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As aparências enganam

Mesmo como peças-chave da produção jornalística, as fontes são ainda um ponto de polêmica. Está sobre estas
pessoas o poder de alterar o curso da história, ao contrário do sentimento que os jornalistas se auto-atribuem.
Porém, entre as diversas fontes a imprensa esconde os seus maiores segredos.


Raphael Vaz e Suellen Timm

É um começo de manhã dominical na cidade de Washington. Um pai de família, depois de uma relaxante noite de
sono, desperta de maneira preguiçosa e esboça um leve bocejo. Senta na cama e procura, com os olhos, ainda
fechados, suas pantufas de couro revestidas de uma lã macia. Calça-as e se dirige até o cabideiro, onde está
pendurado seu robe. Veste-o sobre o pijama e se dirige para a cozinha. Logo mais terá de acordar seus filhos e a
esposa para irem à igreja. Alcança o pó de café na estante e derruba três colheres cheias na cafeteira com uma ra-
zoável medida de água. Enquanto espera o apito da cafeteira, escuta no jardim o barulho do jornaleiro que acaba
de arremessar o jornal na varanda. Como de costume, abre a porta e abaixa-se tomando nas mãos o jornal. Nem
pensava no que lhe esperava na primeira página do Washington Post de 18 de junho de 1972.

O jornal noticiava em primeira mão o assalto ao Edifício Watergate, sede do Comitê Nacional Democrata (partido
de oposição ao partido do presidente Nixon). Enquanto lia a manchete, mal imaginava o patriarca que o diário
americano enviava os repórteres Bob Woodward e Carl Bernstein para investigar o que ficou conhecido mundial-
mente como o Caso Watergate.

Este fato só continuou recebendo destaque nas páginas impressas norte-americanas devido ao depoimento de
uma fonte anônima chamada, ficticiamente, de Garganta Profunda (Deep Throat). As histórias e informações de-
sta fonte mudaram de forma direta o rumo da história política americana, que culminou com a renúncia do presi-
dente Nixon. Mesmo sob pressão, os jornalistas Woodward e Bernstein não revelaram a identidade da sua fonte.
Apenas 31 anos depois, em maio de 2005, o ex-vice-presidente do FBI, W. Mark Felt, confessou ser o informante
dos jornalistas, assumindo para si o codinome.

Relação jornalista x fonte

As fontes são o fator principal do trabalho jornalístico. Está sobre estas pessoas o poder de alterar o curso da
história, ao contrário do sentimento que os jornalistas se auto-atribuem. Como são as fontes que vivenciam os
acontecimentos, apenas elas conseguem revelar o que ficaria oculto aos olhos da imprensa e, conseqüentemente,
da população. “O jornalista muitas vezes atribui a si mesmo a verdade dos fatos, esquecendo que no seu trabalho
existe uma total dependência do relato das fontes”, define o repórter do Jornal da Band, Humberto Aragão.

Ele ainda aponta que o jornalista deve ser isento de interesses particulares no momento de apuração, para que
possa transmitir exatamente o que o entrevistado citou, fazendo a informação a mais clara e correta possível aos
leitores. A professora de ensino infantil, Maria Lourdes, confessa que já teve o seu depoimento alterado pelo jor-
nal de sua cidade devido a interesses comerciais. “O jornal queria promover um evento do município, mas eu não
concordei. O meu depoimento foi contra o que o jornal acreditava. Então mudaram as minhas palavras e alteraram
o sentido do que falei”, reclama.

No entanto, o repórter da Folha de S.Paulo, Mauro Souza, acredita que casos como esse são exceção. “Não creio
que os jornalistas sejam incompetentes ao ponto de colocar em risco sua carreira para defender uma opinião
específica”, comenta. Souza atua há mais de 15 anos como jornalista e olha o trabalho sob um espectro comple-
tamente positivo.

“Equilibrar a afirmação das fontes é o papel do jornalista. O cuidado é tanto que, boa parte das redações, pos-
sui uma lista considerável de fontes a serem consultadas”, lembra o editor da Gazeta Mercantil, Alcides Barros.
Porém, o editor alerta que é evidente que, em alguns casos, acontecem alguns deslizes da imprensa.
A estudante de Economia na USP, Renata Huff, acredita que a imprensa deixa a desejar no seu modo de lidar
com as fontes. “Sem este contato, o jornalista não possui valor nenhum. Não é ele que tem o conhecimento e
sim a pessoa que entrevista. Mas, além de muitas vezes tratar com desprezo, a fonte não tem garantia de que
o seu depoimento será publicado com o verdadeiro sentido”, refuta.

