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LOUS

RONDON
Contos Reunidos I

1
Uma Anomalia II: Minha Grande Dedicação
Molhado de urina infantil o lençol gelava meu rosto. E sentia o cheiro bom do sangue
coagulado. Ontem me botei em outra aventura, minha grande dedicação faz o trabalho
nunca entrar na rotina, por mais que o faça demais ultimamente.
14 Horas atrás:
Espreguiçava-me, o jejum vespertino animava o coração que pouco a pouco retornava
ao ritmo anestésico da minha excitação. Vesti uma calça, calcei as botas curtas e
alcancei as alças do meu macacão camurça. Peguei as chaves do carro, tranquei a
casa e dei partida no motor. A noite me possuía, e eu possuía os desejos que uma
noite de cidade grande poderia proporcionar; em cada esquina as putas me acenavam,
pero são velhas demais para o meu gosto delicado e etéreo. Apesar disso a elas devo
minha gratidão: as filhas das putas não se prostituíam por causa da polícia na região,
elas apenas deitavam-se nas ruas em dias invernosos como esse, ficavam lá morando
na calçada, cobertas (quando cobertas) por um cobertor imundo, e eu as tinha
descoberto. Talvez pela tendência de serem como as mães fosse fácil a aproximação,
parava o carro e da janela oferecia um bolo de chocolate. Sou um empresário de
primeira, e quando quero não tem infância que pode fugir da agilidade dos meus
braços e dedos grossos. Tampando a boca e segurando os dois esqueléticos
antebraços com uma mão miro os seus olhos assustados, e do interior do carro ela via
brilhar o olhar profissional e como eu disse: de tamanha dedicação...
Amarrada punhos e pés, uma camisa entrava pela boca e descia garganta adentro,
conto com os glóbulos vermelhos: Deus queira que esse princípio de pneumonia não
tenha lhe dado muito catarro, pois senão com certeza morrer-se-ia sufocada, sem que
ao menos tivesse tocado sua pele tão lisa e gostosa. Nervoso de preocupação fiz
queimar as rodas nas ruas largas em direção ao lar, dirigi furiosamente o mais que
podia, deveria lembrar-me sempre em dissimular a pressa, respeitando os eternos
sinais vermelhos e as mulheres, péssimas motoristas. Em um minuto eu já tinha
estacionado, peguei o meu delicioso brinquedinho e tranquei toda a casa de muros
altíssimos e grades de cárcere — é nessa hora que se dá conta do benéfico medo da
violência e dos jornais que não param de divulgá-la.
Desamarrei a minha presa, que depois de ter se dado conta da chance de liberdade
correu pelos corredores curvos, descobrindo todos os cômodos da casa, buscava o
mais cômodo para acomodar-se. Meus ouvidos já me disseram: os passos pararam, o
coelho tocaiou-se na toca. Andei pesado, entrei no quarto e apanhei um cinto, comecei
a voá-lo contra a parede, sinto os sentimentos por ela sentidos. Cultivava o seu medo,
de pé em pé, devagar e sempre, o estridor excelente exprimia as minhas fantasias
fantásticas realizando-se.
O couro chicoteava sua cabeça, meus bíceps demonstravam a verdadeira dedicação,
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ela se encolhia cada vez mais no canto escuro e úmido do banheiro, seus soluços e
gaguejos soavam mais altos que os golpes. Peguei-a pelo cabelo, no mesmo instante
senti meus dedos deslizando nos fios, percebo, não eram os dedos a deslizarem, e sim
os fios a se soltarem facilmente. Alguns ainda persistentes me deram a oportunidade
de arrastar aquele corpo magro pela casa toda. Levantei-a pelos ombros e a assentei à
mesa. Suas pernas ficaram arranhadas e seu humilde corpo raquítico tremia todo sem
parar, acompanhando os berros desesperados. Apertando-lhe os braços, meus olhos
fixaram-nos dela, mandei-a calar a boca: funcionou melhor que eu esperava, como é
fácil controlar crianças. Subitamente engoliu o choro e a tremedeira como se estivesse
em choque, apenas as lágrimas que durariam até o fim de sua vida ainda rolavam
como cachoeiras na maçã suja do rosto.
Imóvel ficou durante o tempo que passei cozendo uma sopa, peguei os pratos fundos
e os talheres antigos. Servi a água com verduras, pero não parecia nem um pouco
disposta a alimentar-se sozinha. Como a um bebê dei as colheradas entre seus lábios
fininhos, com máxima gentileza, com máxima dedicação. Tudo está sobre controle e
agora é sabido por mim como é ter uma filha e a ela como é ter um pai.
Estendi a mão, ela apertou e a levei até a cama, depois da surra cochilou um
pouquinho, a esquentei num edredom limpo. Vinte ou trinta minutos foram de
observação. Minha alma estava plena, satisfazia-me a solidariedade, a ajudava como
um compromisso social. Se paro para pensar sou o melhor homem, entre aqueles que
erraram eu tinha sido a esperança para as crianças de rua, quando esquecidas eu as
aquecia. Sou feliz a cada momento porque sei que elas me amam.
Aquela observação foi se tornando monótona, a cada minuto sentia os meus músculos
lutando contra o cérebro; a cãibra era decifrada: não agüentava mais a imobilidade, e
até o coração se arrependia de ter iniciado um relaxamento. Minha personalidade me
dizia e meus hormônios triunfantes pulavam, a impertinência tirava o corpo da
impotência. Arrastei-me até a cama como um vampiro, mirei sua face tão pura e
necessitada, vendo aqueles beicinhos secos e roxos de frio acordei a bela adormecida
com um beijo. Naquela idade ainda não sabia beijar, abriu os olhos, tentou fechar os
lábios e com as pequeninas mãos empurrava meu peito — Tudo em vão — Minha
voluptuosa dedicação crescia mais, e só com a língua eu a dominava, dentro da sua
boca explorava cada espaço, contei os dentes e as cáries, assim como as veias abaixo
da língua; abafava os grunhidos acariciando as amígdalas. Deixei e se protegeu
apertando a cabeceira da cama, seus olhos espantavam-se e sua fisionomia gritava
apavorada. Numa velocidade que surpreendeu até a mim tirava as roupas dela; depois
de tê-la deixado pelada e batendo queixo de hipotermia fui até o guarda-roupa: olhei
tudo só por olhar, já sabia o que queria: um cabide fino de metal. Apanhei-la pelo
pescoço com a força dos meus ombros gigantes desferi com graça e enérgica
dedicação na sua bunda, os glúteos contraiam-se elétricos e na pele marcava
vermelhidões desenhos salientes do ferro. Enquanto batia ela urrava e urinava na
minha cama cara. Um, dois, treze, vinte, vinte e cinco, já não podia mais contar, as
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marcas se misturavam, havia amaciado a carne o suficiente. Abri o zíper e desceu meu
pênis comprido que ia palpitando-se mais e mais, a parecer um rabo de cachorro feliz.
Forcei para dentro, e pela vagareza com que entrava durou uma conta de segundos;
antes da metade senti um obstáculo, seria aquele o colo do útero? Talvez soubesse a
criança que começava a babar uma saliva inacabável e espessa. A aplicada dedicação
rompeu os horizontes, e pelo movimento de entra e sai avistava num futuro próximo a
noite ejacular o sol. Lambi sua barriga encardida, aquele gosto, aquele gosto salgado
de sujeira acentuava-se mais nos mamilos sem bicos. Lambi, lambi e lambi as
bochechas, os ouvidos e mordisquei o pescocinho novo. Saciado, curvei-a para trás e
tratei de torcer o externocleidomastóideo.
— Depois da festa tem que se limpar a bagunça, eis o que alguns diriam. Pero começa
agora a melhor parte: Peguei o meu facão alemão Schwarz, com cabo de madeira
tratada de dezoito centímetros; lâmina negra de meio metro, feita de aço amorfo 420. O
brilho inigualável do fio injetava em mim uma alta dose de adrenalina.
Decapitei-a com duas investidas, estiquei o braço e com uma única torei o osso
descalcificado. Fiz o mesmo com ambos os fêmures, que precisaram evidentemente de
mais facãozadas. Despreguei a canela da cocha, caso não tivesse feito minha sacola
plástica rasgaria. Não preciso me preocupar com digitais, saliva ou sêmem. No lugar
que hei de enterrar o corpo retalhado é inóspito, naquela floresta lamacenta remota.
Este meu calculado plano tem durado duas décadas, e por isto creio indubitavelmente
no seu funcionamento, tanto que posso usufruir de outra regalia: gosto de dormir perto
do corpo, ter ao nariz o cheiro da carne recém morta e sangue fresco.
Acordei. Molhado de urina infantil o lençol gelava meu rosto. E sentia o cheiro bom do
sangue coagulado. Pode parecer insanidade, pero tenho maior arbítrio de dia do que à
noite. De noite parecerá mais suspeito um carro subindo a grande colina, e seria quase
impossível esquivar das britz policiais que sempre se faziam naquela direção. Devo
este racioncínio a minha engenhosa dedicação.
Arrumei em baixo dos bancos os sacos, em seguida pus o carpete. Segui na avenida
Dutra o destino longínquo. Virei à esquerda, numa estreita rua de asfalto breve; a
última parte do caminho seguiria na estrada de chão. As poeiras levantavam como
sempre, as nuvens transpareciam o céu azul marinho, o vento era forte e as
andorinhas voavam de acordo com a vontade da líder. Resumindo a calmaria habitual.
Cheguei até a parte que de carro poderia chegar. Amarrei os sacos e uma pá em volta
do corpo, eu precisaria exercitar a panturrilha, a subida era penosa. Encontrei. Aqui o
cenário muda quase que completamente, as botas afundam na lama e as árvores
enchem o pulmão de oxigênio. Soltei a carne e a pá. Cavei, cavei e cavei, o suor
pingava da testa, mesmo naquele solo a cavação ser amena. Seis ou oito palmos de
fundura e bem largo, joguei os sacos. Tampei e despejei lama por cima e alguns galhos
para disfarçar. Depois do serviço pronto necessito voltar para casa. Meus pés
encontraram-se com um buraco, caí e bati a cabeça. Levantei assustado, ao sair eu via
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que mais para frente havia outro, não sabia o que se passava; ao andar me subiu um
arrepio, avistava um terceiro buraco aberto, corri para investigar: após descer um
monte de terra deparei-me com vários policiais e tratores. Minha grande dedicação! Os
bombeiros haviam descoberto as 177 crianças.Š
Cuiabá, sexta-feira, 13 de agosto de 2010

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Uma Anomalia III: Nasce o Psicopata
Capítulo I: Infância
Amava mesmo era minha mãe, a sua beleza inigualável me encantava, os cabelos
louros ondulados transpareciam a luz do sol; e esta quando mergulhava fundo nos
olhos, cristalizava a íris azulada, fraquinha. Além da beleza era muito inteligente, fora
quem me persuadiu com a leitura quando criança. Como filho único, fui muito amado
por ela e pelos criados da casa, estes talvez para agradar sua senhora. Em todo caso
quero me lembrar da dedicação que mamãe tinha comigo. Exigia-se o máximo para me
agradar de todas as formas imagináveis; de certo fui um pentelho melindroso demais,
confesso. A solidão me agredia, e tentava descontá-la em alguns passa-tempos
infantis, tal como matar insetos usando a criatividade e aprontar pequeninos desastres
dentro de casa, ora na sala com visitas, ou na cozinha quando solitária. Papai era
diretor de um hospital, o seu conhecimento é indubitável mesmo para mim, com seis
anos. Apesar deste ponto forte que me chamava atenção para ter um espaço junto
dele, era extremamente sério e carrancudo. Hoje penso que não sabia separar o os
importunos do trabalho com os da vida caseira (se é que tinha uma). Provavelmente o
meu melindre de criança se estendeu até agora, não tenho razões para reclamar do
meu pai, a sua agressividade e compulsão ritualística de agir não restringia tão
diretamente a minha conduta; mamãe me protegia do escuro, dos meus medos que
causavam insônia, dos meus primeiros dias de aula e do meu bruto pai. Protegia-me
com dentes e unhas afiadas qualquer explosão de intolerância dele, era uma leoa,
tinha uma defesa incrível, e talvez seja prazer de todo moleque ver o desgaste que a
mãe tem consigo. Eu não era castigado, em casa junto dos empregados eu tinha tudo,
o pai não me castigava por mais que fosse da sua vontade, respeitava muitíssimo a
minha protetora, e era dela não só a decisão final, como a inicial também. No mais,
ainda preciso ressaltar essa estranha necessidade que tinha de me mostrar para meu
pai, obter a figura paternal. Se paro para me analisar, todas as atrocidades que uma
criança pode fazer eu fazia perto dele. Muitas visitas não gostam de ter os seus
docinhos urinados pelos filhos dos seus amigos, e não só uma vez escapei da babá
para enturmar com os colegas de papai. O sofá da sala era tremendamente grande,
pero aqueles homens adoravam o calor humano, dessa forma sentavam-se uns perto
dos outros. Na frente da mesinha chegava com um sorriso de orelha a orelha, os meus
dentinhos e minhas janelinhas se mostravam para os visitantes que eram obrigados a
sorrir e puxar assunto. E a partir desse momento que adquiri a confiança deles,
abaixava a calça e urinava na mesa de aperitivo que comiam com gosto. As explosões
do papai eram de assustar, e vendo a cara avermelhada dele, os homens rapidamente
o seguravam e pediam calma. Nesta altura já era um diabinho. O medo não me
convencia de nada, sempre como protetora teria mamãe, a liberdade me era generosa.
Esta técnica que tinha de incomodar as visitas com urina se repetiu algumas vezes, era
de um costume de se convidar as pessoas para o jantar, e para meu pai os costumes
não são perdidos, não, nunca. Então de forma nenhuma, mesmo com a vergonha das
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minhas atrocidades ele ainda as continuava convidando, como faz desde sempre,
assim como o pai dele o fazia. Sendo assim impossível, papai começou a apelar para
psicologia infantil: diante das visitas não mais explodia e sim ao contrário, convidava os
convidados a rirem do meu pequenino pintinho, tão pequeno que mais parecia uma
ervilha balançando. Pequeno demais até para uma criança da minha idade. As crianças
devem ter vergonha de algo, é preciso. Não pensem que são completamente
desavergonhadas, isto não é possível. Diante dessa gozação do pai o meu sangue
fervia, meus olhos se enchiam de lágrimas e saía berrando como não fazia em
qualquer outro momento. Não corria para os braços da minha mãe, se ela deixava o pai
fazer isso é porque estava de acordo com ele. E verdadeiramente assim parecia estar,
a punição era precisa, talvez fosse essa, talvez fosse. Preciso informar que após
alguns anos não me parecia ser aquilo uma punição, não dava valor aquilo, e melhor,
era único momento que tínhamos juntos. pero voltando, a tirania do meu pai começou,
e não só quando eu aprontava alguma coisa, a piada se fazia em qualquer situação. Só
bastava três coisas: plateia, papai e eu.
No meu aniversário de sete anos mamãe me deu um filhote de pastor belga. Foi um
dos presentes que me deixou mais feliz. A festa foi grande, havia muitos doces, muitos.
Os enfeites se estendiam por toda a casa, que contava como público meus avós, a
babá que a partir de agora não me seria mais útil (pensava meu pai) e a faxineira. Eu já
havia mudado de colégio duas vezes, tempo insuficiente para colecionar alguns
amigos. A rua era feita de casarões, onde os donos eram velhos solitários. Se havia
naquela rua uma criança era muito, e eu desconhecia. Logo a desculpa para a falta de
amigos na minha festa é essa; fora que eu gosto de pensar que papai não se dava bem
com crianças — apreciava as relações mais maduras, de negócios. E seria um estorvo
gastar tempo com amigos, o tempo era direcionado para a escola, os estudos. Fiquei
sabendo que a escola em que iriam me meter seria mais rígida que a anterior, nem
mamãe conseguia decidir o lugar que eu iria ficar. Neste meio tempo de mudança de
colégio fiquei em casa. A babá já não mais me servia. Papai nunca foi homem de
passar muito tempo no lar, e embora sempre achasse que papai e mamãe se
gostassem muito, estavam brigados. A mãe lecionava numa universidade do centro no
período matutino e vespertino. As noites me eram eternas ao lado dela, antes de
perceber que os dois tinham voltado a ficarem juntos. Nestas minhas pequenas férias
escolares tive de usar a imaginação para exprimir toda energia de miúdo. A rua não me
era permitida, então só ia andar de bicicleta anos mais tardes, obviamente, passear
com o Belga não se podia. Passei os horrores das manhãs e tardes sozinho, o tempo
todo deixava a tevê ligada, gostava daquela falsa companhia. Revelo que como um
garoto qualquer, tinha interesse de ser percebido pelo pai, no entanto me era covarde o
fato dele só ligar para o trabalho. Como uma criança da minha idade chamaria
atenção? Impossível. Mesmo assim tentava, não pensem que essa é a desculpa para o
sadismo, niños não têm sadismo, são descobridores ingênuos. O mundo se é novo, e a
curiosidade inconsequente seria só uma forma de diversão ingenua e naturalmente
infantil. A profissão de médico do papai me despertava para ser como ele, e já queria
mostrar a destreza com que fazia uma cirurgia; mesmo sem os instrumentos bonitos
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que a sala de cirurgia ornava. Pero se formos falar de instrumentos de culinária, sim!
Aqui tinha os mais belos, a cozinheira descontava a sua condição financeira menos
avantajada nos talheres e facas que sempre quisera ter, aqui se podia pelo menos
momentaneamente, meus pais tinham dinheiro. Três coleções de facas de todos os
tamanhos com lâminas que não se perdiam o fio, fatiava aqueles pedaços grandes de
carne como se fossem feitas de gelatina. Facilmente poderíamos imaginar serem
aquelas verdadeiros bisturis caseiros.
O Belga latia como que sorrindo, ele mal imaginava que a minha curiosidade poria fim
nos seus três meses. Acariciei aquele pelo grosso e macio, e assim apertei com
vontade a corda no seu pescoço, ele não conseguia latir, a boca aberta era sinal de
sufocação, os olhos brilhavam de uma forma convencedora, e invejava ali a sua
maneira de persuasão — brilhavam enternecidos pelo líquido que escorria um
pouquinho, piscou algumas vezes, o coração agitado deu as últimas palpitações,
rendendo-se ao cansaço e as dores da sua curta vida. Desamarrei a corda, com a faca
menor abri a ventral do pescoço para ver melhor o osso amassado, como um bom
médico, parei por uns segundos para cogitar a forma mais fácil de estudar os seus
órgãos; pela região do hipogástrio, a barriga ser desprovida de ossos, assim sendo
facilmente aberta comecei a retirar o couro que se iniciava logo acima do pênis,
circundar as pernas e as costelas, chegando ao peito a faca parou no esterno; não
pensem que pela idade fiz a cirurgia de qualquer jeito, fui delicado no corte, queria ver
o orgulho do meu pai quando chegasse. A partir do esterno estiquei o couro já livre e o
levantei, se despregando da caixa torácica. Com as duas mãos pus o intestino para
fora, junto do fígado que experimentei provar se tinha o mesmo gosto do jantar
passado; dei continuidade puxando os pulmões e o pequeno coração que ainda estava
quente. Quando me deparei com toda aquela cavidade intestinal e respiratória vazia e
limpa, percebi a grandeza do meu trabalho, a dedicação tinha sido satisfatória, e
parece que finalmente conheci algo que ocuparia-me como um hobby. E de repente
surgiu em mim uma sagacidade que não conhecia: tenho que mudar meus planos em
relação a este trabalho e o meu pai. Geralmente nunca me aprova, e se não aprovasse
o que fiz com Belga eu não poderia fazer de novo com outro animal. Realmente foi uma
satisfação interessante, estava decidido a fazer outras vezes.
Após dois dias todos sentiram a falta do Belga que havia sido enterrado em sacolas
separadas pelo quintal inteiro, no intuito que se por ventura o jardineiro descobrisse
uma das sacolas não saberia reconhecer aquilo. Como é de se esperar, a hipótese
mais lógica para o desaparecimento de Belga foi que alguém em algum momento
deixou o portão aberto, e este fugiu aproveitando-se do seu tamanho. É um cachorro
bastante novo, não saberia voltar para casa. A hipótese do sumiço além do mais não
era o mais importante. O mais importante é que agora eu estava sozinho, e até meu pai
pensou que eu estivesse triste demais pelo acontecido. Logo, como bons pais,
escolheram outro cachorrinho para mim, que após algumas semanas também fugiu. A
bizarrice é que eu começava a ter dois cães por mês, e eles sumiam (fruto da minha
dissecação obsessiva). Isso despertou duas questões: dever-se-ia trocar o portão
8
eletrônico, que os deixava escapar. Segunda: algum dos nossos vizinhos senis e mal
humorados poderia ter pegado os cachorros. Qualquer que seja o verdadeiro motivo, o
certo é que agora que eu estava acostumado a ter um bicho de estimação não poderia
ficar sem um, mesmo que fosse algum animal inferior, como um gato ou um pássaro,
eu os amaria.
Capítulo II: Juventude
No meu segundo grau era reconhecidamente o aluno mais brilhante da escola, que
relativamente é bem mais rígida que as outras escolas do centro. Os meus argumentos
continham citações claras de quem havia lido os livros originais dos filósofos e
sociólogos, desde os mais populares aos meus favoritos marginalizados. A literatura
era minha área, que mesmo não participando da aula, os mestres tinham vergonha e
entravam na sala frustrados por terem um conhecimento muito menor que o meu, que
contava apenas com dezessete anos. Tudo me era simples, e a escola atendia
prontamente qualquer exigência que eu singelamente indagasse. Conversar com os
doutores da universidade da minha mãe me era prazeroso, e com eles fazia planos de
como proporcionar aos mestrandos melhor desempenho. Neste grupo intelectualizado
eu traçava ali o meu reconhecimento social, não que me satisfizesse totalmente, não,
sempre faltava coisas, quanto mais conteúdo me era facilmente assimilado, sentia-me
mais vazio.
Neste ano tive a minha primeira relação sexual, consequentemente a minha primeira
frustração com o sexo. As mulheres me eram fáceis, meu peitoral se preenchia
naturalmente com músculos rígidos, o meu desenvolvimento corporal foi perfeitamente
bem realizado pelos hormônios e pela rica alimentação, sobretudo em fibras e cálcio,
que mamãe me mimava todos dias. Minha altura baseava-se nos quase um metro e
noventa, os cabelos louros desciam até pouco antes dos ombros, os dentes
simetricamente alinhados e formatados como que em fôrma de vidro preenchidas com
leite. Os olhos azuis sabiam persuadir mais e melhor que todo o resto do corpo, não só
as mulheres, pero também exigia dos homens respeito. Fazendo essas observações,
se conclui a admiração que causava diante doutros. Minha conversação tinha um toque
de alemão e italiano, resolvidamente não é a aparência que me causou frustração no
sexo, não é. Aos leitores mais atentos não engano! A minha primeira noite nem sequer
chegou acontecer, despido diante da modelo ela fez questão de notar e seguidamente
caçoar do meu pequeno pênis, que se muito não chegava aos nove centímetros. Meu
sangue ferveu, a vista tremeu pelas lágrimas de sangue, instantaneamente surgiu em
mim uma íra terrível como a dos tempos atrás. Sêneca nunca poderia supor! Odiava
meu pai, tinha sido o causador do meu fracasso, como poderei me socializar com a
desgraça que havia sido descoberta desde criança? A vergonha me acompanhava pela
vida adulta, queria me destruir, arruinar quaisquer planos de futuro. Eu tinha o desejo e
destino apaziguados em minhas mãos, alguém furtou, criou-se o vazio, a alegria sumiu,
deu lugar ao tormento que iria me acompanhar nas vinte e quatro horas por dia, até
mesmo em meus sonhos!
9
A minha protetora morreu, a traição de meu pai só durou cinco anos, e não foi só por
ela que minha mãe faleceu. O cigarro a havia matado, amarelado seus dentes,
envelhecido a sua pele jovem e diminuído o volume dos seus cachos. Os pulmões
padeceram, não podiam mais fazer o trabalho tão simples que o corpo havia lhe
incumbido. Outra vez meu pai estacionou-se diante da minha vida, como uma pedra no
caminho, havia tirado de mim os últimos dias felizes com mamãe. Se não fosse pela
traição, talvez os oitenta anos a esperassem, e não o fim aos quarenta e dois.
A sexualidade dentro dos meus testículos estava se aflorando, enquanto se aflorava a
impaciência foi tomando meu juízo. A ansiedade já me impedia de ter o mesmo
raciocínio que tinha há pouco tempo atrás. Por um lado me era muito fácil conseguir
sexo, e mesmo se não fosse pela aparência, o meu dinheiro resolveria. Por outro lado
era inconcebível a idéia do ato sexual, transar com um pênis tão pequeno me poria
mais atônito, mais frustrado, eu preservava o meu status acima de tudo. Mesmo
sabendo disso sentia uma enorme vontade de sexo, ela foi tomando poder na minha
mente, os neurônios não mais trabalhavam paralisando as atividades rotineiras,
sistemáticas. Foram sendo substituídas pelas duradouras e numerosas masturbações
diárias. E além delas os meus choros imaturos, constantes fantasias sexuais, sejam
zoofílicas, afinal animais não se frustram com aparências físicas, dizia Montaigne.
