Imaginar como será nosso futuro
é sempre um trabalho árduo
e invariavelmente impreciso.
Entretanto, em uma sociedade
altamente tecnocrát ica, tentar
compreender os efeitos que as
criaturas de silício exercem sobre
seus mestres de carbono se
torna cada vez mais importante.
Neurociência para profissionais de marketing aula 1 - neurociência para não...
A tecnologia e o futuro da educação: um olhar neurocientífico
1. ASSUNTO
em pauta
A tecnologia
e o futuro
Oleg Zhevelev
da educação:
um olhar
neurocientífico
I magina r como s erá no s s o f u-
turo é s empre um t ra ba lho á r-
duo e inva riavelmente impreciso.
Ent ret a nto, e m u m a s oci e d a d e
a l t a m e nte te c n o c r át i c a , te nt a r
compre ender o s efe ito s que a s
cr iatura s de s ilício exercem s o -
bre seus me stre s de ca rbono se
tor na cada vez ma i s imp or ta nte.
P o r B i l ly E . M . N a s c i M E N t o
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2. interessantes para entendermos e refletirmos
o
D
sobre o futuro da escola e da educação no novo
e fato estamos vivendo em um tempo mundo digital.
onde tudo envolve tecnologia, interfa- Em um artigo escrito na revista Neuron de se-
ces, comunicação e informação. A todo tembro de 2010 por Dephne Bavelier, C. Shawn
instante interagimos com estas máquinas que Gree e Matthew W. G. Dye, pesquisadores nas
se dispõem a nos prestar tarefas subservientes Universidades de Rochester, Minnesota e Illinois,
embaladas em promessas de um mundo melhor. respectivamente, os autores discorrem sobre a
Mas qual será o efeito das tecnologias sobre nossa importância de avaliarmos as respostas cerebrais
forma de pensar? Como nosso cérebro reage a dentro de um contexto adequado, em relação ao
esse crescente número de interfaces tecnológicas uso de tecnologias. O paralelo que os autores
que nos afastam, de maneira contundente, da fazem sobre as perguntas que devem ser feitas
Savana Original? com relação à influência da tecnologia no cérebro
Os efeitos da tecnologia sobre nossa forma de é o mesmo que fazemos sobre a influência da
pensar e educar promovem uma reflexão sobre alimentação em nosso estado físico.
o próprio papel da educação em nossa socieda- Se nos fizéssemos essa pergunta, compreendería-
de. É notória a origem industrialista da escola, mos que a qualidade e quantidade são essenciais
assim como a conhecemos, com suas divisões de para verificarmos os impactos da alimentação na
classes, normatização de aprendizado, horários saúde. O mesmo poderia ser dito sobre a tecnolo-
rigidamente cronometrados e a sirene fabril para gia. Entender sua influência é tentar compreender,
as trocas de turno. Concebida em um contexto do ponto de vista qualitativo, (qual tipo de tec-
de profunda mudança promovida pela Revolução nologia e conteúdo), e quantitativo (quantidade
Industrial, a escola contemporânea tinha objetivos do tipo de conteúdo que eu absorvo), como o
claros de educar segundo uma nova forma de con- nosso cérebro funciona e se altera quando somos
ceber o mundo, seguindo os preceitos da fábrica. expostos às mídias digitais.
Entender os efeitos das novas tecnologias em Estudos sobre a influência da tecnologia na edu-
nosso cérebro, e como elas podem interferir com cação se aplicam a qualquer tipo de interface ligada
a educação, passa pela compreensão da nova ao consumo de informação e entretenimento.
revolução imposta nos últimos anos, a Revolução Uma das mais antigas tecnologias que influen-
da Tecnologia da Informação e Comunicação.
A escola do futuro será aquela que melhor se
adaptar a esta nova forma de mundo, permitindo
o desenvolvimento das potencialidades que hoje
são mandatórias. Grande parte da nossa crítica ou
aprovação para um novo mundo de possibilidades
tecnológicas passa pela compreensão da quebra
de paradigmas que a civilização humana promove
hoje. A fábrica morreu, e ainda estamos tentando
entender quem é sua herdeira.
Enquanto ciências neófitas, as neurociências fo-
ram constituídas também em um contexto de pro- Podemos definir o conceito de interface como o conjunto
funda mudança, graças às descobertas de como o de meios planejadamente dispostos, sejam eles físicos
ou lógicos, com vista à adaptação entre dois sistemas,
cérebro funciona. É justamente a possibilidade de
cujo objeto final possui características de ambos. O
verificarmos alterações ou mesmo promovermos conceito pode ser exemplificado por um relógio, cujo fim
intencionalmente mudanças no cérebro, que faz é contar um tempo, e uma dinamite, cujo fim é causar
das neurociências uma das ferramentas mais uma explosão. Após a adaptação dos sistemas, ou após
interfaceados, o usuário obterá um sistema conjugado
cujo fim é causar uma explosão num tempo determinado.
