O documento discute o papel do educador como um modelo de comportamento para as crianças. Argumenta que as experiências na primeira infância moldam a personalidade e hábitos duradouros, e que os educadores devem promover experiências ricas que ensinem conhecimentos úteis de uma forma contextualizada. Também enfatiza a importância da educação ambiental, começando com os próprios comportamentos dos educadores.
1. O “Educador” como Modelo comportamental
Henrique Santos
Educador de Infância
Antes de mais quero agradecer à equipa da Câmara Municipal de
Loures que tão oportunamente organizou este evento, que, espero,
bons frutos traga.
Em segundo lugar, quero agradecer a todos os presentes, certo que a
vossa presença aqui, só por si, já é uma etapa ganha no esforço de
cooperação, colaboração e solidariedade que os problemas aqui
abordados nos exigem,
por último, e porque sou naturalmente optimista, espero que esta
minha breve intervenção não vos mace e que até vos possa trazer
algumas informações úteis.
Apresento-me aqui, em nome da Associação de Profissionais de
Educação de Infância, mas primeira e assumidamente como Educador
de Infância, e por tal, talvez o que vos venha dizer possa parecer, à
primeira vista (ou audição) uma tremenda infantilidade, mas espero
poder convencê-los do contrário.
A questão que desde sempre persegue educadores, pais, autarcas e a
comunidade em geral é a de saber até que ponto as experiências da
primeira e segunda infância (0-6 anos) constituem factores
determinantes do desenvolvimento subsquente, ao nível cognitivo, da
personalidade e na interacção com o meio.
Embora os efeitos a longo prazo das experiências da infância sejam,
em certa medida, reversíveis, no caso da personalidade, no seu todo,
as bases lançadas neste período de vida parecem conservar-se
razoavelmente estáveis. No que concerne à interacção com o meio, e
como complemento activo do desenvolvimento da personalidade,
poderemos acreditar que a vivência de certas experiências chave
2. poderá contribuir para a assimilação e incorporação de
comportamentos duradouros.
Para exemplificar, e de certa forma fundamentar esta primeira
“laracha” surge-nos um estudo, com já alguns anos, de Haslow, que
criou macacos Rhesus em isolamento completo uns dos outros e de
qualquer mãe viva, real ou animada.
Neste estudo, os bébés sobreviveram muito bem até à idade adulta.
Chegados aí, porém, mostravam-se completamente anormais. Não
interagiam com outros adultos e nem sequer para fins sexuais.
Algumas fêmeas conseguiram ficar prenhes mas ou ignoravam ou
mesmo matavam as crias.
Posteriormente outros estudos, agora desenvolvidos com crianças,
evidenciam e comprovam que estas, em idades da primeira e
segunda infância, sujeitas a bons cuidados e uma boa comunicação
parecem desenvolver rotinas profundas e íntimas com efeitos
irreversíveis. Daqui se pode concluir, numa conclusão rápida e
fundamentada apenas para este efeito, que a infância (esta infância)
é a fase da vida mais importante para desenvolver a capacidade a
que chamamos personalidade, e onde se arrumam os
comportamentos, as atitudes e as crenças dos humanos (entre
outras).
Passado este primeiro espaço de reflexão, surge-nos agora, e porque
é, reconhecidamente, um dos mais importantes “adultos” em
interacção com as crianças em idade pré-escolar, o Educador de
Infância.
O papel do educador de infância, e de todos os educadores em geral,
é o de promoção de experiências verdadeiramente ricas e completas
que permitam a vivência e a aquisição de conhecimentos úteis. É este
o desafio que se coloca (generalizando agora) aos educadores e à
Escola.
Diz-se que o primeiro objectivo da escolas consiste, frequentemente,
em transmitir conhecimentos aos alunos. Continuando a generalizar,
3. diz-se também que pouco importa o contexto pedagógico, ou seja, as
actividades de aprendizagem e o próprio contexto de ensino e
aprendizagem. Diz-se que o que é verdadeiramente importante é que
os alunos apreendam os conteúdos, os conceitos.
