O Ministério Público de Santa Catarina ingressou na Justiça com ação civil pública com pedido liminar a fim de que sejam implantados, no mínimo, dez leitos de Unidade de Tratamento Intensivo Neonatal em São Miguel do Oeste, a fim de atender a população do extremo oeste catarinense. Atualmente há somente 18 leitos em Unidade de Tratamento Intensivo Neonatal em toda a região Oeste de Santa Catarina, em Chapecó e Xanxerê, a mais de 120 quilômetros de distância de São Miguel Oeste.
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II - DA LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Ressalta-se que a legitimidade do Ministério Público para a
propositura da presente ação civil pública que visa à defesa dos interesses
individuais indisponíveis de crianças está prevista em vários preceitos legais, seja
de ordem constitucional (art. 127 e 129, incisos II e III, ambos da Constituição da
República Federativa do Brasil, seja de ordem infraconstitucional (art. 201 da Lei
Nacional 8.069/90, artigo 25 da Lei Nacional 9.265/92 e diversos outros, quais
conferem legitimidade ativa a este Órgão Ministerial.
III - DA LEGITIMIDADE PASSIVA
A legitimidade passiva do requerido ESTADO DE SANTA
CATARINA tem por fundamento previsões legais constantes na própria
Constituição da República e na legislação infraconstitucional até então vigente se
operantes.
Em primeiro plano, a Constituição da República, no artigo 196,
prevê o dever do Estado (considerado como ente público, e não como unidade da
federação) de garantir a saúde a todos, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao
acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação.
De outro lado, a Lei Nacional n. 8.080/90, que dispõe sobre as
condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, prevê que a
saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as
condições indispensáveis ao seu pleno exercício (artigo 2º). Ainda, estabelece
que:
Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços
privados contratados ou conveniados que integram o Sistema
Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as
diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal,
obedecendo ainda aos seguintes princípios:
I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os
níveis de assistência;
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II - integralidade de assistência, entendida como conjunto
articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e
curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em
todos os níveis de complexidade do sistema;
[...]
IV - igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou
privilégios de qualquer espécie;
Não suficiente, o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente –
Lei Nacional n. 8.069/90 - estabelece que o Poder Público deve assegurar, com
absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida e à saúde aos
indivíduos em desenvolvimento (artigo 4º). Para tanto, estabelece que:
[...]
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer
circunstâncias;
b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de
relevância pública;
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais
públicas;
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas
relacionadas com a proteção à infância e à juventude.
De mais a mais, há previsão clara e expressa no artigo 11 do
Estatuto da Criança e Adolescente ao consignar que "É assegurado atendimento
integral à saúde da criança e do adolescente, por intermédio do Sistema Único de
Saúde, garantido o acesso universal e igualitário às ações e serviços para
promoção, proteção e recuperação da saúde".
Ainda, registra-se que a Constituição da República Federativa do
Brasil determina que o dever de cuidar da saúde e da assistência pública é de
competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
evidenciando a responsabilidade concorrente entre os três entes federativos (art.
23, II). Por conseguinte, qualquer dos três entes federativos podem ser
demandados.
Diante da solidariedade entre Municípios, Estado e União para a
consecução dos fins atinentes à promoção da saúde pública através do SUS,
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afigura-se viável determinar ao ente público estadual que implante leitos de
Unidade de Terapia Intensiva Neonatal no Hospital Reginal Terezinha Gaio
Basso.
Portanto, inconteste a legitimidade do ESTADO DE SANTA
CATARINA para compor o polo passivo da presente demanda.
IV – COMPETÊNCIA
A conduta omissiva se deu nesta Comarca, portanto, nos termos
do art. 2º da Lei Nacional n. 7.347/85, aqui deve ser deflagrada e apreciada a
presente demanda.
Destarte, cuidando-se no presente caso de dano a direito coletivo
indisponível, consistente na saúde dos neonatos da região de São Miguel do
Oeste, a competência para o processo e julgamento da presente ação civil
pública é mesmo a Comarca de São Miguel do Oeste.
