SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 4
Baixar para ler offline
Acta Pediátrica Portuguesa 297
ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE
Portugal
Introdução
A meningite bacteriana é uma infeção grave das menin-
ges que está associada a taxas elevadas de mortalidade
e morbilidade, mesmo após o início da era antibiótica e
com a melhoria dos cuidados de saúde.1-3
O défice audi-
tivo e as sequelas neurológicas são uma importante fon-
te de morbilidade, ocorrendo em 5% a 40% dos indiví-
duos.4
A abordagem terapêutica baseia-se no início
precoce de antibioterapia empírica, sendo que o uso de
terapêutica anti-inflamatória adjuvante, como a cortico-
terapia, se mantém controverso.5-7
Objetivos
Apresentam-se e comentam-se os resultados de uma
revisão sistemática da Cochrane Database of Systematic
Reviews,1
cujo objetivo foi avaliar o efeito do uso de tera-
pêutica adjuvante com corticosteroides versus placebo,
na mortalidade, défice auditivo e sequelas neurológicas
em crianças e adultos com meningite aguda bacteriana.
Métodos
Nesta revisão foi realizada uma atualização da revisão
publicada em 2013 que seguiu a metodologia padro-
nizada das revisões Cochrane, incluindo a pesquisa
sistemática de estudos até fevereiro de 2015, pesquisa
manual das referências citadas em estudos publicados e
de resumos apresentados em congressos e registos de
estudos clínicos da Organização Mundial de Saúde e da
ClinicalTrials.gov, até junho de 2015.
Foram incluídos ensaios clínicos controlados e aleato-
rizados, com participantes de todas as idades, com o
diagnóstico de meningite bacteriana adquirida na comu-
nidade, sob antibioterapia, submetidos a terapêutica
com corticosteroides ou placebo.
Foram considerados outcomes primários a mortalidade,
sequelas auditivas (graves se perda auditiva bilateral >
60 dB ou necessidade de prótese auditiva) e sequelas
neurológicas (presença de défices neurológicos focais ou
epilepsia de novo, ataxia grave ou perturbação grave da
memória / concentração). Definiram-se como outcomes
secundários a ocorrência de efeitos adversos caracteriza-
dos por hemorragia gastrintestinal clinicamente evidente,
artrite reativa, pericardite, infeção a vírus herpes zoster
ou herpes simplex, infeção fúngica, febre recorrente
(temperatura ≥ 38ºC após pelo menos um dia de apirexia)
e febre persistente (febre com duração superior a cinco
dias após início de antibioterapia adequada).
Foi realizada uma análise de subgrupos de acordo com
a idade (< 16 anos e 16 anos), microrganismos respon-
sáveis (Haemophilus influenzae, Neisseria meningitidis
e Streptococcus pneumoniae), local do estudo (países
desenvolvidos e em desenvolvimento), altura de admi-
nistração da corticoterapia (prévia ou simultaneamente
com a primeira dose de antibiótico e após a primeira
dose) e qualidade metodológica dos estudos (definida
pelos autores como alta, moderada e baixa, consoante
a classificação nos itens da Cochrane Risk of Bias Tool).
Todos os resultados foram apresentados em variáveis
dicotómicas, tendo sido usado o risco relativo (RR) com
intervalo de confiança de 95% (IC 95%) como medida de
efeito. A heterogeneidade estatística dos resultados foi
avaliada através da medida I2
.
Para os estudos com dados de seguimento e outcomes
em falta, foram realizadas análises de sensibilidade por
imputação de dados.
COCHRANE CORNER
Ana Dias Curado1
, Ricardo M Fernandes1,2,3
, Ana Brett4,5,6
Acta Pediatr Port 2018;49:297-300
DOI: 10. 10.21069/APP.2018.14652
Corticosteroids for Acute Bacterial Meningitis
Corticosteroides na Meningite Aguda Bacteriana
1. Departamento de Pediatria, Hospital de Santa Maria, Centro Hospitalar Lisboa Norte, Centro Académico de Medicina de Lisboa, Lisboa, Portugal
2. Unidade de Farmacologia Clínica, Instituto de Medicina Molecular, Faculdade de Medicina, Universidade de Lisboa, Centro Académico de Medicina de Lisboa, Lisboa, Portugal
3. Centro Colaborador Português da Rede Cochrane Iberoamericana, Cochrane Portugal, Lisboa, Portugal
4. Serviço de Urgência, Hospital Pediátrico de Coimbra, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, Coimbra, Portugal
5. Unidade de Infecciologia, Hospital Pediátrico de Coimbra, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, Coimbra, Portugal
6. Clínica Universitária de Pediatria, Faculdade de Medicina, Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal
Correspondência
Ana Dias Curado
anacurado@campus.ul.pt
Serviço de Pediatria, Departamento de Pediatria, Hospital de Santa Maria, Avenida Professor Egas Moniz, 1649-035 Lisboa, Portugal
Recebido: XX/XX/2018 | Aceite: XX/XX/2018
298 Acta Pediátrica Portuguesa
Corticosteroides na Meningite Aguda Bacteriana
Resultados
Foram incluídos 25 estudos com um total de 4121 par-
ticipantes (2064 tratados com corticosteroides e 2057
com placebo), dos quais 2511 crianças. Os principais
resultados encontram-se representados na Tabela 1.
Nove estudos decorreram em países em desenvolvi-
mento e 16 em países desenvolvidos.
A dexametasona foi o corticosteroide mais utilizado
(22 dos 25 estudos, 1949 participantes), com dosagens
entre 0,4-1,5 mg/kg/dia e duração entre dois e quatro
dias. A medicação em estudo foi administrada prévia ou
simultaneamente com a primeira dose de antibiótico
em 13 estudos e após a primeira dose em oito. A morta-
lidade variou entre 0% e 54%.