Necrófilas, pois a dissecação era um prazer. E as pedófilas, até então nunca
praticadas, ponto que desperta a minha curiosidade. pero é perigoso. Alguém
inteligente como eu pode desenvolver um plano perfeito que não poria a riscos
nenhum. Contudo é algo para se pensar com mais calma, e no meu estado mental não
seria aconselhável, pois o desespero por sexo poderia falhar o plano — pensando que
faria um plano perfeito — e no entanto não veria os erros mais evidentes, é sem dúvida
perigoso. Com este raciocino pus a prova que meu juízo não está assim tão deturpado.
pero nem adianta me vangloriar com ele, nesse instante parece que admiti ter de
escolher entre uma das três opções. Lógico, eram só suposições, quero ver como os
meus planos se formariam a respeito da escolhida. A mais fácil e já conhecida zoofilia,
seria a ideal. A senhora Maria, minha vizinha passa o tempo fora de casa, lá uma
cachorrinha latia muito. Agora faz silêncio devido a uma cordectomia, por costume
antigo não tranca a porta dos fundos, e a casa vive sozinha. Claro, isso não é certeza.
Nunca a vi trancando, posso apostar que também aquela fechadura já está enferrujada
de tão velha — lembro dela quando era criança. Aquele tipo de fechadura não é
aconselhável se coloca-se na porta dos fundos, local onde a chuva toca.
Coloquei o plano em prática. Da forma que planejei, a porta dos fundos não era
trancada, lá ela prendia a cachorrinha doberman. Passei a tarde com ela, a posição já
é sabida. Levei uma faca, não queria que uma da casa sumisse. Dentro do banheiro a
abri de ponta a ponta, retirei a cabeça, dividi o maxilar superior do inferior, arranquei as
quatro patas, abri o hipogástrio, puxei as tripas e as enrolei numa sacola, fiz a já
conhecida limpeza, serrei com faca de pão o manúbrio, organizei todas as partes em
sacolas separadas e enterrei perto das árvores do grande quintal.
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Capítulo III: Maturidade
Saciado pude retornar ao ritmo habitual. pero agora desenvolvia em mim um plano
maior, passava uns tempos aqui em casa uma negrinha filha da empregada. Ela tinha
quatro anos, adora me agradar, é de uma alegria tão intensa que uma pessoa sã não
poderia resistir em retribuir o sorriso e falar com ela sobre a escola em que aprende a
ler e escrever. Quando chega vem correndo me chamando — Jeferson Danilo! Quem a
busca é a mãe, o colégio não fica tão longe. Dez minutos, no máximo. A minha ação
precisa ser rápida, terei de ir buscá-la na escola logo após a faxineira tê-la deixado. Eu
poderia usar a casa da vizinha, alugaria um carro, teria de levar comigo uma pá, corda,
uma fita adesiva, um facão para os ossos e um belo jogo de facas. Além de luvas de
frio para as digitais e preservativos. Não! Um erro! Tudo isso colocaria numa bolsa e
esconderia na casa da vizinha antes. É evidente que seria muito suspeito carregar
essas coisas no carro se fosse parado pela polícia. Decidido! Dois dias antes abri com
a papelada na loja de veículos, era fácil para mim, em vista do salário do meu pai.
Aluguei o carro e estacionei na rua, lá passou o dia inteiro, a rua é tranqüila. No outro
dia de manhã quando a faxineira saiu com a Jacqueline dirigi para a escola. No exato
momento em que a faxineira deixava o local e vinha embora, desci do carro. Fui em
busca de Jacqueline, a paguei pela mão e sugeri — Que tal um passeio? — ela não
poderia recusar, nunca me recusaria algo assim, me amava. Simplesmente
correspondeu — Aonde nós vamos, Jeferson? — Vamos escolher o seu presente de
aniversário, o que mais seria? Eu disse. Então me abriu um sorriso daqueles enormes,
apertou bastante a minha mão e foi pulando até o carro vermelho. Dentro do carro
lembrei que tinha de passar em casa antes porque havia esquecido o dinheiro,
expliquei a Jacqueline. Então os pensamentos foram passando pela cabeça bem
suaves, já sentia o ato como se estivesse realizado, deu tudo certo. É impressionante
como crianças são fáceis de lhe dar. Parei o carro.
— Jacqueline, vamos passar na casa de uma amiga antes, ta? Perguntei.
— Ah, por que Jeferson? Não era só pra pegar o dinheiro? Você não vai mais me
comprar o presente? Quero voltar pra escola! Jacqueline já começava a chorar...
— Claro que vou, sua boba! É aqui mesmo que vou pegar o dinheiro! Não confia em
mim?
Entrando na casa coloquei a perna na frente dela e a empurrei ao chão, ajoelhei-me
em suas costas, abri a fita e passei em sua boca, as mãos amarrei fortemente com a
corda. Os pés eu prefiro livres, adoro os chutes e a tentativa inútil de fugir. A levantei
pelo cabelo e dei alguns tapas na cara só para provocar. Rapidamente as lágrimas de
incompreensão brotaram na face, e a mesma já se encharcava. Depois uns socos na
barriga com força moderada, se eu quisesse poderia matá-la só com isso. Ah! Como
crianças são divertidas! Aposto que Jacqueline não abrirá a boca para falar do tamanho
do meu pênis. Afinal, que tamanho tinha a vagina dela? Mais dois tapas no rosto e a
vontade louca de penetrar me possuía, arranquei a calça e logo após a calcinha.
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Estava toda cagada! Provavelmente por causa dos socos na barriga, coitadinha.
Joguei-a no piso e ajoelhei em suas pernas, abri meu zíper e botei o preservativo. Ali
ela era como um objeto, e nessa minha primeira vez é de assustar como a vagina era
apertada! Fiquei por dez minutos tentando entrar, quando finalmente dentro não tirei
por nada. Depois de alguns movimentos rápidos o suor me pingava da testa, sentia na
glande o útero rasgando, e dela só se ouvia gemidos abafados pela boca fechada. O
melhor era o pequenino corpo quente molhado, a maciez da sua pele negra, sentir nos
meus quadris aquela bunda tão pequena. Era maravilhoso. Após gozar retirei o
preservativo usado. A deixei ali no chão descansar por alguns instantes, o sexo é o
maior desejo do ser humano, afinal, teria algo mais humano do que querer realizar uma
fantasia sexual? Coloquei outra camisinha, dessa vez quero sodomizá-la, meter
naquele apertadíssimo anus delicado e sujo, devido as fezes a entrada foi mais fácil,
nessa segunda vez demorei bastante a ejacular, aproveitei para cerrar os dentes na
orelhinha como um lobo disputando carne . O sangue escorria da vagina e do bumbum
assado, para morrer a golpeei com vários pontapés. Desamarrei, e por um dos
bracinhos a arrastei até o chuveiro. Peguei um facão, dividi os membros da maneira
que já havia treinado quando criança, depositei os órgãos numa sacola. Cortei um
pedaço de bife das cochas e guardei para mim em uma bolsa separada, esta seria o
jantar. O resto enterrei em vários lugares do quintal, junto de um saco de cal
igualmente distruibuido.
O sumiço de Jacqueline perturbou a todos daquela vizinhança tranqüila. A faxineira
ficou muito abalada, e meu pai a deu umas semanas de férias. A investigação da
polícia tinha sido infrutífera, no colégio de Jacqueline um funcionário disse tê-la visto
em um gol vermelho. E um velho franzino chamado George disse que um carro
vermelho havia ficado estacionado na rua a noite inteira. Era certo que alguém a havia
raptado. Esperou-se resposta do seqüestro, talvez queiram dinheiro do meu pai. O
seqüestrador nunca ligou. Não havia notícia alguma do caso.
Após o término do segundo grau papai me enviou à capital. A desculpa era a
universidade. Penso se teve algo a ver com o seqüestro de Jacqueline, erro em
superestimar a sua ingenuidade, os pais sempre sabem de tudo, estranho nunca terem
duvidado do desaparecimento de Belga e dos outros, hoje me parece tão evidente. E
se soubesse sobre mim esse tempo todo, nenhuma das minhas tentativas de chamar a
atenção teve sucesso. Caso descobrissem o assassino, ele estaria arruinado, o seu
caráter nunca permitiria esse escândalo. De qualquer forma depois de quatro meses
morreu de alguma doença no coração, não quis procurar saber. Eu ainda guardo um
rancor, é algo no peito que não saberia explicar em palavras. Sentia sua falta, a vida
inteira quis estar junto dele, acho que a personalidade egoísta e autoritária impediram
isso, ou mesmo a falta dela. Hoje tenho a sensação de estar mais livre, contudo todos
os dias me pego com uma raiva descontrolada, um vazio que quer sempre ser
preenchido. Nesses dez meses repito com freqüência um mesmo ritual que parece
saciar-se só por ora. Neste momento estou matando a minha nona criança, dentro
desse distúrbio mental que tanto me incomoda, acho que inconscientemente estou
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mesmo é tentando matar meu pai.
Cuiabá, 9 de outubro de 2010.

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Uma Anomalia IV: Quem Bate à Porta?
Capítulo I
— Tio, estou vendendo chocolate caseiro, o senhor quer comprar?
— Quero sim, adoro chocolate caseiro. Entre aí, que eu vou pegar o dinheiro lá dentro.
Está sol aí fora, né?
— Tá mesmo, a gente tem que andar nesse sol, cansa... você tem água?
— Tenho, entra aí. Cuidado as escadas. Tem água lá na cozinha, vou ao quarto pegar o
dinheiro, quanto é que é mesmo?
— Três barras por cinco.
— Vou pegar.
Como é fácil domar crianças. Ela bebia água, gole por gole, o rosto transpirava o sol
escaldante, via os dentinhos brancos novinhos através do copo de vidro. A pele clara
avermelhada suava, descia uma gota da testa à garganta. Que sofrimento andar por
esse sol, coitadinha...
— E o dinheiro?
— Está aqui. Ela pegou, me passou os bombons e se dirigiu à saída.
Apertei o seu nariz, a boca e encostei a palma no mamilo. Lambi o pescoço, fiz alguns
chupões, outra mordida na orelha. Adoro esses chocolates...
Amarrei braços e pernas na cama, de bruços cortei suas roupas. A bunda dura pelos
exercícios souberam malhar meu pênis que dançava no anus apertado. Afiei a lamina o
mais que pude, e iniciando na ponta da coluna vertebral fui rasgando a separar o couro
fino e melindroso das costas, subindo cada vez mais logo eu via a base ensangüentada
desprovida do maior órgão. Já com vinte centímetros de pele meu trabalho ficou mais e
mais delicado. Nenhum cirurgião poderia ter tamanha destreza em esfolar as costas de
forma tão sublime. Como um pintor que vê seu quadro ganhando vida a cada grunhido
de desespero. Nunca estive tão ereto. Ganhando, abrindo espaço e deliciando-me com
aquela vermelhidão sem fim. Acima da metade das costas fiquei paralisado por alguns
segundos: um movimento pecador e terminava ali a fantasia que até aqui me pus com
tanto esforço a conseguir. O pano para minha capa traseira tem de ser sem nenhuma
cicatriz ou arranhão; senão teria de achar outra fonte. Da vendedora de bombons, a
máscara não me serviria. A máscara já tenho há anos, adquirida de uma jovem mais
madura. Subi mais dois centímetros, mais um, mais três, meu corpo tremeu numa
vontade louca e irresistível de terminar, arranquei de qualquer jeito, dando fim à minha
arte, estiquei o macio pedaço de couro e me masturbei com ele. Um orgasmo que
nunca tive! Gozei ali naquele mar de sangue um rio de esperma.
Capítulo II
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Uma pizza de queijo era meu jantar. Ouvi palmas novamente. Quem bate à minha
porta? Deve ser o carteiro e ninguém mais.
Não era o carteiro. Uma senhora de cabelos brancos e muletas, perguntava pela neta
de doze anos que passava a tarde vendendo trufas.
— Não a vi. Provavelmente está na casa de alguma amiga, não?
— Não, senhor! Ela sempre volta antes das cinco. É uma menina disciplinada, não
voltaria tarde nem se me avisasse.
— Bem, não posso ajudá-la. Fique tranqüila, é uma criança afinal, sempre são
malcriadas e desobedecem os adultos.
Subi. Da área de cima a via dar seus passos lentos de três pernas. Parou na casa de
um vizinho. Não sabia que a observava. Os lábios mexeram. O vizinho apontou para
cá. Ela olhou de novo e decidiu voltar. Atravessou a rua.
Palmas novamente. É o demônio! Ninguém mais!
Desci as escadas, logo se via que o vizinho falava de mim. A senhora disse que o
jovem da casa da frente a viu conversar comigo, apenas isso. Descreveu a criança e
suplicou por qualquer informação. Eu por outro lado lhe disse que herdei a memória
ruim da família. Admiti tê-la visto, pero passara rápido. Nada havia lhe comprado. E me
ofereci:
— Sou jornalista, talvez possa ajudá-la a procurar pela neta e com os afazeres na
polícia.
— Ah! Muito obrigada, o senhor doutor é muito gentil!
— Entre, vamos ao escritório. Cuidado as escadas. A senhora deve ter andado demais,
parece cansada.
— Não sou tão jovem, né doutor?
Infortúnio. Tive de fazer algo para silenciá-la.
— Sente-se à vontade. Aceita café?
— Aceito, muito obrigada.
— Vamos ao relato. Farei algumas anotações, depois agirei por conta própria, pero a
mantendo sempre informada. Pode passar os dados? Primeiro qual o nome da
senhora?
— Maria Aparecida de Sousa Bezerra.
— Se me permite, qual a idade da senhora?
— Sessenta e oito anos, doutor.
— Casada?
— Cinquenta anos de casamento, coisa que não se vê em qualquer lugar.
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— Sim, casamentos duradouros são cada vez mais raros, diga-se de passagem.
Continuemos, qual nome do esposo da senhora?
— João Antônio Guimarães Bezerra.
— Qual a idade do senhor seu marido?
— Setenta e dois anos, está velho, está doente.
— Que doença ele tem?
— Diabetes, vive no médico, pero somos tão pobres, mal temos dinheiro para os
remédios.
— O governo não os dá?
— Não todos, alguns são caros. Tem limite de valor, e há muita falta. A gente tem que
pagar muitas vezes, não dá pra esperar.
— Seu João é aposentado, do que trabalhava?
— Ganhou a vida como taxista. Eu ficava sozinha com Aninha o dia todo. Minha
princesinha... (Lágrimas).
— Qual a nome da neta da senhora?
— Ana Luiza Bezerra. Só tem o sobrenome do pai, meu filho. Eu a chamo de Aninha. O
senhor promete que vai me ajudar? Eu não sei o que faço, a polícia não resolve, nunca
resolve nada!
— Certamente, é para isso que servem os jornalistas. E quantos anos a Ana tem?
— Fez doze nesse mês, dia dez.
— E a escola, em que série Ana está?
— Sétima A. Está naquele colégio do centro, do padre Pedro, da igreja Anjo Novo,
sabe?
— Qual nome do colégio?
— Aquele... espera, deixe-me lembrar. (Dez minutos depois) Santa Rita de Cássia!
Essa memória de velha minha...
— O que a Ana fazia quando sumiu?
— Estava na rua, saiu para vender trufas.
— Que horas eram quando saiu?
— Duas e meia, mais ou menos.
— Que horas ela costuma voltar?
— Cinco horas, cinco e dez.
— Suponho que é a senhora quem faz as trufas. Para ajudar na renda familiar?
— Sim, doutor, a aposentadoria de João é muito pouca, e como eu disse, temos tantos
remédios para comprar... Falava de uma maneira a dar pena.
— Ana mora apenas com vocês dois?
— Sim, senhor. Nós cuidamos dela desde de nascida.
— Pode me passar o endereço da residência?
— Rua Giovana Nº 3045 Jardim dos Pompos
— E os pais de Ana?
— Somos apenas nós três, João, Ana, e eu, doutor.
— Qual nome dos pais dela?
— A mãe não é importante, eu fui a mãe dela. O pai, meu filho se chama Antônio Luís
de Sousa Bezerra. pero morreu, quanta saudade, já tem alguns anos...
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Maria parecia ter algum problema em falar da mãe de Ana, enfim:
— Antônio morreu de quê?
— No trabalho, trabalhava de taxista igual ao pai dele. Foi um acidente horrível!
(Enxugou os olhos).
— Que idade tinha ele então?
— Vinte e oito anos, tão novo! Tão moço! Meu filho!
— E a mãe de Ana? Perguntei ajeitando os óculos para olhá-la fixamente.
— Não quero falar dela, é muito triste!
— Pode contar, é importante. Pode confiar plenamente em mim.
— A mãe da Ana se chamava Lourdes Maria da Silva. Teve Ana muito novinha, com
treze anos.
— Casou-se cedo assim?
— Ela não casou não senhor, aconteceu uma desgraça com ela, doze anos atrás foi
violentada quando ia pra escola por um marginal que deve estar solto por aí! A polícia
nunca resolve nada, eu os odeio!
— Pode me contar a história, por favor? Farei o possível para ajudar. Onde a mãe da
Ana está?
— Vou contar a história pro senhor, doutor jornalista, vou falar a verdade. (Comecei a
me intrigar). Ana não é filha do meu filho. O Toninho a adotou depois da morte da mãe.
Ela era nossa vizinha. Se matou com dezessete anos, sofreu muito, uma dor que
ninguém pode imaginar, agüentou tudo sozinha, coitadinha, Jesus tenha piedade da
sua alma.
— Entendo. Bem, é só isso, está tarde, então levarei a senhora de carro para casa.
— Não precisa, o senhor já ajudou tanto, seu doutor.
— Claro que precisa, eu insisto, vamos, não me custa nada.
— Muito obrigada, o senhor é um santo, Deus te abençoe.
Levantou com dificuldade, apoiando-se na muleta. Dirigiu-se para saída, na porta
voltou para trás e perguntou:
— Doutor Jeferson, não é?
— Sim, sim.
— Tenho uma memória péssima, o senhor entende.
— Claro. Eu sorri.
De costas para mim, passei rapidamente o braço envolta dela, curvei a cabeça para
trás e logo vi a garganta flácida ser rasgada por minha faca tremendamente afiada.
Tudo aconteceu num susto. O coração pulou do peito duas ou três vezes no máximo,
seus olhos fixados em mim estavam incrédulos, e umas lágrimas secas desceram no
rosto enrugado. O sangue grosso a espirrar deixava o chão numa poça de lama
vermelha. Tratei de pegar uma mini serra elétrica, tão silenciosa quanto útil. Cortei seus
membros e dividi-os em dois. Decapitei-a e arranquei seus órgãos, os enfiando numa
sacola de lixo. Abri meu freezer horizontal de dois metros de comprimento. O ar lá
dentro é gélido e congelará o corpo totalmente em torno de 23 minutos. Joguei todas
as partes lá. A cabeça suspendi pelos cabelos, admirei novamente os olhos assustados
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e a coloquei ao lado do rosto da minha recém descoberta filha, Aninha.
Capítulo III
Dois dias depois:
Jantava um bife suculento frito na manteiga com rodelas de cebola, quando
atrapalhando-me a refeição ouvi palmas. Quem bate a minha porta? Deve ser o
carteiro e ninguém mais. Desci, ao me aproximar cautelosamente até o portão via o
semblante de um senhor de idade por volta dos setenta anos, que me interrogou:
— Boa noite, estou aqui para saber se o senhor viu uma senhora que passou por esta
rua dois dias atrás.
— Como é esta senhora? Perguntei curioso.
— Ela tem sessenta e oito anos, é minha esposa. Cabelos brancos, baixa, muito
bonita, não pode andar sem uma muleta para ajudar. Ela procurava minha neta, que
vendia bombons e sumiu no mesmo dia, pela tarde.
— Já tentou a polícia?
— Já, a polícia é uma porcaria, nunca resolve nada. Disse o velho com violência
— Interessante. Eu sou jornalista, talvez eu possa ajudar o senhor, não quer entrar
para podermos falar sobre o caso?
— Seria de muita ajuda, muito agradecido.
— Pode entrar, suba, tenha cuidado com as escadas...Š
Lous Rondon. Cuiabá, 25 de novembro de 2010.
Uma Anomalia V: Encontro com o Diabo
Capítulo I
Com a boca aberta aparava na língua o jato de urina quente que ia escorrendo
garganta adentro. “Não pare sua putinha! ” Eu puxava o cabelo, e a tremer de
gaguejos o medo a fazia mijar mais. Foi quando apertei a barriguinha dela sobre meu
joelho, e este comprimindo as tripas e esmigalhando os órgãos, doía, eu sabia que
doía, e por isso apertava mais. Apertava até que começou a sair vagarosamente, brotar
do cu uma sementinha de cocô. O pequeno anus se abria só um pouco e avermelhavase nas beiradas. Depois de três pedacinhos que mastiguei e engoli com gosto, saiu
uma fina torneira de fezes meio duras que caía contínua nos meus dentes, pois não me
esperava abrir a boca. Parou de sair, e por mais comprimido que estava o intestino, ela
não cagava mais nada. Sabia que era o momento de parar quando uma gota de
sangue no meio do cu molhou.
A noite chegou, fui levar a janta dela. Para uma menina de nove anos é bem fortinha,
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me agüentou esses três dias, e a cada dia meu apetite fica maior, mal posso esperar
pelas gozadas de amanhã. Colégios de criança são um verdadeiro cardápio, difícil
acreditar no tão despreocupada está a escola com seus alunos. A maior parte dessas
crianças pobres voltam para casa sozinhas, é aí que meu libido desperta, e não posso
segurar essa vontade de apoderar-me do mais fácil, do sexo gratuito, o melhor prazer
do mundo só para mim e de graça; com direito até a escolha: algumas criolinhas de
cabelo encaracolado cobrinho as orelhas; outras de um liso negro italiano. As mais
preciosas, loirinhas de pais gaúchos, têm olhos azuis e cabelos de seda louro
esbranquiçado. Dessas prefiro, sinto saudades de mamãe. Como eram bonitos os seus
olhos, a sua pele, como era tão viva, nova, mamãe.
Lancei o chicote que estralou em suas costas fazendo um buraco em carne viva. Não
sei se agüentava, nem sei se gostava; a essa altura a vagininha não impedia a entrada
quanto mais a saída. Tão feio um anjinho desses estar tão larga. pero eu gostava. Eu
gozava. O seu rosto inocente com lágrimas nos olhos, lábios trêmulos de choro e
dentes pequeninos ainda de leite. Adoro beijar essa boquinha miúda, e com o seu frágil
corpo, bate as mãozinhas nos meus ombros e empurrando minha testa. Nada mais são
que carícias. Que força uma menina mal alimentada e cansada teria contra um adulto
do meu porte? Minha bonequinha. Essa era especial, com essa eu fazia de tudo,
saciava meus desejos e criava fantasias. Com essa eu queria casar. Exagero, talvez.
Pressinto o dia que hei de me enfadar; agora ou mais tarde; um dia, o desejo de
dissecá-la me tomará conta.
A polícia e os jornais deram por seu desaparecimento. Lourdes Maria da Silva, nove
anos, desaparecia ainda dentro da escola. Uns advogados queriam processar a escola.
E a escola apavorada foi perdendo seus alunos, os pais das outras crianças prendiamse dentro de suas casas, com medo. Uma ou duas buscas pelos próprios moradores
dessa cidadezinha aconteceram. Até que noticiou no telejornal da manhã um corpo de
uma garota da mesma idade queimada e enterrada num pântano. A polícia cogitou a
idéia de ser de Maria. O delegado era incompetente e depois de duas semanas os
cidadãos queriam acreditar em algo. Eu acreditava, Mariazinha estava comigo. A
consciência geral pode ficar em paz. Era de idéia comum que aquele cadáver não
reconhecível, encontrado em outro município era ela.
Capítulo II
Na decoração de casa o que eu mais gosto é partes de madeira com verniz
envelhecido. O assoalho, portas e móveis combinam-se fazendo o andar de cima
parecer aconchegante e no modelo alemão século XIX. Na sala uma estante alta, uma
tevê com caixa de madeira e uma vitrola contrastam com o computador na
escrivaninha. O andar de baixo é todo meu; lá habita a dispensa, uma área de serviço,
um quarto onde coleciono e etiqueto gavetas com jornais e revistas; uma bicicleta,
mesa e barra de supino reto e outros pesos. Sala de carpintaria, um freezer horizontal
longo, uma banheira e um quartinho em que hospedo a minha então visita há três
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anos. Neste quarto uma portinhola na parede adjacente à cama que uso para enfiar
comida quando a cara triste de Maria me tem aborrecido. Maria é muito quieta, talvez
pela tensão, o medo constante; ouço seus ossos quebradiços estremecerem quando o
ouvido roxo acorda com o ranger da porta.
Meus dedos em sua garganta. Mirava os olhos eletrizados de desespero. “Vai engolir
cada gota do meu gozo. Não desperdice! ” E o tapa estrondava na bochecha, a
amolecer os dentes molares. A natureza do semblante angelical era de encantar; o
corpo frágil e magro podia ser moldado com as mãos; alguns fios do cabelo escorrido
se rebelavam para cima, tocando a facilmente imaginada auréola. Agora com onze
anos o seu bumbum ganhava maior proporção; os mamilos já empinavam ainda duros,
motivados pela gordura que pouco a pouco ia se formando entre as glândulas
mamárias. O seu cheiro mudou, mais sujo e excitante; típico cheiro de adolescente,
fazia a minha cueca apertar de longe. O anus também odorizava com mais destaque;
sempre o encontrava suado, apertado pelas bandas enrijecidas, que incentivou o cinto
de couro a ser cada vez mais rápido e forte.
