na diretoria regional:
“-Olha tem que reformar”.
“- Vai custar caro?”
“-Não.”
“-Então a diretoria banca.”
Tinta, quem vai pintar? Chama o coletivo de grafite de Perus,
chama o Danilo chama o Bonga chama o Perusferia e vamos fazer. O
Feijão coordenando tudo. No dia do Emicida aqui no teatro nos
fizemos à inauguração da pista lá, todos os grupos de hip hop da
região vieram tocar, cara a molecada chorava, porque quem fez a
reforma foram eles. Ai venho o pessoal da bicicleta:
“- E nossa pista ?”
“ -Bem vamos lá na diretoria, o que precisa ?
“ - Precisa terra.
“ - Se a sub prefeitura autorizar a gente faz.”
A subprefeitura autorizou. Pegaram terra no rodo anel com o
caminhão do depósito aqui de baixo, e pronto fizeram a pista de
bicicleta. Nos apenas intermediamos. Quem fez foram eles. Isto pra
mim já valeu a pena, um negócio assim indescritível. Marcio.
Voltando a Gramsci, possuindo uma concepção dialética da histórica ele faz uma
distinção entre movimentos conjunturais e movimentos orgânicos :
No estudo de uma estrutura, é necessário distinguir os movimentos
orgânicos – relativamente permanentes- dos movimentos que podem ser
33
chamados de conjunturais – que se apresentam como ocasionais, imediatos,
quase acidentais... A distinção entre “movimentos” e fatos orgânicos e
movimentos e fatos “conjunturais” ou ocasionais de ser aplicada a todos os
tipos de situações. (GRAMSCI, previsões e perspectivas In SADER, 2012
p. 40-41)
Lembrando que para Gramsci :
É o problema das relações entre estrutura e superestrutura que
precisamos colocar concretamente e resolver para chegar a uma analise justa
das forças que operam na historia de um determinado período e determinar
suas relações.
Nenhuma sociedade se coloca problemas sem que existam condições
necessárias e suficientes para sua solução, ou sem que essas condições
estejam ao menos em via de aparecer ou se desenvolver (GRAMSCI,
previsões e perspectivas In SADER, 2012 p.39 )
Assim, podemos compreender a eleição de Marta Suplicy em 2000 como um fato
conjuntural, pois é o retorno de uma força progressista ao governo municipal, após oito anos
de governos conservadores encarnados nas figuras de Paulo Maluf (1993-1996) e Celso Pitta
(1997-2000) e o Projeto CEU, disputado politicamente na eleição de 2004, como um
movimento orgânico, ou seja, algo permanente, sobrevivendo ao retorno conservador das
gestões Serra (2005-2006) e Kassab (2006-2012), até a ocorrência de um novo movimento
conjuntural, a eleição de Fernando Haddad em 2012, retornando o Projeto original do CEU
enquanto pólo de desenvolvimento da comunidade não meramente como espaço de
entretenimento.
Para facilitar o entendimento podemos separar estes momentos da seguinte forma:
2000 – Eleição de Marta Suplicy (PT) – Movimento Conjuntural;
2003 - Execução Projeto CEU – Movimento Orgânico;
2004 – Eleição de José Serra (PSDB) - Movimento Conjuntural;
2012 – Eleição de Fernando Haddad (PT) - Movimento Conjuntural;
A posse de Gilberto Kassab (na época no DEMOCRATAS hoje no PSD) ,em 2006,
após a renúncia de José Serra para concorrer ao governo de São Paulo e, posteriormente, a
reeleição de Kassab em 2006,fazem parte do mesmo movimento conjuntural de 2004 de
fortalecimento do conservadorismo. Em 2012 ocorre o retorno de uma força progressista ao
governo municipal encampada na figura de Fernando Haddad. O CEU apesar do seu
esvaziamento, ou das tentativas de esvaziamento, seguiu enquanto um movimento orgânico,
34
permanente, passando pelas duas gestões conservadoras, e agora ressurge com força numa
gestão de caráter progressista.
O Haddad ele tem um olhar sobre o CEU, que eu acredito, muito
legal. Na primeira reunião ele disse o seguinte, o CEU tem que ser a
menina de olhos dessa prefeitura, O CEU tem que ser o lugar onde
eles vão falar mudou. O PT tá ali mudou, não só o PT porque nem
todos os gestores são do PT, mas a administração do PT tá ali mudou
a relação com a comunidade. Marcio
Portanto entendemos que o Projeto CEU – movimento orgânico, permanente - se
propõe a fortalecer a classe trabalhadora enquanto força progressista de transformação da
realidade desigual brasileira sem do assim um fator de extrema importância para a
resolução da nossa Questão Periférica.Vejamos um exemplo interessante que ocorre no bairro
de Perus extremo noroeste da Capital Paulista.
2.1 Queixadas e o CEU Perus
O Centro Educacional Unificado de Perus é um caso emblemático na luta política
contra hegemônica. Entendido pelo seu Gestor como uma Esquina da Comunidade, está
fortemente atrelado as questões do bairro, como por exemplo ao Movimento pela
Reapropriação da Fabrica de Cimento de Perus36
. Este movimento tem como origem a Greve
dos Queixadas, trabalhadores da antiga Fábrica de Cimento da região que na década de 1960
promoveram uma grande greve na luta por melhores condições de trabalho. Atualmente,
existe no bairro este movimento pela reapropriação da fábrica com vistas a torná-la um ponto
de memória e cultura da classe trabalhadora37
. Suas reuniões ocorrem dentro do CEU Perus,
que expõe também atividades diversas sobre a memória da fábrica, tais como exibição de
filmes, palestras e exposições sobre a história do movimento dos Queixadas, promovendo a
construção de um sentimento de pertencimento ao bairro por parte das gerações mais novas.
E a desapropriação da fábrica será a coroação de uma luta antiga dos trabalhadores
desta região:
Conseguimos criar uma ideia de parque dos Queixadas no
território que é da fábrica, um território cultural que envolve Jaraguá,
Anhanguera e Perus. É um mecanismo de proteção, a gente não tem a
36
Sobre o Movimento Pela Reapropriação da Fabrica de Cimento de Perus acesse :
http://movimentofabricaperus.wordpress.com/ Acessado em 17/10/2014. 17:30.
37
Veja algumas questões importantes que envolvem a luta política em Perus no link a seguir :
https://drive.google.com/file/d/0BxR7Lnu7EeUiNDdaOWN5T3hHRWs/view?pli=1 formando toda uma rede
cultural sendo o CEU Perus um polo irradiador fundamental dessa luta. Acesso em 20/10/2014 10:00.
35
fábrica por que continua privada , mas vamos criando movimentos
entorno que vão dificultando essa degradação, a possibilidade do cara
vender etc. E o movimento recuperou sua vitalidade, tem uma
integração muito grande com os coletivos, as ações são até autônomas
do movimento, cada coletivo inventa sua ação. E todos tem claro que
precisamos conquistar a fábrica, ela é um elemento simbólico vital.”
José Soró
Vista aérea da fábrica de cimento de Perus.38
Assim o CEU aberto aos movimentos que permeiam as comunidades do seu entorno
torna-se um fator de construção da Centralidade da Periferia.
38
Imagem retirada de : http://hrechi.blogspot.com.br/2011/04/fabrica-de-cimento.html Acesso em 02/11/2014
22:20.
36
Conclusão - Centralidade da Periferia.
Milton Santos (2008) discute diante da globalização perversa uma possível
centralidade dos países periféricos em relação aos blocos, países hegemônicos mundiais
(notadamente Estados Unidos da América, União Européia e Japão). O autor vaticina que o
novo será promovido pelos “debaixo”, os excluídos, que produzem uma contra ordem à
globalização expropriadora.
Essa análise se faz interessante na produção do espaço da capital Paulista,
notadamente segregador no qual as classes populares, ou seja, os “debaixo” foram
expropriados do centro39
e de suas promessas. Podemos entender, então, que os CEUs podem
propiciar aos periféricos, através da sua correta apropriação de seus variados equipamentos, o
referencial dito por José de Souza Martins (2008), facilitando assim a construção da crítica
social e política do seu periferismo e uma possível resolução da Questão Periférica, ou seja,
o desvinculamento da classe trabalhadora dos setores conservadores que a oprimem. Dessa
forma, se constitui assim o tempo de possibilidades:
O que conta mesmo é o tempo das possibilidades efetivamente
criadas, o que, à sua época, cada geração encontra disponível, isso a que
chamamos tempo empírico, cujas mudanças são marcadas pela irrupção de
novos objetos, de novas ações e relações e de novas ideia”. ( SANTOS,
2008,p.117 ).
Essa questão é colocada em nossas entrevistas :
Henrique – E o que você pensa do futuro, essa criançada que cresce com
esse tipo de escola, que já entra desde sempre no CEU, seis, sete, oito anos?
Leda - A educação é outra né, eles têm várias coisas boas pra aproveitar,
várias atividades, se eles tiverem a cabeça boa vão aproveitar bastante coisa
ai.
Fechamos aqui nossa busca pela Totalidade. Porém, fica claro para nós que ela é uma
Totalidade incompleta, nossos atores sociais entrevistados e a relação cotidiana do autor com
o CEU Pêra Marmelo e CEU Perus, além dos movimentos que circulam no entorno provam
que o CEU é apenas mais um fator da construção da Centralidade da Periferia. Porém, um
fator muito forte e significativo, suas paredes de concreto pulsam quando as pessoas
39
Veja nesta reportagem http://reporterbrasil.org.br/gentrificacao/haddad-e-alckmin-juntos-para-riscar-do-mapa-
favela-do-moinho/ a imensa luta dos moradores da Favela do Moinho, a última a resistir no Centro de São Paulo
contra a especulação imobiliária. Acesso em 20/10/2014 08:00.
37
encontram- se ali naquela Esquina da Comunidade para debaterem as diversas questões que
perpassam-o seu entorno. E tais paredes reverberaram as soluções mais criativas e produtivas
para estas questões, pois são criadas pelos próprios atores locais.
E as novas gerações da periferia nascem já com um novo objeto técnico ao seu dispor,
com grandes possibilidades de construção de novas ações, relações e novas ideias. Sendo esta
uma das formas de construção de uma Centralidade da Periferia na Capital Paulista, com a
emergência da cultura popular.
38
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7.reimpr. São Paulo,Editora da Universidade de São Paulo.2012.
39
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Ribeiro, Georges Bourdoukan, Roberto Freire, João Noro, Sergio de Souza.
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O Espaço em questão. Ed. Marco Zero, AGB, 1988.
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.Por outra globalização: do pensamento único à consciência universal /
Milton Santos. - 16 Ed. - Rio de Janeiro: Record, 2000.
SINGER, André Vitor. Os Sentidos do Lulismo: reforma gradual e pacto conservador.
1ed. São Paulo. Cia das Letras,2002.
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potencialidades dos CEUs / Ricardo de Souza; orientação Roberto da Silva. São Paulo: s.n.
2010. 301 p.
SUPLICY, Marta. O preconceito ideológico contra os CEUs.O Estado de S. Paulo.São
Paulo, 06 de agosto de 2003,p.2.
40
Apêndice
O autor do trabalho foi candidato eleito com 19 votos a representante da comunidade no
Conselho Gestor do CEU Pêra Marmelo no ano de 2011.
41
Anexos
Anexo 1 - Íntegra das entrevistas realizadas:
Leda Maria de Moutta Ferro- Moradora da Vila Aurora, frequentadora do
CEU Pêra Marmelo e presidente do Conselho Gestor - Entrevista realizada
em 23/10/2014 – às 15 horas na casa da Leda.
Henrique - Gostaria começar pedindo que você se apresentasse se sempre morou aqui
na Vila Aurora?
Leda - Eu vim de Paranapiacaba (Santo André), faz mais de 15 anos, meu filho não
conseguiu escola, ai saiu o CEU pra sobrar mais vaga, ele tava numa escola longe, no Aldo,
não conseguiu vaga no CEU, foi para o Veríssimo.
Henrique – Você lembra como foi a formação do CEU, se você participou, como que
foi ? Foi em 2002, 2003, por aí? E como foi esse começo? Eu lembro que ali era um
campinho de futebol.
Leda- Participei, participei. Vai fazer 11 anos mês que vem (novembro de 2014).Isso
ali era um campinho de futebol.
Henrique – E como foi você lembra?
Leda – A Mara que era representante de bairro sabia da nossa luta por vaga na escola,
e chamou a gente pra participar, ai ela falou do CEU, já sabia que ia sair. Mas no começo eu
fiquei em duvida, fui de porta em porta pedir abaixo assinado pro pessoal, ai quando falou que
era uma escola assim que ia ter piscina, ia ter isso, aquilo, eu duvidei, ai eu falei meu deus se
não sair isso daí eu vou apanhar na rua.
Henrique - Na época você passava e falava essas características. Que ia ter piscina,
quadra teatro?
Leda- Isso, falava que ia ser tudo junto uma coisa só, mas mesmo assim eu duvidava,
tinha medo (risos) ia apanhar. Cheguei a trabalhar na política nessa época, mas graças a deus
saiu deu certo. Mas Eu ficava aqui de casa que da pra ver, eles trabalhando dia e noite, cada
coluna que eles colocavam eu ficava olhando aqui a primeira coluna a segunda coluna desde o
começo.
42
Henrique – É eu lembro que passava ali na Pêra Marmelo dava pra ver batendo a
estaca, ficava curioso, mas eu não participei de nada era novo ainda. Você chegou a vir no dia
da inauguração
Leda – Sim, nos fizemos um bolo na padaria do CEU, porque aquela padaria era pra
comunidade aprender panificação, mas parece que acabou eu cheguei a aprender a fazer bolo
ali, matinha um professor, mas acabou, e hoje a padaria.
Henrique- Hoje virou uma cozinha.
Leda – Mas aquilo lá era pra comunidade aprender a trabalhar, que nem as maquinas
de costura, tem ali, mas nuca ninguém ensinou, que era pro pessoal aprender a trabalhar nas
maquinas industriais mas ate hoje não se usou, a intenção da Marta era boa, pro pessoal
aprender a trabalhar.
Henrique – Mas ai mudou o governo, você notou diferença? Você reparou diferença
de Marta pra Serra /Kassab?
Leda – Deu muita diferença, foi o Kassab que venho depois?
Henrique - Venho o Serra ele ficou um ano e pouco ai entrou o Kassab, porque o
Serra foi ser candidato ao governo.
Leda - Isso ele abandonou né. Então, mas ai piorou muito. Deu uma caída boa o CEU,
porque no tempo dela era muito bom.
Henrique - Eu lembro que tinha muito show, cheguei a ver show ali na pista de skate.
Leda - Eu lembro que tinha muito teatro, tinha teatro pra adulto, e teatro infantil eu ia
aos dois porque eu gosto de teatro, participava dos dois, tinha peças boas, depois do Serra caiu
muito o CEU.
Henrique - E como era sua relação com cultura antes do céu, teatro?
Leda – Nenhuma.
Henrique - Você acha que facilitou? Você já tinha visto teatro antes?
Leda - Sim com pouca frequência, por que era muito longe e caro. Ai o CEU venho
pra cá. Eu comecei a ver bastante. Todas eu assistia, de criança e de adulto e passava filme
também, tinha bastante filme, mas cortaram tudo isso.
Henrique - E quais outras atividades você fazia?
Leda - Sempre fiz ginástica, hidro, alongamento, tudo que tem eu faço, caminhadas,
artesanato da melhor idade, conselho gestor. Procuro sempre tá por dentro das coisas que vão
ter.
Henrique - E o seu filho chegou a fazer algum curso por fora?
43
Leda - Chegou a fazer judô, mas no tempo do Serra acabou agora parece que tem
umas crianças fazendo, mas meu filho cresceu né ai não deu mais.
Henrique - E agora com essa mudança de prefeito, dois anos de Haddad, você acha
que de uma modificada, voltou à fase da Marta?
Leda - Olha voltar à fase da Marta é difícil igual à Marta não tem, fiquei ate triste que
ela não ganhou, pelo tanto que ela fez, mas voltar do jeito que era ela é difícil.
Henrique - E a questão do conselho gestor? Que eu participei também, vamos falar
um pouco, o que você pensa sobre ele, acha que falta participação?