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3. } A e scola do f uturo s erá aque la que me lhor
se ada pta r a e sta nova for ma de mundo, p er-
mitindo o desenvolvimento das potencialidades
que hoje s ão ma ndatór ia s .~
ciou muitas gerações e inventou toda uma nova tecnologia na educação tem muito mais a ver com
forma de comunicar foi a televisão. Grandes de- o conteúdo transmitido, que pelo meio de comu-
bates já se desenvolveram para mostrar o poder nicação em si. Dessa maneira, não seria a televisão
da televisão de afetar a capacidade de aprendi- uma grande vilã para o processo de aprendizado,
zado de crianças. Mas estaria isso ocorrendo e sim o conteúdo transmitido. A grande diferença
somente pela forma de apresentar informação encontrada entre os programas que aumentam as
ou o conteúdo também poderia influenciar o capacidades cognitivas das crianças é a interação
desenvolvimento cognitivo de crianças? que eles provocam, estimulando a participação
por meio de perguntas e pausas programadas
Pesquisadores da Universidade da Pennsylvania
para as crianças responderem.
e Kansas estudaram crianças que assistiam a pro-
gramas infantis como Teletubbies, Vila Sésamo e A influência do conteúdo de mídia para o desenvol-
Dora a Aventureira. O resultado indicou que as vimento psicológico e educacional sempre foi muito
crianças de dois anos que assistiam ao Telletu- debatido, principalmente para produtos de entreteni-
bies tinham menos vocabulário comparado com mento, como os videogames. Estudos mostram que
programas infantis mais participativos, como Vila 94% dos videogames classificados para adolescentes
Sésamo e Dora a Aventureira (veiculado aqui no contêm algum tipo de violência (Haninger et al.
Brasil pelo Canal Cultura) (Linebarger Walker 2004). Muito já foi dito sobre a relação entre o con-
2005). Vila Sésamo, que começou a ser veiculado sumo de videogames violentos e o desenvolvimento
nos EUA na década de 60, já foi associado a diver- de comportamentos agressivos. Alguns trabalhos
sos benefícios para as crianças, como preparo es- científicos já mostraram a relação entre a exposição
colar, tamanho do vocabulário e habilidades com a conteúdos de violência e tendências antissociais
números (Zill et al., 1994; Fisch Truglio, 2001). (Huesmann, 2009), porém esse assunto não é total-
Essas evidências demonstram que a influência da mente esclarecido. Outros estudos já encontraram a
ausência de efeitos para comportamentos agressivos
quando adolescentes são expostos a conteúdos de
violência (Fergunson CJ, 2007).
Outro problema que se origina a partir do contato
com essas interfaces tecnológicas é a dependência.
A utilização de ferramentas neurocientíficas
Mesmo que ainda não tenha sido classificado
em pesquisas de comportamento de con- como transtorno psiquiátrico, o vício de internet,
sumo vem sendo adotada pelas principais por exemplo, pode assolar 2% dos jovens (Johans-
corporações ao redor do mundo. Utilizando son; Götestam, 2004). Casos pavorosos como um
eletrodos, fios, géis ou mesmo máquinas que
custam 3 milhões de dólares, estas empresas casal coreano que deixou seu bebê de três meses
coletam informações preciosas sobre a ativi- morrer de fome após ficar mais de 12 horas num
dade cerebral e corporal de consumidores cyber-café criando uma criança virtual em um
quando são expostos à propaganda, produtos
jogo de RPG chamado “Prius On-line” chamam
ou embalagens.
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4. As novas tecnologias de comuni-
cação oferecem uma infraestrutura
a atenção sobre o poder que a tecnologia tem de que nos permite a interação em
favorecer o aparecimento de transtornos ligados à rede de seus integrantes. Todo
dependência. Circuitos cerebrais frontoestriatais, esse processo acabou por criar um
novo paradigma, onde a informa-
ativados em comportamentos de dependência, são ção é a matéria-prima. A tecnologia
ativados quando adolescentes jogam videoga- passa, assim, a permear toda
mes (Koepp et al. 1998), o que pode explicar o a atividade humana, aplicando
desenvolvimento de comportamentos aditivos. sua lógica de redes em qualquer
sistema ou conjunto de relações.