Toda criança é inocente, pero Mariazinha dia a dia se tornava mais indiferente, o que
me enfurecia. Parto dessa desculpa para justificar a calmaria do meu libido, e até
minha traição. Pouco a pouco me ausentava do quarto, esperava que essas folgas
diárias deixassem Maria mais amedrontada. Passou-se a ser raro os nossos encontros,
e por causa disso e do trabalho eu a esquecia. A casa ficou mais serena que nunca. O
vento entrava pela porta do primeiro andar e ventilava os corredores, seguindo
caminho para o banheiro que tinha sua própria janela bem iluminada; a sala arejada
carrega perfume das rosas do jardim, trazidos por essa corrente de ar. Um ambiente
muito tranqüilo, capaz de apaziguar os corações de homens da terceira idade que hoje
se sentem inúteis por não terem feito nada na vida. Sentado na poltrona de pena vez
em quando me pego pensando no meu pai. Teria morrido nessa paz com que aqui
estou? O coração teria descansado da vida ateia e responsável que levara? Num
suspiro caio na realidade que sou filho de peixe. Com os mesmos defeitos, mesmas
lamurias, e os mesmos pressentimentos quanto à morte e amigos. Na rotina os rituais
que sempre tentam suprir mentirosamente essa necessidade de companhia. No
segundo suspiro sou acordado de um cochilo por um choro manhoso e muito fraco que
foi brevemente marcado na minha memória. Devia ser um sonho. Acolhi-me para
cama, arrastando meus músculos pesados de sono.
Capítulo III
Acordei com o sol transluzindo pela janela de vidro. O forro tinha um bom cheiro,
parecia confortável e me chamava para ter com ele mais dez ou quinze minutos. No
entanto não quis, levantei para beber café e lavar o rosto. Senti-me preenchido, a noite
me foi satisfatória, e notavelmente dormi tranquilamente. Fora o choro infantil que
ecoava em meus sonhos duas ou três vezes na noite, com intervalos de duas horas.
Esqueci disso com um pedaço de pão com geléia, que mastiguei bem antes de engolir.
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Mãos lavadas li o jornal do dia, fiz umas anotações e fui ver as flores. Enquanto as
podava, mexia na terra e fazia enxerto duma planta para outra, pus João Gilberto para
tocar nas cordas de náilon acordes em ritmo de bossa nova. Saí, fui ter na empresa os
compromissos do trabalho cotidiano.
Outra noite comum as outras, não suava, o clima gelado da região me fazia ter sonos
tranqüilos e completos. Apesar disso venho tendo já há dois meses pesadelos muito
estranhos que me arrepiam a pele. Ando por um corredor escuro, apesar de fazer sol;
caminhei muito por um corredor curto que parecia nunca acabar; finalmente chegando
a quina de uma porta americana, entro e me deparo com mamãe, rindo, com uma
sacola de laranjas e chupando. Sentada se nota o barrigão que ela detém. Ao lado dela
numa posição que nunca vi, papai também come as laranjas. Conversam, riem. São
muito moços, devaneio que se casaram a pouco tempo; Falam de algo, discutem um
nome. Entre eles está João, Danilo, José, Lucas e Jeferson. Apontam os benefícios e o
lado ruim de todos eles. Apesar de dizerem em bom som, não entendo nada, parecem
estar cochichando, alto o bastante para pensar que o fazem perto do meu ouvido.
Observo tudo aquilo paralisado; nunca senti tamanho medo antes. Escuto um latido do
lado de fora. Deixo a cena e encaro na janela da cozinha um grande quintal, que
apesar de bem iluminado deixa a vista escurecida. Um grande cachorro negro late. Ele
me fita, os olhos penetrantes, sérios, lindos, deixa-me com pavor. Pavor que sobe dos
pés para a cabeça. Os latidos são íntimos e parecem querer expulsar um intruso ao
mesmo tempo em que dá boas vindas. Tudo acaba quando viro para trás de repente,
olho minha mãe e escuto um choro.
Neste dia trabalhei a manhã inteira, voltei e pela portinhola dei comida para Mariazinha,
sem ver a sua cara. Subi, almocei vendo o telejornal. Após o almoço tomei um gole de
café para me animar na tarde que iria passar na redação. As cobranças e os parabéns
são sempre os mesmos, tanto que me cansam. Gastei as vistas digitando no
computador; tive contato com notícias novas, algumas animadoras, no entanto a
maioria de pequenas tragédias da capital, já que em cidade do interior pouco ocorre.
Trabalhei por mais tempo, algo como hora extra, se isso existisse no jornal. Saí do
trabalho exausto da mesmice, e fui para academia descontar nos braços a frustração
de rotina. Exauri o oxigênio entre as fibras musculares todas as angustias de um
trabalho chato. Poderia arrumar um melhor, pero é só nesta cidade que vou ter tanta
liberdade para suprir os meus prazeres distintos. Voltei para casa não me agüentando
em pé. Ao chegar preparei uma comida rápida. Um bife largo frito e coberto com queijo
mussarela e orégano. Acompanhei com vinho e mirei o jornal noturno. Fadigado, olhos
piscando, fui para o quarto. Dormi.
Muitas luzes circulavam ao meu redor, num local escuro fui reconhecendo o corredor.
Estava na casa dos meus pais. Na casa da minha infância. Havia quadros nas paredes
pintadas de pêssego claro. Quis parar para prestar atenção em cada um deles, pero
meus pés foram se movendo por mais que os impedisse, não, eu não os impedia.
Vagarosamente o corredor foi se tornando estreito, e caminhava com passos curtos a
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estrada longínqua. O fim parecia distante, entretanto eu tinha tempo. Talvez fossem
meus olhos ainda piscando, pero o caminho às vezes tomava outra direção. Ao olhar
para cima o teto de madeira se desprendia das colunas de apoio, entortando-se para
cima da minha cabeça, e o corredor então era um terror de claustrofobia. Descobri-me
claustrofóbico. Lutei para chegar ao fim, finalmente chegando à quina da porta recuei
um passo, tal como um bicho desconfiado. Tomei coragem, me debrucei sobre a quina,
colocando o rosto para dentro: lá estava como já sabido minha mãe sentada no chão
chupando laranjas. Ela me fitou, e ao abrir a boca um choro agudo e tão real me
despertou! Acordei suado, esbugalhei os olhos pelo quarto tentando achar algo. O
lençol molhado e quando pensei que estava tudo bem ouvi mais uma vez um choro
breve que arrepiou o meu corpo inteiro. Saí do quarto e o choro voltou, dessa vez mil
vezes mais alto, vinha do andar de baixo. Corri a tropeçar nos tapetes a escada abaixo.
E o choro mais uma vez soou através da porta do quartinho. Um arrepio mais intenso
bambeou minhas pernas, pulei para junto da maçaneta, girei a chave lá presa o mais
rápido que pude, e não acreditei quando vi a mais horripilante cena da minha vida: o
choro vinha dos braços de Maria, na escuridão da cabeceira da cama Maria
amamentava o filho do diabo!
Cuiabá, 25 de dezembro de 2010.

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Uma Anomalia VI: Verdades Reveladas
Capítulo I
Não era atoa que eu era o melhor escritor do Tradicional de Canguçu. Os elogios são
sempre tão rotineiros a ponto de ser tornarem enfadonhos, contudo entre os que o meu
serviço fazia eu não era o que melhor recebia. A disputa com a filha do patrão é mesmo
injusta, pero muita bola não dava, tinha o que queria. Certa manhã um jornalista veio
da capital para se juntar à redação, eu tomava café e rabiscava uma folha ou outra,
“esta pode, esta tem de ser refeita.” Levantei-me da cadeira quando José Klein Hoff foi
apresentado a nós. Bem vestido, de rosto sujo por uma barba rasteira e castanha,
cumprimentou a todos com aperto de mão e um sorriso excentricamente sarcástico,
chegando até mim com as mãos suadas com o sebo de todos: “espero que possamos
ser exigentes uns com os outros, falaram-me das suas grandes qualidades. ” Reparei a
pequena mancha de obturação no dente molar quando os pés parados inclinaram o
corpo dele para junto do meu. Todos devidamente sentados, admirei nesta manhã mais
um enfeite naquela grande sala: segui continuamente com os olhos todos os gestos do
novo trabalhador, a maneira de andar forte e o jeito sério de encarar o papel em
branco, parecia competente, competente o bastante para ter feitos a ser comparados
com os meus.
O editor nos pediu um pequeno trecho do editorial, ambos tínhamos de fazer, publicado
seria só um. Rabisquei qualquer coisa e fui para casa.
Peguei na adega uma garrafa e botei na geladeira. Preparei a frigideira para o alho,
pus o macarrão na água e arredondei as almôndegas. Bati no liquidificador os tomates
e adicionei sal. Dentro de meia hora me servi num prato grande de porcelana, derramei
o vinho gelado no copo e desci garganta adentro. Estou cheio.
O sol nasceu entre as nuvens extremamente brancas moldadas pelo vento. Entre elas
alguns pássaros passavam juntos passo a passo sem perder o compasso. Outros
inspirados pelo cheiro das flores recitavam poesia em assobios afinadíssimos. O
barulho dos carros dava início ao dia. Não presenciei nada disso, estava no banheiro
tomando a ducha. Bebi café e encontrei no editorial um dos meus rabiscos, já era
esperado, na verdade confesso ter sentido uma leve tensão a respeito. Cheguei ao
trabalho. Assentei-me na frente do computador e espreguicei. José rapidamente se
apoiou na minha mesa: “o seu editorial está mal escrito, repete assuntos velhos e só
eu percebi isso, é de se esperar de um jornalismo do interior. ” Levantou o cinto e foi
para sua própria mesa. Que injúria. Senti os músculos do rosto ficando mais rígidos,
minha vista mais centrada, e os incisivos de cima roçando nos de baixo. Até hoje nunca
havia me ocorrido tão fortemente a idéia de vingança.
Capítulo II
23
Via tevê quando percebi ter tomado a primeira garrafa de vinho tinto. A cabeça estava
cada vez mais quente, e recorri às lembranças da única pessoa que amei na vida, de
olhos claros e cabelo louro cacheado: mamãe, como era lindo o seu sorriso, mesmo
amarelado pelo cigarro tinha um charme de fotografia antiga. Desde pequeno mamãe
foi muito afetuosa, dando-me todas as atenções possíveis e ao contrário do esperado o
seu mimo não diminuiu com o tempo; o amor era como um vício; eu sensível ao
carinho de todos os dias mal podia suportar a sua ausência na faculdade. Lembro-me
como se tivesse vivido para lembrar os momentos de criança. Mamãe banhava-se
comigo, e sempre após depilar-se exibia uma insinuada massagem pelo corpo. Com o
correr do tempo os acontecimentos foram me tornando significativos e não mais
passivos como foram; posso me lembrar de maiores detalhes da nossa convivência.
Mamãe me amava de um jeito que passei a achar muito singular, vendo a mãe dos
outros meninos; louca por mim os carinhos apesar de serem comuns me faziam no
fundo pensar serem doentios.
Chegando a adolescência intensificaram: ela deixava a porta do quarto entreaberta,
para de noite escondido na quina da porta eu espreitá-la transar com papai. E os seus
gemidos eram com certeza algo para se notar devido a altura. A voz aguda se
mostrava, eu pensava: não para agradar ao meu pai, muito menos por necessidade
física; pero para mim. E ali tirava da calça o meu pintinho que excitava até ejacular.
Meses atrás sozinhos, ela me ensinou a masturbação de meninos, fazendo
movimentos leves e macios no meu pequenino pênis diariamente; também a
masturbação feminina, ao tocar-se na minha frente, desvendando-me todos os
segredos de uma mulher e como elas gostam. Ainda me oferecia o peito para mamar e
pude penetrar pela primeira vez a vagina quente e molhada da minha amada
professora. Falou-me do beijo e das posições no Kama Sutra. Ainda novo pude
perceber que as damas tentam alcançar a igualdade apelando pelo sexo, pensei:
quanta ingenuidade.
Certa tarde despertei de um sonho erótico com mamãe chupando loucamente meu
pênis; levantei e ela beijou minha boca. Suspendeu os braços tirou a camisa e colocou
o mamilo rosado entre os meus dentes — me mandou morder — mordi. Sentada em
mim, abriu meu zíper, achou-me duro, afastando a calcinha para o lado tratou de
encaixar entre as pernas molhadas o pau que ainda continuava crescendo dentro dela.
O líquido escorria em mim me encharcando, o seu rosto vermelho “mãe, vou gozar! ” eu
disse, e ela me exigia: “morda mais forte! ”. Eu gozei, ela ainda excitada rebolava no
pênis, sugando todo o gozo para o útero.
Os anos foram passando, mamãe era minha amante e eu o amante dela. Meu pai a
traía, ela não ligava. Por meses ficaram brigados o que me foi muito agradável, pude
ouvir uma das discussões, “você é doente, Maria, ele é nosso filho! ” Quando voltaram
a se entender me senti desapontado; apesar de me ter unicamente para ela, e sempre
que queria, ainda continuava com meu pai, eu a dividia. Essa situação realmente me
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aborrecia, atrapalhava os estudos e dava dor de cabeça. Senti raiva dela, pero sempre
ao se aproximar encantava, o nosso amor fazia surgir a esperança de um dia ela ser só
minha.
Capítulo III
Terminado a terceira garrafa o álcool tinha me deixado aéreo, a ira possuía minha
paciência. Não hei de gastar meu tempo preocupando-me com problemas, tratei de
seguir Sêneca, o problema deveria ser resolvido hoje. Fui à cozinha e apanhei uma
faca de mesa com ponta, desci as escadas e no quarto de carpintaria abri uma gaveta
e dentro dela num fundo falso meu revolver Alphonsus 38 prata. Abri a garagem,
peguei o carro e girei a chave. Pela janela aberta o vento me batia no rosto, liguei o
rádio, eram duas da manhã e as luzes vermelhas dos postes deixava tonto. Apesar das
avenidas mal iluminadas, as rodas sabiam bem em que lugar passar, evitando buracos.
O volante a virar, meus olhos piscavam — o sono era o equilíbrio, acalmando a raiva.
Desliguei os faróis e estacionei de vagar em frente à casa de José, desci e observei
toda a rua: vazia, vazia e escura, os habitantes dormiam cedo, é costume ir trabalhar
ao amanhecer. Decidi entrar, pero antes voltei e urinei na árvore da frente — minha
bexiga doía. Pulei o muro e espiei a janela da sala: a luz estava ligada e
aparentemente não havia ninguém. Por outra janela chequei o quarto: escuro e muito
quieto. Quem deixaria a luz da sala ligada numa vizinhança tão calma quanto esta?
Pensei comigo... é provável que é alguém que chegará em casa tarde da noite, vai
abrir a porta, não quer tropeçar nos móveis e acomodar-se silenciosamente como se
não tivesse sequer saído. Peguei um grampo de cabelo, quebrei e acionei a mola da
fechadura, com a faca de ponta fiquei tentando por alguns minutos abrir a porta.
Trabalho difícil. Consegui. Encostei-a atrás de mim e segui na sala com passos de
gato. Visitei o quarto único: não havia ninguém na cama, eu estava certo, o casal saiu.
“Maldito filho da puta José do caralho!”, me fez perder tempo vindo até aqui. Estava
para ir embora quando lembrei da luz ligada: para que iriam entrar sem fazer barulho
se não houvesse ninguém dentro da casa? Voltei ao quarto. Ascendi a lâmpada.
Consegui ver o que no escuro não poderia: meus olhos se encheram de graça, ao lado
da cama um berço estreito e baixo: o filho do casal de dois anos descansava em sono
profundo. José pode esperar, não vim aqui para fazer nada. Com a mão esquerda
tampei a boca da criança, a erguendo pelo rosto, como uma cobra a apertei sobre meu
corpo, e assim com a mão direita podia fechar a porta e até dirigir. Saí de lá
rapidamente e dei partida no motor, segui na estrada deserta com faróis apagados.
O menino ficava pulando, pero facilmente conseguia controlá-lo, até sufocá-lo se eu
quisesse. Chegando em casa entrei na garagem pelo portão eletrônico. Ainda o
segurando com a mão esquerda peguei uma fita adesiva e tampei sua boca, rodeando
a cabeça inteira. Sei muito bem a intensidade do grito de um pirralho. Joguei-o no chão
e dei um chute forte que o fez voar na parede. Puxei pelo cabelo, agarrei pelo pescoço
e arranquei a sua roupa com violência, rasgando-a nele. Levantei-o mais alto que
minha cabeça e mordi o seu pinto, junto dos testículos miúdos. Apertei com força e o
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sangue escorreu no meu queixo, mais força fiz e consegui dilacerar a genitália que
estando só na minha boca cuspi ao chão. A vermelhidão tomava conta de suas pernas
e barriga. Virei-o de costas, e aproveitando o sangue como lubrificante meti na sua
bunda por mais ou menos vinte minutos; deixei cair o corpo desfalecido. Busquei a mini
serra elétrica e decidi, excitado, a cortar o bracinho. Fora do seu corpo empurrei o
pedaço de antebraço no anus dele; a entrada inicialmente era impossível; pero que
força é isso para um bíceps acostumado com cem quilos? foi evidente que consegui
colocar dentro do reto aquele braço, e os dedinhos das mãos enfeitava o bumbum tal
como um rabo de coelho felpudo.
Capítulo IV
Com dezessete anos já havia tentado um namoro que terminou em frustração. E minha
relação com mamãe estava à beira de um desastre. Não podia suportar a existência do
meu pai; atualmente estão brigados novamente. Desta vez por causa das traições de
papai, ele não escondia. Mamãe era linda e muito dedicada, ele não sabia realmente
aproveitar a preciosidade que tinha em mãos. Era uma tremenda ingratidão a dele e
passei a sentir raiva do sinismo maior dela. Uma raiva que lembrava a cada instante, e
que os carinhos não mais abafavam. Explosões de inconsciência e planos impossíveis,
inconcebíveis. Dementes, que fugiriam até da minha própria vontade. Contudo a
verdade é que há três meses viver me está sendo impossível por causa dessa
impaciência. Gostaria de estar dedicando todo o tempo a mim, e não em preocupação
com problemas. Estressado ao máximo. Fazem dois dias que papai não vem para
casa, o que achei perfeito; mamãe finge não ligar, pero está magoada.
O dia amanheceu chuvoso, decidimos não sair de casa. Rapidamente escureceu por
causa das nuvens carregadas, e ofereci a ela “que tal uma sopa com muitos grãos? ” É
de se combinar com o tempo; estávamos agasalhados. Modesta parte, sou muito bom
na cozinha e uma sopa quente seria bem vinda. Ela não pôde recusar. As seis horas
estávamos com sono e famintos; a pimenta do reino já temperava, o macarrão ficava
macio, a lentilha e a batata doce estavam quase no ponto. Servi a sopa em pratos
fundos, tomamos tanto que mal podíamos levantar de tão pesados, e por isso ficamos
à mesa conversando. Por volta das oito mamãe se sentiu mal, inesperadamente
regurgitando um líquido muito preto. Seu rosto empalideceu e ameaçou desmaiar, pero
somente escorregou ao chão, começando a sentir falta de ar. Tentou levantar por duas
vezes, conseguindo na segunda, sentei-a na cadeira onde o mal estar se estendeu por
mais uma hora. Voltou de novo a falta de ar, do rosto lívido brotou manchas
amareladas, os olhos caídos e vermelhos ressaltavam uma forte anemia. Suou
bastante, um suor pegajoso e gelado. Toquei as suas mãos e estavam ásperas, com as
palmas descamadas e unhas se entortando para fora. Neste momento deu quatro
tossidas altas, seguida do mesmo vomito negro e grosso que não parou mais; a grande
poça que foi se formando podia contar com pequenas bolas de pus verde e gelatinoso
junto com um sangue rosado. Quando parou de vomitar, caindo sobre a poça. Teve
ataques epilépticos como se estivesse exprimindo o restante de energia que tinha no
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corpo; um barulho longo de peido se ouviu, logo um fedor de merda. A roupa se sujou
toda, mamãe ficou estrábica, e fez grunhidos, numa tentativa de comunicação.
"Se tu não for só minha, não será de mais ninguém!", esclamei.
E ela em um último esforço grunhiu algo decifrável: "do que tá falando!?"
Levantei sua cabeça nos meus braços e os cabelos soltaram facilmente do couro
cabeludo, deixando uma grande área calva e tomada de sangue. Parou de respirar,
coloquei a mão em seu peito e o coração já não dava sinal de vida. O corpo estava frio
como gelo e a pele branca como de um fantasma. Uma pessoa que horas atrás sorria,
agora parece estar morta há vários dias. Do que restava de mamãe era só o amor que
por ela ainda sentia. Despi-a, igualmente tirei minha roupa; ela estava com alguns
quilos a menos e suas partes íntimas lambrecadas de fezes. Peguei no meu pênis,
debrucei sobre ela e meti em sua vagina; não estava nada molhada; ao contrário:
sentia esfregar o pau em dois bifes congelados. Pero só por ser a vagina de mamãe
ficava excitadíssimo! Comecei a meter com mais força e rapidamente, gemia e o meu
gemido ecoava na cozinha vazia. Transava com ela em cima do piso. Nunca senti
tamanho tesão e mal podia esperar pelas próximas gozadas! Eu te amo mãe! pero algo
repentinamente me deu um susto que tirou todo o fôlego, meu coração pulou e
desacreditei: sorrateiramente papai havia entrado na cozinha e presenciado toda cena
funesta: “Jeferson! Jeferson! Está a estuprar tua mãe morta! ” Š
Cuiabá, 12 de Fevereiro de 2011

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Uma Anomalia VII: O Mal é Humano
Capítulo I
Há um mês me pus numa chateação que me renderá futuramente bom proveito, se
tudo sair como penso. Às vezes me perturba ter uma certeza tão prepotente, queria
mesmo é correr mais perigo. Anseio por isso. A certeza em muitas ocasiões, caso não
fosse o meu ego altivo, seria-me penosa. Graças a mim, não peno. Nada sai fora de
ordem, a terça sucede a segunda com equilíbrio, embora meus pensamentos, à nível
moral, possam ser considerados desequilibrados, mesmo virtuosos, calculistas e
totalmente consequentes.
Se o leitor não tem a capacidade de me compreender, seguirei o texto, que por si dará
um excelente exemplo do que estou a falar.
Manoela é uma moça de trinta anos, grandes olhos castanhos, cabelo negro italiano e
rosto ovalado. O bumbum é volumoso e macio, algumas sardas ao lado do fino nariz e
abaixo uns lábios hidratados e rubros, desenhados como que à mão. Mulher correta e
moralista, esforçada e sentimental. Quando nos víamos apenas na redação sempre
cumprimentava-me sobre meu trabalho, agora com quarenta dias de namoro não
consegue esconder a necessidade que tem do meu apoio, minha atenção. Em partes
me correspondo com ela; o pai separado não devia ter tempo com o que viria ser o
maior jornal da cidade, no qual trabalho. Com isso deve ter amadurecido rapidamente,
criando responsabilidades ainda na infância. Responsabilidades um tanto injustas, pois
são oferecidas para conquistar o amor do pai. Não muito diferente cresci, numa casa
de doutores eu tinha de ser o melhor, dedicação que só valeu a pena para conseguir
alguns lazeres hoje em dia.
— Por que faz essa cara? Às vezes tu é tão sério, pero é tão carinhoso, nem parece a
mesma pessoa.
— Ah! Tu não sabe quando eu to pensando? Só to pensando.
— Pensando em quê?
— Em nada, já devia me conhecer. Tá falando de mim, pero nem sabe que sou assim
mesmo...
— Para de ser chato. Quero comer macarrão. Tem manga para suco na geladeira?
— Tem, pero tu quer comer macarrão de novo?
— É mais rápido, hoje vou dormir em casa, finalmente.
— Tu sabe que vou te convencer a ficar.
O luar iluminava toda praça de árvores baixas e cadeiras de cimento, o círculo em volta
da lua indicava uma chuva fraca no meio da noite. O ar estava muito bom, revigorante.
Respirei fundo, e enquanto caminhava abraçado com Manoela podia olhar as muitas
estrelas que se alastravam lado a lado, nas laterais lisas da tão pequena abóboda
28
celeste que nos cobria neste dia. Convidei Manoela a olhar quando o vento soprou o
perfume das flores que escolhem a noite para desabrocharem.
José Hoff tirou alguns dias de folga depois do desaparecimento de seu filho que botou
a polícia da cidade a procurar com esmero. Então pôde perceber a incapacidade do
delegado em resolver casos nesta cidade antes pacata. Durante dois meses as
pessoas ficaram assustadas e começaram a trancar as portas de casa. José não me
importava, ele iria mesmo acabar voltando para a capital: não estava contente com o
Tradicional de Canguçu e seu casamento estava indo mal; a mulher histérica ainda
chorava, talvez se culpasse por ter deixado a criança sozinha.
Capítulo II
A fumaça saía da panela, logo botei o macarrão que sem se defender afundou.
Manoela e eu comemos, comemos muito. Pensamos que o que encheu foi o suco de
manga rosa com gelo e limão, quando na verdade pode até ser mais simples admitir a
gula. Assentado ainda à mesa li algumas páginas de poesia, experimentei alguns
versos tristes de Ricardo Reis logo após a janta, será que seria digestivo? Manoela se
levantou da cadeira que arranhou o assoalho fazendo um barulho irritante, desastrada.
“Já sobre a fronte vã se me acinzenta”
Escutei Manoela urinar vagarosamente, a porta do banheiro estava aberta. Isso me
distraiu, pero continuei.
“O cabelo do jovem que perdi.