A qualidade da evidência foi considerada alta em quatro
estudos, moderada em 14 e baixa em sete.
Mortalidade
Verificou-se uma redução não estatisticamente signifi-
cativa da mortalidade no grupo tratado com corticoste-
roides (Tabela 1).
O uso de corticosteroides reduziu a mortalidade na
meningite a Streptococcus pneumoniae (RR 0,84; IC
95% 0,72 a 0,98), mas não na meningite a Haemophilus
influenzae ou Neisseria meningitidis.
Sequelas auditivas e neurológicas
Na globalidade, o uso de corticosteroides associou-se a
taxas mais baixas de défice auditivo grave, de qualquer
défice auditivo e de sequelas neurológicas. Em crianças, o
seu uso reduziu a ocorrência de perda auditiva (Tabela 1).
Nas crianças com meningite a Haemophilus influenzae, a
perda auditiva grave foi significativamente reduzida com
o uso de corticosteroides (RR 0,34; IC 95% 0,20 a 0,59),
não se tendo constatado benefício estatisticamente
significativo na meningite causada por outros microrga-
nismos (RR 0,95; IC 95% 0,65 a 1,39).
Nos estudos em países desenvolvidos, os corticosteroi-
des contribuíram para uma redução do défice auditivo
grave (RR 0,52; IC 95% 0,35 a 0,78) e sequelas neuroló-
gicas (RR 0,67; IC 95% 0,46 a 0,97) em crianças quando
incluindo todos os microrganismos, não se tendo verifi-
cado efeito benéfico nos estudos realizados em países
em desenvolvimento.
Relativamente ao período de administração, não foram
demonstradas diferenças significativas nas sequelas
auditivas e neurológicas.
Quando analisados os subgrupos de acordo com a qua-
lidade dos estudos, foi demonstrado efeito benéfico do
uso de corticosteroides na redução do défice auditivo
grave apenas nos estudos de moderada qualidade (RR
0,47; IC 95% 0,29 a 0,75), no entanto, com heterogenei-
dade significativa entre subgrupos (I2
70%).
A análise de sensibilidade por imputação de dados omis-
sos não demonstrou benefício do uso de corticosteroi-
des na perda auditiva ou sequelas neurológicas.
Efeitos adversos
Os doentes tratados com corticosteroides tiveram mais
febre recorrente (RR 1,27; IC 95% 1,09 a 1,47), mas
menos febre persistente (RR 0,29; IC 95% 0,12 a 0,70),
comparativamente ao grupo controlo. Outros efeitos
adversos ocorreram em proporção semelhante em
ambos os grupos.
IC 95% - intervalo de confiança a 95%; RR - risco relativo.
* Resultados com base no total dos estudos incluídos nesta revisão.
Tabela 1. Comparação do uso de corticosteroides versus placebo em doentes com meningite bacteriana aguda
Outcome
Efeito relativo
(corticosteroides vs placebo)
Número de participantes
Qualidade da evidência
(GRADE)
Mortalidade
Geral*
Crianças
17,8% vs 19,9%; RR 0,9; IC 95% 0,80 a 1,01
4121
(25 estudos)
Moderada
13,1% vs 14,7%; RR 0,89; IC 95% 0,74 a 1,07
Défice auditivo grave
Geral*
Crianças
6% vs 9,3%; RR 0,67; IC 95% 0,51 a 0,88
2437
(17 estudos)
Elevada
7,3% vs 11,2%; RR 0,67; IC 95% 0,49 a 0,91
Qualquer défice auditivo
Geral*
Crianças
13,8% vs 19%; RR 0,74; IC 95% 0,63 a 0,87
2785
(20 estudos)
Elevada
14,6% vs 20,4%; RR 0,73; IC 95% 0,61 a 0,86
Sequelas neurológicas 17,9% vs 21,6%; RR 0,83; IC 95% 0,69 a 1,00
1756
(13 estudos)
Elevada
Febre recorrente 28,3% vs 22,1%; RR 1,27; IC 95% 1,09 a 1,47
1723
(12 estudos)
Moderada
Acta Pediátrica Portuguesa 299
Corticosteroides na Meningite Aguda Bacteriana
Conclusões
Esta revisão sistemática demonstrou que os corticos-
teroides reduziram significativamente a perda auditiva
e sequelas neurológicas, mas não a mortalidade, em
doentes com meningite bacteriana. Em crianças, o seu
uso teve um efeito benéfico na prevenção de défice
auditivo grave e de qualquer défice auditivo, sendo que
em estudos realizados em países desenvolvidos se veri-
ficou também efeito protetor na redução de sequelas
neurológicas.
Comentários
Apesar da incidência da meningite bacteriana em idade
pediátrica ter diminuído com a introdução das vaci-
nas contra o Haemophilus influenzae tipo b (Hib),
Streptococcus pneumoniae e Neisseria meningitidis,
esta infeção continua a associar-se a morbimortalidade
significativa,8
justificando-se a necessidade de procurar
terapêuticas adjuvantes eficazes.
A meningite é caracterizada por inflamação importante
do espaço subaracnoideu, pelo que se postula que o uso
de corticoterapia poderá reduzir este processo inflamató-
rio.9
No entanto, existe a possibilidade do seu uso poder
atrasar a esterilização do líquor, pois ao reduzir a infla-
mação e permeabilidade da barreira hemato-encefálica,
poderá existir potencial interferência na penetração da
antibioterapia no espaço subaracnoideu.10
Os efeitos
benéficos demonstrados nesta revisão suportam o uso
de corticoterapia em crianças e adultos com meningite
aguda bacteriana nos países desenvolvidos, sendo refor-
çados pela ausência de efeitos adversos importantes.
A dexametasona foi considerada o corticosteroide de
escolha, por ter melhor penetração na barreira hemato-
-encefálica e maior duração de ação biológica, podendo
ser iniciada prévia ou simultaneamente com a primeira
dose de antibiótico. A maioria dos estudos incluídos usou
um regime com duração de quatro dias, sem um aumento
de efeitos adversos em relação a um regime de dois dias,
sendo a primeira a posologia recomendada nesta revisão.
O uso de corticoterapia tem sido bem fundamentado
nas meningites a Hib, que representaram uma pro-
porção elevada dos estudos com crianças incluídos
desta revisão. Contudo, esta doença foi virtualmente