Barros enfatiza que normalmente o jornalista trabalha a favor da fonte e não contra. “O uso de off é um ex-
emplo comum. Existem vários casos de profissionais da imprensa que mantiveram suas entrevistas em sigilo
respeitando a sua fonte”, exemplifica. O editor acredita que o jornalismo não consegue desenvolver um trabalho
melhor porque as fontes, em alguns casos, não se interessam em contribuir ou arrumam recusas para dificultar
a imparcialidade. “Prova de que a fonte é um desafio é o tempo que gastamos para escrever em comparação ao
tempo que dispensamos nas entrevistas”, finaliza.

Hora da verdade

Mas nem sempre o que uma produção jornalística apresenta pode ser considerada verdade. Em muitos casos as
pessoas crêem que o jornalismo é perfeito e que apresenta apenas a verdade, mesmo com tantos casos de farsa.
Prova disso é essa reportagem. Provavelmente você acreditou em tudo que escrevemos até agora. Porém, tudo
que é apresentado do primeiro intertítulo em diante não condiz com a realidade. As fontes, a função que exer-
cem e o que disseram, não existem. Todas as informações foram criadas. Inventamos todas as fontes e citações
dessa reportagem para alertar a você, leitor, do que o “quarto poder” é capaz.

Para quem acredita ter perdido tempo lendo esta reportagem, reflita. Repense sua função como leitor ou
telespectador. Será que existe passividade frente à enxurrada de informações que as mídias jornalísticas propõem
por os leitores e consumidores? Será que estes estão assumindo a posição de marionetes jornalísticas, deixando-
se guiar por tudo que lêem, sem questionar se tudo é real? À imprensa cabe o poder de escrever. Analisar o que
nela está escrito não é uma exclusividade do profissional da comunicação, mas de qualquer pessoa letrada.