Meus olhos brilham menos.
Já não tem jus a beijos minha boca.”
Por mais vagaroso que ia, a urina continuava a bater na água, sinceramente aquilo não
me deixava ter um bom fluxo de raciocínio, no entanto prossegui pois só sobrara dois
versos que continuei lendo com calma, queria que Manoela parasse antes de eu
terminar, para que enfim possa eu escutar minha voz como único som a ornar o
silêncio.
“Se me ainda amas, por amor não ames:
Traíras-me comigo.”
Na sexta sílaba o som da urina parou. Manoela se secou e suspendeu a calcinha com
a calça, tudo velozmente, tão breve quanto a última sílaba tônica de Pessoa. Fechei o
livro e a surpreendi ainda no banheiro, penteando o cabelo escorrido. Abracei-a por trás
e a fiz sentir o calor dos nossos corpos, como se estivesse dizendo “Manoela não vá,
está frio lá fora e veja o quanto está quente aqui dentro. ” Não sei se a convenci, pero
tirei o pente da pequena mão e deixei sobre a pia, a fiz andar até o quarto, onde virou29
se para mim e me beijou. Toquei em seu queixo para enquadrar o belo rosto liso e
macio, desci a mão até a barriga e subi até as costas, retirando a camisa. Manoela
levantou os braços, joguei a camisa na cama e ela tremeu de frio. Desabotoei a calça e
retirei o sutiã branco curto. Encobri os seios e o indicador sozinho se movimentou
provocando o mamilo que ia endurecendo. Ela cruzou os braços no meu pescoço se
segurando, retirei a calça e a calcinha rendada, finalmente ela se abaixou, abriu meu
zíper e pôs dentro da boca meu pau que pulsava mais e mais. Ali naquela posição se
sentia confortável, tanto que chupou por muito tempo, tive uma estranha sensação de
fraqueza. Deitei na cama e meu corpo afundou pesado: Manoela subiu em mim
tampando com o cabelo minha visão da pouca luz da sala que entrava no quarto
escuro: senti-me mais pesado e a comida já estava me causando enjoo: pero dei
continuidade: ela se arrastou estacionando com a vagina no meu rosto: olhei seus
olhos e brilhavam: lambi o miudinho clitóris quase invisível: ela rebola botando peso
nos meus dentes incisivos: ejaculei e o esperma começou a escorrer do pênis ao
escroto: ao ver a mão molhada com muito tesão sentou no pau até o fundo e a cada
vez que fazia isso as ripas da cama rangiam: liguei a luz e a encostei com as mãos na
parede: a cintura fina acentuava a bunda grande que pela grossura das cochas fazia o
corpo com seios pequenos e longo cabelo serem uma combinação irresistivelmente
atraente.
— Bom dia amor, vamos chegar atrasados, acorda amor. Acordei Manoela aos beijos.
Ela estava cansada, com pouca força na voz e olheiras.
— Que horas são? Daqui a pouco eu levanto.
Deixei-a lá para fazer o café e ler o jornal da manhã. O brilho do sol apenas confirmava
o horário do relógio na parede da cozinha, estávamos realmente atrasados. Mirei a
manchete principal do Tradicional quando escutei o som de Manoela urinando com a
porta aberta logo após entrando no boxe. Ela por alguma razão vestiu a roupa
rapidamente, notei que estava mais desastrada que de costume, me beijou, não tomou
café e saiu. Decidi chegar ao trabalho duas ou três horas mais tarde, então depois de
ler o jornal desci para regar as flores do jardim. Pelo portão olhei a rua, vazia como de
costume, a não ser por um carro cinza prata no final da rua, que ali ficou estacionado
durante o tempo que fiquei cuidando das plantas. Subi para tomar banho e me arrumar.
Capítulo III
Arrumei a camisa por dentro da calça e apertei o cinto, olhei pela janela e o carro tinha
partido. Voltei ao quarto e caí no chão por uma forte batida que me gerou uma dor
instantânea atrás da cabeça, a vista piscou e foi escurecendo, pero pude entender
antes de relutantemente perder a consciência em que situação me encontrava: José
Hoff me apontava uma espingarda, e se meus ouvidos não me enganaram, balbuciou
algo como:
— Te peguei, seu monstro!
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Acordei com cheiro forte de álcool e arnica por causa de dois algodões molhados pela
mistura que foram enfiados para dentro de minhas narinas, por causa disso tive de
respirar pela boca para tentar inibir o cheiro terrível que afetava minha consciência e
meus pulmões. Uma casa com paredes úmidas e teto sem forro, mobiliada
bucolicamente me hospedava no momento. Eu amarrado com os braços para trás
numa cadeira tinha ânsia de vômito e a dor mortal na minha cabeça fazia-me desejar
estar morto. A camisa estava banhada de sangue e faltando alguns botões. Depois de
uma hora nessa agoniante posição finalmente José apareceu na minha frente
empunhando a mesma espingarda que acredito ter causado o meu ferimento.
— José, o que tu está fazendo? Perguntei. Ele de olhos regalados, e aparentando uma
paciência demente, começou a contar:
— Tu quer saber como cheguei a isso? Vou te contar. Pelo que vi tu tem muita razão
para ter tanta confiança, comportar-se com arrogância e ser sínico mesmo nas horas
em que o teu mal está evidente. Não descreio da tua arrogância, nem subestimou a
ingenuidade das pessoas dessa cidade. Para chegar onde chegou, é óbvio que com
um jornalismo mal feito e uma polícia vagabunda que não sabe tratar de surpresas
quando acontece algo nesta cidade de interior miserável, os teus feitos diabólicos
sairão triunfantes. Poderia subestimar qualquer pessoa, até a tua namorada, filha do
chefe. pero cometeu um erro que vai dar fim a toda monstruosidade que fez, quando
ousou tirar de mim a única coisa que me mantinha contente nesta cidade “sem
violência”, a vida do meu filho. Ele era toda a graça da minha vida, eu não poderia
deixar um delegado analfabeto cuidar disso. Coloquei em prática toda minha
competência e meus anos de jornalista.
Capítulo IV
O teu nome, Jeferson Dietrich me ocorreu um dia após eu chegar em casa e ver que
meu filho havia sumido. Depois de avisar a polícia e desesperar-me junto da minha
esposa que hoje separada, e me culpando pelo acontecido, lembrei, para minha
alegria, que havia uma babá eletrônica instalada no berço, para que me avisasse do
choro do menino, e que se fosse a ocasião de eu não estar em casa, gravado ficaria
tudo ao menor som perto do berço apercebido. Entrei em meu escritório, peguei um
gravador e coloquei a fita para tocar, tudo ocorria normalmente, como esperado, pero o
choro do meu filho começou fraco e foi ficando muito forte, eu estremeci e ameacei
desmaiar, houve outro som, palavras, duas palavras foram introduzidas na gravação,
um arrepio me subiu, as duas únicas palavras ditas pela pessoa que o sequestrou, no
momento me indicaram ser a tua amaldiçoada voz. Elas diziam: “silêncio, moleque! ”
Por dois dias eu não acreditei, pero meus neurônios e meu instinto investigativo tiraram
meu sono e minha fome, me deixando neurótico. Minha neurose foi dia a dia ficando
mais forte, e decidi, para a minha saúde mental, investigá-lo. Primeiramente para
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comprovar uma inquietante intuição planejei ir a tua casa a fim de encontrar algo que
confirme pelo menos a tua má índole. Na manhã enquanto tu estava na redação
chamei um chaveiro de outro bairro para me abrir três fechaduras. Disse a ele ser
minha casa, e que as chaves havia esquecido. O rapaz abriu o portão, subiu a escada
e abriu a porta – que deu entrada para tua sala de estar. Logo pude perceber que o
acesso ao andar térreo estava trancado, o que excitou a minha curiosidade pela
estranha situação. Aberto, ao primeiro passo que dei escada abaixo, minha pressão
ficou mais fraca, e meu coração palpitou lentamente batidas intensas. O visual do
andar térreo era totalmente diferente do primeiro, o ar pesava e pouco a pouco era
envolvido numa atmosfera malignamente infernal, que ao perceber, virei para o
chaveiro e disse “pode me esperar lá fora? Pegarei alguns documentos e dentro de
cinco minutos no máximo, pedirei a tua ajuda para fechar novamente as fechaduras,
pois tenho de sair”.
Respirava com dificuldade, a minha ansiedade enfraquecia meus movimentos. A sala
então se dividia em quatro partes importantes: à minha frente uma máquina de
musculação com muitos pesos pesadíssimos. Liguei a luz e a lâmpada incandescente
fornecia uma iluminação avermelhada e curta. Ao lado direito havia dois quartos com
chave pendurada na fechadura, fui entrar no primeiro, ao chegar a porta me bateu um
medo arrepiante, como se sentisse uma presença de outro mundo. Com muito medo
consegui com os braços trêmulos abrir a porta. O que vi foi um quarto escuro
agoniante, apesar de só conter uma cama com cheiro de mofo em todo espaço do
quarto. Portando, pelo mal estar que aquela situação me colocava tratei de fechar
rapidamente, e bem baixinho rezei o rosário, e pedi a Deus que tivesse pena da alma
que ali tinha sofrido.
Capítulo V
No quarto ao lado se eu não me engano, era uma perfeita sala de carpintaria. Com
vários instrumentos e utensílios de maquinaria. Apesar de ter me intrigado sou forçado
a dizer que não compreendi a intenção daquela sala em um ambiente tão horripilante.
Fechei a porta e voltei ao ponto de início. Virei de costas e atrás de mim aguardava um
fantasmagórico freezer horizontal de mais ou menos dois metros e meio. Estava ligado,
funcionando e em sua orla um ar gélido que vinha de baixo para cima. Também
exalava um odor intenso de carniça que ao chegar perto quase me fez vomitar. Pensei
muito ao abrir, se não fosse a minha curiosidade investigava teria recuado e ido
embora só com o que já tinha. Contudo lembrei que nada tinha, e não poderia culpá-lo
por achismos, apesar do sentimento de náusea e sobrenatural que o andar térreo
emitia. Abri a tampa pesada do freezer com as duas mãos, o odor e o vento congelante
me empurraram para trás, estava escuro, então acendi meu isqueiro. O que vi não
posso traduzir em palavras ou em raciocínio lógico, infelizmente passei a entender a
função do quarto de carpintaria. Pedaços congelados de corpo humano na mais pura
fase de crescimento. Cabeças fora do ombro, pernas separadas dos quadris e órgãos
internos, uma pilha deles. Não pude conter o choro ao pensar que poderia ser um
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daqueles corpos inocentes e violados meu filho. Pelo escuro e gelo não poderia
reconhecer. Estou contando com calma pois ao ver aquela cena horrível de mutilação
satânica fiquei imóvel e indefeso. Mesmo que por instantes ter permanecido com o
freezer aberto senti que aquela assombração durou toda eternidade. Agora estava
convencido e tinha provas da tua monstruosidade, pero uma gaveta ao lado do freezer,
em uma área no canto da parede, como que esquecida, continha uma espécie de diário
que relatava tortura, nomes e idades de crianças, datando pelo menos uma década.
Pus o pequeno caderno dentro da paletó e fui para casa.
Chegando em casa passei dias a relacionar as mortes listadas no diário com os da
cidade e os da redondeza. Descobri vinte crianças desaparecidas em notícias de
jornais do interior. Sim, eu procurei. Foi um trabalho desgastante, penoso, exaustivo,
pero queria entender até onde iam as tuas atrocidades. E com passar do tempo entendi
que teria de ir mais a fundo, decidi pesquisar sobre tua vida. Mortes por perto ti desde a
tua adolescência. Isso mesmo! Pelo meu raciocínio a tua fome por sangue devia ter
começado com alguém próximo. Nenhum crime fica sem provas, é necessário
experiência, é se preciso cair para começar a andar. Procurei por teus erros. E
descobri. Primeiro descobri que quando morava com os teus pais na capital a filha de
uma criada havia desaparecido. É mesmo Jeferson Dietrich a encarnação do mal. pero
o que mais me assustou foi saber da morte da tua mãe com quarenta e dois anos de
idade. Então fui à capital. No hospital onde teu pai foi diretor por muitos anos, me
disfarcei de médico, e com dificuldade encontrei o laudo, onde registrava a morte da
tua mãe. Não tem como eu entender linguagem médica, pero ali no meio daqueles
termos herméticos li “alta concentração de cianureto ”. Estranho, não? Mesmo com o
nome de um veneno mortífero escrito ali e entendido até por mim, o que se ficou
sabendo sobre o falecimento da senhora tua mãe, que não tem culpa por ter um filho
diabólico, é que morreu por causa de câncer.
Capítulo VI
Escondi tudo da polícia, não a falaria de nada, seria tudo inútil! O mais correto a fazer,
e não pense que é fazer justiça com as próprias mãos, pero sim impedir que um
psicopata faça mais vítimas. Farei hoje o papel de Deus, Deus finalmente decidiu
interferir no teu livre arbítrio.
— José, tu é muito inteligente. Foi mais esperto que qualquer pessoa, realmente
preciso admitir a tua superioridade quanto a mim e os outros habitantes da cidade. pero
se empolgou muito enquanto contava das tuas descobertas. Foi contando
freneticamente, acho que a questão entre nós não é eu ter matado teu filho, e como tu
disse, ter destruído a tua vida e a de outras pessoas. Para mim é natural crianças
serem ingênuas, pero adultos têm de deixar de lado a ingenuidade e admitir os próprios
erros. O erro de todos os pais, todas as famílias das crianças que eu matei foi terem
deixado elas livremente na mão de estranhos, explorarem um trabalho infantil ou terem
sido deixadas sozinhas em casa. Como foi o que tu fez. Então para mim, a questão
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aqui é a disputa que tu criou para provar quem é mais inteligente, tu, ou eu. Tu não
percebeu que enquanto te vangloriava dos teus feitos e da minha posição de
submissão a ti, que estas cordas com que me amarrou são muito vagabundas, e os fios
se desenlaçam uns dos outros quando se molham, afrouxando. Então pude soltar a
corda. Agora eu vou te matar.
— Não fale besteira, seu animal! Quem vai morrer é tu, tenho até dó de ti, mesmo
sabendo do monstro que é.
Quando José terminou de falar soltei as minhas mãos e dei um soco no nariz dele,
esmagando o osso e a cartilagem, o fazendo voar contra parede, ficando inconsciente.
Tirei as roupas e o amarrei na mesa da cozinha. Procurei algum instrumento que
fizesse o nosso prazer ser mais intenso. Ao procurar percebi que era um sítio pequeno
e muito bonito, o sol se mostrava radiante, perto de se pôr. Caminhei e encontrei vários
instrumentos de cultivo. O utensílio de corte mais tecnológico era um serrote
enferrujado, que apesar disso parecia ser muito afiado. Voltei até a cozinha e comecei
a serrar os pés do senhor Hoff, que acordou rapidamente. O serrote dava muito
trabalho, pero consegui terminar o pé direito. José desmaiou de dor. O chão da cozinha
ficou inundado pelo sangue que escorria sem parar, acendi uma brasa e tratei de
cauterizar o machucado. O sangramento parou. Dirigi o serrote à barriga de José, fiz
força, e abaixo da pele, ultrapassei a gordura que espirrava sangue, em meio a muito
sangue as tripas foram saindo, atrapalhando mais o trabalho. Aos gritos José morreu.
Os órgãos pareciam todos iguais, era uma vermelhidão sem fim. Separei José em dois,
e tive uma excelente ideia para cabeça. Decapitei e embrulhei com muito pano que
encontrei nos quartos e a enfiei em uma sacola de lixo.
Capítulo VII: Fim
Com uma pá fiz um fundo buraco que joguei ali o corpo sem cabeça. Limpei a cozinha
e tomei banho. Coloquei um curativo no machucado. No paletó de José encontrei meu
diário, vesti as roupas dele e as minhas coloquei dentro de outra sacola de lixo e trouxe
comigo numa caminhada. Depois de muito caminhar peguei carona até a cidade
vizinha a Canguçu. Lá paguei um táxi que me trouxe até praça perto de casa. Voltei pra
casa a pé. Estava cansado, chegando tomei banho. Enquanto a água caía no meu
rosto pude relaxar os músculos e os nervos de um dia que me deu tanto trabalho.
Preparei uma panela com água, esperei ferver. Enquanto fervia puxei o cabelo da
cabeça de José e pude retirar seu cabelo com um escalpelo. Joguei a cabeça na
panela de pressão e esperei quarenta minutos. Soltei o vapor e com a ajuda de luva e
dois garfos retirei a cabeça da panela colocando numa tigela de vidro. Em cima da
mesa pedi auxílio de uma colher para raspar o músculo epicrânico, que em forma de
gelatina foi sendo despregado do osso em toda sua extensão, não arrebentando
apesar da sua finura. Totalmente raspado retirei também o temporal. Peguei uma faca
sem serra, e com leves movimentos à direita decepei o masseter. Embrulhei o resto e
34
coloquei no freezer.
A campainha tocou, olhei pela janela e Manoela estava na porta.
— Vem abrir! Ela gritou.
Desci para abrir a portão. Ela me recebeu com um beijo e um abraço apertado, passou
na minha frente e subimos a estreita escada de mãos dadas. A calça apertava sua
bunda como se convidasse a apertar. Apertei, ela continuou subindo sem nada dizer.
— Tu tá fazendo janta?
— To sim, já comeu?
— Não.
— Eu vou fazer macarrão à alho e óleo com uns fios de carne bem soltinhos pra comer
com vinho que tá gelando.
— Ótimo, to morrendo de fome. Vou ao banheiro.
Ela deixou a porta aberta para eu escutá-la urinando. Quando saiu eu dei um sorriso,
ela retribuiu e deu um beijo.
— Tu tá carinhosa hoje. Eu disse
— Saudade de ti.
Depois de comermos dormimos. Fomos gulosos e o vinho ajudou a adormecer. Os dias
correram-se assim. Depois daquele longo dia de infortúnio com José, eu estava até que
enfim livre para respirar.
Hoje é dia primeiro e amanheceu com um belo sol a transluzir pela janela e pela
cortina. Fiz café que espalhou o seu bom cheiro pela casa toda. Li o jornal, eram oito
da manhã e pensava em Manoela, que deveria estar dormindo este horário. Quando
acordasse planejaria minha festa surpresa. A campainha tocou, Manoela chegou tão
cedo assim? Impossível. pero a campainha tocou mais duas vezes. Quem está a me
incomodar a esta hora da manhã? Logo se seguiu de palmas, e uma voz gritou
“Jeferson Dietrich, aqui é a polícia, abra a porta, temos um mandato! ”Š
Lous Rondon. Cuiabá, 16 de Abril de 2011.

35
O Estuprador de São Félix
Começou a andar pé por pé, a magreza driblava o tronco alto do vento, assim
transpassando o frio e o cheiro de perfume ruim que vinha da gorda da frente. O
terreno baldio marcou a hora do ataque, prendeu a mulher surpresa enforcando-a com
o antebraço comprido e feito de osso. A peixeira que tirou da cintura refletiu com uma
lâmina fria e faminta a lua cheia, que soube amedrontar a mulher vaidosa de quatro
filhos. “Vão me matar”, pensou. Foi arrastada ao meio do mato e do lixo, de árvores e
de corpos de bicho de estimação já secos e comidos por formigas. Tudo fedia, fedia a
banha suada da quarentona, fedia o perfume barato, fedia as roupas do peixeiro, fedia
o cabelo que nunca lavara na vida, fedia o pinto duro e sujo que transpirava todo
ferormônio, e este foi bem recebido pela vagina peluda, aberta pelas longas horas de
caminhada e pelas tantas vezes que fudeu.
A mão no pescoço seboso congelou o desejo de fuga, a faca pontiaguda arranhava
junto com as idas e vindas do pau preto e arretado. O aço violento por vontade própria
começou a golpear o seio pelancudo que em seis anos amamentara toda a cria,
dançava e pulava como uma cobra tentando se livrar de um predador, até que por fim
descansou com tensão e perfurou fundo do bucho ao coração. Lá trepada não saiu por
longos minutos, esperou maliciosa a última tremedeira da empregada doméstica, que
esticou-se como uma pedra gelada no inverno, em uma atmosfera muda e
desconhecida, enfim tudo terminara, enfim a tristeza tomou conta do lugar, ficou tudo
tão vazio quanto as longas horas de trabalho repetido.
Amanheceu e o que dizia no jornal era tudo. pero sobre ele nada. Nada teria achado
se ao menos tivesse procurado no diário local. Se muito esforço fizesse conseguiria
soletrar algumas poucas palavras, o resto não saberia era nada. Este vagabundo
nunca conseguiu terminar a segunda série do ensino fundamental. Este vagabundo
nunca conseguiu outro trabalho além de peixeiro e orelha seca. Depois da feira daria
umas tragadas numa pinga doce. Faria um quilo de farofa com pacu frito. A casa velha
tinha um cheiro de óleo e mofo pelas paredes infiltradas. O tijolo era visível, e o
cimento esfarelava sozinho. O fogão por milagre tinha uma boca a funcionar. Era o que
havia deixado o ofício de prostituta da sua falecida e cardíaca mãe. Depois da morte
dela os quartos ainda continuaram a receber clientes das mulheres do padrasto de
Josemar. Contudo a solidão devastou o lar após o sumiço do cafetão alcoólatra.
O olhar vidrado do peixe na lâmpada não esperava por nada. Apenas estava lá
enquanto as vísceras dele eram arrancadas dentre as espinhas e escamas lavadas e
escorridas cano abaixo. Uns narigões melequentos vinham cheirar sua cabeça, e assim
estendido por mãos grossas de unhas longas e pintadas, chamativas. Estas senhoras
perguntavam ao peixeiro quanto o gosto e modo de preparo. Causavam nojo, e por
este nojo a vontade de esfregar o pinto entre suas pernas crescia.

36
Quando a lua tornou-se rubra como sangue entre o escuro do amplo céu os ventos
malignos planejaram cantar sobre as telhas e árvores, e o frio que vinha com ele
poderia matar os sapos desavisados que pulavam no quintal sem fim que nesta noite
era revestido por uma fantasmagórica nuvem a deslizar sobre a terra de tantos e tantos
cadáveres dormindo desde séculos atrás. Do portão à parede o terreno tornara-se tão
extenso a não se poder ver horizonte. As mangueiras sem frutos estavam altas e
abrigavam corujas que ao tremerem soltavam como dor a última vogal do alfabeto.
Dentro da casa a escuridão emudecia os móveis de madeira, tão antigos que traziam
lembranças há tempos esquecidas. Em especial um deles, uma cadeira de balanço
rangia ao ir-se para frente e para trás, tão vagarosamente a dar a impressão de estar
flutuando no meio daquela sala de insana morbidez. O coro do vento tornou-se mais
forte e agora dava para se ouvir nitidamente, eram como crianças cantando cantigas de
roda. A porta por não aguentar cedeu, deixando seis meninas a fingir cavalgarem em
cabras fantasmas entrar. Os cabelos pareciam irradiar brasas se movendo no ar, as
pesadas roupas afogadas em lama de pântano encobriam parte das delicadas
perninhas, o olhar negro sem reflexo algum sombreava o sorriso podre e lábios
doentes. Saíram galopando sem medo de monstros pois na verdade os espíritos eram
elas agora livres para trucidar um mortal.
Josemar sob o forro dormia incomodado, sonhava, balbuciava qualquer coisa e
chorava todas as lágrimas que nunca presenciariam a luz de seus crimes. Chorava a
morte da mãe, chorava as lembranças de nunca ter tido infância, de saber que seu pai
era mais um cliente no meio de várias prostitutas. As meninas ao pé da cama
atentavam-no como chamas infernais e sussurravam vozes bestiais ininteligíveis "...
acorde, Josemar, o vento te guia, agora lhe diremos o futuro, guardamos algo em
particular para você, o escolhemos pois dará conta do destino, das milhares de unhas
brilhantes e de vaginas ofegantes hão de esperar pela sua timidez. O demônio que foi
perturbado hoje está conosco, o número correto é o três, não o cinco. Satã derramou
sobre nós os poderes das trevas. Nenhuma bondade é sem interesse e nenhum
interesse livre de maldade. A casa está velha, não aguentará muito, tem de sair, a
parede precisa de mais sangue e a terra de mais ossos. Não existe nada mais
impessoal que o sexo. Os filhos terão pais, pero é preciso deixá-los órfãos, como
você...” Uma das meninas diabólicas puxou o pé de Josemar, ele rapidamente pulou da
cama, o pranto misturava-se com o suor, e o suor com o fogo. ?
Cuiabá, 10 de setembro de 2012

37
O Benfeitor
O texto a seguir é indicado para maiores de 18 anos. É fictício, não representando a
opinião pessoal do autor.
O Benfeitor
Por Lous Rondon
Para a flor que me pediu um conto.
Cuiabá, 17 de Julho de 2013.
Correção e novos detalhes feitos em 1º de julho de 2013.
-- Capítulo I
O ventilador repetia sempre o mesmo ranger, dando um ar entendiante ao quarto de
tinta amarelada. A cama tinha um forro que nunca fora trocado, mofado, encardido, que
fedia à sexo. Em cima deles uma meretriz nova de coxas arredondas, morenas e
grossas, a pele que não banhara no dia podia contar com a hidratação natural da raça.
Os dentes incisivos pretos, um sorriso tão vulgar que poderia encontrá-lo em qualquer
boca larga das moças da periferia. A mão extremamente pequena e gordinha lutava
contra um velho tarado, que na noite, como todas, fugia da mulher rabugenta com
quem era casado há pelo menos quarenta anos, indo de bar em bar, de puteiro em
puteiro.
