Por meio de ações afirmativas, estudantes indígenas têm acesso a vagas suplementares em universidades públicas do Paraná desde 2001. No entanto, as taxas de evasão permanecem altas. Este relatório analisa o acesso e permanência de estudantes indígenas na UNICENTRO entre 2011-2019, identificando desafios como preconceito, falta de apoio e dificuldades culturais e linguísticas. Mais ações de inclusão cultural e apoio estudantil são necessárias para melhorar a conclusão dos cursos.
1. ANEXO V, DO EDITAL Nº 002/2020 DO PROGRAMA INSTITUCIONAL DE
INICIAÇÃO CIENTÍFICA – PROIC, DA UNICENTRO
RELATÓRIO FINAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA
NOME DO ALUNO: Edina Fidelis
ORIENTADOR: Laurete Maria Ruaro
REFERENTE AO PERÍODO: 03.09.2019 a 15.11.2020
TÍTULO: Acesso e Permanência de estudantes Indígenas da Universidade Estadual do Centro
Oeste
PALAVRAS-CHAVE: Acesso e permanência. Estudante indígena. Ações afirmativas.
RESUMO:
Por meio de ações afirmativas voltadas à população indígena o Estado do Paraná, desde o ano de
2001, oferece vagas suplementares no vestibular em suas universidades públicas. Junto a essas
vagas, que hoje são regulamentadas pela Portaria Estadual 010/2019, há a disponibilização de
bolsa-auxílio para garantir a mobilidade entre o território indígena e o local em que cursará o ensino
superior. No sentido de entender como acontece esse processo no interior da UNICENTRO –
Universidade Estadual do Centro-Oeste, essa pesquisa analisou os dados disponibilizados pela
instituição entre os anos 2011 e 2019 a fim de entender em que medida os objetivos do programa
CUIA – Comissão Universidade para os Índios alcançam as necessidades de inclusão e sucesso do
indígena quando adentra à vida acadêmica.
01 – INTRODUÇÃO
Por meio de ações afirmativas do Estado do Paraná, desde o ano de 2001 são ofertadas
vagas suplementares para alunos indígenas em Universidades Públicas. Hoje o documento que
ampara essas ações é Portaria nº010/2019. Essa política foi de fundamental importância para que a
população indígena pudesse cursar o ensino superior e se profissionalizar para atender as
necessidades dos territórios a que pertencem.
O ponto de partida dessa investigação se deu na leitura do texto de Angnes (2010, p.12),
que apresentou em estudo sobre como “as formas como o acesso ao ensino superior interferem nas
expectativas destes estudantes e outros aspectos que influenciaram seu ingresso, permanência,
desistência, conclusão na universidade”.
Naquele estudo a pesquisadora mapeou a presença dos estudantes indígenas na
UNICENTRO, Universidade Estadual do Centro Oeste utilizando o recorte dos dez primeiros anos
de atuação da CUIA. Desde lá já foi possível identificar que a flexibilização do acesso não bastava
para garantir a permanência e conclusão do aluno indígena, sendo que o número de abandono ainda
2. se apresentava muito alto.
No sentido de olhar como estão postas essas questões entre os anos de 2011 a 2019,
buscou-se mapear os ingressos de alunos indígenas na UNICENTRO e procurar avaliar os índices
de sucesso escolar desses novos acadêmicos. Conforme o Relatório Cuia/2019, nesse último ano a
universidade tem 32 matriculados, a maioria em cursos de Licenciatura: Pedagogia, Letras e
História somando 19 alunos. Na área da saúde um aluno cursando Enfermagem e uma matriculada
em Medicina, dez alunos cursam Administração e uma Secretariado Executivo.
A maioria desses indígenas é proveniente do TI Mangueirinha, da etnia Kaingang
frequentando o Campus Avançado de Chopinzinho. Nesse tempo, a universidade formou 19
indígenas Kaingang e 03 da etnia Guarani pelo programa sendo que a média de tempo para
conclusão tem sido de 6 anos.