No entanto, a prática actual têm-nos mostrado, com cada vez maior
evidência, que é preciso abandonar a ideia que os conceitos são
entidades autónomas e abstractas. Eles são, fundamentalmente o
produto de actividades sociais e culturais. É preciso ter a consciência
que o conhecimento conceptual é, na sua base, um conjunto de
instrumentos que serão utilizados em situações reais. Quem fala em
“instrumentos” fala em situação, história, perícia, experiência, arte,
artesão. Um instrumento só existe desde que haja uma situação que
permita o seu emprego e apoia-se sobre a história das suas
utilizações. Em suma, só aprendemos sobre determinado
“instrumento” se o utilizarmos devidamente, e dele retirarmos
conhecimento.
Se quisermos concluir este segundo intermezzo, teremos de afirmar
que é necessário fazer os conhecimentos sair do seu contexto
escolar, colocá-los no seu contexto original e então ensinar as
características culturais na sua origem com o auxílio de actividades
autênticas, ou seja, as práticas comuns da cultura.
Mas estamos então a falar de quê?
A nossa sociedade atravessa um período de transição que
provavelmente marca o fim de um ciclo de história do nosso planeta:
A Industrialização desenfreada das sociedades.
A educação deve ser repensada, não mais a partir de uma grelha
industrial, mas a partir de uma visão mais global da evolução do
planeta. A Educação deve servir para inventar outro futuro para o
planeta. Tal como afirmava Edgar Morin em 89, “este já não é o
tempo de se contestarem catástrofes ecológicas(...) é necessário
substituir uma cultura de competição e agressão que governa
4. actualmente as relações dos homens por uma consciência ecológica
da solidariedade”
Chegou pois a altura de abordar, frontalmente, a questão do
Educador como Modelo Comportamental. Partindo do princípio
“LaPallisseano” de que todos os homens são educadores, acho então
que chegou a altura de controlar a nossa evolução e criar um novo
processo evolutivo, porque precisamos de um novo “Ambiente”.
E se falarmos particularmente em questões ambientais, diminuindo
esse conceito aos comportamentos urbanos, mundanos e mesquinhos
que tantas vezes “ensinamos” aos nossos filhos, como a limpeza da
rua ou o respeito pelo espaço comunitário, não nos podemos
esquecer, como é óbvio, dos outros comportamentos, aqueles mais
institucionais, como o deixar o passeio por acabar ou permitir a
construção desenfreada em zonas protegidas e de interesse
ambiental.
E se quisermos continuar por esta perspectiva, como sugestões de
boas práticas poderão surgir as miniaturas de ecopontos, produzidas
pelas Autarquias e oferecidas aos estabelecimentos escolares, a ser
utilizados pelos alunos dentro das suas salas de aula, com os quais os
educadores poderão desenvolver trabalhos coordenados de
sensibilização e promoção de conhecimentos, ou podemos também
falar das inúmeras visitas de carácter ecológico e ambiental e que
podem ser também apoiadas palas autarquias (e nestas incluo as
visitas feitas aos mercados, às hortas ou mesmo aos alfarrabistas),
no entanto, se queremos pensar de uma forma global e concertada,
teremos de pôr a mão na consciência e tentar compreender porque é
que fumamos, porque é que atravessamos a estrada com o sinal
vermelho para os peões ou porque é que estacionamos o carro em
cima dos passeios, sabendo que possivelmente servirá de obstáculo a
um cego.
5. A Educação ambiental começa em todos nós, mas o investimento em
formação, em conhecimento e em acção pode ser fomentado pelas
instituições, que no fim são o conjunto de todos nós. E como?
Através da divulgação corrente das boas práticas, que são, no fundo,
as nossas práticas: a limpeza das ruas, o estacionamento ordenado,
o prazer de servir, politicamente, as populações, e, como é óbvio, o
prazer de partilhar o nosso saber sem receio de o perder.
Porque a pessoa culta será sobretudo aquela que conseguir gerir os
problemas da nossa sociedade, mais do que aquela que ostenta o seu
conhecimento do passado.