Leda – Acho que falta participação da comunidade, é fácil chegar e reclamar, mas a
comunidade não ta participando, só tá indo eu e a Maria, eu sozinha é difícil, agora o conselho
ta mais formado por professores, lógico que eles vem o lado deles, mas acho que a
comunidade ta perdendo com isso, ninguém quer se envolver ninguém quer dar a cara a tapa
pra mim sozinho é difícil.
Henrique – E o que você pensa do futuro, essa criançada que cresce com esse tipo de
escola, que já entra desde sempre no CEU, seis, sete, oito anos?
Leda - A educação é outra né, eles têm várias coisas boas pra aproveitar, várias
atividades, se eles tiverem a cabeça boa vão aproveitar bastante coisa ai. Vários esportes, as
professoras dedicadas. Eu acho que se eles tiverem a cabeça boa vão aproveitar bastante, meu
filho infelizmente não conseguiu vaga ai, o tanto que eu lutei, mas não deu. Agora virou uma
bagunça porque no meu tempo ter que comprovar que morava perto da escola, agora vem
gente de longe, aqui briga com o Pedrinho do campo (Dono do terreno onde foi construído o
CEU Pêra Marmelo.).
Henrique – Ele não queria ceder o terreno?
Leda - Sim, mas no fim deu tudo certo. Mas você vê com tanta luta meu filho não
entrou ai, mas vem criança de longe.
Henrique – Fala um pouco pra mim sobre o baile da melhor idade esta integração
desde quando tem o baile?
Leda – Desde o começo tinha a Ana Claudia do telecentro, ai a gente começou a fazer
o baile era um bailinho pequeno pouca gente, a gente colocava mesinhas, mas cresceu tanto
que hoje não cabe mais mesinha, ai começou a vir gente de fora, do CEU vila Atlântica e nos
vamos ao baile lá.
Henrique – Ai tem essa integração, o pessoal de lá vem aqui e o daqui vai pra lá?
Leda - Isso, e é bom que a gente conhecesse muita gente, é muito bom o lhe dar com o
pessoal da melhor idade e tem também o artesanato, conseguimos ai uma parceria com uma
44
pessoa que estudou gerontologia, e visa o bem esta dos idosos, ai com a gente ela vai ver
essas questões de leis, estatuto do idoso, estas coisas assim porque a gente tem muita dúvida,
das leis, dos direitos dos idosos. Eu já conhecia ela, do tempo da marta, mas ai no tempo
Serra/ Kassab era foi posta de lado e ai ela voltou agora.
Henrique – Falando de direitos aqui vai virar polo de direitos humanos? O que você
pensa disso?
Leda – Tudo que for feito pra comunidade pra melhorar é bem vindo, porque o
pessoal não se liga muito nessas coisas de informação, de direito de educação a gente tem que
saber tem que ta por dentro.
Henrique - E a comunicação do CEU? Você acha que é eficiente?
Leda - Então eles põem avisos, tem a programação do mês inteiro, mas tem gente que
fala assim pô você não me avisa, mas ta lá pra todo mundo vê, tem aqueles painéis, tem na
parede, é uma questão de parar e olhar, ler né! Se programar, eles divulgam sim é bem
divulgado.
Henrique – Pra finalizar o que você tem a dizer sobre sua relação com o CEU e o que
você pensa do futuro dele? Como você vê essa dinâmica do governo atual, da comunidade.
Leda – Você conhece o CEU aqui, você já foi CEU do Kassab? Olha o teatro é
pequenininho, não e igual esse o teatro daqui já venho muita gente aqui e todos elogiaram o
teatro daqui eu já fui no teatro Butantã, porque antes eu fazia o vocacional fui se apresentar
lá.O teatro era pequenininho.o nosso daqui é grande os da marta são melhores.
Henrique - Você fazia o vocacional?
Leda - Fiz durante um ano. Era dança. É legal mas não era o que eu queria eu queria
dança de salão,sempre lutei pra vir dança de salão aqui mas não venho,porque o vocacional é
mais expressão corporal alongamento, pé legal mas não era o que eu queria dança de salão
mesmo e o que mais você perguntou ?
Henrique- Sobre a relação do CEU e a comunidade o que você pensa pro futuro?
Leda - Era bom que a comunidade participasse mais, não só de deixar o filho lá, mas
participasse da vida do CEU que nem eu fico lá.
Henrique - Saber o que ta acontecendo
Leda - Exatamente porque as pessoas só deixam o filho lá e vão pra casa, e não é
assim tem que participar, tem que estar por dentro de tudo o que acontece, se você acha que
não tem uma coisa legal tem que ir lá no conselho e reclamar, porque uma pessoa sozinha dá a
impressão que é picuinha minha , que só eu que to vendo
Henrique - Não tem uma demanda unida.
45
Leda - Não tem, na outra gestão tinha mais comunidade participando era melhor,
agora eu fico ali de bobeira, eu falo, elas acham que o direito delas ta certo.
Henrique - Então o que você pensa é que a galera precisa participar mais?
Leda - Isso você tem que ficar integrado ali, tem que saber tudo o que acontece,
porque isso daí é nosso é da comunidade, o pessoal que ta ali ta ganhado pra trabalhar, a gente
tem que ter o melhor, e pra gente querer o melhor a gente tem que ta integrado ali, participar,
isso daí falta muito.
Henrique - Bem e você quer falar mais alguma coisa?
Leda - Não, (risos) acho que já falei tudo acho. Já falei demais.
Henrique - Então agradeço e estamos ai. Participar, vou ver a questão do horário.
Leda - Ah deixa eu falar uma coisinha o meu vice me deixou na mão (risos) , mas eu
sei você tava estudando.
Henrique - Vou ver re retorno (risos).
46
José Soró – Agente cultural de Perus, Diretor da Agendes – Agencia de
Desenvolvimento Cultural. Entrevista realizada no Quiosque do CEU Perus
no dia 25/10/2014 às 15 horas.
Soró- Eu fiquei curioso né, eu não trabalho no CEU, fiquei pensando por que você
quer me ouvir ?
Henrique -Mas aí que ta a graça (risos). Eu queria que você se apresentasse, José
Soró, onde nasceu ? Quanto tempo mora aqui em Perus ?
Soró - Eu nasci no mato grosso do sul, morei lá em fazenda ate os 11 anos, aí meu pai
morreu, nos somos em 6 irmãos e minha mãe, ai um tio meu que morava em São Paulo meio
que resgatou a gente , trouxe pra São Paulo, ai viemos morar em perus em 1976, aí fiquei por
aqui e de alguma maneira essas historias que tinha em Perus acabou atraindo muito, eu
cheguei num período que da minha casa dava pra ver tas manifestações no portão da fabrica,
tanques ainda da ditaduras e tal, essa coisas aguçavam.
Henrique – Impactaram ?
Soró – Impactaram. Ai quando entrei na escola, entrei com doze anos no Candido
Portinari, eu já sabia ler e escrever, antes não tinha estudado por que onde morava não tinha
escola, mas tinha aprendido a ler e escrever com gibis essas coisas e fui aprendendo, mas tive
que entrar na primeira serie, era um gigante, interessante né porque ali já exercício um pouco
o papel de mais velho, era o único lugar que tinha ou morrer de vergonha por ta ali com doze
anos no meio de crianças de sete. Enfim, o Candido Portinari, é uma característica das
escolas de Perus, era muito politizada, contava-se muitas historias dos queixadas,das lutas
sociais que existiam no bairro, ai acabou não dando outra cara!! Um dia cruzei com um
professor de historia e as coisas começaram a fazer sentido. Era interessante acompanhado um
pouco o período de 79 das lutas pela...
Henrique – Democratização ?
Soró - Não, ainda era pela anistia e aquilo aparecia assim, ai começaram a aparecer às
greves.
Henrique Greves, tinha informação ?
Soró – Tinha. E eu me lembro daquelas cenas da Vila Euclides, do Lula, que aquilo
ali dava um calor, mas eu ainda não entendia por que. E as contrainformações eram muito
grandes, sempre eram colocados como baderneiros enfim, e era sempre assustador esse clima
47
ainda de final da ditadura militar, mas aquilo chamava atenção, e tanto é que eu acabei
entrando na militância política podemos dizer assim , mas não pelo PT, uma vizinha ia fazer
campanha pro Janio Quadros e resolveu contratar o povo, e eu fui enfim NE era um bico, mas
tinha aquele interesse porque vinha ai deputado conversar, ai tinha aquele interesse, mas
acabei entrando pela porta errada, mas era a campanha de 82 e o lula aparecia mais vezes,
porque tinha o horário eleitoral e aquilo começava a ferver, ferver, ferver dentro de mim, ai
chegou à eleição e meu primeiro voto foi no Janio Quadros prefeito, mas acho que nunca mais
cometi algum erro (risos). Mas me encantei por essa coisa do universo político, na eleição
mesmo conheci algumas pessoas, alguns jovens aqui do bairro e já tinha alguns jovens
discutindo a falta de cultura no bairro, e tinha um cara do PCB, Edson, por conta do Mario
Covas ser prefeito ele era uma espécie de subprefeito, e ele era muito envolvido com arte e
com cultura e começou a dar uma impulsionada também, ai a gente se juntou num grupo de
pessoas, ai a gente criou um centro cultural, se chamava Ajuá.
Henrique - Década de 80 ?
Soró – 82,83, ai promovendo algumas coisas ai, ai acabei indo pro mundo político,
fazendo militância política mesmo, achei que o PT era o que eu queria, aquela coisa com o
lula e tudo, e sou apaixonado por política acho uma arte, e fui compreendendo desde a minha
historia ate a realidade periférica de Perus que era muito violenta,fui começando a
compreender esses conceitos de luta de classe, etc. ai fazer política não foi só um gosto uma
adrenalina, mas um posicionamento pragmático político meso, quem eu era onde estava, e
sempre fui muito revoltado com a pobreza né, e teve um certo desencanto com a minha
infância né porque tudo que eu lembrava era muito bonito, mas depois você vai entendendo
que meu pai era trabalhador, a máquina roçadeira que eu vi um dia e achei maravilhoso
parecia de outro planeta, na verdade era a desgraça do campo e a consciência que meu pai era
trabalhador que vivia aquela migração atrás de emprego , de colheita,estas coisas e tal ate que
eu voltei um dia eu fui pro mato grosso uma época, tava tudo parado lá, ai nunca mais quis
voltar, nunca mais tive essa coisa de voltar pra lá, mas acho que ganhei do ponto de vista do
meu lugar no mundo e desde então participei dos movimentos sociais, aqui do bairro sempre
muitos movimentos, luta de absolutamente de tudo, água asfalto, etc.
Henrique – Bem eu fiquei curioso, você falou ai do Janio Quadros, e a vitoria da
Erundina em 89 ?
Soró – Ahh! Ai eu já tava bem descolado. Fiz parte assim de uma cristalização de uma
identidade política fudida, que foi a história da Erundina. Eu comecei a participar da Igreja
(Comunidades Eclesiais de Base) e toda essa ebulição que acontecia no Brasil, e tudo foi me
48
interessando bastante e fui aprendendo, e nessa época da Luiza Erundina, era muito
interessante, eu fiz parte do PT acho que doze anos, assumi cargos, fui candidato etc. Mas não
era muito meu encanto, mas entendo que era um caminho natural quando você faz militância
partidária assumir cargos faz parte do percurso, mas da Luiza, o PT tinha uma proposta de ser
de massas e de quadros40
e ele era mais que um partido, era um movimento cultural de
mudança, e congregava diversos tipos de núcleos, neste sentido ele era de massas, por que a
base tinha lugares pra falar, participação intensa, ele se constituía por núcleos, só em Perus
tinha dois núcleos , e tinha uma participação muito direta desde o sujeito mais simples até o
mais intelectual dentro do partido, e isso politizou muita , estudar, era um movimento que
tinha aquilo de que tem que estudar, tem que se formar. Tanto até que na primeira reunião que
eu fui, a pedagogia era horrível, os caras sentaram lá, sábado a tarde e abriram O Capital
(risos) volume 1, e começaram a ler O Capital, era muito simples, mas essa consciência da
necessidade de estudar, isso me favoreceu muito, assim de ganhar disciplina, de pensar de
estudar fazer analise de conjuntura, e isso hoje acho que ficou muito pobre, essa necessidade
de ter a disciplina de estudar não é visto como uma tarefa revolucionária, ai tem um
empobrecimento enfim. Ai nesse caminho todo surge 88, que foi uma historia muito
interessante. A parte diretiva do PT, que já era um núcleo em torno do Jose Dirceu,eles
avaliavam que o melhor candidato era o Plínio por que ele era cristão,dialogava com a classe
media pra perder aquele medo do PT. E a outra candidata era a Luiza Erundina, que vinha
arrebentando tudo, zona leste com NE barro, tinha um discurso radical, que a cidade precisava
arrebentar a cidade por que a cidade era muito complicada. Enfim, a direção bancou o Plínio,
mas teve uma rebelião de bases interna, a cara do PT é a Erundina, e eu fiz parte desse
movimento, era da articulação que era majoritária mas comecei a me desencantar um pouco
com eles. E quando chegou as prévias as bases deram uma virada feia, tipo 80 por cento pra
Erundina e ai criou um problema por que a direção se ressentiu e se afastou, então você tinha
a máquina partidária controlada por essas pessoas e tinha uma candidatura lançada pelas
bases, e a consciência imediata era vamos com o que a gente tem, boca,língua convencimento
ai virou uma febre em são Paulo os núcleos todos se mobilizaram, lembro que aqui em perus a
gente fez porta em porta duas vezes conversando com a pessoa e isso se generalizou pela
cidade, ai não deu outra batemos o Maluf. Mas isso gerou um problema de governabilidade
porque ela não tinha estrutura partidária, não tinha estrutura, montou um governo conforme a
base apontou, mas não tinha sustentação. O primeiro ano foi muito difícil, mas isso foi bom
40
Sobre Partido de Quadros e Partido de Massas veja http://www.veduca.com.br/play/7283 Acessado em
02/11/2014 as 18:05.
49
porque as bases discutiam muito os diretórios indicavam o administração regional, tinha que
ser alguém de perto, os cargos eram todos discutidos, pra todos os organismo de saúde, de não
sei o que a gente montou conselhos populares, então tinha um participação muito intensiva,
foi um ano de governo direto com as pessoas. Mas a sustentação institucional era complicada
e ai eles tiveram que arregar por que a direção voltou e assumiu e falou que tinha que ser do
nosso jeito também, ai o governo ganhou em capacidade funcional administrativa,mas fugiu
um pouco das bases. Mas enfim esse papel esse momento é fundamental, essa é um pouco a
minha escola de aprender a olhar o mundo.
Henrique – Me fala mais um pouco ai da Erundina, ela que tomba a Fábrica de
Cimento nesse momento ?
Soró - Pois é, essa é uma historia ruim (risos) dela e nossa. No governo dela essas
coisas de recuperar a memória, dar valor ao movimento sociais, o povo da área acadêmica
vem em peso com a Chauí como secretaria de cultura , e começam a fazer um resgate de
memória na zona leste e isso bateu aqui nos ouvidos do João Breno e do pessoal do sindicato.
Ai rolou uma parceria e a secretaria de cultura venho pra cá e começou um estudo para efeitos
de tombamento patrimonial e ao mesmo tempo um resgate da memória oral que ia sustentar
esse tombamento imaterial por que em tese a fabrica não tinha elemento para ser tombada
patrimonialmente então a historia da greve dos queixadas sustentou esse tombamento, durante
quis um ano a gente ouviu uns 200 queixadas contando suas historias . E isso resgatou a ideia
do centro de cultura do trabalhador que era uma ideia de 58 a gente resgatou, ai conseguiu o
tombamento, faltava fazer a desapropriação e construir o centro de cultura e memória.Havias
conversas com o SESC pra viabilizar o centro de cultura e a prefeitura precisava fazer a
desapropriação. Foi feito o tombamento a gente celebrou na praça. Ai entrou no ultimo
mandato da Erundina, ai aconteceu uma coisa complicada, o povo militante nos cargos
começa a ir pra campanha, ai o governo começa a trabalhar mais lento. E havia uma crença
também, não que ela seria reeleita por que não tinha reeleição, mas que a gente ia conseguir
reeleger o sucessor, que na época era o Suplicy. Ai entramos nessa crença tanto eles do
governo e a gente dos movimentos sociais, então a gente vai ganhar faz a desapropriação
depois , ai se fudemos por que perdemos pro Maluf (risos). E FOI UM vacilo mesmo. Lembro
que o João Breno que era um cara muito sabido falava olha não vamos entrar nessa onda,
vamos acelerar as coisas e lembro que a gente mais militante falava assim que isso não seja pé
frio não fala dessas coisas (risos) . E isso criou um vácuo, porque ela foi tombada mas não foi
desapropriada.Ela continua pertencendo ao Abdalla que não conseguiu transformar ela pra
outros negócios ai venho destruindo ela sistematicamente. Foi falta de mais esperteza que
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  • 2. HENRIQUE MACEDO JUSTINIANO O CENTRO EDUCACIONAL UNIFICADO COMO UM FATOR DE CENTRALIDADE DA PERIFERIA Monografia apresentada para a conclusão do curso de Licenciatura em Geografia do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de São Paulo. Colaboração: Professor Me. Marco Antonio Teixeira. SÃO PAULO 2014
  • 3. Para meus pais Seu Tião e Dona Léia.