eliminada nos países desenvolvidos com a vacinação
universal. Embora não se tenha constatado benefício
estatisticamente significativo na meningite causada por
outros microrganismos, esta revisão demonstrou que,
em países desenvolvidos, ocorreu um efeito favorável
do uso de corticosteroides no défice auditivo grave,
quando incluídos todos os microrganismos, nomeada-
mente não Hib.
Atualmente, várias guidelines e protocolos de países
desenvolvidos, entre os quais o Reino Unido e os
Estados Unidos da América,6,8,9,11,12
recomendam o uso
precoce de dexametasona (0,15 mg/kg, quatro vezes
por dia, durante quatro dias) perante a suspeita ou con-
firmação de meningite bacteriana em crianças com 3 ou
mais meses, suportadas pelos resultados desta revisão.
A guideline sul africana,13
que se baseia em estudos em
países em desenvolvimento, não o recomenda. Segundo
os protocolos europeus da European Society of Clinical
Microbiology and Infectious Diseases,8
recomenda-se
suspender a dexametasona em doentes cuja menin-
gite bacteriana foi excluída ou se o microrganismo
causal for outro que não o Haemophilus influenzae ou
Sreptococcus pneumoniae, embora alguns peritos acon-
selhem que deva ser continuada independentemente
da bactéria causal.8
De notar que o papel da corticoterapia adjuvante na
meningite neonatal se mantém pouco claro pelo dife-
rente espetro de microrganismos causais e carência de
dados de estudos clínicos controlados e aleatorizados
com aplicabilidade, tendo sido incluído apenas um
estudo em recém-nascidos nesta revisão.
Algumas limitações desta revisão poderão reduzir a sua
fiabilidade, nomeadamente pela heterogeneidade das
taxas de mortalidade reportadas entre estudos, com a
inclusão tanto de estudos com doença menos grave,
sugerido pelas baixas taxas de mortalidade (< 3%), como
de cinco estudos com doença avançada grave, sugerido
pelas taxas elevadas de mortalidade (> 25%), podendo
afetar a estimativa do efeito da corticoterapia, quer
globalmente, quer para subgrupos específicos (como
em agentes específicos como Neisseria meningitidis).
Por outro lado, a definição de qualidade metodológica
dos estudos pelos autores não é padronizada nas reco-
mendações habituais das revisões Cochrane, o que pode
limitar a interpretação das análises de subgrupo.
Palavras-chave: Adulto; Criança; Doença Aguda;
Glucocorticoides/uso terapêutico; Meningites
Bacterianas/complicações; Meningites Bacterianas/
mortalidade; Meningites Bacterianas/tratamento
farmacológico; Países Desenvolvidos; Países em
Desenvolvimento
Keywords: Acute Disease; Adult; Child; Developed
Countries; Developing Countries; Glucocorticoids/
therapeutic use; Meningitis, Bacterial/complica-
tions; Meningitis, Bacterial/drug therapy; Meningitis,
Bacterial/mortality
300 Acta Pediátrica Portuguesa
Corticosteroides na Meningite Aguda Bacteriana
Conflitos de Interesse
Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse na
realização do presente trabalho.
Fontes de Financiamento
Não existiram fontes externas de financiamento para a
realização deste artigo.
Referências
1. Brouwer MC, McIntyre P, Prasad K, van de Beek D.
Corticosteroids for acute bacterial meningitis. Cochrane
Database Syst Rev 2015;9:CD004405.
2. Brouwer MC, Tunkel AR, van de Beek D. Epidemiology, diag-
nosis, and antimicrobial treatment of acute bacterial meningi-
tis. Clin Microbiol Rev 2010;23:467-92.
3. Kim KS. Acute bacterial meningitis in infants and children.
Lancet Infect Dis 2010;10:32-42.
4. Baraff LJ, Lee SI, Schriger DL. Outcomes of bacterial
meningitis in children: A meta-analysis. Pediatr Infect Dis J
1993;12:389-94.
5. van de Beek D, Brouwer MC, Thwaites GE, Tunkel AR.
Advances in treatment of bacterial meningitis. Lancet
2012;380:1693-702.
6. Tunkel AR, Hartman BJ, Kaplan SL, Kaufman BA, Roos KL,
Scheld WM, et al. Practice guidelines for the management of
bacterial meningitis. Clin Infect Dis 2004;39:1267-84.
7. Mongelluzzo J, Mohamad Z, Ten Have TR, Shah SS.
Corticosteroids and mortality in children with bacterial menin-
gitis. JAMA 2008;299:2048-55.
8. van de Beek D, Cabellos C, Dzupova O, Esposito S, Klein M,
Kloek AT, et al. ESCMID guideline: Diagnosis and treatment of
acute bacterial meningitis. Clin Microbiol Infect 2016;22:S37-62.
9. National Collaborating Centre for Women’s and Children’s
Health. Bacterial meningitis and meningococcal septicaemia.
management of bacterial meningitis and meningococcal septi-
caemia in children and young people younger than 16 years in
primary and secondary care. London: RCOG Press; 2010.
10. Viladrich PF, Gudiol F, Linares J, Pallares R, Sabate I,
Rufi G, et al. Evaluation of vancomycin for therapy of adult
pneumococcal meningitis. Antimicrob Agents Chemother
1991;35:2467-72.
11. NSW Ministry of Health. Infants and children: Acute
management of bacterial meningitis. Clinical practice gui-
deline [consultado em 31 de maio de 2018]. Disponível em:
http://www1.health.nsw.gov.au/pds/ActivePDSDocuments/
GL2014_013.pdf
12. Le Saux N. Guidelines for the management of suspected
and confirmed bacterial meningitis in Canadian children older
than one month of age. Paediatr Child Health 2014;19:141-52.
13. Boyles T, Bamford C, Bateman K, Blumberg L, Dramowski
A, Karstaedt A, et al. Guidelines for the management of acute
meningitis in children and adults in South Africa. South Afr J
Epidemiol Infect 2013;28:5-15.