Outrossim, é de competência do juízo da Vara de Infância desta
Comarca o julgamento de demandas nessa natureza, consoante entendimento
do E. Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA. VARA DA INFÂNCIA E
JUVENTUDE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INTERESSES
INDIVIDUAIS, DIFUSOS OU COLETIVOS VINCULADOS À
CRIANÇA E AO ADOLESCENTE. 1. A pretensão deduzida na
demanda enquadra-se na hipótese contida nos arts. 98, I, 148,
IV, 208, VII e 209, todos da Lei 8.069/1990 (Estatuto da Criança e
Adolescente), sendo da competência absoluta do Juízo da Vara
da Infância e da Juventude a apreciação das controvérsias
fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos
vinculados à criança e ao adolescente. 2. As medidas de
proteção, tais como o fornecimento de medicamentos e
tratamentos, são adotadas quando verificadas quaisquer das
hipóteses do art. 98 do ECA. 3. A competência da Vara da
Infância e da Juventude é absoluta e justifica-se pelo relevante
interesse social e pela importância do bem jurídico a ser tutelado
nos termos do art. 208, VII do ECA, bem como por se tratar de
questão afeta a direitos individuais, difusos ou coletivos do
infante, nos termos dos arts. 148, inciso IV, e 209, do Estatuto da
Criança e do Adolescente. Precedentes do STJ. 4. O Estatuto da
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Criança e Adolescente é lex specialis e prevalece sobre a regra
geral de competência das Varas de Fazenda Pública, quando o
feito envolver Ação Civil Pública em favor da criança ou
adolescente, na qual se pleiteia acesso às ações ou serviços e
saúde, independentemente de a criança ou o adolescente estar
em situação de abandono ou risco. 6. Recurso Especial provido.
(REsp 1486219/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
SEGUNDA TURMA, julgado em 25/11/2014, DJe 04/12/2014)
Portanto, o Ministério Público propõe a presente demanda
perante este Juízo (1ª Vara da Comarca de São Miguel do Oeste), por ser o
competente para a apreciação do caso em concreto.
V – DOS FATOS
O Ministério Público de Santa Catarina instaurou perante a 1ª
Promotoria de São Miguel do Oeste o Inquérito Civil n. 06.2015.00001134-4,
visando apurar a ausência de Unidade de Terapia Intensiva Neonatal no Hospital
Regional Terezinha Gaio Basso, localizado neste Município, em razão da
frequente necessidade de ajuizamento de ações judiciais para garantir a
transferências de neonatos e crianças desta comarca/região para Unidades
de Terapia Intensiva Neonatal - UTIN.
Ressalta-se que a necessidade de implementação vagas de UTI
Neonatal neste Município já foi reconhecida pelo Ministério da Saúde quando da
1implementação da Rede Cegonha no Estado de Santa Catarina, a qual apontou
a necessidade da existência de cinco vagas de Unidade de Terapia Intensiva
Neonatal apenas para a região do Extremo Oeste ainda em maio de 2012.
2(vide Portaria 1781/2013 do Ministério da Saúde , Resolução CIB n. 167/2012 e
parecer de mérito do Ministério da Saúde anexo).
Posteriormente, já no ano de 2016, a Secretaria de Estado da
1
A Rede Cegonha é uma estratégia do Ministério da Saúde que preconiza a organização de uma rede de cuidados
materno-infantil, estabelecida pela Portaria nº 1.459, de 24 de junho de 2011. Seu objetivo é que a mulher tenha acesso à
atenção no planejamento sexual e reprodutivo na gestação, garantindo, atenção humanizada na gravidez, parto e
puerpério, e ao recém-nato até o segundo ano de vida, assegurando o direito ao nascimento seguro, crescimento e
desenvolvimento saudáveis. Disponível em: http://www.saude.sc.gov.br/index.php/resultado-busca/rede-cegonha/2283-
rede-cegonha
2
Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt1781_26_08_2013.html
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Saúde informou que em razão da falta de recursos financeiros e orçamentários
"as regiões de Xanxerê e Chapecó recebem as demandas da região do Extremo
Oeste" (ofício n. 156, de 17 de novembro de 2016). Na oportunidade informaram,
ainda, que "o Hospital Regional Terezinha Gaio Basso não recebeu, até o
momento, recursos federais de incentivo da Rede Cegonha para UTI Neonatal,
haja vista o recurso de custeio só ser repassado quando o serviço está em
habilitação e em funcionamento". Por fim, pontuaram que os últimos repasses
financeiros à instituição foram destinados à área da oncologia.
Nesse sentido a fim de se constatar se as vagas de UTI Neonatal
existentes no Grande Oeste do Estado eram suficientes para atendimento da
demanda da micro região do extremo oeste, oficiou-se ao Hospital Regional do
Oeste (Chapecó) e ao Hospital São Paulo (Xanxerê).
O Hospital São Paulo informou que a UTI Neonatal da unidade
possui oito leitos, que à época da resposta encaminhada (dezembro de 2018), a
unidade encontrava-se superlotada, com treze pacientes internados. Também
informou que, conforme plano estatístico anexo, por vários vezes o percentual de
ocupação se deu na capacidade máxima e que "houve episódios em que não
se pôde receber novos recém-nascidos em decorrência da ocupação de
todos os leitos". Por fim, informaram que no período de 2016 a novembro de
2018 quatorze crianças recebidas na UTI Neonatal eram do Município de São
Miguel do Oeste.