  • 4. AGRADECIMENTOS Agradeço aos familiares pelo suporte dado em diversos momentos para a conclusão do curso. Alexandre e Adriana sempre juntos nas adversidades. Meus sobrinhos Gabriella e Thiago por cederem o computador quando eu preciso. Agradeço principalmente ao meu pai Sebastião Rodrigues Justiniano e minha mãe Leacira Maria Macedo que fizeram e fazem ainda muitos esforços em suas vidas para darem o máximo possível de bem estar para mim. Agradeço ao Professor Rodrigo que em conversas no ano de 2009 me indicou o curso de Geografia do Instituto Federal de São Paulo. Agradeço ao CEU Pêra Marmelo e CEU Perus pelo acolhimento à pesquisa. Agradeço a Leda, José Soró e Marcio que me cederam entrevistas significativas para a pesquisa. Agradeço aos professores do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia por fazerem um curso de Geografia muito rico na visão crítica da sociedade em que vivemos, sendo fundamental uma aula do Professor Fausto no ano de 2010 para a definição do tema de pesquisa. Por fim, agradeço a todos(as) amigos e amigas que tive o prazer de conversar durante esse período do curso sobre os mais diversos assuntos. Galera do CA Estrabão- Gestão Bertha Becker pela experiência interessante de articulação política. E claro agradecimento especial pelas conversas filosóficas divertidas que ocorrem invariavelmente com a companheira Deise Serra e com os camaradas Douglas Faria, Edson Silva da Rocha, Marcio Romeiro e Regimarcio Pereira.
  • 5. Os que moram Do outro lado do muro Nunca vão saber O que se passa no subúrbio Eles te consideram Um plebeu repugnante Eles te chamam De garoto podre Garotos Podres - Garoto Podre Aqui não vejo nenhum clube poliesportivo Pra molecada frequentar, nenhum incentivo O investimento no lazer é muito escasso O centro comunitário é um fracasso Racionais MC’s - Fim de Semana no Parque
  • 6. RESUMO No ano de 2003, durante a gestão da prefeita Marta Suplicy (PT – 2001-2004), a periferia da cidade de São Paulo obteve um novo equipamento público: o Centro Educacional Unificado (CEU). Tal equipamento continha num mesmo espaço teatro, piscina, biblioteca, quadra poliesportiva e sala de informática abertos não só aos alunos ali matriculados, como também a toda a comunidade sendo alvo de uma grande disputa política na eleição do ano seguinte, o presente trabalho pretende investigar o significado mais profundo que está contido neste objeto técnico, que resistiu as gestões conservadoras de José Serra (PSDB – 2005-2006) e Gilberto Kassab (DEM – 2006 - 2012); foi taxado de concreto pedagógico por um grande jornal de São Paulo e nos faz questionar quanto à possível resolução da nossa Questão Periférica e a emergência de uma Centralidade da Periferia. Palavras- Chave : CEU; Questão periférica; centralidade da periferia; Marta Suplicy; José Serra.
  • 7. ABSTRACT In 2003 during the administration of Mayor Marta Suplicy (PT - 2001-2004) to the outskirts of São Paulo got a new public facility: Unified Education Center (CEU). Such equipment contained in the same space theater, swimming pool, library, sports court, computer room open not only to students enrolled there as well as the entire community. Target of a major political dispute in the election the following year, this study aims to investigate the deeper meaning that is contained in this technico object, which withstood the conservative administrations of José Serra (PSDB - 2005-2006) and Gilberto Kassab (DEM - 2006 - 2012), was labeled a pedagogical concrete for a major newspaper in São Paulo and makes us wonder about the possible resolution of our Issue Peripheral and the emergence of a Centrality of the Periphery. Key-words: CEU, peripheral issue, the centrality of the periphery, Marta Suplicy, José Serra.
  • 8. SUMÁRIO INTRODUÇÃO........................................................................................................07 1 - O CEU - EM BUSCA DA TOTALIDADE.........................................................09 1.1 Reestruturação Urbana..................................................................................16 1.2 Verticalidades e horizontalidades..................................................................20 1.3 Amplificação Pública......................................................................................22 1.4 Cidade Educadora..........................................................................................24 1.5 Conselho Gestor..............................................................................................27 2 – A QUESTÃO PERIFÉRICA............................................................................30 2.1 Queixadas e o CEU Perus..............................................................................34 CONCLUSÃO – CENTRALIDADE DA PERIFERIA........................................36 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................38 APÊNDICE..............................................................................................................40 ANEXOS...................................................................................................................41
  • 9. 7 1 - Introdução Quando seu objeto de investigação está indelevelmente ligado a sua formação e construção de sua vida o pesquisador fica instado a vangloriar tal objeto. Porém a insatisfação leva ao questionamento e assim questões diversas são levantadas para que se tenha uma compreensão satisfatória do processo social, da luta política, das relações sociais, da construção e identificação para com o território, palco no qual está colocado o objeto, e no qual atuam os diversos atores sociais. Instigado a investigar o porquê de um grande jornal de São Paulo taxar o Centro Educacional Unificado (CEU) de “Concreto pedagógico”, passamos a investigar o debate político por detrás de tal equipamento público, localizado em áreas marginalizadas da Cidade de São Paulo, verdadeiros espaços esquecidos pelo Estado na área social. Esta questão territorial dos CEUs também causa uma curiosidade epistemológica, no sentindo de compreender o porquê de tal investimento em uma obra de grande porte, verdadeiro monumento arquitetônico a contrastar com o entorno autoconstruído, em localidades periféricas com baixo índice de desenvolvimento humano. Fazer falar o território1 é uma questão central no trabalho do geógrafo. As disputas sociais, econômicas, políticas e culturais possuem uma expressão e correlação fortemente ligada ao território, à produção do espaço, sendo a Cidade de São Paulo dialeticamente desenvolvida nas contradições que emergem de uma verdadeira disputa entre classes. Postulamos que existe uma luta de classes, em todos os âmbitos acima citados, que marca o território de forma ímpar. E o papel dos intelectuais exercido na construção de uma hegemonia através da disputa política para a classe na qual exercem sua função também é um ponto de interesse para o entendimento do que é o Projeto CEU. Assim, a pesquisa é feita através da paixão no sentido gramsciano da palavra2 , na busca de entender a formação periférica de São Paulo e as possíveis saídas para que tal 1 “Quando a gente faz falar o território – que é um trabalho que creio que é o nosso, fazer falar o território, como os psicólogos fazem falar a alma, como Darcy Ribeiro quis fazer fala o povo, como Celso Furtado quis falar a economia, o território também pode aparecer como uma voz... O território brasileiro é esquizofrênico, [...] porque de um lado, recebendo esses insumos de modernização globalitária, ele se fragmenta, se fragiliza; de outro lado, descobre que esse processo não lhe convém. E talvez lhe falte descobrir qual é a lógica mais geral que permita a produção de um discurso novo. Primeiro acadêmico, quando possível também de mídia, e depois o discurso político”(SANTOS in : Entrevista em Caros Amigos,1998). 2 “Paixão no sentido de Gramsci: o de colocar-se em uma posição e, mediante essa colocação e por causa dela, tentar entender uma tragédia” (OLIVEIRA, 1987,p.9) “Porque somente a paixão aguça o intelecto e ajuda a tornar mais clara a intuição” (GRAMSCI, 2005, in SADER. p.35.).
  • 10. 8 periferia construa uma nova centralidade na qual o ser o humano seja o cerne da questão em detrimento do lucro capitalista. A busca pela totalidade do fenômeno se faz presente no primeiro capitulo, no qual é debatido o processo político de execução do Projeto CEU, aas escolhas feitas, mudanças ocorridas, etc. Uma análise dos conceitos ligados ao nosso objeto técnico também é necessária para o entendimento das suas características de localização periférica e possível pólo de desenvolvimento das comunidades na construção de uma Cidade Educadora. Indo além, postulamos uma por nós chamada Questão Periférica. Por que a periferia pobre e marginalizada tende a formar um bloco histórico3 com setores conservadores da cidade de São Paulo? O Projeto CEU poderia ajudar a resolucionar a nossa chamada Questão Periférica, ou é mesmo um mero concreto pedagógico sem utilidade alguma? Com ajuda do depoimento de alguns atores sociais possíveis respostas emergem das contradições apresentadas. Caminhe conosco nessa investigação. Boa leitura! 3 Uma análise apurada do conceito de Bloco Histórico na obra de Antonio Gramsci pode ser encontrada em PORTELLI, Hugues. Gramsci e o bloco histórico; tradução de Angelina Peralva. Rio de Janiero, Editora Paz e Terra,1977
  • 11. 9 1 – O CEU – Em busca da totalidade. Analisamos nosso objeto técnico, o Centro Educacional Unificado (CEU), através do olhar do geógrafo Milton Santos e sua análise da forma, função, estrutura e processo, com vistas a alcançar a totalidade. : “A forma nos apresenta a coisa, o objeto geográfico; sua função atual nos leva ao processo que lhe deu origem; e este, o processo, nos conduz à totalidade social, a estrutura social que desencadeou e dá ao objeto uma vida social” (SANTOS,1988,p.7) Entendemos que a forma se constitui no objeto técnico intitulado Centro Educacional Unificado, que com sua arquitetura arrojada, causa um contraste impactante com as casas autoconstruídas ao redor. Porém, o objeto em si não se explica, é preciso compreender o seu fundamento dado através das relações sociais. O objeto apresenta-se com a função de desenvolver o local, o lugar, assim sua forma (arquitetura arrojada) possui uma função (desenvolvimento local). Devemos então compreender a estrutura social no qual o equipamento está inserido, investigando o processo social e suas mudanças produzidas no decorrer do tempo. Assim, discorremos sobre este fenômeno social buscando abarcar sua totalidade: Forma, função,estrutura e processo são quatro termos disjuntivos associados, a empregar segundo um contexto do mundo de todo dia. Tomados individualmente, representam apenas realidades parciais, limitadas, do mundo.Considerados em conjunto, porém, e relacionados entre si, eles constroem uma base teórica e metodológica a partir da qual podemos discutir os fenômeno espaciais em totalidade. (SANTOS,1985,p. 52.). E para buscar tal totalidade, percorremos os processos políticos envolvidos na execução inicial do Projeto CEU, a historicidade da formação periférica da Cidade de São Paulo, os conceitos por de trás da confecção do objeto técnico e por fim entrevistas com aqueles que dão vida ao equipamento, os atores locais que possuem o território como abrigo: Os atores locais tem o território como um abrigo, buscando constantemente se adaptar ao meio geográfico local, ao mesmo tempo que recriam estratégias que garantam sua sobrevivência nos lugares. É neste jogo dialético que podemos recuperar a totalidade.(SANTOS,2004,p.261)
  • 12. 10 Os CEU’s se baseiam em experiências anteriores, tais como as “Escolas Parques” do educador Anísio Teixeira na Bahia nos anos 1950, os CIEP’s (Centros Integrado de Educação Pública) escolas de tempo integral construídas no Rio de Janeiro durante o governo de Leonel Brizola (1983-1987), com apoio do educador Darcy Ribeiro, entre outras tentativas de integrar educação, cultura e lazer num mesmo equipamento (PADILHA, 2004, p.29-30). Um dos nossos entrevistados4 comenta sobre essa influência do CIEPs já nas discussões sobre uma Cidade Educadora e a construção de equipamentos públicos com esta concepção na época da Prefeita Luiza Erundina (1989-1992) e de Paulo Freire como Secretário Municipal de Educação: Tinha o aspecto de dar um choque na educação, e isso tem a ver com a Fábrica e com o CEU também, porque essa ideia do CEU nasce lá atrás via Paulo Freire, de uns encontros com o movimento de moradia da zona leste. Eles eram metidos a pensar o lugar da educação como um lugar educativo, e foram atrás do Paulo Freire pra discutir isso. E desenharam a implantação do conjunto habitacional todo pensado como um lugar educador, do jardim a casa, a praça, todo desenhando com o Paulo Freire. Ai começa a nascer essa ideia do CEU acho assim, de um lugar que seja integrador da comunidade, nascem dessas ideias ai. Mas eles não chegaram a fazer o CEU, e todos eram fãs assim, apesar de estar em partidos diferentes , do Darcy Ribeiro e os CIEP's no Rio, mas não chegaram a fazer o CEU. José Soró. Assim, em 2002 na Gestão da Prefeita Marta Suplicy (2001-2004) o Projeto CEU se apresenta como um pólo de desenvolvimento da comunidade, pela sua arquitetura arrojada e fundamentalmente, por propor a integração de seus diversos setores. Seus espaços e equipamentos abertos ao uso, não só dos alunos matriculados, mas também da comunidade potencializam os princípios da Cidade Educadora, caracterizando-se como uma rede de proteção social. Isto demonstra o equívoco do jornal Estado de São Paulo, que em sua edição de 03/08/2003 ataca os CEUs, através de uma critica ao discurso5 do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), pronunciado na inauguração do CEU Jambeiro em Guaianazes no extremo leste da capital paulista no dia 01/08/2003. 4 A íntegra das três entrevistas realizadas com Leda (Moradora da Vila Aurora e frequentadora do CEU Pêra Marmelo, sendo também Presidente do Conselho Gestor), José Soró (morador de Perus e agente cultural do bairro) e Marcio Bezerra ( morador de Perus e gestor do CEU Perus) encontram-se no anexo 1. 5 Confira a íntegra do discurso em http://www.biblioteca.presidencia.gov.br/ex-presidentes/luiz-inacio-lula-da- silva/discursos/1o-mandato/pdfs-2003/2o-semestre/01-08-2003-discurso-do-presidente-da-republica-luiz-inacio- lula-da-silva-na-cerimonia-da-inauguracao-do-centro-educacional-unificado-jambeiro/view. Acesso em 13/10/2014 , 23:15.
  • 13. 11 O Jornal no editorial “O CEU das elites”6 trabalha apenas sobre uma ótica economicista, entendendo o Projeto CEU como um “Concreto pedagógico” , tratando os alunos ali matriculados como os “eleitos” em detrimento dos demais alunos das escolas da comunidade. Por falta de conhecimento, ou como coloca a Prefeita Marta Suplicy (PT)7 , no mesmo Estado de S. Paulo do dia 06/08/2003, por um preconceito ideológico contra o CEU, o Editorial do jornal deixa de citar as possibilidades criadas com o Projeto. Assim obtém uma resposta da Prefeita Marta Suplicy, deixando claro os objetivos que os CEU’s possuem : Os CEU’s são uma nova proposta pedagógica de educação inclusiva e consistem em organizar toda a rede municipal nesse conceito. Assegurando a todas as crianças do ensino fundamental uniforme e material escolar gratuito : transporte para as que moram a mais de dois quilômetros da escola; merenda de qualidade e acesso a computação, música e instrumentos musicais, teatro, cinema e esportes, começando pelas regiões mais pobres da cidade. Em algumas regiões, isso estará concentrado numa única construção, como os CEUs que estão sendo inaugurados agora, assegurando como rotatividade o acesso a esses espaços. Em outros bairros, criando espaços semelhantes interligados com a rede escolar já existente. A comunidade passa a ser co-gestora e participe do sistema. Juntos construiremos um outro futuro se a reprodução recorrente da pobreza. Não fomos escolhidos para perpetuar o sistema e a desigualdade social. Estamos fazendo uma revolução na educação, rompendo com a lógica de 500 anos de exclusão. (SUPLICY,2003,p.2). A execução da obra possibilita que, de certa forma, um direito começa a efetivamente se fazer presente aos excluídos da periferia, caracterizado por José de Souza Martins (2008) como: O direito justo dos pobres de terem acesso às promessas sociais e revolucionárias do centro, do monumento e do monumental, do teatro, da música erudita, da arte, dos museus, do propriamente urbano e do bem-estar que ele anuncia e possibilita, aquilo que é propriamente emancipador do homem. A falta desse acesso corrói o referencial crítico que possibilitaria a um periférico fazer a crítica social e política do seu periferismo (MARTINS, 2008, p.55.) Um dos nossos entrevistados também comenta esta visão do jornal que acaba por contaminar até mesmo funcionários do equipamento: E a gente pensa justamente o inverso, todo este complexo cultural, esportivo é pra todas as escolas do entorno. É isto que a gente faz hoje, a gente abre pra todas. Uma diretora daqui chegou a usar o seguinte termo 6 Confira o Editorial “O CEU das Elites” no acervo online do Jornal o Estado de S. Paulo no link : http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/20030803-40101-nac-3-edi-a3-not acessado em 13/10/2014, 23:25. 7 Confira a resposta da Prefeita ao Editorial “O Ceu das Elites” no acervo online do Jornal o Estado de S. Paulo no link : http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/20030806-40104-nac-2-opi-a2-not acessado em 13/10/2014, 23:30.