-- Vamos, eu pago mais. Te dou mais vinte do que já dei pra sua patroa lá fora. Não tem
perigo, é mais gostoso eu to falando, o cliente tem razão e eu paguei então não vou
pegar o dinheiro de volta e você vai ter que fazer do jeito que eu gosto, vamos, eu to
pagando.
-- Já disse não, não vou fazer sem camisinha, caso você não trouxe pega essas aqui,
ou cai fora, não devolvo o dinheiro também, você veio aqui pra arranjar confusão? eu
vou chamar o segurança lá fora.
O tapa foi forte, a vagabunda bateu a cabeça na cabeceira da cama e apagou. Então o
velho instigado meteu o pinto enrugado e cabeçudo para dentro daquela buceta suja de
urina e lubrificantes. Roçou ali tão folgado como um soco no ar, o pênis não era o
mesmo dos seus vinte anos, então espirrou num minuto, colocou o caralho para dentro
da calça e desceu com passos longos e rápidos a escadaria mal feita, em que os
degrais continham buracos, visto que a altura de um para outro variava tanto que
podia-se facilmente errar o pé, sendo necessária muita atenção e destreza para não
sair rolando até em baixo.
-- Capítulo II
A aids, o craque e o filho a levaram até o convento, onde tornara-se freira. Deixando o
38
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Dedicação insana

  • 2. Uma Anomalia II: Minha Grande Dedicação Molhado de urina infantil o lençol gelava meu rosto. E sentia o cheiro bom do sangue coagulado. Ontem me botei em outra aventura, minha grande dedicação faz o trabalho nunca entrar na rotina, por mais que o faça demais ultimamente. 14 Horas atrás: Espreguiçava-me, o jejum vespertino animava o coração que pouco a pouco retornava ao ritmo anestésico da minha excitação. Vesti uma calça, calcei as botas curtas e alcancei as alças do meu macacão camurça. Peguei as chaves do carro, tranquei a casa e dei partida no motor. A noite me possuía, e eu possuía os desejos que uma noite de cidade grande poderia proporcionar; em cada esquina as putas me acenavam, pero são velhas demais para o meu gosto delicado e etéreo. Apesar disso a elas devo minha gratidão: as filhas das putas não se prostituíam por causa da polícia na região, elas apenas deitavam-se nas ruas em dias invernosos como esse, ficavam lá morando na calçada, cobertas (quando cobertas) por um cobertor imundo, e eu as tinha descoberto. Talvez pela tendência de serem como as mães fosse fácil a aproximação, parava o carro e da janela oferecia um bolo de chocolate. Sou um empresário de primeira, e quando quero não tem infância que pode fugir da agilidade dos meus braços e dedos grossos. Tampando a boca e segurando os dois esqueléticos antebraços com uma mão miro os seus olhos assustados, e do interior do carro ela via brilhar o olhar profissional e como eu disse: de tamanha dedicação... Amarrada punhos e pés, uma camisa entrava pela boca e descia garganta adentro, conto com os glóbulos vermelhos: Deus queira que esse princípio de pneumonia não tenha lhe dado muito catarro, pois senão com certeza morrer-se-ia sufocada, sem que ao menos tivesse tocado sua pele tão lisa e gostosa. Nervoso de preocupação fiz queimar as rodas nas ruas largas em direção ao lar, dirigi furiosamente o mais que podia, deveria lembrar-me sempre em dissimular a pressa, respeitando os eternos sinais vermelhos e as mulheres, péssimas motoristas. Em um minuto eu já tinha estacionado, peguei o meu delicioso brinquedinho e tranquei toda a casa de muros altíssimos e grades de cárcere — é nessa hora que se dá conta do benéfico medo da violência e dos jornais que não param de divulgá-la. Desamarrei a minha presa, que depois de ter se dado conta da chance de liberdade correu pelos corredores curvos, descobrindo todos os cômodos da casa, buscava o mais cômodo para acomodar-se. Meus ouvidos já me disseram: os passos pararam, o coelho tocaiou-se na toca. Andei pesado, entrei no quarto e apanhei um cinto, comecei a voá-lo contra a parede, sinto os sentimentos por ela sentidos. Cultivava o seu medo, de pé em pé, devagar e sempre, o estridor excelente exprimia as minhas fantasias fantásticas realizando-se. O couro chicoteava sua cabeça, meus bíceps demonstravam a verdadeira dedicação, 2
  • 3. ela se encolhia cada vez mais no canto escuro e úmido do banheiro, seus soluços e gaguejos soavam mais altos que os golpes. Peguei-a pelo cabelo, no mesmo instante senti meus dedos deslizando nos fios, percebo, não eram os dedos a deslizarem, e sim os fios a se soltarem facilmente. Alguns ainda persistentes me deram a oportunidade de arrastar aquele corpo magro pela casa toda. Levantei-a pelos ombros e a assentei à mesa. Suas pernas ficaram arranhadas e seu humilde corpo raquítico tremia todo sem parar, acompanhando os berros desesperados. Apertando-lhe os braços, meus olhos fixaram-nos dela, mandei-a calar a boca: funcionou melhor que eu esperava, como é fácil controlar crianças. Subitamente engoliu o choro e a tremedeira como se estivesse em choque, apenas as lágrimas que durariam até o fim de sua vida ainda rolavam como cachoeiras na maçã suja do rosto. Imóvel ficou durante o tempo que passei cozendo uma sopa, peguei os pratos fundos e os talheres antigos. Servi a água com verduras, pero não parecia nem um pouco disposta a alimentar-se sozinha. Como a um bebê dei as colheradas entre seus lábios fininhos, com máxima gentileza, com máxima dedicação. Tudo está sobre controle e agora é sabido por mim como é ter uma filha e a ela como é ter um pai. Estendi a mão, ela apertou e a levei até a cama, depois da surra cochilou um pouquinho, a esquentei num edredom limpo. Vinte ou trinta minutos foram de observação. Minha alma estava plena, satisfazia-me a solidariedade, a ajudava como um compromisso social. Se paro para pensar sou o melhor homem, entre aqueles que erraram eu tinha sido a esperança para as crianças de rua, quando esquecidas eu as aquecia. Sou feliz a cada momento porque sei que elas me amam. Aquela observação foi se tornando monótona, a cada minuto sentia os meus músculos lutando contra o cérebro; a cãibra era decifrada: não agüentava mais a imobilidade, e até o coração se arrependia de ter iniciado um relaxamento. Minha personalidade me dizia e meus hormônios triunfantes pulavam, a impertinência tirava o corpo da impotência. Arrastei-me até a cama como um vampiro, mirei sua face tão pura e necessitada, vendo aqueles beicinhos secos e roxos de frio acordei a bela adormecida com um beijo. Naquela idade ainda não sabia beijar, abriu os olhos, tentou fechar os lábios e com as pequeninas mãos empurrava meu peito — Tudo em vão — Minha voluptuosa dedicação crescia mais, e só com a língua eu a dominava, dentro da sua boca explorava cada espaço, contei os dentes e as cáries, assim como as veias abaixo da língua; abafava os grunhidos acariciando as amígdalas. Deixei e se protegeu apertando a cabeceira da cama, seus olhos espantavam-se e sua fisionomia gritava apavorada. Numa velocidade que surpreendeu até a mim tirava as roupas dela; depois de tê-la deixado pelada e batendo queixo de hipotermia fui até o guarda-roupa: olhei tudo só por olhar, já sabia o que queria: um cabide fino de metal. Apanhei-la pelo pescoço com a força dos meus ombros gigantes desferi com graça e enérgica dedicação na sua bunda, os glúteos contraiam-se elétricos e na pele marcava vermelhidões desenhos salientes do ferro. Enquanto batia ela urrava e urinava na minha cama cara. Um, dois, treze, vinte, vinte e cinco, já não podia mais contar, as 3
  • 4. marcas se misturavam, havia amaciado a carne o suficiente. Abri o zíper e desceu meu pênis comprido que ia palpitando-se mais e mais, a parecer um rabo de cachorro feliz. Forcei para dentro, e pela vagareza com que entrava durou uma conta de segundos; antes da metade senti um obstáculo, seria aquele o colo do útero? Talvez soubesse a criança que começava a babar uma saliva inacabável e espessa. A aplicada dedicação rompeu os horizontes, e pelo movimento de entra e sai avistava num futuro próximo a noite ejacular o sol. Lambi sua barriga encardida, aquele gosto, aquele gosto salgado de sujeira acentuava-se mais nos mamilos sem bicos. Lambi, lambi e lambi as bochechas, os ouvidos e mordisquei o pescocinho novo. Saciado, curvei-a para trás e tratei de torcer o externocleidomastóideo. — Depois da festa tem que se limpar a bagunça, eis o que alguns diriam. Pero começa agora a melhor parte: Peguei o meu facão alemão Schwarz, com cabo de madeira tratada de dezoito centímetros; lâmina negra de meio metro, feita de aço amorfo 420. O brilho inigualável do fio injetava em mim uma alta dose de adrenalina. Decapitei-a com duas investidas, estiquei o braço e com uma única torei o osso descalcificado. Fiz o mesmo com ambos os fêmures, que precisaram evidentemente de mais facãozadas. Despreguei a canela da cocha, caso não tivesse feito minha sacola plástica rasgaria. Não preciso me preocupar com digitais, saliva ou sêmem. No lugar que hei de enterrar o corpo retalhado é inóspito, naquela floresta lamacenta remota. Este meu calculado plano tem durado duas décadas, e por isto creio indubitavelmente no seu funcionamento, tanto que posso usufruir de outra regalia: gosto de dormir perto do corpo, ter ao nariz o cheiro da carne recém morta e sangue fresco. Acordei. Molhado de urina infantil o lençol gelava meu rosto. E sentia o cheiro bom do sangue coagulado. Pode parecer insanidade, pero tenho maior arbítrio de dia do que à noite. De noite parecerá mais suspeito um carro subindo a grande colina, e seria quase impossível esquivar das britz policiais que sempre se faziam naquela direção. Devo este racioncínio a minha engenhosa dedicação. Arrumei em baixo dos bancos os sacos, em seguida pus o carpete. Segui na avenida Dutra o destino longínquo. Virei à esquerda, numa estreita rua de asfalto breve; a última parte do caminho seguiria na estrada de chão. As poeiras levantavam como sempre, as nuvens transpareciam o céu azul marinho, o vento era forte e as andorinhas voavam de acordo com a vontade da líder. Resumindo a calmaria habitual. Cheguei até a parte que de carro poderia chegar. Amarrei os sacos e uma pá em volta do corpo, eu precisaria exercitar a panturrilha, a subida era penosa. Encontrei. Aqui o cenário muda quase que completamente, as botas afundam na lama e as árvores enchem o pulmão de oxigênio. Soltei a carne e a pá. Cavei, cavei e cavei, o suor pingava da testa, mesmo naquele solo a cavação ser amena. Seis ou oito palmos de fundura e bem largo, joguei os sacos. Tampei e despejei lama por cima e alguns galhos para disfarçar. Depois do serviço pronto necessito voltar para casa. Meus pés encontraram-se com um buraco, caí e bati a cabeça. Levantei assustado, ao sair eu via 4
  • 5. que mais para frente havia outro, não sabia o que se passava; ao andar me subiu um arrepio, avistava um terceiro buraco aberto, corri para investigar: após descer um monte de terra deparei-me com vários policiais e tratores. Minha grande dedicação! Os bombeiros haviam descoberto as 177 crianças.Š Cuiabá, sexta-feira, 13 de agosto de 2010 5
  • 6. Uma Anomalia III: Nasce o Psicopata Capítulo I: Infância Amava mesmo era minha mãe, a sua beleza inigualável me encantava, os cabelos louros ondulados transpareciam a luz do sol; e esta quando mergulhava fundo nos olhos, cristalizava a íris azulada, fraquinha. Além da beleza era muito inteligente, fora quem me persuadiu com a leitura quando criança. Como filho único, fui muito amado por ela e pelos criados da casa, estes talvez para agradar sua senhora. Em todo caso quero me lembrar da dedicação que mamãe tinha comigo. Exigia-se o máximo para me agradar de todas as formas imagináveis; de certo fui um pentelho melindroso demais, confesso. A solidão me agredia, e tentava descontá-la em alguns passa-tempos infantis, tal como matar insetos usando a criatividade e aprontar pequeninos desastres dentro de casa, ora na sala com visitas, ou na cozinha quando solitária. Papai era diretor de um hospital, o seu conhecimento é indubitável mesmo para mim, com seis anos. Apesar deste ponto forte que me chamava atenção para ter um espaço junto dele, era extremamente sério e carrancudo. Hoje penso que não sabia separar o os importunos do trabalho com os da vida caseira (se é que tinha uma). Provavelmente o meu melindre de criança se estendeu até agora, não tenho razões para reclamar do meu pai, a sua agressividade e compulsão ritualística de agir não restringia tão diretamente a minha conduta; mamãe me protegia do escuro, dos meus medos que causavam insônia, dos meus primeiros dias de aula e do meu bruto pai. Protegia-me com dentes e unhas afiadas qualquer explosão de intolerância dele, era uma leoa, tinha uma defesa incrível, e talvez seja prazer de todo moleque ver o desgaste que a mãe tem consigo. Eu não era castigado, em casa junto dos empregados eu tinha tudo, o pai não me castigava por mais que fosse da sua vontade, respeitava muitíssimo a minha protetora, e era dela não só a decisão final, como a inicial também. No mais, ainda preciso ressaltar essa estranha necessidade que tinha de me mostrar para meu pai, obter a figura paternal. Se paro para me analisar, todas as atrocidades que uma criança pode fazer eu fazia perto dele. Muitas visitas não gostam de ter os seus docinhos urinados pelos filhos dos seus amigos, e não só uma vez escapei da babá para enturmar com os colegas de papai. O sofá da sala era tremendamente grande, pero aqueles homens adoravam o calor humano, dessa forma sentavam-se uns perto dos outros. Na frente da mesinha chegava com um sorriso de orelha a orelha, os meus dentinhos e minhas janelinhas se mostravam para os visitantes que eram obrigados a sorrir e puxar assunto. E a partir desse momento que adquiri a confiança deles, abaixava a calça e urinava na mesa de aperitivo que comiam com gosto. As explosões do papai eram de assustar, e vendo a cara avermelhada dele, os homens rapidamente o seguravam e pediam calma. Nesta altura já era um diabinho. O medo não me convencia de nada, sempre como protetora teria mamãe, a liberdade me era generosa. Esta técnica que tinha de incomodar as visitas com urina se repetiu algumas vezes, era de um costume de se convidar as pessoas para o jantar, e para meu pai os costumes não são perdidos, não, nunca. Então de forma nenhuma, mesmo com a vergonha das 6
  • 7. minhas atrocidades ele ainda as continuava convidando, como faz desde sempre, assim como o pai dele o fazia. Sendo assim impossível, papai começou a apelar para psicologia infantil: diante das visitas não mais explodia e sim ao contrário, convidava os convidados a rirem do meu pequenino pintinho, tão pequeno que mais parecia uma ervilha balançando. Pequeno demais até para uma criança da minha idade. As crianças devem ter vergonha de algo, é preciso. Não pensem que são completamente desavergonhadas, isto não é possível. Diante dessa gozação do pai o meu sangue fervia, meus olhos se enchiam de lágrimas e saía berrando como não fazia em qualquer outro momento. Não corria para os braços da minha mãe, se ela deixava o pai fazer isso é porque estava de acordo com ele. E verdadeiramente assim parecia estar, a punição era precisa, talvez fosse essa, talvez fosse. Preciso informar que após alguns anos não me parecia ser aquilo uma punição, não dava valor aquilo, e melhor, era único momento que tínhamos juntos. pero voltando, a tirania do meu pai começou, e não só quando eu aprontava alguma coisa, a piada se fazia em qualquer situação. Só bastava três coisas: plateia, papai e eu. No meu aniversário de sete anos mamãe me deu um filhote de pastor belga. Foi um dos presentes que me deixou mais feliz. A festa foi grande, havia muitos doces, muitos. Os enfeites se estendiam por toda a casa, que contava como público meus avós, a babá que a partir de agora não me seria mais útil (pensava meu pai) e a faxineira. Eu já havia mudado de colégio duas vezes, tempo insuficiente para colecionar alguns amigos. A rua era feita de casarões, onde os donos eram velhos solitários. Se havia naquela rua uma criança era muito, e eu desconhecia. Logo a desculpa para a falta de amigos na minha festa é essa; fora que eu gosto de pensar que papai não se dava bem com crianças — apreciava as relações mais maduras, de negócios. E seria um estorvo gastar tempo com amigos, o tempo era direcionado para a escola, os estudos. Fiquei sabendo que a escola em que iriam me meter seria mais rígida que a anterior, nem mamãe conseguia decidir o lugar que eu iria ficar. Neste meio tempo de mudança de colégio fiquei em casa. A babá já não mais me servia. Papai nunca foi homem de passar muito tempo no lar, e embora sempre achasse que papai e mamãe se gostassem muito, estavam brigados. A mãe lecionava numa universidade do centro no período matutino e vespertino. As noites me eram eternas ao lado dela, antes de perceber que os dois tinham voltado a ficarem juntos. Nestas minhas pequenas férias escolares tive de usar a imaginação para exprimir toda energia de miúdo. A rua não me era permitida, então só ia andar de bicicleta anos mais tardes, obviamente, passear com o Belga não se podia. Passei os horrores das manhãs e tardes sozinho, o tempo todo deixava a tevê ligada, gostava daquela falsa companhia. Revelo que como um garoto qualquer, tinha interesse de ser percebido pelo pai, no entanto me era covarde o fato dele só ligar para o trabalho. Como uma criança da minha idade chamaria atenção? Impossível. Mesmo assim tentava, não pensem que essa é a desculpa para o sadismo, niños não têm sadismo, são descobridores ingênuos. O mundo se é novo, e a curiosidade inconsequente seria só uma forma de diversão ingenua e naturalmente infantil. A profissão de médico do papai me despertava para ser como ele, e já queria mostrar a destreza com que fazia uma cirurgia; mesmo sem os instrumentos bonitos 7
  • 8. que a sala de cirurgia ornava. Pero se formos falar de instrumentos de culinária, sim! Aqui tinha os mais belos, a cozinheira descontava a sua condição financeira menos avantajada nos talheres e facas que sempre quisera ter, aqui se podia pelo menos momentaneamente, meus pais tinham dinheiro. Três coleções de facas de todos os tamanhos com lâminas que não se perdiam o fio, fatiava aqueles pedaços grandes de carne como se fossem feitas de gelatina. Facilmente poderíamos imaginar serem aquelas verdadeiros bisturis caseiros. O Belga latia como que sorrindo, ele mal imaginava que a minha curiosidade poria fim nos seus três meses. Acariciei aquele pelo grosso e macio, e assim apertei com vontade a corda no seu pescoço, ele não conseguia latir, a boca aberta era sinal de sufocação, os olhos brilhavam de uma forma convencedora, e invejava ali a sua maneira de persuasão — brilhavam enternecidos pelo líquido que escorria um pouquinho, piscou algumas vezes, o coração agitado deu as últimas palpitações, rendendo-se ao cansaço e as dores da sua curta vida. Desamarrei a corda, com a faca menor abri a ventral do pescoço para ver melhor o osso amassado, como um bom médico, parei por uns segundos para cogitar a forma mais fácil de estudar os seus órgãos; pela região do hipogástrio, a barriga ser desprovida de ossos, assim sendo facilmente aberta comecei a retirar o couro que se iniciava logo acima do pênis, circundar as pernas e as costelas, chegando ao peito a faca parou no esterno; não pensem que pela idade fiz a cirurgia de qualquer jeito, fui delicado no corte, queria ver o orgulho do meu pai quando chegasse. A partir do esterno estiquei o couro já livre e o levantei, se despregando da caixa torácica. Com as duas mãos pus o intestino para fora, junto do fígado que experimentei provar se tinha o mesmo gosto do jantar passado; dei continuidade puxando os pulmões e o pequeno coração que ainda estava quente. Quando me deparei com toda aquela cavidade intestinal e respiratória vazia e limpa, percebi a grandeza do meu trabalho, a dedicação tinha sido satisfatória, e parece que finalmente conheci algo que ocuparia-me como um hobby. E de repente surgiu em mim uma sagacidade que não conhecia: tenho que mudar meus planos em relação a este trabalho e o meu pai. Geralmente nunca me aprova, e se não aprovasse o que fiz com Belga eu não poderia fazer de novo com outro animal. Realmente foi uma satisfação interessante, estava decidido a fazer outras vezes. Após dois dias todos sentiram a falta do Belga que havia sido enterrado em sacolas separadas pelo quintal inteiro, no intuito que se por ventura o jardineiro descobrisse uma das sacolas não saberia reconhecer aquilo. Como é de se esperar, a hipótese mais lógica para o desaparecimento de Belga foi que alguém em algum momento deixou o portão aberto, e este fugiu aproveitando-se do seu tamanho. É um cachorro bastante novo, não saberia voltar para casa. A hipótese do sumiço além do mais não era o mais importante. O mais importante é que agora eu estava sozinho, e até meu pai pensou que eu estivesse triste demais pelo acontecido. Logo, como bons pais, escolheram outro cachorrinho para mim, que após algumas semanas também fugiu. A bizarrice é que eu começava a ter dois cães por mês, e eles sumiam (fruto da minha dissecação obsessiva). Isso despertou duas questões: dever-se-ia trocar o portão 8
  • 9. eletrônico, que os deixava escapar. Segunda: algum dos nossos vizinhos senis e mal humorados poderia ter pegado os cachorros. Qualquer que seja o verdadeiro motivo, o certo é que agora que eu estava acostumado a ter um bicho de estimação não poderia ficar sem um, mesmo que fosse algum animal inferior, como um gato ou um pássaro, eu os amaria. Capítulo II: Juventude No meu segundo grau era reconhecidamente o aluno mais brilhante da escola, que relativamente é bem mais rígida que as outras escolas do centro. Os meus argumentos continham citações claras de quem havia lido os livros originais dos filósofos e sociólogos, desde os mais populares aos meus favoritos marginalizados. A literatura era minha área, que mesmo não participando da aula, os mestres tinham vergonha e entravam na sala frustrados por terem um conhecimento muito menor que o meu, que contava apenas com dezessete anos. Tudo me era simples, e a escola atendia prontamente qualquer exigência que eu singelamente indagasse. Conversar com os doutores da universidade da minha mãe me era prazeroso, e com eles fazia planos de como proporcionar aos mestrandos melhor desempenho. Neste grupo intelectualizado eu traçava ali o meu reconhecimento social, não que me satisfizesse totalmente, não, sempre faltava coisas, quanto mais conteúdo me era facilmente assimilado, sentia-me mais vazio. Neste ano tive a minha primeira relação sexual, consequentemente a minha primeira frustração com o sexo. As mulheres me eram fáceis, meu peitoral se preenchia naturalmente com músculos rígidos, o meu desenvolvimento corporal foi perfeitamente bem realizado pelos hormônios e pela rica alimentação, sobretudo em fibras e cálcio, que mamãe me mimava todos dias. Minha altura baseava-se nos quase um metro e noventa, os cabelos louros desciam até pouco antes dos ombros, os dentes simetricamente alinhados e formatados como que em fôrma de vidro preenchidas com leite. Os olhos azuis sabiam persuadir mais e melhor que todo o resto do corpo, não só as mulheres, pero também exigia dos homens respeito. Fazendo essas observações, se conclui a admiração que causava diante doutros. Minha conversação tinha um toque de alemão e italiano, resolvidamente não é a aparência que me causou frustração no sexo, não é. Aos leitores mais atentos não engano! A minha primeira noite nem sequer chegou acontecer, despido diante da modelo ela fez questão de notar e seguidamente caçoar do meu pequeno pênis, que se muito não chegava aos nove centímetros. Meu sangue ferveu, a vista tremeu pelas lágrimas de sangue, instantaneamente surgiu em mim uma íra terrível como a dos tempos atrás. Sêneca nunca poderia supor! Odiava meu pai, tinha sido o causador do meu fracasso, como poderei me socializar com a desgraça que havia sido descoberta desde criança? A vergonha me acompanhava pela vida adulta, queria me destruir, arruinar quaisquer planos de futuro. Eu tinha o desejo e destino apaziguados em minhas mãos, alguém furtou, criou-se o vazio, a alegria sumiu, deu lugar ao tormento que iria me acompanhar nas vinte e quatro horas por dia, até mesmo em meus sonhos! 9