Mais conteúdo relacionado

Semelhante a 14757 45935-1-sm

Microbiologia trabalho final
Microbiologia   trabalho finalMicrobiologia   trabalho final
Microbiologia trabalho finalMarina Sousa
 
Bula astrazaneca Instituto ButantanY_QJEcjnUUPHMzyW_o5-x6tZfBJTG3jp.pdf
Bula astrazaneca Instituto ButantanY_QJEcjnUUPHMzyW_o5-x6tZfBJTG3jp.pdfBula astrazaneca Instituto ButantanY_QJEcjnUUPHMzyW_o5-x6tZfBJTG3jp.pdf
Bula astrazaneca Instituto ButantanY_QJEcjnUUPHMzyW_o5-x6tZfBJTG3jp.pdfELIAS OMEGA
 
Farmacocineticaefarmacodinamica.pdf
Farmacocineticaefarmacodinamica.pdfFarmacocineticaefarmacodinamica.pdf
Farmacocineticaefarmacodinamica.pdfNayara85
 
bula vacina jonhoson InCJQdTVHsdL46wL6inQS4X7hNA7hOZ4.pdf
bula vacina jonhoson InCJQdTVHsdL46wL6inQS4X7hNA7hOZ4.pdfbula vacina jonhoson InCJQdTVHsdL46wL6inQS4X7hNA7hOZ4.pdf
bula vacina jonhoson InCJQdTVHsdL46wL6inQS4X7hNA7hOZ4.pdfELIAS OMEGA
 
A clamídia e o desafio do diagnóstico laboratorial
A clamídia e o desafio do diagnóstico laboratorialA clamídia e o desafio do diagnóstico laboratorial
A clamídia e o desafio do diagnóstico laboratorialPublicações Weinmann
 
Aula de eventos adversos aspectos introdutorios
Aula de eventos adversos   aspectos introdutoriosAula de eventos adversos   aspectos introdutorios
Aula de eventos adversos aspectos introdutoriosProqualis
 
Prognóstico e risco em odontologia 2011
Prognóstico e risco em odontologia 2011Prognóstico e risco em odontologia 2011
Prognóstico e risco em odontologia 2011João Batista Zanirato
 
Imunodeficiências primárias na prática clínica
Imunodeficiências primárias na prática clínicaImunodeficiências primárias na prática clínica
Imunodeficiências primárias na prática clínicaJUAN CARLOS CORREA CELI
 
Congresso brasileiro auditoria quimioterapia oral_2013_pdf
Congresso brasileiro auditoria quimioterapia oral_2013_pdfCongresso brasileiro auditoria quimioterapia oral_2013_pdf
Congresso brasileiro auditoria quimioterapia oral_2013_pdfLeandro Brust
 
Vacinação ocupacional
Vacinação ocupacionalVacinação ocupacional
Vacinação ocupacionalCosmo Palasio
 
Segurança e eficácia da vacina contra hepatite b no lúpus eritematoso sistêmi...
Segurança e eficácia da vacina contra hepatite b no lúpus eritematoso sistêmi...Segurança e eficácia da vacina contra hepatite b no lúpus eritematoso sistêmi...
Segurança e eficácia da vacina contra hepatite b no lúpus eritematoso sistêmi...Nádia Elizabeth Barbosa Villas Bôas
 
Radioquimioterapia com cisplatina, etoposido e ifosfamida associada a ácido v...
Radioquimioterapia com cisplatina, etoposido e ifosfamida associada a ácido v...Radioquimioterapia com cisplatina, etoposido e ifosfamida associada a ácido v...
Radioquimioterapia com cisplatina, etoposido e ifosfamida associada a ácido v...Francisco H C Felix
 
Terapia alvo na cancerologia pediátrica
Terapia alvo na cancerologia pediátricaTerapia alvo na cancerologia pediátrica
Terapia alvo na cancerologia pediátricaFrancisco H C Felix
 
Campanha sobrevivendo à sepse 2012 mais atualizado
Campanha sobrevivendo à sepse 2012   mais atualizadoCampanha sobrevivendo à sepse 2012   mais atualizado
Campanha sobrevivendo à sepse 2012 mais atualizadoDaniel Valente
 

Semelhante a 14757 45935-1-sm (20)

Microbiologia trabalho final
Microbiologia   trabalho finalMicrobiologia   trabalho final
Microbiologia trabalho final
 
Artigo1.1 r4
Artigo1.1 r4Artigo1.1 r4
Artigo1.1 r4
 
Bula astrazaneca Instituto ButantanY_QJEcjnUUPHMzyW_o5-x6tZfBJTG3jp.pdf
Bula astrazaneca Instituto ButantanY_QJEcjnUUPHMzyW_o5-x6tZfBJTG3jp.pdfBula astrazaneca Instituto ButantanY_QJEcjnUUPHMzyW_o5-x6tZfBJTG3jp.pdf
Bula astrazaneca Instituto ButantanY_QJEcjnUUPHMzyW_o5-x6tZfBJTG3jp.pdf
 
Farmacocineticaefarmacodinamica.pdf
Farmacocineticaefarmacodinamica.pdfFarmacocineticaefarmacodinamica.pdf
Farmacocineticaefarmacodinamica.pdf
 
bula vacina jonhoson InCJQdTVHsdL46wL6inQS4X7hNA7hOZ4.pdf
bula vacina jonhoson InCJQdTVHsdL46wL6inQS4X7hNA7hOZ4.pdfbula vacina jonhoson InCJQdTVHsdL46wL6inQS4X7hNA7hOZ4.pdf
bula vacina jonhoson InCJQdTVHsdL46wL6inQS4X7hNA7hOZ4.pdf
 
Varicela 6
Varicela 6Varicela 6
Varicela 6
 
Anais - I SPEED
Anais - I SPEEDAnais - I SPEED
Anais - I SPEED
 
A clamídia e o desafio do diagnóstico laboratorial
A clamídia e o desafio do diagnóstico laboratorialA clamídia e o desafio do diagnóstico laboratorial
A clamídia e o desafio do diagnóstico laboratorial
 
TelessaúdeRS
TelessaúdeRSTelessaúdeRS
TelessaúdeRS
 
Aula de eventos adversos aspectos introdutorios
Aula de eventos adversos   aspectos introdutoriosAula de eventos adversos   aspectos introdutorios
Aula de eventos adversos aspectos introdutorios
 