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  • 1. As aparências enganam Mesmo como peças-chave da produção jornalística, as fontes são ainda um ponto de polêmica. Está sobre estas pessoas o poder de alterar o curso da história, ao contrário do sentimento que os jornalistas se auto-atribuem. Porém, entre as diversas fontes a imprensa esconde os seus maiores segredos. Raphael Vaz e Suellen Timm É um começo de manhã dominical na cidade de Washington. Um pai de família, depois de uma relaxante noite de sono, desperta de maneira preguiçosa e esboça um leve bocejo. Senta na cama e procura, com os olhos, ainda fechados, suas pantufas de couro revestidas de uma lã macia. Calça-as e se dirige até o cabideiro, onde está pendurado seu robe. Veste-o sobre o pijama e se dirige para a cozinha. Logo mais terá de acordar seus filhos e a esposa para irem à igreja. Alcança o pó de café na estante e derruba três colheres cheias na cafeteira com uma ra- zoável medida de água. Enquanto espera o apito da cafeteira, escuta no jardim o barulho do jornaleiro que acaba de arremessar o jornal na varanda. Como de costume, abre a porta e abaixa-se tomando nas mãos o jornal. Nem pensava no que lhe esperava na primeira página do Washington Post de 18 de junho de 1972. O jornal noticiava em primeira mão o assalto ao Edifício Watergate, sede do Comitê Nacional Democrata (partido de oposição ao partido do presidente Nixon). Enquanto lia a manchete, mal imaginava o patriarca que o diário americano enviava os repórteres Bob Woodward e Carl Bernstein para investigar o que ficou conhecido mundial- mente como o Caso Watergate. Este fato só continuou recebendo destaque nas páginas impressas norte-americanas devido ao depoimento de uma fonte anônima chamada, ficticiamente, de Garganta Profunda (Deep Throat). As histórias e informações de- sta fonte mudaram de forma direta o rumo da história política americana, que culminou com a renúncia do presi- dente Nixon. Mesmo sob pressão, os jornalistas Woodward e Bernstein não revelaram a identidade da sua fonte. Apenas 31 anos depois, em maio de 2005, o ex-vice-presidente do FBI, W. Mark Felt, confessou ser o informante dos jornalistas, assumindo para si o codinome. Relação jornalista x fonte As fontes são o fator principal do trabalho jornalístico. Está sobre estas pessoas o poder de alterar o curso da história, ao contrário do sentimento que os jornalistas se auto-atribuem. Como são as fontes que vivenciam os acontecimentos, apenas elas conseguem revelar o que ficaria oculto aos olhos da imprensa e, conseqüentemente, da população. “O jornalista muitas vezes atribui a si mesmo a verdade dos fatos, esquecendo que no seu trabalho existe uma total dependência do relato das fontes”, define o repórter do Jornal da Band, Humberto Aragão. Ele ainda aponta que o jornalista deve ser isento de interesses particulares no momento de apuração, para que possa transmitir exatamente o que o entrevistado citou, fazendo a informação a mais clara e correta possível aos leitores. A professora de ensino infantil, Maria Lourdes, confessa que já teve o seu depoimento alterado pelo jor- nal de sua cidade devido a interesses comerciais. “O jornal queria promover um evento do município, mas eu não concordei. O meu depoimento foi contra o que o jornal acreditava. Então mudaram as minhas palavras e alteraram o sentido do que falei”, reclama. No entanto, o repórter da Folha de S.Paulo, Mauro Souza, acredita que casos como esse são exceção. “Não creio que os jornalistas sejam incompetentes ao ponto de colocar em risco sua carreira para defender uma opinião específica”, comenta. Souza atua há mais de 15 anos como jornalista e olha o trabalho sob um espectro comple- tamente positivo. “Equilibrar a afirmação das fontes é o papel do jornalista. O cuidado é tanto que, boa parte das redações, pos- sui uma lista considerável de fontes a serem consultadas”, lembra o editor da Gazeta Mercantil, Alcides Barros. Porém, o editor alerta que é evidente que, em alguns casos, acontecem alguns deslizes da imprensa.
  • 2. A estudante de Economia na USP, Renata Huff, acredita que a imprensa deixa a desejar no seu modo de lidar com as fontes. “Sem este contato, o jornalista não possui valor nenhum. Não é ele que tem o conhecimento e sim a pessoa que entrevista. Mas, além de muitas vezes tratar com desprezo, a fonte não tem garantia de que o seu depoimento será publicado com o verdadeiro sentido”, refuta. Barros enfatiza que normalmente o jornalista trabalha a favor da fonte e não contra. “O uso de off é um ex- emplo comum. Existem vários casos de profissionais da imprensa que mantiveram suas entrevistas em sigilo respeitando a sua fonte”, exemplifica. O editor acredita que o jornalismo não consegue desenvolver um trabalho melhor porque as fontes, em alguns casos, não se interessam em contribuir ou arrumam recusas para dificultar a imparcialidade. “Prova de que a fonte é um desafio é o tempo que gastamos para escrever em comparação ao tempo que dispensamos nas entrevistas”, finaliza. Hora da verdade Mas nem sempre o que uma produção jornalística apresenta pode ser considerada verdade. Em muitos casos as pessoas crêem que o jornalismo é perfeito e que apresenta apenas a verdade, mesmo com tantos casos de farsa. Prova disso é essa reportagem. Provavelmente você acreditou em tudo que escrevemos até agora. Porém, tudo que é apresentado do primeiro intertítulo em diante não condiz com a realidade. As fontes, a função que exer- cem e o que disseram, não existem. Todas as informações foram criadas. Inventamos todas as fontes e citações dessa reportagem para alertar a você, leitor, do que o “quarto poder” é capaz. Para quem acredita ter perdido tempo lendo esta reportagem, reflita. Repense sua função como leitor ou telespectador. Será que existe passividade frente à enxurrada de informações que as mídias jornalísticas propõem por os leitores e consumidores? Será que estes estão assumindo a posição de marionetes jornalísticas, deixando- se guiar por tudo que lêem, sem questionar se tudo é real? À imprensa cabe o poder de escrever. Analisar o que nela está escrito não é uma exclusividade do profissional da comunicação, mas de qualquer pessoa letrada.