  • 10. A minha protetora morreu, a traição de meu pai só durou cinco anos, e não foi só por ela que minha mãe faleceu. O cigarro a havia matado, amarelado seus dentes, envelhecido a sua pele jovem e diminuído o volume dos seus cachos. Os pulmões padeceram, não podiam mais fazer o trabalho tão simples que o corpo havia lhe incumbido. Outra vez meu pai estacionou-se diante da minha vida, como uma pedra no caminho, havia tirado de mim os últimos dias felizes com mamãe. Se não fosse pela traição, talvez os oitenta anos a esperassem, e não o fim aos quarenta e dois. A sexualidade dentro dos meus testículos estava se aflorando, enquanto se aflorava a impaciência foi tomando meu juízo. A ansiedade já me impedia de ter o mesmo raciocínio que tinha há pouco tempo atrás. Por um lado me era muito fácil conseguir sexo, e mesmo se não fosse pela aparência, o meu dinheiro resolveria. Por outro lado era inconcebível a idéia do ato sexual, transar com um pênis tão pequeno me poria mais atônito, mais frustrado, eu preservava o meu status acima de tudo. Mesmo sabendo disso sentia uma enorme vontade de sexo, ela foi tomando poder na minha mente, os neurônios não mais trabalhavam paralisando as atividades rotineiras, sistemáticas. Foram sendo substituídas pelas duradouras e numerosas masturbações diárias. E além delas os meus choros imaturos, constantes fantasias sexuais, sejam zoofílicas, afinal animais não se frustram com aparências físicas, dizia Montaigne. Necrófilas, pois a dissecação era um prazer. E as pedófilas, até então nunca praticadas, ponto que desperta a minha curiosidade. pero é perigoso. Alguém inteligente como eu pode desenvolver um plano perfeito que não poria a riscos nenhum. Contudo é algo para se pensar com mais calma, e no meu estado mental não seria aconselhável, pois o desespero por sexo poderia falhar o plano — pensando que faria um plano perfeito — e no entanto não veria os erros mais evidentes, é sem dúvida perigoso. Com este raciocino pus a prova que meu juízo não está assim tão deturpado. pero nem adianta me vangloriar com ele, nesse instante parece que admiti ter de escolher entre uma das três opções. Lógico, eram só suposições, quero ver como os meus planos se formariam a respeito da escolhida. A mais fácil e já conhecida zoofilia, seria a ideal. A senhora Maria, minha vizinha passa o tempo fora de casa, lá uma cachorrinha latia muito. Agora faz silêncio devido a uma cordectomia, por costume antigo não tranca a porta dos fundos, e a casa vive sozinha. Claro, isso não é certeza. Nunca a vi trancando, posso apostar que também aquela fechadura já está enferrujada de tão velha — lembro dela quando era criança. Aquele tipo de fechadura não é aconselhável se coloca-se na porta dos fundos, local onde a chuva toca. Coloquei o plano em prática. Da forma que planejei, a porta dos fundos não era trancada, lá ela prendia a cachorrinha doberman. Passei a tarde com ela, a posição já é sabida. Levei uma faca, não queria que uma da casa sumisse. Dentro do banheiro a abri de ponta a ponta, retirei a cabeça, dividi o maxilar superior do inferior, arranquei as quatro patas, abri o hipogástrio, puxei as tripas e as enrolei numa sacola, fiz a já conhecida limpeza, serrei com faca de pão o manúbrio, organizei todas as partes em sacolas separadas e enterrei perto das árvores do grande quintal. 10
  • 11. Capítulo III: Maturidade Saciado pude retornar ao ritmo habitual. pero agora desenvolvia em mim um plano maior, passava uns tempos aqui em casa uma negrinha filha da empregada. Ela tinha quatro anos, adora me agradar, é de uma alegria tão intensa que uma pessoa sã não poderia resistir em retribuir o sorriso e falar com ela sobre a escola em que aprende a ler e escrever. Quando chega vem correndo me chamando — Jeferson Danilo! Quem a busca é a mãe, o colégio não fica tão longe. Dez minutos, no máximo. A minha ação precisa ser rápida, terei de ir buscá-la na escola logo após a faxineira tê-la deixado. Eu poderia usar a casa da vizinha, alugaria um carro, teria de levar comigo uma pá, corda, uma fita adesiva, um facão para os ossos e um belo jogo de facas. Além de luvas de frio para as digitais e preservativos. Não! Um erro! Tudo isso colocaria numa bolsa e esconderia na casa da vizinha antes. É evidente que seria muito suspeito carregar essas coisas no carro se fosse parado pela polícia. Decidido! Dois dias antes abri com a papelada na loja de veículos, era fácil para mim, em vista do salário do meu pai. Aluguei o carro e estacionei na rua, lá passou o dia inteiro, a rua é tranqüila. No outro dia de manhã quando a faxineira saiu com a Jacqueline dirigi para a escola. No exato momento em que a faxineira deixava o local e vinha embora, desci do carro. Fui em busca de Jacqueline, a paguei pela mão e sugeri — Que tal um passeio? — ela não poderia recusar, nunca me recusaria algo assim, me amava. Simplesmente correspondeu — Aonde nós vamos, Jeferson? — Vamos escolher o seu presente de aniversário, o que mais seria? Eu disse. Então me abriu um sorriso daqueles enormes, apertou bastante a minha mão e foi pulando até o carro vermelho. Dentro do carro lembrei que tinha de passar em casa antes porque havia esquecido o dinheiro, expliquei a Jacqueline. Então os pensamentos foram passando pela cabeça bem suaves, já sentia o ato como se estivesse realizado, deu tudo certo. É impressionante como crianças são fáceis de lhe dar. Parei o carro. — Jacqueline, vamos passar na casa de uma amiga antes, ta? Perguntei. — Ah, por que Jeferson? Não era só pra pegar o dinheiro? Você não vai mais me comprar o presente? Quero voltar pra escola! Jacqueline já começava a chorar... — Claro que vou, sua boba! É aqui mesmo que vou pegar o dinheiro! Não confia em mim? Entrando na casa coloquei a perna na frente dela e a empurrei ao chão, ajoelhei-me em suas costas, abri a fita e passei em sua boca, as mãos amarrei fortemente com a corda. Os pés eu prefiro livres, adoro os chutes e a tentativa inútil de fugir. A levantei pelo cabelo e dei alguns tapas na cara só para provocar. Rapidamente as lágrimas de incompreensão brotaram na face, e a mesma já se encharcava. Depois uns socos na barriga com força moderada, se eu quisesse poderia matá-la só com isso. Ah! Como crianças são divertidas! Aposto que Jacqueline não abrirá a boca para falar do tamanho do meu pênis. Afinal, que tamanho tinha a vagina dela? Mais dois tapas no rosto e a vontade louca de penetrar me possuía, arranquei a calça e logo após a calcinha. 11
  • 12. Estava toda cagada! Provavelmente por causa dos socos na barriga, coitadinha. Joguei-a no piso e ajoelhei em suas pernas, abri meu zíper e botei o preservativo. Ali ela era como um objeto, e nessa minha primeira vez é de assustar como a vagina era apertada! Fiquei por dez minutos tentando entrar, quando finalmente dentro não tirei por nada. Depois de alguns movimentos rápidos o suor me pingava da testa, sentia na glande o útero rasgando, e dela só se ouvia gemidos abafados pela boca fechada. O melhor era o pequenino corpo quente molhado, a maciez da sua pele negra, sentir nos meus quadris aquela bunda tão pequena. Era maravilhoso. Após gozar retirei o preservativo usado. A deixei ali no chão descansar por alguns instantes, o sexo é o maior desejo do ser humano, afinal, teria algo mais humano do que querer realizar uma fantasia sexual? Coloquei outra camisinha, dessa vez quero sodomizá-la, meter naquele apertadíssimo anus delicado e sujo, devido as fezes a entrada foi mais fácil, nessa segunda vez demorei bastante a ejacular, aproveitei para cerrar os dentes na orelhinha como um lobo disputando carne . O sangue escorria da vagina e do bumbum assado, para morrer a golpeei com vários pontapés. Desamarrei, e por um dos bracinhos a arrastei até o chuveiro. Peguei um facão, dividi os membros da maneira que já havia treinado quando criança, depositei os órgãos numa sacola. Cortei um pedaço de bife das cochas e guardei para mim em uma bolsa separada, esta seria o jantar. O resto enterrei em vários lugares do quintal, junto de um saco de cal igualmente distruibuido. O sumiço de Jacqueline perturbou a todos daquela vizinhança tranqüila. A faxineira ficou muito abalada, e meu pai a deu umas semanas de férias. A investigação da polícia tinha sido infrutífera, no colégio de Jacqueline um funcionário disse tê-la visto em um gol vermelho. E um velho franzino chamado George disse que um carro vermelho havia ficado estacionado na rua a noite inteira. Era certo que alguém a havia raptado. Esperou-se resposta do seqüestro, talvez queiram dinheiro do meu pai. O seqüestrador nunca ligou. Não havia notícia alguma do caso. Após o término do segundo grau papai me enviou à capital. A desculpa era a universidade. Penso se teve algo a ver com o seqüestro de Jacqueline, erro em superestimar a sua ingenuidade, os pais sempre sabem de tudo, estranho nunca terem duvidado do desaparecimento de Belga e dos outros, hoje me parece tão evidente. E se soubesse sobre mim esse tempo todo, nenhuma das minhas tentativas de chamar a atenção teve sucesso. Caso descobrissem o assassino, ele estaria arruinado, o seu caráter nunca permitiria esse escândalo. De qualquer forma depois de quatro meses morreu de alguma doença no coração, não quis procurar saber. Eu ainda guardo um rancor, é algo no peito que não saberia explicar em palavras. Sentia sua falta, a vida inteira quis estar junto dele, acho que a personalidade egoísta e autoritária impediram isso, ou mesmo a falta dela. Hoje tenho a sensação de estar mais livre, contudo todos os dias me pego com uma raiva descontrolada, um vazio que quer sempre ser preenchido. Nesses dez meses repito com freqüência um mesmo ritual que parece saciar-se só por ora. Neste momento estou matando a minha nona criança, dentro desse distúrbio mental que tanto me incomoda, acho que inconscientemente estou 12
  • 13. mesmo é tentando matar meu pai. Cuiabá, 9 de outubro de 2010. 13
  • 14. Uma Anomalia IV: Quem Bate à Porta? Capítulo I — Tio, estou vendendo chocolate caseiro, o senhor quer comprar? — Quero sim, adoro chocolate caseiro. Entre aí, que eu vou pegar o dinheiro lá dentro. Está sol aí fora, né? — Tá mesmo, a gente tem que andar nesse sol, cansa... você tem água? — Tenho, entra aí. Cuidado as escadas. Tem água lá na cozinha, vou ao quarto pegar o dinheiro, quanto é que é mesmo? — Três barras por cinco. — Vou pegar. Como é fácil domar crianças. Ela bebia água, gole por gole, o rosto transpirava o sol escaldante, via os dentinhos brancos novinhos através do copo de vidro. A pele clara avermelhada suava, descia uma gota da testa à garganta. Que sofrimento andar por esse sol, coitadinha... — E o dinheiro? — Está aqui. Ela pegou, me passou os bombons e se dirigiu à saída. Apertei o seu nariz, a boca e encostei a palma no mamilo. Lambi o pescoço, fiz alguns chupões, outra mordida na orelha. Adoro esses chocolates... Amarrei braços e pernas na cama, de bruços cortei suas roupas. A bunda dura pelos exercícios souberam malhar meu pênis que dançava no anus apertado. Afiei a lamina o mais que pude, e iniciando na ponta da coluna vertebral fui rasgando a separar o couro fino e melindroso das costas, subindo cada vez mais logo eu via a base ensangüentada desprovida do maior órgão. Já com vinte centímetros de pele meu trabalho ficou mais e mais delicado. Nenhum cirurgião poderia ter tamanha destreza em esfolar as costas de forma tão sublime. Como um pintor que vê seu quadro ganhando vida a cada grunhido de desespero. Nunca estive tão ereto. Ganhando, abrindo espaço e deliciando-me com aquela vermelhidão sem fim. Acima da metade das costas fiquei paralisado por alguns segundos: um movimento pecador e terminava ali a fantasia que até aqui me pus com tanto esforço a conseguir. O pano para minha capa traseira tem de ser sem nenhuma cicatriz ou arranhão; senão teria de achar outra fonte. Da vendedora de bombons, a máscara não me serviria. A máscara já tenho há anos, adquirida de uma jovem mais madura. Subi mais dois centímetros, mais um, mais três, meu corpo tremeu numa vontade louca e irresistível de terminar, arranquei de qualquer jeito, dando fim à minha arte, estiquei o macio pedaço de couro e me masturbei com ele. Um orgasmo que nunca tive! Gozei ali naquele mar de sangue um rio de esperma. Capítulo II 14
  • 15. Uma pizza de queijo era meu jantar. Ouvi palmas novamente. Quem bate à minha porta? Deve ser o carteiro e ninguém mais. Não era o carteiro. Uma senhora de cabelos brancos e muletas, perguntava pela neta de doze anos que passava a tarde vendendo trufas. — Não a vi. Provavelmente está na casa de alguma amiga, não? — Não, senhor! Ela sempre volta antes das cinco. É uma menina disciplinada, não voltaria tarde nem se me avisasse. — Bem, não posso ajudá-la. Fique tranqüila, é uma criança afinal, sempre são malcriadas e desobedecem os adultos. Subi. Da área de cima a via dar seus passos lentos de três pernas. Parou na casa de um vizinho. Não sabia que a observava. Os lábios mexeram. O vizinho apontou para cá. Ela olhou de novo e decidiu voltar. Atravessou a rua. Palmas novamente. É o demônio! Ninguém mais! Desci as escadas, logo se via que o vizinho falava de mim. A senhora disse que o jovem da casa da frente a viu conversar comigo, apenas isso. Descreveu a criança e suplicou por qualquer informação. Eu por outro lado lhe disse que herdei a memória ruim da família. Admiti tê-la visto, pero passara rápido. Nada havia lhe comprado. E me ofereci: — Sou jornalista, talvez possa ajudá-la a procurar pela neta e com os afazeres na polícia. — Ah! Muito obrigada, o senhor doutor é muito gentil! — Entre, vamos ao escritório. Cuidado as escadas. A senhora deve ter andado demais, parece cansada. — Não sou tão jovem, né doutor? Infortúnio. Tive de fazer algo para silenciá-la. — Sente-se à vontade. Aceita café? — Aceito, muito obrigada. — Vamos ao relato. Farei algumas anotações, depois agirei por conta própria, pero a mantendo sempre informada. Pode passar os dados? Primeiro qual o nome da senhora? — Maria Aparecida de Sousa Bezerra. — Se me permite, qual a idade da senhora? — Sessenta e oito anos, doutor. — Casada? — Cinquenta anos de casamento, coisa que não se vê em qualquer lugar. 15
  • 16. — Sim, casamentos duradouros são cada vez mais raros, diga-se de passagem. Continuemos, qual nome do esposo da senhora? — João Antônio Guimarães Bezerra. — Qual a idade do senhor seu marido? — Setenta e dois anos, está velho, está doente. — Que doença ele tem? — Diabetes, vive no médico, pero somos tão pobres, mal temos dinheiro para os remédios. — O governo não os dá? — Não todos, alguns são caros. Tem limite de valor, e há muita falta. A gente tem que pagar muitas vezes, não dá pra esperar. — Seu João é aposentado, do que trabalhava? — Ganhou a vida como taxista. Eu ficava sozinha com Aninha o dia todo. Minha princesinha... (Lágrimas). — Qual a nome da neta da senhora? — Ana Luiza Bezerra. Só tem o sobrenome do pai, meu filho. Eu a chamo de Aninha. O senhor promete que vai me ajudar? Eu não sei o que faço, a polícia não resolve, nunca resolve nada! — Certamente, é para isso que servem os jornalistas. E quantos anos a Ana tem? — Fez doze nesse mês, dia dez. — E a escola, em que série Ana está? — Sétima A. Está naquele colégio do centro, do padre Pedro, da igreja Anjo Novo, sabe? — Qual nome do colégio? — Aquele... espera, deixe-me lembrar. (Dez minutos depois) Santa Rita de Cássia! Essa memória de velha minha... — O que a Ana fazia quando sumiu? — Estava na rua, saiu para vender trufas. — Que horas eram quando saiu? — Duas e meia, mais ou menos. — Que horas ela costuma voltar? — Cinco horas, cinco e dez. — Suponho que é a senhora quem faz as trufas. Para ajudar na renda familiar? — Sim, doutor, a aposentadoria de João é muito pouca, e como eu disse, temos tantos remédios para comprar... Falava de uma maneira a dar pena. — Ana mora apenas com vocês dois? — Sim, senhor. Nós cuidamos dela desde de nascida. — Pode me passar o endereço da residência? — Rua Giovana Nº 3045 Jardim dos Pompos — E os pais de Ana? — Somos apenas nós três, João, Ana, e eu, doutor. — Qual nome dos pais dela? — A mãe não é importante, eu fui a mãe dela. O pai, meu filho se chama Antônio Luís de Sousa Bezerra. pero morreu, quanta saudade, já tem alguns anos... 16
  • 17. Maria parecia ter algum problema em falar da mãe de Ana, enfim: — Antônio morreu de quê? — No trabalho, trabalhava de taxista igual ao pai dele. Foi um acidente horrível! (Enxugou os olhos). — Que idade tinha ele então? — Vinte e oito anos, tão novo! Tão moço! Meu filho! — E a mãe de Ana? Perguntei ajeitando os óculos para olhá-la fixamente. — Não quero falar dela, é muito triste! — Pode contar, é importante. Pode confiar plenamente em mim. — A mãe da Ana se chamava Lourdes Maria da Silva. Teve Ana muito novinha, com treze anos. — Casou-se cedo assim? — Ela não casou não senhor, aconteceu uma desgraça com ela, doze anos atrás foi violentada quando ia pra escola por um marginal que deve estar solto por aí! A polícia nunca resolve nada, eu os odeio! — Pode me contar a história, por favor? Farei o possível para ajudar. Onde a mãe da Ana está? — Vou contar a história pro senhor, doutor jornalista, vou falar a verdade. (Comecei a me intrigar). Ana não é filha do meu filho. O Toninho a adotou depois da morte da mãe. Ela era nossa vizinha. Se matou com dezessete anos, sofreu muito, uma dor que ninguém pode imaginar, agüentou tudo sozinha, coitadinha, Jesus tenha piedade da sua alma. — Entendo. Bem, é só isso, está tarde, então levarei a senhora de carro para casa. — Não precisa, o senhor já ajudou tanto, seu doutor. — Claro que precisa, eu insisto, vamos, não me custa nada. — Muito obrigada, o senhor é um santo, Deus te abençoe. Levantou com dificuldade, apoiando-se na muleta. Dirigiu-se para saída, na porta voltou para trás e perguntou: — Doutor Jeferson, não é? — Sim, sim. — Tenho uma memória péssima, o senhor entende. — Claro. Eu sorri. De costas para mim, passei rapidamente o braço envolta dela, curvei a cabeça para trás e logo vi a garganta flácida ser rasgada por minha faca tremendamente afiada. Tudo aconteceu num susto. O coração pulou do peito duas ou três vezes no máximo, seus olhos fixados em mim estavam incrédulos, e umas lágrimas secas desceram no rosto enrugado. O sangue grosso a espirrar deixava o chão numa poça de lama vermelha. Tratei de pegar uma mini serra elétrica, tão silenciosa quanto útil. Cortei seus membros e dividi-os em dois. Decapitei-a e arranquei seus órgãos, os enfiando numa sacola de lixo. Abri meu freezer horizontal de dois metros de comprimento. O ar lá dentro é gélido e congelará o corpo totalmente em torno de 23 minutos. Joguei todas as partes lá. A cabeça suspendi pelos cabelos, admirei novamente os olhos assustados 17
  • 18. e a coloquei ao lado do rosto da minha recém descoberta filha, Aninha. Capítulo III Dois dias depois: Jantava um bife suculento frito na manteiga com rodelas de cebola, quando atrapalhando-me a refeição ouvi palmas. Quem bate a minha porta? Deve ser o carteiro e ninguém mais. Desci, ao me aproximar cautelosamente até o portão via o semblante de um senhor de idade por volta dos setenta anos, que me interrogou: — Boa noite, estou aqui para saber se o senhor viu uma senhora que passou por esta rua dois dias atrás. — Como é esta senhora? Perguntei curioso. — Ela tem sessenta e oito anos, é minha esposa. Cabelos brancos, baixa, muito bonita, não pode andar sem uma muleta para ajudar. Ela procurava minha neta, que vendia bombons e sumiu no mesmo dia, pela tarde. — Já tentou a polícia? — Já, a polícia é uma porcaria, nunca resolve nada. Disse o velho com violência — Interessante. Eu sou jornalista, talvez eu possa ajudar o senhor, não quer entrar para podermos falar sobre o caso? — Seria de muita ajuda, muito agradecido. — Pode entrar, suba, tenha cuidado com as escadas...Š Lous Rondon. Cuiabá, 25 de novembro de 2010. Uma Anomalia V: Encontro com o Diabo Capítulo I Com a boca aberta aparava na língua o jato de urina quente que ia escorrendo garganta adentro. “Não pare sua putinha! ” Eu puxava o cabelo, e a tremer de gaguejos o medo a fazia mijar mais. Foi quando apertei a barriguinha dela sobre meu joelho, e este comprimindo as tripas e esmigalhando os órgãos, doía, eu sabia que doía, e por isso apertava mais. Apertava até que começou a sair vagarosamente, brotar do cu uma sementinha de cocô. O pequeno anus se abria só um pouco e avermelhavase nas beiradas. Depois de três pedacinhos que mastiguei e engoli com gosto, saiu uma fina torneira de fezes meio duras que caía contínua nos meus dentes, pois não me esperava abrir a boca. Parou de sair, e por mais comprimido que estava o intestino, ela não cagava mais nada. Sabia que era o momento de parar quando uma gota de sangue no meio do cu molhou. A noite chegou, fui levar a janta dela. Para uma menina de nove anos é bem fortinha, 18
  • 19. me agüentou esses três dias, e a cada dia meu apetite fica maior, mal posso esperar pelas gozadas de amanhã. Colégios de criança são um verdadeiro cardápio, difícil acreditar no tão despreocupada está a escola com seus alunos. A maior parte dessas crianças pobres voltam para casa sozinhas, é aí que meu libido desperta, e não posso segurar essa vontade de apoderar-me do mais fácil, do sexo gratuito, o melhor prazer do mundo só para mim e de graça; com direito até a escolha: algumas criolinhas de cabelo encaracolado cobrinho as orelhas; outras de um liso negro italiano. As mais preciosas, loirinhas de pais gaúchos, têm olhos azuis e cabelos de seda louro esbranquiçado. Dessas prefiro, sinto saudades de mamãe. Como eram bonitos os seus olhos, a sua pele, como era tão viva, nova, mamãe. Lancei o chicote que estralou em suas costas fazendo um buraco em carne viva. Não sei se agüentava, nem sei se gostava; a essa altura a vagininha não impedia a entrada quanto mais a saída. Tão feio um anjinho desses estar tão larga. pero eu gostava. Eu gozava. O seu rosto inocente com lágrimas nos olhos, lábios trêmulos de choro e dentes pequeninos ainda de leite. Adoro beijar essa boquinha miúda, e com o seu frágil corpo, bate as mãozinhas nos meus ombros e empurrando minha testa. Nada mais são que carícias. Que força uma menina mal alimentada e cansada teria contra um adulto do meu porte? Minha bonequinha. Essa era especial, com essa eu fazia de tudo, saciava meus desejos e criava fantasias. Com essa eu queria casar. Exagero, talvez. Pressinto o dia que hei de me enfadar; agora ou mais tarde; um dia, o desejo de dissecá-la me tomará conta. A polícia e os jornais deram por seu desaparecimento. Lourdes Maria da Silva, nove anos, desaparecia ainda dentro da escola. Uns advogados queriam processar a escola. E a escola apavorada foi perdendo seus alunos, os pais das outras crianças prendiamse dentro de suas casas, com medo. Uma ou duas buscas pelos próprios moradores dessa cidadezinha aconteceram. Até que noticiou no telejornal da manhã um corpo de uma garota da mesma idade queimada e enterrada num pântano. A polícia cogitou a idéia de ser de Maria. O delegado era incompetente e depois de duas semanas os cidadãos queriam acreditar em algo. Eu acreditava, Mariazinha estava comigo. A consciência geral pode ficar em paz. Era de idéia comum que aquele cadáver não reconhecível, encontrado em outro município era ela. Capítulo II Na decoração de casa o que eu mais gosto é partes de madeira com verniz envelhecido. O assoalho, portas e móveis combinam-se fazendo o andar de cima parecer aconchegante e no modelo alemão século XIX. Na sala uma estante alta, uma tevê com caixa de madeira e uma vitrola contrastam com o computador na escrivaninha. O andar de baixo é todo meu; lá habita a dispensa, uma área de serviço, um quarto onde coleciono e etiqueto gavetas com jornais e revistas; uma bicicleta, mesa e barra de supino reto e outros pesos. Sala de carpintaria, um freezer horizontal longo, uma banheira e um quartinho em que hospedo a minha então visita há três 19