O Hospital Regional do Oeste relatou que a UTI Neonatal possui
dez leitos, também encontrando-se superlotada quando da resposta
encaminhada (dezembro de 2018). Aduziu que:
"Cumpre informar que periodicamente a UTI encontra-se
lotada, sendo raros os momentos em que temos leito vago disponível da
UTI Neonatal. Frequentemente, por existência de pacientes graves e ausências
de leito em UTI Neonatal disponível, realizados adaptações criando até um ou
dois leitos extras, que embora distante do ideal no cuidando intensivo do
Neonato, garante maior possibilidade de sobrevivência. Salientamos ainda, que
existe necessidade premente de duplicarmos a capacidade de atendimentos de
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nossa UTI Neotanal, pois constantemente vivemos comentos de angustia
entre médicos e familiares, por falta de leitos em Terapia Intensiva
Neonatal". (grifei)
A região do Grande Oeste de Santa Catarina registrou 10.913
(dez mil novecentos e treze) nascimentos no ano de 2016 (vide documento
anexo). Enquanto que a mesma região conta atualmente com apenas 18
(dezoito) vagas em Unidades de Terapia Intensiva Neonatal, todas localizadas a
mais de 120 quilometros de distância deste município, em hospitais de Chapecó
e Xanxerê, as quais sempre estiveram superlotadas.
Ou seja, o Estado de Santa Catarina garante vaga somente a
0,16% dos neonatos nascidos na região do Grande Oeste.
Tal número – 0,16% - já é, per si, suficiente para evidenciar a
negligência do requerido com a região oeste, bem como comprovar que não
estão sendo observadas as determinações legais referentes ao direito à vida e à
saúde, bem como as diretrizes de atendimento a neonatos, as quais serão
abordadas a seguir.
Nesse tópico vale ressaltar matéria publicada no site do jornal
3Diário Catarinense , em maio de 2018, dando conta de que:
"Bebês prematuros e recém-nascidos em estado grave podem
enfrentar dificuldades para encontrar vagas em Unidades de Tratamento
Intensivo (UTI) neonatal em Santa Catarina. O levantamento, feito pela
Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) a partir do Cadastro Nacional de
Estabelecimentos de Saúde (CNES) do Ministério da Saúde, mostra que o
Estado tem um déficit de 179 leitos para atingir a proporção considerada
ideal, que é de quatro vagas por mil nascidos vivos. O Estado tem 211 vagas, o
que leva a uma taxa de 2,2, quase metade do que é preconizado pela SBP.
O levantamento, divulgado nesta quinta-feira, inclui leitos do SUS e de hospitais
privados".
3
http://dc.clicrbs.com.br/sc/estilo-de-vida/noticia/2018/04/faltam-179-leitos-de-uti-neonatal-em-sc-aponta-
pesquisa-10269468.html
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4Similar foi a matéria veiculada no site da Globo.com em julho de 2018, a qual
informou que "O estado tem 226 leitos de UTI neonatal, sendo 174 públicos e 52
privados. Mas que nem sempre estão vagos."
Ocorre, ainda, que não obstante a importância da criação das
vagas de UTI Neonatal no Hospital Terezinha Gaio Basso (já reconhecida no ano
de 2012 pela Rede Cegonha), bem como a garantia de prioridade de atendimento
nos serviços públicos ou de relevância pública e a destinação privilegiada de
recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à
juventude, o Estado de Santa Catarina investiu R$ 2,3 milhões para aquisição de
equipamentos e móveis para estruturar a nova ala de oncologia no hospital deste
5Município e repassará mensalmente o valor de R$ 865 mil exclusivamente para
o atendimento da oncologia.
Registra-se, nesse tópico, que não se está a desaprovar ou
desmerecer a instalação do setor de oncologia no Hospital Terezinha Gaio Basso
- o qual também era de extrema necessidade da população do extremo oeste.
Não obstante, sabe-se que às crianças têm primazia no recebimento de polícias
públicas.
Assim, é evidente que o ESTADO DE SANTA CATARINA não
garante o direito à vida e a à saúde dos neonatos da região do Grande Oeste, em
especial do Extremo-oeste.
Diante de tudo isso é que este Órgão Ministerial entende ser
indispensável a propositura da presente demanda, visando à condenação do
ESTADO DE SANTA CATARINA em implementar no mínimo 10 (dez) leitos
de Unidade Terapia Intensiva Neonatal no Hospital Regional Terezinha Gaio
Basso.