Prognóstico e risco em odontologia 2011
Prognóstico e risco em odontologia 2011Prognóstico e risco em odontologia 2011
Prognóstico e risco em odontologia 2011
 
Imunodeficiências primárias na prática clínica
Imunodeficiências primárias na prática clínicaImunodeficiências primárias na prática clínica
Imunodeficiências primárias na prática clínica
 
Congresso brasileiro auditoria quimioterapia oral_2013_pdf
Congresso brasileiro auditoria quimioterapia oral_2013_pdfCongresso brasileiro auditoria quimioterapia oral_2013_pdf
Congresso brasileiro auditoria quimioterapia oral_2013_pdf
 
Vacinação ocupacional
Vacinação ocupacionalVacinação ocupacional
Vacinação ocupacional
 
Segurança e eficácia da vacina contra hepatite b no lúpus eritematoso sistêmi...
Segurança e eficácia da vacina contra hepatite b no lúpus eritematoso sistêmi...Segurança e eficácia da vacina contra hepatite b no lúpus eritematoso sistêmi...
Segurança e eficácia da vacina contra hepatite b no lúpus eritematoso sistêmi...
 
Consenso criança e adolescente suplemento 02 - 2011
Consenso criança e adolescente   suplemento 02 - 2011Consenso criança e adolescente   suplemento 02 - 2011
Consenso criança e adolescente suplemento 02 - 2011
 
Radioquimioterapia com cisplatina, etoposido e ifosfamida associada a ácido v...
Radioquimioterapia com cisplatina, etoposido e ifosfamida associada a ácido v...Radioquimioterapia com cisplatina, etoposido e ifosfamida associada a ácido v...
Radioquimioterapia com cisplatina, etoposido e ifosfamida associada a ácido v...
 
Terapia alvo na cancerologia pediátrica
Terapia alvo na cancerologia pediátricaTerapia alvo na cancerologia pediátrica
Terapia alvo na cancerologia pediátrica
 
Campanha sobrevivendo à sepse 2012 mais atualizado
Campanha sobrevivendo à sepse 2012   mais atualizadoCampanha sobrevivendo à sepse 2012   mais atualizado
Campanha sobrevivendo à sepse 2012 mais atualizado
 
Atualização da SBP sobre Vacinas COVID-19 em Pediatria
Atualização da SBP sobre Vacinas COVID-19 em PediatriaAtualização da SBP sobre Vacinas COVID-19 em Pediatria
Atualização da SBP sobre Vacinas COVID-19 em Pediatria
 

Último

cuidados ao recem nascido ENFERMAGEM .pptx
cuidados ao recem nascido ENFERMAGEM .pptxcuidados ao recem nascido ENFERMAGEM .pptx
cuidados ao recem nascido ENFERMAGEM .pptxMarcosRicardoLeite
 
Terapia Celular: Legislação, Evidências e Aplicabilidades
Terapia Celular: Legislação, Evidências e AplicabilidadesTerapia Celular: Legislação, Evidências e Aplicabilidades
Terapia Celular: Legislação, Evidências e AplicabilidadesFrente da Saúde
 
88888888888888888888888888888663342.pptx
88888888888888888888888888888663342.pptx88888888888888888888888888888663342.pptx
88888888888888888888888888888663342.pptxLEANDROSPANHOL1
 
aula entrevista avaliação exame do paciente.ppt
aula entrevista avaliação exame do paciente.pptaula entrevista avaliação exame do paciente.ppt
aula entrevista avaliação exame do paciente.pptDaiana Moreira
 
Modelo de apresentação de TCC em power point
Modelo de apresentação de TCC em power pointModelo de apresentação de TCC em power point
Modelo de apresentação de TCC em power pointwylliamthe
 
Uso de Células-Tronco Mesenquimais e Oxigenoterapia Hiperbárica
Uso de Células-Tronco Mesenquimais e Oxigenoterapia HiperbáricaUso de Células-Tronco Mesenquimais e Oxigenoterapia Hiperbárica
Uso de Células-Tronco Mesenquimais e Oxigenoterapia HiperbáricaFrente da Saúde
 
Saúde Intestinal - 5 práticas possíveis para manter-se saudável
Saúde Intestinal - 5 práticas possíveis para manter-se saudávelSaúde Intestinal - 5 práticas possíveis para manter-se saudável
Saúde Intestinal - 5 práticas possíveis para manter-se saudávelVernica931312
 
Manual-de-protocolos-de-tomografia-computadorizada (1).pdf
Manual-de-protocolos-de-tomografia-computadorizada (1).pdfManual-de-protocolos-de-tomografia-computadorizada (1).pdf
Manual-de-protocolos-de-tomografia-computadorizada (1).pdfFidelManuel1
 

Último (8)

cuidados ao recem nascido ENFERMAGEM .pptx
cuidados ao recem nascido ENFERMAGEM .pptxcuidados ao recem nascido ENFERMAGEM .pptx
cuidados ao recem nascido ENFERMAGEM .pptx
 
Terapia Celular: Legislação, Evidências e Aplicabilidades
Terapia Celular: Legislação, Evidências e AplicabilidadesTerapia Celular: Legislação, Evidências e Aplicabilidades
Terapia Celular: Legislação, Evidências e Aplicabilidades
 
88888888888888888888888888888663342.pptx
88888888888888888888888888888663342.pptx88888888888888888888888888888663342.pptx
88888888888888888888888888888663342.pptx
 
aula entrevista avaliação exame do paciente.ppt
aula entrevista avaliação exame do paciente.pptaula entrevista avaliação exame do paciente.ppt
aula entrevista avaliação exame do paciente.ppt
 
Modelo de apresentação de TCC em power point
Modelo de apresentação de TCC em power pointModelo de apresentação de TCC em power point
Modelo de apresentação de TCC em power point
 