  • 20. anos. Neste quarto uma portinhola na parede adjacente à cama que uso para enfiar comida quando a cara triste de Maria me tem aborrecido. Maria é muito quieta, talvez pela tensão, o medo constante; ouço seus ossos quebradiços estremecerem quando o ouvido roxo acorda com o ranger da porta. Meus dedos em sua garganta. Mirava os olhos eletrizados de desespero. “Vai engolir cada gota do meu gozo. Não desperdice! ” E o tapa estrondava na bochecha, a amolecer os dentes molares. A natureza do semblante angelical era de encantar; o corpo frágil e magro podia ser moldado com as mãos; alguns fios do cabelo escorrido se rebelavam para cima, tocando a facilmente imaginada auréola. Agora com onze anos o seu bumbum ganhava maior proporção; os mamilos já empinavam ainda duros, motivados pela gordura que pouco a pouco ia se formando entre as glândulas mamárias. O seu cheiro mudou, mais sujo e excitante; típico cheiro de adolescente, fazia a minha cueca apertar de longe. O anus também odorizava com mais destaque; sempre o encontrava suado, apertado pelas bandas enrijecidas, que incentivou o cinto de couro a ser cada vez mais rápido e forte. Toda criança é inocente, pero Mariazinha dia a dia se tornava mais indiferente, o que me enfurecia. Parto dessa desculpa para justificar a calmaria do meu libido, e até minha traição. Pouco a pouco me ausentava do quarto, esperava que essas folgas diárias deixassem Maria mais amedrontada. Passou-se a ser raro os nossos encontros, e por causa disso e do trabalho eu a esquecia. A casa ficou mais serena que nunca. O vento entrava pela porta do primeiro andar e ventilava os corredores, seguindo caminho para o banheiro que tinha sua própria janela bem iluminada; a sala arejada carrega perfume das rosas do jardim, trazidos por essa corrente de ar. Um ambiente muito tranqüilo, capaz de apaziguar os corações de homens da terceira idade que hoje se sentem inúteis por não terem feito nada na vida. Sentado na poltrona de pena vez em quando me pego pensando no meu pai. Teria morrido nessa paz com que aqui estou? O coração teria descansado da vida ateia e responsável que levara? Num suspiro caio na realidade que sou filho de peixe. Com os mesmos defeitos, mesmas lamurias, e os mesmos pressentimentos quanto à morte e amigos. Na rotina os rituais que sempre tentam suprir mentirosamente essa necessidade de companhia. No segundo suspiro sou acordado de um cochilo por um choro manhoso e muito fraco que foi brevemente marcado na minha memória. Devia ser um sonho. Acolhi-me para cama, arrastando meus músculos pesados de sono. Capítulo III Acordei com o sol transluzindo pela janela de vidro. O forro tinha um bom cheiro, parecia confortável e me chamava para ter com ele mais dez ou quinze minutos. No entanto não quis, levantei para beber café e lavar o rosto. Senti-me preenchido, a noite me foi satisfatória, e notavelmente dormi tranquilamente. Fora o choro infantil que ecoava em meus sonhos duas ou três vezes na noite, com intervalos de duas horas. Esqueci disso com um pedaço de pão com geléia, que mastiguei bem antes de engolir. 20
  • 21. Mãos lavadas li o jornal do dia, fiz umas anotações e fui ver as flores. Enquanto as podava, mexia na terra e fazia enxerto duma planta para outra, pus João Gilberto para tocar nas cordas de náilon acordes em ritmo de bossa nova. Saí, fui ter na empresa os compromissos do trabalho cotidiano. Outra noite comum as outras, não suava, o clima gelado da região me fazia ter sonos tranqüilos e completos. Apesar disso venho tendo já há dois meses pesadelos muito estranhos que me arrepiam a pele. Ando por um corredor escuro, apesar de fazer sol; caminhei muito por um corredor curto que parecia nunca acabar; finalmente chegando a quina de uma porta americana, entro e me deparo com mamãe, rindo, com uma sacola de laranjas e chupando. Sentada se nota o barrigão que ela detém. Ao lado dela numa posição que nunca vi, papai também come as laranjas. Conversam, riem. São muito moços, devaneio que se casaram a pouco tempo; Falam de algo, discutem um nome. Entre eles está João, Danilo, José, Lucas e Jeferson. Apontam os benefícios e o lado ruim de todos eles. Apesar de dizerem em bom som, não entendo nada, parecem estar cochichando, alto o bastante para pensar que o fazem perto do meu ouvido. Observo tudo aquilo paralisado; nunca senti tamanho medo antes. Escuto um latido do lado de fora. Deixo a cena e encaro na janela da cozinha um grande quintal, que apesar de bem iluminado deixa a vista escurecida. Um grande cachorro negro late. Ele me fita, os olhos penetrantes, sérios, lindos, deixa-me com pavor. Pavor que sobe dos pés para a cabeça. Os latidos são íntimos e parecem querer expulsar um intruso ao mesmo tempo em que dá boas vindas. Tudo acaba quando viro para trás de repente, olho minha mãe e escuto um choro. Neste dia trabalhei a manhã inteira, voltei e pela portinhola dei comida para Mariazinha, sem ver a sua cara. Subi, almocei vendo o telejornal. Após o almoço tomei um gole de café para me animar na tarde que iria passar na redação. As cobranças e os parabéns são sempre os mesmos, tanto que me cansam. Gastei as vistas digitando no computador; tive contato com notícias novas, algumas animadoras, no entanto a maioria de pequenas tragédias da capital, já que em cidade do interior pouco ocorre. Trabalhei por mais tempo, algo como hora extra, se isso existisse no jornal. Saí do trabalho exausto da mesmice, e fui para academia descontar nos braços a frustração de rotina. Exauri o oxigênio entre as fibras musculares todas as angustias de um trabalho chato. Poderia arrumar um melhor, pero é só nesta cidade que vou ter tanta liberdade para suprir os meus prazeres distintos. Voltei para casa não me agüentando em pé. Ao chegar preparei uma comida rápida. Um bife largo frito e coberto com queijo mussarela e orégano. Acompanhei com vinho e mirei o jornal noturno. Fadigado, olhos piscando, fui para o quarto. Dormi. Muitas luzes circulavam ao meu redor, num local escuro fui reconhecendo o corredor. Estava na casa dos meus pais. Na casa da minha infância. Havia quadros nas paredes pintadas de pêssego claro. Quis parar para prestar atenção em cada um deles, pero meus pés foram se movendo por mais que os impedisse, não, eu não os impedia. Vagarosamente o corredor foi se tornando estreito, e caminhava com passos curtos a 21
  • 22. estrada longínqua. O fim parecia distante, entretanto eu tinha tempo. Talvez fossem meus olhos ainda piscando, pero o caminho às vezes tomava outra direção. Ao olhar para cima o teto de madeira se desprendia das colunas de apoio, entortando-se para cima da minha cabeça, e o corredor então era um terror de claustrofobia. Descobri-me claustrofóbico. Lutei para chegar ao fim, finalmente chegando à quina da porta recuei um passo, tal como um bicho desconfiado. Tomei coragem, me debrucei sobre a quina, colocando o rosto para dentro: lá estava como já sabido minha mãe sentada no chão chupando laranjas. Ela me fitou, e ao abrir a boca um choro agudo e tão real me despertou! Acordei suado, esbugalhei os olhos pelo quarto tentando achar algo. O lençol molhado e quando pensei que estava tudo bem ouvi mais uma vez um choro breve que arrepiou o meu corpo inteiro. Saí do quarto e o choro voltou, dessa vez mil vezes mais alto, vinha do andar de baixo. Corri a tropeçar nos tapetes a escada abaixo. E o choro mais uma vez soou através da porta do quartinho. Um arrepio mais intenso bambeou minhas pernas, pulei para junto da maçaneta, girei a chave lá presa o mais rápido que pude, e não acreditei quando vi a mais horripilante cena da minha vida: o choro vinha dos braços de Maria, na escuridão da cabeceira da cama Maria amamentava o filho do diabo! Cuiabá, 25 de dezembro de 2010. 22
  • 23. Uma Anomalia VI: Verdades Reveladas Capítulo I Não era atoa que eu era o melhor escritor do Tradicional de Canguçu. Os elogios são sempre tão rotineiros a ponto de ser tornarem enfadonhos, contudo entre os que o meu serviço fazia eu não era o que melhor recebia. A disputa com a filha do patrão é mesmo injusta, pero muita bola não dava, tinha o que queria. Certa manhã um jornalista veio da capital para se juntar à redação, eu tomava café e rabiscava uma folha ou outra, “esta pode, esta tem de ser refeita.” Levantei-me da cadeira quando José Klein Hoff foi apresentado a nós. Bem vestido, de rosto sujo por uma barba rasteira e castanha, cumprimentou a todos com aperto de mão e um sorriso excentricamente sarcástico, chegando até mim com as mãos suadas com o sebo de todos: “espero que possamos ser exigentes uns com os outros, falaram-me das suas grandes qualidades. ” Reparei a pequena mancha de obturação no dente molar quando os pés parados inclinaram o corpo dele para junto do meu. Todos devidamente sentados, admirei nesta manhã mais um enfeite naquela grande sala: segui continuamente com os olhos todos os gestos do novo trabalhador, a maneira de andar forte e o jeito sério de encarar o papel em branco, parecia competente, competente o bastante para ter feitos a ser comparados com os meus. O editor nos pediu um pequeno trecho do editorial, ambos tínhamos de fazer, publicado seria só um. Rabisquei qualquer coisa e fui para casa. Peguei na adega uma garrafa e botei na geladeira. Preparei a frigideira para o alho, pus o macarrão na água e arredondei as almôndegas. Bati no liquidificador os tomates e adicionei sal. Dentro de meia hora me servi num prato grande de porcelana, derramei o vinho gelado no copo e desci garganta adentro. Estou cheio. O sol nasceu entre as nuvens extremamente brancas moldadas pelo vento. Entre elas alguns pássaros passavam juntos passo a passo sem perder o compasso. Outros inspirados pelo cheiro das flores recitavam poesia em assobios afinadíssimos. O barulho dos carros dava início ao dia. Não presenciei nada disso, estava no banheiro tomando a ducha. Bebi café e encontrei no editorial um dos meus rabiscos, já era esperado, na verdade confesso ter sentido uma leve tensão a respeito. Cheguei ao trabalho. Assentei-me na frente do computador e espreguicei. José rapidamente se apoiou na minha mesa: “o seu editorial está mal escrito, repete assuntos velhos e só eu percebi isso, é de se esperar de um jornalismo do interior. ” Levantou o cinto e foi para sua própria mesa. Que injúria. Senti os músculos do rosto ficando mais rígidos, minha vista mais centrada, e os incisivos de cima roçando nos de baixo. Até hoje nunca havia me ocorrido tão fortemente a idéia de vingança. Capítulo II 23
  • 24. Via tevê quando percebi ter tomado a primeira garrafa de vinho tinto. A cabeça estava cada vez mais quente, e recorri às lembranças da única pessoa que amei na vida, de olhos claros e cabelo louro cacheado: mamãe, como era lindo o seu sorriso, mesmo amarelado pelo cigarro tinha um charme de fotografia antiga. Desde pequeno mamãe foi muito afetuosa, dando-me todas as atenções possíveis e ao contrário do esperado o seu mimo não diminuiu com o tempo; o amor era como um vício; eu sensível ao carinho de todos os dias mal podia suportar a sua ausência na faculdade. Lembro-me como se tivesse vivido para lembrar os momentos de criança. Mamãe banhava-se comigo, e sempre após depilar-se exibia uma insinuada massagem pelo corpo. Com o correr do tempo os acontecimentos foram me tornando significativos e não mais passivos como foram; posso me lembrar de maiores detalhes da nossa convivência. Mamãe me amava de um jeito que passei a achar muito singular, vendo a mãe dos outros meninos; louca por mim os carinhos apesar de serem comuns me faziam no fundo pensar serem doentios. Chegando a adolescência intensificaram: ela deixava a porta do quarto entreaberta, para de noite escondido na quina da porta eu espreitá-la transar com papai. E os seus gemidos eram com certeza algo para se notar devido a altura. A voz aguda se mostrava, eu pensava: não para agradar ao meu pai, muito menos por necessidade física; pero para mim. E ali tirava da calça o meu pintinho que excitava até ejacular. Meses atrás sozinhos, ela me ensinou a masturbação de meninos, fazendo movimentos leves e macios no meu pequenino pênis diariamente; também a masturbação feminina, ao tocar-se na minha frente, desvendando-me todos os segredos de uma mulher e como elas gostam. Ainda me oferecia o peito para mamar e pude penetrar pela primeira vez a vagina quente e molhada da minha amada professora. Falou-me do beijo e das posições no Kama Sutra. Ainda novo pude perceber que as damas tentam alcançar a igualdade apelando pelo sexo, pensei: quanta ingenuidade. Certa tarde despertei de um sonho erótico com mamãe chupando loucamente meu pênis; levantei e ela beijou minha boca. Suspendeu os braços tirou a camisa e colocou o mamilo rosado entre os meus dentes — me mandou morder — mordi. Sentada em mim, abriu meu zíper, achou-me duro, afastando a calcinha para o lado tratou de encaixar entre as pernas molhadas o pau que ainda continuava crescendo dentro dela. O líquido escorria em mim me encharcando, o seu rosto vermelho “mãe, vou gozar! ” eu disse, e ela me exigia: “morda mais forte! ”. Eu gozei, ela ainda excitada rebolava no pênis, sugando todo o gozo para o útero. Os anos foram passando, mamãe era minha amante e eu o amante dela. Meu pai a traía, ela não ligava. Por meses ficaram brigados o que me foi muito agradável, pude ouvir uma das discussões, “você é doente, Maria, ele é nosso filho! ” Quando voltaram a se entender me senti desapontado; apesar de me ter unicamente para ela, e sempre que queria, ainda continuava com meu pai, eu a dividia. Essa situação realmente me 24
  • 25. aborrecia, atrapalhava os estudos e dava dor de cabeça. Senti raiva dela, pero sempre ao se aproximar encantava, o nosso amor fazia surgir a esperança de um dia ela ser só minha. Capítulo III Terminado a terceira garrafa o álcool tinha me deixado aéreo, a ira possuía minha paciência. Não hei de gastar meu tempo preocupando-me com problemas, tratei de seguir Sêneca, o problema deveria ser resolvido hoje. Fui à cozinha e apanhei uma faca de mesa com ponta, desci as escadas e no quarto de carpintaria abri uma gaveta e dentro dela num fundo falso meu revolver Alphonsus 38 prata. Abri a garagem, peguei o carro e girei a chave. Pela janela aberta o vento me batia no rosto, liguei o rádio, eram duas da manhã e as luzes vermelhas dos postes deixava tonto. Apesar das avenidas mal iluminadas, as rodas sabiam bem em que lugar passar, evitando buracos. O volante a virar, meus olhos piscavam — o sono era o equilíbrio, acalmando a raiva. Desliguei os faróis e estacionei de vagar em frente à casa de José, desci e observei toda a rua: vazia, vazia e escura, os habitantes dormiam cedo, é costume ir trabalhar ao amanhecer. Decidi entrar, pero antes voltei e urinei na árvore da frente — minha bexiga doía. Pulei o muro e espiei a janela da sala: a luz estava ligada e aparentemente não havia ninguém. Por outra janela chequei o quarto: escuro e muito quieto. Quem deixaria a luz da sala ligada numa vizinhança tão calma quanto esta? Pensei comigo... é provável que é alguém que chegará em casa tarde da noite, vai abrir a porta, não quer tropeçar nos móveis e acomodar-se silenciosamente como se não tivesse sequer saído. Peguei um grampo de cabelo, quebrei e acionei a mola da fechadura, com a faca de ponta fiquei tentando por alguns minutos abrir a porta. Trabalho difícil. Consegui. Encostei-a atrás de mim e segui na sala com passos de gato. Visitei o quarto único: não havia ninguém na cama, eu estava certo, o casal saiu. “Maldito filho da puta José do caralho!”, me fez perder tempo vindo até aqui. Estava para ir embora quando lembrei da luz ligada: para que iriam entrar sem fazer barulho se não houvesse ninguém dentro da casa? Voltei ao quarto. Ascendi a lâmpada. Consegui ver o que no escuro não poderia: meus olhos se encheram de graça, ao lado da cama um berço estreito e baixo: o filho do casal de dois anos descansava em sono profundo. José pode esperar, não vim aqui para fazer nada. Com a mão esquerda tampei a boca da criança, a erguendo pelo rosto, como uma cobra a apertei sobre meu corpo, e assim com a mão direita podia fechar a porta e até dirigir. Saí de lá rapidamente e dei partida no motor, segui na estrada deserta com faróis apagados. O menino ficava pulando, pero facilmente conseguia controlá-lo, até sufocá-lo se eu quisesse. Chegando em casa entrei na garagem pelo portão eletrônico. Ainda o segurando com a mão esquerda peguei uma fita adesiva e tampei sua boca, rodeando a cabeça inteira. Sei muito bem a intensidade do grito de um pirralho. Joguei-o no chão e dei um chute forte que o fez voar na parede. Puxei pelo cabelo, agarrei pelo pescoço e arranquei a sua roupa com violência, rasgando-a nele. Levantei-o mais alto que minha cabeça e mordi o seu pinto, junto dos testículos miúdos. Apertei com força e o 25
  • 26. sangue escorreu no meu queixo, mais força fiz e consegui dilacerar a genitália que estando só na minha boca cuspi ao chão. A vermelhidão tomava conta de suas pernas e barriga. Virei-o de costas, e aproveitando o sangue como lubrificante meti na sua bunda por mais ou menos vinte minutos; deixei cair o corpo desfalecido. Busquei a mini serra elétrica e decidi, excitado, a cortar o bracinho. Fora do seu corpo empurrei o pedaço de antebraço no anus dele; a entrada inicialmente era impossível; pero que força é isso para um bíceps acostumado com cem quilos? foi evidente que consegui colocar dentro do reto aquele braço, e os dedinhos das mãos enfeitava o bumbum tal como um rabo de coelho felpudo. Capítulo IV Com dezessete anos já havia tentado um namoro que terminou em frustração. E minha relação com mamãe estava à beira de um desastre. Não podia suportar a existência do meu pai; atualmente estão brigados novamente. Desta vez por causa das traições de papai, ele não escondia. Mamãe era linda e muito dedicada, ele não sabia realmente aproveitar a preciosidade que tinha em mãos. Era uma tremenda ingratidão a dele e passei a sentir raiva do sinismo maior dela. Uma raiva que lembrava a cada instante, e que os carinhos não mais abafavam. Explosões de inconsciência e planos impossíveis, inconcebíveis. Dementes, que fugiriam até da minha própria vontade. Contudo a verdade é que há três meses viver me está sendo impossível por causa dessa impaciência. Gostaria de estar dedicando todo o tempo a mim, e não em preocupação com problemas. Estressado ao máximo. Fazem dois dias que papai não vem para casa, o que achei perfeito; mamãe finge não ligar, pero está magoada. O dia amanheceu chuvoso, decidimos não sair de casa. Rapidamente escureceu por causa das nuvens carregadas, e ofereci a ela “que tal uma sopa com muitos grãos? ” É de se combinar com o tempo; estávamos agasalhados. Modesta parte, sou muito bom na cozinha e uma sopa quente seria bem vinda. Ela não pôde recusar. As seis horas estávamos com sono e famintos; a pimenta do reino já temperava, o macarrão ficava macio, a lentilha e a batata doce estavam quase no ponto. Servi a sopa em pratos fundos, tomamos tanto que mal podíamos levantar de tão pesados, e por isso ficamos à mesa conversando. Por volta das oito mamãe se sentiu mal, inesperadamente regurgitando um líquido muito preto. Seu rosto empalideceu e ameaçou desmaiar, pero somente escorregou ao chão, começando a sentir falta de ar. Tentou levantar por duas vezes, conseguindo na segunda, sentei-a na cadeira onde o mal estar se estendeu por mais uma hora. Voltou de novo a falta de ar, do rosto lívido brotou manchas amareladas, os olhos caídos e vermelhos ressaltavam uma forte anemia. Suou bastante, um suor pegajoso e gelado. Toquei as suas mãos e estavam ásperas, com as palmas descamadas e unhas se entortando para fora. Neste momento deu quatro tossidas altas, seguida do mesmo vomito negro e grosso que não parou mais; a grande poça que foi se formando podia contar com pequenas bolas de pus verde e gelatinoso junto com um sangue rosado. Quando parou de vomitar, caindo sobre a poça. Teve ataques epilépticos como se estivesse exprimindo o restante de energia que tinha no 26
  • 27. corpo; um barulho longo de peido se ouviu, logo um fedor de merda. A roupa se sujou toda, mamãe ficou estrábica, e fez grunhidos, numa tentativa de comunicação. "Se tu não for só minha, não será de mais ninguém!", esclamei. E ela em um último esforço grunhiu algo decifrável: "do que tá falando!?" Levantei sua cabeça nos meus braços e os cabelos soltaram facilmente do couro cabeludo, deixando uma grande área calva e tomada de sangue. Parou de respirar, coloquei a mão em seu peito e o coração já não dava sinal de vida. O corpo estava frio como gelo e a pele branca como de um fantasma. Uma pessoa que horas atrás sorria, agora parece estar morta há vários dias. Do que restava de mamãe era só o amor que por ela ainda sentia. Despi-a, igualmente tirei minha roupa; ela estava com alguns quilos a menos e suas partes íntimas lambrecadas de fezes. Peguei no meu pênis, debrucei sobre ela e meti em sua vagina; não estava nada molhada; ao contrário: sentia esfregar o pau em dois bifes congelados. Pero só por ser a vagina de mamãe ficava excitadíssimo! Comecei a meter com mais força e rapidamente, gemia e o meu gemido ecoava na cozinha vazia. Transava com ela em cima do piso. Nunca senti tamanho tesão e mal podia esperar pelas próximas gozadas! Eu te amo mãe! pero algo repentinamente me deu um susto que tirou todo o fôlego, meu coração pulou e desacreditei: sorrateiramente papai havia entrado na cozinha e presenciado toda cena funesta: “Jeferson! Jeferson! Está a estuprar tua mãe morta! ” Š Cuiabá, 12 de Fevereiro de 2011 27
  • 28. Uma Anomalia VII: O Mal é Humano Capítulo I Há um mês me pus numa chateação que me renderá futuramente bom proveito, se tudo sair como penso. Às vezes me perturba ter uma certeza tão prepotente, queria mesmo é correr mais perigo. Anseio por isso. A certeza em muitas ocasiões, caso não fosse o meu ego altivo, seria-me penosa. Graças a mim, não peno. Nada sai fora de ordem, a terça sucede a segunda com equilíbrio, embora meus pensamentos, à nível moral, possam ser considerados desequilibrados, mesmo virtuosos, calculistas e totalmente consequentes. Se o leitor não tem a capacidade de me compreender, seguirei o texto, que por si dará um excelente exemplo do que estou a falar. Manoela é uma moça de trinta anos, grandes olhos castanhos, cabelo negro italiano e rosto ovalado. O bumbum é volumoso e macio, algumas sardas ao lado do fino nariz e abaixo uns lábios hidratados e rubros, desenhados como que à mão. Mulher correta e moralista, esforçada e sentimental. Quando nos víamos apenas na redação sempre cumprimentava-me sobre meu trabalho, agora com quarenta dias de namoro não consegue esconder a necessidade que tem do meu apoio, minha atenção. Em partes me correspondo com ela; o pai separado não devia ter tempo com o que viria ser o maior jornal da cidade, no qual trabalho. Com isso deve ter amadurecido rapidamente, criando responsabilidades ainda na infância. Responsabilidades um tanto injustas, pois são oferecidas para conquistar o amor do pai. Não muito diferente cresci, numa casa de doutores eu tinha de ser o melhor, dedicação que só valeu a pena para conseguir alguns lazeres hoje em dia. — Por que faz essa cara? Às vezes tu é tão sério, pero é tão carinhoso, nem parece a mesma pessoa. — Ah! Tu não sabe quando eu to pensando? Só to pensando. — Pensando em quê? — Em nada, já devia me conhecer. Tá falando de mim, pero nem sabe que sou assim mesmo... — Para de ser chato. Quero comer macarrão. Tem manga para suco na geladeira? — Tem, pero tu quer comer macarrão de novo? — É mais rápido, hoje vou dormir em casa, finalmente. — Tu sabe que vou te convencer a ficar. O luar iluminava toda praça de árvores baixas e cadeiras de cimento, o círculo em volta da lua indicava uma chuva fraca no meio da noite. O ar estava muito bom, revigorante. Respirei fundo, e enquanto caminhava abraçado com Manoela podia olhar as muitas estrelas que se alastravam lado a lado, nas laterais lisas da tão pequena abóboda 28
  • 29. celeste que nos cobria neste dia. Convidei Manoela a olhar quando o vento soprou o perfume das flores que escolhem a noite para desabrocharem. José Hoff tirou alguns dias de folga depois do desaparecimento de seu filho que botou a polícia da cidade a procurar com esmero. Então pôde perceber a incapacidade do delegado em resolver casos nesta cidade antes pacata. Durante dois meses as pessoas ficaram assustadas e começaram a trancar as portas de casa. José não me importava, ele iria mesmo acabar voltando para a capital: não estava contente com o Tradicional de Canguçu e seu casamento estava indo mal; a mulher histérica ainda chorava, talvez se culpasse por ter deixado a criança sozinha. Capítulo II A fumaça saía da panela, logo botei o macarrão que sem se defender afundou. Manoela e eu comemos, comemos muito. Pensamos que o que encheu foi o suco de manga rosa com gelo e limão, quando na verdade pode até ser mais simples admitir a gula. Assentado ainda à mesa li algumas páginas de poesia, experimentei alguns versos tristes de Ricardo Reis logo após a janta, será que seria digestivo? Manoela se levantou da cadeira que arranhou o assoalho fazendo um barulho irritante, desastrada. “Já sobre a fronte vã se me acinzenta” Escutei Manoela urinar vagarosamente, a porta do banheiro estava aberta. Isso me distraiu, pero continuei. “O cabelo do jovem que perdi. Meus olhos brilham menos. Já não tem jus a beijos minha boca.” Por mais vagaroso que ia, a urina continuava a bater na água, sinceramente aquilo não me deixava ter um bom fluxo de raciocínio, no entanto prossegui pois só sobrara dois versos que continuei lendo com calma, queria que Manoela parasse antes de eu terminar, para que enfim possa eu escutar minha voz como único som a ornar o silêncio. “Se me ainda amas, por amor não ames: Traíras-me comigo.” Na sexta sílaba o som da urina parou. Manoela se secou e suspendeu a calcinha com a calça, tudo velozmente, tão breve quanto a última sílaba tônica de Pessoa. Fechei o livro e a surpreendi ainda no banheiro, penteando o cabelo escorrido. Abracei-a por trás e a fiz sentir o calor dos nossos corpos, como se estivesse dizendo “Manoela não vá, está frio lá fora e veja o quanto está quente aqui dentro. ” Não sei se a convenci, pero tirei o pente da pequena mão e deixei sobre a pia, a fiz andar até o quarto, onde virou29