4
https://g1.globo.com/sc/santa-catarina/noticia/2018/07/20/sc-precisa-de-mais-179-leitos-de-utis-neonatais-segundo-
estudo-da-sociedade-brasileira-de-pediatria.ghtml
5 https://www.sc.gov.br/index.php/noticias/temas/saude/governo-do-estado-inaugura-setor-de-oncologia-no-hospital-
regional-em-sao-miguel-do-oeste
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Estadual disciplina que:
Parágrafo único – O direito á saúde implica os seguintes princípios
fundamentais:
I - trabalho digno, educação, alimentação, saneamento, moradia,
meio ambiente saudável, transporte e lazer;
II - - informação sobre o risco de doença e morte, bem como a
promoção e recuperação da saúde
E, tratando-se de recém nascido, diz a Constituição em seu art
227, ser “dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e
ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação [...]”
No mesmo sentido, o Estatuto da Criança e do Adolescente
estabelece em seus artigos 7º e seguintes que a saúde é direito de todos e dever
do Estado. Ademais, este diploma legal estabelece prioridade absoluta para
assegurar os direitos de crianças e adolescentes, compreendendo a primazia de
receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; precedência de
atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; preferência na
formulação e na execução das políticas sociais públicas; destinação privilegiada
de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e
juventude, vejamos:
Art. 3º. A criança e o adolescente gozam de todos os direitos
fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da
proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por
lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a
fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral,
espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em
geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a
efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação,
à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
[...]
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais
públicas;
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d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas
relacionadas com a proteção à infância e à juventude.
Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à
saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que
permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso,
em condições dignas de existência.
Art. 8o É assegurado a todas as mulheres o acesso aos
programas e às políticas de saúde da mulher e de planejamento
reprodutivo e, às gestantes, nutrição adequada, atenção
humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério e atendimento
pré-natal, perinatal e pós-natal integral no âmbito do Sistema
Único de Saúde.
[....]
§ 4o Incumbe ao poder público proporcionar assistência
psicológica à gestante e à mãe, no período pré e pós-natal,
inclusive como forma de prevenir ou minorar as consequências
do estado puerperal.
§ 5o A assistência referida no § 4o deste artigo deverá ser
prestada também a gestantes e mães que manifestem interesse
em entregar seus filhos para adoção, bem como a gestantes e
mães que se encontrem em situação de privação de
liberdade.
[...]
§ 10. Incumbe ao poder público garantir, à gestante e à mulher
com filho na primeira infância que se encontrem sob custódia em
unidade de privação de liberdade, ambiência que atenda às
normas sanitárias e assistenciais do Sistema Único de Saúde
para o acolhimento do filho, em articulação com o sistema de
ensino competente, visando ao desenvolvimento integral da
criança.
Art. 11. É assegurado acesso integral às linhas de cuidado
voltadas à saúde da criança e do adolescente, por intermédio do
Sistema Único de Saúde, observado o princípio da equidade no
acesso a ações e serviços para promoção, proteção e
recuperação da saúde.
A par disso, a Constituição da República estabelece que a saúde
é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, sendo exercida através
ações e serviços de saúde pelo Poder Público, cabendo a ele realizar sua
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regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita
diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de
direito privado (artigo. 197). Ao omitir-se em ofertar serviços necessários à
garantia da saúde aos neonatos o requerido claramente procura eximir-se de sua
obrigação constitucional, expondo a risco a saúde e a vida dos recém-nascidos
no Grande Oeste do estado.
O Supremo Tribunal Federal, através de voto do Ministro Celso
de Mello, analisando os dispositivos constitucionais sob enfoque, destacou:
O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa
jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela
própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico
constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de
maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular
e implementar políticas sociais e econômicas idôneas que visem
a garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus
HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e
médico-hospitalar. O direito à saúde, além de qualificar-se
como direito fundamental que assiste a todas as pessoas,
representa conseqüência constitucional indissociável do
direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera
institucional de sua atuação no plano da organização
federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao
problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda
que por censurável omissão, em grave comportamento
inconstitucional. A interpretação da norma programática não
pode transformá-la em promessa constitucional inconseqüente. O
caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta
Política, que tem por destinatários todos os entes políticos que
compõem, no plano institucional, a organização federativa do
Estado brasileiro não pode converterse em promessa
constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público,
fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade,
substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu
impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade
governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do
Estado. (...) (RE 271.286-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, DJ
24/11/00) (grifo não consta do original).
Com convicção, o direito público subjetivo de acesso universal e
igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar, consequência
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indissociável do direito à vida e do princípio da dignidade da pessoa humana,
pressupõe, sob pena de tornar-se letra morta, o atendimento integral, conforme
preconiza o artigo 198, inciso II, da Constituição da República.