  • 14. 12 numa reunião, por isso que eu falo porque foi numa reunia aberta, “ - Pô vocês tão abrindo o CEU desse jeito daqui a pouco o morro vai descer pra cá” . Pô eu falei pra ela se o morro descer pra cá é isso que eu quero né! (risos). Este complexo não é de vocês. O Gestor do CEU era um zelador de condomínio das três unidades. E eles não perceberam até hoje a dimensão do que é a concepção do CEU. Marcio É interessante notar que construídos com êxito durante o governo da Prefeita Marta Suplicy (2001-2004), do Partido dos Trabalhadores (PT), os 21 CEUs de sua gestão não se fizeram como um “espetáculo da educação, em prol de um clientelismo político”, como preconiza Reinaldo Tadeu Boscolo Pacheco (PACHECO, 2009), afinal a candidata petista a reeleição foi derrotada nas urnas por José Serra (PSDB), que inicialmente, sendo coerente com seu discurso eleitoral de que o projeto era caro, barrou a construção de outros 24 CEU's já licitados, retornando-os ao final de seu primeiro ano de mandato (2005)8 , com algumas mudanças no projeto (como por exemplo, a capacidade do teatro que foi reduzida de 450 para 180 pessoas.). Em 2006 mais um fato político ocorreu na prefeitura de São Paulo, a saída de José Serra (PSDB) para se candidatar ao governo do estado de São Paulo, tomando posse seu então desconhecido vice-prefeito Gilberto Kassab (DEMOCRATAS- DEM)9 . Comparando através da Tabela abaixo10 a votação da Prefeita Marta Suplicy nas eleições de 2000 (campanha vitoriosa) e 2004 (campanha derrotada) com os locais de construção dos 21 CEUs entendemos que a tese de clientelismo político não é válida. Mas claro a derrota dela causa uma grande surpresa: O CEU foi uma coisa tal impactante pra periferia que eu achava que a Marta não perderia jamais a eleição. Na época tinha 21 CEUS construídos, a Marta fez 21 teatros na periferia, 21 cinemas. E não é qualquer teatro, é uma coisa de qualidade uma coisa boa, 11 anos depois você desce lá, ele ta lá bonitinho. Não tinha como perder essa eleição, mas eleição se perde nos detalhes (risos). Marcio. Olha voltar à fase da Marta é difícil. Igual à Marta não tem, fiquei até triste que ela não ganhou, pelo tanto que ela fez, mas voltar do jeito que era ela é difícil. Leda 8 Serra decide retomar os CEUs veja : http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u115664.shtml acessado em 14/10/2014 00:10. 9 Marta foi duramente criticada pelos valores dos 21 CEU’s, porém a dupla Serra/Kassab fez 24 mini-CEU’s, mais simples, sem preocupação com a estética, com menores equipamentos, porém mais caros no seu custo final como demonstra o link : http://blogdofavre.ig.com.br/2008/09/o-ceu-e-a-verdade/ acessado em 14/10/2014 00:30. 10 Tabela extraída do interessante trabalho “A derrota não explicada – Uma reflexão sobre a eleição municipal de 2004 em São Paulo” que busca explicações para a derrota nas urnas de uma Prefeita com 48% de ótimo e bom na avaliação de sua gestão. Acessado no dia 11/10/2014 23:00 no link : http://www.bocc.ubi.pt/pag/paula-luiz- eleicao-municipal.pdf . Sobre o papel da mídia e a administração municipal leia na época da Marta leia : http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos/iq260220032.htm acesso em 14/10/2014 02:45.
  • 15. 13 Tabela11 com os votos de Marta Suplicy nas eleições de 2000 e 2004 : 11 Vide nota 10.
  • 16. 14 Analisando a tabela percebemos que Marta aumentou sua votação nos bairros do Grajaú (CEU Navegantes e CEU Três Lagos), Guaianazes (CEU Jambeiro) São Mateus (CEU São Mateus e CEU São Rafael) e Capela do Socorro ( CEU Cidade Dutra). Nas demais localidades diminuiu sua votação: Cidade Ademar (CEU Alvarenga), Capão Redondo (CEU Capão Redondo), Pirituba (CEU Pêra Marmelo e CEU Anhanguera), Itaim Paulista (CEU Vila Curuça e CEU Parque Veredas), Brasilândia (CEU Paz), Sapopemba (CEU Rosa Da China), São Miguel Paulista (CEU Parque São Carlos), Itaquera (CEU Inácio Monteiro e CEU Aricanduva),Ipiranga (CEU Meninos), Butantã (CEU Butantã), Campo Limpo (CEU Casa Blanca). Apesar da derrota de uma força progressista, entendemos o Centro Educacional Unificado como uma política de luta por hegemonia através da cultura, esporte e lazer associados à educação em áreas até então esquecidas nestes itens pelo Estado, estabelecendo- se assim uma luta pela democracia. E a guerra de posição neste contexto é travada nas áreas periféricas, quase sempre cooptadas pelo conservadorismo. Afinal, Aldo Tortorella12 diz sobre a Hegemonia que : Para Gramsci, o grande mérito de Lênin é precisamente o de ter compreendido, contra as degenerescências e simplificações economicistas e deterministas, o extraordinário e decisivo valor da luta cultural e ideológica para a afirmação das classes subalternas e de um novo sistema econômico-social. Contudo, a ideia da hegemonia em Lênin — segundo a interpretação de Gramsci — não deve ser entendida como afirmação de uma dominação, mas como afirmação de uma capacidade superior de interpretação da história e de solução dos problemas que ela coloca (grifo nosso) Quanto a guerra de posição Gramsci coloca no caderno 13 “Breves notas sobre a política de Maquiavel” parágrafo 1713 que : Se as crises históricas fundamentais são determinadas imediatamente pelas crises econômicas; pode-se excluir que, por si mesmas, as crises econômicas imediatas produzam eventos fundamentais; podem apenas criar um terreno mais favorável à difusão de determinados modos de pensar, de pôr e de resolver as questões que envolvem todo o curso subsequente da vida estatal. A história da formação das periferias de São Paulo denota o quão perverso é o regime de acumulação do capital no Brasil. Deixados à margem das políticas do Estado, milhões de pessoas foram excluídas do centro da cidade e de suas promessas culturais, sociais, ou seja, de 12 http://www.acessa.com/gramsci/texto_visualizar.php?mostrar_vocabulario=mostra&id=644 acesso em 14/10/2014 00:40. 13 Extraído de http://www.acessa.com/gramsci/texto_visualizar.php?mostrar_vocabulario=mostra&id=643 acessado em 17/10/2014 14:30
  • 17. 15 cidadania, sendo “exilados” nas longínquas periferias da cidade, sem mínima infraestrutura adequada, se reproduzindo com o básico (em alguns casos abaixo do básico), aumentado dessa forma a acumulação de capital. Assim, em 2003, no processo de implementação dos CEUs esse contexto histórico foi entendido de forma superior, sendo necessária a construção de alguma ferramenta para a possível superação desse problema de segregação sócio espacial constituindo pela formação das periferias. Essa ferramenta se materializa nos CEUs, espaços destinados a uma política de integração da sociedade civil. Aqui, instala-se a necessidade da democracia política para que coincida governantes e governados no mesmo processo dialógico. A construção dessa democracia política se dá pelo poder através de uma ação de classe, construindo-se uma contra hegemonia na sociedade. Exercido em conjunto através da cultura, desmontando o intelectual orgânico da burguesia, criando o intelectual orgânico da classe trabalhadora. Ocorre aqui uma apropriação da cultura de massa e uma resignificação da mesma perpetrada pelos novos intelectuais orgânicos formados nessa nova agenda social realizada através das possibilidades colocadas pelo instrumental contido nos CEUs. Deve-se dessa forma aproveitar as condições materiais do nosso tempo, para produzir outra forma política, utilizando por exemplo a internet como forma de disseminação da informação e consequentemente da contradição presente no mundo, mote fundamental do desenvolvimento histórico. E o território é a base dessa luta. Entendido como matriz da vida social, econômica e política para a superação da contradição maior da sociedade brasileira contida no desequilíbrio entre direitos e deveres na construção da cidadania. Isso se faz possível porque no nosso tempo está contida a possibilidade de se conviver com o futuro possível. Apenas a visão da violência como forma de entendimento do mundo não capta o real processo do movimento perpetrado de baixo para cima, pelas classes populares em suas mais diferentes organizações e instrumentos de luta. O presente trabalho analisa a capacidade e o potencial do Centro Educacional Unificado de funcionar como um forte instrumento pela construção da democracia verdadeiramente participativa, na qual as decisões e processos partam da base14 . Assim a apropriação dessa ferramenta, transformando-a numa “esquina” da comunidade, na qual os problemas sejam debatidos, e soluções sejam apresentadas significam 14 Os CEUs possuem o Conselho Gestor, local de debate das questões relativas ao uso dos equipamentos, envolvendo representantes da comunidade (vide apêndice), dos professores, alunos e direção. Analisaremos melhor esta questão no subcapítulo 1.5.
  • 18. 16 uma construção pela sociedade civil, no entendimento Grasmiciano do termo, de uma necessária participação política. Nas palavras dos nossos entrevistados fica claro que é essa “Esquina da Comunidade”: Eu uso um termo que eu ouvi num curso que eu fiz, lá atrás o arquiteto que planejou ele dizia que o CEU tem que ser a esquina do bairro, o que é a esquina do bairro? Onde os movimentos sociais, a população, se encontram pra debater. Ao invés de debater no boteco, vem aqui no CEU. Por exemplo, hoje a noite vai ter a reunião do movimento da fábrica. De manha teve na biblioteca o curso caminhos da UBS, na sala da UAB uma reunião do conselho gestor de saúde Pirituba/ Perus e no teatro um evento DST/AIDS, é isso a Esquina do Bairro todos os movimentos convergindo pra cá e ele sendo ponto de efervescência de todos os movimentos populares. Marcio. A gente começou a fazer o baile, era um bailinho pequeno pouca gente, a gente colocava mesinhas, mas cresceu tanto que hoje não cabe mais mesinha, ai começou a vir gente de fora, do CEU Vila Atlântica e nos vamos ao baile lá. Isso, e é bom que a gente conhece muita gente, é muito bom lhe dar com o pessoal da melhor idade e tem também o artesanato, conseguimos ai uma parceria com uma pessoa que estudou gerontologia, e visa o bem estar dos idosos, ai com a gente ela vai ver essas questões de leis, estatuto do idoso, estas coisas assim porque a gente tem muita dúvida, das leis, dos direitos dos idosos. Eu já conhecia ela do tempo da Marta, mas ai no tempo Serra/ Kassab ela foi posta de lado e ai ela voltou agora. Leda. Por tanto no CEU, essa “esquina da comunidade”, a democracia deve ser debatida e fortalecida para a evolução social do lugar perante o mundo. Como um projeto de larga escala, o CEU possui uma gama enorme de conceitos por de trás da sua confecção. Vamos analisar algum deles. 1.1- Reestruturação Urbana O Projeto CEU, pela sua particularidade de localização periférica15 visa torna-se um pólo de desenvolvimento das comunidades periféricas de São Paulo16 , baseado na intersetorialidade, de forma que a cultura, educação, esporte e lazer se integrem constituindo- se numa forte ferramenta para o desenvolvimento local e a participação popular. Assim, pretende-se chegar a uma melhoria da qualidade de vida e um aumento da justiça social através do desenvolvimento sócio espacial. Com sua arquitetura arrojada os 15 Vide mapa da localização dos CEUS por Diretoria de Ensino e uma tabela com os endereços de cada unidade no anexo 2. 16 Sobre as condições sociais da Cidade de São Paulo acesse: http://www9.prefeitura.sp.gov.br/sempla/mm/index.php?texto=corpo&tema_cod=5. Acesso em 17/10/2014 17:30.
  • 19. 17 CEUs se apresentam como projetores de uma possível mudança social positiva, não apenas nas relações sociais, mas igualmente na espacialidade. O lugar constitui-se como um espaço vivido17 , no qual as relações sociais estão contidas de emoções, significados diversos, etc. Os CEUs pretendem-se como um espaço de encontro para o fortalecimento dessas relações, necessárias para a construção da democracia participativa, representada de forma maior pelo conselho gestor nos CEUs. Com a Operação Urbana CEU o Governo Municipal agiu de forma a propiciar um ferramental para a construção de tal democracia, minimizando a segregação espacial em relação à cultura, educação etc. A concepção dos CEUs está orientada para o futuro do desenvolvimento das regiões no qual foi construído. A alternativa escolhida foi pela periferia. A derrota na eleição de 2004 promoveu mudanças na concepção do Projeto CEU pelo candidato vencedor José Serra (PSDB)18 , baseado no Estado mínimo Neoliberal19 , o projeto inicial dos CEUs de participação popular foi abandonado. A chegada ao poder em 2013 de Fernando Haddad (PT) retoma as características originais baseadas na concepção de uma Cidade Educadora, de intervenção urbana com vistas ao desenvolvimento igualitário da Cidade de São Paulo20 . 17 “O espaço vivido é o conjunto dos lugares de vida de um indivíduo. A casa, o lugar de trabalho, o itinerário de um a outro local formam os componentes principais do espaço vivido.” (PONTUSCHKA,2007 p.314) 18 http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/20051210-40961-nac-53-cid-c1-not/ Acesso em 18/10/2014 04:50. 19 O Neoliberalismo privilegia o mercado em detrimento da intervenção Estatal nas áreas sociais. 20 Até 2016 a gestão de Fernando Haddad prometeu a construção de 20 novos CEUs, reutilizando equipamentos já existentes como os Centros Esportivos subutilizados, com a construção das torres que compõem as características originais do Projeto CEU, constituindo assim o Território CEU. http://planejasampa.prefeitura.sp.gov.br/wpcontent/uploads/2014/10/EQP_141015_Audi%C3%AAncia_CPOP.p df Acesso em 17/10/2014. 16:00.
  • 20. 18 Mapa da exclusão/inclusao – Distritos do Munícipio de São Paulo-200221 . Para execução da Operação Urbana CEU, foram delimitados os locais com maior vulnerabilidade social, baseados nos índices sintetizados no Mapa acima, no qual os locais em vermelho possuem piores condições de qualidade de vida, desenvolvimento humano e consequentemente menor autonomia dos indivíduos. Repare no mapa abaixo a localização dos 45 CEUs coincidindo com esses locais de maior vulnerabilidade. 21 Extraído de http://www9.prefeitura.sp.gov.br/sempla/mm/mapas/indice4_1.pdf Acessado em 18/10/2014 04:10.
  • 21. 19 45 CEUs - Centro Educacionais Unificados22 . 22 http://planejasampa.prefeitura.sp.gov.br/wp-content/uploads/2014/10/SME_CEU_CPOP15.10.pdf Acessado em 18/10/2014 04:20.