É importante mencionar que há muitos indígenas que frequentam a universidade, mas que
não fizeram o vestibular pela CUIA – Comissão universidade para os índios. Ou seja, há muitos
acadêmicos indígenas com a entrada pelo vestibular regular que não recebem a bolsa de estudos
vinculada ao programa e não estão incluídos nesses dados apresentados.
Do levantamento desses dados, surge a necessidade de entender em que medida as políticas
afirmativas fazem a diferença na vida do acadêmico indígena e como a Universidade se organiza
para auxiliar o aluno nesse processo a fim de garantir a conclusão do curso. Assim, delimita-se a
temática dessa pesquisa: quais ações para potencializar a aprendizagem dos acadêmicos
considerando o tripé ensino, pesquisa e extensão?
02 – OBJETIVOS
Objetivo geral: Analisar o processo de acesso e permanecia dos estudantes na universidade
Objetivos específicos: investigar as políticas de acesso e permanência. Levantar a situação dos
estudantes indígenas na instituição, entrada, tempo de conclusão e saída. Sinalizar as ações que
poderiam ser desenvolvidas para evitar a evasão
03 – METODOLOGIA
Optou-se pela abordagem qualitativa e selecionou-se como instrumento de investigação a análise
documental e bibliográfica. No decorrer dos estudos houve a necessidade de ouvir os acadêmicos,
então desenvolveu-se dinâmica de grupo focal para ouvir as vozes dos acadêmicos e entender um
pouco das suas trajetórias considerando as dificuldades, mas, também as esperanças e anseios.
3. 04 - RESULTADOS E DISCUSSÃO
Num primeiro momento o que se tem a dizer é que o Ensino Superior no Brasil é muito
branco e hegemônico. Tradicionalmente o filho do pobre, quando consegue acesso, estuda nos
cursos menos concorridos ou em cursos noturnos porque precisa trabalhar. Outro dado é que os
cursos mais bem vistos como engenharias e medicina, por exemplo, são mais cursados por homens
(GOMES, 2003). Ou seja, precisamos conversar sobre políticas afirmativas para alunos e alunas
dos cursos superiores, estamos falando de projetos que sempre aparecem muito velados nas falas
dos sujeitos. Para entender a necessidade de falar em inclusão e ação afirmativa dentro da
universidade precisamos fazer uma retomada desse conceito:
As ações afirmativas se definem como políticas públicas (e privadas)
voltadas à concretização do princípio constitucional da igualdade material e
à neutralização dos efeitos da discriminação racial, de gênero, de idade, de
origem nacional e de compleição física. Na sua compreensão, a igualdade
deixa de ser um princípio jurídico a ser respeitado por todos, e passa a ser
um objetivo constitucional a ser alcançado pelo Estado e pela sociedade.
(GOMES, 2003. p.21)
Ou seja, é de grande importância discuti-las nos corredores, nas salas de aula, nas calçadas,
praças ou outros espaços em que se encontram populações minorizadas pelas suas condições
materiais e/ou imateriais.
Essas discussões ainda são muito vazias, inexistentes ou mal interpretadas dentro de
algumas universidades, mais ainda em instituições pequenas com cursos menos valorizados - como
a das licenciaturas, por exemplo. Em algumas poucas discussões que se conseguiu investigar na
UNICENTRO, Universidade Estadual do Centro-Oeste, viu-se muito pouca coisa como, por
exemplo, custeio de parte da alimentação e algumas vagas para permanência.
O programa institucional de Assistência Estudantil voltada para acadêmicos do Campus
Santa Cruz e/ou Cedeteg por meio de dois grandes projetos tem a intenção de suprir algumas
lacunas que poderiam ser solucionadas, por exemplo, com ampliação de bolsas e participação em
ações mais específicas. Segue ações da Universidade:
4. FIGURA 01 – Projetos Assessoria Estudantil
https://www3.unicentro.br/apoioaoestudante/projetos/
5. FIGURA 02 – Serviços ofertados
https://www3.unicentro.br/apoioaoestudante/vivendo-na-unicentro/
Na figura 02 é possível observar que a instituição oferece 04 serviços, entretanto, não foi
possível acessá-los por estarem em construção.