Nesse sentido, registra-se que o público infantil encontra-se em
peculiar condição de desenvolvimento, devendo a família, a sociedade e o
Estado, a partir de uma atuação solidária, confluir esforços devidos para
promover a defesa da criança e do adolescente.
Face ao exposto, a única alternativa para salvaguardar os direitos
violados é a imposição de obrigação de fazer ao Estado de Santa de Catarina
para que implante, no mínimo, dez leitos de unidade terapia intensiva
neonatal no Hospital Regional Terezinha Gaio Basso, com observância à
Portaria MS n. 930, de 10 de maio de 2012, que definiu as diretrizes e objetivos
para a organização da atenção integral e humanizada ao recém-nascido grave ou
potencialmente grave e os critérios de classificação e habilitação de leitos de
Unidade Neonatal no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
VI.2 – DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE OFERTA E
MANUTENÇÃO DE UNIDADES DE TERAPIAS INTENSIVAS NEONATAL
Necessário pontuar, ainda, que a forma deficiente da prestação
do serviço público de saúde em São Miguel do Oeste e região contraria a Política
Nacional de Atenção Obstétrica e Neonatal, prevista na Portaria MS n. 1067, de 4
de julho de 2005, cujo norte e princípio é a atenção obstétrica e neonatal
humanizada e de qualidade, como direito da mulher e do recém-nascido:
Art. 2º Estabelecer os seguintes princípios e diretrizes para a
estruturação da Política de Atenção Obstétrica e Neonatal:
I - toda gestante tem direito ao acesso a atendimento digno e de
qualidade no decorrer da gestação, parto e puerpério;
[...]
V - todo recém-nascido tem direito à assistência neonatal de
forma humanizada e segura;
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VI - toda mulher e recém-nascido em situação de intercorrência
obstétrica e neonatal tem direito a atendimento adequado e
seguro de açor do com os princípios gerais e condições
estabelecidas no Anexo I desta Portaria;
[...]
Do mesmo modo, a falta de vagas em UTI Neonatal na região do
Grande Oeste também deixa de observar as previsões da Portaria MS n. 930, de
10 de maio de 2012, que definiu as diretrizes e objetivos para a organização da
atenção integral e humanizada ao recém-nascido grave ou potencialmente grave
e os critérios de classificação e habilitação de leitos de Unidade Neonatal no
âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS):
Art. 4º São objetivos da atenção integral ao recém-nascido grave
ou potencialmente grave:
I - organizar a Atenção a Saúde Neonatal para que garanta
acesso, acolhimento e resolutividade;
II - priorizar ações que visem à redução da morbimortalidade
perinatal e neonatal e que possibilitem o desenvolvimento
saudável do recém-nascido e sua integração na família e
sociedade;
III - garantir acesso aos diferentes níveis da assistência
neonatal, por meio da melhoria da organização do acesso
aos serviços e ampliação da oferta de leitos em unidades
neonatal;
IV - induzir a formação e qualificação de recursos humanos para
a atenção ao recém-nascido, que deverá ultrapassar
exclusivamente a preocupação técnica/tecnológica, incorporando
os referenciais conceituais e organizacionais do SUS; e
V - induzir a implantação de mecanismos de regulação,
fiscalização, controle e avaliação da assistência prestada aos
recém nascidos graves ou potencialmente graves no SUS.
Explica-se que a Unidade de Terapia Intensiva Neonatal - UTI
Neonatal "é um ambiente do hospital preparado para recebem bebês que
nasceram antes das 37 semanas de gestação, com baixo peso ou que possuem
algum problema que possa interferir no seu desenvolvimento, como alterações
cardíacas ou respiratórias" (https://www.tuasaude.com/uti-neonatal/),
concentrando os principais recursos para garantir as funções vitais dos recém-
nascidos ali internados.
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Ou seja, para a Sociedade Brasileira de Pediatria a região do
Grande Oeste de Santa Catarina conta com menos da metade do número ideal
de leitos de UTI Neonatal, uma vez que é recomendado quatro leitos para cada
mil crianças nascidas vivas.
Considerando o total de nascimentos na região – 10.913 – e as
vagas ofertadas – dezoito – verifica-se um déficit de 22 (vinte e duas) vagas.
De mais a mais, conforme tabela acima, constata-se que o
Estado de Santa Catarina possui 144 leitos de UTI Neonatal no Sistema Único
de Saúde, sendo que apenas 18 (dezoito) estão na região do Grande Oeste,
menos de treze por cento das vagas.
VI.3. – DA POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO DO PODER
JUDICIÁRIO NO DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE – AUSÊNCIA DE
VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA INDEPENDÊNCIA DOS PODERES
É cediço que vige no ordenamento jurídico brasileiro o princípio
da separação dos poderes, o qual é estabelecido no artigo 2º da Constituição da
República Federativa do Brasil e é considerado uma das bases do Estado
Democrático de Direito.