  • 22. 20 1.2 - Verticalidades e Horizontalidades O sistema econômico atual se impõe de forma vertical, delimitando lugares que mandam e lugares de exclusão. Na cidade de São Paulo, em relação à cultura, educação, etc., os bairros centrais perpetram uma verticalidade de produção e acumulação de equipamentos sócio-culturais que segregam espacialmente boa parte da população, “exilada” nas periferias longínquas, tanto perante a distância, quanto à questão econômica. Afinal: O processo de implantação de infra estrutura ocorre descontinuamente, aos saltos, sendo que, quando acontece, cobre uma grande área de uma só vez. E isto ocorre porque os investimentos feitos pelo poder público em bairros de população de baixa renda dependem muito mais de conjunturas políticas do que de um processo de planejamento.”(BONDUKI, 1978, p.124) Assim, para a construção de uma horizontalidade diversificada, pois contra hegemônica a produção homogeneizadora dos lugares, os CEUs se apresentam como uma importante ferramenta popular: As horizontalidades, pois, além das racionalidades típicas das verticalidades que as atravessam, admitem a presença de outras racionalidades (chamadas de irracionalidades pelos que desejariam ver como única a racionalidade hegemônica). Na verdade, são contra racionalidades, isto é, formas de convivência e de regulação criadas a partir do próprio território e que se mantêm nesse território a despeito da vontade de unificação e homogeneização, características da racionalidade hegemônica típica das verticalidades. A presença dessas verticalidades produz tendências à fragmentação, com a constituição de alvéolos representativos de formas específicas de ser horizontal a partir das particularidades. (SANTOS, 2000, p.110.) Comentando sobre o processo de participação na construção do CEU Perus um dos nossos entrevistados coloca luz neste encontro das verticalidades e horizontalidades, ou seja, da produção que vem de “cima” e as questões horizontais que circulam em “baixo” : Como a gente já reivindicava um centro cultural há muitos anos, rolou então essa coisa do CEU em Perus e começou o processo de participação das pessoas a dizer como queria, que tipo de CEU queria... Eu acompanhava de longe e pensava o seguinte, era a favor que você tem que montar algo que quebre a lógica mórbida periférica, até brincava a gente lutou durante quase quinze, vinte anos pelo centro cultural e de repente a gente ganha esse mega monstro (risos). Pra alguns lugares isso foi tão espantoso, que a falta de habilidade de quem estava na gestão com o entorno, transformou em elefante branco, ou escola privilegiada, o CEU é sempre tido como uma puta escola pelos seus recursos Mas enfim, eu achava o CEU muito correto como política publica, muito mais talvez pelo aspecto cultural do que o educacional, porque numa ideia de mudança da sociedade a gente tem que reparar os direitos das pessoas, chegar com as condições, mas eu já tinha uma concepção que era muito mais além disso, as pessoas não tinham boa escola, não iam no teatro, não era só por que não tinham acesso ou custava caro, nessa época trabalhando com pessoas de rua já tinha descoberto que o
  • 23. 21 repertório de universo imaginário das pessoas é fundamental, então uma pessoa que nunca foi no teatro, ou qualquer outras manifestações artísticas, não tem isso no seu cotidiano. Não faz parte. Ele não vai por que aquilo não diz muito respeito a ele. Não faz parte do cotidiano dele, ele também não estimula os filhos porque não tem esse repertório. Então pra mim é necessário investir em cultura, porque ela potencializa o universo imaginário das pessoas, enriquece. Jose Soró. (Grifo nosso) Vista aérea do CEU Perus23 . Vista aérea do CEU Pêra Marmelo24 . 23 https://www.google.com.br/search?q=Ceu+Perus&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ei=6mxZVNndPOX9sASJ hoKgCA&ved=0CAcQ_AUoAg Acesso em 04/11/2014 22:20 24 https://www.google.com.br/search?q=Ceu+Pera+Marmelo&es_sm=93&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ei=P 25ZVPBq-JOxBLSdgrAB&ved=0CAkQ_AUoAg&biw=1280&bih=699 Acesso em 04/11/2014 22:25
  • 24. 22 É dessa forma, graças à esquizofrenia do espaço, no qual os lugares é que são o mundo, pois o reproduzem de “... modos específicos, individuais, diversos. Eles são singulares, mas são também globais, manifestações da totalidade-mundo, do qual são formas particulares” (SANTOS,2000 p.112), que o cidadão, até então excluído das promessas do centro, pode e deve apropriar-se dos CEUs para a constituição dessa horizontalidade diversificada, instalando-se como um cidadão de sua Cidade, de seu Estado, do seu País: Nas condições atuais, o cidadão do lugar pretende instalar-se também como cidadão do mundo. A verdade, porém, é que o “mundo” não tem como regular os lugares. Em conseqüência, a expressão cidadão do mundo torna-se um voto, uma promessa, uma possibilidade distante. Como os atores globais eficazes são em última análise, anti-homem e anticidadão, a possibilidade de existência de um cidadão do mundo é condicionada pelas realidades nacionais. Na verdade, o cidadão só o é (ou não o é) como cidadão de um país. (SANTOS, 2000, p.113) A cultura popular, pelas suas características específicas dos lugares em que é criada, enraizada no território, produz uma contraordem. Os CEUs possuem possibilidades, potencialidades de se constituírem como os enclaves de formação dessas “irracionalidades”, pois contrárias a racionalidade dominante, produzindo-se assim uma nova hegemonia, na qual a questão sociocultural como integradora e possibilitadora da destruição das desigualdades se construa, pois “... a conformidade com a Razão Hegemônica é limitada, enquanto a produção plural de “irracionalidades” é ilimitada. É somente a partir de tais irracionalidades que é possível a ampliação da consciência” (SANTOS, 2000, p.115). 1.3 - Amplificação Pública A mídia é conhecida como o quarto poder da república, pela sua característica de contar os fatos e de certa forma transformá-los em verdade. Assim, as periferias de São Paulo ficaram estigmatizadas como locais de violência, moradia de ladrões, traficantes, homicidas, etc. A miséria tratada como espetáculo por programas como “Aqui Agora”, “Cidade Alerta”, “Brasil Urgente”, “Polícia 24 horas”, entre outros, perpetuam as mais tristes e podres caricaturas dos moradores dos bairros periféricos das grandes cidades. A televisão não é como um livro, ou sequer como um jornal impresso, cuja leitura podemos interromper, refazer, submeter a reflexões demoradas. A dinâmica da imagem solicita respostas imediatas de quem a ela está submetido. As reações são reflexas, rápidas. Esse mecanismo é muito eficaz quando se trata de manter oculta a estrutura do texto ou a concepção que está na base da disposição segundo a qual as imagens são representadas. (ARBEX, 2008, p.13)
  • 25. 23 Será mesmo que a periferia é apenas violenta e desprovida de algum bem cultural de valor universal ? 25 Faz-se, então, necessária a superação das imagens televisivas estereotipadas. Até mesmo pelas universidades que costumam vir até a periferia com uma visão salvadora, ignorando os conhecimentos que circulam por ali. Nosso entrevistado José Soró nos alerta sobre isso ao comentar sobre as parcerias frustradas com a universidade: Umas da primeiras conversas foi com a USP leste. Mas eles não aguentaram, porque tem uma coisa complicada nessa relação com a universidade, uma coisa vetorizada superior, tanto é que eles separavam conhecimento popular e conhecimento acadêmico, eu falo não tem essa, conhecimento é conhecimento, o que eles são ? São diferentes. A academia é um vetor de conhecimento, um vetor com um jeito de organizar e estabelecer conhecimento. Mas ao longo dos anos isso acabou gerando um vetor de valor, deixando os outros conhecimentos desvalorizados. E isso não é verdade. As pessoas aqui tem um grande conhecimento. E o desafio era impor isso, mas a universidade não soube como lidar com isso, não saber que papel assumir quando você não tem mais isso de chegou a salvação (risos). Quando a gente começou a questionar queremos uma relação que esses conhecimentos e capacidades daqui estejam integrados. Se não, não rola. Uma relação de domino não rola. Eles não deram conta de achar um lugar que não fosse esse de salvador. Foram embora, chegamos a desenvolver um curso de capacitação cultural juntos, mas foram embora. José Soró. 25 https://www.google.com.br/search?q=Sorria+voce+esta+sendo+manipulado&es_sm=93&source=lnms&tbm=i sch&sa=X&ei=W29ZVOjnL-vjsATjzoJo&ved=0CAgQ_AUoAQ&biw=1280&bih=699 Acesso em 04/11/2014 22:35.
  • 26. 24 Porém as tentativas de parceria não cessaram. Está em curso atualmente o projeto da Universidade Livre e Colaborativa com o Professor Euller Sandeville26 , tendo o CEU um papel auxiliar no projeto: Depois que o Marcio assumiu a gestão o CEU Perus virou uma espécie de lugar que a gente tem todas as condições e tal, mas ela continua circulando, tem aula em igrejas, casas, escolas, na Quilombaque, na praça, enfim. Ela mantém esse espírito pra não permitir o predomínio de uma lógica funcional. E entendendo que o conhecimento, ele não é só um pedaço do discurso, da retórica, ele é toda uma experiência. Porque isso vindo aqui as pessoas participando de almoço comunitário, quebrando barro, aula na casa de não sei o quem. Então a ideia da Universidade é um aprendizado integral. Enriquecendo seu repertório afetivo vivencial. Ai cada aula é diferente, não existe uma igual a outra. José Soró. Dessa forma, os CEUs se apresentam como holofotes a apontar novos caminhos,abrindo espaços para as diversas experiências do seu entorno, desmitificando-se a estigmatização das periferias, propiciando assim a “Amplificação Pública” (SOUZA, 2010, p.111), ou seja, outra visão desses lugares até então estigmatizados pela violência e carência material, pois pelas características do Projeto CEU, as questões político-sociais que afetam tais áreas estão associadas às matérias produzidas sobre os CEUs, e consequentemente as resoluções apontadas pela cultura popular imbricada e produzidas dentro do equipamento social. Além disso, com a emergência das redes sociais essa amplificação pública se faz maior e melhor, pois é executada sem a visão, algumas vezes distorcida, dos intermediários midiáticos comprometidos com a ideologia mercadológica dominante. 1.4 Cidade Educadora A construção de uma Cidade Educadora está atrelada a ação estatal. O Projeto CEU está imbricado à constituição de uma Cidade Educadora, na qual a escola torna-se um espaço comunitário e a cidade um grande espaço educador para que se possa aprender na cidade, com a cidade e com as pessoas, valorizando o aprendizado vivencial. Um dos princípios norteadores do Projeto CEU é a constituição de uma Cidade Educadora27 ·: “A Cidade Educadora é um complexo em constante evolução e pode ter expressões diversas, mas sempre considerará como uma de suas prioridades o investimento cultural e a formação permanente de sua população” (GADOTTI, 2004 p. 12). 26 http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?metodo=apresentar&id=K4792295T9 Curriculum Lattes do Professor Euller Sandeville. Acesso em 02/11/2014 19:40. 27 Veja alguns elementos que você pode encontrar em uma Cidade Educadora: http://educacaointegral.org.br/noticias/19-elementos-que-voce-pode-encontrar-em-uma-cidade-educadora/. Acessado em 16/10/2014. 02:05.
  • 27. 25 Vivemos uma tensão global-local, no qual existe uma racionalidade dominante vinculada ao capital que produz o espaço de forma a atender seus interesses. A periferia pobre, excluída, acaba por se constituir como um produto dessa produção do espaço, não sendo uma exclusividade brasileira: Em geral, é na periferia que também se encontram os bolsões de extrema pobreza (favelas brasileiras, villas miséria na Argentina, callampas chilenas, precaritas mexicanas etc.), que foram se construindo a partir das migrações rurais- urbanas da década de 1950, dando lugar à conformação dos assentamentos irregulares que cresceram enormemente entre os anos 1960-1970, e que desde os anos 1980, são a expressão de uma sociedade informal fortemente definida, cuja característica é o congestionamento domiciliar e a carência de serviços urbanos e péssima qualidade de vida (GADOTTI, 2004 p. 18-19.) Grifo nosso. Com uma diminuição da intervenção social do Estado, a produção do espaço ocorre desregradamente, porém compreendemos que no caso da acumulação capitalista que se deu no Brasil pós década de 1950, esse desregramento foi planejado, ou seja, ficou a cargo única e exclusivamente da classe trabalhadora buscar meios para se reproduzir, sendo a autoconstrução a principal saída para a resolução do problema da moradia. Assim, pelas particularidades do local (baixa renda, consequentemente menor mobilidade urbana) seus moradores perdem um contato maior com a Cidade, porém caso ocorra um reconhecimento histórico28 do seu entorno, cria-se uma sensação de pertencimento interessante: A possibilidade de poder nos reconhecer historicamente em nosso próprio entorno físico e social cria um caráter ativo de identidade cultural. Devemos pensar, então, a cidade como totalidade complexa, que é necessário recuperar como espaço público de discussão e realização, fortalecendo assim o desenvolvimento de experiências culturais através do exercício da Cidadania.(GADOTTI, 2004, p.24-25). Realizado em Barcelona, em novembro de 1990, o primeiro Congresso Internacional de Cidades Educadoras fez uma carta que continha os princípios básicos para definir um modelo progressista de cidade. Assim, a “força do lugar” se faz presente, encampadas por políticas publicas executadas pelos municípios, tornando-se o motor da construção das Cidades Educadoras: No lugar- um cotidiano compartido entre as mais diversas pessoas, firmas e instituições – cooperação e conflito são a base da vida em comum. 28 “Cada grupo de pessoas percorre apenas pequenos setores das cidades quando realiza suas tarefas habituais. Talvez por isso, se perca a experiência do urbano, enfraquecendo os laços de solidariedade e a ideia de pertencimento” (GADDOTTI, 2004 p.21).
  • 28. 26 Porque cada um exerce uma ação própria, a vida social se individualiza; e porque a contiguidade é criadora de comunhão, a política se territorializa, com o confronto entre organização e espontaneidade. O lugar é o quadro de uma referência pragmática ao mundo, do qual lhe vem solicitações e ordens precisas de ações condicionadas, mas é também o teatro insubstituível das paixões humanas, responsáveis, por meio da ação comunicativa, pelas mais diversas manifestações da espontaneidade e da criatividade.” (SANTOS, 2012, p.322.). Portanto cabe: Aos Municípios desenvolver com eficiência as competências que lhes correspondem em matéria de educação pelo qual devem organizar uma política educativa ampla e de alcance global, de maneira a incluir nela todas as modalidades de educação formal e não formal assim como as diversas manifestações culturais (GADOTTI, 2004, p. 29). As cidades são reconhecidas como verdadeiros espaços de aprendizagem e a educação possui um papel de assumir e compreender a diversidade: A educação tem que assumir a difícil tarefa de compreender e aceitar a diversidade, já que esta potencializa o enriquecimento entre os indivíduos e os grupos humanos, e evitar que esta se converta em fator de exclusão social. Para isso é necessário gerar os espaços de encontros e de integração”(GADOTTI, 2004, p.31).Grifo nosso Entendemos os CEUs como um desses espaços de encontros e de integração, numa “Esquina da Comunidade”. No escopo da cultura popular urbana, as esquinas são pontos de encontro de fundamental importância, possuindo quase sempre um bar, no qual se discute os mais variados assuntos (futebol, trabalho, política29 , religião, etc.), ou seja, a “Esquina da Comunidade” está intrinsecamente vinculada à produção de cultura popular, sendo, portanto interessante esta visão do equipamento CEU, pois durante a Gestão Kassab o mesmo foi esvaziado30 , afinal era visto apenas como um local de entretenimento, visão da qual não compartilhamos, pois a cidade já possui diversos espaços privados que funcionam sobre esta ótica, como os Shooping’s. Portanto o CEU, “Esquina da Comunidade”, objeto técnico capaz de alavancar a revanche da cultura popular, desde que devidamente apropriado, deve ser entendido como produtor de uma pedagogia urbana: 29 Veja que interessante a fala de Frei Chico irmão do ex presidente Luís Inácio Lula da Silva (2003-2009) sobre a importância do Bar da Rosa nas articulações políticas em http://docverdade.blogspot.com.br/2011/03/presidentes-da-america-latina-brasil.html. Acessado no dia 16/10/2014 04:20. 30 http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,publico-de-eventos-dos-ceus-cai-42-na-gestao-kassab,365064 Acessado em 16/10/2014 03:42.