Nessa pesquisa olhamos para esses serviços de Assistência Estudantil também para avaliar
em que medida dos acadêmicos, indígenas ou não, são acolhidos e encaminhados para os serviços
prestados pela instituição e que se colocam como ação afirmativa. Pois, as bolsas e possibilidades
de estágio ainda são muito pequenas e cada vez mais ausentes. Poucos alunos conseguem bolsas
remuneradas para pesquisa ou participação em projetos de extensão – essas possibilidades são ainda
mais complicadas para os cursos na área de humanas.
Entendemos que é necessário maior envolvimento da instituição com as condições dos
alunos que entram para fazer um curso superior. No caso específico dos indígenas temos alguns
problemas bem mais pontuais: a barreira linguística; a condição socioeconômica; a privação
cultural, o preconceito.
Depois dessa primeira discussão, num segundo momento a discussão maior será feita a
partir da realidade dos alunos indígenas da Unicentro. Foram considerados para esse estudo os
alunos que entraram pelos vestibulares organizados pela CUIA – mas há outros indígenas que
frequentam a instituição que entraram pelo vestibular regular.
Começa, então, o primeiro viés do preconceito: a entrada por meio de vagas suplementares
6. nem sempre é entendida pelos alunos regulares. A indignação histórica e comum é a mesma voltada
para os cotistas: vocês estão “tomando” nossas vagas (ANGNES, 2010). Esse preconceito não é
apenas racista ou segregacionista, ele é o indicador de que o sujeito que proletário que vai para a
universidade não consegue se enxergar como também um excluído. O preconceito vai além quando
a questão trazida é a retórica de que “o índio deveria ficar na mata” e que a “civilização” não é o
seu lugar. Esse tipo de discurso deixa muito fraca a possibilidade de existir formas de resistência no
espaço estudantil, nem mesmo os sujeitos do campo conseguem se afirmar dentro de uma única
força.
Em relação às entradas dos indígenas na instituição ainda podemos identificar a validade
da contribuição de Oliveira (1998) que identifica a busca de formação universitária dos povos
nativos em dois segmentos: formação de professores indígenas nos cursos de licenciatura – no caso
da Unicentro a maioria e outros cursos para inserção no mercado. A ideia é de formar profissionais
nativos para associar os saberes científicos com os saberes tradicionais, conforme diz Oliveira
(1998, p.34) “pondo-se à frente da resolução de necessidades surgidas com o processo
contemporâneo de territorialização a que estão submetidos”.
Talvez nesse ponto que reside o motivo para que os estudantes indígenas não darem conta
de terminar sua formação. Pois, nem a universidade nem os professores estão preparados para
receber toda essa diversidade cultural e negam as possibilidades de uma educação intercultural – em
que todos os saberes são considerados e problematizados a partir dos saberes científicos.
Por fim, retomando os estudos de Angnes (2010; 2014), a pesquisadora apontou alguns
elementos que poderiam pesar no rendimento/entrosamento do indígena na universidade:
relacionamento interpessoal; timidez; aparência/vestuário; língua; cotismo. Ao analisar essas
categorias no ano de 2019, elas continuam a ser mencionadas.
Uma análise mais profunda mostra que a timidez, falta de entrosamento e vergonha de se
manifestar nas aulas, por exemplo, são fatores que afetam os alunos não indígenas também – assim
como o vestuário e a aparência, alunos mais carentes sofrem com essa condição. Seria um respiro,
não fosse que os alunos não brancos e pobres não conseguirem se identificar com o indígena na
condição de expropriado.
Mas, pesa sobre o nativo brasileiro todo o preconceito construído por uma política, antes
da tutela, agora da intolerância mesmo de seus pares minorizados. A esperança ainda está presente
quando é possível acreditar que as políticas educacionais possam “diminuir a distância e o
preconceito entre indígenas e não indígenas, para garantir os direitos sociais” (GARLET, 2010, p.
72). Caminhemos para isso por meio da insistência em garantir a igualdade na diversidade.