Entretanto, não cabe ao Estado alegar que o estabelecimento de
políticas sociais derivadas de normas programáticas situa-se no âmbito do poder
discricionário do administrador público, sendo vedado ao Poder Judiciário
interferir nos critérios de conveniência e oportunidade, pois estamos diante de
uma concreta violação ao direito à vida e à saúde de crianças recém-nascidas
nesta região, uma vez que o requerido, embora já reconhecida a necessidade de
implantação de leitos de UTI Neonatal no hospital regional deste Município, não
de oferta à população do Extremo Oeste de Santa Catarina nenhuma vaga em
unidade de terapia intensiva destinada aos neonatos, exigindo que os recém
nascido desloquem-se por mais de cem quilômetros nas precárias estradas da
região (até os município de Chapecó e Xanxerê) para receberam atendimento
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Telefone: (49) 3631-1546, E-mail: SaoMigueldoOeste01PJ@mpsc.mp.br
médico, direito este que lhes é garantido pela Constituição da República.
A atuação do Poder Judiciário nestes casos não interfere de
modo algum na independência dos poderes, levando-se em conta a questão dos
direitos fundamentais relacionados à criança. Ademais, sabe-se que, na
ocorrência de omissão por parte do Poder Público no cumprimento de norma
constitucional elevada à categoria de norma fundamental, compete sim ao Poder
Judiciário aplicar o direito ao caso concreto.
Nesse sentido o Supremo Tribunal Federal leciona que "o Poder
Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração
Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente
reconhecidos como essenciais, sem que isso configure contrariedade ao princípio
da separação dos Poderes", ressaltando, ainda, que "a análise da
excepcionalidade da situação em concreto, a ensejar a intervenção, ou não, do
Poder Judiciário na implementação de políticas públicas cabe ao Tribunal a quo,
e não ao Supremo Tribunal Federal." (EDRE n. 700.227/SC, relª. Ministra Cármen
Lúcia j. 23/4/2013).
Ainda, conforme Acórdão proferido pelo egrégio Tribunal de
Justiça em Ação Civil Pública desta Comarca (TJSC, Apelação Cível n.
0900118-71.2018.8.24.0067, de São Miguel do Oeste, rel. Des. Sérgio Roberto
Baasch Luz, Segunda Câmara de Direito Público, j. 05-02-2019) é certo que " no
que diz respeito à impossibilidade de o Poder Judiciário apreciar a conveniência e
a oportunidade dos atos administrativos, sob pena de prejudicar a gestão das
verbas públicas, deve-se avaliar o conflito que se estabelece entre o direito
tutelado e essa prerrogativa da Administração Pública".
Nesses termos, frisa-se que o artigo 227 da Constituição da
República assevera que “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar
à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde,
à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade,
ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los
a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
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crueldade e opressão”.
Nesse sentido, o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê os
procedimentos que visam à garantia de propriedades elencadas pela norma
constitucional em seu artigo 4º, dando conta da primazia de receber proteção e
socorro em quaisquer circunstâncias, a precedência de atendimento nos serviços
públicos ou de relevância pública, a preferência na formulação e na execução das
políticas sociais públicas e a destinação privilegiada de recursos públicos.
Assim, se o direito à proteção integral da criança, do
adolescente e do jovem é direito fundamental previsto na Constituição da
República, que obriga o Poder Público a implementar esse direito mediante
políticas públicas concretas, não há dúvida de que o inadimplemento dessa
obrigação "qualificar-se-á como uma censurável situação de inconstitucionalidade
por omissão imputável ao Poder Público". (STF, AgRg no RE n. 410.715/SP, rel.
Ministro Celso de Mello, j. 22-11-2005).
Ou seja, "a inferência é a de que o Poder Judiciário está
autorizado a atuar excepcionalmente no sentido de compelir o Poder Executivo,
sem que isso importe violação ao princípio da separação dos poderes, ou mesmo
em substituição ao Administrador" (TJSC, Apelação Cível n.
0900118-71.2018.8.24.0067, de São Miguel do Oeste, rel. Des. Sérgio Roberto
Baasch Luz, Segunda Câmara de Direito Público, j. 05-02-2019), a assegurar o
direito à vida e à saúde dos neonatos.
Assim, conclui-se que, caso o gestor público seja relapso e atue
com descaso no que se refere aos direitos fundamentais relacionados à criança e
ao adolescente, não só se permite, como também se impõe a pronta atuação
deste Órgão do Ministério Público, assim como do Poder Judiciário, no objetivo
de fazer valer os ditames constitucionais e infraconstitucionais.