  • 29. 27 “As contribuições da pedagogia urbana mais significativas são as seguintes: 1 – Ampliação do campo de ação pedagógica. 2 – Construção de valores democrático-participativos. 3 – Ressignificação da cidadania: de objetos urbanos a sujeitos. 4 – Multiplicação de redes educativas e culturais.” (GADOTTI, 2004, p. 35)” Sobre o esvaziamento do CEU nas gestões Serra/ Kassab leia o diálogo com Leda : Henrique- Mas ai mudou o governo, você notou diferença? Você reparou diferença de Marta pra Serra /Kassab? Leda – Deu muita diferença, foi o Kassab que venho depois? Henrique - Venho o Serra ele ficou um ano e pouco ai entrou o Kassab, porque o Serra foi ser candidato ao governo. Leda - Isso ele abandonou né. Então, mas ai piorou muito. Deu uma caída boa o CEU, porque no tempo dela era muito bom. Eu lembro que tinha muito teatro, tinha teatro pra adulto, e teatro infantil eu ia aos dois porque eu gosto de teatro, participava dos dois, tinha peças boas, depois do Serra caiu muito o CEU. E com Marcio : Marcio - E a população se apropriou porque ela sabia na gestão Marta, eu acompanhava, frequentava o CEU direto, que toda sexta e sábado a noite tinha um filme, que todo mês um sábado tinha uma peça de teatro. Criou um hábito. Tem um rapaz aqui do lado o Mario que ele falava “ –Eu sabia que toda sexta ou sábado eu podia ir lá que tinha um filme, mas quando o Serra/ Kassab entrou acabou com isso”. Isso daqui virou um condomínio fechado. Eu conto umas historias aqui e passo por mentiroso cara, mas é verdade. No primeiro mês que entrei aqui, eu recebi uma denúncia de uma pessoa do Recanto dos Humildes que tava lendo e foi expulso da biblioteca. Eu falei vem cá me conta esta historia direito. Ele falou eu sou casado e tenho filho pequeno, eu gosto de ler, e o único lugar que eu consigo ler tranquilo é aqui na biblioteca, e nesse dia me tiraram da biblioteca eu tava lendo, não sei por que falaram que ia ter um evento. Ai chamei à bibliotecária e perguntei por que tiraram o rapaz da biblioteca? Ela falou que toda última sexta feira do mês a Natura faz uma exposição na biblioteca pra vender produtos! Henrique- Apropriação privada do bem público! Marcio - Isso. Era isso que acontecia. Isso daqui foi desmantelado.Grifos nosso. 1.5 - Conselho Gestor Nosso país possui uma democracia nova. E seu passado autoritário ecoa forte nos atuais tempos, pois apesar da pressão popular, a transição foi arquitetada por cima com a eleição indireta de Tancredo Neves na década de 1980 pelo colégio eleitoral. Porém, José
  • 30. 28 Sarney, advindo das fileiras da ditadura assume a presidência após a morte de Tancredo, promovendo uma distribuição nada democrática de transmissoras de rádio e televisão a políticos em troca de apoio. Manteve-se assim uma tradição autoritária na execução das políticas públicas. Algumas instituições, como a Polícia Militar não se democratizaram, atuando ainda sobre a ótica ditatorial do inimigo interno, tratando a sociedade civil, e principalmente aqueles que reivindicam melhores condições de vida, com forte truculência. Por isso, enquanto instituição nova, a proposta intersetorial dos CEUs é importante para a construção e fortalecimento da democracia, pois abrangem diversas áreas tais como meio ambiente, educação, emprego e renda, participação popular, desenvolvimento local, saúde, cultura, esporte e lazer, afirmando-se dessa forma como um espaço de afirmação de direitos e de promoção da cidadania, como coloca o Decreto de Regulamentação dos Conselhos Gestores: 1° O Conselho constituir-se-á em instância permanente de debate e de articulação entre os vários equipamentos que integram o CEU, tendo em vista o atendimento das necessidades comuns e a solução dos conflitos que possam interferir em seu funcionamento (DECRETO Nº 50.738, de 15 de Julho de 2009) Assim, a participação no Conselho Gestor da população torna possível uma melhor construção dessa proposta intersetorial, pois as demandas são colocadas, debatidas, construindo-se soluções conjuntas para os problemas específicos de cada CEU. A construção desse espaço comunitário atua como princípio da Cidade Educadora. E para a constituição de uma tradição democrática de participação é necessário que : Os governos locais possuam mecanismos institucionais adequados que deem a um número representativo de cidadãos a possibilidade de intervir no planejamento urbano e na construção de políticas públicas necessárias para o planejamento da cidade presente e futura. E nós cidadãos devemos aprender a participar ativamente na conquista e construção das nossas cidades.(GADOTTI, 2004 p.33) Identificamos na fala dos nossos entrevistados alguns problemas com o Conselho Gestor : Acho que falta participação da comunidade, é fácil chegar e reclamar, mas a comunidade não ta participando, só tá indo eu e a Maria, eu sozinha é difícil, agora o conselho tá mais formado por professores, lógico que eles vem o lado deles, mas acho que a comunidade ta perdendo com isso, ninguém quer se envolver ninguém quer dar a cara a tapa pra mim sozinho é difícil.Leda Conseguimos eleger um conselho gestor só no meio do ano, mas mesmo assim ele não é um conselho gestor participativo pleno, mas isso daí
  • 31. 29 é outra coisa que a gente vai retomar aos poucos a participação no conselho. As pessoas tão retornando a participar agora do CEU, é uma coisa lenta, a gente quer que se apresse, mas é lento, mas tá voltando a participação.É uma coisa legal isso. Marcio A política adotada durante oito anos pelas gestões Serra/Kassab (2005-2012) promoveu um esvaziamento intencional do debate político dentro do CEU, tornando o Conselho Gestor um órgão esvaziado, apesar da sua grande importância. Porém, acreditamos assim como nosso entrevistado José Soró, que a questão da autonomia do CEU como um todo acaba por influenciar na participação, pois o Conselho Gestor fica preso a esta dependência de decisões externas, sendo, portanto, em nossa visão mais um instrumento consultivo do que deliberativo: Olha, eu tava pensando nisso hoje, você me cutucou. Fiquei pensando em como pode ser um desenho viável pro CEU, por que ele fica preso na própria lógica dele, forma dele, e não se potencializa no que foi pensando nele como política pública, não materializa aquilo que se esperava dele enquanto força dinâmica. Há que se pensar, acho que os CEUs deveriam ser organismos autônomos, inclusive do ponto de vista orçamentário. Ai a gestão integrada teria o papel de construir projetos próprios de características locais, de cada região. Mas não tendo isso não cumpre esse papel. Mesmo a gestão Haddad, que eu respeito, neste aspecto não oferece nenhuma esperança que vai mudar esse enquadramento. José Soró. Após esta breve análise desses instrumentais vinculados ao Projeto CEU ficamos instados a propor que tal equipamento pode contribuir para a resolução daquilo que chamamos de Questão Periférica, possibilitando a construção de uma Centralidade da Periferia. Desenvolveremos esta tese no próximo capítulo.
  • 32. 30 2 - A Questão Periférica “Todos os homens são intelectuais, poder-se-ia dizer então: mas nem todos os homens desempenham na sociedade a função de intelectuais” Antonio Gramsci, Os intelectuais e a organização da cultura. Após a análise da concepção do Projeto CEU, fica a questão: será que tal equipamento é capaz de resolver nossa Questão Periférica, permitindo a construção de uma Centralidade da Periferia. Devemos entender primeiramente o que seria esta Questão Periférica. O Comunista italiano Antonio Gramsci (1891-1937) se questionava quanto a Questão Meridional verificada em sua terra natal: Afirmamos que o camponês meridional esta ligado ao grande proprietário rural por meio do intelectual. Este tipo de organização é o mais difundido em todo o Mezzogiorno e na Sicília. Forma um monstruoso bloco agrário que no seu conjunto funciona como intermediário e guardião do capitalismo setentrional e dos grandes bancos. Seu único objetivo é conservar o status quo.(GRAMSCI in : SINGER,2002 p.9) Intrigava o comunista italiano o fato dos camponeses pobres do Sul formarem um grande bloco histórico ligado aos grandes proprietários, protegendo o capitalismo dos grandes bancos do norte da Itália, mantendo um status quo que era prejudicial a tais camponeses. Como citado acima o papel dos intelectuais nessa composição era fundamental. No Brasil, André Singer, em sua análise quanto aos Sentidos do Lulismo,31 investiga a possível resolução daquilo que ele chama de Questão Setentrional, na qual dessa vez ocorre um deslocamento das massas rurais exploradas, principalmente no Nordeste brasileiro, que até 2006 estavam ligadas aos grandes proprietários rurais, representados em nossa democracia no antigo PFL (Partido da Frente Liberal) - atual DEMOCRATAS - para o Lulismo. Tais massas beneficiadas pelas políticas públicas do primeiro mandato de Luis Inácio Lula da Silva (2003- 2006), tais como o Bolsa Família, Crédito Rural, Luz para todos, fortalecimento do salário mínimo, entre outras fazem tal deslocamento de apoio, consagrando Lula com um segundo mandato em 2006. 31 SINGER, André Vitor. Os Sentidos do Lulismo: reforma gradual e pacto conservador. 1ed. São Paulo. Cia das Letras,2002.
  • 33. 31 Entendemos então, que o CEU como ferramenta construtora de intelectuais orgânicos pode promover a resolução da Questão Periférica colocada da seguinte forma: Por que as massas periféricas da Cidade de São Paulo tendem a se alinhar a um conservadorismo direitista que invariavelmente tende a prejudicar tais classes? Pois tal visão de mundo não está preocupada em buscar resoluções para as desigualdades sociais, além de atuar de forma a barrar atitudes que tem esse objetivo, como é o caso da descaracterização promovida nos CEUs construídos nas Gestões Serra/Kassab32 . O nosso entrevistado Marcio conta uma história interessante da visão de Serra sobre os CEUs: Tem uma piada, não sei se é piada ou se é verídico33 . Dizem que o Serra quando assumiu, reuniu seus secretários e falou: “-Vou fechar os CEUS”. Ai o pessoal saiu foi pros bairros que tinha CEU : “-Serra é bom não fechar”. Ai ele falou: “- Então não vou construir mais nenhum”. Ai o pessoal saiu pros bairros voltou. “ - Olha Serra é bom fazer (risos)”. “-Vou fazer. Mas vou fazer mal feito.” Marcio Aqui o papel de intelectuais orgânicos ligados aos setores conservadores, tais como José Luiz Datena34 e Marcelo Rezende35 ajudam a explicar essa aderência. Porém, entendemos que as políticas públicas executadas nos CEUs podem agir como uma contra hegemonia no sentindo de criar intelectuais orgânicos vinculados a classe trabalhadora, tendendo a se aliar a setores progressistas da Cidade, pois como coloca Singer (2012, p.23) : “As classes podem transformar-se em classes para si, isto é, conscientes de seus interesses e dispostas a lutar por eles no plano da política.” A ação política no caso do Projeto CEU encampada no mandato de Marta Suplicy (2000-2004) baseou-se fortemente no terreno da realidade efetiva, pois: O político em ação é um criador, instigador, mas não cria nada nem se move no vazio turvo de seus próprios desejos e sonhos. Ele se baseia na realidade efetiva. O que é, porém, essa realidade efetiva ? Será por acaso algo estático ou imóvel, ou, antes, uma relação de forças em constante movimento, alternando continuamente o equilíbrio ? Aplicar a vontade na criação de um novo equilíbrio de forças realmente existente e 32 Arquitetos criticam os CEUS de Serra. http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/20051210-40961-nac-53-cid- c1-not Acesso em 20/10/2014 acesso em 20/10/2014 08:10. 33 História verídica ou não o fato é que José Serra possui um grande desprezo pelo Projeto CEU. Veja: http://poderonline.ig.com.br/index.php/2012/04/21/serra-diz-que-os-ceus-sao-iguais-a-qualquer-outra-escola/ 02/11/2014 21:20. 34 Apresenta o programa policial Brasil Urgente na Bandeirantes. 35 Apresenta o programa policial Cidade Alerta na Rede Record.
  • 34. 32 operantes, baseando-se em determinada força que se considera progressista e reforçando-a para levá-la ao triunfo, é se mover sempre no terreno da realidade efetiva, mas para dominá-la e superá-la ou contribuir para isso.(GRAMSCI, previsões e perspectivas In SADER, 2012 p. 36-37 ) Grifo nosso. Entendemos o Projeto CEU como um fortalecimento das forças progressistas. De todo um movimento que existe na periferia, convergindo para o CEU, desde que ele esteja aberto á participação. Veja este caso interessante no CEU Perus: Quando a gente chegou aqui no ano passado a pista de skate tava detonada e a gente não tinha dinheiro pra consertar. Até recebi denúncia que tinha ferro solto, tava perigosa. Falei quer saber de alguma coisa, chama essa molecada. Esta pista é muito usada, num mês fizemos uma medição passam por dia em torno de cem a duzentas crianças, jovens e adultos. Chama essa molecada pra conversar. Temos que fazer a reforma. Que reforma eles querem que faça ? E tem um menino ai campeão brasileiro de skate, o Feijão, que já foi pra Barcelona, já foi pra Dinamarca. Falei pra ele coordena a molecada ai e vamos conversar. Ai nos vimos que o problema era maior, além da pista de skate tinha uma molecada que usava bicicleta. Eles falaram “- Porque a gente não faz uma pista de bicicleta do lado?” Eu falei: “- Beleza vamos fazer juntos porque sozinho eu não consigo”. Fomos na diretoria regional: “-Olha tem que reformar”. “- Vai custar caro?” “-Não.” “-Então a diretoria banca.” Tinta, quem vai pintar? Chama o coletivo de grafite de Perus, chama o Danilo chama o Bonga chama o Perusferia e vamos fazer. O Feijão coordenando tudo. No dia do Emicida aqui no teatro nos fizemos à inauguração da pista lá, todos os grupos de hip hop da região vieram tocar, cara a molecada chorava, porque quem fez a reforma foram eles. Ai venho o pessoal da bicicleta: “- E nossa pista ?” “ -Bem vamos lá na diretoria, o que precisa ? “ - Precisa terra. “ - Se a sub prefeitura autorizar a gente faz.” A subprefeitura autorizou. Pegaram terra no rodo anel com o caminhão do depósito aqui de baixo, e pronto fizeram a pista de bicicleta. Nos apenas intermediamos. Quem fez foram eles. Isto pra mim já valeu a pena, um negócio assim indescritível. Marcio. Voltando a Gramsci, possuindo uma concepção dialética da histórica ele faz uma distinção entre movimentos conjunturais e movimentos orgânicos : No estudo de uma estrutura, é necessário distinguir os movimentos orgânicos – relativamente permanentes- dos movimentos que podem ser
  • 35. 33 chamados de conjunturais – que se apresentam como ocasionais, imediatos, quase acidentais... A distinção entre “movimentos” e fatos orgânicos e movimentos e fatos “conjunturais” ou ocasionais de ser aplicada a todos os tipos de situações. (GRAMSCI, previsões e perspectivas In SADER, 2012 p. 40-41) Lembrando que para Gramsci : É o problema das relações entre estrutura e superestrutura que precisamos colocar concretamente e resolver para chegar a uma analise justa das forças que operam na historia de um determinado período e determinar suas relações. Nenhuma sociedade se coloca problemas sem que existam condições necessárias e suficientes para sua solução, ou sem que essas condições estejam ao menos em via de aparecer ou se desenvolver (GRAMSCI, previsões e perspectivas In SADER, 2012 p.39 ) Assim, podemos compreender a eleição de Marta Suplicy em 2000 como um fato conjuntural, pois é o retorno de uma força progressista ao governo municipal, após oito anos de governos conservadores encarnados nas figuras de Paulo Maluf (1993-1996) e Celso Pitta (1997-2000) e o Projeto CEU, disputado politicamente na eleição de 2004, como um movimento orgânico, ou seja, algo permanente, sobrevivendo ao retorno conservador das gestões Serra (2005-2006) e Kassab (2006-2012), até a ocorrência de um novo movimento conjuntural, a eleição de Fernando Haddad em 2012, retornando o Projeto original do CEU enquanto pólo de desenvolvimento da comunidade não meramente como espaço de entretenimento. Para facilitar o entendimento podemos separar estes momentos da seguinte forma: 2000 – Eleição de Marta Suplicy (PT) – Movimento Conjuntural; 2003 - Execução Projeto CEU – Movimento Orgânico; 2004 – Eleição de José Serra (PSDB) - Movimento Conjuntural; 2012 – Eleição de Fernando Haddad (PT) - Movimento Conjuntural; A posse de Gilberto Kassab (na época no DEMOCRATAS hoje no PSD) ,em 2006, após a renúncia de José Serra para concorrer ao governo de São Paulo e, posteriormente, a reeleição de Kassab em 2006,fazem parte do mesmo movimento conjuntural de 2004 de fortalecimento do conservadorismo. Em 2012 ocorre o retorno de uma força progressista ao governo municipal encampada na figura de Fernando Haddad. O CEU apesar do seu esvaziamento, ou das tentativas de esvaziamento, seguiu enquanto um movimento orgânico,
  • 36. 34 permanente, passando pelas duas gestões conservadoras, e agora ressurge com força numa gestão de caráter progressista. O Haddad ele tem um olhar sobre o CEU, que eu acredito, muito legal. Na primeira reunião ele disse o seguinte, o CEU tem que ser a menina de olhos dessa prefeitura, O CEU tem que ser o lugar onde eles vão falar mudou. O PT tá ali mudou, não só o PT porque nem todos os gestores são do PT, mas a administração do PT tá ali mudou a relação com a comunidade. Marcio Portanto entendemos que o Projeto CEU – movimento orgânico, permanente - se propõe a fortalecer a classe trabalhadora enquanto força progressista de transformação da realidade desigual brasileira sem do assim um fator de extrema importância para a resolução da nossa Questão Periférica.Vejamos um exemplo interessante que ocorre no bairro de Perus extremo noroeste da Capital Paulista. 2.1 Queixadas e o CEU Perus O Centro Educacional Unificado de Perus é um caso emblemático na luta política contra hegemônica. Entendido pelo seu Gestor como uma Esquina da Comunidade, está fortemente atrelado as questões do bairro, como por exemplo ao Movimento pela Reapropriação da Fabrica de Cimento de Perus36 . Este movimento tem como origem a Greve dos Queixadas, trabalhadores da antiga Fábrica de Cimento da região que na década de 1960 promoveram uma grande greve na luta por melhores condições de trabalho. Atualmente, existe no bairro este movimento pela reapropriação da fábrica com vistas a torná-la um ponto de memória e cultura da classe trabalhadora37 . Suas reuniões ocorrem dentro do CEU Perus, que expõe também atividades diversas sobre a memória da fábrica, tais como exibição de filmes, palestras e exposições sobre a história do movimento dos Queixadas, promovendo a construção de um sentimento de pertencimento ao bairro por parte das gerações mais novas. E a desapropriação da fábrica será a coroação de uma luta antiga dos trabalhadores desta região: Conseguimos criar uma ideia de parque dos Queixadas no território que é da fábrica, um território cultural que envolve Jaraguá, Anhanguera e Perus. É um mecanismo de proteção, a gente não tem a 36 Sobre o Movimento Pela Reapropriação da Fabrica de Cimento de Perus acesse : http://movimentofabricaperus.wordpress.com/ Acessado em 17/10/2014. 17:30. 37 Veja algumas questões importantes que envolvem a luta política em Perus no link a seguir : https://drive.google.com/file/d/0BxR7Lnu7EeUiNDdaOWN5T3hHRWs/view?pli=1 formando toda uma rede cultural sendo o CEU Perus um polo irradiador fundamental dessa luta. Acesso em 20/10/2014 10:00.