Uso de Células-Tronco Mesenquimais e Oxigenoterapia Hiperbárica
Uso de Células-Tronco Mesenquimais e Oxigenoterapia HiperbáricaUso de Células-Tronco Mesenquimais e Oxigenoterapia Hiperbárica
Uso de Células-Tronco Mesenquimais e Oxigenoterapia Hiperbárica
 
Saúde Intestinal - 5 práticas possíveis para manter-se saudável
Saúde Intestinal - 5 práticas possíveis para manter-se saudávelSaúde Intestinal - 5 práticas possíveis para manter-se saudável
Saúde Intestinal - 5 práticas possíveis para manter-se saudável
 
Manual-de-protocolos-de-tomografia-computadorizada (1).pdf
Manual-de-protocolos-de-tomografia-computadorizada (1).pdfManual-de-protocolos-de-tomografia-computadorizada (1).pdf
Manual-de-protocolos-de-tomografia-computadorizada (1).pdf
 

14757 45935-1-sm

  • 1. Acta Pediátrica Portuguesa 297 ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE Portugal Introdução A meningite bacteriana é uma infeção grave das menin- ges que está associada a taxas elevadas de mortalidade e morbilidade, mesmo após o início da era antibiótica e com a melhoria dos cuidados de saúde.1-3 O défice audi- tivo e as sequelas neurológicas são uma importante fon- te de morbilidade, ocorrendo em 5% a 40% dos indiví- duos.4 A abordagem terapêutica baseia-se no início precoce de antibioterapia empírica, sendo que o uso de terapêutica anti-inflamatória adjuvante, como a cortico- terapia, se mantém controverso.5-7 Objetivos Apresentam-se e comentam-se os resultados de uma revisão sistemática da Cochrane Database of Systematic Reviews,1 cujo objetivo foi avaliar o efeito do uso de tera- pêutica adjuvante com corticosteroides versus placebo, na mortalidade, défice auditivo e sequelas neurológicas em crianças e adultos com meningite aguda bacteriana. Métodos Nesta revisão foi realizada uma atualização da revisão publicada em 2013 que seguiu a metodologia padro- nizada das revisões Cochrane, incluindo a pesquisa sistemática de estudos até fevereiro de 2015, pesquisa manual das referências citadas em estudos publicados e de resumos apresentados em congressos e registos de estudos clínicos da Organização Mundial de Saúde e da ClinicalTrials.gov, até junho de 2015. Foram incluídos ensaios clínicos controlados e aleato- rizados, com participantes de todas as idades, com o diagnóstico de meningite bacteriana adquirida na comu- nidade, sob antibioterapia, submetidos a terapêutica com corticosteroides ou placebo. Foram considerados outcomes primários a mortalidade, sequelas auditivas (graves se perda auditiva bilateral > 60 dB ou necessidade de prótese auditiva) e sequelas neurológicas (presença de défices neurológicos focais ou epilepsia de novo, ataxia grave ou perturbação grave da memória / concentração). Definiram-se como outcomes secundários a ocorrência de efeitos adversos caracteriza- dos por hemorragia gastrintestinal clinicamente evidente, artrite reativa, pericardite, infeção a vírus herpes zoster ou herpes simplex, infeção fúngica, febre recorrente (temperatura ≥ 38ºC após pelo menos um dia de apirexia) e febre persistente (febre com duração superior a cinco dias após início de antibioterapia adequada). Foi realizada uma análise de subgrupos de acordo com a idade (< 16 anos e 16 anos), microrganismos respon- sáveis (Haemophilus influenzae, Neisseria meningitidis e Streptococcus pneumoniae), local do estudo (países desenvolvidos e em desenvolvimento), altura de admi- nistração da corticoterapia (prévia ou simultaneamente com a primeira dose de antibiótico e após a primeira dose) e qualidade metodológica dos estudos (definida pelos autores como alta, moderada e baixa, consoante a classificação nos itens da Cochrane Risk of Bias Tool). Todos os resultados foram apresentados em variáveis dicotómicas, tendo sido usado o risco relativo (RR) com intervalo de confiança de 95% (IC 95%) como medida de efeito. A heterogeneidade estatística dos resultados foi avaliada através da medida I2 . Para os estudos com dados de seguimento e outcomes em falta, foram realizadas análises de sensibilidade por imputação de dados. COCHRANE CORNER Ana Dias Curado1 , Ricardo M Fernandes1,2,3 , Ana Brett4,5,6 Acta Pediatr Port 2018;49:297-300 DOI: 10. 10.21069/APP.2018.14652 Corticosteroids for Acute Bacterial Meningitis Corticosteroides na Meningite Aguda Bacteriana 1. Departamento de Pediatria, Hospital de Santa Maria, Centro Hospitalar Lisboa Norte, Centro Académico de Medicina de Lisboa, Lisboa, Portugal 2. Unidade de Farmacologia Clínica, Instituto de Medicina Molecular, Faculdade de Medicina, Universidade de Lisboa, Centro Académico de Medicina de Lisboa, Lisboa, Portugal 3. Centro Colaborador Português da Rede Cochrane Iberoamericana, Cochrane Portugal, Lisboa, Portugal 4. Serviço de Urgência, Hospital Pediátrico de Coimbra, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, Coimbra, Portugal 5. Unidade de Infecciologia, Hospital Pediátrico de Coimbra, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, Coimbra, Portugal 6. Clínica Universitária de Pediatria, Faculdade de Medicina, Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal Correspondência Ana Dias Curado anacurado@campus.ul.pt Serviço de Pediatria, Departamento de Pediatria, Hospital de Santa Maria, Avenida Professor Egas Moniz, 1649-035 Lisboa, Portugal Recebido: XX/XX/2018 | Aceite: XX/XX/2018
