1. ALDEIA - SOLÂNEA/PB
ALDEIA
Em 1718, os índios sucurus solicitaram e obtiveram a concessão de terras, onde
já habitavam há algum tempo, na "Serra da Boa Vista", no lugar do "olho d'água",
para que "pudessem viver e plantar suas lavouras".
A população da aldeia naquela época era de aproximadamente 94 indivíduos, a
maioria pertencente ao mesmo núcleo familiar composto de crianças e
adolescentes.
Segundo consta o local onde se fixaram os sucurus, que vieram para a Paraíba
justamente para combater os tapuias, cujos domínios se estendiam entre os rios
Curimataú e o Araçagi, era muito fértil e abundante em água de boa qualidade -
útil ao ser humano e para a criação de gados.
Uma vez concedidas as terras a aldeia rapidamente prosperou. E, como em todos os
aldeamentos indígenas da época a presença de missionários se fez presente,
embora não sendo certo o ano em que ali chegaram.
A única certeza que se tem, advinda de fontes históricas, é que alguns
religiosos de Santa Tereza marcaram presença durante algum tempo e, são deles a
iniciativa da construção do primeiro oratório, por volta de 1730, cujo orago era
Santo Antonio. Passando o lugar a ser denominado "Aldeia de Santo Antonio da Boa
Vista".
"Aos nove dias do mez de março de mil sete sentos trinta e douz annos na Capela
da Boavista, administração dos sucurus e canindés, em licença minha batizou sem
os santos oléos o Pe Manoel Jorge da Costa a Firmiano, filho natural de Antonia,
tapuya, escrava do tenente Antonio Gomes de Macedo".
Com a fixação de uma grande cruz de madeira na área central da aldeia e algumas
adaptações passaram a impor normas e costumes europeus na comunidade, tais como
a proibição da nudez, construção de palhoças separadas para abrigar casais e sua
prole, além da catequese.
A obrigatoriedade do batismo com nomes portugueses foi uma das práticas
utilizadas que visava acabar com a identidade cultural dos membros da aldeia.
Por outro lado, os religiosos proibiam também que os índios e seus descendentes
fossem chamados de "caboclo", termo que consideravam pejorativo e ofensivo.
Muito embora se saiba que foram assim denominados por muito tempo. Sendo que
passou a ser apelido da família e até sobrenome.
Meu avô paterno LUIZ SEVERIANO DA COSTA, cuja pequena biografia tratei em outra
postagem, era chamado por LUIZ CABOCLO, pois era da "família CABOCLO". Muito
embora até hoje ainda não consegui determinar com precisão sua ascendência
indígena.
O lugar onde foi fixada a cruz virou referência, sendo certo que até meados do
século XIX podemos encontrar registros paroquiais onde o local era designado de
"CRUZ DA ALDEIA".
Em relação ao "olho d'água" citado na concessão de terras, que se tratava de uma
fonte ou nascente, ou seja, a água que surge por afloramento do lençol freático,
podemos dizer que era incomum, já que seu volume era grande, bem diferente de
outras nascentes do brejo paraibano.
Da mesma forma que a cruz virou referência, o olho d'água também, sendo certo
que próximo a ele muitos passaram a residir, passando a ser denominado "OLHO
D'ÁGUA DA ALDEIA".
Cabe ressaltar, que o município de SOLÂNEAPB, além da ALDEIA, tem atualmente em
sua zona rural, algumas localidades cujos nomes datam de pelo menos dois
séculos, tais como: LAGES, BOM SUCESSO, LAGOA DE TANQUES, MATINHAS, JACARÉ,
SALGADO e OLHO D'ÁGUA SECO.
Outras como SANTA TEREZA e FAZENDA VELHA são reminiscências da antiga presença
no local dos religiosos missionários de Santa Tereza na primeira metade do
século XVIII. Desnecessário dizer que no período a quantidade de crianças
batizadas com os prenomes ANTONIO e TEREZA também chama a atenção.
O certo é que o OLHO D'ÁGUA DA ALDEIA era de grande importância naqueles tempos.
Tanto é que não tardou que começaram os conflitos entre os índios aldeados e os
fazendeiros fixados em terras ao redor. A água era vital e, em consequência, bem
precioso.
Com o Diretório dos índios (a partir de 1758) e a política pombalina começam a
surgir mudanças, entre as quais as transferências para outras aldeias. Daí ser
uma consequência natural, que fosse também afetada a ALDEIA DE SANTO ANTONIO DA
2. BOA VISTA.
Muitos índios já estavam completamente integrados na denominada sociedade local
através de casamentos com o colonizador "português" e haviam pedido totalmente
sua identidade cultural. Os poucos que restavam na aldeia que resistiram foram
transferidos e suas terras quase que imediatamente ocupadas.
Até 1786, encontrei registros de batizados na capela da Boa Vista, como o do
batismo de DAMIÃO, em 24/04/1786, filho de Jozé Barreiro e sua mulher Angela
Maria.
É importante ressaltar que, bem próximo à Aldeia, um agrupamento humano surgiu,
tornando-se próspero, já que era ponto de passagem do caminho que ligava o
litora ao sertão, a "CHÃ DO MORENO". Aliás, é bom destacar que o referido
caminho remontava a época pré-cabralina, muito utilizado pelos índios de várias
etnias.
Chã, Chan ou Xam era como chamavam antigamente uma terra plana na serra, razão
pela qual a localidade tinha uma bela vista da aldeia, embrião do que é hoje a
cidade de SOLÂNEA.
Chã do Moreno prosperou, por outro lado a antiga ALDEIA, apesar de sua
opulência, quase que completamente despareceu dos registro históricos. E, o pior
crime que poderia se cometer ocorreu ao longo dos anos, simplesmente nenhum
estudo sério foi feito no sentido de resgatar sua importância histórica.
Nenhuma investigação arqueológica. Nenhum rastreamento. Nenhum interesse...
Nada. Uma lástima. E, assim tem sido em relação à cultura indígena, fadada ao
esquecimento e degredo.
Felizmente, sobre o antigo olho d'água algumas pessoas deixaram registros, tais
como Tancredo de Carvalho, que em Memórias de um Brejeiro (1975), narra a
alegria que tinha na sua infância (por volta de 1909) de "descer" de Moreno para
tomar banho na "fonte da Aldeia".