  • 37. 35 fábrica por que continua privada , mas vamos criando movimentos entorno que vão dificultando essa degradação, a possibilidade do cara vender etc. E o movimento recuperou sua vitalidade, tem uma integração muito grande com os coletivos, as ações são até autônomas do movimento, cada coletivo inventa sua ação. E todos tem claro que precisamos conquistar a fábrica, ela é um elemento simbólico vital.” José Soró Vista aérea da fábrica de cimento de Perus.38 Assim o CEU aberto aos movimentos que permeiam as comunidades do seu entorno torna-se um fator de construção da Centralidade da Periferia. 38 Imagem retirada de : http://hrechi.blogspot.com.br/2011/04/fabrica-de-cimento.html Acesso em 02/11/2014 22:20.
  • 38. 36 Conclusão - Centralidade da Periferia. Milton Santos (2008) discute diante da globalização perversa uma possível centralidade dos países periféricos em relação aos blocos, países hegemônicos mundiais (notadamente Estados Unidos da América, União Européia e Japão). O autor vaticina que o novo será promovido pelos “debaixo”, os excluídos, que produzem uma contra ordem à globalização expropriadora. Essa análise se faz interessante na produção do espaço da capital Paulista, notadamente segregador no qual as classes populares, ou seja, os “debaixo” foram expropriados do centro39 e de suas promessas. Podemos entender, então, que os CEUs podem propiciar aos periféricos, através da sua correta apropriação de seus variados equipamentos, o referencial dito por José de Souza Martins (2008), facilitando assim a construção da crítica social e política do seu periferismo e uma possível resolução da Questão Periférica, ou seja, o desvinculamento da classe trabalhadora dos setores conservadores que a oprimem. Dessa forma, se constitui assim o tempo de possibilidades: O que conta mesmo é o tempo das possibilidades efetivamente criadas, o que, à sua época, cada geração encontra disponível, isso a que chamamos tempo empírico, cujas mudanças são marcadas pela irrupção de novos objetos, de novas ações e relações e de novas ideia”. ( SANTOS, 2008,p.117 ). Essa questão é colocada em nossas entrevistas : Henrique – E o que você pensa do futuro, essa criançada que cresce com esse tipo de escola, que já entra desde sempre no CEU, seis, sete, oito anos? Leda - A educação é outra né, eles têm várias coisas boas pra aproveitar, várias atividades, se eles tiverem a cabeça boa vão aproveitar bastante coisa ai. Fechamos aqui nossa busca pela Totalidade. Porém, fica claro para nós que ela é uma Totalidade incompleta, nossos atores sociais entrevistados e a relação cotidiana do autor com o CEU Pêra Marmelo e CEU Perus, além dos movimentos que circulam no entorno provam que o CEU é apenas mais um fator da construção da Centralidade da Periferia. Porém, um fator muito forte e significativo, suas paredes de concreto pulsam quando as pessoas 39 Veja nesta reportagem http://reporterbrasil.org.br/gentrificacao/haddad-e-alckmin-juntos-para-riscar-do-mapa- favela-do-moinho/ a imensa luta dos moradores da Favela do Moinho, a última a resistir no Centro de São Paulo contra a especulação imobiliária. Acesso em 20/10/2014 08:00.
  • 39. 37 encontram- se ali naquela Esquina da Comunidade para debaterem as diversas questões que perpassam-o seu entorno. E tais paredes reverberaram as soluções mais criativas e produtivas para estas questões, pois são criadas pelos próprios atores locais. E as novas gerações da periferia nascem já com um novo objeto técnico ao seu dispor, com grandes possibilidades de construção de novas ações, relações e novas ideias. Sendo esta uma das formas de construção de uma Centralidade da Periferia na Capital Paulista, com a emergência da cultura popular.
  • 40. 38 Referências bibliográficas ARBEX JR., José. O poder da TV, Scipione. 1997. 96 p. BONDUKI, Nabil e ROLNIK, Raquel – Periferia: Ocupação do espaço e reprodução da força de trabalho, Cadernos de Estudos e Pesquisas PRODEUR/FUPAM2, FAU- USP.1978. P 117- 149. GADOTTI, Moacir (org.). Cidade Educadora: princípios e experiências. São Paulo, Cortez : Instituto Paulo Freire; Buenos Aires : Ciudades Educadoras América Latina,2004. MARTINS, José de Souza, A aparição do demônio na fábrica: origens sociais do Eu dividido no subúrbio operário; fotografias do autor – São Paulo: Editora 34, 2008. OLIVEIRA, Francisco de. Elegia para uma re(li)gião: SUDENE, Nordeste, planejamento e conflitos de classes. 5. ed. Rio de Janeiro (RJ): Paz e Terra, 1987. 137 p. PACHECO, Reinaldo Tadeu Boscolo. O espetáculo da educação: Os Centros Educacionais Unificados do Município de São Paulo como espaços públicos de lazer / Reinaldo Tadeu Boscolo Pacheco; Orientação Vitor Henrique Paro. São Paulo: s.n. 2009.Tese de Doutorado. PADILHA, Paulo Roberto e SILVA, Roberto da (orgs.). Educação com qualidade social: a experiência dos CEU's de São Paulo. São Paulo: Instituto Paulo Freire, 2004. PREFEITURA DE SÃO PAULO. CEU’s da rede municipal de São Paulo. IN: http://portalsme.prefeitura.sp.gov.br/documentos/CEU/mapa_ceu.pdf. Acesso em: 04/05/2013 – 22h05min. PREFEITURA DE SÃO PAULO. Decreto de Regulamentação dos Conselhos Gestores: DECRETO Nº 50.738, de 15 de Julho de 2009. PREFEITURA DE SÃO PAULO. Endereços dos CEU’s. IN: http://portalsme.prefeitura.sp.gov.br/documentos/CEU/enderecos45ceus.pdf. Acesso em: 04/05/2013 - 22h00min. PONTUSCHKA, Nídia Nacib. Para ensinar e aprender Geografia. 3°Ed.São Paulo, Cortez,2009. SADER,Emir (org.). Gramsci: poder, política e partido; tradução : Eliana Aguiar. 2. ed. São Paulo : Expressão Popular,2012. 144p. SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção.4 ed, 7.reimpr. São Paulo,Editora da Universidade de São Paulo.2012.
  • 41. 39 . “ Entrevista com o professor Milton Santos”. Caros amigos, n.17, São Paulo, ago.1998. Entrevistadores : Maria Amaral, Sergio Pinto de Almeida, Leo Gilson Ribeiro, Georges Bourdoukan, Roberto Freire, João Noro, Sergio de Souza. . Espaço e método. São Paulo, Nobel, 1985. .O espaço geográfico como categoria filosófica, IN : Terra Livre – n.5 – O Espaço em questão. Ed. Marco Zero, AGB, 1988. .O papel ativo da geografia : um manifesto. In: Milton Santos e o Brasil. Maria Brandão (org.) São Paulo.Editora Perseu Abramo,2004.p.261. .Por outra globalização: do pensamento único à consciência universal / Milton Santos. - 16 Ed. - Rio de Janeiro: Record, 2000. SINGER, André Vitor. Os Sentidos do Lulismo: reforma gradual e pacto conservador. 1ed. São Paulo. Cia das Letras,2002. SOUZA, Ricardo de. A educação social em espaços de experimentação pedagógica: as potencialidades dos CEUs / Ricardo de Souza; orientação Roberto da Silva. São Paulo: s.n. 2010. 301 p. SUPLICY, Marta. O preconceito ideológico contra os CEUs.O Estado de S. Paulo.São Paulo, 06 de agosto de 2003,p.2.
  • 42. 40 Apêndice O autor do trabalho foi candidato eleito com 19 votos a representante da comunidade no Conselho Gestor do CEU Pêra Marmelo no ano de 2011.
  • 43. 41 Anexos Anexo 1 - Íntegra das entrevistas realizadas: Leda Maria de Moutta Ferro- Moradora da Vila Aurora, frequentadora do CEU Pêra Marmelo e presidente do Conselho Gestor - Entrevista realizada em 23/10/2014 – às 15 horas na casa da Leda. Henrique - Gostaria começar pedindo que você se apresentasse se sempre morou aqui na Vila Aurora? Leda - Eu vim de Paranapiacaba (Santo André), faz mais de 15 anos, meu filho não conseguiu escola, ai saiu o CEU pra sobrar mais vaga, ele tava numa escola longe, no Aldo, não conseguiu vaga no CEU, foi para o Veríssimo. Henrique – Você lembra como foi a formação do CEU, se você participou, como que foi ? Foi em 2002, 2003, por aí? E como foi esse começo? Eu lembro que ali era um campinho de futebol. Leda- Participei, participei. Vai fazer 11 anos mês que vem (novembro de 2014).Isso ali era um campinho de futebol. Henrique – E como foi você lembra? Leda – A Mara que era representante de bairro sabia da nossa luta por vaga na escola, e chamou a gente pra participar, ai ela falou do CEU, já sabia que ia sair. Mas no começo eu fiquei em duvida, fui de porta em porta pedir abaixo assinado pro pessoal, ai quando falou que era uma escola assim que ia ter piscina, ia ter isso, aquilo, eu duvidei, ai eu falei meu deus se não sair isso daí eu vou apanhar na rua. Henrique - Na época você passava e falava essas características. Que ia ter piscina, quadra teatro? Leda- Isso, falava que ia ser tudo junto uma coisa só, mas mesmo assim eu duvidava, tinha medo (risos) ia apanhar. Cheguei a trabalhar na política nessa época, mas graças a deus saiu deu certo. Mas Eu ficava aqui de casa que da pra ver, eles trabalhando dia e noite, cada coluna que eles colocavam eu ficava olhando aqui a primeira coluna a segunda coluna desde o começo.
  • 44. 42 Henrique – É eu lembro que passava ali na Pêra Marmelo dava pra ver batendo a estaca, ficava curioso, mas eu não participei de nada era novo ainda. Você chegou a vir no dia da inauguração Leda – Sim, nos fizemos um bolo na padaria do CEU, porque aquela padaria era pra comunidade aprender panificação, mas parece que acabou eu cheguei a aprender a fazer bolo ali, matinha um professor, mas acabou, e hoje a padaria. Henrique- Hoje virou uma cozinha. Leda – Mas aquilo lá era pra comunidade aprender a trabalhar, que nem as maquinas de costura, tem ali, mas nuca ninguém ensinou, que era pro pessoal aprender a trabalhar nas maquinas industriais mas ate hoje não se usou, a intenção da Marta era boa, pro pessoal aprender a trabalhar. Henrique – Mas ai mudou o governo, você notou diferença? Você reparou diferença de Marta pra Serra /Kassab? Leda – Deu muita diferença, foi o Kassab que venho depois? Henrique - Venho o Serra ele ficou um ano e pouco ai entrou o Kassab, porque o Serra foi ser candidato ao governo. Leda - Isso ele abandonou né. Então, mas ai piorou muito. Deu uma caída boa o CEU, porque no tempo dela era muito bom. Henrique - Eu lembro que tinha muito show, cheguei a ver show ali na pista de skate. Leda - Eu lembro que tinha muito teatro, tinha teatro pra adulto, e teatro infantil eu ia aos dois porque eu gosto de teatro, participava dos dois, tinha peças boas, depois do Serra caiu muito o CEU. Henrique - E como era sua relação com cultura antes do céu, teatro? Leda – Nenhuma. Henrique - Você acha que facilitou? Você já tinha visto teatro antes? Leda - Sim com pouca frequência, por que era muito longe e caro. Ai o CEU venho pra cá. Eu comecei a ver bastante. Todas eu assistia, de criança e de adulto e passava filme também, tinha bastante filme, mas cortaram tudo isso. Henrique - E quais outras atividades você fazia? Leda - Sempre fiz ginástica, hidro, alongamento, tudo que tem eu faço, caminhadas, artesanato da melhor idade, conselho gestor. Procuro sempre tá por dentro das coisas que vão ter. Henrique - E o seu filho chegou a fazer algum curso por fora?