VII – DA TUTELA DE URGÊNCIA
Até a tramitação desta ação, incluindo a concessão de prazo para
defesa, eventual fase probatória e prolação da decisão final, certamente
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CATARINA para que, por meio de tutela initio litis, sob pena de restar inócua a
prestação jurisdicional futura, tendo em vista a já existente falta de vagas,
implante no mínimo DEZ LEITOS DE UNIDADE TERAPIA INTENSIVA
NEONATAL NO HOSPITAL REGIONAL TEREZINHA GAIO BASSO no prazo
de SEIS MESES, com observância à Portaria MS n. 930, de 10 de maio de 2012,
que definiu as diretrizes e objetivos para a organização da atenção integral e
humanizada ao recém-nascido grave ou potencialmente grave e os critérios de
classificação e habilitação de leitos de Unidade Neonatal no âmbito do Sistema
Único de Saúde (SUS).
VII.1 DA POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE MULTA EM
DESFAVOR DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NO CASO CONCRETO
A obrigação de cumprimento da tutela de urgência deve se dar
sob pena de multa em valor não inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais) por dia de
atraso, haja vista estarmos falando de ausência garantia ao direito à vida e à
saúde de todos os neonatos da região do extremo-oeste, nos termos dos artigos
6297, 536 e 537, todos do Código de Processo Civil e nos termos do artigo 11 da
7Lei Nacional n. 7.347/85 .
E nem se fale na impossibilidade de aplicação de astriente em
desfavor da Administração Pública, haja vista a importância dos direitos
fundamentais tutelados pela presente ação civil pública, cuja incidência de
multa, inclusive, é obrigatória, pois estamos diante a direitos
supraindividuais centrais, a saber, à vida e à saúde da pessoa humana.
6
Art. 297. O juiz poderá determinar as medidas que considerar adequadas para efetivação da
tutela provisória.
Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de
não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a
obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à
satisfação do exequente.
Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de
conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja
suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do
preceito.
7
Art. 11. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz
determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena
de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível,
independentemente de requerimento do autor.
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Mutatis mutandis, recentemente em brilhante decisão assim
decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
IPHAN. REFORMA DE PRÉDIO TOMBADO. PATRIMÔNIO
HISTÓRICO E CULTURAL. POLÍTICAS PÚBLICAS LEGISLADAS.
PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. OBRIGAÇÃO DE
FAZER. CONTEMPT OF COURT. AUSÊNCIA DE FIXAÇÃO DE
MULTA. OBRIGATORIEDADE DE ASTREINTES. ART. 461 DO CPC
DE 1973. ART. 536, PARÁGRAFO PRIMEIRO, DO CPC DE 2015.
ART. 84 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ART. 11 DA
LEI 7.347/1985. HONORÁRIOS. EXCLUSÃO DA CONDENAÇÃO.
JUÍZO DE SIMETRIA. ALTERAÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER.
IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1.. [...]
Nos termos do art. 11 da Lei 7.437/1985, a hipótese de imposição
de astreintes é ope legis e, em consequência, obrigatória, caso
paire a mínima dúvida sobre o acatamento voluntário futuro da
decisão judicial ("Na ação que tenha por objeto o a observância de
obrigação de fazer ou não fazer, o juiz determinará o cumprimento
da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade
nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de
multa diária, se esta for suficiente ou compatível,
independentemente de requerimento do autor", grifo
acrescentado).
11. Já sob a égide do Código de Processo Civil - tanto o revogado
como o de 2015 - o legislador previu a hipótese de incidência das
astreintes como categoria processual ope judicis. Assim dispunha o art.
461, § 4º, do CPC de 1973: "O juiz poderá ... impor multa diária ao réu,
independentemente de pedido do autor...". Na mesma linha segue o art.
536, parágrafo primeiro, do atual CPC: "o juiz poderá determinar, entre
outras medidas, a imposição de multa" (grifo acrescentado). 12. A
obrigatoriedade, como regra, da cominação de astreinte no
campo da Ação Civil Pública justifica-se inteiramente,
sobretudo pela natureza jurídica proeminente dos sujeitos,
dos direitos e dos bens protegidos em questão, além do
próprio conteúdo e extensão subjetiva do provimento
judicial. É que, no processo civil coletivo, afora a autoridade
formal da decisão judicial, o legislador quer garantir, de
modo estrito, a eficácia imediata e plena da tutela material de
interesses supraindividuais, muitos deles centrais à
dignidade da pessoa humana, ao patrimônio público e às
gerações futuras. Não se trata, então, de providência
excepcional, mesmo contra o Estado. [...] 13. Como narrado no
Acórdão recorrido, há quase duas décadas realizam-se estudos do
imóvel e elaboram-se projetos supervisionados pelo Iphan, sem
que o Estado tenha providenciado as reformas necessárias. 14. A
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Primeira Seção do STJ referendou o entendimento, no REsp Repetitivo
1.474.665/RS (Relator Ministro Benedito Gonçalves), de que a
infligência de multa pela desobediência à obrigação de fazer ou de
não fazer, inclusive contra o Estado, decorre do "poder geral de
efetivação", concedido ao juiz para fazer valer, no mundo dos
fatos, as suas decisões. [...]
