Este documento apresenta uma antologia poética de 7 poemas de autores do século XX organizados por tema: paz, amizade e amor. Inclui poemas de Miguel Torga, Carlos Drummond de Andrade, Alexandre O'Neill, Eugénio de Andrade e Mia Couto.
1. Escola Básica e Secundária Quinta das Flores
Português – 10º ano
Contrato de leitura – 2º período
Antologia Poética
Francisco Simões, nº9, 10ºB
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3. Prefácio
Nesta minha antologia de poemas de autores do séc. XX, irei expor algumas obras do meu
agrado e de que gostei especialmente. Para tal, decidi organizá-las neste documento de
acordo com o tema.
Os temas que escolhi foram o amor, a paz, a amizade. Mas antes disso quero explicitar a
razão de escolher três temas e sete poemas. O três que simboliza o equilíbrio e a união,
temas que para todos os efeitos, transmitem a mesma ideia que o número 3: união,
equilíbrio e harmonia. Quanto ao número de poemas, escolhi sete, pois representa a
perfeição, qualidade que quero que a minha antologia atinja.
Relativamente à ordem, primeiro apresentarei os poemas relacionados com a paz, pois acho
ser um tema primordial que é pouco respeitado e devia merecer mais atenção. De seguida,
irei expor os poemas sobre amizade, pois considero que uma pessoa sem amigos está
sozinha no mundo e que os amigos são importantes e ficam para a vida. Por último, mas
não menos relevantes, apresentarei os poemas relativos ao amor, um tema que deu origem
à poesia e que me agradou.
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4. Miguel Torga nasceu em 1907 em S. Martinho de Anta, Trás os
Montes. De nome Adolfo Correia da Rocha, adotou o pseudónimo
de Miguel Torga. Frequentou apenas por um ano, o seminário em
Lamego e 1920 partiu para o Brasil, onde foi recebido na fazenda
de um tio. Regressou depois a Portugal e em apenas três anos fez
o curso do liceu, matriculando-se de seguida na Faculdade de
Medicina, onde terminou o curso em 1933. Escreveu poesia,
contos, peças de teatro e diários. Os seus livros foram traduzidos
em diversos idiomas. (espanhol, francês, inglês, alemão, chinês,
japonês, croata, romeno, norueguês, sueco, holandês, búlgaro), tendo sido várias vezes
nomeado para Prémio Nobel. Morreu em 1995 em Coimbra.
Princípio
Não tenho deuses. Vivo
Desamparado.
Sonhei deuses outrora,
Mas acordei.
Agora
Os acúleos são versos,
E tacteiam apenas
A ilusão de um suporte.
Mas a inércia da morte,
O descanso da vide na ramada
A contar primaveras uma a uma,
Também me não diz nada.
A paz possível é não ter nenhuma.
Miguel Torga, in Penas do Purgatório
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5. Carlos Drummond de Andrade nasceu em Itabira do Mato
Dentro, a 31 de outubro de 1902. Estudou na cidade de Belo
Horizonte e no Colégio Anchieta de Nova Friburgo RJ, de onde
foi expulso. Formou-se em farmácia na cidade de Ouro Preto
em 1925 e fundou com outros escritores A Revista, tendo
disso o poeta mais influente da literatura brasileira. Morreu no
Rio de Janeiro, a 17 de agosto de 1987, pouco após a morte
de sua única filha. As suas obras foram traduzidas para muitas
línguas (espanhol, inglês, francês, italiano ou alemão, entre
outras).
Convite Triste
Meu amigo, vamos sofrer,
vamos beber, vamos ler jornal,
vamos dizer que a vida é ruim,
meu amigo, vamos sofrer.
Vamos fazer um poema
ou qualquer outra besteira.
Fitar por exemplo uma estrela
por muito tempo, muito tempo
e dar um suspiro fundo
ou qualquer outra besteira.
Vamos beber uísque, vamos
beber cerveja preta e barata,
beber, gritar e morrer,
ou, quem sabe? beber apenas.
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6. Vamos xingar a mulher,
que está envenenando a vida
com seus olhos e suas mãos
e o corpo que tem dois seios
e tem um embigo também.
Meu amigo, vamos xingar
o corpo e tudo que é dele
e que nunca será alma.