  • 45. 43 Leda - Chegou a fazer judô, mas no tempo do Serra acabou agora parece que tem umas crianças fazendo, mas meu filho cresceu né ai não deu mais. Henrique - E agora com essa mudança de prefeito, dois anos de Haddad, você acha que de uma modificada, voltou à fase da Marta? Leda - Olha voltar à fase da Marta é difícil igual à Marta não tem, fiquei ate triste que ela não ganhou, pelo tanto que ela fez, mas voltar do jeito que era ela é difícil. Henrique - E a questão do conselho gestor? Que eu participei também, vamos falar um pouco, o que você pensa sobre ele, acha que falta participação? Leda – Acho que falta participação da comunidade, é fácil chegar e reclamar, mas a comunidade não ta participando, só tá indo eu e a Maria, eu sozinha é difícil, agora o conselho ta mais formado por professores, lógico que eles vem o lado deles, mas acho que a comunidade ta perdendo com isso, ninguém quer se envolver ninguém quer dar a cara a tapa pra mim sozinho é difícil. Henrique – E o que você pensa do futuro, essa criançada que cresce com esse tipo de escola, que já entra desde sempre no CEU, seis, sete, oito anos? Leda - A educação é outra né, eles têm várias coisas boas pra aproveitar, várias atividades, se eles tiverem a cabeça boa vão aproveitar bastante coisa ai. Vários esportes, as professoras dedicadas. Eu acho que se eles tiverem a cabeça boa vão aproveitar bastante, meu filho infelizmente não conseguiu vaga ai, o tanto que eu lutei, mas não deu. Agora virou uma bagunça porque no meu tempo ter que comprovar que morava perto da escola, agora vem gente de longe, aqui briga com o Pedrinho do campo (Dono do terreno onde foi construído o CEU Pêra Marmelo.). Henrique – Ele não queria ceder o terreno? Leda - Sim, mas no fim deu tudo certo. Mas você vê com tanta luta meu filho não entrou ai, mas vem criança de longe. Henrique – Fala um pouco pra mim sobre o baile da melhor idade esta integração desde quando tem o baile? Leda – Desde o começo tinha a Ana Claudia do telecentro, ai a gente começou a fazer o baile era um bailinho pequeno pouca gente, a gente colocava mesinhas, mas cresceu tanto que hoje não cabe mais mesinha, ai começou a vir gente de fora, do CEU vila Atlântica e nos vamos ao baile lá. Henrique – Ai tem essa integração, o pessoal de lá vem aqui e o daqui vai pra lá? Leda - Isso, e é bom que a gente conhecesse muita gente, é muito bom o lhe dar com o pessoal da melhor idade e tem também o artesanato, conseguimos ai uma parceria com uma
  • 46. 44 pessoa que estudou gerontologia, e visa o bem esta dos idosos, ai com a gente ela vai ver essas questões de leis, estatuto do idoso, estas coisas assim porque a gente tem muita dúvida, das leis, dos direitos dos idosos. Eu já conhecia ela, do tempo da marta, mas ai no tempo Serra/ Kassab era foi posta de lado e ai ela voltou agora. Henrique – Falando de direitos aqui vai virar polo de direitos humanos? O que você pensa disso? Leda – Tudo que for feito pra comunidade pra melhorar é bem vindo, porque o pessoal não se liga muito nessas coisas de informação, de direito de educação a gente tem que saber tem que ta por dentro. Henrique - E a comunicação do CEU? Você acha que é eficiente? Leda - Então eles põem avisos, tem a programação do mês inteiro, mas tem gente que fala assim pô você não me avisa, mas ta lá pra todo mundo vê, tem aqueles painéis, tem na parede, é uma questão de parar e olhar, ler né! Se programar, eles divulgam sim é bem divulgado. Henrique – Pra finalizar o que você tem a dizer sobre sua relação com o CEU e o que você pensa do futuro dele? Como você vê essa dinâmica do governo atual, da comunidade. Leda – Você conhece o CEU aqui, você já foi CEU do Kassab? Olha o teatro é pequenininho, não e igual esse o teatro daqui já venho muita gente aqui e todos elogiaram o teatro daqui eu já fui no teatro Butantã, porque antes eu fazia o vocacional fui se apresentar lá.O teatro era pequenininho.o nosso daqui é grande os da marta são melhores. Henrique - Você fazia o vocacional? Leda - Fiz durante um ano. Era dança. É legal mas não era o que eu queria eu queria dança de salão,sempre lutei pra vir dança de salão aqui mas não venho,porque o vocacional é mais expressão corporal alongamento, pé legal mas não era o que eu queria dança de salão mesmo e o que mais você perguntou ? Henrique- Sobre a relação do CEU e a comunidade o que você pensa pro futuro? Leda - Era bom que a comunidade participasse mais, não só de deixar o filho lá, mas participasse da vida do CEU que nem eu fico lá. Henrique - Saber o que ta acontecendo Leda - Exatamente porque as pessoas só deixam o filho lá e vão pra casa, e não é assim tem que participar, tem que estar por dentro de tudo o que acontece, se você acha que não tem uma coisa legal tem que ir lá no conselho e reclamar, porque uma pessoa sozinha dá a impressão que é picuinha minha , que só eu que to vendo Henrique - Não tem uma demanda unida.
  • 47. 45 Leda - Não tem, na outra gestão tinha mais comunidade participando era melhor, agora eu fico ali de bobeira, eu falo, elas acham que o direito delas ta certo. Henrique - Então o que você pensa é que a galera precisa participar mais? Leda - Isso você tem que ficar integrado ali, tem que saber tudo o que acontece, porque isso daí é nosso é da comunidade, o pessoal que ta ali ta ganhado pra trabalhar, a gente tem que ter o melhor, e pra gente querer o melhor a gente tem que ta integrado ali, participar, isso daí falta muito. Henrique - Bem e você quer falar mais alguma coisa? Leda - Não, (risos) acho que já falei tudo acho. Já falei demais. Henrique - Então agradeço e estamos ai. Participar, vou ver a questão do horário. Leda - Ah deixa eu falar uma coisinha o meu vice me deixou na mão (risos) , mas eu sei você tava estudando. Henrique - Vou ver re retorno (risos).
  • 48. 46 José Soró – Agente cultural de Perus, Diretor da Agendes – Agencia de Desenvolvimento Cultural. Entrevista realizada no Quiosque do CEU Perus no dia 25/10/2014 às 15 horas. Soró- Eu fiquei curioso né, eu não trabalho no CEU, fiquei pensando por que você quer me ouvir ? Henrique -Mas aí que ta a graça (risos). Eu queria que você se apresentasse, José Soró, onde nasceu ? Quanto tempo mora aqui em Perus ? Soró - Eu nasci no mato grosso do sul, morei lá em fazenda ate os 11 anos, aí meu pai morreu, nos somos em 6 irmãos e minha mãe, ai um tio meu que morava em São Paulo meio que resgatou a gente , trouxe pra São Paulo, ai viemos morar em perus em 1976, aí fiquei por aqui e de alguma maneira essas historias que tinha em Perus acabou atraindo muito, eu cheguei num período que da minha casa dava pra ver tas manifestações no portão da fabrica, tanques ainda da ditaduras e tal, essa coisas aguçavam. Henrique – Impactaram ? Soró – Impactaram. Ai quando entrei na escola, entrei com doze anos no Candido Portinari, eu já sabia ler e escrever, antes não tinha estudado por que onde morava não tinha escola, mas tinha aprendido a ler e escrever com gibis essas coisas e fui aprendendo, mas tive que entrar na primeira serie, era um gigante, interessante né porque ali já exercício um pouco o papel de mais velho, era o único lugar que tinha ou morrer de vergonha por ta ali com doze anos no meio de crianças de sete. Enfim, o Candido Portinari, é uma característica das escolas de Perus, era muito politizada, contava-se muitas historias dos queixadas,das lutas sociais que existiam no bairro, ai acabou não dando outra cara!! Um dia cruzei com um professor de historia e as coisas começaram a fazer sentido. Era interessante acompanhado um pouco o período de 79 das lutas pela... Henrique – Democratização ? Soró - Não, ainda era pela anistia e aquilo aparecia assim, ai começaram a aparecer às greves. Henrique Greves, tinha informação ? Soró – Tinha. E eu me lembro daquelas cenas da Vila Euclides, do Lula, que aquilo ali dava um calor, mas eu ainda não entendia por que. E as contrainformações eram muito grandes, sempre eram colocados como baderneiros enfim, e era sempre assustador esse clima
  • 49. 47 ainda de final da ditadura militar, mas aquilo chamava atenção, e tanto é que eu acabei entrando na militância política podemos dizer assim , mas não pelo PT, uma vizinha ia fazer campanha pro Janio Quadros e resolveu contratar o povo, e eu fui enfim NE era um bico, mas tinha aquele interesse porque vinha ai deputado conversar, ai tinha aquele interesse, mas acabei entrando pela porta errada, mas era a campanha de 82 e o lula aparecia mais vezes, porque tinha o horário eleitoral e aquilo começava a ferver, ferver, ferver dentro de mim, ai chegou à eleição e meu primeiro voto foi no Janio Quadros prefeito, mas acho que nunca mais cometi algum erro (risos). Mas me encantei por essa coisa do universo político, na eleição mesmo conheci algumas pessoas, alguns jovens aqui do bairro e já tinha alguns jovens discutindo a falta de cultura no bairro, e tinha um cara do PCB, Edson, por conta do Mario Covas ser prefeito ele era uma espécie de subprefeito, e ele era muito envolvido com arte e com cultura e começou a dar uma impulsionada também, ai a gente se juntou num grupo de pessoas, ai a gente criou um centro cultural, se chamava Ajuá. Henrique - Década de 80 ? Soró – 82,83, ai promovendo algumas coisas ai, ai acabei indo pro mundo político, fazendo militância política mesmo, achei que o PT era o que eu queria, aquela coisa com o lula e tudo, e sou apaixonado por política acho uma arte, e fui compreendendo desde a minha historia ate a realidade periférica de Perus que era muito violenta,fui começando a compreender esses conceitos de luta de classe, etc. ai fazer política não foi só um gosto uma adrenalina, mas um posicionamento pragmático político meso, quem eu era onde estava, e sempre fui muito revoltado com a pobreza né, e teve um certo desencanto com a minha infância né porque tudo que eu lembrava era muito bonito, mas depois você vai entendendo que meu pai era trabalhador, a máquina roçadeira que eu vi um dia e achei maravilhoso parecia de outro planeta, na verdade era a desgraça do campo e a consciência que meu pai era trabalhador que vivia aquela migração atrás de emprego , de colheita,estas coisas e tal ate que eu voltei um dia eu fui pro mato grosso uma época, tava tudo parado lá, ai nunca mais quis voltar, nunca mais tive essa coisa de voltar pra lá, mas acho que ganhei do ponto de vista do meu lugar no mundo e desde então participei dos movimentos sociais, aqui do bairro sempre muitos movimentos, luta de absolutamente de tudo, água asfalto, etc. Henrique – Bem eu fiquei curioso, você falou ai do Janio Quadros, e a vitoria da Erundina em 89 ? Soró – Ahh! Ai eu já tava bem descolado. Fiz parte assim de uma cristalização de uma identidade política fudida, que foi a história da Erundina. Eu comecei a participar da Igreja (Comunidades Eclesiais de Base) e toda essa ebulição que acontecia no Brasil, e tudo foi me
  • 50. 48 interessando bastante e fui aprendendo, e nessa época da Luiza Erundina, era muito interessante, eu fiz parte do PT acho que doze anos, assumi cargos, fui candidato etc. Mas não era muito meu encanto, mas entendo que era um caminho natural quando você faz militância partidária assumir cargos faz parte do percurso, mas da Luiza, o PT tinha uma proposta de ser de massas e de quadros40 e ele era mais que um partido, era um movimento cultural de mudança, e congregava diversos tipos de núcleos, neste sentido ele era de massas, por que a base tinha lugares pra falar, participação intensa, ele se constituía por núcleos, só em Perus tinha dois núcleos , e tinha uma participação muito direta desde o sujeito mais simples até o mais intelectual dentro do partido, e isso politizou muita , estudar, era um movimento que tinha aquilo de que tem que estudar, tem que se formar. Tanto até que na primeira reunião que eu fui, a pedagogia era horrível, os caras sentaram lá, sábado a tarde e abriram O Capital (risos) volume 1, e começaram a ler O Capital, era muito simples, mas essa consciência da necessidade de estudar, isso me favoreceu muito, assim de ganhar disciplina, de pensar de estudar fazer analise de conjuntura, e isso hoje acho que ficou muito pobre, essa necessidade de ter a disciplina de estudar não é visto como uma tarefa revolucionária, ai tem um empobrecimento enfim. Ai nesse caminho todo surge 88, que foi uma historia muito interessante. A parte diretiva do PT, que já era um núcleo em torno do Jose Dirceu,eles avaliavam que o melhor candidato era o Plínio por que ele era cristão,dialogava com a classe media pra perder aquele medo do PT. E a outra candidata era a Luiza Erundina, que vinha arrebentando tudo, zona leste com NE barro, tinha um discurso radical, que a cidade precisava arrebentar a cidade por que a cidade era muito complicada. Enfim, a direção bancou o Plínio, mas teve uma rebelião de bases interna, a cara do PT é a Erundina, e eu fiz parte desse movimento, era da articulação que era majoritária mas comecei a me desencantar um pouco com eles. E quando chegou as prévias as bases deram uma virada feia, tipo 80 por cento pra Erundina e ai criou um problema por que a direção se ressentiu e se afastou, então você tinha a máquina partidária controlada por essas pessoas e tinha uma candidatura lançada pelas bases, e a consciência imediata era vamos com o que a gente tem, boca,língua convencimento ai virou uma febre em são Paulo os núcleos todos se mobilizaram, lembro que aqui em perus a gente fez porta em porta duas vezes conversando com a pessoa e isso se generalizou pela cidade, ai não deu outra batemos o Maluf. Mas isso gerou um problema de governabilidade porque ela não tinha estrutura partidária, não tinha estrutura, montou um governo conforme a base apontou, mas não tinha sustentação. O primeiro ano foi muito difícil, mas isso foi bom 40 Sobre Partido de Quadros e Partido de Massas veja http://www.veduca.com.br/play/7283 Acessado em 02/11/2014 as 18:05.
  • 51. 49 porque as bases discutiam muito os diretórios indicavam o administração regional, tinha que ser alguém de perto, os cargos eram todos discutidos, pra todos os organismo de saúde, de não sei o que a gente montou conselhos populares, então tinha um participação muito intensiva, foi um ano de governo direto com as pessoas. Mas a sustentação institucional era complicada e ai eles tiveram que arregar por que a direção voltou e assumiu e falou que tinha que ser do nosso jeito também, ai o governo ganhou em capacidade funcional administrativa,mas fugiu um pouco das bases. Mas enfim esse papel esse momento é fundamental, essa é um pouco a minha escola de aprender a olhar o mundo. Henrique – Me fala mais um pouco ai da Erundina, ela que tomba a Fábrica de Cimento nesse momento ? Soró - Pois é, essa é uma historia ruim (risos) dela e nossa. No governo dela essas coisas de recuperar a memória, dar valor ao movimento sociais, o povo da área acadêmica vem em peso com a Chauí como secretaria de cultura , e começam a fazer um resgate de memória na zona leste e isso bateu aqui nos ouvidos do João Breno e do pessoal do sindicato. Ai rolou uma parceria e a secretaria de cultura venho pra cá e começou um estudo para efeitos de tombamento patrimonial e ao mesmo tempo um resgate da memória oral que ia sustentar esse tombamento imaterial por que em tese a fabrica não tinha elemento para ser tombada patrimonialmente então a historia da greve dos queixadas sustentou esse tombamento, durante quis um ano a gente ouviu uns 200 queixadas contando suas historias . E isso resgatou a ideia do centro de cultura do trabalhador que era uma ideia de 58 a gente resgatou, ai conseguiu o tombamento, faltava fazer a desapropriação e construir o centro de cultura e memória.Havias conversas com o SESC pra viabilizar o centro de cultura e a prefeitura precisava fazer a desapropriação. Foi feito o tombamento a gente celebrou na praça. Ai entrou no ultimo mandato da Erundina, ai aconteceu uma coisa complicada, o povo militante nos cargos começa a ir pra campanha, ai o governo começa a trabalhar mais lento. E havia uma crença também, não que ela seria reeleita por que não tinha reeleição, mas que a gente ia conseguir reeleger o sucessor, que na época era o Suplicy. Ai entramos nessa crença tanto eles do governo e a gente dos movimentos sociais, então a gente vai ganhar faz a desapropriação depois , ai se fudemos por que perdemos pro Maluf (risos). E FOI UM vacilo mesmo. Lembro que o João Breno que era um cara muito sabido falava olha não vamos entrar nessa onda, vamos acelerar as coisas e lembro que a gente mais militante falava assim que isso não seja pé frio não fala dessas coisas (risos) . E isso criou um vácuo, porque ela foi tombada mas não foi desapropriada.Ela continua pertencendo ao Abdalla que não conseguiu transformar ela pra outros negócios ai venho destruindo ela sistematicamente. Foi falta de mais esperteza que