  • 30. se para mim e me beijou. Toquei em seu queixo para enquadrar o belo rosto liso e macio, desci a mão até a barriga e subi até as costas, retirando a camisa. Manoela levantou os braços, joguei a camisa na cama e ela tremeu de frio. Desabotoei a calça e retirei o sutiã branco curto. Encobri os seios e o indicador sozinho se movimentou provocando o mamilo que ia endurecendo. Ela cruzou os braços no meu pescoço se segurando, retirei a calça e a calcinha rendada, finalmente ela se abaixou, abriu meu zíper e pôs dentro da boca meu pau que pulsava mais e mais. Ali naquela posição se sentia confortável, tanto que chupou por muito tempo, tive uma estranha sensação de fraqueza. Deitei na cama e meu corpo afundou pesado: Manoela subiu em mim tampando com o cabelo minha visão da pouca luz da sala que entrava no quarto escuro: senti-me mais pesado e a comida já estava me causando enjoo: pero dei continuidade: ela se arrastou estacionando com a vagina no meu rosto: olhei seus olhos e brilhavam: lambi o miudinho clitóris quase invisível: ela rebola botando peso nos meus dentes incisivos: ejaculei e o esperma começou a escorrer do pênis ao escroto: ao ver a mão molhada com muito tesão sentou no pau até o fundo e a cada vez que fazia isso as ripas da cama rangiam: liguei a luz e a encostei com as mãos na parede: a cintura fina acentuava a bunda grande que pela grossura das cochas fazia o corpo com seios pequenos e longo cabelo serem uma combinação irresistivelmente atraente. — Bom dia amor, vamos chegar atrasados, acorda amor. Acordei Manoela aos beijos. Ela estava cansada, com pouca força na voz e olheiras. — Que horas são? Daqui a pouco eu levanto. Deixei-a lá para fazer o café e ler o jornal da manhã. O brilho do sol apenas confirmava o horário do relógio na parede da cozinha, estávamos realmente atrasados. Mirei a manchete principal do Tradicional quando escutei o som de Manoela urinando com a porta aberta logo após entrando no boxe. Ela por alguma razão vestiu a roupa rapidamente, notei que estava mais desastrada que de costume, me beijou, não tomou café e saiu. Decidi chegar ao trabalho duas ou três horas mais tarde, então depois de ler o jornal desci para regar as flores do jardim. Pelo portão olhei a rua, vazia como de costume, a não ser por um carro cinza prata no final da rua, que ali ficou estacionado durante o tempo que fiquei cuidando das plantas. Subi para tomar banho e me arrumar. Capítulo III Arrumei a camisa por dentro da calça e apertei o cinto, olhei pela janela e o carro tinha partido. Voltei ao quarto e caí no chão por uma forte batida que me gerou uma dor instantânea atrás da cabeça, a vista piscou e foi escurecendo, pero pude entender antes de relutantemente perder a consciência em que situação me encontrava: José Hoff me apontava uma espingarda, e se meus ouvidos não me enganaram, balbuciou algo como: — Te peguei, seu monstro! 30
  • 31. Acordei com cheiro forte de álcool e arnica por causa de dois algodões molhados pela mistura que foram enfiados para dentro de minhas narinas, por causa disso tive de respirar pela boca para tentar inibir o cheiro terrível que afetava minha consciência e meus pulmões. Uma casa com paredes úmidas e teto sem forro, mobiliada bucolicamente me hospedava no momento. Eu amarrado com os braços para trás numa cadeira tinha ânsia de vômito e a dor mortal na minha cabeça fazia-me desejar estar morto. A camisa estava banhada de sangue e faltando alguns botões. Depois de uma hora nessa agoniante posição finalmente José apareceu na minha frente empunhando a mesma espingarda que acredito ter causado o meu ferimento. — José, o que tu está fazendo? Perguntei. Ele de olhos regalados, e aparentando uma paciência demente, começou a contar: — Tu quer saber como cheguei a isso? Vou te contar. Pelo que vi tu tem muita razão para ter tanta confiança, comportar-se com arrogância e ser sínico mesmo nas horas em que o teu mal está evidente. Não descreio da tua arrogância, nem subestimou a ingenuidade das pessoas dessa cidade. Para chegar onde chegou, é óbvio que com um jornalismo mal feito e uma polícia vagabunda que não sabe tratar de surpresas quando acontece algo nesta cidade de interior miserável, os teus feitos diabólicos sairão triunfantes. Poderia subestimar qualquer pessoa, até a tua namorada, filha do chefe. pero cometeu um erro que vai dar fim a toda monstruosidade que fez, quando ousou tirar de mim a única coisa que me mantinha contente nesta cidade “sem violência”, a vida do meu filho. Ele era toda a graça da minha vida, eu não poderia deixar um delegado analfabeto cuidar disso. Coloquei em prática toda minha competência e meus anos de jornalista. Capítulo IV O teu nome, Jeferson Dietrich me ocorreu um dia após eu chegar em casa e ver que meu filho havia sumido. Depois de avisar a polícia e desesperar-me junto da minha esposa que hoje separada, e me culpando pelo acontecido, lembrei, para minha alegria, que havia uma babá eletrônica instalada no berço, para que me avisasse do choro do menino, e que se fosse a ocasião de eu não estar em casa, gravado ficaria tudo ao menor som perto do berço apercebido. Entrei em meu escritório, peguei um gravador e coloquei a fita para tocar, tudo ocorria normalmente, como esperado, pero o choro do meu filho começou fraco e foi ficando muito forte, eu estremeci e ameacei desmaiar, houve outro som, palavras, duas palavras foram introduzidas na gravação, um arrepio me subiu, as duas únicas palavras ditas pela pessoa que o sequestrou, no momento me indicaram ser a tua amaldiçoada voz. Elas diziam: “silêncio, moleque! ” Por dois dias eu não acreditei, pero meus neurônios e meu instinto investigativo tiraram meu sono e minha fome, me deixando neurótico. Minha neurose foi dia a dia ficando mais forte, e decidi, para a minha saúde mental, investigá-lo. Primeiramente para 31
  • 32. comprovar uma inquietante intuição planejei ir a tua casa a fim de encontrar algo que confirme pelo menos a tua má índole. Na manhã enquanto tu estava na redação chamei um chaveiro de outro bairro para me abrir três fechaduras. Disse a ele ser minha casa, e que as chaves havia esquecido. O rapaz abriu o portão, subiu a escada e abriu a porta – que deu entrada para tua sala de estar. Logo pude perceber que o acesso ao andar térreo estava trancado, o que excitou a minha curiosidade pela estranha situação. Aberto, ao primeiro passo que dei escada abaixo, minha pressão ficou mais fraca, e meu coração palpitou lentamente batidas intensas. O visual do andar térreo era totalmente diferente do primeiro, o ar pesava e pouco a pouco era envolvido numa atmosfera malignamente infernal, que ao perceber, virei para o chaveiro e disse “pode me esperar lá fora? Pegarei alguns documentos e dentro de cinco minutos no máximo, pedirei a tua ajuda para fechar novamente as fechaduras, pois tenho de sair”. Respirava com dificuldade, a minha ansiedade enfraquecia meus movimentos. A sala então se dividia em quatro partes importantes: à minha frente uma máquina de musculação com muitos pesos pesadíssimos. Liguei a luz e a lâmpada incandescente fornecia uma iluminação avermelhada e curta. Ao lado direito havia dois quartos com chave pendurada na fechadura, fui entrar no primeiro, ao chegar a porta me bateu um medo arrepiante, como se sentisse uma presença de outro mundo. Com muito medo consegui com os braços trêmulos abrir a porta. O que vi foi um quarto escuro agoniante, apesar de só conter uma cama com cheiro de mofo em todo espaço do quarto. Portando, pelo mal estar que aquela situação me colocava tratei de fechar rapidamente, e bem baixinho rezei o rosário, e pedi a Deus que tivesse pena da alma que ali tinha sofrido. Capítulo V No quarto ao lado se eu não me engano, era uma perfeita sala de carpintaria. Com vários instrumentos e utensílios de maquinaria. Apesar de ter me intrigado sou forçado a dizer que não compreendi a intenção daquela sala em um ambiente tão horripilante. Fechei a porta e voltei ao ponto de início. Virei de costas e atrás de mim aguardava um fantasmagórico freezer horizontal de mais ou menos dois metros e meio. Estava ligado, funcionando e em sua orla um ar gélido que vinha de baixo para cima. Também exalava um odor intenso de carniça que ao chegar perto quase me fez vomitar. Pensei muito ao abrir, se não fosse a minha curiosidade investigava teria recuado e ido embora só com o que já tinha. Contudo lembrei que nada tinha, e não poderia culpá-lo por achismos, apesar do sentimento de náusea e sobrenatural que o andar térreo emitia. Abri a tampa pesada do freezer com as duas mãos, o odor e o vento congelante me empurraram para trás, estava escuro, então acendi meu isqueiro. O que vi não posso traduzir em palavras ou em raciocínio lógico, infelizmente passei a entender a função do quarto de carpintaria. Pedaços congelados de corpo humano na mais pura fase de crescimento. Cabeças fora do ombro, pernas separadas dos quadris e órgãos internos, uma pilha deles. Não pude conter o choro ao pensar que poderia ser um 32
  • 33. daqueles corpos inocentes e violados meu filho. Pelo escuro e gelo não poderia reconhecer. Estou contando com calma pois ao ver aquela cena horrível de mutilação satânica fiquei imóvel e indefeso. Mesmo que por instantes ter permanecido com o freezer aberto senti que aquela assombração durou toda eternidade. Agora estava convencido e tinha provas da tua monstruosidade, pero uma gaveta ao lado do freezer, em uma área no canto da parede, como que esquecida, continha uma espécie de diário que relatava tortura, nomes e idades de crianças, datando pelo menos uma década. Pus o pequeno caderno dentro da paletó e fui para casa. Chegando em casa passei dias a relacionar as mortes listadas no diário com os da cidade e os da redondeza. Descobri vinte crianças desaparecidas em notícias de jornais do interior. Sim, eu procurei. Foi um trabalho desgastante, penoso, exaustivo, pero queria entender até onde iam as tuas atrocidades. E com passar do tempo entendi que teria de ir mais a fundo, decidi pesquisar sobre tua vida. Mortes por perto ti desde a tua adolescência. Isso mesmo! Pelo meu raciocínio a tua fome por sangue devia ter começado com alguém próximo. Nenhum crime fica sem provas, é necessário experiência, é se preciso cair para começar a andar. Procurei por teus erros. E descobri. Primeiro descobri que quando morava com os teus pais na capital a filha de uma criada havia desaparecido. É mesmo Jeferson Dietrich a encarnação do mal. pero o que mais me assustou foi saber da morte da tua mãe com quarenta e dois anos de idade. Então fui à capital. No hospital onde teu pai foi diretor por muitos anos, me disfarcei de médico, e com dificuldade encontrei o laudo, onde registrava a morte da tua mãe. Não tem como eu entender linguagem médica, pero ali no meio daqueles termos herméticos li “alta concentração de cianureto ”. Estranho, não? Mesmo com o nome de um veneno mortífero escrito ali e entendido até por mim, o que se ficou sabendo sobre o falecimento da senhora tua mãe, que não tem culpa por ter um filho diabólico, é que morreu por causa de câncer. Capítulo VI Escondi tudo da polícia, não a falaria de nada, seria tudo inútil! O mais correto a fazer, e não pense que é fazer justiça com as próprias mãos, pero sim impedir que um psicopata faça mais vítimas. Farei hoje o papel de Deus, Deus finalmente decidiu interferir no teu livre arbítrio. — José, tu é muito inteligente. Foi mais esperto que qualquer pessoa, realmente preciso admitir a tua superioridade quanto a mim e os outros habitantes da cidade. pero se empolgou muito enquanto contava das tuas descobertas. Foi contando freneticamente, acho que a questão entre nós não é eu ter matado teu filho, e como tu disse, ter destruído a tua vida e a de outras pessoas. Para mim é natural crianças serem ingênuas, pero adultos têm de deixar de lado a ingenuidade e admitir os próprios erros. O erro de todos os pais, todas as famílias das crianças que eu matei foi terem deixado elas livremente na mão de estranhos, explorarem um trabalho infantil ou terem sido deixadas sozinhas em casa. Como foi o que tu fez. Então para mim, a questão 33
  • 34. aqui é a disputa que tu criou para provar quem é mais inteligente, tu, ou eu. Tu não percebeu que enquanto te vangloriava dos teus feitos e da minha posição de submissão a ti, que estas cordas com que me amarrou são muito vagabundas, e os fios se desenlaçam uns dos outros quando se molham, afrouxando. Então pude soltar a corda. Agora eu vou te matar. — Não fale besteira, seu animal! Quem vai morrer é tu, tenho até dó de ti, mesmo sabendo do monstro que é. Quando José terminou de falar soltei as minhas mãos e dei um soco no nariz dele, esmagando o osso e a cartilagem, o fazendo voar contra parede, ficando inconsciente. Tirei as roupas e o amarrei na mesa da cozinha. Procurei algum instrumento que fizesse o nosso prazer ser mais intenso. Ao procurar percebi que era um sítio pequeno e muito bonito, o sol se mostrava radiante, perto de se pôr. Caminhei e encontrei vários instrumentos de cultivo. O utensílio de corte mais tecnológico era um serrote enferrujado, que apesar disso parecia ser muito afiado. Voltei até a cozinha e comecei a serrar os pés do senhor Hoff, que acordou rapidamente. O serrote dava muito trabalho, pero consegui terminar o pé direito. José desmaiou de dor. O chão da cozinha ficou inundado pelo sangue que escorria sem parar, acendi uma brasa e tratei de cauterizar o machucado. O sangramento parou. Dirigi o serrote à barriga de José, fiz força, e abaixo da pele, ultrapassei a gordura que espirrava sangue, em meio a muito sangue as tripas foram saindo, atrapalhando mais o trabalho. Aos gritos José morreu. Os órgãos pareciam todos iguais, era uma vermelhidão sem fim. Separei José em dois, e tive uma excelente ideia para cabeça. Decapitei e embrulhei com muito pano que encontrei nos quartos e a enfiei em uma sacola de lixo. Capítulo VII: Fim Com uma pá fiz um fundo buraco que joguei ali o corpo sem cabeça. Limpei a cozinha e tomei banho. Coloquei um curativo no machucado. No paletó de José encontrei meu diário, vesti as roupas dele e as minhas coloquei dentro de outra sacola de lixo e trouxe comigo numa caminhada. Depois de muito caminhar peguei carona até a cidade vizinha a Canguçu. Lá paguei um táxi que me trouxe até praça perto de casa. Voltei pra casa a pé. Estava cansado, chegando tomei banho. Enquanto a água caía no meu rosto pude relaxar os músculos e os nervos de um dia que me deu tanto trabalho. Preparei uma panela com água, esperei ferver. Enquanto fervia puxei o cabelo da cabeça de José e pude retirar seu cabelo com um escalpelo. Joguei a cabeça na panela de pressão e esperei quarenta minutos. Soltei o vapor e com a ajuda de luva e dois garfos retirei a cabeça da panela colocando numa tigela de vidro. Em cima da mesa pedi auxílio de uma colher para raspar o músculo epicrânico, que em forma de gelatina foi sendo despregado do osso em toda sua extensão, não arrebentando apesar da sua finura. Totalmente raspado retirei também o temporal. Peguei uma faca sem serra, e com leves movimentos à direita decepei o masseter. Embrulhei o resto e 34
  • 35. coloquei no freezer. A campainha tocou, olhei pela janela e Manoela estava na porta. — Vem abrir! Ela gritou. Desci para abrir a portão. Ela me recebeu com um beijo e um abraço apertado, passou na minha frente e subimos a estreita escada de mãos dadas. A calça apertava sua bunda como se convidasse a apertar. Apertei, ela continuou subindo sem nada dizer. — Tu tá fazendo janta? — To sim, já comeu? — Não. — Eu vou fazer macarrão à alho e óleo com uns fios de carne bem soltinhos pra comer com vinho que tá gelando. — Ótimo, to morrendo de fome. Vou ao banheiro. Ela deixou a porta aberta para eu escutá-la urinando. Quando saiu eu dei um sorriso, ela retribuiu e deu um beijo. — Tu tá carinhosa hoje. Eu disse — Saudade de ti. Depois de comermos dormimos. Fomos gulosos e o vinho ajudou a adormecer. Os dias correram-se assim. Depois daquele longo dia de infortúnio com José, eu estava até que enfim livre para respirar. Hoje é dia primeiro e amanheceu com um belo sol a transluzir pela janela e pela cortina. Fiz café que espalhou o seu bom cheiro pela casa toda. Li o jornal, eram oito da manhã e pensava em Manoela, que deveria estar dormindo este horário. Quando acordasse planejaria minha festa surpresa. A campainha tocou, Manoela chegou tão cedo assim? Impossível. pero a campainha tocou mais duas vezes. Quem está a me incomodar a esta hora da manhã? Logo se seguiu de palmas, e uma voz gritou “Jeferson Dietrich, aqui é a polícia, abra a porta, temos um mandato! ”Š Lous Rondon. Cuiabá, 16 de Abril de 2011. 35
  • 36. O Estuprador de São Félix Começou a andar pé por pé, a magreza driblava o tronco alto do vento, assim transpassando o frio e o cheiro de perfume ruim que vinha da gorda da frente. O terreno baldio marcou a hora do ataque, prendeu a mulher surpresa enforcando-a com o antebraço comprido e feito de osso. A peixeira que tirou da cintura refletiu com uma lâmina fria e faminta a lua cheia, que soube amedrontar a mulher vaidosa de quatro filhos. “Vão me matar”, pensou. Foi arrastada ao meio do mato e do lixo, de árvores e de corpos de bicho de estimação já secos e comidos por formigas. Tudo fedia, fedia a banha suada da quarentona, fedia o perfume barato, fedia as roupas do peixeiro, fedia o cabelo que nunca lavara na vida, fedia o pinto duro e sujo que transpirava todo ferormônio, e este foi bem recebido pela vagina peluda, aberta pelas longas horas de caminhada e pelas tantas vezes que fudeu. A mão no pescoço seboso congelou o desejo de fuga, a faca pontiaguda arranhava junto com as idas e vindas do pau preto e arretado. O aço violento por vontade própria começou a golpear o seio pelancudo que em seis anos amamentara toda a cria, dançava e pulava como uma cobra tentando se livrar de um predador, até que por fim descansou com tensão e perfurou fundo do bucho ao coração. Lá trepada não saiu por longos minutos, esperou maliciosa a última tremedeira da empregada doméstica, que esticou-se como uma pedra gelada no inverno, em uma atmosfera muda e desconhecida, enfim tudo terminara, enfim a tristeza tomou conta do lugar, ficou tudo tão vazio quanto as longas horas de trabalho repetido. Amanheceu e o que dizia no jornal era tudo. pero sobre ele nada. Nada teria achado se ao menos tivesse procurado no diário local. Se muito esforço fizesse conseguiria soletrar algumas poucas palavras, o resto não saberia era nada. Este vagabundo nunca conseguiu terminar a segunda série do ensino fundamental. Este vagabundo nunca conseguiu outro trabalho além de peixeiro e orelha seca. Depois da feira daria umas tragadas numa pinga doce. Faria um quilo de farofa com pacu frito. A casa velha tinha um cheiro de óleo e mofo pelas paredes infiltradas. O tijolo era visível, e o cimento esfarelava sozinho. O fogão por milagre tinha uma boca a funcionar. Era o que havia deixado o ofício de prostituta da sua falecida e cardíaca mãe. Depois da morte dela os quartos ainda continuaram a receber clientes das mulheres do padrasto de Josemar. Contudo a solidão devastou o lar após o sumiço do cafetão alcoólatra. O olhar vidrado do peixe na lâmpada não esperava por nada. Apenas estava lá enquanto as vísceras dele eram arrancadas dentre as espinhas e escamas lavadas e escorridas cano abaixo. Uns narigões melequentos vinham cheirar sua cabeça, e assim estendido por mãos grossas de unhas longas e pintadas, chamativas. Estas senhoras perguntavam ao peixeiro quanto o gosto e modo de preparo. Causavam nojo, e por este nojo a vontade de esfregar o pinto entre suas pernas crescia. 36
  • 37. Quando a lua tornou-se rubra como sangue entre o escuro do amplo céu os ventos malignos planejaram cantar sobre as telhas e árvores, e o frio que vinha com ele poderia matar os sapos desavisados que pulavam no quintal sem fim que nesta noite era revestido por uma fantasmagórica nuvem a deslizar sobre a terra de tantos e tantos cadáveres dormindo desde séculos atrás. Do portão à parede o terreno tornara-se tão extenso a não se poder ver horizonte. As mangueiras sem frutos estavam altas e abrigavam corujas que ao tremerem soltavam como dor a última vogal do alfabeto. Dentro da casa a escuridão emudecia os móveis de madeira, tão antigos que traziam lembranças há tempos esquecidas. Em especial um deles, uma cadeira de balanço rangia ao ir-se para frente e para trás, tão vagarosamente a dar a impressão de estar flutuando no meio daquela sala de insana morbidez. O coro do vento tornou-se mais forte e agora dava para se ouvir nitidamente, eram como crianças cantando cantigas de roda. A porta por não aguentar cedeu, deixando seis meninas a fingir cavalgarem em cabras fantasmas entrar. Os cabelos pareciam irradiar brasas se movendo no ar, as pesadas roupas afogadas em lama de pântano encobriam parte das delicadas perninhas, o olhar negro sem reflexo algum sombreava o sorriso podre e lábios doentes. Saíram galopando sem medo de monstros pois na verdade os espíritos eram elas agora livres para trucidar um mortal. Josemar sob o forro dormia incomodado, sonhava, balbuciava qualquer coisa e chorava todas as lágrimas que nunca presenciariam a luz de seus crimes. Chorava a morte da mãe, chorava as lembranças de nunca ter tido infância, de saber que seu pai era mais um cliente no meio de várias prostitutas. As meninas ao pé da cama atentavam-no como chamas infernais e sussurravam vozes bestiais ininteligíveis "... acorde, Josemar, o vento te guia, agora lhe diremos o futuro, guardamos algo em particular para você, o escolhemos pois dará conta do destino, das milhares de unhas brilhantes e de vaginas ofegantes hão de esperar pela sua timidez. O demônio que foi perturbado hoje está conosco, o número correto é o três, não o cinco. Satã derramou sobre nós os poderes das trevas. Nenhuma bondade é sem interesse e nenhum interesse livre de maldade. A casa está velha, não aguentará muito, tem de sair, a parede precisa de mais sangue e a terra de mais ossos. Não existe nada mais impessoal que o sexo. Os filhos terão pais, pero é preciso deixá-los órfãos, como você...” Uma das meninas diabólicas puxou o pé de Josemar, ele rapidamente pulou da cama, o pranto misturava-se com o suor, e o suor com o fogo. ? Cuiabá, 10 de setembro de 2012 37
  • 38. O Benfeitor O texto a seguir é indicado para maiores de 18 anos. É fictício, não representando a opinião pessoal do autor. O Benfeitor Por Lous Rondon Para a flor que me pediu um conto. Cuiabá, 17 de Julho de 2013. Correção e novos detalhes feitos em 1º de julho de 2013. -- Capítulo I O ventilador repetia sempre o mesmo ranger, dando um ar entendiante ao quarto de tinta amarelada. A cama tinha um forro que nunca fora trocado, mofado, encardido, que fedia à sexo. Em cima deles uma meretriz nova de coxas arredondas, morenas e grossas, a pele que não banhara no dia podia contar com a hidratação natural da raça. Os dentes incisivos pretos, um sorriso tão vulgar que poderia encontrá-lo em qualquer boca larga das moças da periferia. A mão extremamente pequena e gordinha lutava contra um velho tarado, que na noite, como todas, fugia da mulher rabugenta com quem era casado há pelo menos quarenta anos, indo de bar em bar, de puteiro em puteiro. -- Vamos, eu pago mais. Te dou mais vinte do que já dei pra sua patroa lá fora. Não tem perigo, é mais gostoso eu to falando, o cliente tem razão e eu paguei então não vou pegar o dinheiro de volta e você vai ter que fazer do jeito que eu gosto, vamos, eu to pagando. -- Já disse não, não vou fazer sem camisinha, caso você não trouxe pega essas aqui, ou cai fora, não devolvo o dinheiro também, você veio aqui pra arranjar confusão? eu vou chamar o segurança lá fora. O tapa foi forte, a vagabunda bateu a cabeça na cabeceira da cama e apagou. Então o velho instigado meteu o pinto enrugado e cabeçudo para dentro daquela buceta suja de urina e lubrificantes. Roçou ali tão folgado como um soco no ar, o pênis não era o mesmo dos seus vinte anos, então espirrou num minuto, colocou o caralho para dentro da calça e desceu com passos longos e rápidos a escadaria mal feita, em que os degrais continham buracos, visto que a altura de um para outro variava tanto que podia-se facilmente errar o pé, sendo necessária muita atenção e destreza para não sair rolando até em baixo. -- Capítulo II A aids, o craque e o filho a levaram até o convento, onde tornara-se freira. Deixando o 38