7. 05 – CONCLUSÕES
Independente da forma de entrada no sistema universitário, o que se pode verificar é que as
políticas para assegurar a permanência e conclusão dos alunos indígenas se fazem bastante
fragilizadas. É importante pontuar, nesse contexto, que a universidade não oferta ações afirmativas
tão mais significativas do que a CUIA, havendo um déficit significativo nesse setor e que é uma
reivindicação antiga dos Centros Acadêmicos da instituição.
Sem dúvidas a Comissão Universidade para o Índios, no Paraná, traz uma vantagem para
nossos povos nativos. Pois, na maioria das instituições fora do Estado enquadram os indígenas nas
cotas afrodescendentes ou socias vinculadas ao vestibular geral.
Mas, embora haja a presença da coordenação do projeto, assim como membros da Cuia na
universidade e no Campus, as ações não são contínuas e enfraquecem muito a experiência
formativa. As sugestões estariam em tempo maior de discussão dos alunos com a comissão – esse
tempo é mais difícil quando estamos matriculados em um Campus Avançado sem condições
estruturais e nem de tempo para isso.
Reuniões isoladas com a coordenação, ainda que bem vindas, não são suficientes. Outro
fator que preocupa é a falta de formação dos tutores que designados para acompanhar indígenas
com maiores dificuldade. Alguns passos já foram dados, mas ainda há que se ampliar a voz dos
indígenas no ensino superior: ampliação do número de vagas suplementares; maior presença em
cursos na área da saúde e nas engenharias; espaço para trabalho em projetos de extensão e pesquisa;
participação ativa na organização das políticas de inclusão; valorização dos saberes indígenas.
Somos homens e mulheres, Guaranis e Kaingangs que entendem a dinâmica da sociedade e
que conhecem seu lugar de resistência e de luta por um espaço mais justo e humano para todos que
se encontram em situação de vulnerabilidade, indígenas ou não.
06 - REFERÊNCIAS
ANGNES, Juliane Sachser. O Ensino Superior para os Povos Indígenas: Ingresso,
Permandência, Desistência e Conclusão dos Estudantes Indígenas da Universidade Estadual
do Centro-Oeste (UNICENTRO), Paraná. 2010. 420 f. Tese (Doutorado) - Curso de Educação,
Educação, Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 2010.
_______. (et all). Permanência na universidade: o que dizem os estudantes indígenas da
universidade estadual do centro-oeste do paraná. In: Revista Holos, ano 30, vol 6, 2014.
GARLET, Marinez. Cotas para estudantes indígenas: Inclusão universitária ou exclusão escolar.
Educação, Porto Alegre, v. 33, nº 1, p. 65–74, jan/abr.2010. Disponível em:
http://repositorio.pucrs.br/dspace/bitstream/10923/7967/2/. Acesso em 01de abril. 2019.
8. GOMES, J. B. O debate constitucional sobre as ações afirmativas. In: SANTOS, Renato Emerson
dos; LOBATO, Fátima (Org.). Ações afirmativas: políticas públicas contra as desigualdades
raciais. Rio de Janeiro, RJ: DP&A, 2003. p.15-58. ISBN 8574902601
NOVAK, M. S. J. Políticas da ação afirmativa: a inserção dos indígenas nas Universidades
Públicas Paranaenses. Dissertação (Mestrado em Educação). Programa de Pós-Graduação em
Educação. Universidade Estadual de Maringá. Maringá: UEM 2007.
OLIVEIRA, J. P. de. (Org). Indigenismo e territorialização: poderes, rotinas e saberes coloniais
no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Contra Capa, 1998.
PARANÁ. CUIA Estadual. Relatório de estudantes indígenas matriculados e formados até 2019.
Comitê Cuia Estadual, 2019.Disponível em
<http://www.seti.pr.gov.br/sites/default/arquivos_restritos/files/documento/2020-
06/relatorio_vestibular_indigena_2019_cuia.pdf>
07 -AVALIAÇÃO DO ORIENTADOR SOBRE O DESEMPENHO DO ORIENTADO
A aluna desenvolveu todas as atividades de leitura, fichamentos e produções de sínteses. Teve um excelente
desempenho na coleta e sistematização dos dados demonstrando protagonismo nas análises e excelência nas
atividades escritas.
08 - ANEXOS (Certificados de apresentação e divulgação dos resultados do projeto)