  • 2. 298 Acta Pediátrica Portuguesa Corticosteroides na Meningite Aguda Bacteriana Resultados Foram incluídos 25 estudos com um total de 4121 par- ticipantes (2064 tratados com corticosteroides e 2057 com placebo), dos quais 2511 crianças. Os principais resultados encontram-se representados na Tabela 1. Nove estudos decorreram em países em desenvolvi- mento e 16 em países desenvolvidos. A dexametasona foi o corticosteroide mais utilizado (22 dos 25 estudos, 1949 participantes), com dosagens entre 0,4-1,5 mg/kg/dia e duração entre dois e quatro dias. A medicação em estudo foi administrada prévia ou simultaneamente com a primeira dose de antibiótico em 13 estudos e após a primeira dose em oito. A morta- lidade variou entre 0% e 54%. A qualidade da evidência foi considerada alta em quatro estudos, moderada em 14 e baixa em sete. Mortalidade Verificou-se uma redução não estatisticamente signifi- cativa da mortalidade no grupo tratado com corticoste- roides (Tabela 1). O uso de corticosteroides reduziu a mortalidade na meningite a Streptococcus pneumoniae (RR 0,84; IC 95% 0,72 a 0,98), mas não na meningite a Haemophilus influenzae ou Neisseria meningitidis. Sequelas auditivas e neurológicas Na globalidade, o uso de corticosteroides associou-se a taxas mais baixas de défice auditivo grave, de qualquer défice auditivo e de sequelas neurológicas. Em crianças, o seu uso reduziu a ocorrência de perda auditiva (Tabela 1). Nas crianças com meningite a Haemophilus influenzae, a perda auditiva grave foi significativamente reduzida com o uso de corticosteroides (RR 0,34; IC 95% 0,20 a 0,59), não se tendo constatado benefício estatisticamente significativo na meningite causada por outros microrga- nismos (RR 0,95; IC 95% 0,65 a 1,39). Nos estudos em países desenvolvidos, os corticosteroi- des contribuíram para uma redução do défice auditivo grave (RR 0,52; IC 95% 0,35 a 0,78) e sequelas neuroló- gicas (RR 0,67; IC 95% 0,46 a 0,97) em crianças quando incluindo todos os microrganismos, não se tendo verifi- cado efeito benéfico nos estudos realizados em países em desenvolvimento. Relativamente ao período de administração, não foram demonstradas diferenças significativas nas sequelas auditivas e neurológicas. Quando analisados os subgrupos de acordo com a qua- lidade dos estudos, foi demonstrado efeito benéfico do uso de corticosteroides na redução do défice auditivo grave apenas nos estudos de moderada qualidade (RR 0,47; IC 95% 0,29 a 0,75), no entanto, com heterogenei- dade significativa entre subgrupos (I2 70%). A análise de sensibilidade por imputação de dados omis- sos não demonstrou benefício do uso de corticosteroi- des na perda auditiva ou sequelas neurológicas. Efeitos adversos Os doentes tratados com corticosteroides tiveram mais febre recorrente (RR 1,27; IC 95% 1,09 a 1,47), mas menos febre persistente (RR 0,29; IC 95% 0,12 a 0,70), comparativamente ao grupo controlo. Outros efeitos adversos ocorreram em proporção semelhante em ambos os grupos. IC 95% - intervalo de confiança a 95%; RR - risco relativo. * Resultados com base no total dos estudos incluídos nesta revisão. Tabela 1. Comparação do uso de corticosteroides versus placebo em doentes com meningite bacteriana aguda Outcome Efeito relativo (corticosteroides vs placebo) Número de participantes Qualidade da evidência (GRADE) Mortalidade Geral* Crianças 17,8% vs 19,9%; RR 0,9; IC 95% 0,80 a 1,01 4121 (25 estudos) Moderada 13,1% vs 14,7%; RR 0,89; IC 95% 0,74 a 1,07 Défice auditivo grave Geral* Crianças 6% vs 9,3%; RR 0,67; IC 95% 0,51 a 0,88 2437 (17 estudos) Elevada 7,3% vs 11,2%; RR 0,67; IC 95% 0,49 a 0,91 Qualquer défice auditivo Geral* Crianças 13,8% vs 19%; RR 0,74; IC 95% 0,63 a 0,87 2785 (20 estudos) Elevada 14,6% vs 20,4%; RR 0,73; IC 95% 0,61 a 0,86 Sequelas neurológicas 17,9% vs 21,6%; RR 0,83; IC 95% 0,69 a 1,00 1756 (13 estudos) Elevada Febre recorrente 28,3% vs 22,1%; RR 1,27; IC 95% 1,09 a 1,47 1723 (12 estudos) Moderada
  • 3. Acta Pediátrica Portuguesa 299 Corticosteroides na Meningite Aguda Bacteriana Conclusões Esta revisão sistemática demonstrou que os corticos- teroides reduziram significativamente a perda auditiva e sequelas neurológicas, mas não a mortalidade, em doentes com meningite bacteriana. Em crianças, o seu uso teve um efeito benéfico na prevenção de défice auditivo grave e de qualquer défice auditivo, sendo que em estudos realizados em países desenvolvidos se veri- ficou também efeito protetor na redução de sequelas neurológicas. Comentários Apesar da incidência da meningite bacteriana em idade pediátrica ter diminuído com a introdução das vaci- nas contra o Haemophilus influenzae tipo b (Hib), Streptococcus pneumoniae e Neisseria meningitidis, esta infeção continua a associar-se a morbimortalidade significativa,8 justificando-se a necessidade de procurar terapêuticas adjuvantes eficazes. A meningite é caracterizada por inflamação importante do espaço subaracnoideu, pelo que se postula que o uso de corticoterapia poderá reduzir este processo inflamató- rio.9 No entanto, existe a possibilidade do seu uso poder atrasar a esterilização do líquor, pois ao reduzir a infla- mação e permeabilidade da barreira hemato-encefálica, poderá existir potencial interferência na penetração da antibioterapia no espaço subaracnoideu.10 Os efeitos benéficos demonstrados nesta revisão suportam o uso de corticoterapia em crianças e adultos com meningite aguda bacteriana nos países desenvolvidos, sendo refor- çados pela ausência de efeitos adversos importantes. A dexametasona foi considerada o corticosteroide de escolha, por ter melhor penetração na barreira hemato- -encefálica e maior duração de ação biológica, podendo ser iniciada prévia ou simultaneamente com a primeira dose de antibiótico. A maioria dos estudos incluídos usou um regime com duração de quatro dias, sem um aumento de efeitos adversos em relação a um regime de dois dias, sendo a primeira