15. Havendo indício que aponte risco futuro de o réu resistir ao
cumprimento do provimento judicial de natureza metaindividual, a
imposição de multa diária é de rigor, quadro mais que configurado
nestes autos.
16. A condenação do ente público omisso quanto aos seus
compromissos legais e constitucionais tão somente na obrigação de
fazer ou de não fazer debilita ou esvazia o conteúdo normativo
instigador de eficácia do art. 11 da Lei da Ação Civil Pública. No
processo civil coletivo, deve o magistrado definir provimento cogente
assecuratório e indutor de obediência à sua decisão, individualizado ao
caso concreto, que se prestará para realçar - em face do réu
recalcitrante ou simplesmente contumaz na ilicitude - a pretensão
republicana e social de absoluto cuidado e prioridade na salvaguarda
de bens metaindividuais constitucional e legalmente amparados.
17. Especificamente quanto ao Estado-réu, saliente-se que
desrespeito, embaraço e negativa de cumprimento a decisão
judicial (contempt of court) por servidor público caracterizam, em
tese, improbidade administrativa, sem prejuízo de providências
sancionatórias em outros domínios do Direito, como o disciplinar,
o civil e o penal.
18. A determinação de astreintes, na presente demanda, que cuida
da proteção do patrimônio histórico e cultural, direito difuso por
excelência e de magna importância, mostra-se imprescindível para
tornar efetiva a prestação jurisdicional. Merece reforma, pois, o
julgado recorrido para que, reconhecida a violação do art. 11 da
Lei 7.437/1985, se estabeleça multa diária de R$ 1.000,00 (mil
reais), a partir de 6 (seis) meses após a publicação deste Acórdão.
[...] (REsp 1723590/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA
TURMA, julgado em 08/05/2018, DJe 26/11/2018).
Portanto, considerando a matéria aventada nestes autos, o
Ministério Público requer a concessão da tutela de urgência, conforme
supracitado, sob pena de aplicação de multa diária ao ESTADO DE SANTA
CATARINA, em valor não inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), nos nos termos
dos artigos 297, 536 e 537, todos do Código de Processo Civil e artigo 11 da Lei
Nacional n. 7.347/85.
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f) Para fins de produção de prova, a expedição de ofício à
Sociedade Brasileira de Pediatria, com sede na Rua Santa Clara, n. 292, Rio de
Janeiro/RJ - CEP: 22041-012, a fim de que encaminhe cópia do estudo realizado
apontando a necessidade de quatro leitos de unidade de terapia intensiva para
cada mil crianças nascidas com vida.
g) A procedência do pedido inicial, com a confirmação da
tutela de urgência pleiteada para o fim de condenar o ESTADO DE SANTA
CATARINA sem prejuízo da garantia de acesso universal à vida e à saúde ,
na obrigação de fazer, consistente em implementar no mínimo 10 (DEZ) LEITOS
DE UNIDADE TERAPIA INTENSIVA NEONATAL NO HOSPITAL REGIONAL
TEREZINHA GAIO BASSO, com observância à Portaria MS n. 930, de 10 de
maio de 2012, que definiu as diretrizes e objetivos para a organização da atenção
integral e humanizada ao recém-nascido grave ou potencialmente grave e os
critérios de classificação e habilitação de leitos de Unidade Neonatal no âmbito
do Sistema Único de Saúde (SUS).
h) Requer-se, ainda, seja fixada multa diária de no mínimo R$
10.000,00 (dez mil reais) por dia de descumprimento de sentença final, além de
perdas e danos eventualmente verificados, a ser revertida em favor do Fundo de
Reparação dos Bens Lesados, sem prejuízo a aplicação de outras medidas
coercitivas que se fizerem necessárias conforme prudente arbítrio do Juízo,
independentemente das sanções penais por desobediência, ato de improbidade
administrativa e eventual omissão de socorro;
e) Protesta-se pela isenção no pagamento de custas,
emolumentos e outros encargos, na forma do art. 91 do Código de Processo Civil;
Atribuo à causa para efeitos legais o valor de R$ 957,00
(novecentos e cinquenta e sete reais).