Embora esses estudos demonstrem o poder
devastador que a tecnologia pode ter sobre
crianças e adolescentes, vemos uma relação
que é muito mais pautada no conteúdo do
que da mídia em si. De fato outros trabalhos o controle do jogo quanto para a monitoração
já mostraram melhoras no processamento do desempenho. Esse novo nível de informação
visuoespacial e cognitivo de adolescentes que disponível pode ser utilizado pelos professores
utilizavam videogames de ação, por exemplo. como uma ferramenta extremamente poderosa
(Green; Bavelier, 2008). para o desenvolvimento pedagógico do aluno,
E se a neurociência é utilizada para tentarmos permitindo um controle personalizado das com-
entender o poder das mídias e da tecnologia petências e dificuldades do estudante.
que utilizamos hoje, o que dizer das novas for- O que dizer então das possibilidades de implantes
mas de interação cérebro-máquina que serão cerebrais, os chamados neurochips, que poderão
possíveis no futuro? interagir diretamente com a estrutura neuronal
Diversas empresas estão criando as novas for- para facilitar o processamento cognitivo? Os
mas de entretenimento que utilizarão o poder implantes cerebrais hoje são utilizados para tra-
da leitura da informação cerebral para gerar tamento de doenças neurológicas e psiquiátricas,
jogos, brinquedos e conteúdos controlados porém evidências já começam a mostrar que
diretamente pelo cérebro. essa influência direta no cérebro pode ajudar a
melhorar as capacidades humanas. Cientistas da
Essa indústria neurotecnológica, hoje, se baseia University of Southern California conseguiram
primariamente na decodificação da atividade mostrar, por exemplo, como um implante de uma
elétrica do cérebro, que pode ser captada e
prótese neuronal pode melhorar a capacidade de
transformada em informação para o controle de
memória em ratos (Berger et al. 2011).
diversas atividades. O uso dessa tecnologia para
a educação pode ser visto no desenvolvimento Seja pelo uso intenso da comunicação, por meio
de aplicativos neuroeducacionais desenvolvidos de interfaces digitais, seja por influência direta
por empresas como a Neurosky Inc. e Advanced no cérebro, a tecnologia está nos levando a um
Brain Monitoring Inc, por exemplo. patamar nunca antes visto. O extremo controle
sobre as bases da natureza humana poderão
Essas tecnologias têm como base a captura do si-
modificar de maneira contundente a forma como
nal eletroencefalográfico que, após ser processado
enxergamos a sociedade e as relações humanas.
e traduzido, pode auxiliar crianças e adolescentes
a realizarem tarefas, geralmente jogos que, em Isso obviamente afetará a forma como entende-
última instância, podem ter objetivos educacio- mos o papel da educação. O aprendizado poderá
nais. Os dados cerebrais são utilizados tanto para ser feito utilizando-se todo o conhecimento
gerado por meio dessas novas interfaces tecno-
lógicas. Iniciativas como a School of One (www.
ev
vel
he
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gZ
e v i s t a d a
Ole
5. schoolofone.org), que utiliza tecnologia para
oferecer uma nova forma de conceber o ensino,
alterarão o modo e a essência do que hoje somos
levados a aprender. A School of One trabalha
BIBLIOGRAFIA
com algoritmos que identificam as dificuldades
e potencialidades dos alunos, auxiliando na BAVELIER D, GREEN C. S, DYE M. W, Children, wired: for
elaboração de conteúdo apropriado para cada better and for worse. Neuron. 2010 Sep 9;67(5):692-701.
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mecânica. O que hoje é valorizado deixará de KOEPP M. J, GUNN R. N, LAWRENCE A. D, CUNNINGHAM
ser, e aquilo que ainda não é estimulado será V. J, DAGHER A, JONES T, BROOKS D. J, BENCH C. J and
cada vez mais necessário. No fim, teremos a GRASBY P. M, Evidence for striatal dopamine release
tecnologia ocupando um lugar cada vez mais during a video game. Nature 393 (1998), pp. 266–268.
importante em relação ao ambiente em que LINERBARGER D, WALKER D, Infants’ and toddlers’
vivemos. Mesmo sem saber como será esse television viewing and language outcomes. American
novo futuro, temos certeza de que ele será Behavioral Scientist. January 2005 vol. 48 no. 5 624-645.
completamente diferente do que hoje temos SCHMIDT M. E, RICH M, RIFAS-SHIMAN S. L, OKEN E.
de padrão. Seja bem-vindo, amanhã. ESPM
and TAVERAS E. M, Television viewing in infancy and
child cognition at 3 years of age in a US cohort. Pediatrics
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BILLY E. M. NASCIMENTO ZILL N, DAVIES E. and DALY M, Viewing of Sesame
Diretor Executivo Forebrain Neurotecnologia.
Street by pre-school children in the United States and
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MD (1994).
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