a posologia recomendada nesta revisão. O uso de corticoterapia tem sido bem fundamentado nas meningites a Hib, que representaram uma pro- porção elevada dos estudos com crianças incluídos desta revisão. Contudo, esta doença foi virtualmente eliminada nos países desenvolvidos com a vacinação universal. Embora não se tenha constatado benefício estatisticamente significativo na meningite causada por outros microrganismos, esta revisão demonstrou que, em países desenvolvidos, ocorreu um efeito favorável do uso de corticosteroides no défice auditivo grave, quando incluídos todos os microrganismos, nomeada- mente não Hib. Atualmente, várias guidelines e protocolos de países desenvolvidos, entre os quais o Reino Unido e os Estados Unidos da América,6,8,9,11,12 recomendam o uso precoce de dexametasona (0,15 mg/kg, quatro vezes por dia, durante quatro dias) perante a suspeita ou con- firmação de meningite bacteriana em crianças com 3 ou mais meses, suportadas pelos resultados desta revisão. A guideline sul africana,13 que se baseia em estudos em países em desenvolvimento, não o recomenda. Segundo os protocolos europeus da European Society of Clinical Microbiology and Infectious Diseases,8 recomenda-se suspender a dexametasona em doentes cuja menin- gite bacteriana foi excluída ou se o microrganismo causal for outro que não o Haemophilus influenzae ou Sreptococcus pneumoniae, embora alguns peritos acon- selhem que deva ser continuada independentemente da bactéria causal.8 De notar que o papel da corticoterapia adjuvante na meningite neonatal se mantém pouco claro pelo dife- rente espetro de microrganismos causais e carência de dados de estudos clínicos controlados e aleatorizados com aplicabilidade, tendo sido incluído apenas um estudo em recém-nascidos nesta revisão. Algumas limitações desta revisão poderão reduzir a sua fiabilidade, nomeadamente pela heterogeneidade das taxas de mortalidade reportadas entre estudos, com a inclusão tanto de estudos com doença menos grave, sugerido pelas baixas taxas de mortalidade (< 3%), como de cinco estudos com doença avançada grave, sugerido pelas taxas elevadas de mortalidade (> 25%), podendo afetar a estimativa do efeito da corticoterapia, quer globalmente, quer para subgrupos específicos (como em agentes específicos como Neisseria meningitidis). Por outro lado, a definição de qualidade metodológica dos estudos pelos autores não é padronizada nas reco- mendações habituais das revisões Cochrane, o que pode limitar a interpretação das análises de subgrupo. Palavras-chave: Adulto; Criança; Doença Aguda; Glucocorticoides/uso terapêutico; Meningites Bacterianas/complicações; Meningites Bacterianas/ mortalidade; Meningites Bacterianas/tratamento farmacológico; Países Desenvolvidos; Países em Desenvolvimento Keywords: Acute Disease; Adult; Child; Developed Countries; Developing Countries; Glucocorticoids/ therapeutic use; Meningitis, Bacterial/complica- tions; Meningitis, Bacterial/drug therapy; Meningitis, Bacterial/mortality
  • 4. 300 Acta Pediátrica Portuguesa Corticosteroides na Meningite Aguda Bacteriana Conflitos de Interesse Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse na realização do presente trabalho. Fontes de Financiamento Não existiram fontes externas de financiamento para a realização deste artigo. Referências 1. Brouwer MC, McIntyre P, Prasad K, van de Beek D. Corticosteroids for acute bacterial meningitis. Cochrane Database Syst Rev 2015;9:CD004405. 2. Brouwer MC, Tunkel AR, van de Beek D. Epidemiology, diag- nosis, and antimicrobial treatment of acute bacterial meningi- tis. Clin Microbiol Rev 2010;23:467-92. 3. Kim KS. Acute bacterial meningitis in infants and children. Lancet Infect Dis 2010;10:32-42. 4. Baraff LJ, Lee SI, Schriger DL. Outcomes of bacterial meningitis in children: A meta-analysis. Pediatr Infect Dis J 1993;12:389-94. 5. van de Beek D, Brouwer MC, Thwaites GE, Tunkel AR. Advances in treatment of bacterial meningitis. Lancet 2012;380:1693-702. 6. Tunkel AR, Hartman BJ, Kaplan SL, Kaufman BA, Roos KL, Scheld WM, et al. Practice guidelines for the management of bacterial meningitis. Clin Infect Dis 2004;39:1267-84. 7. Mongelluzzo J, Mohamad Z, Ten Have TR, Shah SS. Corticosteroids and mortality in children with bacterial menin- gitis. JAMA 2008;299:2048-55. 8. van de Beek D, Cabellos C, Dzupova O, Esposito S, Klein M, Kloek AT, et al. ESCMID guideline: Diagnosis and treatment of acute bacterial meningitis. Clin Microbiol Infect 2016;22:S37-62. 9. National Collaborating Centre for Women’s and Children’s Health. Bacterial meningitis and meningococcal septicaemia. management of bacterial meningitis and meningococcal septi- caemia in children and young people younger than 16 years in primary and secondary care. London: RCOG Press; 2010. 10. Viladrich PF, Gudiol F, Linares J, Pallares R, Sabate I, Rufi G, et al. Evaluation of vancomycin for therapy of adult pneumococcal meningitis. Antimicrob Agents Chemother 1991;35:2467-72. 11. NSW Ministry of Health. Infants and children: Acute management of bacterial meningitis. Clinical practice gui- deline [consultado em 31 de maio de 2018]. Disponível em: http://www1.health.nsw.gov.au/pds/ActivePDSDocuments/ GL2014_013.pdf 12. Le Saux N. Guidelines for the management of suspected and confirmed bacterial meningitis in Canadian children older than one month of age. Paediatr Child Health 2014;19:141-52. 13. Boyles T, Bamford C, Bateman K, Blumberg L, Dramowski A, Karstaedt A, et al. Guidelines for the management of acute meningitis in children and adults in South Africa. South Afr J Epidemiol Infect 2013;28:5-15.