Meu amigo, vamos cantar,
vamos chorar de mansinho
e ouvir muita vitrola,
depois embriagados vamos
beber mais outros sequestros
(o olhar obsceno e a mão idiota)
depois vomitar e cair
e dormir.
Carlos Drummond de Andrade, in Brejo das Almas
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7. Alexandre Manuel Vahía de Castro O'Neill de Bulhões
nasceu em 1924. Foi um dos fundadores do Movimento
Surrealista de Lisboa .Em 1943, com dezassete anos,
publicou os primeiros versos num jornal de Amarante, o
Flor do Tâmega. Apesar de ter recebido prémios literários
no Colégio Valsassina, esta actividade não foi
grandemente incentivada pela família. Foi várias vezes
preso pela polícia política, a PIDE. Escreveu prosa, poesia e
fiz uma série de traduções e antologias. Morreu a 21 de
agosto de 1986.
Amigo
Mal nos conhecemos
Inaugurámos a palavra «amigo».
«Amigo» é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!
«Amigo» (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
«Amigo» é o contrário de inimigo!
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8. «Amigo» é o erro corrigido,
Não o erro perseguido, explorado,
É a verdade partilhada, praticada.
«Amigo» é a solidão derrotada!
«Amigo» é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
«Amigo» vai ser, é já uma grande festa!
Alexandre O'Neill, in No Reino da Dinamarca
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9. Eugénio de Andrade, pseudónimo de José Fontinhas, nasceu
em 19 de Janeiro de 1923 em Póvoa de Atalaia, Fundão, no
seio de uma família de camponeses. A sua infância foi passada
com a mãe, na sua aldeia natal. Mais tarde, prosseguindo os
estudos, foi para Castelo Branco, Lisboa e Coimbra, onde
residiu entre 1939 e 1945. Em 1947 entrou para a Inspeção
Administrativa dos Serviços Médico-Sociais, em Lisboa. Em
1950 foi transferido para o Porto, onde se fixou. Abandonou a ideia de um curso de Filosofia
para se dedicar à poesia e à escrita e ganhou uma série de prémios literários. Morreu em junho
de 2005.
Os Amigos
Os amigos amei
despido de ternura
fatigada;
uns iam, outros vinham,
a nenhum perguntava
porque partia,
porque ficava;
era pouco o que tinha,
pouco o que dava,
mas também só queria
partilhar
a sede de alegria —
por mais amarga.
Eugénio de Andrade, in Coração do Dia
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10. Urgentemente
É urgente o amor
É urgente um barco no mar
É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos, muitas espadas.
É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.
Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer.
Eugénio de Andrade, in Até Amanhã
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11. António Emílio Leite Couto (Mia Couto) nasceu
em 1955 e é um biólogo e escritor
moçambicano. Iniciou os estudos universitários
em medicina, mas abandonou esta área no
princípio do terceiro ano, passando a exercer a
profissão de jornalista depois do 25 de Abril de
1974. Em 1983, publicou o seu primeiro livro
de poesia, dois anos depois, demitiu-se da
posição de diretor para continuar os estudos
universitários na área de biologia. Além de considerado um dos escritores mais importantes de
Moçambique, é o escritor moçambicano mais traduzido. Em muitas das suas obras, Mia Couto
tenta recriar a língua portuguesa com uma influência moçambicana, utilizando o léxico de
várias regiões do país e produzindo um novo modelo de narrativa africana. Foi fundador de
uma empresa de estudos ambientais da qual é colaborador.
A Demora
O amor nos condena:
demoras
mesmo quando chegas antes.
Porque não é no tempo que eu te espero.
Espero-te antes de haver vida
e és tu quem faz nascer os dias.
Quando chegas
já não sou senão saudade
e as flores
tombam-me dos braços
para dar cor ao chão em que te ergues.
Perdido o lugar
em que te aguardo,
só me resta água no lábio
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12. para aplacar a tua sede.
Envelhecida a palavra,
tomo a lua por minha boca
e a noite, já sem voz
se vai despindo em ti.
O teu vestido tomba
e é uma nuvem.
O teu corpo se deita no meu,
um rio se vai aguando até ser mar.
Mia Couto, in idades cidades divindades
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